Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
7/09.2JAAVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: RECURSO
MATÉRIA DE FACTO
PROVA INDICIÁRIA
PENAS PARCELARES
PENA UNITÁRIA
Data do Acordão: 03/03/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA MEALHADA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 153º E 155º, 190° Nº 2, 191º 272º, N º1, AL. A), 71º E 77º TODOS DO CP,; 127º 363º, 374º Nº2, ,410º,,412º E 428ººDO CPP
Sumário: 1. No recurso sobre a matéria de facto compete ao recorrente demonstrar os fundamentos do recurso, o mesmo é dizer, não só identificar o erro in operando ou o erro in judicando que aponta à decisão recorrida, mas ainda especificar o conteúdo concreto dos meios de prova capazes de, numa valoração em conformidade com os critérios legais, impor decisão diferente da recorrida.

2.Perante uma sentença devidamente fundamentada, para que seja revogada, impõe-se que sejam rebatidos, com base em razões materiais minimamente persuasivas, os seus fundamentos materiais, o mesmo é dizer, ou a legalidade dos meios de prova utilizados, ou conteúdo das declarações ou de outros meios de prova valorados pela sentença, ou a inconsistência, á luz dos princípios legais atinentes, da análise crítica e da apreciação em que repousa a decisão

3.A prova directa incide directamente sobre o facto probando, enquanto a prova indirecta ou indiciária incide sobre factos diversos do tema de prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação da qual se infere o facto a provar.

4. No caso presente, o arguido estava profundamente desavindo com o ofendido; ameaçou-o; teve tempo de chegar ao local dos factos; não se apresentou ao serviço na manhã desse dia apesar de ter estado todo o dia a comemorar o aniversário da irmã; tentou ocultar a existência da queimadura; a sua alegada incapacidade perante o médico que o assistiu (esta conduta só encontra justificação no facto de se ter lesionado gravemente e apresentar essas lesões de forma visível) ; a dificuldade que a PJ teve em estabelecer contacto com o arguido logo após os factos (tal dificuldade só tem como única explicação plausível o arguido não querer ser confrontado com os factos).

5 Todas as circunstâncias acima descritas, conjugadas e apreciadas na sua globalidade de acordo com a experiência comum, confluem, inexoravelmente (nem existe qualquer outra versão possível dos factos) no sentido de o arguido ser o autor dos factos (incêndio): móbil, oportunidade, consequências do próprio crime – queimaduras sofridas pelo recorrente, causadas pela explosão da gasolina e efeito chaminé de saída pelo vidro do automóvel partido.

6. Os crimes praticados pelo arguido – agente da PSP, retenha-se – de noite, no reduto de uma casa de habitação, com substância explosiva como a gasolina – causam forte alarme social e sentimento de insegurança da comunidade.

7.As penas parcelares aplicadas situam-se abaixo meio-termo das respectivas molduras abstractas, salvo a relativa ao crime de incêndio, moderadamente acima do meio da moldura, perfeitamente proporcionada (dentro da moldura abstracta) às exigências de protecção dos bens jurídicos violados e a todas as circunstâncias provadas, relativas ao grau de ilicitude e de culpa, à personalidade neles revelada, ao modo de execução, à gravidade das consequência, à falta de postura crítica do recorrente perante os facto.

8. A pena única aplicada em cúmulo - 5 anos e 6 meses de prisão – surge, dentro dos limites abstractos mínimo de 5 anos e máximo de 6 anos e 7 meses de prisão - mostra-se proporcionada e adequada na valoração conjunta da actuação do recorrente e da personalidade revelada na globalidade da matéria apurada.

Decisão Texto Integral: I.
Realizada a audiência com exercício amplo do contraditório, foi proferido acórdão no qual o Tribunal Colectivo decidiu:
1. Julgar procedente a acção penal e condenar o arguido, R.
- pela prática de um crime de perturbação da vida privada, p. e p. pelo artigo 190° nº 2 do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;
- pela prática de um crime de ameaça, agravada, p. e p. pelo artigo 153° e 155° n.º 1 al. a), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão;
- pela prática de um crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. pelo artigo 191° do Código Penal, na pena de 1 (um) mês de prisão;
- pela prática de um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272° n.º 1 al. a) do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
2. Efectuar o cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, condenando o arguido R. na pena única de cinco anos e seis meses de prisão.
3. Julgar procedente o pedido de indemnização civil com base em responsabilidade civil conexa com a criminal, formulado nos autos por C e M e, em consequência, condenar o arguido/demandado a pagar a cada um dos demandantes, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), acrescida de juros à taxa legal desde a data da presente decisão até integral pagamento e a quantia global de € 2.702,62 (dois mil setecentos e dois euros e sessenta e dois cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento.
*
Recorre o arguido do referido acórdão, formulando, na motivação, as seguintes CONCLUSÕES:
A - Sucede que o sentimento de justiça do arguido não lhe permite aceitar urna decisão que considera injusta, baseada no testemunho de duas pessoas que como se demonstrou faltaram deliberadamente á verdade, como aliás V. Exas. facilmente constatarão através da audição dos respectivos depoimentos, sendo certo que os seus depoimento determinaria que os pontos dados como provados fossem dados como não provados uma vez que são o único elemento que liga o arguido aos factos de que estava acusado.
B - Acresce que foi produzida prova em audiência de julgamento que correctamente considerada deveria ter determinado a absolvição do arguido.
C - A não se considerar a prova positiva no sentido de que o arguido é inocente e devia ser absolvido sempre se deveria considerar que nenhuma prova se produziu no sentido de que tivesse sido o arguido a praticar os factos de que vinha acusado
D - na sua condenação foram consideradas provas que são nulas, designada mente a perícia realizada pelo IML, que foi realizada antes da constituição do recorrente como arguido e sem ser precedido das formalidades legais designadamente de despacho de magistrado judicial, sendo certo que nenhuma razão existia para que tal exame se realizasse nos termos em que se realizou, considerando o disposto no artigo 172º, 154º e l26º todos do C.P.P, uma vez que não existe autorização expressa do arguido para a realização do exame no IML, nem tão pouco tal exame foi ordenado por magistrado judicial, nem se impunha urgência no mesmo que não permitisse uma das duas prorrogativas apontadas.
E - A prova registada contem lacunas de ordem tal que deveriam determinar a repetição da audiência de julgamento
F - finalmente o julgamento decorreu de forma que pôs em causa a legalidade do mesmo e as garantias de defesa do arguido, uma vez que todas as testemunhas incluindo o assistente e primeiro depoente compareceram e foram ouvidos em audiência fardados e armados.
G - a considerar-se que o julgamento ocorreu sem anomalias e que a prova foi correctamente apreciada quanto aos facto dados como provados e não provados sempre se clamará pelo excesso na aplicação da pena em concreto pelo cúmulo de crimes de que o arguido vinha acusado, atentas as consequências concretas dos factos descritos, o facto de ser primário, ter família constituída com uma filha menor que dele depende, os danos na sua globalidade terem já sido ressarcidos, alem de não existir o mínimo de prova de qualquer premeditação ou necessidade de especiais cautelas quanto á conduta futura do arguido no caso de alguma conduta passada recriminável lhe poder ser imputável
TODO O EXPOSTO DEVERÁ SER ANALISADO Á LUZ DE UMA EXPRL’SSAO QUE O PROPRIO COLECTIVO UTILIZA:
“ninguém o viu [ao arguido] no local, é certo, mas todas as circunstâncias referidas, apreciadas na sua globalidade de acordo com a experiência comum das coisas, é lá que o colocam” - EM VIOLAÇÃO CLARA DO princípio do in dubio pro reo, CONSTITUCIONALMENTE CONSAGRADO,
Se assim se não entender

1) Na determinação da medida concreta da pena, sendo certo que haverá que considerar os parâmetros definidos no artigo 71º do Código Penal, tendo especial relevância a culpa do agente, a ilicitude dos factos e as exigências de prevenção especial e geral de futuros crimes, também é certo que haverá que considerar a vertente ressocializadora e de reinserção social do agente, para que com a aplicação da pena e situação social do agente não sofra mais que o estritamente necessário.
2) Dentro da medida de prevenção (protecção óptima e protecção mínima - limite superior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face á ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
3) Certo é que da sentença proferida nada se conclui quanto ao grau de culpa do agente.
4) Apenas é referido que “As exigências de prevenção geral e especial desaconselham fortemente a opção por pena não privativa da liberdade.” Porquê? O que se pretende alcançar com esta afirmação e que exigências concretamente se está a referir o tribunal?
5) Não devem ser tomadas em consideração, na medida da pena, as circunstâncias que façam já parte do tipo de crime: nisto se traduz o essencial do princípio da proibição de dupla valoração.
6) O tribunal a quo violou este princípio da dupla valoração, porquanto na determinação da medida da pena e ao fazer o cúmulo jurídico considerou circunstâncias que na fixação da própria moldura penal de cada um dos crimes pelo legislador.
7) Violou também a decisão os princípios de justiça e proporcionalidade uma vez que, ao arrepio da tendência apontada pelo Código Penal aplicável ao caso em apreço, cria sobre o pai de uma jovem de 15 anos que tem a seu cargo, o estigma de “ir preso” pela prática dos crimes em questão.
8) O princípio da proporcionalidade aplica-se a todos os crimes alegadamente praticados, sendo certo que em todos eles foi violado, pois desconsiderou-se em absoluto a personalidade e condições sócio económicas do arguido, bem como o facto de a pena aplicada comprometer para sempre o seu futuro pois terá que mudar de profissão.
*
Respondeu o digno magistrado do MºPº junto do tribunal recorrido, rebatendo a fundamentação do recurso e concluindo pela sua total improcedência.
No visto a que se reporta o art. 416º do CPP o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual manifesta a sua concordância com a resposta apresentada em primeira instância, desenvolvendo a respectiva argumentação.
Foi cumprido o disposto no art. 417º, n.º2 do CPP.
Corridos os vistos e realizado o julgamento, mantendo-se a validade e regularidade afirmadas no processo, cumpre conhecer e decidir.

II.

1. Tendo em vista as conclusões, que definem o objecto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, são colocadas à apreciação deste Tribunal, em breve síntese, as seguintes questões – por ordem de precedência lógica:
- Existência de deficiências na gravação dos depoimentos prestados em audiência e suas consequências;
- Nulidade do exame médico realizado pelo IML, na pessoa do arguido;
- Impugnação da decisão da matéria de facto, com o fundamento, em síntese, de que numa apreciação criteriosa da prova produzida, tendo em vista o princípio in dubio pro reo deveria ter conduzido à absolvição do recorrente;
- Violação, na determinação da pena aplicada, do princípio da dupla valoração (proibição da) e dos princípios da justiça e da proporcionalidade.
Para proceder à sua apreciação, vejamos a decisão da matéria de facto, com a motivação que a suporta.
2.
A decisão do tribunal recorrido em matéria de facto é a seguinte:

A) Factos provados:

1 - O arguido RZ é Agente da PSP e exerce funções, na ..a Esquadra da PSP de Coimbra, local onde igualmente exerce funções, também como Agente da PSP, o ofendido C

2 - Na sequência de desconfiança do arguido de que o ofendido C mantinha relacionamento extraconjugal com a sua esposa, o arguido RZ no mês … de 2008, efectuou várias chamadas telefónicas do seu telemóvel com o n. ° …. para o número de telemóvel Nº…. pertencente ao ofendido C-

3 - Assim, em data e hora não concretamente apurada, no período da noite, o ofendido C recebeu no seu telemóvel, perante MA, uma chamada telefónica de número não identificado, tendo pelo ofendido sido reconhecida a voz do arguido RZ o qual lhe disse "temos de ter uma conversa. Dou-te um tiro".

4 - Após esse telefonema, também em dias e horas não concretamente determinadas, o ofendido C recebeu vários telefonemas anónimos, numa dessas chamadas foi audível, a seguinte expressão "Tas fodido".

5 - Entre os dias 14 e 18 de … de 2008, o arguido telefonou para o telemóvel do ofendido C, no dia 14-12-2008, pelas 20h39m41s, no dia 16-12-­2008 pelas 12h39m50s, no dia 16-12-2008, pelas 16h01m56s e no dia 18-12-2008, pelas 11h16m56s, sendo que em alguns desses contactos telefónicos não chegou a haver qualquer conversação.

6 - Na sequência das desconfianças e desavenças que o mesmo tinha para com o ofendido C, o arguido delineou um projecto de atear fogo à viatura conduzida pelo ofendido e, eventualmente, à residência daquele sita na P….

Pelo que, em concretização do delineado,

7 - No dia 4 de …de 2009, entre as 4horas e 30minutos e as 4horas 45minutos, o arguido RZ dirigiu-se à residência dos ofendidos C. e esposa MA, sita na… n. ° 17, no lugar de… área deste concelho e comarca de Mealhada.

8 - Aí chegado, o arguido saltou o muro que veda a área circundante da casa de habitação, colocou um pé na parte térrea do pátio, e já no seu interior, deslocou-se para as traseiras da habitação, na qual se encontrava estacionado o veiculo automóvel de marca …, modelo …, com a matricula …..-HZ, registado em nome da ofendida MA Rodrigues e conduzido, habitualmente, pelo ofendido C

9 - Após, aproximou-se da referida viatura, e fazendo uso de um martelo/maço partiu os vidros da viatura do lado oposto ao lugar do condutor, e, munido de um garrafão de plástico de 5 litros próprio para água, introduziu e projectou gasolina para o seu interior e ateou-lhe fogo, o que levou a que instantaneamente deflagrasse uma combustão seguida de explosão e incêndio, funcionando a abertura do vidro partido como chaminé de saída para o exterior da viatura, de chama e fumos atingindo o arguido na sua mão direita e na sua face.

10 - A viatura ….HZ, que à data dos factos tinha o valor comercial de €2.500,00 ardeu praticamente na sua totalidade.

11 - O incêndio da viatura foi de imediato detectado pelos ofendidos, que se encontravam a dormir no interior da residência juntamente com a filha de ambos, menor de idade.

12 - Os ofendidos chamaram de imediato, ao local, os Bombeiros Voluntários de P.., que prontamente intervieram, motivo pelo qual o referido incêndio não se estendeu à habitação dos ofendidos contígua à viatura …­HZ.

13 - A explosão, as chamas e o calor intenso provocados pelo incêndio da viatura …-HZ, fizeram com que os vidros das duas janelas da habitação, que se situavam próximas do local onde se encontrava estacionada a viatura, estalassem e se partissem.

14 - As chamas e o calor intenso provocados pelo incêndio destruíram ainda, para além do mais, uma caixa de electricidade existente no local, a pintura da parede da habitação, um regador, uma cadeira de criança, um candeeiro de parede, sofrendo os ofendidos um prejuízo de € 2.030,00.

15 - O arguido RZ é colega de trabalho do ofendido C, encontrava-se desavindo com este, e sabia que no dia 04-01-2009 pelas 4h30m /4h45m, os ofendidos C e MA e a filha de ambos, menor de idade, se encontravam no interior da residência a dormir.

16 - Sabia o arguido que ao proferir as expressões descritas nos pontos 3 e 4, as mesmas, eram adequadas e idóneas a provocar no ofendido, medo e inquietação limitando a liberdade e determinação do mesmo o que quis e efectivamente logrou conseguir.

17 - O arguido encontrando-se desavindo com o ofendido C sabia que ao efectuar as chamadas telefónicas, supra identificadas no ponto 5, para o telemóvel do ofendido perturbava a sua vida privada, paz e sossego, o que quis e logrou conseguir.

18 - O arguido sabia que o fogo que ateara, à viatura automóvel ----HZ, utilizando para o efeito gasolina era susceptível de o destruir, como destruiu, de se alastrar facilmente, propagando-se à casa de habitação do ofendido, podendo desta forma causar prejuízos elevados ou criar o perigo de tal ocorrer, pondo desta forma em perigo bens patrimoniais alheios de valor elevado, o que quis e aconteceu, e bem assim, pondo em perigo a vida ou integridade física dos ofendidos ali residentes e daqueles que participaram no combate directo daquele incêndio, conformando-se com estes factos, sabendo e visando sempre criar incêndio de relevo.

19 - Mais sabia que entrava no pátio da mesma habitação sem autorização ou consentimento dos seus legítimos proprietários, o que quis e logrou conseguir.

20 - Em todas as condutas supra descritas o arguido, agiu sempre de modo livre, voluntário e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

MAIS SE PROVOU (também constam da acusação tendo sido alterada a ordem pela qual tais factos se encontravam naquele despacho por uma questão lógica):

21 - No local e dia dos factos, foi detectado um vestígio de urna pisada (pegada) humana na parte térrea do pátio da casa e foi encontrado um saco de plástico semi-derretido, contendo a publicidade estabelecimento comercial "Loja …autocolante, nele colado, utilizado pela loja P…no interior do saco um martelo/maço com o um peso de 1 kg.

22 - Nesse mesmo local e dia, foi ainda encontrado um garrafão de plástico de 5 litros, próprio para água, contendo no seu interior urna substância que se apurou ser gasolina.

22 - Na noite do dia 03 para o dia 04 do mês de … de 2009, o arguido prestou serviço gratificado, junto do Banco …em Coimbra com o horário das 00h00m e as 4h00m.

23 - O arguido foi rendido/substituído pelo Agente da PSP RL pelas 3h45m, pelo que se ausentou daquele local antes das 4h00m do dia 04-01-2009.

24 - O arguido ausentou-se do serviço gratificado junto do Banco … sendo ainda portador do seu habitual de bigode e sem qualquer lesão/queimadura em qualquer das mãos.

25 - O arguido RZ após ter saído do serviço gratificado no Banco … não se apresentou na ..ª Esquadra da PSP de Coimbra, a fim de ser dado com findo o referido serviço, tendo para o efeito telefonado para aquela Esquadra, solicitando que o Serviço gratificado fosse dado como findo.

25 - O arguido não se apresentou ao serviço pelas 8h00m do dia 04-01-2009, na ..Esquadra da PSP de Coimbra conforme a respectiva escala, tendo nesse mesmo dia, pela 07h15m, telefonado para a Esquadra a comunicar que ia entrar de baixa médica.

26 - No dia 05-01-2009, pelas 9h00m, o arguido dirigiu-se ao Médico assistente da PSP, Dr. M.e solicitou que lhe fosse passado o documento de baixa médica, a iniciar no dia apresentando-se ao médico assistente com uma queimadura na mão direita.

27 - No dia 08-01-2009, o arguido compareceu na ..Esquadra da PSP de Coimbra, calçando luvas e sem o habitual bigode, e, após retirar as luvas, o mesmo apresentava um edema dérmico compatível com queimaduras, na face externa da mão direita.

28 - Sujeito a exame médico-legal, no GML de Aveiro do INML, no dia 08-01-2009, conforme Relatório fls. 43 a 45 e fotografia de fls. 36, o integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, o arguido RZ presentava as seguintes lesões: “Face: duas zonas avermelhadas localizadas uma na região submentoniana, a maior, com 5cmx1cm e outra mais arroxeada, elíptica disposta verticalmente sobre o mento, com 1cmx0,5cm; Membro superior direito: lesão de queimadura do 1° e 2° grau (vermelha-eritematosa) ocupando todo o dorso da mão (onde media 15cm de eixo maior por 8cm de eixo menor) e estendendo-se até à falange proximal de todos os dedos, de limites regulares, os quais eram em linha recta na transição do punho para o dorso da mão, poupando as faces laterais e mediais dos dedos, a bordo medial da mão e toda a região palmar; na extremidade proximal daquela área de queimadura no dorso da mão, existia uma solução de continuidade da epiderma, com fundo húmido, medindo 5,5cmx2cm; algumas crostas no seio da queimadura, na extremidade lateral e no dorso do 2° metacarpo."

29 - O saco plástico encontrado no local dos foi comercializado pelo estabelecimento comercial "Loja …ituado nas proximidades da residência do arguido e o autocolante nele colado foi comercializado por uma loja situada junto à ..Esquadra da PSP de Coimbra.

DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL

30 - A 2.ª demandante é casada com o 1º demandante e exerce a profissão de professora.

31 - No interior da referida viatura, encontrava-se uma cadeira de criança.

32 - Os demandantes tiveram que despender com a intervenção dos Bombeiros Voluntários de P..por eles chamados para combaterem o incêndio ateado pelo arguido/demandado, a quantia de € 20,00 (vinte euros), cujo comprovativo se encontra junto aos autos a fls. 336.

34 - Com os danos provocados na residência dos demandantes em resultado do incêndio ateado pelo arguido/ demandado, sofreram aqueles um prejuízo de € 2.030,00 (Dois mil e trinta euros). Porém, aquele valor foi reembolsado integralmente aos demandantes pela Companhia de Seguros ..em virtude de regularização do sinistro coberto por seguro de incêndio de que eram titulares.

35 - Acresce que, ambos os demandantes, em consequência directa dos factos descritos, foram acometidos de perturbação emocional e psíquica, pelo que tiveram que recorrer a acompanhamento médico especializado, que ainda perdura.

36 - Para tanto, em consultas médicas e despesas medicamentosas, despenderam até agora (data da dedução do pedido de indemnização civil) , a quantia de € 147,62 (Cento e quarenta e sete euros e sessenta e dois cêntimos).

37 - Todos os contactos telefónicos efectuados pelo arguido/demandado para o telemóvel do 1. ° demandante, visaram pelas expressões e ameaças nelas veiculadas, provocar no demandante, medo e inquietação e consequente limitação da sua liberdade e determinação, o que foi conseguido.

38 - Os demandantes sofreram perturbação acrescida pela circunstância de terem uma filha menor.

39 - À data dos factos, a 2.ª demandante encontrava-se grávida.

40 - Factos e circunstâncias que eram do conhecimento do arguido/demandado.

41 - Durante todo O mês de Dezembro de 2008, os demandantes andaram inquietos e assustados com a eventualidade de o arguido/demandado concretizar as suas ameaças.

42 - A 2.a demandante temendo pela integridade do seu marido, viveu momentos de angústia que só eram atenuados quando ele regressava a casa.

43 - Ainda assim, sempre retomados com os telefonemas que o arguido/demandado efectuava, durante a noite, para o telemóvel do marido.

44 - A perturbação emocional e psíquica que já então ameaçava os demandantes, acentuou-se e instalou-se após os factos ocorridos na madrugada de 4 de Janeiro de 2009.

45 - No que respeita ao 1.° demandante, após aqueles factos, este passou a ser objecto de acompanhamento médico na Consulta de Psicologia Clínica do Hospital Militar Regional 2.

46 - Sendo que aí permanece em tratamento de sintomatologia de "Depressão e Obsessão/Compulsão, (...) comummente associada a Stress Agudo, com reexperienciação persistente do trauma, através de recordações recorrentes e intrusivas, mal estar psicológico intenso quando exposto a acontecimentos e sonhos e pesadelos recorrentes acerca do acontecimento",

47 - Apresentando "sintomas de embotamento e de evitamento, nomeadamente, esforço para evitar pensamentos ou sentimentos e interesse em actividades acentuadamente diminuído".

48 - E, "ainda, sintomas persistentes de activação aumentada, nomeadamente, dificuldade em adormecer ou em manter-se a dormir, irritabilidade, dificuldade em concentrar-se, hipervigilância, resposta de alerta exagerado e reactividade fisiológica, além de sintomas de tristeza e depressão e cansaço".

49 - "Este Evento traumático, teve um impacto negativo, essencialmente no funcionamento social do demandante, contaminando também o funcionamento laboral, devido ao vínculo existente entre ele e o suspeito. Também a nível familiar o impacto é significativo, essencialmente devido a ter uma filha de seis anos e a esposa à altura do evento se encontrar grávida".

50 - Já quanto à 2.a demandante, igualmente submetida a tratamento médico psicológico, desde 29.01.2009, revelava então "um estado de angústia subjectiva e perturbação emocional com interferência no seu funcionamento psíquico e consequentemente, ao nível do desempenho individuar”.

51 - Estes factores constituíram "reacção a uma experiência traumática que envolveu ameaça à segurança e integridade física da paciente e familiares (marido e filha; de salientar que a Helena [a demandante] também se encontrava, à data, em estado inicial de gravidez), ocorrida na madrugada de 4 de Janeiro de 2009".

52 - A demandante apresentava "sintomas persistentes de ansiedade; preocupação; lembranças perturbadoras recorrentes do acontecimento traumático; intenso mal-estar psicológico face à exposição a estímulos associados/decorrentes do acontecimento; comportamentos diários de evitamento dos estímulos que desencadeavam lembranças do acontecimento; reactividade fisiológica (respostas de alarme súbitas e exageradas); aumento de activação que não estava presente antes do trauma (insónias e hipervigilância); humor mais deprimido; sentimento de incapacidade de adaptação à situação vivenciada e à continuação do normal funcionamento no âmbito do desempenho de algumas tarefas diárias que exigissem maiores níveis de atenção/concentração. Revelava ainda elevada preocupação relativamente às consequências do seu estado emocional ao nível da gravidez e no modo como o acontecimento ocorrido e todos os factores a ele subjacentes poderiam afectar psicologicamente a filha bem como o seu ritmo de rotinas diárias". E,

53 - Já em recente avaliação do seu estado, a 2.ª demandante revela "presença aumentada de mal-estar psicológico e elevados níveis de tensão desencadeados por factores situacionais (stress situacional) promotores de possível desorganização emocional. Esta sobrecarga interfere ao nível do pensamento potenciando uma actividade ideativa periférica que afecta processos cognitivos deliberados e, consequentemente, afecta as actividades que requerem o uso da atenção e concentração conduzindo a um défice significativo das mesmas e à sensação de uma perda iminente de controlo; - pensamento caracterizado por pessimismo sendo as relações com o meio circundante vistas com uma sensação de desconfiança e desânimo; desta forma, manifesta algum evitamento de contacto com as outras pessoas sentindo maior incómodo nas relações interpessoais, o que potencia um menor envolvimento na interacção social; - atitude mais negativa para com o que a rodeia que, embora possa não se manifestar no comportamento, tem influência ao nível das tomadas de decisão (fortemente influenciadas pela emoção) e na forma como lida com as situações e acontecimentos diários; - auto-imagem marcada por características negativas e existência de uma imagem pessoal mais desvalorizada; - experiências intensas de depressão e perturbação afectiva; alguma deterioração psicológica causada por estado crónico decorrente das actuais exigências do ambiente (pressões situacionais significativas)."

54 - As perturbações psíquicas atrás descritas dos demandantes permanecem ainda hoje.

55 - Todos os danos atrás descritos sobrevieram, quer para o 1.º demandante, quer para a 2.ª demandante, em directa e imediata consequência da actuação do arguido/demandado.


Da contestação
56 - O arguido é colega de trabalho do ofendido e foi amigo do mesmo largos anos.
57 - Em conjunto com outros elementos da polícia conviverem e reunirem-se em jantares e noutras actividades lúdicas.
58 - Os telefonemas por si geraram grande perturbação.
59 - O estabelecimento em causa existe em vários locais do país.
60 - No dia 04-01-2009 data em que a sua irmã faz anos o arguido conviveu com a sua família e amigos desta.

Da discussão da causa
61 – O arguido é agente da PSP desde 1986 e aufere mensalmente € 1300,00.
62 – É casado e reside em casa própria com a esposa a qual não exerce actualmente actividade remunerada.
63 – Têm uma filha de 15 anos estudante a seu cargo.
64 – Paga € 550,00 mensais para amortização de empréstimo bancário contraído para aquisição da habitação.
65 – Tem 12 anos de escolaridade como habilitações literárias.
66 – Nada consta do certificado de registo criminal do arguido.


B) FACTOS NÃO PROVADOS:
- Nas circunstâncias a que se reporta o ponto 3 o telemóvel tenha sido colocado em "alta voz";
- Nas circunstâncias a que se reporta o ponto 4 o telefone se encontrasse em "alta voz".
Não se provou o mais alegado em 23º, o alegado em 26º, o mais alegado em 34º, o mais alegado em 35º, o alegado em 38º e 39º do PIC, o mais alegado em 2º da contestação, o alegado em 3º, 4º, 5º, 6º, o mais alegado em 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 13º, o mais alegado em 14º e o alegado em 15º da contestação.
Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa, não se referindo aqui a demais matéria contida no pedido de indemnização civil por ser conclusiva e de direito.


C) MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO:
O incêndio ocorreu nas circunstâncias descritas e quanto a isso não há dúvidas. As testemunhas C e MA encontravam-se a dormir na sua habitação e fizeram a propósito um relato dos factos sem quaisquer contradições referindo que foram acordados por “estalos”, ambos se deslocaram para o rés-do-chão da sua habitação e logo se depararam com um “clarão” ao fundo das escadas, percebendo que a viatura estava a arder. Declararam também que chamaram os Bombeiros Voluntários cuja pronta intervenção (em 2-3 minutos) já que a residência se situa próximo do aquartelamento daqueles evitou maiores prejuízos do que aqueles que relataram – designadamente a propagação do fogo à habitação.
No local esteve CX inspectora da PJ que procedeu à inspecção do local e do veículo no próprio dia do incêndio, declarou que a viatura se encontrava estacionada nas traseiras da habitação e que se encontravam vidros no chão o que indicava ter sido partido vidro antes do incêndio por não haver fixação de fuligem. Recolheu fotografias (estão no processo de fls. 16 a fls. 24) e nelas pode ver-se a casa de habitação dos ofendidos, o vestígio de pisada humana na parte térrea do pátio da casa, o local onde se encontrava a viatura, constatando-se o estado em que ficou e a proximidade a que estava estacionada da habitação, bem como o pormenor de vidros partidos que se encontravam no solo, garrafão contendo combustível e saco contendo martelo, bem como pormenores destes objectos. Do que observou no local a testemunha C. Coelho concluiu que o autor do fogo transpôs o muro, dirigindo-se pela parte lateral da casa ao veículo.
Esteve também no local a testemunha F, militar da GNR, autor da participação de fls. 9, cujo teor reproduziu em audiência. De salientar deste seu depoimento que o ofendido logo lhe referiu que suspeitava de um colega de trabalho colocando depois a hipótese de um indivíduo que tinha detido e que depois viu a trabalhar na sua habitação a colocar uma grade em janela.
Em audiência o referido C reiterou as suas suspeitas relativamente ao arguido e referiu que àquele elemento da GNR terá ainda avançado a hipótese de ter sido alguma situação relacionada com detenção.
Ao tribunal ficou a firme convicção de que as suspeitas do ofendido eram mais do que fundadas.
Com efeito, estava o arguido convencido de que o ofendido mantinha um relacionamento amoroso com a sua esposa, confrontou o ofendido com esse facto e dirigiu-lhe ameaças o que foi amplamente documentado pelas declarações da testemunha C e da esposa MA sendo que o ofendido deu conta desses factos aos seus superiores hierárquicos em momento anterior ao fogo que contribuiu para reforçar a credibilidade dos referidos depoimentos (assim o declarou a testemunha A., comandante da ..ª esquadra da PSP de Coimbra, onde o ofendido presta serviço).
O arguido andava perturbado em virtude desse seu convencimento de que o ofendido mantinha um relacionamento amoroso com a sua esposa o que nos é revelado quer pelos telefonemas que dirigiu ao ofendido quer pela conversa que manteve com o mesmo antes dos factos.
O incêndio ocorreu cerca das 4H30-4H45 e nesse dia o arguido esteve a fazer um serviço de gratificado entre as 23H50 e as 3H45 junto ao Banco … em Coimbra (nesse sentido o depoimento da testemunha MG agente da PSP que fez o mesmo serviço em conjunto com o arguido por isso sabe dos factos). Esse serviço, como declarou a testemunha MG, deveria prolongar-se até às 4H00 mas o arguido foi rendido mais cedo e deveria entrar de novo ao serviço às 8H00 da manhã do mesmo dia, não tendo sido registado nada de anormal pela referida testemunha no comportamento do arguido. Não tendo nada de pessoal contra o arguido, afirmando-se como colega e amigo quer do ofendido quer do arguido, o seu depoimento foi ainda relevante na parte em que referiu que o arguido se apresentava com bigode, sendo esta uma sua característica habitual, não apresentando quaisquer queimaduras nem nas mãos nem na cara.
A testemunha A declarou que o arguido teria tempo para chegar à residência do ofendido na P…, considerando a hora a que foi efectivamente rendido e o início do fogo. Esse trajecto foi igualmente percorrido pelos inspectores da PJ que verificaram que o arguido teve tempo de percorrer o trajecto até à casa do ofendido (nesse sentido o depoimento da testemunha CS).
O arguido não se apresentou na esquadra depois do serviço de gratificado e telefonou cerca das 7H10 justificando a sua não apresentação, referindo que o serviço tinha corrido bem e que não ia trabalhar (nesse sentido o depoimento da testemunha V que estava de serviço na .. esquadra e recebeu esse telefonema do arguido). A informação de fls. 231 regista o telefonema para a ..ª esquadra pelas 7h19m55s (é o número do comando da PSP como referiu a testemunha ACA, inspector da PJ que procedeu à investigação e que procedeu a essa anotação a lápis na referida informação).
Na manhã do dia 5/1/2009 o arguido foi consultado pelo médico M (o arguido dispensou-o do dever de sigilo, como exarado na acta de audiência de julgamento), apresentava marcada ansiedade e muito nervosismo. Sob um ponto de vista psíquico não estava em condições de exercer a sua profissão pelo que ficou na situação de incapacidade por seis dias (neste sentido o depoimento da testemunha M e os documentos de fls. 192 a 197). Só no final da consulta se apercebeu, porque o arguido lho referiu, que o mesmo apresentava queimadura na mão. Este referiu-lhe que a queimadura tinha sido produzida no domicílio.

A testemunha ACA e a testemunha CS também inspector da PJ, descreveram factos que permitem concluir que o arguido evitou o contacto dessa polícia. Efectivamente, como declararam, foi procurado em sua casa e em casa de familiares, não tendo sido localizado, apesar de terem conhecimento de que estava em casa, não abria a porta. Foi solicitada a colaboração do comando da PSP vindo o arguido a comparecer na esquadra calçando luvas e sem o habitual bigode, e, após retirar as luvas, apresentava, como provado, um edema dérmico compatível com queimaduras, na face externa da mão direita mas ainda sinais de queimadura na face e nas sobrancelhas (nesse sentido também o depoimento da testemunha AP.

Sujeito a exame médico-legal, no GML de Aveiro do INML, no dia 08-01-2009, conforme relatório fls. 43 a 45, apresentava lesões sendo visível a queimadura na mão direita na foto de fls. 36.
O arguido, pelas 3h45 de 04.01.2009, ao sair do serviço de gratificado, não apresentava quaisquer lesões visíveis, nomeadamente na mão direita, e usava o habitual bigode.
Pelas 07h10/07h15 dessa manhã já não estava em condições de comparecer ao serviço, tanto mais que informou o graduado de serviço que ia entrar de baixa médica.
Apresentou-se no dia 08.01.2009 sem bigode, procurou ocultar as lesões de queimadura com luvas e apresentava ainda vestígios de queimadura na face.
As lesões na face e na mão provêm da projecção de fogo compatível com os factos, porquanto conforme foto de fls. 36, a mão quando sofreu a lesão apresentava-se fechada (as zonas da unha e falange seguinte não foram afectadas) e o fogo veio de zona exterior com a face da mão voltada nessa direcção; o maço/martelo foi utilizado para partir vidros do carro e a projecção de gasolina para o seu interior terá criado um ambiente volátil (como em regra acontece com a gasolina em ambiente aberto), de tal forma que, com a ignição, se deu uma explosão, funcionando a zona do vidro partido como chaminé de saída da chama; este último efeito chaminé, inesperado, provocou assim as lesões no suspeito, atingindo quer a sua mão, onde estaria o meio de ignição, quer a sua face.
Em síntese, o arguido estava desavindo com o ofendido, ameaçou-o, teve tempo de chegar ao local, não se apresentou ao serviço na manhã desse dia apesar de ter estado todo o dia a comemorar o aniversário da irmã, tentou ocultar a existência da queimadura, sendo que a sua alegada incapacidade perante o médico que o assistiu só encontra justificação no facto de se ter lesionado gravemente e apresentar essas lesões de forma visível ao que acresce a dificuldade que a PJ teve em estabelecer contacto com o arguido logo após os factos o que também só tem como única explicação plausível o arguido não querer ser confrontado com os factos.
Ninguém o viu no local, é certo, mas todas as circunstâncias supra referidas, apreciadas na sua globalidade de acordo com a experiência comum das coisas, é lá que o colocam.
O relato das testemunhas da defesa (diga-se de passagem que não deixa de se estranhar um churrasco ao ar livre em pleno Inverno), designadamente F. CC .S. JB, MLL foi unânime na parte em que descreveram que o arguido se terá queimado na mão ao acender fogareiro no dia a 4/1/2009 pela hora de almoço. Tais depoimentos no que respeita às lesões que o arguido veio a revelar não são inteiramente credíveis porque contraditórios entre si (refere a testemunha F que nem sequer notou qualquer sinal de queimadura; a testemunha CC que a ter havido algum resultado terá sido algo “muito discreto”; a testemunha S. que estava um pouco avermelhado; a testemunha JB que nesse dia não se apercebeu de qualquer sinal de queimadura; e a testemunha MLL que no dia em que comemoraram o seu aniversário o arguido “não aparentava praticamente nada”). Não deixando de se estranhar também a circunstância de tanta gente (todos os que se encontravam na comemoração) se encontrar próximo de um fogareiro, admite-se, por não se poder afirmar de forma segura que todos mentiram, que o arguido tenha encenado que se queimou de forma a justificar as lesões que veio a evidenciar.
No que concerne às chamadas telefónicas e às ameaças, tais factos foram, como supra referido, amplamente documentados pelas declarações da testemunha C e da esposa MA sendo que o ofendido deu conta desses factos aos seus superiores hierárquicos em momento anterior ao fogo o que contribuiu para reforçar a credibilidade dos referidos depoimentos. Aliás quatro dessas chamadas telefónicas encontram-se também documentadas na informação de fls. 230/31. E não ficou demonstrado que o telefone do ofendido estivesse em alta voz pois nenhuma das duas referidas testemunhas o mencionou, antes referindo que numa das ocasiões (ponto 3) se encontravam ambos na cama e que na segunda (ponto 4) a expressão surgiu através de um grito e que o ofendido normalmente usa o seu telefone com som elevado o que permitiu à esposa ouvir o que foi dito.
Foram também valorados os documentos de fls. 7 (características e propriedade do veículo), fls. 28/29 (ordem de serviço da PSP quanto aos agentes escalados para serviços remunerados), documento de fls. 60 (vista de alguns locais em Coimbra), fls. 66 (informação), fls. 68 (fotografias).

No que respeita aos factos do pedido de indemnização civil atendeu-se ainda aos documentos de fls. 334 (orçamento referente aos trabalhos a efectuar na moradia), 336 (cópia de recibo comprovativo de pagamentos aos BV da P ), 437 a 446 (prova que efectuaram despesas médicas e medicamentosas), fls. 447/48 (relatório de observação psicológica do demandante), 449 a 452 (relatório individual de acompanhamento psicológico da demandante) e os recibos de despesas médicas e medicamentosas apresentados durante a audiência de julgamento (os quais atestam permanecem até hoje as perturbações psíquicas descritas), tudo em conjugação com os depoimentos das testemunhas AN JO, AMM (colegas de profissão e amigos do demandante) e JMB (conhece o demandante de quem é amigo desde que frequentaram o ensino secundário), sendo que todos descrevem as alterações de comportamento do demandante como ficou provado.
Sobre a factualidade vertida na contestação a testemunha C. não deixou de reconhecer ter sido amigo do arguido encontrando-se actualmente e na sequência dos eventos a que respeita o processo de relações cortadas com o arguido. As testemunhas JD AHH e H fizeram referência a jantares mas nenhumas das testemunhas inquiridas soube concretizar com conhecimento directo qualquer contacto telefónico entre o ofendido e o arguido a propósito de tais jantares. O ofendido deu conta do teor dos telefonemas que recebeu, como supra referido, inclusivamente ao comandante da ..ª esquadra onde presta serviço, como resultou evidenciado das declarações do próprio. Em audiência a testemunha C. não referiu ter criado qualquer inimizade com indivíduo concreto que possa ter detido. Colocar como hipótese que pudesse ter sido algum indivíduo por si detido a praticar os factos (o atear do fogo) é algo bem diferente e até natural para quem exerce uma profissão que envolve risco. As considerações supra tecidas revelam que tal não passava de hipótese infundamentada. O provado encontra-se em contradição com a inexistência de suspeições quanto a qualquer infidelidade da mulher do arguido e quanto ao alegado em 9º e 10º da contestação. A testemunha ACA, inspector da PJ, explicou que a proveniência do saco referido em 11º da contestação só poderia ser o estabelecimento referido. O alegado em 13ºda contestação não foi suportado por qualquer meio de prova e remete-se para o que supra se referiu que não permite suportar o mais alegado em 14º e o alegado em 15º da contestação.
Atendeu-se às declarações do arguido (que apenas nesta parte quis prestar declarações) quanto às suas condições económicas e financeiras e ao certificado de registo criminal junto aos autos quanto aos seus antecedentes criminais.


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3. APRECIAÇÃO

3.1. Deficiências de gravação
Invoca o recorrente a violação do disposto nos artigos 9º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15/12, e 201º, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do art. 4º do Código de Processo Penal.
Ora, no caso, os depoimentos prestados em audiência foram efectivamente gravados, não podendo falar-se em falta de gravação.
Aliás foi fornecida ao recorrente cópia da gravação, para efeito de recurso sem que tenha manifestado qualquer reparo ou dificuldade de audição.
Do mesmo modo foi enviado a este Tribunal da Relação o CD contendo a gravação para efeito da reapreciação da prova.
Não existe, pois, manifestamente, omissão da gravação ou da disponibilização ao recorrente, em tempo oportuno, de cópia das mesmas, para efeito de recurso da matéria de facto.

No que toca à “qualidade” da gravação este Tribunal procedeu à abertura do CD e sua audição em várias passagens de cada depoimento, verificando que esta se apresenta perfeitamente audível em toda a sua extensão, sem embargo dos “normais” incómodos do som do arrastamento dos microfones mas que, manifestamente, não afectam a efectiva audição seja de que depoimento for, em toda a sua extensão.
Aliás o recorrente, obtida a sua cópia da gravação não fez qualquer reparo à qualidade da audição. E limita-se a referir, de forma genérica e conclusiva, a existência de deficiências sem especificar, minimamente qualquer passo concreto da gravação (e estão em causa múltiplos depoimentos, com inquirição, instâncias, esclarecimentos, repetições), ou da cópia do suporte que lhe foi disponibilizada para efeito de recurso, que fosse inaudível ou pudesse afectar a percepção de algum dos depoimentos prestados em audiência.
O recorrente não especifica qualquer passagem concreta dessa mesma gravação, qualquer suposta “fala” ou afirmação de pessoa ouvida em audiência que não seja perceptível. Muito menos que afecte a perceptibilidade de algum dos depoimentos prestados em audiência. Menos ainda – et pour cause - que a gravação pudesse ter passado em branco qualquer afirmação, produzida em audiência, que tenha sido relevante para a fundamentação da decisão e/ou pudesse ser relevante para a reapreciação da prova pelo tribunal de recurso.
Não alega, tão-pouco, que o tribunal recorrido pudesse ter “ouvido mal” qualquer depoimento e – por isso – qualquer defeito de gravação pudesse ter afectado a valoração probatória em que repousa a decisão impugnada, inquinando-a.
Pelo contrário, resulta claro da motivação apresentada e das extensas transcrições efectuadas pelo recorrente, que este tem perfeita noção do conteúdo dos depoimentos prestados – tanto que os reproduz, no que entende relevante, na motivação do recurso.
Ancorando a impugnação apresentada, não na errada percepção do conteúdo dos depoimentos, mas, pelo contrário, na alegação de que “ninguém viu” deitar fogo e na nulidade da prova pericial.
Acresce que, ouvida a gravação – com base na qual o recorrente exerceu plenamente, em qualquer embaraço, identificado ou identificável, o direito ao recurso – apenas se detectam os vulgares ruídos de fundo do arrastamento e pancadas nos microfones, que, embora irritantes, não constituem, minimamente, deficiência que impeça a completa audição e o sentido dos depoimentos prestados.
Apenas se compreendendo a alegação do recorrente num quadro de interpretativo da lei que aponta para a “obrigatoriedade” do recurso de matéria de facto.
Assim, para além de o recorrente não identificar qualquer passagem da gravação que pudesse afectar o entendimento dos depoimentos, certo é que a motivação do recurso demonstra que o recorrente bem os percepcionou, cumprindo a gravação a sua finalidade.
Não existindo, pois, deficiências na gravação que impossibilitem ou dificultem a reapreciação da matéria de facto.
Pelo que improcede a invocada nulidade.


2. Nulidade da prova
Sustenta o recorrente a nulidade da prova decorrente do exame médico realizado no Gabinete Médico-Legal de Aveiro, em 08/07/2009 - cfr. fls. 43.
Alega que o mesmo foi realizado sem o seu expresso consentimento, antes de ter sido constituído arguido e sem que houvesse urgência que o justificasse. Para concluir que dessa forma foi violado o preceituado nos arts. 172º, 154º, 125º e 126º, do Código de Processo Penal.
Vejamos o circunstancialismo em que foi efectuado o exame médico em questão.
Perante a denúncia do crime de incêndio, havendo fortes suspeitas de que tinha sido o arguido seu autor, a Polícia Judiciária (órgão de polícia criminal que detém competência reservada para a investigação, nos termos do art. 7º, nº 3, alínea f), da Lei 49/2008, de 27 de Agosto, Lei de Organização da Investigação Criminal) tentou localizá-lo, sem êxito (na residência e no local de trabalho) convencendo-se, por isso, de que o mesmo se estava a furtar ao contacto com os agentes daquele órgão de polícia criminal – cfr., além do mais, o relato de diligência externa de fls. 32.
Daí que a Polícia Judiciária tenha solicitado ao superior hierárquico do arguido, na Esquadra da PSP onde este prestava serviço (Subcomissário PR), que o convocasse para comparecer na referida Esquadra, seu local de trabalho habitual.
Quando o arguido compareceu na dita Esquadra, apresentava-se “com um braço ao peito” e usando luvas, de lã, nas mãos - que não costumava usar.
Instado a tirar as ditas luvas, o arguido fê-lo, verificando-se que apresentava um ferimento na mão direita com aparência de “queimadura”.
Daí que, perante a aparente relação entre queimadura e incêndio (investigado), foi solicitado ao arguido que se deslocasse ao Gabinete Médico-legal de Aveiro, a fim de ser sujeito a perícia médica – cfr. relato de diligência externa já referido, a fls. 33.
E, na verdade o arguido deslocou-se no referido Gabinete Médico-legal onde o exame em causa foi realizado, sem que resulte dos autos ou seja, sequer, apresentada qualquer sugestão ou princípio de prova de que o arguido se tenha oposto, por qualquer forma, à sua realização.
Muito menos que o arguido tivesse sido compelido ou submetido a qualquer procedimento que de alguma forma pudesse atentar contra a sua vontade, integridade física ou psíquica.
Por outro lado o exame em causa traduz-se no mero exame – observação externa - de partes do corpo habitualmente expostas (mão e cara). Dentro do recato de um gabinete médico, por um médico, dentro das habituais e elementares lege artis da actividade médica.
Não existindo, pois, qualquer intromissão, muito menos desproporcionada, na sua intimidade, integridade física (enquanto intrusão ou manipulação de qualquer espécie) ou sequer da sua vontade.
Trata-se de mero exame externo sem qualquer participação activa do examinado, que se limitou a, passivamente e sem qualquer incómodo, a deixar observar a mão (visível por natureza) ao perito médico.
Trata-se, pois, de meio de prova legal, obtido sem violação de qualquer preceito legal.
Não existindo reserva de decisão judicial prévia para tal exame, que como se viu, não ofendeu a intimidade, a integridade ou a vontade do arguido.
De qualquer forma, para a realização do referido exame nem seria necessária a autorização do arguido.
Com efeito, nos termos do disposto no art. 249º, do Código de Processo Penal, compete aos órgãos de polícia criminal, mesmo antes de receberem ordem da autoridade judiciária competente para procederem a investigações, praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova (nº 1 do preceito). Competindo-lhes nomeadamente (n.º2 do preceito) “Proceder a exames dos vestígios do crime, em especial às diligências previstas no n.º 2 do artigo 171º e no artigo 173º, assegurando a manutenção do estado das coisas e dos lugares” – n.º 2 e alínea b) do art. 249º.
O art. 171º, por sua vez, dispõe que por meio de exames das pessoas, dos lugares e das coisas, inspeccionam-se os vestígios que possa ter deixado o crime e todos os indícios relativos ao modo como e ao lugar onde foi praticado, às pessoas que o cometeram ou sobre as quais foi cometido (nº 1); e que, logo que houver notícia da prática de crime, providencia-se para evitar, quando possível, que os seus vestígios se apaguem ou alterem antes de serem examinados (nº 2).
Por último, nº 1 do art. 172º, determina que se alguém pretender eximir-se ou obstar a qualquer exame devido ou a facultar coisa que deva ser examinada, pode ser compelido por decisão da autoridade judiciária competente.
Assim a intervenção da autoridade judiciária, nesta matéria, apenas se justificaria caso o arguido se opusesse, o que, como se viu, não foi o caso.
Ainda que oposição pudesse ter havido sempre a mesma seria materialmente irrelevante, não afectando o princípio nemo tenetur acusare se ipsum. Porque a perícia é circunscrita à mera observação, por profissional médico credenciado, de partes expostas do corpo do recorrente (mão e face). Sem contributo activo do recorrente, muito menos de qualquer assunção de culpabilidade.
Pelo que não se tratava de exame que carecesse para a sua realização de autorização judicial (art. 154º, nº 2, ex vi art. 172º, nº 2, do Código de Processo Penal).
É ainda de todo descabido invocar aqui o disposto no art. 126º, do Código de Processo Penal pois que é manifesto (nem o arguido o invoca) que não houve qualquer tipo de coação ou tortura, ou qualquer ofensa à integridade física ou moral do arguido.
Sendo, pois, o meio de prova em questão legal e validamente produzido e sujeito ao contraditório pleno, na contestação e na audiência de discussão e julgamento. Nada obstando a que fosse valorado pelo tribunal.

Alega ainda o recorrente que foi posta em causa a legalidade do julgamento e as garantias de defesa do arguido “uma vez que todas as testemunhas incluindo o assistente e primeiro depoente compareceram e foram ouvidos em audiência fardados e armados”.
A este respeito, nada consta da motivação do recurso que fundamente a afirmação de os agentes da PSP depuseram “armados”. Dizendo-o o recorrente sem tentar, sequer, comprovar a afirmação.
Por outro lado o recorrente, além de não caracterizar, juridicamente, o suposto vício, não identifica, tão-pouco, qualquer norma que proíba os agentes da PSP de comparecerem em audiência e deporem vestindo o uniforme - legalmente definido e aprovado.
Acresce que nem o recorrente especifica, nem é vislumbrado por este tribunal, em quê ou porquê o depoimento dos agentes fardados com o uniforme ou fardados “à civil” pudesse por em causa os direitos de defesa do recorrente.
Tanto mais que teve oportunidade de exercer exaustivamente o contraditório e por em causa a substância dos depoimentos.
Carece assim de fundamento o recurso, também neste âmbito.


3. Impugnação da matéria de facto dada como provada
Como é sabido, existem duas formas distintas, assentes em pressupostos diferentes, de impugnar a decisão da matéria de facto: - com fundamento nos “vícios” previstos no art. 410º, n.º2 do CPP; e - com base na reapreciação da prova produzida em audiência, nos termos previstos nos artigos 431º e 412º do CPP.
Os vícios do art. 410º, como resulta claro do corpo do n.º2, hão-se emergir do texto da própria decisão por si ou confrontada com o critério da livre apreciação da prova enunciado no art. 127º do CPP. Sendo – porque detectáveis ao simples exame da decisão em confronto com as regaras da experiência comum – de conhecimento oficioso, como decidido pelo acórdão do STJ para fixação de jurisprudência de 19.10.1995, publicado no DR, I-A Série de 28.12.95.
Já no recurso com base na reapreciação da prova, o legislador impõe ao recorrente determinados ónus de especificação / fundamentação previstos no art. 412º, n.º3 e 4 do CPP:
3. Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) as provas que devem ser renovadas
4. Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado em acta, nos termos do art. 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.
Competindo assim ao recorrente demonstrar os fundamentos do recurso, o mesmo é dizer, não só identificar o erro in operando ou o erro in judicando que aponta à decisão recorrida, mas ainda especificar o conteúdo concreto dos meios de prova capazes de, numa valoração em conformidade com os critérios legais, impor decisão diferente da recorrida.
Com efeito, como remédios jurídicos os recursos não podem ser utilizados com o único objectivo de melhor justiça. O recorrente tem que indicar expressamente os vícios da decisão recorrida. A motivação dos recursos consiste exactamente na indicação daqueles vícios que se traduzem em erros in operando ou in judicando. A pretensa injustiça imputada a um vício de julgamento só releva quando resulta de violação de direito material. Esta natureza dos recursos justifica, por outro lado, que se lhes aplique o princípio dispositivo e que se reconheça às partes um importante papel conformador – cfr. Cunha Rodrigues, Jornadas de Direito Processual Penal, Centro de Estudos Judiciários, p. 387.
O que obriga, no caso dos depoimentos prestados oralmente em audiência, à identificação do conteúdo probatório concreto de tais depoimentos (concretas afirmações produzidas) e as passagens da gravação que cotem as invocadas afirmações, capazes de imporem decisão diversa da recorrida, por erro de “audição” (só este, verdadeiramente, pode a gravação comprovar) ou de apreciação em conformidade com os critérios legais em vigor.
Aliás, não sendo a decisão de facto devidamente fundamentada, padece de nulidade - nos termos do disposto no art. 379º, n.º1, al. a) e no at. 374º n.º2 do CPP. Pelo que a procedência do recurso obriga a que se demonstre a insubsistência dessa mesma fundamentação
Perante uma sentença devidamente fundamentada, para que seja revogada, impõe-se que sejam rebatidos, com base em razões materiais minimamente persuasivas, os seus fundamentos materiais, o mesmo é dizer, ou a legalidade dos meios de prova utilizados, ou conteúdo das declarações ou de outros meios de prova valorados pela sentença, ou a inconsistência, á luz dos princípios legais atinentes, da análise crítica e da apreciação em que repousa a decisão.
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Em termos de critérios de valoração da prova, a prova documental e a prova pericial estão sujeitas a critérios legais de apreciação vinculada - cfr., respectivamente, os artigos 169º e 163º do CPP.
Já os depoimentos prestados oralmente em audiência (únicos meios de prova cuja valoração é questionada, no caso) estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, nos termos previstos pelo artigo 127º do CPP.
Com efeito, postula o referido art. 127º: Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
A livre convicção não pode nem deve significar o impressionista-emocional arbítrio ou a decisão irracional “puramente assente num incondicional subjectivismo alheio à fundamentação e a comunicação” – cfr. Prof. Castanheira Neves, citado por Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 1, 43.
Como ensina o Prof. Figueiredo Dias (Lições de Direito Processual Penal, 135 e ss), que no processo de formação da convicção há que ter em conta os seguintes aspectos:
- a recolha dos dados objectivos sobre a existência ou não dos factos com interesse para a decisão, ocorre com a produção de prova em audiência,
- é sobre estes dados objectivos que recai a livre apreciação do tribunal, como se referiu, motivada e controlável, balizada pelo princípio da busca da verdade material,
- a liberdade da convicção anda próxima da intimidade pois que o conhecimento ou apreensão dos factos e dos conhecimentos não é absoluto, tendo como primeira limitação a capacidade do conhecimento humano, portanto, as regras da experiência humana.
Assim, a convicção assenta na verdade prático-jurídica, mas pessoal, porque para a sua formação concorrem a actividade cognitiva e ainda elementos racionalmente não explicáveis como a própria intuição.
Esta operação intelectual, não é uma mera opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo) com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis) e para ela concorrem as regras impostas pela lei, como sejam as da experiência, da percepção da personalidade do depoente — aqui relevando, de forma especialíssima, os princípios da oralidade e da imediação — e da dúvida inultrapassável que conduz ao princípio “in dubio pro reo” - cfr. Ac. do T. Constitucional de 24/03/2003, DR. II, nº 129, de 02/06/2004, 8544 e ss..
Como refere o Prof. FIGUEIREDO DIAS (Direito Processual Penal, p. 202-203) “a apreciação da prova é na verdade discricionária, tem evidentemente como toda a discricionalidade jurídica os seus limites que não podem ser ultrapassados: a liberdade de apreciação da prova, é, no fundo uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada «verdade material» - de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios de objectivos e, portanto, em geral, susceptível de motivação e de controlo”...”não a pura convicção subjectiva ... se a verdade que se procura é uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão ... a convicção do juiz há-de ser .. em todo o caso uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de se impor aos outros ... em que o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável”.
A gravação dos depoimentos prestados oralmente em audiência permite o controlo, pelo tribunal superior, da conformidade da decisão com as afirmações produzidas em audiência. Mas não substitui a plenitude da comunicação que se estabelece na audiência pública com a discussão cruzada dos meios de prova, a oralidade e imediação, no confronto dialéctico dos depoentes por parte dos vários sujeitos processuais, no exercício vivo do contraditório, na discussão cruzada levada a cabo na plenitude da audiência, pública, de discussão e julgamento.
E só os princípios da oralidade e da imediação permitem avaliar o mais correctamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais. Só eles permitem, por último, uma plena audiência desses mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição perante o material de facto recolhido e comparticipem na declaração do direito do caso” – Cfr. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, p. 233-234.
Daí que os julgadores do tribunal de recurso, a quem está vedada a oralidade e a imediação, perante duas versões dos factos, só podem afastar-se do juízo efectuado pelo julgador da 1ª instância, naquilo que não tiver origem naqueles dois princípios, ou seja quando a convicção não se tiver operado em consonância com as regras da lógica e da experiência comum, reconduzindo-se assim o problema, na maior parte dos casos, ao da fundamentação de que trata o art. 347º, n.º2 do CPP – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. II, p. 126 e 127, que por sua vez cita o Prof. Figueiredo Dias e jurisprudência uniforme desta Relação, designadamente acórdãos 19.06.2002 e de 04.02.2004, nos recursos penais 1770/02 e 3960/03; 18.09.2002, recurso penal 1580/02; Ac. R. C. de 06.03.2002, publicado na CJ, ano 2002, II, 44.
A convicção do tribunal é formada antes de mais com base nos dados objectivos fornecidos pela prova documental, pericial e outras provas constituídas de apreciação vinculada. Conjugando e articulando criticamente esses meios de prova com os depoimentos prestados na plenitude da audiência, apreciados em função do distanciamento de cada depoente do objecto do processo, da sua razão de ciência, das certezas e das lacunas dos depoimentos, das humanas paixões, da ligação de cada depoente ao objecto do litígio e aos sujeitos processuais, na comunicação dialéctica que se estabelece na audiência de discussão e julgamento, sob a fiscalização directa dos sujeitos processuais, sob a vigilância da comunidade, na publicidade da audiência.
Por outro lado a certeza judicial não se confunde com a certeza absoluta, física ou matemática, sendo antes uma certeza prática, empírica, moral, histórica – crf. Climent Durán, La Prueba Penal, ed. Tirant Blanch, Barcelona, p. 615.

Toda a decisão judicial constitui - precisamente - a superação não só da dúvida metódica, como da “dúvida razoável” sobre a matéria da acusação e da presunção de inocência do acusado. Daí a submissão a um rígido controlo formal e material do processo de formação da decisão e do conteúdo da sua motivação, a fim de assegurar os padrões inerentes ao Estado de Direito moderno.

O princípio in dubio pro reo situa-se no âmago da livre apreciação da prova. Constituindo como que “o fio da navalha” onde se move a missão de julgar. Livre convicção e dúvida razoável limitam-se e completam-se reciprocamente, obedecendo aos mesmos critérios de legalidade da produção e da valoração da prova e da sua apreciação em conformidade com o critério do art. 127º do CPP. Sujeito ainda à mesma exigência de legalidade da prova e da sua apreciação motivada e crítica, da objectividade, racionalidade e razoabidade dessa apreciação.

O princípio in dubio pro reo é considerado pela doutrina largamente maioritária um princípio estritamente atinente ao direito probatório, como tal relevante em termos da apreciação da questão de facto e não na superação de qualquer questão suscitada em matéria de direito – cfr. entre outros Cavaleiro Ferreira, Direito Penal Português, 1982, vol. 1, 111, Figueiredo Dias Direito Processual Penal, p. 215, Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal, 1967-1968, p. 58.

Constituindo um princípio geral de direito (processual penal) cuja violação conforma uma autêntica questão-de-direito – Cfr. Medina Seiça, Liber Discipulorum, p. 1420; Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, 1974, p. 217 e segs.), criticando o entendimento contrário do STJ.

Significando que “em caso de dúvida razoável, após a produção de prova, tem de actuar em sentido favorável ao arguido” – formulação de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, ed. de 1974, p. 215, fazendo a síntese da doutrina.
Não é assim toda a dúvida, lançada em abstracto, que legitima o funcionamento deste princípio – estando em causa factos pretéritos existe sempre uma dúvida abstractamente possível sobre a sua verificação e/ou autoria, na certeza de que quem os aprecia não os presenciou. Mas apenas a dúvida argumentada que, em concreto - após a produção e análise crítica de todos os meios de prova relevantes e sua valoração de acordo com os critérios legais – deixa o julgador (objectivo e distanciado do objecto do processo) num estado em que permanece como razoavelmente possível mais do que uma versão do mesmo facto.
Com efeito “A própria dúvida está sujeita a controlo, devendo revelar-se conforme á razão ou racionalmente sindicável, pelo que, não se mostrando racional, tal dúvida não legitima a aplicação do citado princípio razoável” – cfr. Ac. STJ de 04.11.1998, BMJ 481º, p. 265.
A dúvida razoável, que determina a impossibilidade de formação de uma convicção positiva sobre a realidade e/ou a autoria de um facto, distingue-se da dúvida abstracta, meramente possível, ou hipotética. Apenas a dúvida séria e razoável - identificada, resultante da apreciação exaustiva e crítica dos meios de prova relevantes em conformidade com os critérios legais de produção e valoração da prova - impede a valoração dessa dúvida na perspectiva contrária ao interessa do arguido.
A dúvida deve ser argumentada, coerente, razoável – cfr. Jean-Denis Bredin, Le Doute et L’intime Conviction, Revue Française de Théorie, de Philosophie e de Culture Juridique, Vol. 23, (19966), p. 25.
Exigindo o princípio da livre apreciação da prova a formação da convicção sobre a ocorrência dos factos, fundamentada nos meios de prova validamente produzidos e analisados criticamente
A livre apreciação exige a convicção, fundamentada, do julgador, para além da dúvida razoável. E o princípio in dubio pro reo limita a livre convicção quando, após a produção da prova e sua análise á luz das regras da experiência comum, persista uma dúvida razoável.
Situando-se assim o princípio in dubio pro reo no âmago da livre apreciação da prova. Constituindo como que “o fio da navalha” onde se move a missão de julgar. Convicção “para lá da dúvida razoável” e “dúvida razoável” legitimadora do princípio in dubio pro reo limitam-se e completam-se reciprocamente, obedecendo aos mesmos critérios da legalidade da produção da prova, da valoração dos meios prova de apreciação vinculada em conformidade com os critérios legais e por ultimo da livre apreciação dos restantes em conformidade com o critério do art. 127º do CPP.
Sujeitos ambos às mesmas exigências de legalidade da prova e da sua apreciação em conformidade com os critérios legais, de forma motivada e crítica, objectiva e racionalidade, em última instância com base no critério de razoabilidade das regras da experiência comum e do convívio social.
Convicção e dúvida constituem como que a face e verso do critério da livre apreciação da prova, limitando-se reciprocamente. Devendo ambas ser fundamentadas na apreciação dos meios de prova validamente produzidos, na apreciação dos meios de prova de apreciação vinculada em conformidade com os critérios legalmente definidos e, em relação aos restantes meios de prova, em conformidade com o critério do art. 127º do CPP. Acabando a livre convicção positiva onde surge a dúvida razoável; e deixando de subsistir a dúvida razoável quando o tribunal estabelece a convicção positiva, ancorada na análise crítica, objectiva e racional dos meios de prova validamente produzidos.
Assentando ambos na legalidade da produção da prova, nos critérios de apreciação vinculada e, na ausência destes, na razoabilidade da sua apreciação á luz do critério previsto no art. 127º do CPP, pela razoabilidade da análise crítica dos meios de prova produzidos oralmente em audiência com base nas regras do conhecimento científico, do convívio social, da análise, do efeito nos depoimentos da proximidade ou distanciamento do caso e/ou das pessoas envolvidas, do interesse no resultado do processo, da personalidade de cada depoente.
Encontrando-se a decisão recorrida devidamente fundamentada, nos termos supra reproduzidos [não estando seria nula, nos termos do disposto no art. 379º, n.º1, al. a) e no at. 374º n.º2 do CPP] a procedência do recurso implica que o recorrente demonstre a inconsistência dessa fundamentação face aos critérios legais de valoração da prova – ou pela ilegalidade dos meios de prova (neste aspecto o recorrente invoca a nulidade do exame médico-legal) ou pela violação de critérios legais de apreciação vinculada, ou porque os meios de prova convocados não têm o conteúdo atribuído pela sentença, ou, por último, porque repousa numa apreciação crítica desconforme com os critérios legais em vigor.
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Focando o caso dos autos, à luz do que acaba de ser referido, verifica-se que o recorrente começa por fazer longas transcrições das declarações prestadas em audiência de julgamento e julgamento. O que evidencia, como já foi posto em destaque, que as alegadas e não identificadas deficiências da gravação, não só não existem como não causaram qualquer embaraço ao recorrente tanto que a reproduz.
Estão em causa os depoimentos prestados pelos ofendidos C e MA, bem como pela testemunha F.
Pretendendo o recorrente demonstrar, fundamentalmente, que do confronto dos depoimentos resulta que os primeiros não depuseram com verdade relativamente a um dos pontos. Alegando que C num primeiro momento declarou que desde o início tinha suspeitado do arguido como autor dos factos - dados os antecedentes existentes entre ambos. Para sustentar que tal afirmação não é verdadeira dado que do depoimento da testemunha F resulta que, logo após a ocorrência dos factos, o ofendido C tinha também manifestado suspeitas acerca de um outro indivíduo que tinha detido algum tempo antes no exercício da sua actividade profissional e que posteriormente andou a trabalhar na sua residência, por conta de uma empresa que contratara para ali realizar obras.
Esta questão não tem, desde logo, relevância quanto à matéria da acusação - o que releva não é a suspeita mas a prova dos factos típicos constitutivos do crime.
Por outro lado a alegação do recorrente não põe em causa o núcleo do depoimento ou seja, a efectiva suspeita, desde a primeira hora, bem como as razões materiais da suspeita e a subsistência ou não das provas que vieram a ser produzidas na sequência da denúncia.
Aliás qualquer denunciante - por maioria de razão quando se trata de um agente policial, confrontado com um crime - indica todos os possíveis suspeitos, a fim de não “afunilar” a investigação, competindo depois às autoridades policiais investigar os fundamentos da suspeita e as provas que lhe possam dar consistência.
De qualquer forma nem a suspeição deixada no ar tem qualquer consistência.
Com efeito, resulta da transcrição do depoimento feita pelo próprio arguido:
“F: E questionei o proprietário. Disse-lhe se ele suspeitava de alguém, caso ele me disse que sim, que suspeitava. Suspeitava de um camarada dele da PSP e que... e eu fiquei assim um bocadinho, não é?”
Advogado do arguido: “Que identificou logo ou...”
F: Não, não, disse que era um camarada da PSP. E depois dialogamos mais um bocadinho e ele disse-me também que ele tinha feito... que tinha efectuado uma detenção uns tempos antes e que pediu a uma firma para que lhe fosse pôr uma vedação em grade numa janela e que para ficou surpreendido porque quem lhe foi aplicar a mesma foi a pessoa que já tinha detido”.
Sendo, pois, evidente, desta reprodução, que o “camarada” foi desde logo o “primeiro” suspeito, identificando o denunciante, em relação ao recorrente, um móbil concreto, certo e determinado.
O “trabalhador” surge apenas num segundo momento, perante a insistência do investigador (que nunca deve fechar, liminarmente qualquer hipótese possível) como outro “também possível” suspeito. Nunca tendo, aliás sido identificado qualquer móbil específico, além do genérico – e legal - cumprimento das funções por parte do ofendido.
O mesmo resulta, com clareza, dos depoimentos dos queixosos/ofendidos, bem como das razões materiais que apresentaram para a suspeita.
Com efeito C disse e repetiu, perante várias instâncias, que indicou logo como principal suspeito o seu colega RZ limitando-se a admitir também, quando falou com a testemunha F, que aquilo podia ter a ver com “alguma detenção, alguma coisa relacionada com o serviço”.
O que é confirmado pela ofendida, mulher de C, corroborando o núcleo das declarações de F já referidas.
O primeiro e principal suspeito, pelo móbil identificado, foi, desde a primeira hora, o colega RZ ainda que o queixoso, quando ouvido tenha admitido que pudesse ser o trabalhador que tinha detido, no exercício das funções, mas em relação ao qual não foi identificado qualquer móbil ou razão de natureza pessoal.
Assim, além de inócua do ponto de vista probatório, é de todo inconsistente a perspectiva suscitada pelo recorrente neste ponto.
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Alega ainda o recorrente que o tribunal, para dar como provados os factos da acusação, apenas se baseou “em meras conjecturas sobre o que teria acontecido”, dado que ninguém viu o arguido no local, violando assim o princípio in dubio pro reo.
É um facto, como equaciona a decisão recorrida na sua fundamentação, que ninguém disse, em audiência, “ter visto” o arguido a praticar o facto ou no local do crime.
No entanto a ausência de testemunhos de “vista” não impede que o tribunal dê como provado o facto, se a partir de outros factos cabalmente comprovados, através de prova directa, e fazendo apelo às regras da lógica e da experiência comum, puder concluir com segurança pela verificação daquele outro facto.
Com efeito, é conhecida a clássica distinção entre prova directa e prova indirecta ou indiciária – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Curso de Processo Penal, 3ª ed., II vol., p. 99. Aquela incide directamente sobre o facto probando, enquanto esta incide sobre factos diversos do tema de prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação da qual se infere o facto a provar.
Embora a nossa lei processual não faça qualquer referência a requisitos especiais em sede de demonstração dos requisitos da prova indiciária, a aceitação da sua credibilidade está dependente da convicção do julgador que, embora sendo uma convicção pessoal, tem que ser sempre objectivada e motivada – se o não for, a decisão é nula.
A prova indirecta exige um particular cuidado na sua apreciação, sendo certo que apenas se pode extrair o facto probando (no caso a autoria do comunicado) do facto indiciário (no caso a pertença à comissão política) quando tal seja corroborado por outros elementos de prova, por forma a que sejam afastadas outras hipóteses igualmente possíveis – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 3ª ed., II vol., p. 100/1001.
Na sua avaliação, mais do que em qualquer outra, intervém a inteligência e a lógica do julgador – sendo do mesmo passo, mais relevante do que em qualquer outro meio de prova mais ou menos tarifado, o contacto directo e a imediação do julgador com a sua produção, para aquilatar a sua credibilidade. Tanto mais consistente quanto menores os factores externos que possam perturbar a verificação do facto probando.
Aliás a associação que a prova indiciária entre elementos de prova objectivos e regras objectivas da experiência leva alguns autores a afirmarem a sua superioridade perante outros tipos de provas, nomeadamente a prova directa testemunhal, onde também intervém um elemento que ultrapassa a racionalidade e que será mais perigoso de determinar, qual seja a credibilidade do testemunho – cfr. Mittermayer Tratado de Prueba em Processo Penal, p. 389.
Como decidiu o Ac. do ST J de 11-11-2004, Proc. n° 04P3182, in www.dgsi.pt, o sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através de uma espécie de presunções. O recurso às presunções naturais não viola o princípio do in dúbio pro reo.

Ora, no caso, desde logo o recorrente não põe em causa o conteúdo probatório da prova pericial – ignorando-a ao arguí-la de nulo.
Sendo certo que tal meio de prova evidencia que o recorrente, logo que foi localizado após a ocorrência do incêndio, apresentava queimaduras nas mãos e na face. Que, pelas circunstâncias em que foram detectadas e inexistência de qualquer outra causa plausível permitiram estabelecer a sua relação com o fogo.
Bem como o registo de telefonemas efectuados para a vítima, o “timing” da saída do “serviço gratificado” da hora do incêndio, da falta ao serviço “oficial” às 8 da manhã, as dificuldades em encontrá-lo, a sua apresentação dias mais tarde por efeito da convocação do seus superior hierárquico, com a mão (queimada) enluvada, além de despojado do “bigode” que sempre usara e tudo indica, terá ficado chamuscado.
Com efeito o incêndio ocorreu cerca das 4H30-4H45. Nesse dia o arguido esteve a fazer um serviço gratificado entre as 23H50 e as 3H45. Esse serviço, como declarou a testemunha MG, deveria prolongar-se até às 4H00 mas o arguido foi rendido mais cedo, não tendo a testemunha registado nada de anormal pela referida testemunha no comportamento do arguido. Foi ainda referido pela mesma testemunha que o arguido se apresentava com bigode, sendo esta uma sua característica habitual, não apresentando quaisquer queimaduras nem nas mãos nem na cara.
A testemunha AR declarou que o arguido teria tempo para chegar à residência do ofendido na P., considerando a hora a que foi efectivamente rendido e o início do fogo. Esse trajecto foi igualmente percorrido pelos inspectores da PJ que verificaram que o arguido teve tempo de percorrer o trajecto até à casa do ofendido (nesse sentido o depoimento da testemunha CS).
Por outro lado o arguido não se apresentou na esquadra depois do serviço de gratificado e telefonou cerca das 7H10 justificando a sua não apresentação, referindo que o serviço tinha corrido bem e que não ia trabalhar. A informação de fls. 231 regista o telefonema para a ..ª esquadra pelas 7h19m55s.
Na manhã do dia 5/1/2009 o arguido foi consultado pelo médico M, apresentando marcada ansiedade e muito nervosismo, a ponto não estar em condições de exercer a sua profissão - pelo que foi atestada a sua incapacidade por seis dias (neste sentido o depoimento da testemunha M e os documentos de fls. 192 a 197). Só no final da consulta se apercebeu, porque o arguido lho referiu, que o mesmo apresentava queimadura na mão. Este referiu-lhe que a queimadura tinha sido produzida no domicílio.

Os inspectores da PJ ACA e CS declararam que o arguido foi procurado em sua casa e em casa de familiares, não tendo sido localizado, apesar de terem conhecimento de que estava em casa, não abria a porta. Foi solicitada a colaboração do comando da PSP vindo o arguido a comparecer na esquadra calçando luvas e sem o habitual bigode, e, após retirar as luvas, apresentava, como provado, um edema dérmico compatível com queimaduras, na face externa da mão direita mas ainda sinais de queimadura na face e nas sobrancelhas (nesse sentido também o depoimento da testemunha AR).

Por último - e mais relevante - sujeito a exame médico-legal (meio de prova cujo conteúdo o recorrente omite) no GML de Aveiro do INML, no dia 08-01-2009, conforme relatório fls. 43 a 45, o arguido apresentava queimaduras designadamente na mão direita e na face – cfr. além o relatório do exame a foto de fls. 36.
Acresce que o arguido, quando saiu do serviço gratificado (pelas 3h45 de 04.01.2009) como foi referido pelo colega que o substituiu, não apresentava quaisquer lesões visíveis, nomeadamente na mão direita, e usava o habitual bigode.
Por outro lado às 07h10m./07h15m. informou o graduado de serviço que ia entrar de baixa médica, o que evidencia que não estava em condições de comparecer ao serviço.
Depois de várias diligências no sentido de o localizar, apresentou-se na esquadra onde prestava serviço, no dia 08.01.2009, apresentando-se sem bigode, e de luvas, assim ocultando as lesões de queimadura na mão e na face.
Ora as lesões na face e na mão provêm da projecção de fogo compatível com os factos, porquanto conforme foto de fls. 36, a mão quando sofreu a lesão apresentava-se fechada (as zonas da unha e falange seguinte não foram afectadas) e o fogo veio de zona exterior com a face da mão voltada nessa direcção; o maço/martelo foi utilizado para partir vidros do carro e a projecção de gasolina para o seu interior terá criado um ambiente volátil (como em regra acontece com a gasolina em ambiente aberto), de tal forma que, com a ignição, se deu uma explosão, funcionando a zona do vidro partido como chaminé de saída da chama; este último efeito chaminé, inesperado, provocou assim as lesões no suspeito, atingindo quer a sua mão, onde estaria o meio de ignição, quer a sua face / bigode.
Em síntese, o arguido estava profundamente desavindo com o ofendido, ameaçou-o, teve tempo de chegar ao local, não se apresentou ao serviço na manhã desse dia apesar de ter estado todo o dia a comemorar o aniversário da irmã, tentou ocultar a existência da queimadura, sendo que a sua alegada incapacidade perante o médico que o assistiu só encontra justificação no facto de se ter lesionado gravemente e apresentar essas lesões de forma visível ao que acresce a dificuldade que a PJ teve em estabelecer contacto com o arguido logo após os factos o que também só tem como única explicação plausível o arguido não querer ser confrontado com os factos.

Ou seja todas as circunstâncias conjugadas e apreciadas na sua globalidade de acordo com a experiência comum confluem, inexoravelmente (nem existe qualquer outra versão possível dos factos) nesse sentido: móbil, oportunidade, consequências do próprio crime – queimaduras sofridas pelo recorrente, causadas pela explosão da gasolina e efeito chaminé de saída pelo vidro do automóvel partido.
Não fazendo sentido invocar aqui o princípio in dubio pro reo, quer porque improcederam os fundamentos probatórios materiais invocados pelo recorrente quer porque não é identificada qualquer perspectiva probatória consistente de onde resulte que o tribunal recorrido, colocado perante duas perspectivas probatórias, numa situação de dúvida razoável, tenha optado por aquela que desfavorece o arguido.
Nem a análise da prova proposta pelo recorrente á ajustada a levantar uma dúvida razoável sobre a valoração da prova subjacente à decisão recorrida.
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Invoca o recorrente contradições no depoimento do queixoso e da mulher quanto à circunstância de o telefone estar ou não em “altifalante”.
Ora nos termos em que o próprio recorrente coloca a questão não existe qualquer contradição (entre os dois depoimentos, uma vez que a contradição apontada não é entre eles, mas com a circunstância genérica, de hoje os telemóveis disporem de “altifalante”. Sendo certo que, a circunstância de os telemóveis disporem de sistema de “alta voz” não obriga a que seja necessariamente utilizado. E nenhum dos dois depoimentos refere que tivesse sido utilizado.
Por outro lado tais factos não resultam apenas das declarações (minuciosas e sentidas) da testemunha C e da esposa MA Que são perfeitamente coincidentes no ponto relevante – e existência e o conteúdo dos telefonemas.
Com efeito a decisão neste ponto funda-se em outros meios de prova, designadamente os registos dos telefonemas efectuados pelo recorrente para o ofendido sobre que não foi suscitada qualquer dúvida e sobre que o recorrente não forneceu, aliás, qualquer explicação que pudesse contrariar a valoração efectuada elo tribunal recorrido.
Com efeito quatro das chamadas telefónicas estão também documentadas na informação de fls. 230/31.
E o próprio queixoso transmitiu esses factos aos seus superiores hierárquicos ainda antes do incêndio da viatura. O que reforça a credibilidade dos depoimentos.
Não tendo assim qualquer consistência probatória relevante a perspectiva do recorrente também neste ponto.
Improcede assim na totalidade o recurso em matéria de facto.
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Já no âmbito da determinação da medida da pena, alega o recorrente que a sentença “nada diz quanto ao grau de culpa do agente”.
No entanto o tribunal recorrido é bem explícito quanto a tal matéria quando refere, além do mais, que “agiu com dolo, intensíssimo, no caso do mais grave dos crime s que lhe foi imputado (o incêndio), sendo certo que os factos revelam a premeditação e fria preparação das circunstâncias para atear o fogo”.
Mais referindo ainda neste âmbito, noutro passo: “Como circunstâncias desfavoráveis depõem um grau de culpa acrescido já que o arguido tem 12 anos de escolaridade como habilitações literárias e fundamentalmente porque é agente da Polícia de Segurança Pública. Sendo certo que os factos não estão ligados ao exercício das suas funções, estas trazem-lhe uma responsabilidade acrescida pois seria suposto que o tivessem determinado a manter conduta lícita e, nesta sua veste de entidade policial, não pode deixar de constituir um exemplo de comportamento para a comunidade em geral”.
É pois manifesta a insubsistência do recurso neste âmbito.
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Sustenta o recorrente que o tribunal “violou o princípio da dupla valoração, porquanto na determinação da medida da pena e ao fazer o cúmulo jurídico considerou circunstâncias que na fixação da própria moldura penal de cada um dos crime pelo legislador.
Trata-se de uma afirmação – violação da (proibição da) da dupla valoração­ -que o recorrente não fundamenta, minimamente.
Sendo certo que a pena unitária não constitui uma autónoma (no sentido de repetida ou dupla) valoração da ilicitude ou da culpa. Mas antes, depois de definidas as penas parcelares dos vários crimes, uma valoração unificadora, unitária ou conjunta para efeito de uma pena única. Sendo certo que a pena aplicada em cúmulo, nos autos (como na generalidade dos casos) é significativamente inferior à soma aritmética das várias penas parcelares, sendo a valoração unitária claramente in favor reo.
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Alega que, na determinação da pena, o tribunal recorrido violou os princípios de justiça e proporcional idade. E que o tribunal não explicita quais as necessidades de prevenção geral e especial que desaconselham a aplicação da pena de prisão.

O art. 71º, nº1 do C.P estabelece o critério geral segundo o qual “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigência de prevenção”.

Critério que é precisado no nº2: “Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele. Circunstâncias que são exemplificadas (“nomeadamente”) nas várias alíneas do citado nº2 e reconduzem-se a três grupos ou núcleos fundamentais: factores relativos à execução do facto {alíneas a), b) e c) – grau de ilicitude do facto, modo de execução, grau de violação dos deveres impostos ao agente, intensidade da culpam sentimentos manifestados e fins determinantes da conduta}; factores relativos à personalidade do agente {alíneas d) e f) – condições pessoais do agente e sua condição económica, falta de preparação para manter uma conduta lícita manifestada no facto}; e factores relativos à conduta do agente anterior e posterior a facto {alínea e)}.

Este preceito deve ser articulado com o programa político-criminal sobre as finalidades da pena consagrado no art. 40º do C. Penal (redacção introduzida pela Reforma de 95): 1. A aplicação da pena... visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. 2. Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa.
Disposição que consagra o entendimento mais recente do Prof. Figueiredo Dias sobre os fins das penas (cfr. Liberdade, Culpa e Direito Penal, Coimbra editora, 2ª ed., e Direito Penal Português, As Consequência Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, p. 227, este tendo já por referência o projecto que veio a ser plasmado no art. 40º da redacção actual do Código Penal): “A justificação da pena arranca da função do direito penal de protecção dos bens jurídicos; mas esta função de exterioridade encontra-se institucionalmente limitada pela exigência de culpa e, assim, por uma função de retribuição como ressarcimento do dano social causado pelo crime e restabelecimento da paz jurídica violada; o que por sua vez implica a execução da pena com sentido ressocializador – só assim podendo esperar-se uma capaz protecção dos bens jurídicos”.
Ora, no caso, os factos falam por si – e encontrando-se descritos no acórdão recorrido em sede própria, não tinha o tribunal que os repetir na fundamentação jurídica, destinada a retirar as consequências jurídicas da matéria previamente definida.
Está em causa, além do mais, o incêndio, com gasolina, de noite, no reduto da casa de habitação do ofendido, camarada de profissão do recorrente, bem como repetidas ameaças pelo telefone.
O grau de ilicitude é por isso e atendendo ao valor dos prejuízos, elevado – matéria constitutiva dos 4 crimes pelos quais o arguido vem condenado.
Sendo certo que crimes desta natureza – de noite, no reduto de uma casa de habitação, com substância explosiva como a gasolina – causam forte alarme social e sentimento de insegurança da comunidade.
A gravidade objectiva dos factos imputados ao arguido suscita forte alarme social, considerando além do mais que o arguido exerce a profissão de agente da Polícia de Segurança Pública.
Incluindo a previsão do “álibi” da saída do serviço às 4 e da reentrada às 8. Que apenas falhou na previsão do “efeito chaminé” da combustão volátil da gasolina a sair pelo vidro do carro, chamuscando o recorrente, que se revelou fatal na sua ligação indelével aos factos.
Os vários crimes praticados e a sua “sofisticação” fazem lembrar, aliás, modos de actuação sofisticados pouco comuns entre nós, fazendo lembrar outras latitudes.
Não tendo o tribunal que repetir, na fundamentação jurídica, a descrição fáctica que tinha efectuado no local apropriado da mesma peça processual.
Agiu com dolo directo em todos os crimes, sendo particularmente intenso no caso do incêndio desde logo pela minúcia da realização como pelo vigor e persistência da vontade na sua preparação e consumação.
A personalidade é revelada pela natureza das acções perpetradas e pela ausência de atitude de arrependimento.
E, do ponto de vista da prevenção especial, o arguido não assumiu os factos nem revelou qualquer postura crítica ou de arrependimento.
Acresce que o arguido não aproveitou o decurso do tempo para ressarcir os ofendidos não fazendo de qualquer forma esmorecer a forte necessidade da pena. Continuando a manter, ainda no recurso, uma atitude “hostil” de não assunção dos factos, quanto mais de arrependimento ou censura.
As penas parcelares aplicadas situam-se abaixo meio-termo das respectivas molduras abstractas, salvo a relativa ao crime de incêndio, moderadamente acima do meio da moldura, perfeitamente proporcionada (dentro da moldura abstracta) às exigências de protecção dos bens jurídicos violados e a todas as circunstâncias provadas, relativas ao grau de ilicitude e de culpa, à personalidade neles revelada, ao modo de execução, à gravidade das consequência, à falta de postura crítica do recorrente perante os facto.
Foi valorada, além da personalidade do arguido revelada nos factos, a falta de antecedentes criminais do recorrente. Com efeito refere explicitamente o acórdão recorrido: “Tem-se, assim, em consideração, a favor do arguido, a inexistência de antecedentes criminais e a circunstância de ter família constituída”.
Sendo certo que não se provou qualquer outra atenuante de relevo, destacando-se a ausência e apesar da não assunção de qualquer postura de arrependimento ou reprovação dos factos aplicou penas situadas a meio da respectiva moldura abstracta – o silêncio constitui um direito, mas ao exercê-lo o arguido não pode invocar atenuantes de natureza prospectiva e colaborante da sua parte.
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Também a pena única aplicada em cúmulo - 5 anos e 6 meses de prisão – surge, dentro dos limites abstractos (mínimo de 5 anos e máximo de 6 anos e 7 meses de prisão - art. 77.º, n.º 2 do C. Penal) proporcionada e adequada na valoração conjunta da actuação do recorrente e da personalidade revelada na globalidade da matéria apurada.
Os efeitos do cumprimento da pena no seu futuro e na relação com as pessoas que lhe são próximas constituem consequências e não critério para a determinação da pena.
Tanto mais que o recorrente não pode invocar qualquer tipo de arrependimento ou censura dos factos ou de ensejo de reparação do mal do crime que pudessem levar à aplicação de uma pena conjunta mais suave e/ou à aplicação de uma qualquer uma das várias penas de substituição da prisão.
Cujos pressupostos de aplicação, no caso, aliás, não só o recorrente não invoca, como não se verificam, atenta não só a pena aplicada em concreto como ainda as exigências de protecção dos bens jurídicos violados, pelo grau de preparação, pela falta de arrependimento e qualquer esforço sério de reparação das consequências por parte do recorrente.

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III. Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos decide-se negar provimento ao recurso com a consequente manutenção, integral, da decisão recorrida. -----
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 (sete) UC