Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2/14.0TBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
SENTENÇA CONSTITUTIVA
Data do Acordão: 05/17/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU - VISEU - INST. CENTRAL - SECÇÃO CÍVEL - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART.281 CPC
Sumário: 1. A deserção da instância declarativa opera, necessariamente, mediante decisão judicial e pressupõe a negligência das partes no impulsionamento do processo (carece de ser imputável às partes) (art.º 281º, do CPC) - a deserção não existe enquanto o juiz a não declara no processo respectivo.

2. A sentença de deserção tem, pois, alcance constitutivo, pelo que enquanto não for proferida, é lícito às partes promover utilmente o seguimento do processo.

Decisão Texto Integral:           




  Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

            I. Em 31.12.2013, C (…), S. A., instaurou a presente acção declarativa comum contra M (…), S. A., pedindo que seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 550 430 e respectivos juros moratórios.

            No final da petição inicial protestou-se “juntar a procuração forense no prazo de 20 dias” e a junção ocorreu a 05.02.2014 (fls. 11, 29 e 30).

            Na contestação, a Ré concluiu pela improcedência da acção e também protestou juntar procuração, compromisso esse que, por incumprido, veio a determinar a notificação da Exma. Mandatária da Ré “para no prazo de dez dias juntar aos autos procuração com ratificação do processado sob a cominação do disposto no art.º 40º, n.º 2 do CPC[1], instrumento que veio a ser junto a 27.5.2014 (fls. 43, 47, 50 e 51).

            Quando se pretendia realizar a audiência prévia e na sequência de requerimentos e do acordo das partes, no período compreendido entre 20.6.2014 e 04.3.2015, a instância encontrou-se suspensa (fls. 69 e seguintes).

            Ordenada então a notificação das partes para consignarem nos autos o que tivessem por conveniente, no prazo legal, a Exma. Mandatária da A. declarou, de imediato, “nos termos do disposto no art.º 47º do CPC, renunciar à procuração que lhe foi outorgada pela Autora” (fls. 81 e 83).

            Notificada a A. conforme o disposto no art.º 47º, do Código do Processo Civil (CPC)[2], foi então proferido o seguinte despacho (de 15.4.2015):

            «Nos termos do disposto no art.º 47º, n.º 3, al. a), do CPC, suspendo a instância.

            Aguarde, sem prejuízo do estatuído no art.º 281º, n.º 1, do CPC

            Em 21.10.2015, foi junto aos autos requerimento com o seguinte teor:

            «(…) C (…), S. A., A., notificada que foi para os devidos efeitos, vem junto de V. Exa protestar juntar procuração forense, em prazo não superior a 10 dias, requerendo, desde já, o prosseguimento dos autos. Espera Deferimento, A advogada, c/ Procuração».

            Por último, em 11.11.2015, sem que entretanto tivesse sido proferido qualquer despacho, a A. requereu «(…) a admissão aos presentes autos de Procuração Forense passada à ora signatária e protestada juntar no Requerimento antecedente» (sic), apresentando nos autos uma procuração forense datada de 30.10.2015 e que conferia “os mais amplos poderes forenses gerais em Direito permitidos e de ratificação do processado, no Proc. n.º 2/14.0TBVIS” (fls. 90/93).

            No dia 12.11.2015 proferiu-se a seguinte sentença (a fls. 91):

            «A instância destes autos encontra-se suspensa desde 15.4.2015, nos termos do art. 47º, n.º 3, al. a), do CPC, em virtude de a autora não ter constituído mandatário – fls. 86. Do despacho que suspendeu a instância, e determinou que os autos ficassem a aguardar o decurso do prazo de deserção da instância, foi a autora devidamente notificada.

            Findo o prazo previsto no art.º 281º, n.º 1, do CPC, juntou uma Sra. Advogada requerimento a protestar juntar procuração. Ora, o único ato da autora com virtualidade para o prosseguimento dos autos, face ao fundamento da suspensão da instância determinada, seria a constituição de mandatário, com imediata junção da devida procuração forense, o que a autora não fez, tendo a procuração sido junta aos autos já depois de decorrido o prazo mencionado (e tendo a mesma inclusive sido outorgada após o decurso do mesmo prazo).

            Impõe-se, pois, concluir ter já decorrido um período superior a 6 meses sem que a autora tenha impulsionado os autos da forma devida, aquando da junção aos autos de procuração forense, com as inerentes consequências - que se declararão.


*

            Em consonância, julgo extinta a instância dos autos, por deserção – art. 281º, n.º 1, do CPC (…).»

            Inconformada, a A. interpôs a presente apelação formulando as conclusões que assim vão sintetizadas:

            1ª - Em 15/4/2015, o Tribunal a quo proferiu despacho a ordenar a suspensão da instância, tendo como fundamento a renúncia ao mandato por parte da, então, mandatária da A., sem prejuízo do disposto no n.º 1 do art.º 281º do CPC, notificado à A., por notificação de 17/4/2015, a qual, nos termos do art.º 249º, n.º 1, do CPC, se presume efectuada a 21/4/2015.

            2ª - Em 21/10/2015, a Mandatária da A. deu entrada de requerimento nos autos, protestando juntar procuração forense em prazo não superior a 10 dias e, bem assim, requerendo o prosseguimento dos autos, o que constituiu a prática de um acto processual e colocou termo ao decurso do prazo da deserção da instância e que, com a junção aos autos da Procuração forense, com poderes para ratificação do processado - antes de proferida a Sentença a quo -, nenhuma circunstância impedia o prosseguimento dos autos.

            3ª - No dia 11/11/2015, a A. procede à junção de procuração forense, com data de 30.10.2015, com poderes para ratificação do processado, sendo que, apenas em 19/11/2015 a A. é notificada da Sentença que ordena a deserção da instância.

            4ª - Há que versar sobre o alcance e real produção dos efeitos do disposto no art.º 281º do CPC.

            5ª - É certo que aquando da entrada do requerimento da A., em 21/10/2015, ainda não se encontravam decorridos os seis meses da deserção da instância, pois que, nesse mesmo requerimento, mais uma vez, devidamente mandatada para o efeito, a advogada da A., para além de ter protestado juntar a procuração forense, requereu o prosseguimento dos autos.

            6ª - Atento o teor do n.º 4 do referido art.º 281º do CPC - “a deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator” - a deserção da instância não opera automaticamente, pelo simples decurso do prazo, dependendo sempre de decisão judicial.

            7ª - É e tem sido este o entendimento pacífico da jurisprudência, não deixando dúvidas de que a deserção da instância depende, sempre, de um despacho judicial a ordená-la.

            8ª - No caso sub judice, nem o prazo dos seis meses para o proferir da deserção da instância se encontrava ultrapassado aquando da entrada do requerimento enviado pela mandatária da A., em 21/10/2015, nem tão-pouco, quando foi junta a Procuração forense com poderes para ratificação do processado, havia ainda sido proferido Sentença nesse sentido pelo Tribunal a quo e, por último, não foi à A. concedida qualquer possibilidade de exercer o contraditório antes do proferir da Sentença de que se recorre.

            9ª - Antes do prazo da deserção ocorrer, a A. deu a conhecer aos autos que havia já constituído mandatário e, por isso, requereu o prosseguimento dos autos, sendo que este requerimento teve o condão processual de fazer cessar o fundamento que esteve subjacente à suspensão da instância: constituição de mandatário.

            10ª - Ainda que acorressem ao Tribunal a quo dúvidas sobre a (in)suficiência de poderes da advogada subscritora do requerimento de 21/10/2015, por ter protestado juntar procuração, rege o art.º 48º, nºs 1 e 2, do CPC, que tal insuficiência deve ser suprida em prazo a fixar.

            11ª - Ao invés de proceder à notificação para suprir a insuficiência, o Tribunal a quo julgou desde logo a ocorrência da deserção da instância, postergando o dever de gestão processual exposto no art.º 6º do CPC e obliterando o convite à parte para regularizar a insuficiência.

            12ª - Antes de ser proferida a Sentença sob sindicância, a A. já havia procedido à junção da respectiva Procuração Forense!!

            13ª - Em última instância, sempre o requerimento de 21/10/2015 poderia ser entendido como tendo sido praticado a título de gestão de negócios e, destarte, ser passível de ratificação, o que veio a ocorrer em 11/11/2015.

            14ª - O que é relevante apreciar é somente determinar se o prazo foi interrompido com a prática dos actos processuais conducentes à cessação do fundamento processual que determinou a suspensão da instância (requerimentos de 21/10/2015 e 11/11/2015 – anteriores à Sentença) e já não se a forma do exercício desse acto tinha ou não suficiência de representação.

            15ª - A montante da questão sub judice, dir-se-á que o requerimento de 21/10/2015 se constitui como um verdadeiro acto processual que determinava a cessação da suspensão da instância, pois o mesmo é subscrito por advogado em representação da A., parte com a obrigação de dar impulso aos autos.

            16ª - A jusante, restaria ao Tribunal determinar a comprovação do mandato forense manifestado por requerimento de 21/10/2015, notificando a parte para proceder à junção do instrumento que comprovasse o mandato ou se houve actuação a título de gestão de negócios.

            17ª - Não poderia decidir-se da ocorrência de deserção de instância sem que a parte fosse notificada para comprovar que a advogada subscritora do requerimento de 21/10/2015 agia, efectivamente, no seu interesse e representação judicial.

            18ª - E só após esta notificação e na ausência de resposta é que se poderia apreciar se o requerimento de 21/10/2015 era ou não idóneo a interromper o prazo em curso por insuficiência de mandato - o que não ocorreu, porquanto, antes da Sentença proferida pelo Tribunal a quo, já a A. havia junto Procuração.

            19ª - Note-se que a presente acção tem o valor de € 550 430, assumindo a mesma uma importância extrema para a A., que se encontra convicta da procedência dos fundamentos aduzidos na Petição Inicial.

            20ª - O que também deveria ter sido considerado pelo Tribunal a quo, salvaguardando, dessa forma, a prossecução dos interesses da A. e, como princípio basilar, a boa decisão da causa e o alcance da Justiça.

            Remata dizendo que deve ser revogada a decisão de extinção da instância, por deserção, ordenando-se o normal prosseguimento dos autos.

            Não houve resposta à alegação de recurso.

            A única questão a decidir consiste em saber se podia/devia ser declarada a deserção da instância.


*

         II. 1. A factualidade a considerar é a que consta do relatório que antecede (ponto I).

            2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            Preceitua o art.º 281º (sob a epígrafe “deserção da instância e dos recursos”): Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 1); O recurso considera-se deserto quando, por negligência do recorrente, esteja a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 2); Tendo surgido algum incidente com efeito suspensivo, a instância ou o recurso consideram-se desertos quando, por negligência das partes, o incidente se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 3); A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator (n.º 4); No processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 5).

            O regime pretérito (CPC de 1961), relativo à interrupção e deserção da instância, era o seguinte: “A instância interrompe-se, quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento” (art.º 285º); “Cessa a interrupção, se o autor requerer algum acto do processo ou do incidente de que depende o andamento dele, sem prejuízo do disposto na lei civil quanto à caducidade dos direitos” (art.º 286º); “Considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida durante dois anos” (art.º 291º, n.º 1).

            Concluiu-se, assim, que a actual lei processual civil, além de ter encurtado para seis meses o prazo, até aí de dois anos, que a parte dispunha para impulsionar os autos sem que fosse extinta a instância por deserção, eliminou também a figura da interrupção da instância, ou seja, a instância fica deserta logo que o processo, por negligência das partes, esteja sem impulso processual durante mais de seis meses sem passar, portanto, pelo patamar intermédio da interrupção da instância; estamos, pois, perante um regime mais severo para sancionar a negligência das partes em promover o andamento do processo, colimando logo com a ´deserção` e consequente `extinção da instância` [art.º 277º, c)] aquela falta de impulso processual.[3]

            3. Nos termos do art.º 281º, para se considerar deserta a instância será necessário, não apenas que o processo esteja parado há mais de seis meses a aguardar impulso processual da parte, mas também que tal se verifique por negligência (da parte) em promover o seu andamento.

            Segundo a mesma previsão legal, a instância declarativa, ou o recurso, não se poderão considerar desertos independentemente de qualquer decisão judicial (despacho do juiz ou do relator).[4]

            4. Dúvidas não restam, pois, que a deserção da instância declarativa opera, necessariamente, mediante decisão judicial e pressupõe a negligência das partes no impulsionamento do processo (carece de ser imputável às partes)[5], pelo que até ser proferida (tal decisão) não pode, pois, a instância ser considerada deserta, designadamente pela secretaria judicial.

            Pretendeu-se que o arquivamento do processo por deserção ficasse dependente do controlo jurisdicional, designadamente no que toca à verificação da negligência da parte em promover os seus termos.[6]

            5. Confrontados com o actual (e descrito) regime jurídico, afigura-se assim inteiramente correcto, e igualmente defensável, o expendido pelo Senhor Professor Alberto dos Reis a propósito de idêntica disposição do CPC de 1939, mormente quando refere e ensina:    

            A deserção não se produz automaticamente, ´ope legis`; depende de acto do juiz, produz-se ´ope judicis`, visto que demanda uma sentença de declaração.[7] Suponhamos então que, tendo passado o lapso de tempo marcado no artigo 296º[8], uma das partes dá impulso ao processo antes de o juiz ter declarado a deserção; deverá o tribunal considerar deserta a instância, não obstante o impulso referido, ou ficará, pelo contrário, inutilizado o efeito da inércia durante o período legalmente necessário para se operar a deserção?

            Entendemos que a inércia fica sem efeito e que deve admitir-se o seguimento do processo.

            Atenda-se, por um lado, a que o efeito da inactividade das partes não se produz ´ipso jure`. A nossa lei não declara (…) que a deserção opera ´de direito` os seus efeitos; pelo contrário, segundo o artigo 296º, não basta o facto da inércia, é necessário uma sentença de extinção.

            (…) Enquanto a instância não for declarada extinta, as partes podem dar impulso ao processo, pouco importando que tenha estado parado durante mais de (…).”[9]

            “ (…) A deserção não se produz de direito, posto que deva ser declarada oficiosamente; depende de acto do juiz, produz-se ´ope judicis`. A sentença de deserção tem, pois, alcance constitutivo. Enquanto não for proferida, é lícito às partes promover utilmente o seguimento do processo.”.[10]

            “ (…) A deserção não existe enquanto o juiz a não declara no processo respectivo.”[11]

             6. Perante o disposto no art.º 281º, o descrito entendimento e a factualidade mencionada em I., supra, apenas se poderá concluir que, ao juntar aos autos a procuração forense em falta, em 11.11.2015, ou seja, antes de declarada a deserção da instância, a A. não deixou de promover utilmente o seguimento do processo, pelo que ficou desde logo sem efeito, nos termos expostos, a sua pretensa e eventual inércia, razão pela qual já não seria sequer possível analisar a sua pretérita actuação no que pudesse consubstanciar negligência na promoção do regular andamento dos autos.

            7. Fica desta forma prejudicada a apreciação, nomeadamente, da eventual tempestividade e relevância do requerimento da A. de 21.10.2015.[12]

            8. Impõe-se, pois, a revogação da decisão recorrida e o consequente prosseguimento dos autos.


*

            III. Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida, devendo o processo prosseguir os seus termos.

            Custas segundo o decaimento a final.


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17.5.2016


Fonte Ramos ( Relator)

Maria João Areias

Fernanda Ventura

                       

 

           

           

           


[1] A menção do art.º é incorrecta, porquanto se pretendeu referir o art.º 48º, n.º 2, do CPC de 2013.
[2] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.

[3] Cf. o acórdão da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1, publicado no “site” da dgsi.

[4] Decisão que já não se antolha necessária no processo de execução, aqui, ao que tudo indica, em virtude da utilização privilegiada e tendencialmente única, nesta forma de processo, dos procedimentos electrónicos e informáticos. Contudo, daí não se poderá concluir que se tenha pretendido prescindir, quanto ao processo executivo, da efectiva negligência das partes enquanto causa/requisito da situação do processo a aguardar impulso processual, de resto, exigência ou pressuposto claramente expresso na letra e no espírito da lei – cf., neste sentido, os acórdãos desta Relação de 01.12.2015-processo 2061/10.5TBCTB-A.C1 [No qual se defendeu que a negligência das partes a que alude o art.º 281º, do CPC de 2013, não deve/pode ser presumida e, em consequência, sobre tal questão (e para dela apurar) deve ser aberto um contraditório prévio, nos termos do art.º 3º/3 do CPC; o actual art.º 281º/1 do CPC não deve ser interpretado/aplicado com a “rigidez” e “automatismo” do antigo art.º 285º do CPC; e que haverá casos em que o contraditório prévio se mostra, em face de elementos resultantes dos autos, desnecessário e inútil, tanto por a negligência ser já patente, como por ser evidente a falta dela.] e 16.12.2015-processo 651/08.5TBCTB-A.C1 [subscrito pelos aqui relator e 1ª adjunta], publicados no “site” da dgsi.

   Sobre a mesma problemática e relativamente às acções declarativas, cf., entre outros, os acórdãos da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1 e da RC de 05.5.2015-processo 131/04.8TBCNT.C1, publicados no “site” da dgsi, defendendo-se, no primeiro, “a desnecessidade de despacho do juiz ou do relator está apenas circunscrita ao processo de execução” (n.º 5 do art.º 281º) e que “o tribunal antes de exarar o despacho a julgar extinta a instância por deserção, deve ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente de alguma delas, ou de ambas” (daí se ter ordenado a notificação da parte para, ultrapassado que estava o prazo de seis meses, se pronunciar sobre a falta de impulso processual, fixando-se-lhe um prazo de 30 dias para dar andamento aos autos ou requerer o que tivesse por conveniente sob pena de se julgar extinta a instância por deserção), e, no segundo, que “importa apreciar e valorar a existência de omissão negligente da parte em promover os termos do processo, do que depende a possibilidade de se decretar a deserção da instância, constituindo a negligência da parte o seu pressuposto, desiderato, este, que só pode ser alcançado mediante a prolação de decisão judicial precedida da averiguação do motivo/causa da falta de impulso processual”, sendo que, nos termos do n.º 5 do art.º 281º, “o único caso em que se permite a deserção da instância, independentemente de decisão judicial, é no caso de processo de execução, dado que a própria declaração de extinção executiva também ocorre independentemente de decisão judicial, cf. artigo 849º, n.º 3, do NCPC [que assim reza: A extinção da execução é comunicada, por via electrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e electrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria]”. 

   Porém, em idêntico enquadramento processual, no acórdão da RP de 28.10.2015-processo 2248/05.2TBSJM.P2 (publicado no “site” da dgsi) concluiu-se que “a deserção da instância decorre directamente da circunstância de o processo estar parado há mais de seis meses a aguardar o impulso da parte e o único despacho legalmente previsto é aquele que declara essa deserção, nada justificando um anterior despacho de alerta”.

[5] Dir-se-á, ainda, que alguma doutrina e jurisprudência defende que, apesar de a falta de impulso poder ser, ela mesma, sinónima de negligência da parte e de, em princípio, não se justificar nenhum dever de prevenção da parte, porém, como a deserção da instância exige que a falta de impulso decorra da negligência das partes (art.º 281º, n.º 1, CPC), haverá que avaliar, caso a caso, se se justifica o cumprimento pelo tribunal do dever de prevenção, porquanto, por exemplo, poderá haver razões para o cumprimento desse dever se a parte à qual cabe o impulso não estiver representada por advogado ou se esta mesma parte tiver demonstrado, pelo seu anterior comportamento processual, que está interessada na continuação do processo e se, por isso, for surpreendente a falta de impulso processual – cf., designadamente, Paulo Ramos de Faria/Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, 2013, pág. 250.

   Em idêntico sentido, cf. o cit. acórdão da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1 e, entre outros, por último, os acórdãos da RC de 16.3.2016-processo 131/04.8TBCNT.C2, da RL de 03.3.2016-processo1423-07.0TBSCR.L1-6 [A deserção da instância, enquanto causa de extinção da instância, deixou de ser automática, carecendo de ser julgada por despacho do juiz - o julgador tem de apreciar se a falta de impulso processual se ficou a dever à negligência das partes, tendo, por isso, de valorar o comportamento processual das partes. Para tanto, o julgador deverá ouvir as partes por forma a avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente das partes, bem como, e por força do princípio da cooperação, reforçado no novo CPC, alertar as partes para as consequências gravosas que possam advir da sua inércia em impulsionar o processo decorrido que seja o prazo fixado na lei, agora substancialmente mais curto.] e da RE de 17.3.2016-processo 178/14.6TBRDD.E1 [“A não audição das partes sobre a possibilidade de ver decretada a deserção da instância por negligência das mesmas no impulso do processo, constitui uma decisão surpresa e como tal ilícita”, tanto mais que, no caso em apreço “tendo as partes acordado que a suspensão da instância era apenas por 15 dias e tendo o Tribunal acolhido tal pretensão, impunha-se, ´findo que fosse aquele prazo e nada tendo sido requerido em contrário`, que o Tribunal ordenasse o prosseguimento dos autos com a notificação do Réu para contestar, nos termos do disposto no art.º 931º, n.º 5, do CPC.”], publicados no “site” da dgsi.

[6]Vide Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. e loc. citados.
[7] Sublinhado nosso, como os demais a incluir no texto.
[8] Disposição que tinha a seguinte redacção: «Considera-se deserta a instância quando estiver interrompida durante cinco anos, sem prejuízo do que vai disposto no artigo seguinte. Verificado o caso previsto neste artigo, deve a secretaria fazer o processo concluso, a fim de ser declarada extinta a instância

[9] Vide Comentário ao CPC, vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, págs. 439 e seguinte.
[10] Ibidem, pág. 444.
[11] Ibidem, pág. 445.

[12] “Em linha”, de resto, com a pretérita actuação das partes e/ou suas Exmas. Mandatárias, ao assumirem solenemente o compromisso de ulterior junção de procurações que não (nunca) acompanhavam os articulados… (cf. ponto I., supra).