Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2015/22.9T8CTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FELIZARDO PAIVA
Descritores: RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO TRABALHADOR
CADUCIDADE
INÍCIO DO PRAZO
RESOLUÇÃO ILÍCITA
Data do Acordão: 06/14/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE CASTELO BRANCO DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 395.º, N.º 1, 399.º E 401.º DO CÓDIGO DE TRABALHO
Sumário: I – A resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador deve, sob pena de caducidade do direito, ser comunicada ao empregador no prazo de 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos que fundam a justa causa.
II – No caso de factos instantâneos com efeitos duradouros, suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo, aquele prazo inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir de então imediatamente impossível, não sendo exigível ao trabalhador a manutenção daquela relação.

III – Se o autor negociou e concluiu um novo contrato de trabalho com outra empresa, é porque reconhece que o comportamento do empregador fundamentador da resolução assumiu tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se tornou a partir de então imediatamente impossível, não lhe sendo exigível a manutenção daquela relação, sendo a partir da data da negociação/conclusão do novo contrato que se inicia a contagem do prazo de caducidade 30 dias para a resolução contratual.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:

Apelação 2015/22.9T8CTB.C1

Relator: Felizardo Paiva.

Adjuntos: Mário Rodrigues da Silva

 Paula Roberto.


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Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

I AA instaurou a preste ação de processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra “A..., LDA.” e “B..., LDA.”, pedindo que seja julgada procedente à ação e, em consequência, sejam as Rés condenadas a pagar ao autor:

(i) Uma compensação de valor não inferior a € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) acrescida dos juros vincendos após trânsito em julgado da sentença, à taxa legal, até integral pagamento;

(ii) Uma indemnização por danos morais não inferior a € 5.000,00 (cinco mil euros), acrescida dos juros vincendos após trânsito em julgado da sentença, à taxa legal, até integral pagamento;

 (iii) Créditos laborais no valor de € 4.680,22 (quatro mil seiscentos e oitenta euros e vinte e dois cêntimos), acrescidos de juros vencidos à taxa legal no valor € 38,55 (trinta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos) e vincendos até integral pagamento;

(vi) Custas e procuradoria condigna.

Para tanto alegou, em síntese, tal como consta da sentença impugnada, que em 12 de outubro foi admitido ao serviço da C..., S.A., tendo celebrado um contrato de trabalho para o exercício de funções de Assistente de Gestão de Património, sendo que a sociedade C..., S.A. se veio a fundir por incorporação na D..., tendo o A. à data a categoria profissional de Adjunto da Direção Financeira. Mais alegou que em fevereiro de 2009 lhe foi atribuída a categoria profissional de Diretor de Balneário Termal, onde sempre exerceu funções até à cessação do seu contrato de pela 1ª R.. A partir desta data acumulou várias novas funções, que até então eram desempenhadas por outros Diretores da D..., S.A., os quais asseguravam as mesmas, até que em novembro de 2017 lhe foi atribuída a categoria profissional de diretor Geral das E.... A partir do mês de maio de 2020, além das funções que resultavam do seu contrato de trabalho, a empresa F..., Lda., da qual o A. era gerente à data, celebrou com a 1ª R. um contrato de prestação de serviços de contabilidade, a qual passou a ser assegurada diretamente por este, mediante o pagamento de 200 euros mensais. Alega ainda o autor que em 28 de outubro de 2020 celebrou com a 1ª R. um acordo nos termos dos quais o seu contrato de trabalho foi cedido para a 2ª R., mantendo a categoria e demais condições contratuais em vigor à data, tendo a 2ª R. assumido a responsabilidade pela antiguidade do A.. Além das funções de Diretor Geral na 1ª R. o A. passou a acumular igualmente as funções de Project Manager (Gestor de Projeto) na 2ª R.. Na verdade, o autor manteve-se sempre a prestar trabalho e a exercer funções em benefício das duas entidades. Considerando que a 1ª R e a 2ª R. têm um dos mesmos membros de órgãos estatutários em comum, em ambos os casos o A. reportava sempre ao Sr. BB, gerente das duas RR., sendo que todas as funções do A. eram exercidas nas E..., sede das RR., que sempre correspondeu ao seu local de trabalho. Sucede que, em julho de 2022, o gerente das RR. decidiu alterar unilateralmente as suas funções. Com efeito, no dia 18 de Julho de 2022, o A. foi convocado para uma reunião com a gerência das RR., BB, na qual foi transmitido pelo referido gerente que não estava satisfeito com o trabalho do A. nas E..., designadamente por, devido a limitações familiares o A. não estar disponível para trabalhar ao fim-de-semana, considerando que o A. tinha cristalizado na sua evolução como trabalhador e que não tinha perfil para se manter no seu cargo de Diretor Geral. Por este motivo, foi igualmente comunicado ao A. que pretendia que o mesmo deixasse de trabalhar nas E..., alterando o seu local de trabalho para as G..., outra empresa do “grupo” do gerente em causa, com escritório em ..., e que passasse a exercer exclusivamente as funções de Project Manager da 2ª R., deixando assim de ocupar a posição de Diretor-Geral das Termas na 1ª R. Por fim, foi o A. interpelado de que ou aceitava esta alteração às suas condições contratuais ou teria de sair da empresa. Adicionalmente foi igualmente determinado pela gerência das RR. que a partir de 18 de julho de 2022 o A. iria apenas 1 dia por semana (às 3ª-feiras) às E.... Já no dia 20 de julho, sem dar qualquer informação prévia ao A., o gerente das RR convocou uma reunião geral com todos os colaboradores da 1ª R., onde, acompanhado do Sr. CC, informou que ia haver uma alteração interna e que este colaborador passaria a ser o responsável pelas E... e por coordenar todo o pessoal, bem como chefiar a receção, contactar com os clientes e inclusivamente coordenar todo o relacionamento com os médicos, funções que até aí eram exercidas exclusivamente pelo A.. Mais comunicou o gerente das RR. que a partir daquela data o A. apenas ficaria com a parte do backoffice, pelo que deixaria de ter o seu local de trabalho nas E.... Mais ainda, comunicou o gerente das RR. que doravante qualquer assunto das Termas e dos seus colaboradores deixava de ser tratado com o A. e passaria a ser tratado com o Sr. CC, que iria substituir o A. nestas funções. No dia 1 de agosto o autor transmitiu à gerência das rés que não estava de acordo com a alteração das suas funções, razão pela qual aceitava a proposta de cessação do seu contrato de trabalho, por ser a única alternativa viável para si, tendo então acedido a manter-se em funções até ao final do mês de agosto. Após o regresso do A. do gozo de mais uma semana férias (de 22 a 26 de agosto), foi-lhe imediatamente exigido que entregasse o carro que lhe havia sido atribuído para uso total (ou seja, também para assegurar a sua deslocação de casa para as E... e para ser utilizado nas férias e no fim-de-semana), para compensar o facto de a sua remuneração não ser atualizada há muito tempo, mesmo depois de o A. passar a acumular as duas posições nas RR.. Considerando que a 2ª R. pretendia retirar unilateralmente ao A. as funções de Diretor Geral das E... – as quais foram distribuídas à gerência e a outros colaboradores de outras empresas do grupo – e que adicionalmente lhe estavam a ser retirados benefícios a que tinha legalmente direito, a permanência no trabalho passou a ser totalmente insustentável para o A., que assim veio a resolver o seu contrato de trabalho com justa causa, após se terem frustrado as negociações com vista à sua resolução por mútuo acordo, o que fez em 6 de outubro de 2022, por meio de carta dirigida ao gerente das RR.. Conclui por isso pela procedência da ação e pela condenação de ambas as rés nos pedidos acima referidos, por entender que a situação em apreço configura um caso de pluriemprego, a determinar a responsabilidade de ambas as rés na liquidação dos referidos créditos.


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Devidamente citadas as rés e realizada, sem êxito, a audiência de partes, apresentaram aquelas contestação, na qual impugnam, tal como também consta da sentença impugnada, a generalidade da factualidade alegada na petição inicial e pugnam pela improcedência da ação, suscitando desde logo a questão da ilegitimidade da ré A..., Lda. para os termos da presente ação, por entenderem que sendo o autor trabalhador da 2ª ré à data da cessação do contrato, na sequência de cessão da posição contratual, a haver qualquer tipo de responsabilidade esta será em exclusivo da 2ª ré, negando que no caso se verifique uma situação de pluralidade de empregadores. Já quanto aos fatos, defendem as rés, antes de mais, a caducidade do direito do autor de resolver o contrato com justa causa, por o ter feito para além dos 30 dias subsequente ao conhecimento dos fatos que motivaram tal resolução. De qualquer forma, e segundo alegam as rés, não são verdadeiros os factos alegados pelo autor no que respeita à sua alegada “despromoção”, dizendo que em 28 de outubro de 2020 o autor passou a ser trabalhador da 2ª ré, o que por este foi aceite, passado então a ter como principal função a gestão do projeto da B..., sem prejuízo de poder continuar a providenciar apoio à gestão das termas, nomeadamente, na parte administrativa e contabilística, continuando o seu local de trabalho a ser nas E.... Mais alegaram que em janeiro de 2021, a 1ª ré contratou como consultor externo o Dr. CC, com funções na área do marketing e comunicação, com vista ao relançamento da atividade da 1ª ré. Sucede que o autor não se adaptou à nova realidade da empresa, assumindo uma postura propoente e arrogante, não desenvolvendo também trabalho no âmbito do projeto B.... Foi nesse contexto que, em 18 de julho, a gerência reuniu com o autor, na presença do novo consultor, tendo nessa reunião o sócio-gerente expressado a sua insatisfação relativamente ao trabalho prestado pelo autor e a necessidade imperiosa de passar a ser completamente cumprida a cessão da posição contratual de 2020, propondo ainda que o autor passasse a desempenhar as suas funções no escritório sito em ..., passando a deslocar-se a ... apenas uma vez por semana. Tudo isto foi explicado pelo sócio-gerente, tendo este ainda colocado à consideração do autor que, se essa fosse a sua vontade, a empresa estaria disponível para negociar uma eventual revogação contratual por acordo. Alegam ainda as rés que no dia 20 de julho foi efetivamente celebrada uma reunião com a equipa das termas. Alegam depois que no dia 1 de agosto o autor lhes comunicou que se as anteriores condições não fossem repostas iria optar por negociar um acordo para cessação do contrato, tendo começado desde logo a negociar um novo contrato com outra empresa, que ficou concluído ainda no mês de agosto.

Entretanto o autor entrou novamente de férias, levando consigo o carro da empresa, em claro desrespeito pelas instruções que lhe foram dadas, no sentido de a viatura apenas se destinar ao uso profissional e não exclusivo do autor, pelo que tendo o autor regressado a ... em 26 de agosto, a gerência ordenou que este entregasse a viatura. Alegam também as rés que as negociações com vista à cessação do contrato de trabalho continuaram durante o mês de setembro, as quais vieram a terminar por iniciativa da gerência, por ter tomado conhecimento de que o autor tinha sido já contratado por outra empresa, para iniciar funções em outubro. Por fim, alegam que o autor veio a resolver o contrato unilateralmente no dia 6 de outubro de 2022, não tendo a gerência reconhecido qualquer justa causa para resolução, razão pela qual sempre lhe será devido o valor referente ao aviso prévio em falta, no montante de 4.586,40, que deverá ser compensado com o valor dos créditos salariais peticionados pelo autor, no montante de 4.680,22€, tendo sido deduzido a este respeito pedido reconvencional. Concluem por isso pedindo a absolvição da instância da ré A..., Lda. (por força da exceção de ilegitimidade arguida) e, em todo o caso, a absolvição de ambas rés dos pedidos deduzidos.


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O autor apresentou resposta, defendendo a improcedência das exceções de ilegitimidade e caducidade arguidas, bem como a improcedência do pedido reconvencional deduzido, por entender não assistir às rés qualquer direito a ser indemnizadas pelo aviso prévio em falta, uma vez o autor resolveu o contrato com justa causa.

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II - Findos os articulados, não se realizou a audiência prévia, proferiu-se despacho de saneamento do processo com decisão no sentido da admissibilidade da reconvenção deduzida e da legitimidade processual passiva da ré A..., Lda.,

Foi dispensada a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas de prova e, no prosseguimento dos autos veio, a final, a ser proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte:

“Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência, decido:

I – Reconhecer a licitude da resolução do contrato de trabalho efetuada pelo trabalhador;

II – Condenar as rés “A..., LDA.” e “B..., LDA.,” solidariamente, a pagar ao autor AA:

a) A quantia de 55.011,67€, referente a indemnização por antiguidade, acrescida de juros vincendos após trânsito em julgado da sentença e até efetivo e integral pagamento;

b) A quantia de 4.688,22€, referente a créditos laborais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;

O que tudo perfaz a quantia global de 59.699,89€.

III – Absolver as rés do demais peticionado.

IV – Julgar improcedente a reconvenção deduzida, absolvendo o autor reconvindo AA do pedido”.


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III – Inconformadas vieram as rés apelar, alegando e concluindo:

(…).


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Contra-alegou o recorrido, concluindo:

(…).


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O Exmº PGA emitiu parecer fundamentado parecer no sentido no sentido de que “sem prejuízo de melhor entendimento, deverá ser concedido provimento ao recurso, por caducidade do direito à resolução do contrato por parte do trabalhador, nos termos do artº 395º, n.º 1 do Cód. do Trabalho, com as legais consequências”.

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O recorrido respondeu a este parecer

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Corridos os vistos legais cumpre decidir.

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IV – A 1ª instância considerou provada a seguinte factualidade:

Factos alegados pelo autor na petição inicial:

1) Em 12 de Outubro de 1998 o A. foi admitido ao serviço da C..., S.A., tendo as partes celebrado para o efeito um contrato de trabalho para o exercício de funções de Assistente de Gestão de Património, cfr. Doc. 1 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

2) Em outubro de 2008 a C..., S.A. fundiu-se por incorporação na D..., S.A. - cfr. Doc. 2 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

3) Tendo A. à data a categoria profissional de Adjunto da Direção Financeira.

4) Em fevereiro de 2009 foi atribuída ao A. a categoria profissional de Diretor de Balneário Termal - cfr. Doc. 4 junto e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

5) Em 27 de julho Agosto de 2016 as E... foram adquiridas pela 1ª R..

6) A partir desta data o A. acumulou várias novas funções, nomeadamente, a área financeira, gestão de tesouraria, a área de recursos humanos, a relação com várias entidades oficiais como a Associação das Termas de Portugal, a relação com as Termas Centro que tinha a gestão do PROVERE Termas Centro, a CIM da Beira Baixa, a relação com as demais entidade oficiais, a área comercial, a área de marketing, a responsabilidade sobre a manutenção, parques e jardins, serviços gerais, compras, que até então eram desempenhadas por outros Diretores da D..., S.A., os quais asseguravam as mesmas.

7) Em novembro de 2017 foi atribuída ao A. a categoria profissional de Diretor Geral das E... - cfr. Doc. 5 junto e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

8) A partir do mês de maio de 2020, além das funções que resultavam do seu contrato de trabalho, a empresa F..., Lda., da qual o A. era gerente à data, celebrou com a 1ª R. um contrato de prestação de serviços de contabilidade, a qual passou a ser assegurada diretamente por este, cfr. Doc. 6 e 7 juntos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

9) Até ao mês de maio de 2020 estes serviços vinham a ser prestados e assegurados à 1ª R. pela sociedade “H..., Lda.” pelo valor mensal de € 200,00 (duzentos euros), cfr. Doc. 8 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, valor esse que foi mantido pelo A., como acima referido.

10) Assim sendo, o A. passou a prestar o serviço de contabilidade em causa nas mesmas condições - € 200,00 (duzentos euros) por mês, cfr. resulta do Doc. 2 junto.

11) Em 28 de Outubro de 2020 a 1ª R. celebrou com o A. um acordo nos termos dos quais o contrato de trabalho do mesmo foi cedido para a 2ª R., mantendo a categoria e demais condições contratuais em vigor à data, tendo a 2ª R. assumido a responsabilidade pela antiguidade do A., cfr. Doc. 9 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

12) Sem prejuízo do acordado, além das funções de Diretor Geral na 1ª R. o A. passou a acumular igualmente as funções de Project Manager (Gestor de Projecto) na 2ª R..

13) De facto, não obstante o pagamento da sua remuneração ter passado a ser integralmente assegurado pela 2ª R., a verdade é que o A. se manteve sempre a prestar trabalho e a exercer funções em benefício das duas entidades.

14) Assim sendo, até à cessação do seu contrato de trabalho, o A. exerceu as seguintes funções a favor da 1ª R:

(i) Gestão financeira - planeamento financeiro dos recursos, análise financeira dos balancetes, controlo orçamental, captação de recursos e de apoios financeiros, contratação de fornecedores, definição de preços, controlo de gastos, gestão de impostos, monitorização da faturação;

(ii) Gestão administrativa - coordenação de custos administrativos e operacionais, receção e tratamento da documentação da empresa, implementação de processos administrativos, financeiros operacionais e outros, implementação de medidas com o intuito de aumentar a produtividade, diminuir gastos e aumentar os lucros, supervisão de processos e medidas implementadas;

(iii) Gestão de recursos humanos - seleção e contratação de pessoal, definição de horários e escalas de trabalho preparação, planeamento de equipas de trabalho e distribuição plano de trabalhos, gestão e controlo de assiduidade do pessoal, de férias, de faltas, horas extraordinárias e banco de horas, Preparação de emissão de recibos de vencimento;

(iv) Gestão comercial - gestão e contacto de clientes nomeadamente, elaboração de maillings a clientes, elaboração de campanhas promocionais, elaboração de políticas comercias, contacto e acompanhamento dos clientes;

(v) Gestão operacional e de planeamento e organização da atividade – supervisão do funcionamento do Balneário Termal, de áreas de funcionais e respetivos tratamentos, elaboração, implementação e controlo do plano de análises técnicas (em função das definições das entidades oficiais), preparação e elaboração dos dados para o relatório clínico e para o relatório técnico a entregar a entidades oficiais, preparação e apresentação de dados estatísticos de acompanhamento da atividade;

(vi) Gestão de aprovisionamento – compras e gestão de stocks de productos e matérias utilizadas no balneário;

(vii) Gestão da manutenção, parques e jardins e serviços gerais - supervisão e acompanhamento dos serviços, definição e implementação do plano de intervenção e manutenção de equipamentos e espaços interiores e exteriores do balneário, aprovisionamento dos materiais e equipamentos.

15) De igual modo, o A. passou igualmente a exercer as seguintes funções a favor da 2ª R.:

(i) Gestão financeira - planeamento financeiro dos recursos, gestão de tesouraria, contratação de fornecedores, análise financeira dos balancetes, controlo orçamental, captação de recursos e de apoios financeiros, gestão de impostos;

(ii) Gestão administrativa - receção e tratamento da documentação da empresa,

(iii) Gestão e implementação de projetos - gestão documental do projeto para submissão da candidatura e pedidos de pagamento, preparação e tratamento de dados e outros elementos necessários à gestão da candidatura, gestão do cronograma geral de implementação do projeto, gestão do orçamento do projeto, elaboração de fichas de produto, seleção e avaliação de fornecedores, contacto com entidades consultoras, cálculos dos dados do projeto, desenvolver e implementar métricas e mapas de gestão para o acompanhamento e avaliação da execução do projeto.

16) Considerando que a 1ª R e a 2ª R. têm um dos mesmos membros de órgãos estatutários em comum, cfr. Doc. 10 e 11 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, em ambos os casos o A. reportava sempre ao Sr. BB, gerente das duas RR..

17) Todas as funções do A. eram exercidas nas E..., sede das RR., que sempre correspondeu ao seu local de trabalho.

18) Em 6 de Outubro de 2022 o A. comunicou por escrito ao gerente das RR. a resolução do seu contrato de trabalho com justa causa, nos termos que se transcrevem integralmente abaixo:

“Assunto: Resolução de contrato de trabalho com justa causa

Exmos. Senhores,

Tendo em consideração a persistente e continuada violação dos meus direitos laborais verificada nos últimos dois meses, venho por este meio comunicar a resolução com justa causa do contrato de trabalho que mantenho com a B..., LDA., cuja antiguidade se reporta a 12 de outubro de 1998.

Conforme exigido no n.º 1 do art. 395.º do Cód. Trabalho, venho indicar sucintamente os factos que justificam a resolução do meu contrato de trabalho com efeitos imediatos:

Como é do conhecimento de V. Exas., o meu contrato de trabalho foi inicialmente celebrado com a sociedade C... S.A., para exercer as funções de Assistente de Gestão de Património, tendo assumido no mês de fevereiro de 2009 a direção das E..., anteriormente explorada pela D..., S.A. por fusão com a anterior.

Em 1 de Agosto de 2016, com a transmissão do meu contrato de trabalho para a empresa A..., Lda (doravante apenas A...), que assumiu a exploração das E..., fui promovido à categoria de Diretor Geral das mesmas.

Sem prejuízo de sempre ter mantido as minhas funções de Diretor Geral das E..., por determinação e no interesse de V. Exas. o meu contrato de trabalho passou formalmente para outra empresa, a B..., Lda. (doravante apenas B...), com efeitos a 29 de outubro de 2020.

Desde essa data, e sem prejuízo de não ter havido qualquer revisão das minhas condições retributivas, passei a acumular as funções de Diretor Geral das E..., com as funções de Project Manager da B.... Esta situação configura, salvo melhor entendimento, pelo menos uma situação de pluralidade de empregadores nos termos previstos no artigo 101.º do Código do Trabalho.

Uma vez que a gerência das duas empresas é a mesma, continuei a reportar à mesma pessoa – o Dr. BB -, o meu local de trabalho manteve-se inalterado, mas o pagamento da minha remuneração passou a ser integralmente suportado pela B....

E assim continuou até ao dia 18 de Julho de 2022, em que fui convocado para uma reunião com a gerência, na pessoa do Dr. BB, e onde esteve presente o consultor externo Sr. CC, recentemente contratado para assumir funções relacionadas com a componente comercial e de marketing/comunicação das E....

Nesta reunião foi-me transmitido pela gerência que V. Exas. não estavam satisfeitos com o meu trabalho nas E..., designadamente por, devido a limitações familiares, eu não estar disponível para trabalhar ao fim-de-semana (sem qualquer acréscimo remuneratório, refira-se), que consideravam que eu tinha cristalizado na minha evolução como trabalhador e que não tinha perfil para me manter no meu cargo de Diretor Geral. Ou seja, nunca esteve em causa qualquer incumprimento das minhas obrigações enquanto V. trabalhador.

Por este motivo, foi-me igualmente comunicado que pretendiam que eu deixasse de trabalhar nas E..., alterando o meu local de trabalho para as G..., outra empresa do “grupo” do gerente em causa, com escritório em ..., e que passasse a exercer exclusivamente as funções de Project Manager da B..., deixando assim de ocupar a posição de Director Geral das Termas.

Por fim, fui interpelado de que ou aceitava esta alteração às minhas condições contratuais ou teria de sair da empresa, estando a B... disponível para pagar a indemnização necessária atenta a antiguidade reconhecida no meu contrato de trabalho.

Como se recordarão, não tive condições para dar uma resposta imediata uma vez que esta situação me apanhou completamente de surpresa, tendo apenas procurado refutar e justificar as acusações que me estavam a ser injustamente imputadas.

Como acima já referido, esta conversa foi mantida na presença do outro colaborador recentemente contratado pela A..., o Sr. CC, o que foi altamente humilhante e vexatório para mim, não só por eu ocupar, até então, a posição hierárquica mais alta nas E..., tendo ficado totalmente desautorizado perante o mesmo, mas também por eu ser um trabalhador com grande antiguidade na empresa que não merecia o tratamento a que fui sujeito.

Na sequência desta reunião foi logo determinado pela gerência que a partir daquele dia iria apenas 1 dia por semana (às 3ª-feiras) às E... para levantar os depósitos e entregar os mesmos no banco, e que o restante trabalho teria de o realizar nas instalações das G..., em ..., para onde seria alterado o meu local de trabalho, devendo no dia 20 de Julho deslocar-me às Termas para ir levantar a documentação necessária para o efeito.

No dia 20 de Julho, sem me dar qualquer informação prévia ou antes que eu pudesse ter dado o meu acordo a qualquer alteração às minhas funções (o que nunca sucedeu!), o gerente convocou uma reunião com todos os colaboradores a exercer funções nas E..., onde, acompanhado do Sr. CC, informou que ia haver uma alteração interna e que este colaborador passaria a ser o responsável pelas E... e por coordenar todo o pessoal, bem como chefiar a receção, contactar com os clientes e inclusivamente coordenar todo o relacionamento com os médicos – funções exercidas exclusivamente por mim até esta data e que eu apenas ficaria com a parte backoffice, pelo que deixaria de ter ai o meu local de trabalho e que doravante qualquer assunto das Termas e dos colaboradores deixava de ser tratado comigo e passaria a ser tratado com o Sr. CC, que me iria substituir nestas funções.

Na sequência do ocorrido, totalmente indignado com esta situação, no dia 22 de Julho tentei reunir com a gerência para manifestar a minha posição sobre o assunto, mas sem sucesso, tendo-me sido transmitido que teria de ficar para depois das minhas férias (já previamente marcadas de 25 a 29 de Julho) por indisponibilidade para o efeito nesse dia.

No dia 1 de agosto, na reunião realizada com a gerência após o meu regresso de férias, transmiti que não estava de acordo com a alteração das minhas funções, razão pela qual aceitava a proposta de cessação do meu contrato de trabalho, por ser a única alternativa viável para mim.

A pedido da gerência aceitei manter-me em funções até ao final do mês de Agosto, nas condições unilateralmente exigidas pela gerência - até porque o advogado da empresa se encontrava de férias até ao início do mês de Setembro -, o que ingenuamente assenti por ser com um carácter temporário e por recear entrar em litígio com a empresa (o que lamentavelmente acabou por acontecer).

Após o meu regresso do gozo de mais uma semana férias (de 22 a 26 de Agosto, também previamente marcadas), sem prejuízo de ter mantido segredo sobre a situação, tal como me fora solicitado pela gerência, foi-me imediatamente exigido que entregasse o carro que me havia sido atribuído para uso total (ou seja, também para assegurar a minha deslocação de casa para as E... e para ser utilizado nas férias e no fim-de-semana), para compensar o facto de a minha remuneração não ser atualizada há muito tempo, mesmo depois de eu passar a acumular as duas posições nas duas empresas.

Perante a minha discordância desta decisão, até porque necessitava do carro para me deslocar para o meu local de trabalho, foi-me transmitido que passaria a ser alguém da empresa a transportar-me de casa para o trabalho, o que naturalmente eu não poderia aceitar, por ser altamente humilhante para mim, que já fui responsável máximo das E....

Nessa medida, e considerando que já me tinham sido retiradas unilateralmente as funções de Diretor Geral das E... – as quais foram distribuídas à gerência e a outros trabalhadores da empresa - e que agora estavam a ser-me retirados benefícios a que tenho legalmente direito, a permanência no trabalho passou a ser totalmente insustentável.

Uma vez que se tratava de uma situação temporária – apenas durante a preparação do processo de cessação do meu contrato de trabalho – foi acordado com a gerência que eu ficaria a gozar férias até ao final do processo, tendo eu inclusive aceite gozar antecipadamente as férias já correspondentes ao presente ano.

Não obstante, e apesar de ter continuado a exercer todas as funções que me foram sendo exigidas durantas as férias, tendo sido obrigado a passar os assuntos para outros trabalhadores mesmo sem o acordo “fechado”, o processo de negociação da cessação do meu contrato de trabalho foi-se arrastando no tempo, não sei com que intenção, o que, naturalmente, me provocou um grande desgaste psicológico.

Como não aceitei a proposta que me foi inicialmente apresentada pela empresa - não tendo concordado em prescindir do que considerava ser justo e ser-me legalmente devido (até porque não estava aqui em causa qualquer extinção de posto de trabalho, como resulta do acima referido) - comecei a ser pressionado pela gerência, tendo inclusive sido ameaçado que seria obrigado a voltar ao trabalho nas condições laborais determinadas sem o meu acordo pela empresa, o que a meu ver é ilegal, não tendo já quaisquer condições psicológicas para isso.

Por fim, no passado dia 28 de setembro, na sequência das notícias que foram divulgadas nos meios de comunicação social sobre as A... e a B..., e que me são totalmente alheias, a gerência determinou terminar as negociações em curso com vista à cessação do meu contrato de trabalho no dia 30 de Setembro de 2022, bem como exigir o meu regresso ao trabalho com as condições anteriormente determinadas de forma unilateral (ou seja, deixar as funções de Diretor Geral das E...).

Uma vez que eu nunca dei o meu acordo às alterações que foram unilateralmente impostas pela gerência da A... e da B... às minhas condições de trabalho, entendo que está aqui em causa uma ordem ilícita que eu não posso, nem vou aceitar.

Nos termos do artigo 118.º do Código do Trabalho, o trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à atividade para que se encontra contratado, devendo o empregador atribuir-lhe, no âmbito da referida atividade, as funções mais adequadas às suas aptidões e qualificação profissional.

É proibido ao empregador exercer pressão sobre o trabalhador para que atue no sentido de influir desfavoravelmente nas suas condições de trabalho, bem como mudar o trabalhador para categoria inferior conforme previsto no artigo 129.º do Código do Trabalho, alíneas c) e e), respetivamente.

Assim sendo, não existe nenhuma justificação válida para eu não continuar a executar as funções de Diretor Geral das E... para que fui contratado, razão pela qual a decisão de V. Exas. não pode deixar de consubstanciar uma violação grosseira de uma garantia laboral de que beneficio, o que, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 394.º do Cód. do Trabalho, constitui justa causa de despedimento.

Violação essa que tem tido um carácter continuado e que se mantém até hoje.

Nestes termos, a minha relação laboral tornou-se irremediavelmente insustentável devido ao comportamento culposo da gerência da A... e da B..., que, pela sua gravidade e consequências, tornou imediatamente impossível a subsistência da relação de trabalho, razão pela qual venho resolver o mesmo com efeitos imediatos.

Face ao exposto, e tendo em consideração a gravidade dos factos imputados à gerência da A... e da B... e que constituem justa causa de resolução do meu contrato de trabalho, venho desde já reclamar o pagamento de uma indemnização de valor não inferior a 30 dias de remuneração por cada ano de trabalho, nos termos previstos nos n.º 1 do art. 396.º do Cód. do Trabalho. Sobre este valor acrescem ainda os créditos laborais que se vencerão com a cessação do meu contrato de trabalho (proporcionais de férias e dos subsídios de férias e de Natal de 2022 e créditos por formação profissional não recebida).

Os montantes acima referidos deverão ser pagos no prazo máximo de 10 (dez) dias a contar da receção da presente comunicação, sob pena de recorrer aos meios judiciais com vista à cobrança dos mesmos.

Sem mais assunto de momento, apresento os meus melhores cumprimentos, AA” - cfr. Doc. 12 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

19) Na sequência desta comunicação a 2ª R. remeteu ao AA. uma declaração da situação de desemprego, aí indicando que que o A. havia simplesmente denunciado o seu contrato de trabalho, bem como o certificado de trabalho - cfr. Doc. 13 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

20) Adicionalmente, no dia 21 de outubro de 2022 o A. recebeu a resposta da 2ª R. à comunicação acima referida, onde a mesma não reconhece a existência de justa causa na resolução do seu contrato de trabalho, recusando, por isso o pagamento de qualquer compensação por conta da mesma - cfr. Doc. 14 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

21) As RR. também não pagaram qualquer montante ao A. por conta dos créditos laborais que se venceram com a cessação do contrato, tendo invocado inclusive deter um crédito sobre o mesmo em virtude de o A. não ter respeitado o pré-aviso legal para a denúncia unilateral do seu contrato de trabalho, como resulta do Doc. 14 junto e do Doc. 15 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

22) Em resposta, o A. enviou a comunicação cuja cópia se dá por integralmente reproduzira e junto como Doc. 16, onde não se reconhece devedor de quaisquer quantias e se disponibiliza para assinar quaisquer recibos de vencimento que estejam em falta – tal como solicitado pela 2ª R.

23) Os gerentes da RR. e todos os seus trabalhadores tinham perfeito conhecimento que a categoria profissional do A. há muito anos era a de Diretor Geral.

24) Esta categoria era a que constava na assinatura dos seus e-mails desde Novembro de 2017 até à cessação do seu contrato de trabalho, como resulta, a título de exemplo das comunicações enviadas tanto ao gerente das RR., como a terceiros, nomeadamente em 24 de Novembro de 2017, 29 de Novembro de 2017, 13 de Dezembro de 2017, 11 de Janeiro de 2018, 11 de Janeiro de 2018, 14 de Fevereiro de 2018 e 9 de Março de 2018 - cfr. Doc. 17 a 22 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais

25) Do mesmo modo, no Relatório e Contas de 2018 e de 2019 da 1ª R., assinados pelo gerente das RR. BB, consta expressamente, na sua página 4, que as E... têm 1 Diretor-geral - cfr. Doc. 23 e 24 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

26) Em setembro de 2020 o gerente das RR. aprovou o conteúdo do novo cartão de visita do A. onde constava expressamente a categoria profissional de Director-Geral das E... - cfr. Doc. 25 que ora se juntam e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

27) A categoria profissional de Diretor-geral constava em todos os documentos externos em que o A. já era formalmente trabalhador da 2ª R., tal como sucedia enquanto era formalmente trabalhador da 1ª R., como acima referido.

28) Assim o documento assinado pelo gerente da 2ª R. com vista ao renting da viatura que foi atribuído ao A., onde consta expressamente a categoria profissional do mesmo - cfr. Doc. 25 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

29) Ou o Certificado de Trabalho que entregaram ao A. na sequência da cessação do seu contrato de trabalho (cfr. Doc. 15 já junto), em que a 2ª R. reconheceu expressamente que o A. exerce funções nas E....

30) Com o acordo celebrado entre o A. e a 2ª R. o A. manteve na 2ª R. precisamente a mesma remuneração (ao cêntimo) que auferia na 1ª R., como resulta do último recibo por inteiro emitido pelo A. à 1ª R., em setembro de 2020, e do primeiro recibo por inteiro emitido à 2ª R., em novembro de 2020, cfr. Doc. 26 e 27 que ora se juntam e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

31) Não houve, assim, qualquer alteração nas funções do A. enquanto trabalhador da 1ª R. após a sua transição para o quadro de pessoal da 2ª R..

32) O Dr. CC foi contratado como consultor, através de outra sociedade, em janeiro de 2021, tendo começado a dar apoio de forma permanente, e não meramente pontual, nas E... apenas em agosto de 2021.

33) Efetivamente, no dia 18 de julho de 2022, o A. foi convocado para uma reunião com a gerência das RR., BB, e onde esteve presente o referido consultor externo, tal como reconhecido pela gerência das RR. na resposta enviada pelo gerente das RR. já junta como Doc. 14.

34) Nesta reunião foi transmitido ao A. pelo referido gerente que não estava satisfeito com o trabalho do A. nas E..., designadamente por, devido a limitações familiares o A. não estar disponível para trabalhar ao fim-de-semana, que consideravam que o A. tinha cristalizado na sua evolução como trabalhador e que não tinha perfil para manter no seu cargo de Diretor Geral.

35) Por este motivo, foi igualmente comunicado ao A. que pretendiam que o mesmo deixasse de trabalhar nas E..., alterando o seu local de trabalho para as G..., outra empresa do “grupo” do gerente em causa, com escritório em ..., e que passasse a exercer exclusivamente as funções de Project Manager da 2ª R., deixando assim de ocupar a posição de Diretor-geral das Termas na 1ª R.

36) Por fim, foi o A. interpelado de que ou aceitava esta alteração às suas condições contratuais ou teria de sair da empresa.

37) O A. não teve condições para dar uma resposta imediata ao “ultimato” que recebeu –“ou trabalhava ou a sociedade estava disponível para negociar a sua saída” – uma vez que esta situação apanhou o A. completamente de surpresa, tendo apenas procurado refutar e justificar as acusações que lhe estavam a ser imputadas.

38) Como acima já referido, esta conversa foi mantida na presença do outro colaborador recentemente contratado pela 1ª R., o Sr. CC, o que foi humilhante e vexatório para o A., não só por este ocupar, até então, a posição hierárquica mais alta nas E..., tendo ficado totalmente desautorizado perante o mesmo, mas também por o A. ser um trabalhador com grande antiguidade na empresa.

39) Esta determinação da alteração do local de trabalho do A. para as instalações das G..., em ..., efetivamente ocorreu.

40) Adicionalmente foi igualmente determinado pela gerência das RR. que a partir de 18 de julho de 2022 o A. iria apenas 1 dia por semana (às 3ª-feiras) às E... para levantar os depósitos e entregar os mesmos no banco, devendo no dia 20 de julho deslocar-se ao seu até então local de trabalho para ir levantar a documentação necessária para o efeito, conforme também reconhecido na resposta enviada pelo gerente das RR. junto como Doc. 14.

41) Nesse mesmo dia 20 de julho, sem dar qualquer informação prévia ao A., o gerente das RR. convocou uma reunião geral com todos os colaboradores da 1ª R., onde, acompanhado do Sr. CC, informou que ia haver uma alteração interna e que este colaborador passaria a ser o responsável pelas E... e por coordenar todo o pessoal, bem como chefiar a receção, contactar com os clientes e inclusivamente coordenar todo o relacionamento com os médicos.

42) As funções acima referidas eram, até à data, exercidas exclusivamente pelo A..

43) Mais comunicou o gerente das RR. que a partir daquela data o A. apenas ficaria com a parte backoffice, pelo que deixaria de ter o seu local de trabalho nas E....

44) Mais ainda, comunicou o gerente das RR. que doravante qualquer assunto das Termas e dos seus colaboradores deixava de ser tratado com o A. e passaria a ser tratado com o Sr. CC, que iria substituir o A. nestas funções.

45) Na sequência do ocorrido, totalmente indignado com esta situação, no dia 22 de julho o A. tentou reunir com a gerência das RR. para manifestar a sua posição sobre o assunto, mas sem sucesso, tendo-lhe sido transmitido que teria de ficar para depois das suas férias (já previamente agendadas de 25 a 29 de julho) por indisponibilidade para o efeito nesse dia.

46) No dia 1 de agosto, na reunião realizada com a gerência após o regresso de férias do A., o mesmo transmitiu que não estava de acordo com a alteração das suas funções, razão pela qual aceitava a proposta de cessação do seu contrato de trabalho, por ser a única alternativa viável para si.

47) A gerência das RR. pediu ao A. para se manter em funções até ao final do mês de agosto, nas condições unilateralmente impostas pela gerência - até porque o advogado da empresa se encontrava de férias até ao início do mês de Setembro.

48) O A. aceitou este pedido, por ser com um carácter temporário – apenas até ao final do seu contrato de trabalho - e por recear entrar em litígio com a gerência das RR..

49) Após o regresso do A. do gozo de mais uma semana férias (de 22 a 26 de Agosto, também previamente marcadas), sem prejuízo de ter mantido segredo sobre a situação, tal como lhe fora solicitado pela gerência, foi imediatamente exigido que entregasse o carro que lhe havia sido atribuído para uso total (ou seja, também para assegurar a sua deslocação de casa para as E... e para ser utilizado nas férias e no fim-de-semana),

50) Foi acordado com o gerente das RR. que as despesas incorridas fora do horário de trabalho que não fossem por motivo de trabalho e das deslocações de e para a residência do A. com gasolina e portagens deveriam ser suportadas pelo mesmo.

51) Carro esse que já havia sido entregue ao A. em 14 de Julho de 2022, data em que foi entregue pela Leaseplan ao A em ....

52) Foi confirmado à Leaseplan, empresa a quem a viatura foi adquirida, que o condutor habitual da mesma era o A. - cfr. Doc. 28 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais

53) Nessa medida, e considerando que a 2ª R. pretendia retirar unilateralmente ao A. as funções de Diretor Geral das E... – as quais foram distribuídas à gerência e a outros colaboradores de outras empresas do grupo – e que adicionalmente lhe estavam a ser retirados benefícios, a permanência no trabalho passou a ser totalmente insustentável para o A..

54) Uma vez que supostamente se tratava de uma situação temporária – apenas durante a preparação do processo de cessação do contrato de trabalho do A. – foi acordado com a gerência que o mesmo ficaria a gozar férias até ao final do processo, tendo o A. inclusive sugerido gozar antecipadamente as férias já correspondentes ao presente ano, que apenas se venceriam com a cessação do contrato, o que foi aceite pelas gerências das RR., - cfr. Doc. 29 a 31 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

55) O A. e a 2ª R. iniciaram, então, este processo de negociação durante o período em que o A. ficaria a gozar férias - cfr. Doc. 32 e 33 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

56) Não obstante, o A. continuou a exercer todas as funções que foram sendo exigidas ao A. durante as suas férias - cfr. Doc. 34 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais e Doc. 33 junto.

57) Tendo o A. sido obrigado a passar os assuntos para outros trabalhadores e colaboradores do grupo mesmo sem o acordo “fechado” - cfr. Doc. 35 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, o que criou a expectativa no A. de que já não iria regressar ao trabalho.

58) Do mesmo modo, o gerente das 2RR. determinou o afastamento do A. das suas funções habituais, tendo solicitado ao mesmo que procedesses aos procedimentos e comunicações necessárias em conformidade aos fornecedores, parceiros e entidades institucionais relacionadas com as atividades da 1ª R.- cfr. Doc. 36 a 38 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

59) O processo de negociação da cessação do seu contrato de trabalho foi-se arrastando no tempo, o que, naturalmente, provocou desgaste psicológico ao A..

60) O A. não aceitou a proposta que lhe foi inicialmente apresentada pelo gerente das RR. - cfr. Doc. 39 junto e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

61) E apresentou uma proposta de valor mais elevado, a qual foi desde logo recusada pela gerência.

62) O A. começou a ser pressionado pela gerência, tendo inclusive sido advertido de que seria obrigado a voltar ao trabalho nas condições laborais determinadas sem o seu acordo.

63) Nessa altura o A. apercebeu-se que não iria conseguir aguentar a pressão da gerência e acabou por aceitar, através da sua advogada, a proposta que lhe foi veiculada pelo advogado das RR..

64) Contudo, no passado dia 28 de Setembro, numa altura em que foram divulgadas notícias nos meios de comunicação social sobre as RR. E atribuição de fundos europeus, - cfr. Doc. 40 a 45 juntos e cujo teor de dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais –a gerência determinou terminar as negociações em curso com vista à cessação do contrato de trabalho do A. com efeitos a 30 de setembro de 2022.

65) Por este motivo, o gerente das RR. determinou o regresso do A. ao trabalho – não cessando o contrato, como previsto, o A. deixaria de ter direito a gozar as férias que venceriam nesse momento -, com as condições anteriormente determinadas (ou seja, deixando as funções de Diretor-geral das E... e alterando o seu local de trabalho para ...) – o que o autor não aceitou.

66) O A. reclamou das RR. o pagamento de uma indemnização de valor não inferior a 30 dias de remuneração por cada ano de trabalho, nos termos previstos nos n.º 1 do art. 396.º do Cód. do Trabalho, bem como o pagamento de todos os créditos laborais que se venceram com a cessação do seu contrato de trabalho (proporcionais de férias e dos subsídios de férias e de Natal de 2022 e créditos por formação profissional não recebida).

67) Tais créditos laborais importam em € 4.680,22 (quatro mil seiscentos e oitenta euros e vinte e dois cêntimos), o que corresponde à soma das seguintes verbas nos termos discriminados no respetivo recibo de vencimento junto como Doc. 15: (i) € 458,64 – remuneração do mês de outubro; (ii) € 625,42 – 6 dias de férias não gozadas; (iii) € 1.719,90 – proporcionais do subsídio de Natal de 2022; (iv) € 1.876,26 – proporcionais do subsídio de férias referente às férias de 2022;

Fatos alegados pelas rés na contestação:

68) a R. B... nasceu de um projeto, da iniciativa da gerência da A..., para dinamizar e publicitar a água das E..., através da sua comercialização para fins veterinários.

69) Como forma de aumentar o negócio das termas e vencer a crise, agravada pela pandemia COVID-19.

70) Pois que, na prática, não havia uma dissociação efetiva entre o balneário termal, em si e o desenvolvimento e comercialização de produtos.

71) Já que, a estratégia de revitalização das Termas passava pela implementação do projeto da B..., como estratégia de marketing para dar a conhecer ao mercado as propriedades terapêuticas da água de ..., atraindo mais utentes para as Termas e consequentemente, aumentar o volume de faturação.

72) A sede de ambas as sociedades é nas E....

73) Tendo gerência comum.

74) Com o nascimento do projeto da B... em 2020 e dada a sua importância estratégica, o acordo subjacente à transferência do A. assentava na ideia de que o A. iria acompanhar a implementação do projeto, beneficiário de fundos europeus.

75) Não foi alterada a categoria profissional do mesmo.

76) Dado que era necessária a obtenção de CAE farmacêutico e com vista à apresentação de candidatura do projeto ao programa de atribuição de fundos europeus, em outubro de 2020, os sócios da R. A... constituíram a R. B... – Cf. Doc. 10 junto com o requerimento inicial.

77) Por esse motivo, foi proposto ao A. que transitasse da R. A... para a R. B..., mantendo o estatuto profissional.

78) O autor ficou responsável pela gestão do projeto de utilização da água termal para fins veterinários, cuja submissão ao programa de incentivos à investigação e desenvolvimento tecnológico de projetos ocorreu pouco tempo depois.

79) Toda a candidatura foi elaborada pela empresa I..., Ld.ª – cf. Doc. 2 e 3 (contrato e fatura) juntos.

80) Em janeiro de 2021, a gerência da A... contratou como consultou externo, o senhor Dr. CC, com funções de auxílio à gerência para planear o programa de marketing e comunicação, a estratégia futura do balneário termal e ainda, planeamento de atividades lúdicas de Verão para relançamento da atividade.

81) Durante o mês de agosto, o autor estava já a negociar um novo contrato de trabalho com outra empresa, novo contrato esse que ficou negociado e concluído ainda no decorrer do mês de agosto de 2022.

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Factos não provados:

Não resultaram provados, nos presentes autos, os seguintes factos:

Factos alegados pelo autor na petição inicial:

1) O contrato de trabalho do A. transitou para a 2ª R. por motivos estritamente contabilísticos e por exclusivo interesse das RR., uma vez que a atividade exercida pela 2ª R. passou a ser financiada através de apoios externos que permitiam assegurar integralmente a remuneração do A..

2) O carro que foi atribuído para uso do autor servia para compensar o facto de a sua remuneração não ser atualizada há muito tempo, mesmo depois de o A. passar a acumular as duas posições nas RR..

3) Quando lhe foi determinado que entregasse o carro, perante a discordância do A. desta decisão, foi transmitido ao A. que passaria a ser alguém da empresa a transportar o mesmo de casa para o trabalho.

Fatos alegados pelas rés na contestação:

4) Com a transição para a B... o A. continuaria a assegurar o apoio à gestão do balneário termal, mas o seu foco principal era o projeto da B....

5) Desde final de 2020 o foco das funções do A. foi deslocado para o projeto da B....

6) Em 2020, a gestão comercial e de atividades passou a ser exercida diretamente pela gerência, ficando o A. com o projeto da B... e com o apoio à gestão administrativa.


***

IV – Como são as conclusões da alegação que, sem prejuízo das questões de que o tribunal conhece oficiosamente, delimitam o objeto do recurso, importa dilucidar e decidir as seguintes questões:

1. Se caducou o direito do autor em resolver o contrato com invocação de justa causa.

2. Na negativa se:

a) Se a matéria de facto deve ser alterada.

b) Se o autor resolveu com justa causa o contrato de trabalho.

c) Se a quantia arbitrada a título de indemnização por resolução por justa causa deve ser diminuída.

Da caducidade do direito à resolução:

O artigo 395.º, n.º 1 do Código de Trabalho estabelece o prazo de 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos que fundam a justa causa para o trabalhador comunicar ao empregador a resolução do contrato.

Trata-se de um prazo de caducidade.

A 1ª instância entendeu não ter ocorrido a invocada caducidade, lendo-se na sentença que “… no caso dos autos, entende-se, adiantando desde já conclusões, que a tanto a alegada alteração de funções, com a inerente alteração do local de trabalho (que constitui o núcleo duro da justa causa invocada), como a retirada do carro de serviço, se assumem como fatos instantâneos com efeitos duradouros.

Neste sentido, se decidiu, por exemplo, no Acórdão da Relação de Guimarães de 23.05.2019, disponível em www.dgsi.pt, onde se defende que “se o trabalhador não ficou em condições de avaliar as consequências para o cumprimento do contrato do facto constitutivo da justa causa para a sua resolução, ainda que instantâneo o prazo de caducidade para o exercício desse direito inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade do facto. Antes, quando, segundo a cognoscibilidade do trabalhador e no contexto da relação laboral, esse facto assuma tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir da então imediatamente impossível”.

Ora, dito isto, e transpondo as considerações acima tecidas para o domínio das infrações laborais, somos de entender que, no caso dos autos, a alteração de funções, aliada à alteração do local de trabalho e ao fato de ao autor deixar de ser atribuído um carro se assumem (independentemente de se verificarem ou não) como infrações instantâneas com efeitos duradouros.

E assim sendo, quando as Rés receberam a comunicação da resolução do contrato, em 1.10.2022, ainda não tinha decorrido o prazo de 30 dias a que alude o n.º 1 do artigo 395.º do CT.

Aqui chegados conclui-se, pois, que não se verifica a aludida caducidade do direito do autor de resolver o contrato com justa causa – o que se decide”.

A propósito desta questão, escreve DD in Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª edição. p. 530 que a interpretação-aplicação desta regar tem de fazer-se em articulação com a própria noção de justa causa, como tem sido salientado pelo tribunais. Significa isto que o prazo de inicia, não no momento do conhecimento da pura materialidade dos factos, mas sim quando no contexto da relação laboral assumem tal gravidade que a subsistência do contrato se torna imediatamente impossível, não sendo exigível ao trabalhador a manutenção daquela relação.

O ponto tem especial relevância nas situações em que os factos que integram justa causa de resolução revestem caráter duradouro, suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo.

(…)

Trata-se de uma explicitação de uma regra geral: residindo a justa causa na situação de impossibilidade de manutenção do vínculo contratual, o prazo para exercer o direito de resolução inicia-se quando ocorrer essa situação”

Assim, configurando-se a alteração das funções do autor e a alteração do seu local de trabalho como factos instantâneos com efeitos duradoiros a mera ocorrência desses factos pode, em algumas situações, conforme refere o EXmº PGA, não resultar de imediato, não obstante a sua gravidade, a impossibilidade ou inexigibilidade para o trabalhador na manutenção do seu contrato de trabalho pois a inexigibilidade dessa manutenção apenas poderá ocorrer em momento posterior, decorrente quer da persistência dos efeitos dos factos anteriormente ocorridos, quer do agravamento desses mesmos efeitos.

Sendo esta, ao que supomos, a corrente jurisprudencial maioritária, escreveu-se, no entanto, no acórdão desta relação de 28.09.202, p. 1512/21.8T8LRA. C1[1], consultável em www.dgsi.pt/jtrc que “em bom rigor, a letra do n.º 1 do art. 395.º do Código do Trabalho não consente a larga interpretação defendida pela apelante. A norma indica que a declaração de resolução do trabalhador com invocação de justa causa e com indicação sucinta dos factos que a justificam deve ser feita “nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos”, pelo que o conhecimento atendível é o dos factos ilícitos cometidos pelo empregador e não o do momento em que se cristaliza no espírito do trabalhador a impossibilidade de manter a relação laboral em presença de tais factos. Porém, é de considerar que os ditos factos podem sofrer um agravamento com o decurso do tempo no plano em que, por via desse decurso temporal, venham a gerar maiores danos na esfera pessoal ou pessoal/patrimonial do trabalhador. Estaremos nesse caso perante um agravamento da ilicitude e do efetivo potencial danoso, pelo que é aceitável atender a esse contexto em si mesmo como uma nova cadeia de “factos” relevante para o início do prazo de caducidade do direito de resolver o contrato de trabalho com justa causa.

É neste patamar de cuidado interpretativo que a jurisprudência tem caminhado, afirmando-se, por exemplo, como no caso do Ac. da Relação do Porto de 17-11-2014 (proc. 739/12.8TTMTS-A.P1) que “no caso de factos instantâneos com efeitos duradouros, suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo, aquele prazo inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir de então imediatamente impossível”. Situação esta, contudo, que importa compaginar bem com a letra da lei de modo a não afastar a realidade factual, em que o agravamento se traduz, da esfera da apreensibilidade ou cognoscibilidade dos factos mais precisos que balizam em concreto o início do prazo de caducidade. É por isso que muitas vezes só na presença do caso concreto se pode ponderar da verificação ou não da caducidade, no balanceamento do critério enunciado, tendo sempre presente que, como refere o Acórdão da Relação do Porto antes referido, citando Ricardo Nascimento (in “Da Cessação do Contrato de Trabalho - Em Especial por Iniciativa do Trabalhador”) o «necessário nexo cronológico entre a decisão de resolver o contrato e os factos invocados mais não constitui do que “uma manifestação do princípio da atualidade da justa causa que traduz a regra de que a resolução se deve seguir imediatamente à verificação da situação de impossibilidade, até em consonância com a finalidade do direito de resolução – evitar situações insustentáveis”».

Seja como for, no caso que nos ocupa, conforme bem assinala o Exmº PGA “não se pode, porém, deixar de trazer à colação, como bem salientam os recorrentes, o facto dado por provado sob o ponto 81) dos factos provados, qual seja: “Durante o mês de agosto, o autor estava já a negociar um novo contrato de trabalho com outra empresa, novo contrato esse que ficou negociado e concluído ainda no decorrer do mês de agosto de 2022”.

Desse facto não pode deixar de extrair-se a conclusão de que, se a alteração de funções e do local de trabalho, determinadas nas reuniões de 18 e 20 de julho de 2022, não foram por si só suficientes para que o A. tivesse entendido que a manutenção da sua relação de trabalho deixava de ser, de imediato, desde então, possível ou exigível, seguramente que esse entendimento estaria já cristalizado, sedimentado na mente do A., quer no momento em que o mesmo passou a negociar contrato com outra empresa, quer sobretudo, no momento em que efetivamente concluiu essa negociação - o que se verificou no decorrer de Agosto de 2022.

Desse modo, aquele prazo de caducidade de 30 dias iniciou-se, sempre, na melhor das hipóteses, antes do início de setembro de 2022.

Considerando, ainda, que a entrega do veículo automóvel (facto instantâneo) foi determinada ao A. no dia 26 de agosto de 2022, (o que o mesmo satisfez) é seguro concluir, entende-se, que, no dia 6 de Outubro de 2022, quando o A. remeteu ao gerente das RR. a comunicação referida no ponto 18 dos factos provados, nos termos e para os efeitos do artº 395º, n.º 1 do CT, o prazo de 30 dias aí referido já havia decorrido”.

Na verdade[2], se o autor negociou um novo contrato de trabalho com outra empresa, novo contrato este que ficou concluído ainda no decorrer do mês de agosto de 2022 é porque reconhece que o comportamento do empregadora fundamentador da resolução assumiu tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se tornou a partir de então imediatamente impossível, não lhe sendo exigível a manutenção daquela relação.

Entendemos que outra interpretação não pode resultar deste seu comportamento.

Se um trabalhador celebra um contrato de trabalho com determinada entidade quando ainda se encontra em vigor um contrato anterior celebrado com entidade diferente é porque interiorizou a vontade de acabar com este contrato.

Deste modo, concordamos inteiramente com o Exmº PGA quando conclui que o prazo de caducidade de 30 dias teve o seu início, sempre, na melhor das hipóteses, antes do início de setembro de 2022 e quando no dia 6 de outubro de 2022 o A. remeteu ao gerente das RR. a comunicação de resolução aquele prazo de 30 dias já havia decorrido.

Ou seja, no caso, ocorreu a caducidade do direito do autor à resolução do contrato sob a legação de justa causa.

E assim sendo, a resolução operada fez cessar o contrato de forma ilícita.

Esta ilicitude acarreta a consequência prevista no artº 401º do CT ex vi artº 399º do mesmo diploma[3] procedendo, assim, o pedido reconvencional.

Considerando o que consta dos recibos de vencimento juntos aos autos o salário base a considerar é no valor de € 2.293,20[4], sendo esta a quantia devida pelo autor às rés.

Tendo o direito à resolução caducado, fica prejudicada a apreciação das demais questões acima enunciadas com fazendo parte do objeto da apelação.


***

V Termos em que se delibera:

1. julgar a apelação totalmente procedente em função do que, na revogação decisão impugnada, se decide ter o autor resolvido ilicitamente o seu contrato de trabalho por ter caducado o respetivo direito.

2. julgar a reconvenção procedente indo o autor condenado a pagar às rés, a título de indemnização, a quantia de €2.293,20 nos termos dos artºs 399º e 401º do CT.

3. No mais, se mantendo a sentença impugnada.


***

Custas na ação e reconvenção a cargo do autor recorrido.

***

Sumário[5]:

(…).


*

Coimbra, 14 de junho de 2024

*

(Joaquim José Felizardo Paiva)

(Mário Sérgio Ferreira Rodrigues da Silva)

(Paula Maria Mendes Ferreira Roberto




[1] Relatado pelo agora Cons. Azevedo Mendes e em que o presente relator figurou como adjunto.
[2] Considerando ainda que a entrega do veículo se traduz num facto instantâneo e que esta entrega ocorreu em 26 de Agosto de 2022.
[3] O trabalhador está obrigado a pagar ao empregador uma indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades sem prejuízo de indemnização por danos causados pela inobservância do prazo de aviso prévio.
[4] Tal como refere o autor na p.i
[5] Da responsabilidade do relator.