Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
28/11.5GAAGD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
Data do Acordão: 05/23/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA – ÁGUEDA – JUÍZO DE INSTÂNCIA CRIMINAL – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: ALTERADA
Legislação Nacional: DEC. LEI 401/82 DE 23 DE SETEMBRO
Sumário: 1.- Pese embora a ponderação da aplicação do regime penal especial para jovens menores de 21 anos seja obrigatória, já não o é a sua aplicação, sendo para esse efeito essencial a demonstração de que um regime de punição mais atenuado irá proporcionar ao jovem o afastamento do crime.

2.- O regime aí previsto só deve ser aplicado, quando o juiz “tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado” e não houver prejuízo para a prevenção da criminalidade.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.
No processo supra identificado foi proferido acórdão que julgou procedente a acusação deduzida pelo Magistrado do Mº Pº, contra os arguidos:
- A..., … residente no … , Águeda.
- B..., residente na Rua … , Águeda.
Sendo decidido:
– Condenar cada um dos arguidos, pela prática, em coautoria, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão efetiva.
***
Inconformados, do acórdão interpuseram recurso os arguidos.
O arguido B... formula as seguintes conclusões na motivação e, que delimitam o seu objeto:

1.Em sede de motivação da decisão de facto, o douto acórdão recorrido começa por afirmar que "formou a sua convicção essencialmente com base no depoimento da testemunha ..., que na qualidade de ofendida relatou circunstanciada e pormenorizada os factos (...) não tendo qualquer dúvida em reconhecer ambos os arguidos como autor dos mesmos". Mais à frente acrescenta que "o mesmo se nos apresentou isentou, credível e consistente" e "o facto de a ofendida não ter gritado a pedir socorro (...) a mesma esclareceu que não o fez ter sido tudo muito rápido, não haver pessoas nas proximidades e conhecer perfeitamente os arguidos, estando pois em condições de os identificar às autoridades, como efetivamente fez".
2.Relativamente ao testemunho de ..., ... e ... são "testemunhas que mantêm uma relação de bastante proximidade com os arguidos, o que é suscetível de fragilizar a isenção e a credibilidade dos seus depoimentos". Por outro lado "não deixa de ser estranho que aquelas três testemunhas estejam em condições de garantir, como fizeram em julgamento, que na tarde em apreço os arguidos nunca se ausentaram desse local".
3.O Tribunal a quo baseou igualmente a sua convicção em documentos, nomeadamente as faturas relativas à compra do computador portátil e aos óculos de correção da ofendida e relatório da perícia médico-legal efetuada à ofendida.
4.Face ao exposto parece-nos óbvio, sempre com o devido respeito, que a fundamentação da decisão contida no douto acórdão recorrido, quanto aos factos julgados provados e não provados supra elencados, não satisfaz os requisitos constantes do n.º 2 do art. 374 do Código de Processo Penal, porquanto não se procede ao necessário exame crítico das provas nem, da sua leitura, é possível alcançar o percurso lógico que levou o Tribunal a formar a sua convicção.
5.Subordinado à epígrafe "Requisitos da sentença" dispõe o preceito supra mencionado: Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
6.A atual redação do n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal foi introduzida pela Lei 59/98, de 25.08, nela se aditando, em relação à anterior, a exigência de exame crítico das provas que, de resto, a jurisprudência e a doutrina já reclamavam.
7.À luz deste normativo, não pode o julgador limitar-se a indicar os concretos meios de prova em que fundou a sua convicção. Na verdade, ao exigir que da sentença conste o exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, a lei impõe que este descreva também - ainda que de forma concisa - o processo racional que conduziu à formação dessa convicção, indissociável da análise e valoração, perante o caso concreto, das diversas provas produzidas (motivos porque foram acolhidas ou repudiadas, quer examinadas em si mesmas, quer no confronto com outras).
8.Embora o nosso processo penal seja regido pelo princípio da livre apreciação da prova - segundo o qual, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador (artigo 127 do Código de Processo Penal) - essa liberdade de apreciação não poderá nunca confundir-se com uma apreciação arbitrária da prova produzida. Compreende-se, assim, que o princípio da livre apreciação da prova surja no nosso ordenamento processual penal temperado pela obrigatoriedade de fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto. Com efeito, só através do conhecimento dessa fundamentação (com a amplitude que a lei prevê) se poderá surpreender o percurso lógico e desse modo sindicar a convicção que formou, expressa nos factos dados como provados e não provados.
9.O cumprimento integral do n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal não é compatível com a simples indicação, por parte dos concretos meios em que fundou a sua convicção.
10.Ora, no início da motivação da decisão de facto, como já tivemos oportunidade de referir, o douto acórdão recorrido começa por dizer "formou a sua convicção ESSENCIALMENTE com base no depoimento da testemunha ....
11.Assim sendo, uma primeira questão pode colocar-se desde logo: qual o valor que foi atribuído às declarações da testemunha/ofendida ... Pinho de Oliveira prestadas na audiência de julgamento? FEZ-SE PROVA QUASE PLENA APENAS COM AS DECLARACÕES DA OFENDIDA?
12.O Douto Acórdão mais refere na sua motivação que a testemunha/OFENDIDA ... afirmou que "os arguidos são conhecidos como jovens violentos e de comportamentos desviantes, o que é corroborado pelos respetivos relatórios sociais junto aos autos". Pergunta-se: e se os arguidos fossem conhecidos na cidade como pessoas recatadas a decisão seria absolutória? Qual o peso que tais afirmações tomaram para formar a convicção do Tribunal a quo?
13.De realçar que as testemunhas ... Alves, ... e ... Arede Fernandes foram totalmente descredibilizadas pelo facto de conhecerem perfeitamente os arguidos e de manter uma relação bastante próxima com estes.
14.Mais! A testemunha/OFENDIDA reconheceu os arguidos no reconhecimento de pessoas a que se reportam os autos de fls. 52 a 59. Pergunta-se: conhecendo a ofendida os arguidos, não se torna fácil incrimina-los num reconhecimento em que é só fazer exclusão de partes?
15.Mais! Valorou-se nomeadamente o relatório da perícia médico-legal efetuada à ofendida a fls. 320 a 321. A Ofendida foi perentória no sentido de ter reconhecido desde o inicio da audiência e discussão em julgamento os arguidos. Pergunta-se: A FLS. 321 A OFENDIDA REFERE QUE "TERÁ SIDO INFLIGIDA POR DESCONHECIDOS, DURANTE UM ASSALTO". Salvo douta e melhor opinião tal facto mais não prova que a ofendida, pelos vistos, não conhecia assim tão bem os arguidos. Foi perentória em reconhecer o arguido A... nas suas declarações e na audiência de julgamento voltou a confirmar tal facto. Passado pouco mais de um mês refere no Relatório Médico-legal que se trataram de desconhecidos!
16.Com efeito, o necessário exame crítico das provas abrange, naturalmente TODAS AS PROVAS PRODUZIDAS, que o julgador deverá apontar, indiciando ainda o exato medido em que cada uma delas serviu para formar a sua convicção, expressa nos factos dados como provados e (ou) não provados.
17.Sabemos que as declarações da Ofendida foram tidos em conta e em que medida na decisão, da leitura da motivação da decisão de facto não é possível concluir de que modo e em que medida os restantes elementos probatórios ali mencionados contribuíram para a decisão de condenar os arguidos.
18.Afigura-se, assim, que o douto acórdão recorrido é nulo, nos termos das disposições conjugados dos artigos 374 n.º 2 e 379 n.º 1 al. a) do Código de Processo Penal, já que a respetiva fundamentação de facto não permite alcançar o processo racional, as regras da experiência ou os critérios lógicos de que o Tribunal a quo se socorreu para formar a sua convicção expressa nos factos supra mencionados (provados e não provados) e que veio a culminar na decisão condenatória do arguido B... por crime de roubo.
19.A consequência natural do reconhecimento do apontado vício consistiria, em princípio, na repetição do ato afetado (artigo 122 do Código de Processo Penal), com o reenvio dos autos à primeira instância para prolação, pelo Tribunal recorrido, de nova sentença, desta feita com integral observância do disposto no n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal.
20.Considerando, todavia, que do processo constam todos os elementos de prova necessários e que através do presente recurso se impugna igualmente a decisão proferida sobre a matéria de facto, crê-se não estar vedada a esse Venerando Tribunal a modificação dessa decisão (ao obrigo do artigo 431 do Código de Processo Penal) e, por essa via, o absolvição do arguido B... do crime de roubo.
21.Conforme resulta dos declarações da testemunha/Ofendida e dos testemunhas ... e ... não pode ser dado como provado os pontos 3 a 11 da matéria cada como provada:
"Nessas circunstâncias de tempo e lugar, os arguidos, A... e B..., acompanhados de outros dois indivíduos cujas identidades não foi possível apurar, apercebendo-se da presença da … , decidiram abordá-la, razão pela qual seguiram no seu encalço, caminhando atrás dela" (sublinhado nosso).
22.A ... apercebendo-se da movimentação dos arguidos e dos dois indivíduos que os acompanhavam, acelerou o passo.
23.Porém, aqueles quatro seguiram no seu encalço, tendo-a alcançado quando ela se encontrava junto a uns prédios.
24.Uma vez junto da ..., o arguido A... abordou-a pelas costas, puxando-lhe os braços para trás, ao mesmo tempo que o arguido B... lhe tirou a bolsa que ela trazia na mão e que continha os seus documentos pessoais (Cartão de Cidadão e Cartão de Estudante), pelo menos €6 em dinheiro, com valor facial variado, uns óculos de correção, no valor de €220, e um casaco.
25.De seguido, enquanto a ... ainda estava manietada pelo arguido A..., o arguido B... tentou tirar-lhe a mala que ela trazia a tiracolo e onde transportava um computador portátil de marca HP, modelo Compact, e respetivo carregador e ainda um carregador de telemóvel Nokia, tudo com um valor não inferior a €600, tendo aquela oposto resistência, ao mesmo tempo que dizia -ó...i, para".
26.Perante a resistência manifestada pela ..., o arguido B... desferiu-lhe um golpe com um objeto de características concretamente não apuradas, atingindo-a numa perna, junto ao pé, o que lhe provocou momentaneamente o desequilíbrio, tendo aquele arguido conseguido, assim, tirar-lhe a referida mala.
27.Os arguidos e os outros dois indivíduos que os acompanhavam, uma vez na posse dos referidos objetos, colocaram-se em fuga.
28.Ao ser atingida pelo referido golpe na perna, desferido pelo arguido B.... a ... sofreu um sofrimento que lhe causou dores e desconforto.
29.Os arguidos agiram de forma livre, voluntária, consciente e de comum acordo entre si e os outros dois indivíduos não identificados, com o propósito de se apoderarem e de fazerem seus os objetos supra descritos que a ... tinha no sua posse, mediante o uso de força, concretizado no facto do arguido A... a ter manietado e de o arguido B... lhe ter desferido um golpe com um objeto, impossibilitando-a assim de resistir, bem sabendo que tais objetos não lhes pertenciam, que agiam contra a vontade da respetiva dona e que os suas condutas eram proibidos pela lei penal."
30.Como é que a testemunha/Ofendida se apercebeu que os arguidos A... e B... se encontravam junto à cabine sendo certo que tal como é por ela referido estava lá bastantes pessoas, ideia corroborada pelo testemunho de ...! Mais. Como é que tem tanta certeza se até estava com pressa e virou para o lado do estação? Como é que teve o perceção de que os alegados arguidos e mais dois que supostamente a seguiram faziam parte do grupo que se encontrava junto à cabine?
31.Como é que o Tribunal a quo dá como matéria provada o ponto 3 afirmando que "apercebendo-se da presença da ..., decidiram abordá-la, razão pela qual seguiram no seu encalço, caminhando atrás dela"?
32.Nunca em momento algum a testemunha/Ofendida ... refere que acelerou o passo, logo o ponto 4 do matéria provado nunca o poderio ter sido como o foi dado como provado.
33.Mais! A testemunha/Ofendida ... refere no seu testemunho (supra transcrito) que não conhece os arguidos da escola onde estuda. Que apenas os conhece por vê-los por vezes em frente à Praça Pública, perto do Câmara e em vários sítios. Como é que tem tanta certeza e afirmou perentoriamente que foram eles e não outras pessoas que procederam ao alegado assalto?
34.Como é que o Tribunal o quo pode dar como provado que foi roubado o computador portátil se nem sequer a testemunha/ofendida ... foi capaz de garantir no tribunal que tinha tal objeto em sua posse? A testemunha/Ofendida percorreu sozinha o caminho que a levou da escola até à estação. Ninguém a viu com o computador. Bastará ao Tribunal a junção de uma fatura da compra de um computador para dar como provado que a mesma possuía tal objeto naquele dia e que o mesmo foi roubado pelos arguidos ora aqui em causa?
35.As testemunhas ... e ... , apesar de conhecerem os arguidos e de se relacionarem com eles foram perentórios em afirmar que os mesmos passaram toda a tarde (pelo menos desde as 16h30 até ó chegada dos NIC's) com eles no Café. Mais afirmaram que era prática de todos os dias se juntarem no Café, local de encontro de todos, para depois irem jogar futebol no sintético do Águeda. Só pelo facto de estes se relacionarem com os arguidos e estes serem conhecidos como jovens violentos e de comportamentos desviantes o testemunho de ambos foi sem mais colocado em causa! Pergunta-se: Quem mais poderia vir testemunhar a seu favor? As testemunhas têm conhecimento de facto de que os arguidos estiveram com eles toda a tarde no Café. Que mais será necessário provar? Além disso, resulta igualmente do depoimento da testemunha ... que quando tomaram conhecimento das acusações imputadas aos arguidos, se deslocaram ao posto da GNR para prestarem depoimento em como os mesmos não teriam saído do Café no período em causa nos autos. Por que razão não foi o seu pedido atendido, não lhes foram declarações e em momento algum o Ministério Público procurou obter esse mesmo depoimento como era de sua obrigação? Termos nós cidadão de primeira e cidadão de segunda? Ou é preciso ser-se arguido da "Face Oculta" para ter todas as garantias processuais tomadas em conta e todas as possibilidades de defesa dos mesmos?
36.Não é estranho também que no que respeita às lesões apenas as mesmas tenham sido observadas aquando do exame de perícia médico-legal, ao qual a testemunha/Ofendida faltou por duas vezes? (e não venham dizer que a mesma só por ter sido chamada à GNR, não poderia ter voltado ao Hospital para ficar ao menos com a prova que as lesões tinham sido praticadas naquele dia e com as características alegados pela mesma). A verdade é que não há um único registo do dia das alegados agressões quanto ao alegado ferimento infligido. Como é que o Tribunal a quo pode dar como provado "que é perfeitamente razoável (...) ter-se ausentado do Hospital já depois da triagem e de lhe terem colocado "betadine" no ferimento que tinha na perna por ter recebido um telefonema da GNR a solicitar a sua comparência no posto? Dita a experiência que o normal, em caso de alguém se encontrar ferido, receber primeiro os tratamentos devidos e só depois se deslocar à GNR para proceder à queixa. O Ministério Público que tem por competência provar a acusação que imputa aos arguidos, não juntou aos autos uma única testemunha que pudesse comprovar que as sequelas de que a mesma se queixou no Instituto de Medicina Médico-Legal em 08.08.2011 - quase dois meses após a alegada ocorrência - tenham sido efetivamente sofridas no dia em causa nos autos.
37.Mais: Porque é que a testemunha/Ofendida quando foi realizar o exame médico-legal declarou que "em dia que não sabe especificar, pelas 17h45, refere ter sofrido agressão com apertão e puxão que terá sido infligida por desconhecidos, durante um assalto"? (sublinhado nosso). Pergunta-se: em sede de declarações às autoridades não teve dúvidas de afirmar que os arguidos que procederam ao alegado roubo foram o A... e o B... e agora não sabe de quem se trata? A testemunha/Ofendida esqueceu-se aquando da feitura do exame e voltou a lembrar-se em sede de Audiência e discussão de julgamento de forma tão veemente?
38.Temos de um lado a versão da testemunha/Ofendida, sem qualquer base provatória apenas o que foi apalavrado pela mesma em sede de audiência e por outro a versão dos arguidos devidamente comprovada por testemunhas, que não podem deixar de ser credíveis pelo simples facto de se relacionarem com os arguidos.
39.Por tudo o que supra ficou dito e explanado os pontos 3 a 11 não podem ser dados como provados.
40.O crime de roubo é estruturalmente um furto qualificado pela violência, pela ameaça ou pela colocação da vítima na impossibilidade de resistir. Trata-se de um crime complexo, na medida em que o seu autor viola não só um bem jurídico de carácter patrimonial, mas ainda um bem jurídico eminentemente pessoal.
41.Tradicionalmente entendia-se que a violência implicava o emprego de força física, ainda que não haja dano para a integridade corporal, como por exemplo, amarrar, amordaçar ou encerrar a vítima. Todavia, atualmente, a doutrina e a jurisprudência inclinam-se para um conceito de violência mais abrangente, englobando a violência psíquica.
42.A ameaça supõe coerção moral e destina-se a produzir o medo.
Exige-se, porém, uma ameaça grave, que vise criar no espírito da vítima um fundado receio de grave e iminente mal, capaz de paralisar a reação contra o agente.
43.Como consequência da pretendida alteração da matéria de facto, nos termos sobreditos, deverá o arguido B... SER ABSOLVIDO DA PRÁTICA DE CRIME DE ROUBO PREVISTO E PUNIDO PELO ARTIGO 210 N.º 1 DO CÓDIGO PENAL.
44.Caso assim se não entenda deverá a pena ser SUBSTANCIALMENTE DIMINUIDA.
45.A apenas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a integração do agente na sociedade - art. 40 n.º 1 do C. Penal. O artigo 71 do Código Penal estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
46.Aduz o mesmo Ilustre Professor - As Consequências Jurídicas do Crime, §55 que "só finalidades relativas de prevenção geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reações específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face á violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contra fáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida".
47.Todavia em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa (ultrapassar a medida da culpa), pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor - in ob. cito §56 - "não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer conceção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; é precisamente esta circunstância que permite uma correto incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização".
48.Ou, em síntese: “A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efetivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas - sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa, deste modo, inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito Democrático. E a de, por essa via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos abusivos que ele possa suscitar".
49.Dentro desta medida de prevenção (proteção ótima e proteção mínima - limite inferior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentam, fixará o quantum concretamente adequado de proteção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
50.O artigo 71 n.º 2 do Código Penal, estabelece: "na determinação concreta da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte deste tipo de crime, depuserem a favor do agente ou, contra ele, considerando nomeadamente: O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; A intensidade do dolo ou da negligência; Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; As condições pessoais do agente e a sua situação económica; A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; A falta de preparação para manter a conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
51.As circunstâncias e critérios do artigo 71 do Código Penal devem contribuir tanto para codeterminar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor sentimento comunitário de afetação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmite indicações externa e objetivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.
52.As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes da fixação da medida das penas, em função da reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para a quietação dos sentimentos afetados na perturbação difusa dos pressupostos em que assentam a normalidade da vivência do quotidiano.
53.Porém, tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito, do agente do fado, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social no respeito pela essencialidade dos valores afetados".
54.As circunstâncias anteriores, contemporâneas e posteriores ao crime constantes da matéria de fado diminuem a ilicitude do facto e a culpa do arguido, pelo que a pena tem de ser atenuada. A condenação do arguido B...... a uma pena de prisão efetiva é excessiva, pelo que se o Tribunal entender que se deverá manter a condenação, esta deverá ser reduzida.
55.Da decisão recorrida resulta que, perante o estado de dúvida a que o Tribunal a quo chegou - dúvida insanável nos termos da prova produzida em sede de audiência e discussão em julgamento - escolheu a tese desfavorável ao arguido, com a consequente violação do princípio in dúbio pro reo.
56.Face à prova produzida não podia o Tribunal recorrido concluir pela condenação do arguido,
57.Na dúvida insanável a que se chegou com a prova produzida, o Tribunal a quo não podia valorar tal prova em prejuízo do arguido uma vez que, não existe em processo penal o ónus da alegação e de prova, face ao princípio da investigação que o domina sem contradição, com o princípio da acusação e da estrutura basicamente acusatória que o caracteriza - cfr. Figueiredo Dias, Direito Processo Penal, Vol. I, pág. 191 e segs. e 211 e segs., e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. 11, 1999, págs. 108 e segs..
58.Na valoração que fez da prova produzida em sede de audiência e discussão em julgamento o Tribunal recorrido violou o princípio in dúbio pro reo e o princípio da presunção de inocência do arguido e, consequentemente, violou o artigo 32 n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
59.Assim, deve reconhecer-se a existência do vício do erro notório na apreciação da prova e, por força dele, a violação do princípio in dúbio pro reo.
60.Na base do princípio in dúbio pro reo, está também a presunção de inocência do arguido, consagrada constitucionalmente - artigo 32 da Constituição da República Portuguesa.
61.Como é sabido, em processo penal vigora o princípio da presunção de inocência do arguido, com consagração constitucional (artigo 32 n.º 2 da Constituição da República Portuguesa e ainda na Declaração Universal dos Direitos do Homem, no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, "cuja primeira grande incidência, assenta fundamentalmente, na inexistência de ónus probatório do arguido em processo penal, no sentido de que o arguido não tem de provar a sua inocência para ser absolvido; um princípio In dubio pro reo; e ainda que o arguido não é mero objeto ou meio de prova, contraditor do acusador, com armas iguais as dele.
62.Na verdade, e em primeiro lugar, o princípio da presunção de inocência do arguido isenta-o do ónus de provar a sua inocência, a qual parece imposta (ou ficcionada) pela lei; o que carece de prova é o contraditório, ou seja, a culpa do arguido, concentrando a lei o esforço probatório na acusação.
63.Em segundo lugar, do referido princípio da presunção da inocência do arguido (embora não exclusivamente dele) decorre um princípio in dúbio pro reo, principio que, procurando responder ao problema da dúvida na apreciação do caso criminal e partindo da premissa de que o Juiz não pode terminar o julgamento com um non liquet, determina, que na dúvida quanto ao sentido em que aponta a prova feita, o arguido seja absolvido (vide Rui Patrício in "O princípio da presunção de inocência do arguido na fase de julgamento no atual processo penal português" - Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, págs. 93-94).
64.Dito isto, e salvo o devido respeito, estando em causa a liberdade do arguido, enquanto direito fundamental constitucionalmente consagrado, exigia-se mais do Tribunal recorrido, designadamente, e face à dúvida a que se chegou com a prova feita em sede de audiência e discussão de julgamento.
Deve o RECURSO ser julgado PROCEDENTE.
O arguido A... formula as seguintes conclusões na motivação e, que delimitam o seu objeto:
1.Em sede de motivação da decisão de facto, o douto acórdão recorrido começa por afirmar que "formou a sua convicção essencialmente com base no depoimento da testemunha ..., que na qualidade de ofendida relatou circunstanciada e pormenorizada os factos (…) não tendo qualquer dúvida em reconhecer ambos os arguidos como autor dos mesmos". Mais à frente acrescenta que "o mesmo se nos apresentou isentou, credível e consistente" e "o facto de a ofendida não ter gritado a pedir socorro (...) a mesma esclareceu que não o fez ter sido tudo muito rápido, não haver pessoas nas proximidades e conhecer perfeitamente os arguidos, estando pois em condições de os identificar às autoridades, como efetivamente fez".
2.Relativamente ao testemunho de ..., ... e ... são "testemunhas que mantêm uma relação de bastante proximidade com os arguidos, o que é suscetível de fragilizar a isenção e a credibilidade dos seus depoimentos". Por outro lado "não deixa de ser estranho que aquelas três testemunhas estejam em condições de garantir, como fizeram em julgamento, que na tarde em apreço os arguidos nunca se ausentaram desse loca".
3.O Tribunal a quo baseou igualmente a sua convicção em documentos, nomeadamente as faturas relativas à compra do computador portátil e aos óculos de correção da ofendida e relatório da perícia médico-legal efetuada à ofendida.
4.Face ao exposto parece-nos óbvio, sempre com o devido respeito, que a fundamentação da decisão contida no douto acórdão recorrido, quanto aos factos julgados provados e não provados supra elencados, não satisfaz os requisitos constantes do n,º 2 do art, 374 do Código de Processo Penal, porquanto não se procede ao necessário exame crítico das provas nem, da sua leitura, é possível alcançar o percurso lógico que levou o Tribunal a formar a sua convicção.
5.Subordinado à epigrafe "Requisitos da sentença" dispõe o preceito supra mencionado:
Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
6.A atual redação do n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal foi introduzida pela Lei 59/98, de 25.08, nela se aditando, em relação à anterior, a exigência de exame crítico das provas que, de resto, a jurisprudência e a doutrina já reclamavam.
7.À luz deste normativo, não pode o julgador limitar-se a indicar os concretos meios de prova em que fundou a sua convicção. Na verdade, ao exigir que da sentença conste o exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, a lei impõe que este descreva também - ainda que de forma concisa - o processo racional que conduziu à formação dessa convicção, indissociável da análise e valoração, perante o caso concreto, das diversas provas produzidas (motivos porque foram acolhidas ou repudiadas, quer examinadas em si mesmas, quer no confronto com outras).
8.Embora o nosso processo penal seja regido pelo princípio da livre apreciação da prova -segundo o qual, salvo, quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador (artigo 127 do Código de Processo Penal) - essa liberdade de apreciação não poderá nunca confundir-se com uma apreciação arbitrária da prova produzida. Compreende-se, assim, que o princípio da livre apreciação da prova surja no nosso ordenamento processual penal temperado pela obrigatoriedade de fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto. Com efeito, só através do conhecimento dessa fundamentação (com a amplitude que a lei prevê) se poderá surpreender o percurso lógico e desse modo sindicar a convicção que formou, expressa nos factos dados como provados e não provados.
9.O cumprimento integral do n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal não é compatível com a simples indicação, por parte dos concretos meios em que fundou a sua convicção.
10.Ora, no início da motivação da decisão de facto, como já tivemos oportunidade de referir, o douto acórdão recorrido começa por dizer "formou a sua convicção ESSENCIALMENTE com base no depoimento da testemunha ....
11.Assim sendo, uma primeira questão pode colocar-se desde logo: qual o valor que foi atribuído às declarações da testemunha/ofendida ... Pinho de Oliveira prestadas na audiência de julgamento? FEZ-SE PROVA QUASE PLENA APENAS COM AS DECLARAÇÕES DA ÓFENDIDA?
12.O Douto Acórdão mais refere na sua motivação que a testemunha/OFENDIDA ... afirmou que "os arguidos são conhecidos como jovens violentos e de comportamentos desviantes, o que é corroborado pelos respetivos relatórios sociais junto aos autos". Pergunta-se: e se os arguidos fossem conhecidos na cidade como pessoas recatadas a decisão seria absolutória? Qual o peso que tais afirmações tomaram para formar a convicção do Tribunal a quo?
13.De realçar que as testemunhas ..., ... e ... foram totalmente descredibilizadas pelo facto de conhecerem perfeitamente os arguidos e de manter uma relação bastante próxima com estes.
14.Mais! A testemunha/OFENDIDA reconheceu os arguidos no reconhecimento de pessoas a que se reportam os autos de fls. 52 a 59. Pergunta-se: conhecendo a ofendida os arguidos, não se torna fácil incrimina-los num reconhecimento em que é só fazer exclusão de partes?
15.Mais! Valorou-se nomeadamente o relatório da perícia médico-legal efetuada à ofendida a fls. 320 a 321. A Ofendida foi perentória no sentido de ter reconhecido desde o início da audiência e discussão em julgamento os arguidos. Pergunta-se: A FLS. 321 A OFENDIDA REFERE QUE "TERÁ SIDO INFLIGIDA POR DESCONHECIDOS, DURANTE UM ASSALTO". Salvo douta e melhor opinião tal facto mais não prova que a ofendida, pelos vistos, não conhecia assim tão bem os arguidos. Foi perentória em reconhecer o arguido A... nas suas declarações e na audiência de julgamento voltou a confirmar tal facto. Passado pouco mais de um mês refere no Relatório Médico Legal que se trataram de desconhecidos!
16.Com efeito, o necessário exame crítico das provas abrange, naturalmente TODAS AS PROVAS PRODUZIDAS, que o julgador deverá apontar, indiciando ainda a exata medida em que cada uma delas serviu para formar a sua convicção, expressa nos factos dados como provados e (ou) não provados.
17.Sabemos que as declarações da Ofendida foram tidas em conta e em que medida na decisão, da leitura da motivação da decisão de facto não é possível concluir de que modo e em que medida os restantes elementos probatórios ali mencionados contribuíram para a decisão de condenar os arguidos.
18.Afigura-se, assim, que o douto acórdão recorrido é nulo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 374 n.º e 379 n.º 1 al. a) do Código de Processo Penal, já que a respetiva fundamentação de facto não permite alcançar o processo racional, as regras da experiência ou os critérios lógicos de que o Tribunal a quo se socorreu para formar a sua convicção expressa nos factos supra mencionados (provados e não provados) e que veio a culminar na decisão condenatória do arguido A... por crime de roubo.
19.A consequência natural do reconhecimento do apontado vício consistiria, em principio, na repetição do ato afetado (artigo 122 do Código de Processo Penal), com o reenvio dos autos à primeira instância para prolação, pelo Tribunal recorrido, de nova sentença, desta feita com integral observância do disposto no n.º 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal.
20.Considerando, todavia, que do processo constam todos os elementos de prova necessários e que através do presente recurso se impugna igualmente a decisão proferida sobre a matéria de facto, crê-se não estar vedada a esse Venerando Tribunal a modificação dessa decisão (ao abrigo do artigo 431 do Código de Processo Penal) e, por essa via, a absolvição do arguido A... do crime de roubo.
21.Conforme resulta das declarações da testemunha/Ofendida ... e das testemunhas ... Alves e ... Arede Fernandes não pode ser dado como provado os pontos 3 a 11 da matéria cada como provada:
"Nessas circunstâncias de tempo e lugar, os arguidos, A...: e B..., acompanhados de outros dois indivíduos cujas identidades não foi possível apurar, apercebendo-se da presença da ..., decidiram abordá-la, razão pela qual seguiram no seu encalço, caminhando atrás dela" (sublinhado nosso).
22.A ... apercebendo-se da movimentação dos arguidos e dos dois indivíduos que os acompanhavam, acelerou o passo.
23.Porém, aqueles quatro seguiram no seu encalço, tendo-a alcançado quando ela se encontrava junto a uns prédios.
24.Uma vez junto da ..., o arguido A... abordou-a pelas costas, puxando-lhe os braços para trás, ao mesmo tempo que o arguido B... lhe tirou a bolsa que ela trazia na mão e que continha os seus documentos pessoais (Cartão de Cidadão e Cartão de Estudante), pelo menos €6 em dinheiro, com valor facial variado, uns óculos de correção, no valor de €220, e um casaco.
25.De seguida, enquanto a ... ainda estava manietada pelo arguido A..., o arguido B... tentou tirar-lhe a mala que ela trazia a tiracolo e onde transportava um computador portátil de marca HP, modelo Compact, e respetivo carregador e ainda um carregador de telemóvel Nokia, tudo com um valor não inferior a €600, tendo aquela oposto resistência, ao mesmo tempo que dizia –Ó …, para".
26.Perante a resistência manifestada pela ..., o arguido B... desferiu-lhe um golpe com um objeto de características concretamente não apuradas, atingindo-a numa perna, junto ao pé, o que lhe provocou momentaneamente o desequilíbrio, tendo aquele arguido conseguido, assim, tirar-lhe a referida mala.
27.Os arguidos e os outros dois indivíduos que os acompanhavam, uma vez na posse dos referidos objetos, colocaram-se em fuga.
28.Ao ser atingida pelo referido golpe na perna, desferido pelo arguido B..., a ... sofreu um sofrimento que lhe causou dores e desconforto.
29.Os arguidos agiram de forma livre, voluntária, consciente e de comum acordo entre si e os outros dois indivíduos não identificados, com o propósito de se apoderarem e de fazerem seus os objetos supra descritos que a ... tinha na sua posse, mediante o uso de força, concretizada no facto do arguido A... a ter manietado e de o arguido B... lhe ter desferido um golpe com um objeto, impossibilitando-a assim de resistir, bem sabendo que tais objetos não lhes pertenciam, que agiam contra a vontade da respetiva dona e que as suas condutas eram proibidas pela lei penal."
30.Como é que a testemunha/Ofendida se apercebeu que os arguidos A... e B... se encontravam junto à cabine sendo certo que tal como é por ela referido estava lá bastantes pessoas, ideia corroborada pelo testemunho de ...! Mais. Como é que tem tanta certeza se até estava com pressa e virou para o lado da estação? Como é que teve a perceção de que os alegados arguidos e mais dois que supostamente a seguiram faziam parte do grupo que se encontrava junto à cabine?
31.Como é que o Tribunal a quo dá como matéria provada o ponto 3 afirmando que "apercebendo-se da presença da ..., decidiram abordá-la, razão pela qual seguiram no seu encalço, caminhando atrás dela"?
32.Nunca em momento algum a testemunha/Ofendida ... refere que acelerou o passo, logo o ponto 4 da matéria provada nunca o poderia ter sido como o foi dado como provado.
33.Mais! A testemunha/Ofendida ... refere no seu testemunho (supra transcrito) que não conhece os arguidos da escola onde estuda. Que apenas os conhece por vê-los por vezes em frente iao Praça Pública, perto da Câmara e em vários sítios. Como é que tem tanta certeza e afirmou perentoriamente que foram eles e não outras pessoas que procederam ao alegado assalto?
34.Como é que o Tribunal o quo pode dar como provado que foi roubado o computador portátil se nem sequer a testemunha/ofendida ... foi capaz de garantir no tribunal que tinha tal objeto em sua posse? A testemunha/Ofendida percorreu sozinha o caminho que a levou da escola até à estação. Ninguém a viu com o computador. Bastará ao Tribunal a junção de uma fatura da compra de um computador para dar como provado que a mesma possuía tal objeto naquele dia e que o mesmo foi roubado pelos arguidos ora aqui em causa?
35.As testemunhas ... e ..., apesar de conhecerem os arguidos e de se relacionarem com eles foram perentórios em afirmar que os mesmos passaram toda a tarde (pelo menos desde as 16h30 até ó chegada dos NIC's) com eles no café. Mais afirmaram que era prática de todos os dias se juntarem no Café, local de encontro de todos, para depois irem jogar futebol no sintético do Águeda. Só pelo facto de estes se relacionarem com os arguidos e estes serem conhecidos como jovens violentos e de comportamentos desviantes o testemunho de ambos foi sem mais colocado em causa! Pergunta-se: Quem mais poderia vir testemunhar a seu favor? As testemunhas têm conhecimento de facto de que os arguidos estiveram com eles toda a tarde no Café. Que mais será necessário provar? Além disso, resulta igualmente do depoimento da testemunha ... que quando tomaram conhecimento das acusações imputadas aos arguidos, se deslocaram ao posto da GNR para prestarem depoimento em como os mesmos não teriam saído do Café no período em causa nos autos. Por que razão não foi o seu pedido atendido, não lhes foram declarações e em momento algum o Ministério Público procurou obter esse mesmo depoimento como era de sua obrigação? Termos nós cidadão de primeira e cidadão de segunda? Ou é preciso ser-se arguido da "Face Oculta" para ter todas as garantias processuais tomadas em conta e todas as possibilidades de defesa dos mesmos?
36.Não é estranho também que no que respeita às lesões apenas as mesmas tenham sido observadas aquando do exame de perícia médico-legal, ao qual a testemunha/Ofendida faltou por duas vezes? (e não venham dizer que a mesma só por ter sido chamada à GNR, não poderia ter voltado ao Hospital para ficar ao menos com a prova que as lesões tinham sido praticadas naquele dia e com as características alegados pela mesma). A verdade é que não há um único registo do dia das alegados agressões quanto ao alegado ferimento infligido. Como é que o Tribunal a quo pode dar como provado "que é perfeitamente razoável (...) ter-se ausentado do Hospital já depois da triagem e de lhe terem colocado "betadine" no ferimento que tinha na perna por ter recebido um telefonema da GNR a solicitar a sua comparência no posto? Dita a experiência que o normal, em caso de alguém se encontrar ferido, receber primeiro os tratamentos devidos e só depois se deslocar à GNR para proceder à queixa. O Ministério Público que tem por competência provar a acusação que imputa aos arguidos, não juntou aos autos uma única testemunha que pudesse comprovar que as sequelas de que a mesma se queixou no Instituto de Medicina Médico-Legal em 08.08.2011 - quase dois meses após a alegada ocorrência - tenham sido efetivamente sofridas no dia em causa nos autos.
37.Mais: Porque é que a testemunha/Ofendida quando foi realizar o exame médico-legal declarou que "em dia que não sabe especificar, pelas 17h45, refere ter sofrido agressão com apertão e puxão que terá sido infligida por desconhecidos, durante um assalto"? (sublinhado nosso). Pergunta-se: em sede de declarações às autoridades não teve dúvidas de afirmar que os arguidos que procederam ao alegado roubo foram o A... e o B... e agora não sabe de quem se trata? A testemunha/Ofendida esqueceu-se aquando da feitura do exame e voltou a lembrar-se em sede de Audiência e discussão de julgamento de forma tão veemente?
38.Temos de um lado a versão da testemunha/Ofendida, sem qualquer base provatória apenas o que foi apalavrado pela mesma em sede de audiência e por outro a versão dos arguidos devidamente comprovada por testemunhas, que não podem deixar de ser credíveis pelo simples facto de se relacionarem com os arguidos.
39.Por tudo o que supra ficou dito e explanado os pontos 3 a 11 não podem ser dados como provados.
40.O crime de roubo é estruturalmente um furto qualificado pela violência, pela ameaça ou pela colocação da vítima na impossibilidade de resistir. Trata-se de um crime complexo, na medida em que o seu autor viola não só um bem jurídico de carácter patrimonial, mas ainda um bem jurídico eminentemente pessoal.
41.Tradicionalmente entendia-se que a violência implicava o emprego de força física, ainda que não haja dano para a integridade corporal, como por exemplo, amarrar, amordaçar ou encerrar a vítima. Todavia, atualmente, a doutrina e a jurisprudência inclinam-se para um conceito de violência mais abrangente, englobando a violência psíquica.
42.A ameaça supõe coerção moral e destina-se a produzir o medo. Exige-se, porém, uma ameaça grave, que vise criar no espírito da vítima um fundado receio de grave e iminente mal, capaz de paralisar a reação contra o agente.
43.Como consequência da pretendida alteração da matéria de facto, nos termos sobreditos, deverá o arguido A... SER ABSOLVIDO DA PRÁTICA DE CRIME DE ROUBO PREVISTO E PUNIDO PELO ARTIGO 210 N.º 1 DO CÓDIGO PENAL.
44.Caso assim se não entenda deverá a pena ser SUBSTANCIALMENTE DIMINUIDA.
45.A apenas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a integração do agente na sociedade - art. 40 n.º 1 do C. Penal. O artigo 71 do Código Penal estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
46.Aduz o mesmo Ilustre Professor - As Consequências Jurídicas do Crime, §55 que "só finalidades relativas de prevenção geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reações específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face á violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contra fáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida".
47.Todavia em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa (ultrapassar a medida da culpa), pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor - in ob. cito §56 - "não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer conceção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; é precisamente esta circunstância que permite uma correto incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização".
48.Ou, em síntese: “A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efetivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas - sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa, deste modo, inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito Democrático. E a de, por essa via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos abusivos que ele possa suscitar".
49.Dentro desta medida de prevenção (proteção ótima e proteção mínima - limite inferior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentam, fixará o quantum concretamente adequado de proteção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
50.O artigo 71 n.º 2 do Código Penal, estabelece: "na determinação concreta da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte deste tipo de crime, depuserem a favor do agente ou, contra ele, considerando nomeadamente: O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; A intensidade do dolo ou da negligência; Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; As condições pessoais do agente e a sua situação económica; A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; A falta de preparação para manter a conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
51.As circunstâncias e critérios do artigo 71 do Código Penal devem contribuir tanto para codeterminar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor sentimento comunitário de afetação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmite indicações externa e objetivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.
52.As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes da fixação da medida das penas, em função da reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para a quietação dos sentimentos afetados na perturbação difusa dos pressupostos em que assentam a normalidade da vivência do quotidiano.
53.Porém, tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito, do agente do fado, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social no respeito pela essencialidade dos valores afetados".
54.As circunstâncias anteriores, contemporâneas e posteriores ao crime constantes da matéria de fado diminuem a ilicitude do facto e a culpa do arguido, pelo que a pena tem de ser atenuada. A condenação do arguido A... a uma pena de prisão efetiva é excessiva, pelo que se o Tribunal entender que se deverá manter a condenação, esta deverá ser reduzida.
55.Da decisão recorrida resulta que, perante o estado de dúvida a que o Tribunal a quo chegou - dúvida insanável nos termos da prova produzida em sede de audiência e discussão em julgamento - escolheu a tese desfavorável ao arguido, com a consequente violação do princípio in dúbio pro reo.
56.Face à prova produzida não podia o Tribunal recorrido concluir pela condenação do arguido,
57.Na dúvida insanável a que se chegou com a prova produzida, o Tribunal a quo não podia valorar tal prova em prejuízo do arguido uma vez que, não existe em processo penal o ónus da alegação e de prova, face ao princípio da investigação que o domina sem contradição, com o princípio da acusação e da estrutura basicamente acusatória que o caracteriza - cfr. Figueiredo Dias, Direito Processo Penal, Vol. I, pág. 191 e segs. e 211 e segs., e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. 11, 1999, págs. 108 e segs..
58.Na valoração que fez da prova produzida em sede de audiência e discussão em julgamento o Tribunal recorrido violou o princípio in dúbio pro reo e o princípio da presunção de inocência do arguido e, consequentemente, violou o artigo 32 n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
59.Assim, deve reconhecer-se a existência do vício do erro notório na apreciação da prova e, por força dele, a violação do princípio in dúbio pro reo.
60.Na base do princípio in dúbio pro reo, está também a presunção de inocência do arguido, consagrada constitucionalmente - artigo 32 da Constituição da República Portuguesa.
61.Como é sabido, em processo penal vigora o princípio da presunção de inocência do arguido, com consagração constitucional (artigo 32 n.º 2 da Constituição da República Portuguesa e ainda na Declaração Universal dos Direitos do Homem, no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, "cuja primeira grande incidência, assenta fundamentalmente, na inexistência de ónus probatório do arguido em processo penal, no sentido de que o arguido não tem de provar a sua inocência para ser absolvido; um princípio In dubio pro reo; e ainda que o arguido não é mero objeto ou meio de prova, contraditor do acusador, com armas iguais as dele.
62.Na verdade, e em primeiro lugar, o princípio da presunção de inocência do arguido isenta-o do ónus de provar a sua inocência, a qual parece imposta (ou ficcionada) pela lei; o que carece de prova é o contraditório, ou seja, a culpa do arguido, concentrando a lei o esforço probatório na acusação.
63.Em segundo lugar, do referido princípio da presunção da inocência do arguido (embora não exclusivamente dele) decorre um princípio in dúbio pro reo, principio que, procurando responder ao problema da dúvida na apreciação do caso criminal e partindo da premissa de que o Juiz não pode terminar o julgamento com um non liquet, determina, que na dúvida quanto ao sentido em que aponta a prova feita, o arguido seja absolvido (vide Rui Patrício in "O princípio da presunção de inocência do arguido na fase de julgamento no atual processo penal português" - Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, págs. 93-94).
64.Dito isto, e salvo o devido respeito, estando em causa a liberdade do arguido, enquanto direito fundamental constitucionalmente consagrado, exigia-se mais do Tribunal recorrido, designadamente, e face à dúvida a que se chegou com a prova feita em sede de audiência e discussão de julgamento.
Deve o RECURSO ser julgado PROCEDENTE.
Respondeu o Magistrado do Mº Pº, concluindo:
1. A atual redação do n.º 3 do art. 417 do CPP, introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, prevê a possibilidade do tribunal superior (o relator) convidar o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, incluindo-se no termo "esclarecer" as situações de "aperfeiçoamento", como será o caso da falta de concisão das conclusões;
2. O recurso ao despacho de aperfeiçoamento previsto no n.º 3 do art. 417 do CPP por parte dos tribunais superiores, quando está em causa a falta de concisão das conclusões é, em nossa opinião, uma prática salutar, mesmo nas situações de manifesta improcedência do recurso por falta de fundamento, como acontece no caso vertente, pois parece ser o único remédio eficaz para combater a frequência daquele fenómeno;
3. Deverão, pois, ambos os recorrentes serem convidados a aperfeiçoarem as suas conclusões, ao abrigo do n.º 3 do art. 417 do CPP e de acordo com o n.º 1 do art. 412, do mesmo diploma legal;
4. O douto acórdão recorrido não padece de qualquer nulidade;
5.O douto acórdão recorrido apreciou corretamente a prova produzida em julgamento;
6. A pena concreta aplicada aos arguidos de 2 anos e 9 meses de prisão efetiva não merece qualquer censura;
7. O douto acórdão recorrido deverá ser mantido nos seus precisos termos, negando-se provimento aos recursos interpostos pelos arguidos.
Nesta Relação, o Ex.mº PGA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso do arguido A... e parcial provimento do recurso do arguido B... (suspensão da execução da pena de prisão aplicada).
Foi cumprido o art. 417 do CPP.
Não foi apresentada resposta.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir:
***
São os seguintes os factos que o Tribunal recorrido deu como provados e sua motivação:
FUNDAMENTAÇÃO
A) - MATÉRIA DE FACTO PROVADA
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 27 de Junho de 2011, cerca das 17h e 40m, ... saiu da Escola e seguiu apeada em direção à rodoviária.
2. Nesse percurso, ao passar pela rua onde se situa o bar “…”, a ... apercebeu-se da presença de um grupo de jovens, em número concretamente não apurado, que se encontravam no exterior daquele bar, junto a uma cabine telefónica ali existente.
3. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, os arguidos, A e B..., acompanhados de outros dois indivíduos cujas identidades não foi possível apurar, apercebendo-se da presença da ..., decidiram abordá-la, razão pela qual seguiram no seu encalço, caminhando atrás dela.
4. A ..., apercebendo-se da movimentação dos arguidos e dos outros dois indivíduos que os acompanhavam, acelerou o passo.
5. Porém, aqueles quatro seguiram no seu encalço, tendo-a alcançado quando ela se encontrava junto a uns prédios.
6. Uma vez junto da ..., o arguido A... abordou-a pelas costas, puxando-lhe os braços para trás, ao mesmo tempo que o arguido B... lhe tirou a bolsa que ela trazia na mão e que continha os seus documentos pessoais (Cartão de Cidadão e Cartão de Estudante), pelo menos € 6 em dinheiro, com valor facial variado, uns óculos de correção, no valor de € 220, e um casaco.
7. De seguida, enquanto a ... ainda estava manietada pelo arguido A..., o arguido B... tentou tirar-lhe a mala que ela trazia a tiracolo e onde transportava um computador portátil de marca HP, modelo Compact, e respetivo carregador e ainda um carregador de telemóvel Nokia, tudo com um valor não inferior a € 600, tendo aquela oposto resistência, ao mesmo tempo que dizia “Ó… , para”.
8. Perante a resistência manifestada pela ..., o arguido B... desferiu-lhe um golpe com um objeto de características concretamente não apuradas, atingindo-a numa perna, junto ao pé, o que lhe provocou momentaneamente o desequilíbrio, tendo aquele arguido conseguido, assim, tirar-lhe a referida mala.
9. Os arguidos e os outros dois indivíduos que os acompanhavam, uma vez na posse dos referidos objetos, colocaram-se em fuga.
10. Ao ser atingida pelo referido golpe na perna, desferido pelo arguido B......, a ... sofreu um ferimento que lhe causou dores e desconforto.
11. Os arguidos agiram de forma livre, voluntária, consciente e de comum acordo entre si e os outros dois indivíduos não identificados, com o propósito de se apoderarem e de fazerem seus os objetos supra descritos que a ... tinha na sua posse, mediante o uso de força, concretizada no facto do arguido A... a ter manietado e de o arguido B...... lhe ter desferido um golpe com um objeto, impossibilitando-a assim de resistir, bem sabendo que tais objetos não lhes pertenciam, que agiam contra a vontade da respetiva dona e que as suas condutas eram proibidas pela lei penal.
*
12. O arguido A..., nascido a 21-01-1990, teve um processo de desenvolvimento junto da família de origem, cuja dinâmica se caracterizava pela instabilidade relacional entre os pais, com situações de rutura da vida em comum, muitas vezes provocada por atitudes dissonantes no que respeita ao acompanhamento educativo dos filhos, nomeadamente do arguido.
13. Este, a partir da transição para o 3º ciclo, manifestou dificuldades de integração escolar e de aprendizagem, com ausência de investimento, forte absentismo, adoção de comportamentos problemáticos no espaço escolar e consequente falta de aproveitamento. Após reprovações no 7º e 8º anos de escolaridade, abandonou o sistema escolar aos 18 anos, sem concluir um curso de educação e formação de serralharia mecânica em que ingressou e que lhe daria equivalência ao 9º ano.
14. Ao nível profissional o seu percurso foi curto, detendo escassas competências, por não ter concluído nenhuma das formações em que ingressou.
15. A sua forte motivação centrava-se na prática do futebol, que abandonou, por questões de saúde, com impacto na sua estabilidade, e que pretende retomar.
16. Durante algum tempo enveredou por um estilo de vida sem ocupação estruturada, integrando grupos de pares com comportamentos desajustados que igualmente assumiu e que originaram os contactos com o sistema de justiça.
17. Posteriormente, o arguido apresentou algum esforço para inverter o seu percurso, embora de forma ainda pouco responsável e interiorizada, subsistindo necessidades ao nível da responsabilidade e da aquisição de competências escolares e formativas/laborais.
18. À data dos factos em apreço, o arguido integrava o agregado familiar de origem, composto pelos pais e três irmãos mais novos, sobrevivendo com os rendimentos provenientes do salário auferido pelo pai, como operário cerâmico, e da mãe, como funcionária de um lar de idosos, acrescidos do subsídio para crianças e jovens, atribuído aos filhos menores.
19. Encontrando-se em situação de prisão preventiva à ordem dos presentes autos desde 29-06-2011, o arguido A... mantém comportamento normativo no meio prisional.
*
20. Por seu lado, o arguido B......, nascido a 14-09-1993, apresenta um percurso de socialização de risco num contexto familiar inconstante e inadequado nas atitudes educativas, tendo estado institucionalizado entre os 2 e os 7 anos de idade. No regresso ao agregado familiar de origem, retomou um ambiente educativo ineficaz no exercício da autoridade, supervisão parental e transmissão de regras.
21. Desde cedo foi sinalizado como um aluno com problemas de comportamento, absentismo e desmotivação para a aprendizagem, com registo de comportamentos socialmente desajustados, num contexto de impulsividade, agressividade, baixo autocontrolo, desprezo pelas figuras de autoridade e associação a pares antissociais (jovens sem ocupação e com condutas desviantes).
22. Após concluir com dificuldade o 6º ano de escolaridade, foi encaminhado para o ensino profissionalizante, tendo chegado a frequentar alguns cursos de formação profissional, tendo sido expulso em todos eles logo no primeiro período letivo por absentismo, desrespeito das regras escolares, agressividade verbal com os professores e colegas e danificação de material escolar.
23. Os momentos de ociosidade reforçaram um estilo de vida de risco, marcado por hábitos de convivência noturna na companhia de grupos de pares desviantes e com consumos de álcool e haxixe.
24. Já foi acompanhado pela DGRS no âmbito de vários processos tutelares educativos.
25. Atualmente vive com o pai e com uma tia, encontrando-se a mãe e a irmã emigradas, apresentando esse agregado familiar uma situação económica precária.
26. Presentemente o arguido encontra-se em cumprimento da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, controlada por vigilância eletrónica, aplicada nos presentes autos, medida essa que tem decorrido sem incidentes.
27. Essa situação de confinamento à habitação e o relacionamento recente com uma namorada sem comportamentos de risco, têm permitido estabilizar o seu quotidiano, embora o arguido ainda mantenha consumos pontuais de haxixe.
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28. O arguido A... já sofreu as seguintes condenações:
- por acórdão de 28-04-2010, transitado em julgado em 04-06-2010, na pena única de 2 anos e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, pela prática, em 10-09-2009, de quatro crimes de roubo;
- por acórdão de 23-03-2011, transitado em julgado em 12-04-2011, na pena única de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com regime de prova, pela prática, em 10-03-2009, de um crime de furto qualificado.
29. Por seu lado, o arguido B...... já sofreu uma condenação, por acórdão de 02-05-2011, transitado em 23-05-2011, na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática, em 18-01-2010, de cinco crimes de roubo.
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B) - MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
Para além do que já resulta excluído em face da matéria provada, apenas não se provou que o objeto com que o arguido B...... desferiu o golpe na ... era metálico e que esta teve necessidade de receber tratamento hospitalar.
A demais matéria alegada na acusação é meramente conclusiva, de direito ou irrelevante para a decisão da causa (como sucede, designadamente com o teor do ponto 14 da mesma, relativo aos processos pendentes contra os arguidos).
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C) - MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
1. Quanto aos factos provados, o Tribunal Coletivo formou a sua convicção essencialmente com base no depoimento da testemunha ..., que na qualidade de ofendida relatou circunstanciada e pormenorizadamente os factos, nos termos que constam da matéria provada, não tendo qualquer dúvida em reconhecer ambos os arguidos como autores dos mesmos. Apesar de a defesa destes ter procurado infirmar a credibilidade desse depoimento testemunhal, o certo é que o mesmo se nos apresentou isento, credível e consistente. Aliás, os próprios arguidos não lograram apontar qualquer justificação para uma falsa imputação dos factos pela ofendida, com a qual afirmaram nunca ter tido qualquer litígio ou desentendimento. Acresce que também não se descortina, nem foi sequer aflorado, um qualquer interesse por parte da daquela em inventar toda esta situação ou pelo menos em a atribuir à atuação dos arguidos, dos quais, nomeadamente, não poderia esperar vir a obter qualquer vantagem patrimonial, atenta a modestíssima condição económica dos mesmos. Por outro lado, tendo sido referido pela ofendida que ambos os arguidos são conhecidos como jovens violentos e de comportamentos desviantes, o que é corroborado pelos respetivos relatórios sociais juntos aos autos, não se apresenta como minimamente credível que aquela se sujeitasse a eventuais represálias por parte deles, motivadas por uma falsa denúncia.
Por outro lado, instada pela defesa dos arguidos sobre a razão pela qual se ausentou do hospital sem receber assistência médica (cfr. episódio de urgência de fls. 343), a ofendida, de forma perfeitamente razoável, afirmou tê-lo feito por, entretanto, já depois da triagem e lhe terem colocado “betadine” no ferimento que tinha na perna, ter recebido um telefonema da GNR, a solicitar a sua comparência no posto para proceder à identificação dos arguidos, o que veio a fazer na diligência de reconhecimento de pessoas a que se reportam os autos de fls. 52 a 59. E também justificou cabalmente a sua falta às duas primeiras marcações ao exame médico realizado no gabinete médico-legal de Aveiro, alegando, numa das situações, não ter transporte para a necessária deslocação desde Águeda, e na outra encontrar-se de férias no Algarve.
Por fim, também não é suscetível de abalar a sua credibilidade o facto de a ofendida não ter gritado a pedir socorro. Com efeito, a mesma esclareceu que não o fez por ter sido tudo muito rápido, não haver pessoas nas proximidades e conhecer perfeitamente os arguidos, estando, pois, em condições de os identificar às autoridades, como efetivamente fez.
Saliente-se ainda que também não foi suficiente para abalar a credibilidade do depoimento da ofendida o testemunho de ..., e ..., todos eles amigos e colegas dos arguidos, ao afirmarem terem estado com estes, num bar, aproximadamente entre as 16 horas e a chegada dos militares da GNR que, na sequência da queixa apresentava pela ofendida, intercetou e deteve aqueles. Com efeito, tratam-se de testemunhas que mantêm uma relação de bastante proximidade com os arguidos, o que é suscetível de fragilizar a isenção e a credibilidade dos seus depoimentos. Por outro lado, fazendo todos eles parte de um extenso grupo de jovens que praticamente todas as tardes se reuniam, nomeadamente no bar em questão, do qual, se ausentavam e ao qual regressavam frequentemente, sozinhos ou em grupos, num constante “vai e vem”, conforme foi mencionado pela testemunha … , proprietário do dito bar, não deixa de ser estranho que aquelas três testemunhas estejam em condições de garantir, como fizeram em julgamento, que na tarde em apreço os arguidos nunca se ausentaram desse local.
Em suma, nada de consistente foi produzido no sentido de gerar dúvidas, e muito menos razoáveis, sobre os factos imputados aos arguidos.
Valoraram-se ainda os seguintes documentos, juntos a fls.:
- 178 (faturas relativas à compra do computador portátil e aos óculos de correção da ofendida, que corroboraram o depoimento desta no que concerne aos valores de tais objetos);
- 320 a 321 (relatório da perícia médico-legal efetuada à ofendida);
- 421 a 425 (certificados de registo criminal dos arguidos, donde constam os respetivos antecedentes);
- 501 a 503 e 517 a 520 (relatórios sociais relativos aos arguidos, atendidos para as respetivas condições pessoais, designadamente sociais, culturais, familiares e económicas).
2. No que concerne à factualidade não provada, não foi produzida prova suficiente, uma vez que a própria ofendida a não confirmou.
***
Conhecendo:
Como se constata das conclusões supra enunciadas, os recursos dos arguidos são iguais.
Assim que se analisarão em conjunto os aspetos que o possam ser.
Analisemos as questões suscitadas:
- Falta ou insuficiência da análise crítica da prova.
- Errada interpretação da prova produzida relativamente aos pontos 3 a 11 dos provados.
- Desproporcionalidade das penas aplicadas, que têm como exageradas.
- Violação do princípio in dúbio pro reo.
- Vício do erro notório
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Impugnação da matéria de facto:
Aponta-se a errada interpretação da prova produzida relativamente aos pontos 3 a 11 dos provados.
Alega-se o erro na análise da prova, no sentido de mal apreciada a prova produzida.
O tribunal tem de decidir, após apreciação da prova nos termos do disposto no art. 127 do CPP, e só em caso de dúvida decide em benefício do arguido.
A matéria de facto apurada (factos provados e não provados) há-de resultar da prova produzida (depoimentos, pareceres, documentos, reconhecimento, reconstituição) conjugada com as regras da experiência comum.
Também, se dirá que o recurso não tem como funcionalidade reexaminar a matéria de facto e o recurso não serve para um novo julgamento.
O recurso sobre a matéria de facto é um remédio para corrigir patentes erros de julgamento sobre matéria apontada pelo recorrente e tendo por base a sua argumentação que pode levar a decisão diversa e apenas isso.
Os recorrentes questionam a matéria de facto, que lhe imputa a prática, em coautoria de um crime de roubo, colocando em causa, desse modo, a prova e a apreciação da mesma.
A prova é valorada, tal qual é produzida em audiência, sendo a prova testemunhal perante os depoimentos orais e a imediação.
No nosso ordenamento jurídico/processual penal vigora o princípio da livre apreciação da prova, sendo esta valorada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador -, art. 127 do C. P. Penal.
O princípio da livre apreciação da prova está intimamente ligado à obrigatoriedade de motivação ou fundamentação fáctica das sentenças criminais, com consagração no art. 374/2 do Código de Processo Penal.
E não dispensa a prova testemunhal um tratamento cognitivo por parte do julgador mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal qual a prova indiciária de qualquer natureza, pode ser objeto de formulação de deduções ou induções baseadas na correção de raciocino mediante a utilização das regras de experiência.
A atribuição de credibilidade ou da não credibilidade a uma fonte de prova por declarações assenta numa opção motivável do julgador na base da sua imediação e oralidade que o tribunal de recurso só poderá criticar demonstrando que é inadmissível face às regras da experiência comum. O juiz é livre de formar a sua convicção no depoimento de um só declarante em desfavor de testemunhos contrários, cfr. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I, 207 (sublinhado nosso).
No mesmo sentido, recurso desta Relação nº 3127/99 de 2-2-2000, no qual se refere que “as declarações da ofendida, quando credíveis e inferidas de todos os outros elementos de prova, são suficientes para, segundo as regras da experiência, dar como provados os factos”.
Assim que, se entenda que é possível dar como provados factos fundando-os num só depoimento, desde que o mesmo seja convincente.
E, a alegação dos recorrentes insiste nisso, de que se valorou o depoimento da ofendida em detrimento das suas declarações e do depoimento das testemunhas que apresentaram.
Assim como fazem confusão entre prova e meios de obtenção de prova, alegando que na motivação o Tribunal se limitou a indicar os concretos meios de prova.
Prova é o meio pelo qual, no decorrer do processo, pode ser demonstrada a existência ou inexistência de um facto, a falsidade ou a veracidade de uma afirmação, a fim de que o julgador possa tirar suas convicções ao realizar o julgamento.
Objeto da prova são todos aqueles factos, acontecimentos, coisas e circunstâncias relevantes e úteis para formar a convicção do julgador acerca do ocorrido, para solucionar o caso concreto.
Meios de prova são os meios úteis para formação, direta ou indireta, da verdade material. São meios de prova, exemplarmente, a perícia, o interrogatório, a confissão, as declarações do ofendido, a prova testemunhal, o reconhecimento de pessoas e coisas etc.
Necessário é que a prova produzida numa das versões plausíveis seja convincente.
Concretizando:
Como se refere no acórdão, motivação da matéria de facto, foi essencial, na formação da convicção, o depoimento da ofendida ....
E, justifica-se porque foi convincente. Porque relatou circunstanciadamente e com pormenor como os factos ocorreram, reconhecendo ambos os arguidos como coautores na prática dos factos.
Não se tendo vislumbrado qualquer motivo, aparente ou não, para que a ofendida tivesse um interesse em imputar a prática dos factos aos arguidos, a não ser a verdade do acontecido.
Ouvindo o depoimento da ofendida é manifesta a segurança com que presta o depoimento, chegando o sr. Procurador a referir-lhe “diz isso com tanta segurança…”.
E, não é difícil ter essa segurança porque conhecia os arguidos de vista, sabia o nome e alcunha dos mesmos, via-os em Águeda em vários sítios. No dia dos factos pelas 5, 30 horas descia da Escola para ir apanhar o autocarro e porque ia atrasada cortou caminho.
Na praça viu um grupo de 7 indivíduos entre os quais os arguidos e pouco depois sentiu que alguém a seguia, pelo que não o dizendo expressamente é legitimo supor que estugou o passo.
E, é perentória ao afirmar que foi o A... que a agarrou e foi atacada de frente pelo B...e que a cortaram numa perna para lhe conseguirem tirar a mala do computador portátil que levava a tiracolo. Depois fugiram.
Face a depoimento deste teor, segundo as regras da experiência, o tribunal só podia convencer-se no sentido em que se convenceu e, sem qualquer ponta de dúvida.
Ou esta versão era convincente como o foi ou, o poderia ser a versão apresentada pelos arguidos de que nada tinham a ver com os factos que lhes eram imputados tendo apresentado testemunhas que em depoimento prestado disseram que os arguidos na altura em que os factos foram praticados estavam noutro local, todos juntos. Só que estes depoimentos não foram tidos como isentos, credíveis e consistentes e é legítimo o convencimento de que num grupo alargado que com assiduidade se junta num bar não se sabe (não se está a tomar conta) se dois desses indivíduos, em hora determinada lá estariam ou se, e ainda que por curto período se ausentaram.
A terceira hipótese era não se ter formado o convencimento do julgador e, em tal situação seria aplicável o princípio in dúbio pro reo.
As regras da experiência conduzem à conclusão a que chegou o Tribunal recorrido e face aos depoimentos prestados, e a prova deve ser apreciada segundo as regras da experiência e livre convicção do julgador –art. 127 do CP.
Refere Figueiredo Dias que só a oralidade e a imediação permitem o indispensável contacto vivo com o arguido (e testemunhas) e a recolha deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais contritamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais. Tal relação estabelece-se com o tribunal de 1ª instância, e daí que a alteração da matéria de facto fixada em decisão colegial deverá ter como pressuposto a existência de elemento que, pela sua irrefutabilidade, não afete o princípio da imediação.
Observe-se que a decisão da primeira instância será sempre o resultado duma «convicção pessoal» nela desempenhando papel de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionais não explicáveis -, v. g. a credibilidade que se concede a determinado meio de prova -, pelo que o tribunal de recurso ao apreciar a prova por declarações deve, salvo casos de exceção, adotar o juízo valorativo formulado pelo tribunal recorrido.
Como se diz no acórdão da Relação de Coimbra, de 6 de março de 2002 (C.J. , ano XXVII , 2º , página 44) , “quando a atribuição da credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear na opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum”.
Paulo Saragoça da Matta, in Jornadas de Direito Processual Penal, pág. 253, refere que se o juízo recorrido for compatível com os critérios de apreciação devidos, então significará que não merece censura o julgamento da matéria de facto fixada. Se o não for, então a decisão recorrida merece alteração.
Como se refere no recurso desta Rel. nº 4172/05, de 15-03-2006, “Para respeitar os princípios da oralidade e da imediação, se a decisão do julgador estiver fundamentada na sua livre convicção e for uma das soluções possíveis segundo as regras da experiência comum, ela não deverá ser alterada pelo tribunal de recurso”.
Como se salienta no Ac. da rel. de Lx. de 12-12-2006, in col. jurisp. tomo V, pág. 136, “o local ideal para apreciar criticamente as provas é a audiência de discussão e julgamento, em que os julgadores dispõem de melhores condições para as apreciar. A conclusão que se impõe é que, perante o texto da decisão recorrida, nada ressalta que indique apreciação notoriamente errada”.
O que os recorrentes pretendem é que o tribunal de recurso faça um novo julgamento e que julgue de acordo com as suas próprias convicções e não segundo as regras de experiência e a sua livre convicção, como disciplina o art. 127 do CPP.
Mas o Tribunal teve como mais consentânea com a verdade a versão da ofendida, o que se confirma ouvindo o depoimento.
E, diremos que o preceituado no art.127 do Código de Processo Penal deve ter-se por cumprido quando a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objeto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, e onde não se vislumbre qualquer assumo de arbítrio na apreciação da prova.
O alegado pelos recorrentes não abala os fundamentos da convicção do julgador, que temos conformes às regras da experiência.
Afigura-se-nos que ressalta, de forma límpida, do texto da sentença ter o Tribunal, após ponderada reflexão e análise crítica sobre a prova recolhida, obtido convicção plena, porque subtraída a qualquer dúvida razoável, sobre a verificação dos factos imputados ao arguido e que motivaram a sua condenação.
O que, diferentemente se pretende é que o tribunal deveria ter valorado as provas à maneira da recorrente, substituindo-se ela-recorrente ao julgador, tal incumbência é apenas, porém deste - art. 127° CPP.
Na conjugação dos depoimentos com a credibilidade que cada um mereceu e as inferências daí resultantes, partiu para a operação intelectual de formação da convicção, resultando a prova dos factos.
Assim, temos que não se verifica qualquer erro, e a convicção do julgador tem suporte nos depoimentos, inexistindo violação do princípio in dúbio pró reo.
Mantendo-se a matéria de facto tal como fixada na sentença.
Erro notório na apreciação da prova:
O erro notório na apreciação da prova, existe quando se verifica:
Erro na crítica dos factos provados. Não erro na sua apreciação em ordem a aplicar o direito (Proc. 48658 eml-2-96;
Contra o que resulta de elementos que constam dos autos e cuja força probatória não foi infirmada, ou de dados de conhecimento público generalizado, se emite juízo sobre a verificação ou não de certa matéria de facto e se torne incontestável a existência de tal erro de julgamento sobre a prova produzida.
Se afirma algo que se não pode ter verificado.
Como assim que, ao erro notório, vem sendo, de igual modo, entendimento das Doutrina e Jurisprudência que apenas se terá como verificado em apertadas circunstâncias. Tal vício nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto proferida e aquela que o recorrente entende ser a correta face à prova produzida, ele só pode ter-se como verificado quando o conteúdo da respetiva decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, patenteie, de modo que não escaparia à análise do homem comum, que no caso se impunha uma decisão de facto contrária à que foi proferida - entre muitos, Acórdão do S.T.J., de 20.03.99, Proc. 1 76/99- 3ª Sec.
In casu entendemos que o erro invocado é a desconformidade entre a decisão de facto e a prova produzida, situação já analisada e não o erro vício, que não se verifica.
Violação do principio in dúbio pró reo:
O princípio in dubio pro reo é o correlato processual do princípio da presunção da inocência do arguido.
Gozando o arguido da presunção de inocência (artigo 32, nº 2, da Constituição da República Portuguesa), toda e qualquer dúvida com que o tribunal fique reverterá a favor daquele.
O princípio in dubio pro reo traduz o correspetivo do princípio da culpa em direito penal, ou "a dimensão jurídico-processual do princípio jurídico-material da culpa concreta como axiológíco-normatívo da pena " - Vital Moreira e Gomes Canotilho in Constituição da República Portuguesa, anotada.
"O principio in dubio pro reo aplica-se sem qualquer limitação, e portanto não apenas aos elementos fundamentadores e agravantes da incriminação, mas também ás causas de exclusão da ilicitude (v. g. a legitima defesa), de exclusão da culpa. Em todos estes casos, a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido " - Figueiredo Dias in D. to Processual Penal, 1974, 211.
"Não adquirindo o tribunal a "certeza" (a convicção positiva ou negativa da verdade prática) sobre os factos (...), a decisão tem de ser, por virtude do princípio in dubio pro reo, a da absolvição. Neste sentido não é o princípio in dubio pro reo uma regra de ónus da prova, mas justamente o correlato processual da exclusão desse ónus " - vd. Castanheira Neves in processo criminal, 1968, 55/60.
No que aos factos desfavoráveis ao arguido tange, a dúvida insanável deve levar a dar como não provado o facto sobre o qual recai.
O princípio in dubio pro reo só é desrespeitado quando o Tribunal, colocado em situação de dúvida irremovível na apreciação das provas, decidir, em tal situação, contra o arguido - Ac. do mesmo Supremo de 18/3/98 in Proc 1543/97.
Afigura-se-nos que ressalta, de forma límpida, do texto da sentença ter o Tribunal, após ponderada reflexão e análise crítica sobre a prova recolhida, obtido convicção plena, porque subtraída a qualquer dúvida razoável, sobre a verificação dos factos imputados ao arguido e que motivaram a sua condenação.
Na motivação se refere, “nada de consistente foi produzido no sentido de gerar dúvidas e, muito menos razoáveis, sobre os factos imputados aos arguidos”
O que, diferentemente se pretende é que o tribunal deveria ter valorado as provas à maneira dos recorrentes, substituindo-se eles-recorrentes ao julgador, tal incumbência é apenas, porém deste - art. 127° CPP.
Na conjugação dos depoimentos com a credibilidade que cada um mereceu e as inferências daí resultantes, partiu para a operação intelectual de formação da convicção, resultando a prova dos factos.
Assim, temos que não se verifica qualquer erro, e a convicção do julgador tem suporte nos depoimentos, inexistindo violação do princípio in dúbio pró reo.
Análise crítica:
Entendem os recorrentes não entenderem o processo lógico de formação da convicção do Tribunal.
Mas sem razão.
Quando há versões diferentes, mesmo que substancialmente divergentes, não se pode aceitar uma e afastar outra (divergência entre a versão da acusação e a versão da defesa), sem qualquer explicação plausível e coerente o que, inexistindo, constitui violação do estatuído no art. 374 nº 2 do CPP “exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”, convicção positiva ou negativa.
Como refere o Ac. do STJ de 30-01-2002, proc. 3063/01- 3ª, SASTJ, nº 57, 69, “A partir da indicação e exame das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, este enuncia as razões de ciência extraídas destas, o porquê da opção por uma e não por outra das versões apresentadas, se as houver, os motivos da credibilidade em depoimentos, documentos ou exames que privilegiou na sua convicção, em ordem a que um leitor atento e minimamente experimentado fique ciente da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção”.
Não dizendo a lei em que consiste o exame crítico das provas, esse exame tem de ser aferido com critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respetivo conteúdo –Ac. do STJ de 12-04-2000.
A insuficiente justificação, constitui falta de análise critica da prova, que gera nulidade da sentença, nos termos do art. 379 nº 1 al. a) do CPP.
Mas in casu é perfeitamente entendível, através da análise da motivação da matéria de facto, saber como o Tribunal concluiu pelo apuramento dos factos. Não entendem os recorrentes já que para eles o depoimento da ofendida é insuficiente.
Como se lê na motivação, a ofendida relatou circunstanciada e pormenorizadamente os factos, não tendo quaisquer dúvidas em reconhecer os arguidos como autores dos mesmos, considerando-o um depoimento isento, credível e consistente.
E a prova da defesa não foi suficiente para abalar a credibilidade do depoimento da ofendida e nada de consistente foi produzido no sentido de gerar dúvidas, e muito menos razoáveis, sobre os factos imputados aos arguidos.
Assim que se entende perfeitamente o porquê da decisão da matéria de facto e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respetivo conteúdo.
Determinação e medida das penas:
Tendo em conta os factos provados, os mesmos preenchem o tipo de crime de roubo, punível em abstrato com pena de prisão de 1 a 8 anos.
Preceitua o artigo 40, do C.P. que a aplicação de penas tem por finalidade a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, ou seja, presidem à aplicação de uma pena finalidades de prevenção geral e prevenção especial. No presente caso e para a determinação da pena a aplicar, temos que dos factos provados nada resulta em benefício ou atenuante do comportamento dos arguidos.
Apenas ressalta a vivência difícil que tiveram ao longo de toda a vida, o que também não contribuiu para uma correta formação da personalidade.
E dos factos provados também ressalta não poder ser aplicável a atenuação legal da pena para jovens delinquentes.
Da lei penal respeitante a jovens delinquentes não resulta que opera automaticamente em relação ao jovem condenado, não é de aplicação obrigatória em relação aos menores de 21 anos.
Assim, considerando a pertinência ou inconveniência da aplicação de tal regime (e esta apreciação é que é obrigatória justificando-se a posição adotada, no sentido da inaplicabilidade -ac. do STJ de 15-01-1997, in Col. Jurisp. tomo I, pág. 182), verifica-se que a conduta do arguido não é merecedora deste benefício.
O não assumir os factos e a falta de arrependimento, (não manifestação em atos donde resultasse arrependimento) manifesta a falta de interiorização do mal social da sua conduta.
O que também resulta da sua personalidade mal formada (por ainda em formação e sem observância de normas de conduta estruturais).
A atenuação especial relativa a jovens “não é de aplicação automática, sendo essencial a demonstração de que um regime de punição mais atenuado irá proporcionar ao jovem o afastamento do crime”- ac. do STJ de 15-07-1992, in Col. Jurisp. tomo IV, pág. 8.
Como refere o art. 4 do referido Dl., o regime aí previsto só deve ser aplicado, quando o juiz “tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado” e não houver prejuízo para a prevenção da criminalidade.
Do exposto, não se podem prognosticar vantagens para a reinserção social do arguido se ao mesmo fosse aplicada a atenuação especial da pena.
Motivo pelo qual não se aplica tal benefício de atenuação especial da pena.
No acórdão recorrido, foram observados os critérios legais de escolha e determinação da medida da pena.
Aí e no concreto se refere:
“Vejamos, então, a situação concreta:
Ambos os arguidos apresentam antecedentes criminais, traduzidos em condenações em penas de prisão suspensas na sua execução. Com efeito, o arguido A... praticou os factos agora em apreço em pleno período de suspensão de duas penas, uma de 2 anos e 10 meses de prisão, pela prática de cinco crimes de roubo, e a outra em 10 meses de prisão, por um crime de furto qualificado. Acresce que esta última condenação foi proferida apenas cerca de três meses antes da prática dos factos dos presentes autos.
Por seu lado, o arguido B......, cerca de dois meses antes dos mesmos factos, viu ser-lhe suspensa uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão, pela prática de cinco crimes de roubo.
Constata-se, assim, uma profunda e muito censurável indiferença de ambos os arguidos perante essas condenações anteriores, demonstrando não ter sido acertado o juízo de prognose positivo que esteve subjacente às decisões de lhes suspender aquelas penas.
Como tal, e para mais estando agora em causa um crime da mesma natureza, torna-se difícil concluir novamente nesse sentido.
Acresce que os arguidos continuam a manifestar ausência de fatores de inserção social e profissional, não estando demonstrado que ultrapassaram os problemas comportamentais que têm caracterizado o seu passado.
Com efeito, em relação ao arguido A..., ainda que tenha apresentado algum esforço para inverter o seu percurso de um estilo de vida sem ocupação estruturada, integrando grupos de pares com comportamentos desajustados, o certo é que o tem feito de forma ainda pouco responsável e interiorizada, subsistindo necessidades ao nível da responsabilidade e da aquisição de competências escolares, formativas e laborais.
Por seu turno, o arguido B...... continua a manter um estilo de vida de risco, marcado por hábitos de convivência noturna na companhia de grupos de pares desviantes e com consumos de álcool e haxixe, só interrompido pela sua sujeição, nos presentes autos, à medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, continuando, porém, a manter consumos pontuais de haxixe.
Assim, em face dos antecedentes criminais dos arguidos, dos seus referidos traços de personalidade, das suas condições de vida e da conduta anterior aos factos, reveladores de fortes necessidades de prevenção especial de ressocialização, não se vê como fazer um juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro dos mesmos, por não ser de admitir, com a mínima segurança, que a mera censura do facto e a ameaça da pena serão suficientes para que eles não voltem a delinquir.
Assim, não estão reunidas as condições para suspender a execução da pena aplicada a cada um dos arguidos”.
Importa atender ao critério legal, o inserto do art. 71 do código, ou seja, “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, atendendo a “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”.
Individualizando a pena a aplicar, verifica-se a concordância com os critérios legais, enunciados no art.71 do código, nos seus nºs 1 e 2, o Tribunal Coletivo procedeu em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, ou seja, atendendo “a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”.
Visando-se, com a aplicação das penas, a proteção de bens jurídicos e a reintegração social do agente, art.40 nº1 do Cód. Penal.
No que se refere à prevenção geral, haverá que dizer que esta radica no significado que a "gravidade do facto" assume perante a comunidade, isto é, importa aferir do significado que a violação de determinados bens jurídico penais tem para a comunidade (na sociedade ocidental releva os crimes cometidos contra a vida) e satisfazer as exigências de proteção desses bens na medida do necessário para assegurar a estabilização das expectativas na validade do direito (cfr. ANABELA RODRIGUES, A Determinação da Medida da Pena Privativa de Liberdade, Coimbra, 1995, págs. 371 e 374) ou, por outra forma, a consideração da prevenção geral procura dar "satisfação à necessidade comunitária de punição do caso concreto, tendo-se em conta de igual modo a premência da tutela dos respetivos bens jurídicos" (Ac. STJ de 4-7-1996, CJSTJ, II, p. 225).
Sendo que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa, art. 40 nº 2 do C. Penal.
Decorre, assim, de tais normativos que a culpa e a prevenção constituem os parâmetros que importa ter em apreço na determinação da medida da pena.
Na determinação concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele – art.71 nº 2 do C. Penal.
Enunciando-se, de forma exemplificativa, no mesmo nº 2 quais as circunstâncias que podem ter tal função.
Tendo em conta estes considerandos, importa referir que as exigências de prevenção neste tipo de situações demandam necessidade de punição.
É intensa a ilicitude do facto e as consequências só não foram mais gravosas porque os arguidos conseguiram os objetivos sem mais violência.
Há que ter em conta as finalidades da prevenção, quer geral, quer especial, incentivar nos cidadãos a convicção que comportamentos deste jaez são punidos, assim como há que dissuadir os arguidos para que não voltem a prevaricar.
A pena só cumpre a sua finalidade enquanto sentida como tal pelo seu destinatário – cfr. Ac. desta Relação de 7-11-1996, in Col. jurisp. tomo V, 47.
Atenta a natureza de uma pena ou sanção, o condenado tem de senti-la sob pena de se poder traduzir em “absolvição encapotada”, e não surtir o efeito pretendido pela lei. As penas têm essa designação, de outro modo não o seriam, nem constituiriam dissuasor necessário para prevenir as infrações, se não forem sentidas como tal, quer pelo agente, quer pela comunidade em geral.
Porém, verifica-se que a violência, sendo a necessária para os arguidos conseguirem os objetivos de apoderamento do computador, não é intensa. A ofendida foi golpeada na perna junto ao pé com objeto não identificado, apenas sofreu “momentâneo desequilíbrio”, sendo ferimento que à ofendida causou dores e desconforto.
Tendo em conta os vetores apontados, tendo em conta a moldura penal, do crime pelo qual os arguidos foram condenados, temos como algo exagerada a pena em concreto encontrada para cada um, tendo também em conta toda a atuação.
Tendo-se como adequada, para cada arguido, a pena de 18 (dezoito) meses de prisão.
Pena de substituição:
Suspensão da execução da pena de prisão.
Entende o Exmº PGA que pode ser concedida nova oportunidade ao arguido Racid, atenta a idade do mesmo à data dos factos.
Temos que, se os factos praticados, o modo como o foram, toda a conduta do arguido, anterior aos factos, são impeditivos da atenuação especial da pena tendo em conta a idade, o mesmo se verifica para a aplicação da pena de substituição suspensão da execução da pena.
Como define a Prof. Maria João Antunes, in Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra 2007/2008, pág. 9, “são penas de substituição as que são aplicadas e executadas em vez de uma pena principal”.
O Prof. Costa Andrade (em parecer) refere que “a suspensão da execução da pena de prisão emerge neste contexto como a mais importante pena de substituição”.
O art.50 do CP tem como pressupostos: que a personalidade do agente, as condições da sua vida, conduta anterior e posterior aos factos, circunstâncias destes, se concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (se necessário com imposição de deveres).
Todas estas circunstâncias hão-de ser ponderadas em face dos factos provados.
Aquelas circunstâncias hão-de resultar dos factos provados e então aplica-se a pena de substituição, ou não resultam e mantém-se a pena principal.
Há que ponderar a gravidade do crime, a repercussão social e necessidade de prevenção geral e especial.
A suspensão da execução da pena de prisão (art.50 do CP), é uma medida penal de conteúdo reeducativo e pedagógico que deve ser decretada nos casos em que é aplicada pena de prisão não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o julgador concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição, isto é, a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, tal como se aponta no art. 40 do CP. (Maia Gonçalves, “Código Penal Português”, Anotado e Comentado, Almedina, 14ª edição, 2001, pág. 191).
Trata-se de um poder-dever que vincula o julgador, que terá de decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os citados pressupostos. (Ac. do TR Coimbra de 20-11-1997, CJ, 1997, 5, 53).
O Prof. Figueiredo Dias, in RLJ, Ano 124, pág. 68, referindo-se ao pressuposto material de aplicação do instituto diz que é necessário que “o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognostico favorável relativamente ao comportamento do delinquente”, no sentido de que a pena suspensa baste para afastar o delinquente da criminalidade, acrescentando que, “para a formulação de um tal juízo – ao qual não pode bastar nunca a consideração ou só da personalidade ou só das circunstâncias do facto – o tribunal atenderá às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto”.
Aqueles factos não permitem concluir que em relação ao arguido a censura dos factos e a ameaça da pena realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Não resulta nenhuma possibilidade de juízo de prognose favorável e que permita poder o Tribunal concluir pela possibilidade da suspensão.
Como referido no acórdão, “o arguido B......, cerca de dois meses antes dos mesmos factos, viu ser-lhe suspensa uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão, pela prática de cinco crimes de roubo.
Constata-se, assim, uma profunda e muito censurável indiferença de ambos os arguidos perante essas condenações anteriores, demonstrando não ter sido acertado o juízo de prognose positivo que esteve subjacente às decisões de lhes suspender aquelas penas.
Como tal, e para mais estando agora em causa um crime da mesma natureza, torna-se difícil concluir novamente nesse sentido.
Acresce que os arguidos continuam a manifestar ausência de fatores de inserção social e profissional, não estando demonstrado que ultrapassaram os problemas comportamentais que têm caracterizado o seu passado.
O arguido B...... continua a manter um estilo de vida de risco, marcado por hábitos de convivência noturna na companhia de grupos de pares desviantes e com consumos de álcool e haxixe, só interrompido pela sua sujeição, nos presentes autos, à medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, continuando, porém, a manter consumos pontuais de haxixe”.
Assim, como no acórdão recorrido, com cujos fundamentos concordamos, não resultam provados factos demonstrativos de que a pena de substituição realiza as finalidades da punição, de forma adequada e suficiente.
Assim, temos não haver factos provados que apontem para a viabilidade de concessão do benefício da suspensão da execução da pena, mesmo com condições. Nada permite ao julgador formular o juízo de prognose favorável e necessário à aplicação da pena de substituição.
A suspensão da execução da pena é uma medida penal de conteúdo reeducativo e pedagógico que deve ser decretada se (e somente se), o julgador concluir que a simples censura do facto e ameaça da pena realizam de forma adequada as finalidades da punição, isto é a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, tal como aponta o art.40 nº 1 do Cód. Penal.
Como salienta o Ac. desta Relação, de 20-11-1997, "a suspensão da execução da pena não é uma mera faculdade do tribunal, mas antes um poder-dever ou um poder funcional dependente da verificação dos pressupostos formal e material fixados na lei".
A aplicação, desta medida de exceção (suspensão), não é automática, sendo essencial a demonstração de que das circunstâncias que acompanharam a infração, se não induza perigo da prática de novos crimes, sempre sem olvidar os fins das penas e nomeadamente as necessidades da prevenção.
No caso presente, tais pressupostos não se verificam, pelo que a suspensão não poderá ser decretada.
Assim e nos termos expostos se julgam parcialmente procedentes os recursos.
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Decisão:
Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação e Secção Criminal em:
- Julgar parcialmente procedentes os recursos dos arguidos B...... e A... e, em consequência:
1- Condena-se cada um dos arguidos, pela prática, em coautoria, de um crime de roubo, p. e p. pelo art.210, n.º 1, do Código Penal, na pena de 18 (dezoito) meses de prisão efetiva
2-Quanto ao mais, mantém-se o acórdão recorrido
Sem custas por não haver decaimento total.

Jorge Dias (Relator)
Brízida Martins