Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | CARLOS MOREIRA | ||
Descritores: | PROCEDIMENTO CAUTELAR NÃO ESPECIFICADO SUPENSÃO/EXTINÇÃO AO ABRIGO DO DISPOSTO NO ARTIGO 17.º-E DO CIRE | ||
Data do Acordão: | 06/04/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO LOCAL CÍVEL DE LEIRIA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 20.º, 1 E 2, DA CRP ARTIGO 13.º, 1, DO CÓDIGO CIVIL ARTIGOS 10.º, 3 B) E 371.º, DO CPC ARTIGOS 17.º-E E 17.º-F, 11, DO CIRE | ||
Sumário: | Com a redação introduzida pela lei nº Lei 9/2022 de 11.01 ao nº1 ao artº 17º-E do CIRE, que operou interpretação autêntica sobre as díspares exegeses incidentes sobre a anterior redação, apenas as ações executivas para cobrança de créditos estão impedidas de ser instauradas ou devem ser suspensas. | ||
Decisão Texto Integral: | Relator: Carlos Moreira
Adjuntos: Fonte Ramos João Moreira do Carmo
ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA
1. A..., UNIPESSOAL, LDA., instaurou procedimento cautelar não especificado contra B..., UNIPESSOAL, LDA.
Pediu: a) Seja ordenada a apreensão imediata dos veículos de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 163 Cv 5p, com a matrícula ..-..- AG e do veículo de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 145 Cv 5p, com a matrícula ..-..-UM e respetivos documentos, que se encontram na posse da Requerida, mesmo que em propriedade privada ou local fechado, incluindo, designadamente, em garagem ou parque, com a consequente entrega à Requerente que, para este efeito, deverá ser nomeada fiel depositária dos mesmos. b) Ser a presente providência cautelar decretada com dispensa do contraditório prévio da Requerida, nos termos do disposto no artigo 366.º, n.º 1, do Código de Processo Civil; c) Ser a Requerente dispensada do ónus de propositura da ação principal, nos termos do disposto no artigo 369.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Alegou, em síntese: No dia 22 de fevereiro de 2019, Requerente e Requerida outorgaram um contrato designado por “Contrato-Quadro de Aluguer Operacional de Automóveis n.º...86”, cujo objeto compreende, segundo a sua cláusula 1.ª, n.º 1, “(…) a prestação de serviços de aluguer e de gestão de automóveis contratados entre o Cliente e a A... (…)”, conforme documento n.º 2, contrato que melhor descreve. Ao abrigo do referido Contrato-Quadro e Adenda, as Partes outorgaram os seguintes contratos individuais: - Contrato designado por “Contrato Individual de Aluguer e Administração, Anexo do Contrato N.º 69086/1 N.º Pré-Cálculo 8.643.082/003, tendo por objeto o veículo automóvel da marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 163 Cv 5p, com a matrícula ..-..- AG, pelo prazo de 30 (trinta) meses, com início em 13.01.2021 e término em 12.07.2023, mediante o pagamento de um valor global mensal de €1.066,95 (mil e sessenta e seis euros e noventa e cinco cêntimos), conforme documento n.º 4, que junta e dá por reproduzido; - Contrato designado por “Contrato Individual de Aluguer e Administração, Anexo do Contrato N.º 69086/1 N.º Pré-Cálculo 8.682.618/003, tendo por objeto o veículo automóvel da marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 145 Cv 5p, com a matrícula ..-..-UM, pelo prazo de 30 (trinta) meses, com início em 18.03.2021 e término em 17.09.2023, mediante o pagamento um valor global mensal de €1.065,39 (mil e sessenta e cinco euros e trinta e nove cêntimos), conforme documento n.º 5, que junta e dá por reproduzido. Os referidos veículos em conformidade com o acordado pelas Partes, foram entregues à Requerida. O contrato de locação operacional relativo à viatura com a matrícula ..-..- AG caducou em 12.07.2023 e o contrato relativo à viatura com a matrícula ..-..-UM caducou em 17.09.2023. Pese embora tal e as diligências efetuadas pela Requerente com vista à entrega das viaturas, que descreve, a Requerida continua a utilizá-las sem que tenha sido paga qualquer contrapartida por essa utilização.
Foi proferido despacho que indeferiu o pedido de dispensa do prévio contraditório da Requerida.
Citada a requerida apresentou oposição. Impugnou todos os factos por totalmente inverídicos, por desconhecer nem lhe ser exigível o seu conhecimento, por constituírem meras considerações de direito ou pelo sentido probatório que se lhe pretendem atribuir e, neste sentido impugnou igualmente toda a documentação junta pela Requerente. Alegou que é objeto de um Processo Especial de Revitalização de Empresa. A Requerente reclamou créditos no processo especial de revitalização indicado e consta da Relação Provisória de Credores com o nº 17. Existe impedimento legal à instauração do procedimento cautelar, por força do denominado efeito stand still, previsto no artigo 17º-E, nºs 1 e 10, do CIRE, o que constitui uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que dá lugar à extinção da instância. Razão pela qual, o procedimento cautelar deve ser extinto por verificação de excepção dilatória inominada, o que resulta da aplicação do disposto no artigo 17ºE, nº 1 e 10, do CIRE. SEM PRESCINDIR, A decisão à qual alude o art. 17°-C, n.° 5 do CIRE (despacho de nomeação do administrador judicial provisório) obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a aqui Requerida durante um período máximo de quatro meses, e durante o mesmo período o tempo suspende, quanto a ela as ações em curso com idêntica finalidade - art. 17°-E, 1 do CIRE. O n.º 1 do art. 17º-E do CIRE dispõe: “A decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”. Assim, aquela previsão legal de suspensão de processos contempla quaisquer acções – incluindo procedimentos cautelares – tendentes ao cumprimento de obrigações creditórias, referentes ao exercício da atividade económica do devedor. Está-se na presença de uma providência cautelar de natureza executiva, pois que, apurados os pressupostos da providência, deve o juiz ordenar a entrega imediata do bem locado, sendo que a execução da entrega insere-se na própria providência”
Efetuada notificação prevista no art. 221º do CPC veio a Requerente dizer, em síntese, que. No entendimento da Requerida, servindo os presentes autos para requerer a entrega das viaturas objecto do contrato de aluguer operacional celebrados com a Requerente, os mesmos deverão ser extintos ou, no limite, suspensos. Contudo, a oposição da Requerida não impugna nenhum dos factos alegados pela Requerente no requerimento inicial. Efectivamente, e ao contrário do que a Requerida pretende fazer crer, os contratos já não se encontram em vigor, tendo já caducado, pese embora a Requerida não tenha procedido à entrega das viaturas. Assim sendo, não se pode considerar que os bens objecto dos contratos sejam bens dos quais a Requerida necessitaria no âmbito de uma eventual aprovação do plano de revitalização, assim como não estava a Requerente impedida de dar início dos presentes autos para a recuperação das viaturas. Ainda que assim não fosse, sempre se dirá que a existência dos presentes autos em nada colide com o Processo Especial de Revitalização em curso.” Conforme refere o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido em 25.01.2023, no âmbito do processo n.º 245/22.2T8ETZE1 III – A previsão do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE (na redação da Lei 9/2022, de 11-01) – nos termos do qual a decisão referida em I obsta à instauração de quaisquer ações executivas contra a empresa para cobrança de créditos durante um período máximo de quatro meses, e suspende quanto à empresa, durante o mesmo período, as ações em curso com idêntica finalidade – apenas abrange as ações executivas para pagamento de quantia certa e não as ações executivas para entrega de coisa certa ou para prestação de facto; IV – Considerando que a providência de natureza executiva requerida consiste na entrega de coisa certa, verifica-se que o procedimento cautelar não se encontra abrangido pela previsão do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE (na indicada redação). Ou seja, ainda que por mera hipótese académica se considerasse que os contratos não se mostram extintos – que mostram, pelo decurso do tempo - , jamais poderiam os presentes autos serem extintos ou até mesmo suspensos, contrariamente ao peticionado pela Requerida. Face ao exposto, deverá a oposição à providência cautelar ser julgada totalmente improcedente.
2. Seguidamente foi proferida a seguinte decisão: «a) Da extinção/suspensão do instância em consequência da instauração do Processo Especial de Revitalização de Empresa, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., sob o n.º 4121/23....: Decorre do Anúncio junto pela Requerida foi proferido em tal processo em 06/11/2023 despacho de nomeação de administrador judicial provisório. Dispõe o art. 17.º-C do CIRE, na redação da Lei 9/2022, de 11-01, que: 1 - O processo especial de revitalização inicia-se pela manifestação de vontade da empresa e de credor ou credores que, não estando especialmente relacionados com a empresa, sejam titulares, pelo menos, de 10 /prct. de créditos não subordinados, relacionados ao abrigo da alínea b) do n.º 3, por meio de declaração escrita, de encetarem negociações conducentes à revitalização daquela, por meio da aprovação de plano de recuperação. 2 - A declaração referida no número anterior deve ser assinada por todos os declarantes, da mesma constando a data da assinatura. 3 - A empresa apresenta no tribunal competente para declarar a sua insolvência requerimento comunicando a manifestação de vontade referida no n.º 1, acompanhado dos seguintes elementos: (…) 5 - Recebido o requerimento referido no n.º 3, o juiz nomeia, de imediato, por despacho, administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto no n.º 1 do artigo 32.º e nos artigos 33.º e 34.º, com as devidas adaptações. Por sua vez o art. 17º-E diz que: 1 - A decisão a que se refere o n.º 5 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações executivas contra a empresa para cobrança de créditos durante um período máximo de quatro meses, e suspende quanto à empresa, durante o mesmo período, as ações em curso com idêntica finalidade. 2 - A requerimento fundamentado da empresa, de um credor ou do administrador judicial provisório, desde que deduzido no prazo de negociações, o juiz pode, de imediato, prorrogar o prazo de vigência da suspensão prevista no número anterior, por um mês, caso se verifique uma das seguintes situações. (…) 3 - No decurso do período suplementar de suspensão, determinado nos termos do número anterior, o juiz pode determinar o seu levantamento nos seguintes casos: (…) 4 - O disposto nos números anteriores não é aplicável a ações executivas para cobrança de créditos emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação. (…). 9 - Durante o período de suspensão das medidas de execução, nos termos dos n.ºs 1 e 2, suspendem-se, igualmente: a) Os processos de insolvência em que anteriormente haja sido requerida a insolvência da empresa, desde que não tenha sido proferida sentença declaratória da insolvência; b) Os processos de insolvência em que seja requerida a insolvência da empresa; c) Todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pela empresa. 10 - A partir da decisão a que se refere o n.º 5 do artigo 17.º-C e durante o período de suspensão das medidas de execução a que se referem os n.os 1 e 2, os credores não podem recusar cumprir, resolver, antecipar ou alterar unilateralmente contratos executórios essenciais em prejuízo da empresa, relativamente a dívidas constituídas antes da suspensão, quando o único fundamento seja o não pagamento das mesmas. 11 - Entende-se por contratos executórios essenciais os contratos de execução continuada necessários à continuação do exercício corrente da atividade da empresa, incluindo quaisquer contratos de fornecimento de bens ou serviços cuja suspensão levaria à paralisação da atividade da empresa. (…)” O art. 17º-E, nº 1 do CIRE na redação anterior à referida Lei 9/2022, de 11/01, dizia: “A decisão a que se refere o nº4 do artigo 17º-C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende quanto à empresa, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.” E o art. 17º-C, nº4 dizia: “Recebido o requerimento referido no número anterior, o juiz nomeia de imediato, por despacho, administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto nos artigos 32º a 34º com as devidas adaptações.” Da referida alteração do art. 17º- E, nº1 resulta que o legislador clarificou o âmbito de aplicação de tal normativo, dizendo que estão em causa “ações executivas contra a empresa para cobrança de créditos” perdendo razão a discussão que existiu quanto ao mesmo na redação inicial. Assim, o presente procedimento não se enquadra na previsão do nº1 daquele art. 17º-E pois não é ação executiva “para cobrança de créditos”, visando sim a entrega de bens em causa em contratos de “aluguer operacional de automóveis”, alegadamente já findos pelo decurso do prazo contratado. – cfr. a este propósito Acórdão citado pela Requerente, da Rel. Évora, de 25/01/2023, proc. 245/22.2T8ETZE1, in www.dgsi.pr. Por exposto improcede a pretensão da Requerida de extinção ou de suspensão da instância.
Mais, a final, decidiu, perante os factos que deu como provados e a interpretação que operou da lei aplicável, nos seguintes termos:
«e) Decisão Por todo o exposto defere-se a providência cautelar requerida, ordenando-se a apreensão dos veículos a que respeitam os contratos dos autos - de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 163Cv 5p, com a matrícula ..-..- AG e de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 145Cv 5p, com a matrícula ..-..-UM e respetivos documentos - e entrega à Requerente. DN Nos termos do art. 369º, nº1 do CPC, dispensa-se a Requerente do ónus da propositura da ação principal. Valor do procedimento: 49.100,00€, indicado no requerimento inicial - art.º 304º, nº3, al. d) do CPC. Condeno a Requerida nas custas, nos termos do art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 , do CPC. »
3. Inconformada recorreu a requerida. Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1.º O presente recurso vem interposto da douta sentença, proferida no âmbito dos presentes autos, a 15.02.2024, a qual deferiu a providência cautelar requerida, “… ordenando-se a apreensão dos veículos a que respeitam os contratos dos autos – de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 163Cv 5p, com a matrícula ..-..- AG e de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 145Cv 5p, com a matrícula ..-..-UM e respetivos documentos – e entrega à Requerente.”, porém, o ora recorrente, não se conforma com os termos de tal decisão, face aos factos e ao direito aplicável, in casu, conforme infra passará a evidenciar. 2.º Consta da sentença que agora se recorre, o seguinte: “Assim, o presente procedimento não se enquadra na previsão do n.º 1 daquele art.º 17º-E pois não é ação executiva “para cobrança de créditos”, visando sim a entrega de bens em causa em contratos de “aluguer operacional de automóveis”…”. 3.º Ora, quando legislador previu que estando em curso um processo especial de revitalização de uma empresa, os seus credores ficam impedidos de colocar ações executivas contra a empresa para cobrança de crédito, bem como, a suspensão de ações em curso com idêntica finalidade, teve em mente a necessidade de propiciar à empresa a estabilidade necessária ao bom curso do processo. 4.º Nas palavras de Catarina Serra, in Lições de Direito da Insolvência, Almedina, Coimbra, 2018, página 389: “… o legislador terá formulado a norma justamente com a intenção de estender o efeito a todas as acções directa ou indirectamente dirigidas a fazer valer direitos ou a exigir o seu cumprimento, independentemente da sua classificação como declarativas ou executivas no Código de Processo Civil.”. 5.º Pelo que, sendo este o espírito intrínseco à letra da lei, é manifesto que, todas as ações, quer executivas, quer declarativas, que atinjam os bens da devedora não devem ser propostas ou deverão ser sustadas, se já em pleito, porquanto, não se pode negar que o decurso da mesma pode criar atrito no desenrolar das negociações e, por essa via, acabar por prejudicar de forma indireta a recuperação do devedor, o que foi exatamente o que o legislador pretende proteger com o disposto no n.º 1, do art.º 17º-E do CIRE. 6.º Sendo certo que, existe larga doutrina, nomeadamente, Carvalho Fernandes e João Labareda, Ana Prata, Jorge Morais Carvalho, Rui Simões, Luís Menezes Leitão e João Aveiro Pereira, Alexandre Soveral Martin, Fátima Reis Silva, Catarina Serra, Artur Dionísio Oliveira, e jurisprudência, designadamente, Acórdãos do Tribunal da Relação de L i s b o a d e 1 8 . 0 6 . 2 0 1 4 – p ro c e s s o n . º 899/12.8TTVFX.L1-4 (Maria João Romba), de 12.05.2016 – processo n.º 1713/12.0TVLSB.L1-6 (Maria de Deus Correia), de 25.06.2015 – processo n.º 7452/13.7TBCSC-B.L1-8 (Sacarrão Martins), de 17.12.2015 – processo n.º 2301/11.3TVLSB.L1-2 (Olindo Geraldes), de 15.03.2016 – processo n.º 467/16.3T8VFX-B.L1-7 (Cristina Coelho), de 16.11.2016 – processo n.º 22218/15.1T8LSB.L1-4 (Duro Mateus Cardoso), e de 13.07.2017 – processo n.º 1515/13.6TVLSB.L1-2 (Maria José Mouro); acórdãos da Relação do Porto de 30.09.2013 – processo n.º 516/12.6TTBRG.P1 (António José Ramos), de 18.12.2013 – processo n.º 407/12.0TTBRG.P1 (João Nunes), de 30.06.2014 – processo n.º 1251/12.0TYVNG.P1 (Caimoto Jácome), de 05.01.2015 – processo n.º 22/13.1TTMTS.P1 (Maria José Costa Pinto), de 14.04.2015 – processo n.º 39327/13.4YIPRT.P1 (Maria Graça Mira), de 16.11.2015 – processo n.º 8176/11.5TBMTS.P1 (Carlos Gil), de 16.05.2016 – processo n.º 2964/14.8TBVNG-A.P1 (Correia Pinto), e de 03.03.2016 – processo n.º 596/11.1TVPRT.P1 (Ataíde das Neves); acórdãos da Relação de Coimbra de 27.02.2014 – processo n.º 1112/13.6TTCBR.C1 (Ramalho Pinto), de 03.03.2015 – processo n.º 1075/13.8TBVIS.C1 (Ma n u e l Cape l o), de 19.05.2015 – processo n.º 3105/13.4TBLRA.C1 (Moreira do Carmo), de 28.01.2016 – processo n.º 791/15.4TBGRD.C1 (Fe l i z a r d o Pa i va), de 13.10.2016 – processo n.º 1380/14.6T8LRA-A.C1 (Paula do Paço), de 26.09.2017 – processo n.º 1122/16.1T8GRD-A.C1 (Maria Catarina Gonçalves) e de 17.11.2017 – processo n.º 2717/16.9T8LRA. C1 (Paula Maria Roberto); acórdãos da Relação de Guimarães de 29.01.2015 – processo n.º 5632/12.1TBBRG.G1 (A n t e r o Ve i g a), de 25.02.2016 – processo n.º 3986/13.1TBBRG.G1 (Francisco Xavier), de 04.04.2017 – processo n.º 2209/14.0TBBRG.G1 (Ana Cristina Duarte), de 09.11.2017 – processo n.º 190/13.2T8VNC.G1 (Maria dos Anjos Nogueira), de 08.02.2018 – 07.06.2018 – processo n.º 1869/14.7TBGMR-B.G1 (Alcides Rodrigues); acórdãos da Relação de Évora de 16.01.2014 – processo n.º 358/13.1TTPTM.E1 (José Feteira), de 12.03.2015 – processo n.º 845/13.1TBABF.E1 (Sívio Sousa), de 01.10.2015 – processo n. º 82/14.8TTSTR.E1 (João Luís Nunes), de 22.10.2015 – processo n.º 37332/13.0YPRT.E1 (Alexandra Moura Santos), e de 10.05.2018 – processo n.º 26005/16.1YIPRT- -E1 (Tomé de Carvalho), e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26.11.2015 – processo n.º 1190/12.5TTLSB.L2.S1 (Ana Luísa Geraldes), de 05.01.2016 – processo n.º 172724/12.6YIPRT.L1.S1 (Nuno Cameira), de 19.04.2016 – processo n.º 7543/14.7T8SNT.L1.S1 (Ana Paula Boularot), de 15.09.2016 – processo n.º 2817/09.1TTLSB.L1.S1 (António Leones Dantas), que defendem a inclusão das ações declarativas neste conspecto. 7.º Pelo que, por maioria de razão, aceitando-se as ações declarativas, nada obsta à aceitação das ações executivas na sua globalidade, pois, qualquer uma delas irá traduzir-se numa alteração na esfera jurídica da devedora, que, necessariamente, irá influenciar a recuperação do devedor, ficando, assim, desprovido de todo e qualquer sentido o plano de recuperação em curso. 8.º Com a suspensão ou com o impedimento da instauração de ações executivas, o devedor ficaria temporariamente liberto dos diversos afazeres e preocupações inerentes a qualquer lide judicial que contra si tenha sido instaurada e se encontre pendente, podendo concentrar todos os seus esforços e diligências no sentido da sua recuperação. 9.º Pelo que, mal andou o douto Tribunal “a quo” ao considerar que o presente procedimento cautelar não se integra no conceito de ação executiva para efeitos no n.º 1, do art.º 17º-E do CIRE, sendo notório o erro de julgamento, devendo, em consequência, ser julgado improcedente o procedimento cautelar proposto.
Nestes termos e nos melhores de Direitos, que V.Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, tudo com as demais consequências legais. Assim se fazendo a sempre douta, sã e elementar Justiça!
Contra alegou a requerente pugnando pela manutenção do decidido, com os seguintes argumentos finais: I - O recurso apresentado pela Recorrente B... veio interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que deferiu a providência cautelar requerida, tendo sido ordenada a apreensão dos veículos marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 163Cv 5p, com a matrícula ..-..- AG e de marca Renault, modelo Master III 2.3 dCi L4H3 3.5T TP 145Cv 5p, com a matrícula ..-..-UM e respetivos documentos - e entrega à Recorrida. II - O recurso veio interposto apenas da parte da decisão relativa à (in)aplicação do artigo 17.ºE- n.º 1 do CIRE, não tendo sido apresentado recurso da parte da decisão proferida pelo Tribunal a quo no qual este decidiu pela improcedência da impugnação genérica apresentada pela Recorrente. III - A Recorrida entende que a sentença recorrida não merece qualquer reparo, devendo manter-se na sua integralidade, nos exactos termos em que foi proferida. IV - Conforme refere o artigos 17.ºE, n.º 1 do CIRE:“1 - A decisão a que se refere o n.º 5 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações executivas contra a empresa para cobrança de créditos durante um período máximo de quatro meses, e suspende quanto à empresa, durante o mesmo período, as ações em curso com idêntica finalidade”. V - Entendeu o Tribunal a quo que o referido preceito legal não era aplicável ao caso dos presentes autos, porquanto os mesmos não têm a finalidade de cobrança de créditos, tal como preceituado pela referida disposição legal desde 2022. VI - Os presentes autos tiveram por base um pedido de devolução das viaturas, propriedade da Recorrida, com base na extinção do contrato por caducidade, por ter decorrido o prazo legalmente estabelecido nos contratos. VII - Ou seja, não há uma qualquer cobrança de dívida inerente aos presentes autos, uma vez que os contratos já haviam cessado não só antes da nomeação do Administrador Judicial Provisório, como também antes sequer de ter sido iniciado o Processo Especial de Revitalização. VIII - Esta cessação dos contratos por decurso do prazo ocorreu em Julho e Setembro de 2023 e os Processo Especial de Revitalização apenas teve o seu início em Outubro. IX - Assim sendo, jamais poderia ser aplicável ao caso dos presentes autos a extinção ou suspensão dos presentes autos com base na aplicação do artigo 17.º- E, n.º 1 do CIRE. X - Não se pode também defender e admitir, ao contrário do que refere a Recorrente, que as viaturas são bens da Recorrente. XI - As viaturas não são, como nunca foram, bens da Recorrente. XII - São, sim, bens cuja utilização foi cedida no âmbito de contratos já findos à data do processo especial de revitalização e, como tal, jamais poderão ser considerados bens que tenham qualquer tipo de influência não só na apresentação do Plano Especial de Revitalização, como também na eventual recuperação da empresa. XIII - Com efeito, os presentes autos servem apenas para a entrega das viaturas com base na extinção dos contratos por caducidade, pelo decurso do prazo acordado entre as Partes e não com base na extinção por falta de pagamento de rendas, pelo que jamais lhe poderão ser aplicadas as regras constantes do artigo 17.ºE- n.º 1 do CIRE. XIV - Carece, pois, de razão toda a argumentação expendida pela Recorrente nas alegações de recurso apresentadas, pelo que, reparo algum merece a douta sentença recorrida, devendo manter-se intocada no seu integral te
Ilegalidade da decisão quando julgou improcedente a pretensão da Requerida de extinção ou de suspensão da instância ao abrigo do artº 17º-E do CIRE.
5. Apreciando. A questão é de simples dilucidação. Está em causa a interpretação do artº 17º-E nº1 do CIRE aprovado pelo DL 53/2004 de 18.03. A redação anterior de tal segmento normativo, introduzida pelo DL n.º 79/2017, de 30/06, era a seguinte: «1 - A decisão a que se o n.º 4 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto à empresa, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.» A redação atual, introduzida pela Lei 9/2022 de 11.01 é a seguinte: «1 - A decisão a que se refere o n.º 5 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações executivas contra a empresa para cobrança de créditos durante um período máximo de quatro meses, e suspende quanto à empresa, durante o mesmo período, as ações em curso com idêntica finalidade.» (sublinhado e negrito nossos) Como é consabido na anterior redação discutiu-se amplamente se no conceito de ações se integravam apenas as ações executivas ou também as ações declarativas, entendendo-se maioritariamente, na doutrina e na jurisprudência, que se englobavam os dois tipos de ações. E havendo quem defendesse, inclusive, e num caso idêntico ao presente, tal como defende a recorrente que: «Entre as acções em curso que são suspensas, nos termos do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, com a decisão que nomeia o administrador judicial provisório figuram os procedimentos cautelares que visam a entrega do estabelecimento comercial onde a devedora exerce a sua actividade.» - Ac. RC de 18.01.2022, p. 193/20.0T8MMV.C1, in dgsi.pt. Porém, e como se vê, a redação introduzida pela Lei 9/2022, resolveu a polémica. E resolveu-a de modo insofismável e incontestável, pois que perante as dúvidas e divergências quanto ao sentido e alcance do aludido segmento normativo, sobre o mesmo foi operada uma interpretação autêntica através de via legislativa. Efetivamente «Interpretação autêntica é a que é realizada por uma fonte que não é hierarquicamente inferior às fontes interpretadas. Corresponde à previsão do art.º 13.º/1 do Código Civil português, que nos dá, a propósito de um caso particular, o critério desta interpretação: lei interpretativa é a que realiza a interpretação autêntica, e há interpretação autêntica quando a nova lei se integrará na lei interpretada.» - Ac. RP de 14.03.2016, p. 9706/14.6T8PRT.P1, in dgsi.pt. No caso vertente assim foi, pois que a nova redação foi introduzida através de Lei interpretativa que se integra na lei interpretada – artº 13º nº1 do CC. Ora perante o teor atual do artº 17º-E nº1 do CIRE alcança-se meridianamente evidente que o legislador limitou a proibição da instauração de ações, e a sua suspensão já quando instauradas, às ações executivas; mais definindo/limitando o período máximo durante o qual tal proibição e suspensão são possíveis: 04 meses. Tal limitação tem na sua génese o entendimento sufragado por alguns de que a pendência ou o prosseguimento de uma ação declarativa para reconhecimento de um crédito em nada prejudica a recuperação de uma empresa que tenha logrado a aprovação de um plano – na ação declarativa apenas se discute o montante da dívida, enquanto o plano de recuperação apenas dispõe sobre a forma de pagamento da dívida. E se, depois da homologação judicial, o plano de recuperação tem a virtualidade de se impor a todos os credores, vinculando mesmo aqueles que não hajam participado nas negociações (art. 17º-F, nº11, CIRE), há que que considerar a posição dos credores que, por algum motivo, não hajam reclamado os seus créditos ou não tenham aí obtido reconhecimento, nos casos de lhes ser vedada a interposição de uma ação declarativa para tal efeito ou o prosseguimento de ação pendente. Estes casos constituiriam uma restrição injustificada e desproporcionada ao direito do credor a ver reconhecido o seu crédito, em violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional, consagrado no art. 20º, nº1 da Constituição, e concretizado no art. 2º do CPC. Ao credor que não tenha visto reconhecido o seu crédito (porque não o reclamou ou porque não foi aí reconhecido ou porque a impugnação não chegou a ser apreciada), apenas o recurso à ação declarativa lhe permitirá o reconhecimento da condição de credor, nomeadamente, para efeitos de se encontrar abrangido pelo plano de recuperação aprovado – Neste sentido cfr. Isabel Alexandre, in Efeitos Processuais da Abertura do Processo de Revitalização”, II Congresso do Direito de Insolvência, Almedina, págs. 243 a 246. No caso vertente. Não nos encontramos perante uma ação executiva, ao menos hoc sensu, mas antes perante uma providência cautelar que, summo rigore, assume o jaez de ação declarativa, de condenação, pois que a requerente o que pretendeu foi a exigir a prestação de uma coisa ou de um facto, pressupondo ou prevendo a violação de um direito – artº 10º nº3 al. b) do CPC. E não obstante ter sido decretada a inversão do contencioso, pode ainda o requerido instaurar a ação principal - artº 371º do CPC - na qual, ainda em sede declarativa, se pode continuar a discutir o direito colocado em juízo; o que, tudo, retira o cariz de executivo ao pleito introduzido em juízo. Ademais, atenta a intenção da atual redação do artº 1/º-E nº1 de restringir acentuadamente os critérios da inibição de propositura e de suspensão das ações, quer em termos da natureza da ação, quer quanto ao lapso temporal em que pode acontecer tal impossibilidade de interposição ou a suspensão da execução, também se deve efetivar uma interpretação literal, e, assim, mais restritiva, quanto à finalidade da ação executiva. Ora perante a letra da lei esta ação apenas deve visar a cobrança de créditos. Nesta conformidade, e como se entendeu na sentença, também por este motivo a requerente não estaria inibida de instaurar a providência, pois que nela não pretende a cobrança de créditos mas antes a entrega de certos bens. Assim sendo, como entendemos que é, se atinge a final conclusão que a presente ação não está abrangida pela previsão do aludido segmento normativo do artº 17º-E nº1 do CIRE.
Improcede o recurso.
(…)
7. Deliberação. Termos em que se acorda julgar o recurso improcedente e, consequentemente, confirmar a sentença.
Custas pelo recorrente.
Coimbra, 2024.06.04.
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