Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALICE SANTOS | ||
Descritores: | INTRODUÇÃO EM LUGAR VEDADO AO PÚBLICO APRECIAÇÃO DA PROVA PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA | ||
Data do Acordão: | 05/05/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | 191º DO CP E127º, 374º, Nº2 DO CPP | ||
Sumário: | 1.O exame crítico das provas, conforme o disposto no nº2 do artigo 374º do CCP, deve indicar no mínimo e não tem que ser de forma exaustiva, as razões de ciência e demais elementos que tenham na perspectiva do tribunal sido relevantes, para assim se poder conhecer o processo de formação da convicção do tribunal. 2.O facto da testemunha ser mulher do arguido, com quem está em conflito, e filha da assistente não obsta, por si só, à credibilidade do seu depoimento. 3, No crime p. e p. pelo artigo 191º do CP, o objecto da acção tem de assumir a forma de um espaço fisicamente limitado, em termos de a entrada arbitrária só ser possível ultrapassando uma barreira física, como p. ex. um muro, um portão, uma sebe. | ||
Decisão Texto Integral: | 35 35 No processo acima identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que: Julgou-se procedentes as acusações pública e particular e condenou RC, pela autoria material e em concurso efectivo de: - um crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. pelo art.º 191.º do Cód. Penal; e - um crime de dano simples, p. e p. pelo art.º 212.º, 1, do Cód. Penal, nas penas parcelares de: - quarenta ( 40 ) dias de multa; e - cento e cinquenta ( 150 ) dias de multa, respectivamente, à razão de dez euros ( € 10 ) dia, cuja pena única, do cúmulo jurídico, se fixou em cento e setenta ( 170 ) dias de multa, à razão de dez euros ( € 10 ) dia, num total de mil e setecentos euros ( € 1700 ). Verificada que seja a hipótese do art.º 49.º, 1, do Cód. Penal, o arguido cumprirá cento e treze ( 113 ) dias de prisão subsidiária. * Julgou-se parcialmente procedente o pedido cível e condenou-se o arguido/demandado a pagar à A. a importância de oitocentos e vinte euros (€820), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora sobre o referido montante, à taxa anual de 4%, desde a notificação até integral pagamento. Desta sentença interpôs recurso o arguido RC sendo do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso: 1- A condenação de Arguido foi, não só excessiva, mas principalmente inadequada e injusta, com uma errada aplicação da Lei e do Direito, aos crimes de que vem acusado e que, na realidade, não cometeu. 2- O Tribunal a quo não atendeu aos factos alegados pelo recorrente, em sua defesa, apenas tendo considerado os factos que poderiam contribuir (e contribuíram) para a sua condenação. 3 - O alheamento da motivação do comportamento e actuação do Arguido, por parte do Tribunal, está patente em várias intervenções, risos, comentários, Juízos de valor algo irónicos e respostas proferidos pelo Mmo Juiz, ao longo da Audiência de Julgamento. 4- O Acórdão "sub judice" fez errónea aplicação da Lei e do Direito. 5- Os factos referidos foram incorrectamente relevados e imputados ao recorrente e errónea e juridicamente, qualificados. 6- Os meios probatórios carreados em sede de Audiência, nomeadamente o depoimento das Testemunhas da Assistente e das próprias partes, é completamente contraditório entre si, revelando a maioria das vezes ser a "palavra de um contra o outro". 7- O Facto 2 e 3 da Sentença, deveriam ter sido considerados como não provados, pois para além dos depoimentos do Arguido e Assistente serem completamente contraditórios, não foram provados factos concretos que consubstanciassem e contextualizassem aquela matéria. 8- O PONTO 5 da Sentença, dado como provado, deveria constar, sim, dos Factos não provados, desde logo, porque, apesar do recorrente ter confirmado que efectivamente colocou o pé na porta para evitar que se fechasse, também não é menos verdade que, quer tenha sido a Assistente ou a testemunha C, a fechar a porta, fê-lo de modo repentino, violento e com muita força, tendo sido esta, ou estas, as únicas e verdadeiras causadoras dos danos sofridos na maçaneta interior da porta de casa. 9- A conduta do Arguido em nada contribuiu para os danos causados na referida porta, tanto mais que os eventuais (e reduzidos danos) que o Arguido possa ter causado na porta (uma moça numa parte da porta que não ficou totalmente definida) não foram, sequer, objecto de reparação posterior. 10- Deveria ter sido dado como provado que a Assistente e a sua filha, ao tentarem de forma, desesperada e violenta, fechar a porta, fizeram com que esta batesse de tal maneira com força no aro, que o puxador interior da porta (que, possivelmente, a Assistente estava a segurar, para fechar a porta por dentro), se danificou, quando a porta veio a fazer "contrapesou com o pé que o Arguido adiantou, entretanto, para impedir que a porta se viesse a fechar. 11- Tanto a Assistente como a sua filha, são responsáveis pelos danos causados na porta, pois não fora tentarem fechar a porta tão rapidamente e com tanta força e, certamente, a porta não se danificaria, da forma que se danificou. 12- Não ficou demonstrado que o Arguido tivesse intenção de causar quaisquer danos na porta. 13- A versão do Arguido é a que melhor corresponde à descrição dos factos relatados por ambas as partes. 14- Em relação ao PONTO 6 da Sentença, o Tribunal a quo também baseou a sua convicção em depoimentos em clara oposição tendo dado como provada a proibição expressa feita ao Arguido de entrar na residência da Assistente, quando deveria ter considerado este Facto como não provado. 15- O Arguido reconhece que não tinha consciência e conhecimento de estar proibido de ali entrar, e a própria Assistente não conseguiu precisar qual a extensão da proibição, ou seja, não ficou provada se a proibição abrangia o pátio que dá acesso à casa, ou se só da casa para dentro, já que o Recorrente não chegou a entrar em casa. 16- A Assistente e sua filha reconhecem, que na data dos factos, não proibiram expressamente o Recorrente dali entrar, o que muito se estranha, pois, pelo menos deviam tê-lo recordado de tal proibição o que não aconteceu, facto este provado e corroborado nos seus depoimentos. 17- A Assistente assume que «do portão nunca o tinha proibido, mas tinha-o proibido de, já o tinha posto uma vez na rua e disse-lhe que não lhe admitia voltar a entrar da minha casa para dentro», reforçando quanto ao interior da casa: «dentro de casa disse uma vez: a partir de hoje pões-te na rua e não pões cá mais os pés dentro de casa», 18- Admitindo a veracidade desta declaração da Assistente, de que nunca proibira o Arguido de entrar do portão para dentro, mas apenas dentro de casa... e se este não chegou a entrar dentro de casa, só se poderia concluir que o ARGUIDO NÃO PRATICOU QUALQUER CRIME. 19- No que se refere aos PONTOS 7A 10 da Sentença, há a dizer que, o Tribunal a quo fundou a sua convicção numa incompreensível e inexplicável «presunção natural», desvalorizando completamente o depoimento do Arguido, dando somente credibilidade e formando a sua convicção (apesar de não o assumir expressamente) nos depoimentos da Assistente e da sua filha - pelo que a matéria destes Factos deveria ter sido Não provada. 20- No que tange ao Pedido de Indemnização cível, somente ficou provado o estrago no valor de 70,00 €, conforme comprovou o depoimento da Testemunha Armando Teixeira. 21- Não ficou, de modo algum provado, o nexo de causalidade entre o comportamento) do Arguido, e os danos causados na porta, nem tal foi, sequer, referido na própria Sentença de que ora se recorre - o que era um dos requisitos de que a Lei faz depender a responsabilidade civil por factos ilícitos. 22- Pelo contrário, tudo leva a crer que foi o comportamento da Assistente, ao fechar a porta de repente e com excessiva violência, que causou danos no puxador interior da porta, empenando-a de forma a não fechar. 23- A SENTENÇA é NULA, por não conter o exame crítico da s provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, não bastando que o Tribunal forme uma convicção sobre os factos, impondo, a Lei, que essa convicção seja exteriorizada através de um "exame crítico das provas" de modo a que, quer os destinatários da decisão, maxime, os sujeitos processuais, quer o Tribunal de recurso, fiquem a conhecer o percurso "lógico ou racional que lhe subjaz". 2 4 - Não pode, o Tribunal a quo, dar, pura e simplesmente como provados os Factos 7 º a 10 º com base numa presunção natural atenta a idade do Arguido, experiência criminal respectiva e experiência de vida. 25- Da factual idade supra descrita, e tendo em consideração a prova produzida em Julgamento não é possível concluir pela prática dos crimes de introdução em lugar vedado ao público, Art. 191º, e crime de dano, Art. 212º ambos do C.P., por parte do Recorrente, assim como não podiam ter-lhe sido assacadas responsabilidades indemnizatórias pelos danos havidos. 26- Quanto ao Crime de introdução cm lugar vedado ao público, não está verificado um dos elementos essenciais do tipo objectivo, designadamente a falta de autorização ou consentimento para entrar em espaços vedados anexos à habitação. 27- A existência de: DOLO é imprescindível para a configuração dos tipos legais d e crime de dano e de introdução em lugar vedado ao público. 28- O ERRO quanto à existência de causa de exclusão da ilicitude havida neste caso concreto - actuação no exercício de um direito - afasta o dolo (Art. 16º nº 1 e 2 e Art. 312 nº 2 b) do C.P. 29- A acção típica deste crime de introdução em local vedado ao público compreende duas modalidades de conduta: a entrada sem consentimento e a permanência depois da intimação para se retirar. 30- Se quanto à entrada sem consentimento ainda pode subsistir alguma dúvida, o mesmo já não se verifica em relação à permanência depois da intimação para se retirar, porquanto o Recorrente não foi, de forma a alguma intimado para se retirar, vindo embora por sua própria iniciativa, sem que alguma vez lhe tenha sido dito que não podia estar ali. 31- Se fosse intenção e vontade do Arguido entrar no interior da casa da Assistente - e dado que com a forma violenta corno esta fechou a porta, a mesma ficou empenada e incapaz de ser fechada à chave - este teria entrado, sem quaisquer problemas, dentro de casa, bastando-lhe empurrar normalmente a porta, o que este não fez, tendo abandonado o local, como ele próprio O diz e é confirmado pelas Assistente e sua filha. 32 - No caso concreto, não está preenchido o tipo objectivo do crime de introdução em lugar vedado ao público, por não se verificar a acção típica do mesmo, e, muito menos se encontra preenchido o tipo subjectivo, pois o Recorrente ao entrar na residência da Assistente não tinha qualquer intenção de d00esrespeitar a sua privacidade e dos que nela habitam, mas tão só de acabar a conversa com a sua esposa. 33- Não existe por parte do Recorrente a ilicitude do seu acto, pois desconhecia por proibição. 34- Segundo o Art. 16º, nº 1 do C.P, o erro sobre os elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, ou sobre as proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude do facto, exclui o dolo. 35- E, no nº 2 do supra citado artigo, refere anterior abrange o erro sobre um estado de coisas excluiria a ilicitude do facto ou a culpa de agente, ora e precisamente o que se verifica no caso em apreço. 36- No caso concreto está excluído o dolo por parte do Arguido pelo que este tinha que ter sido absolvido do crime de introdução em local vedado ao público de que vem acusado. 37- Já quanto ao crime de dano, o arguido não teve qualquer consciência ou intenção de causar o dano na porta. 38- O dolo desdobra-se nos chamados elementos intelectual (representação, previsão ou conhecimento dos elementos de tipo de crime), e volitivo (vontade de realização daqueles elementos do tipo objectivo) que acresce um elemento emocional que é dado, em princípio, pela consciência da ilicitude, e nenhum destes requisitos está preenchido no caso concreto. 39- Cabia, pois, ter-se decidido pela absolvição do Arguido, da prática deste crime. 40 - Quanto ao Pedido de Indemnização Cível, improcedendo, a acção penal, como devia ter improcedido, atenta a identidade de fundamento (acção ilícita culposa, nexo de causalidade adequada entre a acção e o resultado) deveria improceder, também, o pedido de indemnização que tem aquela como pressuposto. 41- Não ficou provado que o dano resultasse da conduta imputada ao Arguido, concluindo-se, pelo contrário que, não fora a forma violenta como a Assistente fechou a porta, e esta não teria ficado com a fechadura pendurada. 42- Não estão preenchidos os requisitos de que a Lei civil (Art. 483º e SS. do CC.), faz depender a responsabilidade civil por factos ilícitos. 43- Houve violação do princípio do in dubio pro reo, a qual pode e deve ser tratada como erro notório na apreciação da prova, por, da apreciação da prova, ter sido evidente e notório que o Tribunal não colocou, sequer, em dúvida, o comportamento criminoso do Arguido, optando pela sua condenação imediata e sem impiedosa, não tendo atendido ao erro sobre as circunstâncias do facto, nem às causas de exclusão da ilicitude e da culpa. 44- É excessiva a pena aplicada ao Arguido no caso concreto, atentos os limites máximo e mínimo, previstos na Lei, nos Arts. 191º do C.P.: « ... pena de multa até 60 dias ... » e no Art. 212º do mesmo diploma: «pena de multa», já que as penas de 40 dias e 150 dias de multa, são manifestamente exageradas, para a situação concreta, tanto mais que cabia ao Douto Tribunal a quo ter atendido às diversas circunstâncias atenuantes do caso concreto: os diminutos danos havidos, a relação de sogra/genro existente entre Assistente e Arguido, a idade do Arguido, as circunstâncias de tempo e lugar em que os factos ocorreram, entre outras, conforme determinam os Arts 71º e 72º do C. P.. NORMAS VIOLADAS: Art. 32º, nº 2 da C.P. Art. 16 º do C. P Art. 319, n 2 b) do C.P Art. 712 e 72º do C.P. Art. 483º do C.C Termos em que, deve ser dada procedência ao presente Recurso, absolvendo-se Arguido em conformidade, Com o que se fará plena Justiça. O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo. Respondeu a assistente R pugnando pela improcedência do recurso. Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso. Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela improcedência do recurso. Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência, cumpre agora decidir. O recurso abrange matéria de direito e de facto já que a prova foi documentada. Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão: 1. No dia 3.09.2008, cerca das 22:30 horas, o arguido dirigiu-se à Rua …. Coimbra, para entregar à sua esposa, C de quem se encontra separado de facto e em conflito, o filho menor de ambos e neto da assistente; 2. Após o arguido ter entregue o filho, o que fez do lado de fora do portão que dá acesso à residência propriedade da assistente, referida em 1., e onde a esposa também reside, a mãe do menor fechou o portão e dirigiu-se à residência na companhia do filho. 3. Encontrava-se já a esposa a chegar à porta da residência, quando ouviu o portão a ser aberto e viu o arguido na sua peugada, após penetrar no espaço vedado anexo à residência referida em 1. 4. A assistente, que se encontrava à porta da residência, vendo o arguido a aproximar-se deixou entrar a filha e o neto e fechou a porta. 5. Deparando-se com o fechar repentino da porta, o arguido desferiu 2 violentos pontapés na porta, provocando danos a nível da fechadura, cujo puxador ficou pendurado, e dos suportes da porta de alumínio, cujos aros saíram do lugar. 6. O arguido sabia bem que estava proibido expressamente pela assistente de entrar dos portões do espaço vedado que dá acesso à residência para dentro. 7. Agiu de modo livre, deliberado e consciente; 8. Com o propósito de invadir aquele espaço anexo à habitação; e 9. No intuito de provocar estragos na porta; 10. Sabia que toda a sua conduta lhe estava legalmente vedada por ser ilícita e criminalmente punível. 11. Aufere cerca de € 630 líquidos mensais; vive só, em casa arrendada por € 450 mensais; tem o 12.º Ano de escolaridade; 12. Foi condenado, a 20.05.2005, pela prática, a 1 e 2.08.2002, de dois crimes de dano qualificado, na pena única de 160 dias de multa – extinta. Do pedido cível: 13. Em consequência da actuação do arguido, e na reparação dos estragos causados na porta, despendeu a A. € 70; 14. Sentiu-se transtornada ( o marido encontrava-se ausente, em trabalho ) e envergonhada, mantendo um estado de ansiedade e receio que o arguido repita tal conduta. 15. Vive com o marido, que aufere cerca de € 700 líquidos mensais, e com a filha e o neto, em casa própria; tem a 4.ª Classe. * factos não provados: 16. Em consequência da actuação do arguido, na reparação dos estragos causados na porta, despendeu a A. € 110. Quaisquer outros factos emergentes da discussão da causa, para além dos que ficaram descritos como provados. * B. A CONVICÇÃO. Convicção do tribunal: Foram determinantes para a fundamentar: Factos provados: 1.º a 6.º: As declarações do arguido – na parte em que reconheceu a razão da deslocação ao local, a entrega do filho à mãe, o local da entrega, as desavenças com a esposa, ter entrado no espaço vedado anexo à residência, propriedade da sogra, depois de ter entregue o filho à esposa, e de esta e o filho se deslocarem para a residência, e ter chegado até à porta da mesma, altura em que a porta se fechou já com a esposa e filho no seu interior, adiantando que pôs o pé à porta para impedir que se fechasse mas ela fechou-se –, complementadas pelas declarações da assistente/sogra daquele – que confirmou a entrega do neto pelo arguido à filha, fora do portão que dá acesso à residência, ter a filha fechado o portão, e encontrar-se a chegar à porta da residência com o filho quando alertou que deu conta de o portão se abrir e logo após apareceu o arguido dirigindo-se a elas; referiu que deixou entrar a filha e o neto e fechou a porta, imediatamente, precisamente no momento em que o arguido chegava à porta; ouviu, de seguida, dois violentos pontapés desferidos na porta do lado de fora, onde o arguido se encontrava, provocando a queda das calhas e danificação da fechadura, que ficou pendurada; precisou que tinha proibido o genro de entrar na casa, abrangendo, a proibição, do portão que veda o espaço fechado anexo à residência para dentro, tendo o arguido percebido perfeitamente essa proibição uma vez que a entrega do filho era sempre feita do portão para fora – e pelo depoimento das testemunhas C. esposa do arguido e filha da assistente – que confirmou pormenorizadamente as declarações da mãe, assim como a hora da entrega do filho dada por assente, precisando que o portão é de ferro ( essa a razão de se ter apercebido do arguido a abri-lo, quando foi atrás de si ), o quintal anexo à residência tem mais de 10 m até à porta da casa, e o que ficou pendurado da fechadura não foi esta, propriamente dita, mas o seu puxador –, A. pessoa que fez a reparação da porta – que referiu ter reparado a porta em questão em Setembro de 2008; a fechadura, danificada, foi mudada, e os aros danificados ( arrancados ) foram reparados; 7.º a 10.º: Presunção natural – atenta a idade do arguido, experiência criminal respectiva e experiência de vida; 11.º: As declarações do arguido – informando o tribunal sobre os seus elementos pessoais – que, na ausência de outros elementos mais consistentes, se consideraram atendíveis; 12.º: O teor do doc. de fls. 74/5 ( CRC do arguido, de onde resultam os elementos especificados ); 13.º: O depoimento da testemunha A. já supra referenciada – na parte em que precisou que o valor das reparações que fez na porta ( fechadura, danificada, foi mudada, e os aros danificados, reparados ) e dos seus serviços orçou em cerca de € 70 –, em detrimento das declarações da A. cível/assistente e da testemunha C., esposa do arguido – que, baseadas no orçamento junto aos autos a fls. 3, referiram o valor de € 110, quando esse doc. é relativo a outro componente aplicado na porta, que não qualquer dos danificados pelo arguido; 14.º: As declarações da A. cível/assistente – que confirmou essa factualidade – corroboradas pelo depoimento da testemunha C., filha, que com a mesma vive, sendo essa, aliás, a consequência normal no comum do ser humano; 15.º: As declarações da A. cível – informando o tribunal sobre os seus elementos pessoais – que, na ausência de outros elementos mais consistentes, se consideraram atendíveis. Factos não provados: 16.º: Provado apenas o constante do facto 13. ( vd. convicção respectiva ). Cumpre, agora, conhecer do recurso interposto. O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. Portanto, são apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar. Questões a decidir: - Se foi violado o disposto no artº 374 nº 2 do CPP; - Se foram incorrectamente julgados os factos dados como provados sob os pontos 2 e 3, 5 e 6 7 a 10. - Se se encontra, preenchidos os elementos constitutivos dos crimes de dano e de introdução em lugar vedado ao público; - Se a pena peca por excessiva; - Se o pedido cível deverá se julgado improcedente; - se foi violado o principio in dubio pro reo; Questão Prévia Sustenta a assistente que o recurso é extemporâneo. Não tem razão. Uma vez que o arguido recorre da matéria de facto o prazo para interposição de recurso é elevado para 30 dias – artº 411 nº 4 do CPP. A sentença apenas foi depositada no dia 2/12/2009 e o recurso deu entrada neste Tribunal no dia 15 de Janeiro de 2010, portanto dentro do prazo (29 dias). Sustenta o recorrente que a sentença recorrida não fez um exame crítico das provas que permitiram a sua convicção violando o disposto no nº 2 do art 374 do CPP, o que leva à nulidade da sentença, nos termos do art 379 nº 1 al a) do CPP”. Da análise do disposto no art 374 do CPP vemos que a sentença compõe-se de três partes: relatório, fundamentação e dispositivo. O relatório é elaborado de acordo com o nº 1, a fundamentação de acordo com o nº 2 e o dispositivo de acordo com o nº 3. Na fundamentação é agora obrigatória a indicação das provas que serviram a convicção do tribunal e do exame critico destas. Dispõe o art 374 nº 2 do CPP que “ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de di0reito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”. Em relação á anterior redacção deste preceito legal, a Lei 59/98 de 25/8 que procedeu á revisão do Cod. Penal aditou a exigência do “exame crítico das provas”. Ou seja, para além de se indicar as provas que serviram para formar a convicção do tribunal, este tem que proceder ao exame critico das provas, isto é ao processo lógico e racional que foi seguido na apreciação das provas. “A fundamentação, como resulta expressis verbis do nº 2, não se satisfaz com a enumeração dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento e dos que serviram para fundamentar a sentença. É ainda necessário um exame crítico desses meios, que servirá para convencer os interessados e a comunidade em geral da correcta aplicação da justiça no caso concreto”. (Maia Gonçalves, em anotação ao art 374 do CPP). O objectivo dessa fundamentação e no dizer do prof. Germano Marques da Silva, no Curso de Processo Penal, pg 294, III Vol é a de permitir “a sindicância da legalidade do acto, por uma parte e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando, por isso como meio de autodisciplina”. A ratio da exigência de fundamentação é a de submeter a decisão judicial a uma maior fiscalização por parte da colectividade e é também consequência da importância que assume no novo processo o direito à prova e à contraprova, nomeadamente o direito de defender-se, probando”. Não dizendo a lei em que consiste o exame crítico das provas, esse exame tem de ser aferido com critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respectivo conteúdo (Ac STJ de 12/4/2000, proc nº 141/2000-3ª, SASTJ nº 40,48). Portanto esse exame crítico deve indicar no mínimo e não tem que ser de forma exaustiva, as razões de ciência e demais elementos que tenham na perspectiva do tribunal sido relevantes, para assim se poder conhecer o processo de formação da convicção do tribunal. Ora, se analisarmos a sentença recorrida vemos que esta está bem elaborada e da mesma constam de forma clara e explicita os factos provados e não provados e, encontra-se, ainda, fundamentada. Na verdade, no caso vertente, o Sr Juiz e na motivação refere: Foram determinantes para a fundamentar: Factos provados: 1.º a 6.º: As declarações do arguido – na parte em que reconheceu a razão da deslocação ao local, a entrega do filho à mãe, o local da entrega, as desavenças com a esposa, ter entrado no espaço vedado anexo à residência, propriedade da sogra, depois de ter entregue o filho à esposa, e de esta e o filho se deslocarem para a residência, e ter chegado até à porta da mesma, altura em que a porta se fechou já com a esposa e filho no seu interior, adiantando que pôs o pé à porta para impedir que se fechasse mas ela fechou-se –, complementadas pelas declarações da assistente/sogra daquele – que confirmou a entrega do neto pelo arguido à filha, fora do portão que dá acesso à residência, ter a filha fechado o portão, e encontrar-se a chegar à porta da residência com o filho quando alertou que deu conta de o portão se abrir e logo após apareceu o arguido dirigindo-se a elas; referiu que deixou entrar a filha e o neto e fechou a porta, imediatamente, precisamente no momento em que o arguido chegava à porta; ouviu, de seguida, dois violentos pontapés desferidos na porta do lado de fora, onde o arguido se encontrava, provocando a queda das calhas e danificação da fechadura, que ficou pendurada; precisou que tinha proibido o genro de entrar na casa, abrangendo, a proibição, do portão que veda o espaço fechado anexo à residência para dentro, tendo o arguido percebido perfeitamente essa proibição uma vez que a entrega do filho era sempre feita do portão para fora – e pelo depoimento das testemunhas C esposa do arguido e filha da assistente – que confirmou pormenorizadamente as declarações da mãe, assim como a hora da entrega do filho dada por assente, precisando que o portão é de ferro ( essa a razão de se ter apercebido do arguido a abri-lo, quando foi atrás de si ), o quintal anexo à residência tem mais de 10 m até à porta da casa, e o que ficou pendurado da fechadura não foi esta, propriamente dita, mas o seu puxador –, e A, pessoa que fez a reparação da porta – que referiu ter reparado a porta em questão em Setembro de 2008; a fechadura, danificada, foi mudada, e os aros danificados ( arrancados ) foram reparados; 7.º a 10.º: Presunção natural – atenta a idade do arguido, experiência criminal respectiva e experiência de vida; 11.º: As declarações do arguido – informando o tribunal sobre os seus elementos pessoais – que, na ausência de outros elementos mais consistentes, se consideraram atendíveis; 12.º: O teor do doc. de fls. 74/5 ( CRC do arguido, de onde resultam os elementos especificados ); 13.º: O depoimento da testemunha A. já supra referenciada – na parte em que precisou que o valor das reparações que fez na porta ( fechadura, danificada, foi mudada, e os aros danificados, reparados ) e dos seus serviços orçou em cerca de € 70 –, em detrimento das declarações da A. cível/assistente e da testemunha C. esposa do arguido – que, baseadas no orçamento junto aos autos a fls. 3, referiram o valor de € 110, quando esse doc. é relativo a outro componente aplicado na porta, que não qualquer dos danificados pelo arguido; 14.º: As declarações da A. cível/assistente – que confirmou essa factualidade – corroboradas pelo depoimento da testemunha C., filha, que com a mesma vive, sendo essa, aliás, a consequência normal no comum do ser humano; 15.º: As declarações da A. cível – informando o tribunal sobre os seus elementos pessoais – que, na ausência de outros elementos mais consistentes, se consideraram atendíveis. Factos não provados: 16.º: Provado apenas o constante do facto 13. ( vd. convicção respectiva ). Perante esta motivação temos de concluir que embora de forma concisa o Sr Juiz fez uma análise crítica dos depoimentos prestados quer pelo arguido e ofendida e testemunhas que de acordo com os restantes elementos de prova impõe a decisão proferida quanto à matéria de facto. Na verdade, tendo o Sr juiz enumerado as provas que teve ao seu dispor, indicando o essencial do seu conteúdo e, portanto, o modo como formou o juízo da sua veracidade, cumpriu com o dever de fundamentação contido no art 374 nº 2 do CPP. No que respeita ao elemento subjectivo este, não é susceptível de apreensão directa por pertencer ao foro intimo de cada um, pelo que só pode ser captado através de presunções legais, em conexão com o princípio da normalidade e as regras da experiência que permitam inferi-lo a partir de factos materiais comuns entre os quais avulta o preenchimento da materialidade da infracção. Portanto, a partir de determinados factos e à luz das regras da experiência podemos concluir pela intencionalidade pela forma como agiu o arguido. Portanto, a intenção com que o recorrente agiu retira-se, extrai-se, da matéria de facto. É através da realidade factual que lhe está subjacente que o Tribunal e recorrendo às regras da experiência tem de concluir pela intencionalidade ou não do agente. Sustentam o recorrente que foram incorrectamente julgados os factos dados como provados sob os pontos 2 e 3, 5 e 6, 7 a 10, uma vez que o tribunal não deveria ter dado credibilidade às declarações prestadas pela assistente e pela testemunha C., sua filha. Portanto, o recorrente discorda com a forma como na decisão recorrida foi apreciada a prova produzida em julgamento e as conclusões de convicção probatória a que ali se chegou. De acordo com o disposto no art 412 nº 3 al b) do Código Processo Penal, a matéria de facto impugnada só pode proceder, quando o recorrente tendo por base o raciocínio lógico e racional feito pelo tribunal na decisão recorrida, indica provas que “imponham decisão diversa”. O recorrente não pode fazer o seu julgamento esquecendo a convicção formada pelo tribunal à luz das regras da experiência comum. Se aquela resulta clara desta, demonstradas no exame crítico das provas que a lei lhe impõe (art 374 nº 2 do Código Processo Penal) o raciocínio feito pelo tribunal não pode ceder perante um qualquer outro raciocínio do recorrente. Exige-o o princípio da livre apreciação da prova (art 127 do referido diploma). O recorrente ao pretender a alteração da matéria de facto pretende que o Tribunal faça tábua rasa às declarações prestadas pela assistente e pela testemunha Cátia José Ferreira dos santos. Ora, tal não é indicar provas que imponham decisão diversa. O Tribunal ao decidir teve em consideração todos os depoimentos prestados e os documentos juntos aos autos. Foi no conjunto de todos os elementos que o tribunal fundou a sua convicção. O que afinal o recorrente faz é impugnar a convicção adquirida pelo tribunal a quo sobre determinados factos em contraposição com a que sobre os mesmos ele adquiriu em julgamento, esquecendo a regra da livre apreciação da prova inserta no art 127. De acordo com o disposto no art 127 a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente. “O art 127 do Código Processo Penal estabelece três tipos de critérios para avaliação da prova, com características e naturezas completamente diferentes: uma avaliação da prova inteiramente objectiva quando a lei assim o determinar; outra também objectiva, quando for imposta pelas regras da experiência; finalmente, uma outra, eminentemente subjectiva, que resulte da livre convicção do julgador. A prova resultante da livre convicção do julgador pode ser motivada e fundamentada mas, neste caso, a motivação tem de se alicerçar em critérios subjectivos, embora explicitados para serem objecto de compreensão” (Ac STJ de 18/1/2001, proc nº 3105/00-5ª, SASTJ, nº 47,88). Tal como refere o Prof Germano Marques da Silva no Curso de Processo Penal, Vol II, pg 131 “... a liberdade que aqui importa é a liberdade para a objectividade, aquela que se concede e que se assume em ordem a fazer triunfar a verdade objectiva, isto é, uma verdade que transcende a pura subjectividade e que se comunique e imponha aos outros. Isto significa, por um lado, que a exigência de objectividade é ela própria um princípio de direito, ainda no domínio da convicção probatória, e implica, por outro lado, que essa convicção só será válida se for fundamentada, já que de outro modo não poderá ser objectiva”. Ou seja, a livre apreciação da prova realiza-se de acordo com critérios lógicos e objectivos. Sobre a livre convicção refere o Professor Cavaleiro de Ferreira que esta « é um meio de descoberta da verdade, não uma afirmação infundada da verdade» -Cfr. "Curso de Processo Penal", Vol. II , pág.30. Por outras palavras, diz o Prof. Figueiredo Dias que a convicção do juiz é "... uma convicção pessoal -até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais -, mas em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável , portanto capaz de impor-se aos outros ."- Cfr., in "Direito Processual Penal", 1º Vol., Coimbra Ed., 1974, páginas 203 a 205. O principio da livre apreciação da prova assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art. 355 do Código de Processo Penal. É ai que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na recepção directa de prova. No dizer do Prof. Germano Marques da Silva "... a oralidade permite que as relações entre os participantes no processo sejam mais vivas e mais directas, facilitando o contraditório e, por isso, a defesa, e contribuindo para alcançar a verdade material através de um sistema de prova objectiva, atípica, e de valoração pela intima convicção do julgador (prova moral), gerada em face do material probatório e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens". -Cfr. "Do Processo Penal Preliminar", Lisboa, 1990, pág. 68”. O principio da imediação diz-nos que deve existir uma relação de contacto directo, pessoal, entre o julgador e as pessoas cujas declarações irá valorar, e com as coisas e documentos que servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto. Citando ainda o Prof. Figueiredo Dias, ao referir-se aos princípios da oralidade e imediação diz o mesmo: « Por toda a parte se considera hoje a aceitação dos princípios da oralidade e da imediação como um dos progressos mais efectivos e estáveis na história do direito processual penal. Já de há muito, na realidade, que em definitivo se reconheciam os defeitos de processo penal submetido predominantemente ao principio da escrita, desde a sua falta de flexibilidade até à vasta possibilidade de erros que nele se continha, e que derivava sobretudo de com ele se tomar absolutamente impossível avaliar da credibilidade de um depoimento. (...) .Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais ". -In "Direito Processual Penal", 10 Vol., Coimbra Ed., 1974, páginas 233 a 234 . Assim, e para respeitarmos estes princípios se a decisão do julgador, estiver fundamentada na sua livre convicção e for uma das possíveis soluções segundo as regras da experiência comum, ela não deverá ser alterada pelo tribunal de recurso. Como se diz no acórdão da Relação de Coimbra, de 6 de Março de_2002 (C.J. , ano XXV|II, 20 , página 44) "quando a atribuição da credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear na opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum". Ora, se atentarmos aos factos apurados e compulsada a fundamentação temos de concluir que os juízos lógico-dedutivos aí efectuados são acertados, designadamente no que se refere aos factos apurados e postos em questão pela recorrente. O Sr juiz na decisão recorrida, nomeadamente, em sede de convicção probatória, explica de forma clara e coerente os seus juízos lógico-dedutivos, analisando as provas tidas em consideração. O recorrente com a sua argumentação apenas pretende e com já se referiu extrair dos elementos analisados uma diferente convicção. O recorrente faz o seu próprio julgamento pretendendo, agora impor o seu próprio raciocínio. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, não apontando o recorrente qualquer fundamento válido que a possa abalar. O recorrente ao impugnar a matéria de facto esquece os elementos de prova nos quais o tribunal se baseou. É no conjunto de todos esses elementos que se fundamenta a convicção e não, apenas, num ou noutro dos mesmos elementos (Rec nº 2541/2003 do Tribunal da Relação de Coimbra). Tendo a factualidade apurada apoio na prova produzida em julgamento a questão a decidir é a de saber se a escolha do tribunal está fundamentada. Hoje exige-se que o tribunal indique os fundamentos necessários para que através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção do facto dado como provado e como não provado. O objectivo dessa fundamentação e no dizer do prof. Germano Marques da Silva, no Curso de Processo Penal, pg 294, III Vol é a de permitir “a sindicância da legalidade do acto, por uma parte e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando, por isso como meio de autodisciplina”. A ratio da exigência de fundamentação é a de submeter a decisão judicial a uma maior fiscalização por parte da colectividade e é também consequência da importância que assume no novo processo o direito à prova e à contraprova, nomeadamente o direito de defender-se, probando”. Não dizendo a lei em que consiste o exame crítico das provas, esse exame tem de ser aferido com critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respectivo conteúdo (Ac STJ de 12/4/2000, proc nº 141/2000-3ª, SASTJ nº 40,48). Portanto esse exame crítico deve indicar no mínimo e não tem que ser de forma exaustiva, as razões de ciência e demais elementos que tenham na perspectiva do tribunal sido relevantes, para assim se poder conhecer o processo de formação da convicção do tribunal. É o juiz de julgamento que tem em virtude da oralidade e da imediação, uma percepção própria do material probatório que nós, neste Tribunal, não temos. O juiz do julgamento tem um contacto vivo e imediato com a todas as partes, ele questiona, ele recolhe todas as impressões e está atento a todos os pormenores. O juiz perante dois depoimentos contraditórios por qual deve optar? “Esta é uma decisão do juiz do julgamento. “Uma decisão pessoal possibilitada pela sua actividade congnitiva, mas também por elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais. Como refere Damião da Cunha (RPCC, 8º, 2º pg 259) os princípios do processo penal, a imediação e a oralidade, implicam que deve ser dada prevalência às decisões da 1ª instância” (Ac RP nº 6862/05). Ora, analisando a decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada e, de faz uma exposição dos motivos de facto que fundamentaram a decisão e faz um exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. A sentença recorrida indica de forma clara e na medida do que é necessário, as provas que serviram para a formação da convicção do tribunal. O recorrente põe em causa os factos provados constantes dos pontos 2) e 3), 5) e 6), 7) a 10). Refere-se no ponto 2): Após o arguido ter entregue o filho, o que fez do lado de fora do portão que dá acesso à residência propriedade da assistente, referida em 1., e onde a esposa também reside, a mãe do menor fechou o portão e dirigiu-se à residência na companhia do filho Refere-se no Ponto 3): Encontrava-se já a esposa a chegar à porta da residência, quando ouviu o portão a ser aberto e viu o arguido na sua peugada, após penetrar no espaço vedado anexo à residência referida em 1. Refere-se no ponto 5): Deparando-se com o fechar repentino da porta, o arguido desferiu 2 violentos pontapés na porta, provocando danos a nível da fechadura, cujo puxador ficou pendurado, e dos suportes da porta de alumínio, cujos aros saíram do lugar. Refere-se no ponto 6: O arguido sabia bem que estava proibido expressamente pela assistente de entrar dos portões do espaço vedado que dá acesso à residência para dentro. Refere-se nos pontos: 7. Agiu de modo livre, deliberado e consciente; 8. Com o propósito de invadir aquele espaço anexo à habitação; e 9. No intuito de provocar estragos na porta; 10. Sabia que toda a sua conduta lhe estava legalmente vedada por ser ilícita e criminalmente punível. Na fundamentação refere-se: 1.º a 6.º: As declarações do arguido – na parte em que reconheceu a razão da deslocação ao local, a entrega do filho à mãe, o local da entrega, as desavenças com a esposa, ter entrado no espaço vedado anexo à residência, propriedade da sogra, depois de ter entregue o filho à esposa, e de esta e o filho se deslocarem para a residência, e ter chegado até à porta da mesma, altura em que a porta se fechou já com a esposa e filho no seu interior, adiantando que pôs o pé à porta para impedir que se fechasse mas ela fechou-se –, complementadas pelas declarações da assistente/sogra daquele – que confirmou a entrega do neto pelo arguido à filha, fora do portão que dá acesso à residência, ter a filha fechado o portão, e encontrar-se a chegar à porta da residência com o filho quando alertou que deu conta de o portão se abrir e logo após apareceu o arguido dirigindo-se a elas; referiu que deixou entrar a filha e o neto e fechou a porta, imediatamente, precisamente no momento em que o arguido chegava à porta; ouviu, de seguida, dois violentos pontapés desferidos na porta do lado de fora, onde o arguido se encontrava, provocando a queda das calhas e danificação da fechadura, que ficou pendurada; precisou que tinha proibido o genro de entrar na casa, abrangendo, a proibição, do portão que veda o espaço fechado anexo à residência para dentro, tendo o arguido percebido perfeitamente essa proibição uma vez que a entrega do filho era sempre feita do portão para fora – e pelo depoimento das testemunhas C, esposa do arguido e filha da assistente – que confirmou pormenorizadamente as declarações da mãe, assim como a hora da entrega do filho dada por assente, precisando que o portão é de ferro ( essa a razão de se ter apercebido do arguido a abri-lo, quando foi atrás de si ), o quintal anexo à residência tem mais de 10 m até à porta da casa, e o que ficou pendurado da fechadura não foi esta, propriamente dita, mas o seu puxador –, e Armando Teixeira, pessoa que fez a reparação da porta – que referiu ter reparado a porta em questão em Setembro de 2008; a fechadura, danificada, foi mudada, e os aros danificados ( arrancados ) foram reparados; Como refere, o Prof. Enriço Altavilla, “o interrogatório, como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras” – Psicologia Judiciária, Vol II, Arménio Amado, Editor, Sucessor, Coimbra, 3ª edição, pg 12. As declarações do assistente e das testemunhas C ao contrário da interpretação subjectiva feita pelo recorrente na motivação do recurso, não é inverosímil, nem foge às regras da experiência comum, quando enquadradas no ambiente em que foram proferidas. Nada impede pois que o Tribunal recorrido, no âmbito da imediação e da oralidade, tenha dado credibilidade às declarações da assistente e da referida testemunha. |