Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
19/14.4T8SAT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA DOMINGAS SIMÕES
Descritores: CONFISSÃO
DOCUMENTO PARTICULAR
PROVA PLENA
PROVA EM CONTRÁRIO
NÃO ADMISSÃO DE TESTEMUNHAS
Data do Acordão: 05/31/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU – SÁTÃO – INT. LOCAL – SEC. COMP. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 347º, 352º, 358º, 374º, 376º, 393º E 394º, TODOS DO C. CIVIL.
Sumário: I – Estando em causa um documento particular simples que se mostra assinado pelo declarante, e cuja assinatura, imputada ao ora apelado, foi por este reconhecida, é a mesma tida como verdadeira, nos termos do n.º 1 do art.º 374.º do CC.

II - Assim estabelecida a autoria do documento, o seu valor probatório é o que resulta do disposto no art.º 376.º do CC.: nos termos do n.º 1 do preceito faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, encontrando-se deste modo plenamente provado que o aqui apelado declarou quanto consta da referida cláusula terceira no sentido de ter recebido a totalidade do preço fixado, €20.000,00 já pagos, de que deu quitação, e os restantes €30.000,00 “pagos na data da outorga do presente contrato”, de cujo recebimento deu igualmente quitação; no que respeita à realidade dos factos afirmados ou, para utilizar as palavras da lei, dos “factos compreendidos na declaração”, vale a regra do n.º 2, considerando-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante.

III - A confissão extrajudicial, di-lo o n.º 2 do art.º 358.º do CC, em documento autêntico ou particular - cuja autoria e genuinidade estejam estabelecidas - considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos, e se for feita à parte contrária tem força probatória plena. Daqui decorre que tal prova só cede perante a prova do contrário, consoante prescreve o art.º 347.º, vigorando no entanto as restrições que resultam do art.º 394.º do CC..

IV - A confissão, neste caso extrajudicial, está sujeita ao quadro de vícios do negócio jurídico, podendo ser nula ou anulada, nos termos gerais, por falta ou vícios da vontade. Tal é a solução expressamente consagrada no n.º 1 do art.º 359.º, acrescentando o n.º 2 do preceito que “O erro, desde que seja essencial, não tem de satisfazer aos requisitos exigidos para a anulação dos negócios jurídicos”. E aqui sem qualquer restrição quanto às provas que o declarante pode utilizar.

V - Em suma, porque a declaração de quitação em relação à totalidade do preço efectuada pelo autor e constante de documento particular cuja autoria se encontra reconhecida constitui o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, tem natureza confessória (cf. art.ºs 352.º, 374.º, n.º 1 e 376.º, n.ºs 1 e 2, do CC).

VI - Tendo sido feita à parte contrária, tem força probatória plena (art.º 358.º, n.º 2 do CC), sem embargo de o declarante poder fazer prova, por qualquer meio, da falta ou vícios da vontade, nos termos do art.º 359.º do CC. Fora do âmbito deste preceito, ao apelado era ainda consentido contrariar a prova plena mediante demonstração da inverdade do facto confessado, conforme prevê o art.º 347.º do CC, estando-lhe todavia vedado o recurso à prova por testemunhas ou presunções judiciais (cfr. art.ºs 393.º, n.º 2, 394.º e 351.º do CC).

Decisão Texto Integral:




I. Relatório

A..., casado, residente na Rua ..., instaurou contra P..., Lda., com sede na Rua ..., acção declarativa com processo comum, pedindo a final que, na procedência da acção:

a) fosse declarada anulada a confissão de recebimento de € 30.000 inserta na alínea b) da cláusula terceira do contrato de compra e venda de acções, por erro na declaração da vontade, por desconformidade da declaração emitida pelo A. com a sua vontade real;

caso assim não fosse entendido:

b) fosse declarado que o A. não recebeu da Ré por ocasião da celebração do contrato a quantia de € 30.000 a que se refere a alínea b) da respectiva cláusula terceira;

c) condenando-se em qualquer caso a ré no pagamento ao autor da quantia de € 20.000 (vinte mil euros), acrescida dos juros vincendos desde a data da citação até integral pagamento, contados à taxa supletiva legal.

Para tanto alegou, em síntese, ter celebrado com a ré contrato de compra e venda de acções, que as partes reduziram a escrito e dataram de 26 de Janeiro de 2012, nos termos do qual declarou vender a totalidade das 90.000 (noventa mil) acções que detinha no capital social da “F..., SA”, com sede no ..., sendo 40.000 nominativas, representadas por títulos numerados de 1 a 8 e 29 a 100, e 50.000 ao portador, representadas por títulos numerados de 101 a 347, sendo o preço acordado de €50.000,00, que incluía o valor dos suprimentos que porventura tivesse efectuado à dita sociedade.

Do aludido preço, € 20.000 (vinte mil euros) foram pagos por transferência bancária efectuada pela sócia-gerente da Ré, S..., para a conta do ora A. em 12 de Janeiro de 2012, sucedendo porém que os remanescentes € 30.000,00 (trinta mil euros), apesar do que ficou a constar do contrato, nunca lhe foram pagos.

Com efeito, aquando da assinatura do contrato, a Ré, na pessoa da sua sócia-gerente S... e do companheiro desta, M..., pessoa com quem toda a negociação foi efectuada, asseverou que tinha quantias a receber da Câmara Municipal do ... em valor superior aos mencionados €30.000 e que tão logo a autarquia pagasse, o que se previa para breve, entregaria ao autor aquela quantia. Tratava-se na verdade de um crédito titulado pela “A..., Ld.ª”, sociedade da qual o referido M... era sócio, e, encontrando-se presente no acto da assinatura do contrato o chefe dos serviços de tesouraria da Câmara do ..., que assegurou a existência do aludido crédito, aceitou o demandante o diferimento do pagamento do resto do preço.

Sucede que os pagamentos que a legal representante da Ré e o seu companheiro esperavam receber da Câmara do ... acabaram por não ser efectuados, alegadamente devido a penhoras de entes públicos. Deste modo, por acordo tripartido celebrado nos inícios de 2013, no qual intervieram o autor, o referido Sr. M... em representação da Ré, e ainda J..., este em representação da sociedade “T..., Ld.ª”, foi deduzida ao montante em dívida a quantia de €10.000,00 por via de um encontro de contas entre as referidas três entidades, remanescendo o valor de €20.000,00 que, apesar das insistências do demandante, não foi pago até ao presente, o que justifica a presente demanda.

Decorre do exposto que, ao subscrever o contrato, não quis o demandante dar quitação do recebimento dos aludidos €30.000,00, que na verdade não recebeu, não tendo sequer atentado na redacção do acordo que lhe foi dado a assinar e que havia sido previamente elaborado sem a sua participação, antes tendo confiado na palavra que então lhe foi dada. Não teve assim sequer a consciência de haver emitido tal declaração de quitação, ocorrendo ainda divergência entre a vontade real e a vontade declarada, pois julgou estar a vender as acções nos termos que nessa ocasião foram firmados, ou seja, com o pagamento dos €30.000,00 diferido para momento posterior.

Invocando ter incorrido em “erro-vício, que atinge os motivos determinantes da vontade, ou falta de consciência da declaração ou erro obstáculo, pois que a declaração negocial por si emitida é desconforme à sua vontade”, pretende a anulação da declaração de quitação inserta no acordo celebrado ou, assim não se entendendo, sempre deverá ser declarado que tal declaração não corresponde à verdade, condenando-se em qualquer caso a ré no pagamento da quantia peticionada.

Citada a ré, afirmou ter pago a totalidade do preço acordado pela venda das acções, sendo €20.000,00 mediante transferência bancária efectuada em 12 de Janeiro de 2012, tal como o autor reconheceu, e os restantes €30.000,00 em dinheiro no acto da celebração do contrato e antes do mesmo ter sido assinado, tal como dele ficou a constar e corresponde à verdade.

Alegando ter o autor faltado propositadamente à verdade, com o intuito de ludibriar o Tribunal e obter um benefício económico a que bem sabe não ter direito e com isso obrigando a contestante a incorrer em despesas, pediu a final a condenação daquele como litigante de má-fé em multa e indemnização a seu favor que cubra as despesas e honorários a favor do Mandatário que a representa.

O autor respondeu, refutando a acusação de litigância de má-fé e, alegando ter sido a ré quem faltou à verdade de forma que qualificou de despudorada, pediu por sua vez a condenação desta no pagamento de uma multa e indemnização condigna a seu favor.

Teve lugar a audiência prévia e nela, frustrada a tentativa de conciliação, procedeu a Mm.ª juíza à delimitação do objecto do litígio e fixação dos temas da prova[1], sem reclamação das partes.

Requereu o autor a notificação da ré para proceder à junção de “comprovativo de que junto de alguma instituição bancária movimentou a débito a quantia que diz ter entregado ao autor”, o que foi indeferido, despacho de que interpôs oportuno, o qual não veio a ser admitido.

Realizou-se a audiência de discussão em julgamento, após o que foi proferida douta sentença que, na parcial procedência da acção:

“a) Declarou que o autor não recebeu da ré, por ocasião da celebração do contrato de compra e venda de acções, junto a fls. 42 a 45 dos autos, a quantia de €30.000 a que se refere a alínea b) da cláusula terceira do contrato;

b) Condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros), acrescida do pagamento de juros de mora, à taxa anual correspondente aos juros legais e aos estipulados sem determinação de taxa, no quantitativo actual de 4%, desde o dia da citação da ré, ocorrida a 31.10.2014 e até integral pagamento;

c) Condenou a ré, como litigante de má-fé, no pagamento de uma multa correspondente a 2 (duas) UCs, bem como no pagamento de uma indemnização ao autor, em montante cuja fixação relegou para momento posterior;

d) Absolveu a ré do restante peticionado:

e) Absolveu o autor do pedido da ré de condenação por litigância de má-fé.”

Inconformada, apelou a ré e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas os fundamentos da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões:

...

Com os aludidos fundamentos, requereu a revogação da sentença recorrida e sua substituição por decisão que julgue a acção improcedente ou, assim não se entendendo, sempre deverá ser revogada a condenação da ré como litigante de má-fé.

Contra alegou o autor, suscitando a questão prévia da intempestividade do recurso e pugnando naturalmente pela manutenção do julgado.

Questão prévia:

O autor veio invocar a intempestividade do recurso interposto uma vez que, tendo as partes sido notificadas da sentença no dia 15 de Outubro, o prazo para impugnar a decisão teria terminado a 27/11, incluindo já o prazo suplementar de 10 dias a que alude o n.º 7 do art.º 638.º do CPC. Deste modo, e tendo as alegações dado entrada em juízo apenas no dia 30/11, sem que a apelante tenha procedido ao pagamento da multa devida pela prática do acto no 3.º dia útil posterior ao termo do prazo, deverá ser proferido despacho de rejeição.

Não lhe assiste, porém, razão.

Compulsados os autos verifica-se que a nota de notificação foi elaborada em 15 de Outubro, conforme certificação feita pelo sistema, donde presumir-se efectuada apenas no 3.º dia útil subsequente, conforme comando ínsito no art.º 248.º do CPC. Assim sendo, tendo o recurso sido interposto no dia 30 de Novembro, 1.º dia útil seguinte ao do termo do prazo, que findou num sábado, e contendo impugnação da prova gravada, impõe-se concluir pela sua tempestividade.

Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, as questões pela apelante submetidas à apreciação deste Tribunal implicam indagar da existência de erro de julgamento no que respeita aos pontos 5., 9., 10. e 12. da sentença apelada, designadamente por errada depreciação do valor probatório pleno da confissão efectuada pelo autor recorrido, indevida admissão da prova testemunhal para prova da inverdade do facto confessado e, em todo o caso, erro de apreciação dessa mesma prova testemunhal.

Porque as enunciadas questões - de facto e de direito - se encontram neste caso indissociavelmente ligadas, procederemos à sua apreciação conjunta a propósito da impugnação da matéria de facto.

A apelante insurge-se, como vimos, contra a decisão proferida, pugnando pela eliminação do elenco dos factos assentes dos descritos sob os pontos 5., 9., 10. e 12., com o seguinte teor:

“5. Os remanescentes € 30.000,00 (trinta mil euros), e pese embora o que no acordo ficou consignado, não foram pagos ao autor, nem na data de outorga do acordo, nem em data posterior.

9. M... e o autor acordaram que logo que a Câmara Municipal do ... procedesse ao pagamento da dívida referida no ponto 7), - o que se previa para breve, já que os trabalhos haviam já sido realizados -, então liquidaria ao autor esses € 30.000.

10. O autor confiou na palavra que lhe foi dada de que o pagamento lhe seria efectuado em data posterior, tendo aceitado receber esses € 30.000 em data ulterior.

12. Os pagamentos que a representante legal da Ré e o seu companheiro esperavam receber da Câmara do ... pouco tempo após a celebração do negócio “sub judice”, acabaram por não ser efectuados, alegadamente devido a penhoras de entes públicos”.

Importa ainda atender, neste conspecto, à seguinte matéria, igualmente dada como assente:

...

Conforme se alcança da motivação elaborada pela Mm.ª juíza, a convicção alcançada no que respeita aos factos agora impugnados alicerçou-se na prova testemunhal produzida, tendo sido relevados a propósito os testemunhos prestados por ...

Acrescentou por último ter o Tribunal considerado a prova testemunhal “quanto ao carácter não verdadeiro da declaração (confessória) constante de documento particular, na medida em que tal se situa no âmbito da interpretação do contexto do documento (cfr. artigo 393.º/3 do Código Civil)”.

A apelante pretende a modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto, alegando para tanto que a declaração efectuada pelo autor, reconhecendo um facto que lhe é desfavorável, adquire força probatória contra o declarante, o que implica a inadmissibilidade da prova por testemunhas, atento o disposto no artigo 394.º do CC, sendo certo ainda que os testemunhos a este propósito prestados não assumiram consistência bastante para contrariar o tero da declaração confessória.

Indaguemos, pois, da correcção de tal argumentação.

Está em causa o acordo celebrado entre autor e ré, datado de 26 de Janeiro de 2012, subscrito pelo autor e pela legal representante da ré, junto como documento n.º 1.

Na apreciação do valor probatório do aludido documento importar reter que o autor, sem impugnar a assinatura do mesmo, antes reconhecendo ter sido por si subscrito, pretende no entanto não corresponder à verdade a declaração que dele consta no sentido de ter recebido o preço das acções que na ocasião declarou vender à ré, e de que deu quitação no acto.

Estando em causa um documento particular simples que se mostra assinado pelo declarante, e cuja assinatura, imputada ao ora apelado, foi por este reconhecida, é a mesma tida como verdadeira, nos termos do n.º 1 do art.º 374.º do CC[2].

Assim estabelecida a autoria do documento, o seu valor probatório é o que resulta do disposto no art.º 376.º: nos termos do n.º 1 do preceito faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, encontrando-se deste modo plenamente provado que o aqui apelado declarou quanto consta da referida cláusula terceira no sentido de ter recebido a totalidade do preço fixado, €20.000,00 já pagos, de que deu quitação, e os restantes €30.000,00 “pagos na data da outorga do presente contrato”, de cujo recebimento deu igualmente quitação; no que respeita à realidade dos factos afirmados ou, para utilizar as palavras da lei, dos “factos compreendidos na declaração”, vale a regra do n.º 2, considerando-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante, mas a declaração é indivisível nos termos prescritos para a prova por confissão.

Diz-se confissão o reconhecimento que a parte faz da realidade da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (cf. art.º 352.º).

Com base na regra de experiência segundo a qual ninguém mente em contrário ao seu interesse, “esta declaração de ciência (na medida em que contém uma informação sobre a realidade) constitui presunção da realidade do facto desfavorável ao confitente, ou, ao invés, da inocorrência do facto favorável ao confitente que dela é objecto”[3].

A confissão extrajudicial, di-lo o n.º 2 do art.º 358.º, em documento autêntico ou particular -cuja autoria e genuinidade estejam estabelecidas - considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária, tem força probatória plena. Daqui decorre que tal prova só cede perante a prova do contrário, consoante prescreve o art.º 347.º, vigorando no entanto as restrições que resultam do art.º 394.º.

A propósito da questão que nos ocupa, escreveu-se no acórdão deste mesma Relação 19/12/2014[4], aqui com plena pertinência: “Quanto à força probatória dos documentos assinados pelo autor, quando genuínos, fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor (art.ºs 374.º n.ºs 1 e 376.º n.º 1 do Código Civil).

Em concreto, quanto aos documentos assinados pelo seu autor a lei institui um sistema gradativo ou sucessivo de ilações.

Em primeiro lugar, a genuinidade da assinatura e, portanto, da autoria do documento: invocado um documento assinado, fica assente, por prova bastante, que a assinatura é genuína: se a parte não impugnar a veracidade da assinatura, ela tem-se por demonstrada (art.º 374.º n.º 1 do Código Civil). Da genuinidade da assinatura conclui-se a genuinidade do texto do documento: o documento cuja autoria seja reconhecida nos termos apontados faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor (art.º 376.º n.º 1 do Código Civil).

No caso, a declaração de quitação, rectior, a declaração de que a recorrida recebeu o preço convencionado, consta de documento particular. Dado que a apelante não impugnou a assinatura do referido documento considera-se como certa e inatacável a sua autenticidade; a autenticidade do contexto ou do corpo do documento resulta, por sua vez, do estabelecimento da autenticidade da assinatura (art.º 374.º n.ºs 1 e 2 do Código Civil).

Uma vez estabelecida a autenticidade do documento – a da assinatura e do contexto – está provado que a apelada emitiu a declaração de quitação, e como o facto compreendido nessa declaração é evidentemente contrária aos seus interesses, tem de se dar como plenamente provado que o apelante recebeu o indicado preço (art.º 376.º n.ºs 1 e 2 do Código Civil)”.

Sendo este o itinerário a percorrer seguindo as citadas disposições legais, uma ressalva se impõe fazer: a confissão, neste caso extrajudicial, está sujeita ao quadro de vícios do negócio jurídico, podendo ser nula ou anulada, nos termos gerais, por falta ou vícios da vontade. Tal é a solução expressamente consagrada no n.º 1 do art.º 359.º, acrescentando o n.º 2 do preceito que “O erro, desde que seja essencial, não tem de satisfazer aos requisitos exigidos para a anulação dos negócios jurídicos”. E aqui sem qualquer restrição quanto às provas que o declarante pode utilizar[5]

E foi seguramente por se encontrar alertado para as restrições decorrentes do disposto nos art.ºs 393.º/2 e 394.º, interditando o recurso à prova testemunhal e também, por inerência, à prova por presunções judiciárias (cf. art.º 351.º) para contrariar o facto confessado e assim plenamente provado, que o autor invocou a existência de vícios da vontade, peticionando, em via principal, a anulação da declaração confessória efectuada. Foi assim lícita a produção da prova testemunhal sendo certo porém que, conforme resulta evidente da decisão, fracassou o autor na prova dos factos que sustentavam os invocados vícios. Por assim ser, a questão que verdadeiramente se coloca é a de saber se a Mm.ª juíza poderia fazer o aproveitamento da prova testemunhal, (bem) admitida para prova dos factos fundantes dos invocados vícios, para contrariar por este meio o facto plenamente provado por confissão. E a resposta é, a nosso ver, negativa.

Diga-se, antes de mais, que não concordamos com a Mm.ª juíza “a quo” quando defende a admissibilidade da prova por testemunhas a pretexto de estar em causa “apenas a interpretação do contexto do documento”. Decerto que assim não é, uma vez que está em causa directa e exclusivamente a (ir)realidade do facto confessado, e não o contexto em que a declaração confessória foi efectuada. Assim considerou o STJ em acórdão de 17/6/2014[6], no qual se afirma “I. A declaração de recebimento do preço de prometida compra e venda, constante de documento particular não arguido de falsidade e subscrito, com admissão, nos termos legais, da respectiva autoria, pelos respectivos sujeitos contratuais, consubstancia confissão extrajudicial que, por dirigida à parte contrária e não arguida de nulidade ou anulabilidade por falta ou vícios da vontade, é dotada de força probatória plena; II. Tal declaração não admite prova testemunhal para prova do facto contrário, porquanto, então, não está em causa a simples interpretação do correspondente contexto”.

Assim sendo, a admissibilidade da produção de prova por testemunhas - e também por presunções judiciárias - dependia da existência de um princípio de prova escrita que contrariasse aquela declaração confessória[7], que não existe no processo e o autor não invocou. Inexistindo esta última via de abertura à prova testemunhal, a consideração de que a declaração constante do contrato, no sentido do preço ter sido integralmente recebido, constitui uma declaração confessória, obsta a que se dê como provado o contrário com base em prova testemunhal, isto “a partir do momento em que claudicou a prova dos demais factos alegados tendentes a provar o erro em que o declarante incorreu, visto que a prova testemunhal apenas é admissível para a prova do erro ou de outro invocado vício de vontade ou da sua falta que haja sido alegado”[8].

Atento o que vem de se expor, impõe-se concluir que ao autor estava interditado o recurso à prova testemunhal para fazer prova de que a quantia relativa ao resto do preço não tinha sido paga, contrariando a sua própria declaração confessória (cf. art.ºs 393.º, n.º 2 e 394.º, n.º 1).

Ainda em ordem a fixar o alcance probatório de tal declaração efectuada pelo autor, considerou a Mm.ª juíza que “relativamente à declaração de quitação em documento particular a prova plena reporta-se à materialidade das declarações e não à exactidão do conteúdo destas, podendo, quanta a esta, o autor do documento produzir livremente prova.

Mantém-se, pois, a regra de que o cumprimento, porque extintivo das obrigações, há-de ser demonstrado pelo devedor nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, não decorrendo do documento de quitação, ainda, qualquer presunção legal de cumprimento, inversão do ónus da prova nos termos do artigo 344.º ou constituição de contraprova nos termos do artigo 346.º mencionado Código”.

Estribando-se em aresto do STJ que identificou[9], considerou ainda que “por via da quitação prestada à ré, exarada no documento particular de contrato compra e venda de acções da F..., nenhuma prova resulta, de “per se”, da verificação do alegado pagamento. E isto porque, como se deixou já antever, a prova plena a que alude o número 1 do artigo 376.º do Código Civil refere-se à materialidade das declarações e não à sua existência”. Em linha com tal raciocínio, veio a concluir que “(…) tendo aplicação o princípio da liberdade de apreciação de prova quanto à (in)existência do aludido cumprimento, resultou adquirido que o pagamento dos €30.000,00 não teve lugar na data de outorga do contrato”.

Pois bem, conforme resulta do que antecedentemente se expôs, não se acompanha a Mm.ª juíza, nem no caminho que trilhou, nem na conclusão a que chegou.

No que se refere ao aresto citado, é verdade que nele se afirma que “o legislador não conferiu à quitação força probatória que fosse para além da generalidade dos documentos em que se integra. E tanto assim é, que consignou no mesmo artigo que, no exercício do seu direito, aquele que cumpre a obrigação, se nisso tiver interesse legítimo, pode exigir que aquela conste de documento autêntico ou autenticado. Verteu, pois, no regime geral, relativo aos documentos, a força probatória da quitação, despindo-a de força relativamente a inversão do ónus de prova. (…) Repousando, assim, no valor probatório do documento onde está consubstanciada, valem, consoante os casos, os artigos 371.º, 372.º, 376.º e 377.º”.

Deste modo, e segundo o aresto em causa, o valor probatório da quitação será aferido em função do valor probatório do documento que contem a declaração, o que, cremos, não contraria em nada quanto vimos referindo.

Por outro lado, e embora a questão não tenha sido directamente abordada, porque não invocada, resulta das alegações dos recorrentes no processo em que o mesmo acórdão foi proferido que a autora juntou aos autos cheques por aqueles emitidos e que tinham sido devolvidos sem pagamento, os quais bem podem ter valido como princípio de prova escrita, a permitir a produção de prova por testemunhas e por presunções judiciárias, de cuja conjugação terá resultado contrariada a realidade subjacente à declaração de quitação, conforme exige o art.º 347.º.

Finalmente, olvida a Mm.ª juiz o nuclear n.º 2 do art.º 376.º e, por consequência, que o que está aqui em causa não é tanto o valor probatório do documento em si, mas antes o valor probatório da confissão que resulta do disposto no n.º 2 do art.º 358.º[10].

Bem a propósito, e versando sobre cada uma das questões também suscitadas nestes autos, em particular sobre o valor da quitação, decidiu o STJ, em acórdão de 17/12/2015[11]: “Todavia, ao contrário do que concluiu a 1.ª instância, aquela declaração, com significado de quitação reportado ao valor da cessão das quotas, para efeitos do disposto no art.º 787.º do CC, não pode ser rebaixada ao ponto de o cedente ser pura e simplesmente dispensado da demonstração da sua inveracidade. A força probatória plena emergente de um documento exarado pelo Notário não corresponde apenas aos factos que o mesmo presenciou e que fez constar do acto, podendo envolver, noutro campo, a valoração de declarações a que seja atribuído valor confessório. Ou seja, uma declaração feita por alguma das partes à contraparte que envolva o reconhecimento de um facto que lhe seja desfavorável e favoreça a parte contrária é qualificada como declaração confessória, nos termos e para efeitos dos art.ºs. 352.º e 358.º, nº 2, do CC.

Assim ocorre com a declaração que foi inserida na escritura de cessão de quotas reportada ao recebimento do preço. Traduz, sem qualquer dúvida, a admissão de um facto que implica para o A. (cedente) a assunção da existência do pagamento e que beneficia a R. (cessionária). Nesta estrita medida é revestida de força probatória plena, com o significado e efeito que naturalmente dela emerge, ou seja, implicando o reconhecimento pelo cedente de que recebeu a totalidade do preço.

Nesta medida, o beneficiário da declaração confessória é dispensado de provar a veracidade do seu conteúdo e, concretamente, de demonstrar, por outras vias, a efectivação do cumprimento, como forma de extinção da obrigação relativa à totalidade do preço.

A prova da eventual inveracidade da declaração, ou seja, de que, apesar do teor do que ficou exarado na escritura, o preço da cessão não fora totalmente pago, restando o pagamento de uma parte, poderia ser feita pelo confitente no âmbito de uma acção em que seja invocada a nulidade ou anulabilidade da confissão.

Invocada falta ou vício na formação da vontade, a lei, em regra, não restringe o uso de qualquer meio de prova relativamente aos factos integradores do vício negocial. É a estas situações que Lebre de Freitas se refere quando analisa os efeitos da confissão e a forma de demonstrar a falsidade do facto confessado, especificamente o recebimento de uma determinada quantia afirmado numa escritura pública ou noutro documento (A Confissão no Direito Probatório, págs. 648 e segs.).

(…) Fora desses casos, o confitente é ainda autorizado a alegar e demonstrar que, malgrado o teor da declaração confessória, o pagamento não foi total ou parcialmente concretizado (art.º 347.º, 1ª parte, do CC). Mas agora com uma importantíssima restrição probatória, sobressaindo, com efeitos na resolução do caso concreto, a limitação quanto ao uso de prova testemunhal (e também ao uso de presunções judiciais), nos termos dos art.ºs 347.º, 2.ª parte, 393.º, nº 2, e 351.º do CC (cfr. Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 758, onde atesta com toda a clareza que “uma vez assente, por confissão não impugnada, a realidade de determinado facto”, é vedado que “esta prova possa ser posta em causa por testemunhas ou presunções judiciais, deixando intacto o problema da colisão da confissão com outros meios de prova legal plena”).

Ou seja, em tais circunstâncias, a confissão extrajudicial inserida em documento autêntico ou particular (cuja falsidade não seja invocada): a) Goza de força probatória plena, nos termos do art.º 358.º, n.º 2, do CC; b) Apenas pode ser contrariada mediante a produção de meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que foi objecto da confissão (art.º. 347.º, 1.ª parte); c) E para este efeito, o confitente enfrenta as restrições legais quanto ao uso de certos meios de prova (art.º 347.º do CC)”.

E acrescenta “Não é difícil compreender os motivos pelos quais o sistema foi assim moldado. Nos casos em que não seja assacado à declaração qualquer vício que infirme o valor intrínseco do respectivo conteúdo, é natural que sejam limitados os meios de prova susceptíveis de a infirmar, evitando os riscos da volatilidade e da subjectividade inerentes à prova testemunhal ou ao uso de presunções judiciais. Representando a confissão extrajudicial o reconhecimento de um facto – in casu, a extinção do direito de crédito emergente do contrato de cessão de quotas – o beneficiário de tal declaração não poderia evidentemente ser colocado no mesmo plano em que ficaria se acaso não houvesse qualquer declaração confessória.

Neste contexto, não podemos deixar de confirmar o juízo da Relação no acórdão recorrido que, por um lado, atribuiu à declaração o relevo próprio de uma declaração confessória e, por outro, condicionou o tipo de meios probatórios susceptíveis de interferir na verificação da inveracidade de tal declaração”.[12]

Em suma, porque a declaração de quitação em relação à totalidade do preço efectuada pelo autor e constante de documento particular cuja autoria se encontra reconhecida constitui o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, tem natureza confessória (cf. art.ºs 352.º, 374.º, n.º 1 e 376.º, n.ºs 1 e 2).

Tendo sido feita à parte contrária, tem força probatória plena (art.º 358.º, n.º 2), sem embargo de o declarante poder fazer prova, por qualquer meio, da falta ou vícios da vontade, nos termos do art.º 359.º. Fora do âmbito deste preceito, ao apelado era ainda consentido contrariar a prova plena mediante demonstração da inverdade do facto confessado, conforme prevê o art.º 347.º, estando-lhe todavia vedado o recurso à prova por testemunhas ou presunções judiciais (cfr. art.ºs 393.º, n.º 2, 394.º e 351.º).

Do que se deixou agora sintetizado resulta que com fundamento na prova por testemunhas não poderia a Mm.º juíza ter dado por assente quanto consta dos impugnados factos, que nada têm a ver com os vícios invocados - factualidade toda ela, de resto, dada como não provada - mas apenas e só com a alegada inverdade do facto que se encontrava plenamente provado.

Dir-se-á ainda, complementarmente, que da audição da prova produzida, estando em causa o depoimento de parte prestado pela legal representante da ré e os testemunhos de ..., não se vê que as declarações destes dois últimos, credibilizadas pela Mm.ª juíza, tenham assumido consistência bastante para infirmar a declaração vertida no documento.

...

Finalmente, tendo a A... sido declarada insolvente no âmbito de processo entado em juízo em 2011, sendo certo que haviam sido antes disso penhorados pela Fazenda Nacional créditos que detinha sobre a Câmara Municipal, factos que, ao que tudo indica, ocorreram em data anterior à celebração do contrato e dos quais a testemunha ... teve necessariamente conhecimento atentas as funções que desempenhava naquela edilidade, sendo, como disse, amigo do autor, não se vê como poderia assegurar que, ainda a existirem pagamentos a efectuar àquela sociedade, não ocorressem novas penhoras. 

...

Deste modo, e em conclusão, ainda a ser admitida, verifica-se que a prova complementar oferecida pelo autor não assume a consistência necessária à afirmação da inveracidade da declaração por ele efectuada, ou seja, não permite que se tenha como assente que não recebeu o valor de €30 000,00 correspondente ao resto do preço.

Termos em que, na procedência da impugnação, se determina a eliminação dos referidos pontos da matéria de facto, que passam a integrar o elenco dos não provados.

Fundamentação

De facto

São os seguintes os factos a considerar:

...

De Direito

O autor tinha peticionado em primeira linha a anulação da declaração de recebimento do preço exarada no acordo por si celebrado com a ré e reduzido a escrito, que reconhecia como confessória, com fundamento em vícios da vontade. Tal pretensão foi, por ausência do necessário suporte probatório, julgada improcedente, decisão com a qual o ora apelado se conformou, tendo por isso transitado em julgado.

Tendo alegado subsidiariamente não corresponder à verdade quanto declarou no sentido de ter recebido o resto do preço, pretende o autor a condenação da ré no pagamento da quantia de €20.000,00.

À luz da factualidade assente nos autos não suscita dúvida a qualificação do contrato celebrado entre autor e ré como de compra e venda, do qual decorre como efeito essencial para o comprador a obrigação de pagar o preço (cf. art.ºs 892.º e 879.º).

Tal como a Mm.ª juíza enunciou, de acordo com o princípio estipulado no artigo 406.º do Código Civil, os contratos devem ser pontualmente cumpridos (“pacta sunt servanda”), mediante a realização integral das prestações a que as partes se vincularam e segundo o princípio da boa-fé  – art.º 762.º, n.º 2. Nos termos do n.º 1 desta disposição legal, o devedor cumpre a sua obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado.

No caso em apreço, subsistindo quanto consta do contrato firmado entre as partes, encontra-se plenamente demonstrado que o preço se encontra pago na sua totalidade, pelo que a presente acção terá de improceder.

III. Decisão

Acordam os juízes da 3.ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar procedente o recurso, revogando a sentença recorrida e absolvendo em consequência a ré do pedido.

Custas em ambas as instâncias a cargo do autor/apelado.

Relatora:

Maria Domingas Simões

Adjuntos:

1º - Jaime Ferreira

2º - Jorge Arcanjo

[1] Nesta sede tendo sido enunciados os seguintes:

1. A vontade declarada inserta na alínea b) da cláusula 3ª do contrato de compra e venda não correspondia à vontade real do autor?

2. Essencialidade para o declarante do elemento sobre o qual incidiu o erro?

3. Conhecimento desta essencialidade por parte do declaratário?

4. O autor não recebeu da ré os 30.000€ (trinta mil euros) a que se refere alínea b) da cláusula 3.ª do contrato de compra e venda?

5. Foi celebrado um acordo entre autor, a ré e a sociedade T..., Lda, em consequência do qual seria abatida à quantia de 30.000€ o valor de 10.000€ (dez mil euros)?

6. Saber se o autor ou ré omitiram/alterado pelo menos de forma negligente a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa?

*

[2] Diploma a que pertencerão as demais disposições legais que vierem a ser citadas sem menção da sua origem.
[3] Aut. e ob. cit., págs. 240/241.
[4] Proferido no processo 98/11.6TBSCD.C1, relatado pelo Ex.mº Sr. Juiz Des. Henrique Antunes e subscrito pelo Ex.mº Sr. Juiz ora 1.º, que versava sobre contrato-promessa de compra e venda do qual constava similar declaração de quitação, acessível em www.dgsi.pt.
[5] Cf. Almeida Costa, em anotação concordante ao acórdão do STJ de 4 de Junho de 1996, RLJ 129, ano, págs. 348 a 352 e 360 a 369.
[6] Processo n.º 8034/10.9 TBMTS.P1.S1, em www.dgsi.pt

[7] Neste sentido, ainda que a propósito de documento autêntico, Ac. STJ de 7/9/2014, processo n.º 28852/10-0 T2SNT.L1.S1, de que se destacam os seguintes pontos do sumário:

“:I - No documento autêntico, o documentador garante, pela fé pública de que está revestido, que os factos, que documenta, se passaram; mas não garante, nem pode garantir, que tais factos correspondem à verdade.

II - A escritura pública de compra e venda não faz prova plena do pagamento do preço ao vendedor. Porém, a declaração do vendedor perante o notário de já ter recebido o preço, tem este valor, porquanto implica o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável, e que o art.º. 352.º do CC qualifica de confissão.

III - Trata-se de uma confissão extrajudicial, em documento autêntico, feita à parte contrária, admissível pela sua própria essência, que goza de força probatória plena contra o confitente (faz prova plena de que, nesse acto, o vendedor declarou já ter recebido o preço) – cf. art.ºs. 355.º, n.º s 1 e 4, e 358.º, n.º 2, do CC.

IV - Se o vendedor alega que não recebeu o preço, impunha-se-lhe alegar a falsidade do aludido documento autêntico ou fazer prova da falta ou vícios da vontade que inquinaram a declaração constante desse documento.

V - Fora destes casos, só quando existir um princípio de prova escrita suficientemente verosímil, fica aberta a possibilidade de complementar, mediante testemunhas, a prova do facto contrário ao constante da declaração confessória, ou seja, de demonstrar não ser verdadeira a afirmação consciente e voluntariamente produzida mediante o documentador (…)”.

Ainda quanto à admissibilidade da prova por testemunhas, o acórdão de 15/4/2015, processo n.º 28247/10.4 T2SNT.A.L1, com declaração de voto da Ex.ª Sr.ª Conselheira Prazeres Beleza, precisando os restritos termos em que esta prova pode ser admitida.

[8] Do acórdão do STJ de 17/3/2016, processo n.º 2294/12.9 TBPTB.G1.S1, acessível no mesmo sítio.
[9] Trata-se do acórdão do STJ de 16/10/2008, proferido no processo n.º 08B2668, acessível em www.dgsipt.
[10] Como adverte o Prof. Lebre de Freitas “Não se confunde a força probatória do documento particular com a da confissão: o documento prova que quem o subscreve fez a declaração dele constante; esta declaração, porque desfavorável ao subscritor, tem força de confissão. O art.º 376.º, n.º 2 do CC contém assim uma norma probatória relativa à confissão, e não já ao documento” – “A acção declarativa comum à luz do Código Revisto”, Coimbra Editora, 2.ª edição, págs. 244/245.
[11] Proferido no processo 40/10.9 TVPRT.P1.S1, aqui com plena pertinência, porquanto, apesar de versar sobre escritura pública, as soluções nele adoptadas são igualmente válidas quando esteja em causa documento particular cuja autoria se encontre reconhecida, tal como resulta do próprio aresto.
[12] Neste mesmo sentido, para lá dos diversos acórdãos ali citados, ainda o acórdão deste Relação de Coimbra de já mencionado e ainda os acórdãos do STJ de 26/5/2009, processo n.º 97/09.8 YFLSB; de 5/7/2009, processo n.º 09 A 0644.S.1