Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||||||
Processo: |
| ||||||
Nº Convencional: | JTRC | ||||||
Relator: | JAIME CARLOS FERREIRA | ||||||
Descritores: | PLANO ESPECIAL DE RECUPERAÇÃO PER NÃO HOMOLOGAÇÃO OFICIOSA DAÇÃO DE BENS EM PAGAMENTO DOS CRÉDITOS SOBRE A INSOLVENTE PRAZO DE APROVAÇÃO DO PLANO | ||||||
Data do Acordão: | 04/26/2016 | ||||||
Votação: | UNANIMIDADE | ||||||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – INST. CENTRAL – 1ª SEC. DE COMÉRCIO | ||||||
Texto Integral: | S | ||||||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||||||
Decisão: | CONFIRMADA | ||||||
Legislação Nacional: | ARTºS 17º-A, 17º-F, Nº 5, 17º-G, 202º, Nº 2, E 215º, TODOS DO CIRE. | ||||||
Sumário: | I – Resulta do disposto no artº 202º, nº 2 do CIRE que “A dação de bens em pagamento dos créditos sobre a insolvência, a conversão destes em capital ou a transmissão das correspondentes dívidas com efeitos liberatórios para o antigo devedor depende da anuência dos titulares dos créditos em causa, prestada por escrito”. II - O nº 2 do art. 202º do CIRE é uma norma que conforma a substância do plano de recuperação mais concretamente uma que define um conteúdo vinculado do plano de recuperação. III – Tal aplicação resulta do disposto no artº 17º-F, nº 5 do CIRE (na redação da Lei nº 16/2012, de 20/04), disposição esta que manda aplicar ao plano de recuperação, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artºs 215º e 216º do CIRE. IV - A não observância daquela disposição traduz-se na sua própria violação, pelo que nos termos do artº 215º do CIRE deve o juiz recusar oficiosamente a homologação do plano de recuperação. V - A homologação de um Plano de insolvência que prevê a dação em cumprimento de imóveis a favor de um credor hipotecário, em vez do pagamento do seu crédito, depende, com o âmbito de aplicação do nº 2 do art.º 202º do CIRE, da anuência daquele credor, prestada por escrito, a não ser que tenha votado o Plano favoravelmente, caso em que se considera haver consentimento tácito. VI - A aprovação do plano tem de ser efectuada dentro do prazo da fase das negociações, fase esta que comunga do carácter de urgência que é genericamente atribuído ao processo de revitalização pelo art.º 17º-A, nº 3 do CIRE. VII - Inserindo-se a aprovação do plano de recuperação dentro da fase das negociações, uma vez decorrido o prazo máximo destas sem a aprovação unânime daquele impõe-se a não homologação do plano por ter sido aprovado em violação de norma legal imperativa – nº 1 do art.º 17º-G conjugado com o nº 5 do art.º 17º-D, ambos do CIRE. | ||||||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I Na Comarca de Leiria – Leiria – Inst. Central – 1ª Sec. de Comércio, correm termos os presentes autos de processo especial de revitalização de pessoa singular (PER), requeridos por E..., farmacêutica, com residência na Rua ... Para o efeito e muito em resumo alega que se encontra em situação económica difícil, não tendo possibilidades em cumprir pontualmente algumas das suas obrigações vencidas, e não podendo obter crédito bancário. Que, no entanto, reúne condições de recuperação económica, tendo já encetado negociações com o seu credor C... com vista à revitalização económica da Requerente, através da aprovação de um plano de recuperação para o dito efeito. II Foi nomeado como administrador judicial provisório, nos termos do disposto no art. 17º-C, nº 3, al. a) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), o Dr. V..., economista inscrito na Lista Oficial de Administradores de Insolvência e que foi indicado pela Requerente. O referido Administrador juntou lista provisória de créditos, nos termos dos artºs 17º-D e 129º do CIRE, créditos esses que considerou serem todos a reconhecer. Em 14 de Janeiro de 2016 veio o Sr. Administrador Judicial Provisório dar conta nos autos de que ficaram concluídas as negociações com os credores da Requerente e que o plano de recuperação foi aprovado com votos favoráveis que representam um valor superior a 2/3 dos votantes, o que no caso presente se traduz num percentagem de 77,59% (pela al. a) do art. 17º-F, nº 3) e de 68,02% ( pela al. b) do mesmo normativo) e 22,41% de votos desfavoráveis. Juntou, em simultâneo, o Plano de Revitalização. III Nessa sequência foi proferido o seguinte despacho: “Para a decisão de homologação do plano de recuperação importa considerar os seguintes factos: 1º- Votaram favoravelmente o plano de recuperação da devedora apresentado aos credores: a Autoridade Tributária e Aduaneira; a C..., CRL; e C... 2º- Votaram desfavoravelmente: C... – Instituição Financeira de Crédito, SA; Banco C..., SA; Banco B...; C..., SA; e C..., SA. 3º- Consta do plano de recuperação no que concerne ao pagamento do crédito da C..., SA: a) Liquidação da totalidade do valor de capital reclamado e reconhecido; b) Os juros vencidos desde a data de incumprimento até à data do trânsito em julgado da sentença que homologar o Plano serão anulados; c) A liquidação da totalidade da dívida será feita com a Dação em Pagamento pela entrega do imóvel que garante este financiamento, abrangendo quaisquer outras dívidas constituídas. (…)”. 4º- De acordo com os votos remetidos aos autos pelo Sr. AJP temos que : A Autoridade Tributária e Aduaneira enviou o seu voto ao Sr. AJP em 7.01.2016; a C... – Instituição Financeira de Crédito, SA a 11.01.16; o Banco C..., SA a 13.01.16; o Banco B... a 12.01.2016; a C..., CRL a 13.01.16; A C..., SA a 13.01.16; a C..., SA a 11.01.2016; C... foi recebido a 8.01.2016. Questões a decidir: 1º- Se o plano de recuperação em que se prevê a dação em pagamento de um imóvel a um credor sem a expressa aceitação de tal dação pelo credor visado pode ser homologado; 2º- Se o plano de recuperação pode ser homologado apesar de se encontrar ultrapassado o prazo de três meses estabelecido na lei para a conclusão das negociações. Vejamos então, começando pela primeira questão: O processo especial de revitalização introduzido pela Lei 16/2012, de 20 de Abril, regulado nos artigos 1º, nº 2, 17º-A a 17º-I do CIRE pretendeu “assumir-se como um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente eminente mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência actual” (Exposição de Motivos da Proposta de Lei 39/XII, de 30 de Dezembro de 2011). Daqui resulta que a lei disponibiliza aos devedores que se encontrem numa situação de insolvência meramente eminente dois meios judiciais: o processo de insolvência e o processo especial de revitalização, sendo que este se aplicará apenas naquelas situações em que ainda é possível a recuperação, através da negociação com os respectivos credores com vista a com eles estabelecer um acordo nesse sentido de harmonia com o preceituado no artigo 17º-A do CIRE (Maria do Rosário Epifânio, Manual de Direito da Insolvência, pág. 275/276). Este processo pré-insolvencial tem como pressuposto substantivo a recuperabilidade do devedor e visa privilegiar, sempre que possível, a manutenção do devedor no giro comercial, gizando-se soluções eficazes de combate ao desaparecimento e desmantelamento (Exposição de Motivos da Proposta de Lei supra indicada). É um processo negocial extrajudicial do devedor com os credores, com a orientação e fiscalização do administrador judicial provisório, focalizado na obtenção de um acordo para a revitalização da devedora, permitindo que esta regularize os seus compromissos para com os seus credores de forma preventiva, isto é, antes de entrar numa situação irreversível de insolvência. No caso vertente, o plano de recuperação apresentado obteve uma percentagem de votos positivos que satisfez os requisitos exigidos pelo nº 3 do artigo 17º-F do CIRE, pelo que o plano foi devidamente aprovado. No que tange à homologação do plano, decorre do disposto nos artigos 17º-F, nº 5, 215º e 216º, todos do CIRE, que o juiz pode recusar a homologação do plano de insolvência aprovado pelos credores. A não homologação do plano pode ter lugar ex officio ou a pedido de um credor. Com efeito, pode o juiz recusar, oficiosamente, a homologação do plano de revitalização aprovado na assembleia de credores, no caso de ocorrer violação não negligenciável de regras procedimentais, ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, no entendimento das primeiras como sendo as que visam regular a forma como deverá desenrolar-se o processo, enquanto as segundas se reportarão ao dispositivo do plano de revitalização, bem como aos princípios que lhe devam estar subjacentes (Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, pág. 826). Embora não conste na lei o que devem ser vícios não negligenciáveis, tem-se entendido (Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, obra citada, pág. 827), que revestem tal natureza todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza, diversamente se verificando quanto às infracções que afectem, tão só as regras de tutela particular, que podem ser afastadas com o consentimento do protegido, sem deixar de atender, por razoável, o critério geral utilizado pela própria lei processual no art. 195, do CPC, isto é, e na devida transposição, se pode interferir ou não com a justa tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta, sem contudo não deixar de ter em conta, o que é livremente renunciável. Deste modo, “tudo o que respeita à preparação e apresentação das propostas, bem como às diligências tendentes à sua aprovação, consubstancia-se em actos ou formalidades do próprio processo e com expressão nele. De modo que, bem vistas as coisas, todas as violações legais se reconduzem à adopção de procedimentos ou à omissão de formalidades que a lei exclui ou determina. Daí que, em sentido processual, que aqui parece especialmente apto para ser acolhido, a violação da lei, activa ou passivamente, comporte sempre a prática de uma nulidade processual. Então, verdadeiramente do que se trata para decidir se ela justifica ou não a recusa de homologação de um plano aprovado pelos credores — que é, afinal de contas, aquilo que aqui está em causa —, é de avaliar a relevância, ou não, da violação constatada. Aqui chegados parece razoável atender ao critério geral que a própria lei processual utiliza no art.° 195º do C.P.Civ.. O que importará é, pois, sindicar se a nulidade observada é susceptível de interferir com a boa decisão da causa, o que significa valorar se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger — nomeadamente, no que respeita à tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta —, tendo em conta o que é, apesar de tudo, livremente renunciável. O que haverá então de peculiar a observar — mas isto em consequência do que o próprio artigo 215º CIRE prescreve — é que o próprio tribunal deve, ele mesmo, agindo ex officio, relevar a nulidade, sem necessidade de arguição de quem quer que seja, o que implicará recusar a homologação do plano, à semelhança, aliás, do que sucede com outras nulidades tipificadas na lei, como se vê do que determina o art. 196º do CPC” (Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, pág. 826 e 827). Dito isto, vejamos então. O plano propõe o pagamento da totalidade da dívida à C..., SA através da dação em pagamento pela entrega do imóvel que garante o financiamento. O art.º 202º, nº 2 do CIRE estabelece que “a dação de bens em pagamento dos créditos sobre a insolvência, a conversão destes em capital ou a transmissão das correspondentes dívidas com efeitos liberatórios para o antigo devedor depende da anuência dos titulares dos créditos em causa, prestada por escrito, aplicando-se o disposto na parte final do n° 2 do artigo 194°”. Como se referiu, o plano de recuperação propõe a entrega do imóvel, ou seja propõe a entrega de coisa diversa da que era devida (crédito), assim se exonerando a devedora da obrigação perante o respectivo credora, que se extingue por força daquela dação em pagamento (art.º 837º do Código Civil). Este nº 2 do art.º 202º não é mais do que a reafirmação do princípio geral constante do art.º 837º do Código Civil, de que a prestação de coisa diversa da que é devida só exonera a devedora se o credor der o seu consentimento. No vertente caso a C..., SA votou desfavoravelmente o plano de recuperação apresentado pela devedora, pelo que não é sequer possível ter como tacitamente prestado aquele consentimento ao abrigo da última parte do nº 2 do art.º 194º do CIRE. O nº 2 do art. 202º do CIRE é uma norma que conforma a substância do plano de recuperação mais concretamente uma que define um conteúdo vinculado do plano de recuperação. Assim, estando a dação em cumprimento dependente do consentimento do credor, na falta deste, como acontece no presente caso, não pode ser homologado um plano de recuperação que a contemple com preterição daquele pressuposto legal. Deste modo, impõe-se a não homologação do plano de recuperação, ao abrigo do art. 215º do CIRE, uma vez que está em causa uma violação não negligenciável de uma norma imperativa, que acarreta a produção de um resultado que a lei não autoriza, na medida em que se tratava de uma norma relativa ao conteúdo do plano de recuperação i.e., uma nulidade processual relevante – que constitui, de per se, fundamento idóneo ou bastante de recusa oficiosa da sua homologação pelo juiz. (neste sentido vide Ac. da RC de 14.05.2014, proc. nº 192/13.9TBFVN-C.C1 in www.dgsi.pt). Vejamos agora a segunda questão: No caso dos autos, a lista provisória de créditos apresentada pelo administrador judicial foi publicitada no Citius, em 28.09.2015. O prazo de 5 dias úteis para a impugnação da lista terminou em 5.10.2015. Findo este prazo dispunham os declarantes de dois meses para concluir as negociações encetadas, podendo haver prorrogação do prazo, por uma só vez e por um mês. Tendo em atenção estas premissas, o prazo de 2 meses terminava em 6.12.2015 e o prazo de 3 meses em 6.01.2016. Vejamos, então. O processo especial de revitalização terá o seu início com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, no sentido de se encetarem negociações, que não poderão exceder os três meses. Com vista a alcançar o objectivo fundamental do processo especial de revitalização, a viabilização ou recuperação do devedor, e porque há que aliar a celeridade com a ponderação de todos as condicionantes económico-financeiras, findo o prazo para impugnações, os declarantes dispõem do prazo de dois meses para concluir as negociações encetadas, o qual pode ser prorrogado, por uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor, devendo tal acordo ser junto aos autos e publicado no portal Citius (nº5 do art.º 17º-D do CIRE). Caso o devedor ou a maioria relevante dos credores concluam antecipadamente não ser possível alcançar acordo, ou caso seja ultrapassado o prazo previsto no nº 5 do artigo 17º-D (prazo para conclusão das negociações - 2 ou 3 meses após o fim do prazo para impugnação da relação provisória de créditos), o processo negocial é encerrado, devendo o administrador judicial provisório comunicar tal facto ao processo, se possível, por meios electrónicos e publicá-lo no portal Citius (nº 1 do art.º 17º-G do CIRE). Das normas legais em causa resulta, assim, que o prazo para a conclusão das negociações é de dois meses, podendo ser prorrogados por um mês. Esse prazo conta-se a partir do termo do prazo para impugnação da lista provisória de créditos, que é de cinco dias úteis e inicia-se com a publicação da lista provisória de créditos. Segundo Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, págs. 160, 161 ”Nos termos em que está concebido, trata-se de um prazo de caducidade, razão pela qual, se o acordo for obtido para além dele, não pode ser já homologado por violação não negligenciável da lei – artº 215º, aplicável por força do artº 17º-F, nº 5. Aliás, segundo disposição expressa do artº 17º –G, nº 1, o processo negocial é encerrado se for ultrapassado o prazo aqui estabelecido”. O mesmo entendimento tem Maria do Rosário Epifânio, in O Processo Especial de Revitalização, Almedina, 2015, pág. 75, quando refere que ” Se o prazo para as negociações expirar, o processo negocial é encerrado. O prazo previsto no art. 17º-D, nº 5, é, assim, um prazo de caducidade – em consequência, o acordo obtido após o decurso do prazo não pode ser homologado pelo juiz”, bem assim, Nuno Salazar Casa Nova e David Sequeira Dinis, in Processo Especial de Revitalização, pág. 81, quando anotam que “As negociações podem prosseguir para reformulação do plano e nova votação, desde que dentro do prazo de dois meses, com eventual prorrogação”. Esta posição tem sido seguida também maioritariamente pela jurisprudência, nomeadamente Relação de Lisboa Acs. de 02.07.2015, proc. nº 168/14.9T8BRR.L1-6, de 13.03.14 , proc. nº 1904/12.3TYLSB.L1-2, 5.02.15, proc. nº 85/14.2TJLSB.L1-8, de 13.10.15, proc. nº 2222/15.0T8LSB-A.L1-7; Relação de Coimbra Acs de 21.10.14, proc. nº 2081/13.8TBPBL-A.C1, de 21.04.15, proc. nº 2460/14.3TBLRA.C1; 03.11.15, proc. nº 4312/14.8T8VIS.C1, 27-01.15 170/14.0TBCDR.C1, 15.09.15, proc. nº 817/14.9T8ACB.C1 e Supremo Tribunal de Justiça Acs. de 8.09.15, proc. nº 570/13.3TBSRT.C1.S1 e de 17.11.2015, proc. nº 1557/14.4TBMTJ.L1.S1todos in www.dgsi.pt. Refere-se no sumário do Ac. do STJ de 8.09.15 acima citado que “I - No âmbito do processo especial de revitalização, o plano de recuperação da devedora requerente deve ser apresentado no prazo das negociações previsto no art. 17.º-F, n.º 1, do ClRE, que é um prazo de caducidade. II - Ultrapassado tal prazo não deve ser homologado o plano, nos termos do art. 215º do ClRE, por a sua homologação, nesse caso, constituir violação não negligenciável de norma imperativa. III - O Tribunal não pode considerar, oficiosamente, a prorrogação do prazo judicial previsto no art. 139º, nº 5, do CPC”. Também no Ac. do STJ de 17.11.2015 se refere:” I - O prazo fixado no nº 5 do art. 17º-D do CIRE para a conclusão das negociações tendentes à revitalização do devedor é peremptório ou preclusivo. II - Decorrido tal prazo sem que as negociações estejam concluídas, o processo negocial fica encerrado, não podendo ser homologado, por ocorrer uma violação não negligenciável de regras procedimentais, o plano que venha ainda assim a ser aprovado”. No caso que nos ocupa a aprovação do plano de recuperação não foi obtida por unanimidade dos credores, razão pela qual só se pode considerar perfeita com o encerramento da votação e subsequente contagem dos votos (art.º 17º-F, nºs 2 e 3). ( Ac. da RC de 21.04.15, proc. 2460/14.3TBLRA.C1 in www.dgsi.pt). Por outro lado, o prazo para a conclusão das negociações ocorreu a 6.01.16 e o encerramento da votação e contagem dos votos só terá ocorrido pelo menos no dia 13.01.2016 (o Sr. AJP não colocou no documento em que contabilizou os votos a data em que realizou a contagem dos votos. Porém, na medida em que houve credores a enviar o voto a 13.01.16, a contagem dos votos apenas poderá ter ocorrido nessa data). Deste modo, a aprovação ocorreu fora do prazo máximo das negociações. E inserindo-se a aprovação do plano de recuperação dentro da fase das negociações, uma vez decorrido o prazo máximo destas, sem a aprovação daquele, impõe-se a não homologação do plano de recuperação por ter sido aprovado em violação de norma imperativa – nº 1 do art.º 17º-G conjugada com o nº 5 do art.º 17º-D -, o que se decide. Pelo exposto, e nos termos do disposto nos artigos 17º- F, nºs 5 e 6, recuso a homologação do plano de recuperação da devedora E... de fls. 204 a 211. ...”. IV Deste despacho interpôs recurso a Requerente, recurso esse que foi admitido em 1ª instância, como sendo de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo. Nas alegações que apresentou a Recorrente formula as seguintes conclusões: (1) O Tribunal a quo proferiu sentença na qual, “nos termos do disposto nos artigos 17º- F, nºs 5 e 6, recuso a homologação do plano de recuperação da devedora E..., de fls. 204 a 211.” (2) A Recorrente entende que a definição e defesa do interesse público na revitalização é definido e delimitado pelos credores na votação do plano, devendo o Tribunal intervir apenas para assegurar a não violação de normas imperativas. (3) O Tribunal a quo, antes de proferir a decisão de homologar ou não o plano, deve proceder à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (também processual) aos factos que lhe compete conhecer, não devendo pura e simplesmente recusar a homologação do plano quando a violação da norma não negligenciável possa ser corrigida ou aperfeiçoada, revertendo-se essa violação e adequando-a ao ordenamento jurídico, pelo que, antes de recusar a homologação, o Tribunal deve convidar a devedora e o Administrador Judicial Provisório, nos casos em que tal seja possível – como é o caso, a modificar o plano de revitalização de molde a torná-lo conforme com a legalidade - neste sentido, o Tribunal da Relação de Coimbra (Acórdão de 05/05/2015, proferido no processo 996/15.8T8CRA-A.C1, disponível em www.dgsi.pt). (4) Assim, não deveria ser oficiosamente recusada a homologação do plano com o fundamento na violação não negligenciável de uma norma imperativa, designadamente no tocante à proposta dação de um imóvel para pagamento da totalidade da dívida ao credor C..., ao abrigo do artigo 215º do CIRE por preterição da norma expressa do artigo 202º, nº 2, do mesmo diploma, que determina a necessidade do acordo desse credor. (5) O plano de recuperação apresentado foi aprovado obtendo uma percentagem de votos positivos de harmonia com o estabelecido no nº 3 do artigo 17º F do CIRE o que não pode deixar de significar que foi reconhecido à devedora a possibilidade da sua recuperação, ou seja que a devedora estaria “desvitalizada” mas não “insolvente”. (6) No caso em apreço, o vício de substância decorre da violação do preceituado no nº 2 do artigo 202º, do CIRE, por o plano ter considerado para a extinção da totalidade do crédito do C..., sem o consentimento deste, a dação em pagamento de um imóvel do activo de que aquele era credor hipotecário, podendo, em vez da proposta dação em pagamento que o plano de revitalização contemplasse a venda desse imóvel, afectando a totalidade do preço ao crédito desse credor e se, ainda assim, o direito do C... não viesse a ser integralmente solvido, integrar o valor remanescente no regime dos comuns. (7) O regime processual geral (subsidiariamente aplicável por força do artigo 17º CIRE) e o regime do próprio instituto, não impedem a possibilidade de aperfeiçoamento do plano. (8) A possibilidade de aperfeiçoamento não atenta contra a unidade do sistema na medida em que o CIRE prevê, no caso da insolvência, em sede de tramitação processual a concessão de um prazo máximo de cinco dias para corrigir vícios sanáveis para que a peça satisfaça os requisitos legais (alínea b) do nº 1 do artigo 27º) - neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Realação de Coimbra, de 12/01/2010, proferido no processo 1743/09.9TBMGR.C1, disponível em www.dgsi.pt. (9) A Recorrente entende que o Tribunal a quo deveria ter convidado ao aperfeiçoamento do plano de molde a torná-lo conforme com a legalidade. (10) No entendimento do Tribunal a quo o plano de revitalização foi apresentado depois de transcorrido o prazo previsto no nº 5 do artigo 17º D do CIRE, contudo a Recorrente entende que o ocorrido nos autos não é motivo para a recusa da homologação do plano. (11) A Recorrente entende que cabe ao Tribunal, esgotado o prazo para conclusão das negociações, caso não seja apresentado um plano ou comunicado o encerramento, fixar um prazo para a sua apresentação sob cominação de encerramento, tendo sido proferido nos autos Despacho, em 14.01.2016 (refª 80217533), com o teor: “Mostrando-se integralmente decorrido o prazo de negociações previsto no art. 17º-D nº5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, notifique o Administrador Judicial Provisório para em cinco dias vir juntar o resultado da votação, advertindo que, nada dizendo no prazo assinalado o tribunal declarará oficiosamente encerrado o processo negocial sem aprovação, ficando a aguardar o parecer relativo à situação de insolvência”. (12) Com a fixação de um prazo para a apresentação do plano, sob a cominação de encerramento, ficam devidamente equilibrados os interesses subjacentes ao regime da revitalização (a conclusão do procedimento em prazo célere e o favorecimento da solução negocial), pois, em caso contrário, chegar-se-ia à solução, que não se tem por razoável, de se terem concluído negociações com sucesso e o Tribunal ficar impedido de lhes conferir força ao plano daí resultante alguns dias após o termo do prazo fixado. (13) O plano foi apresentado em Juízo, espontaneamente, pelo Administrador Judicial Provisório, antes ainda do Tribunal a quo ter procedido à notificação daquele despacho ao mesmo. (14) Em face do exposto, considera a Recorrente que a apresentação do plano de recuperação em 14-01-2016 não impede que o mesmo seja susceptível de homologação judicial, caso os respectivos requisitos relevantes se mostrem verificados. (15) Sendo o processo especial de revitalização uma negociação entre o Administrador Judicial Provisório e os credores sem impor a intervenção ou o acompanhamento do Advogado do credor, ou seja, configura essa negociação como um mero negócio de “números” (e não de apreciação de normas jurídicas até porque o Administrador Judicial Provisório, por via de regra, não tem conhecimento profundo das leis), este não pode ser contrário à lei mas é defensável que este deve ter a flexibilidade para, nos casos em que as eventuais “ilegalidades” (formais ou substanciais) do plano são ultrapassáveis, se proceder à notificação do Administrador Judicial Provisório ou do devedor para a sua adequação com a lei. (16) O prazo das negociações não é peremptório, podendo ser ultrapassado, desde que justificado e, no caso de haver acordo, o processo atingiu o seu fim, pelo que a sua violação não afecta o exame da causa (neste sentido, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 09/12/2014, proferido no processo 62/14.3TYLSB-A.L1 e de 10/04/2014, proferido no processo 8972.13.9T2SNT.L1-7 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/12/2015, proferido no processo 3245/14.2T8GMR.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt). (17) “Por outra banda, já a “simples” ultrapassagem não significativa do prazo das negociações, maxime a aprovação do plano ainda no decurso do prazo de 10 dias a que alude o nº 1 do artigo 211º do CIRE, por si só não basta para obrigar (dura lex, sed lex) o juiz do processo à inevitável prolação de decisão de recusa de homologação do mesmo, com o fundamento de se mostrar ultrapassado o prazo de caducidade do nº 5 do artigo 17º-D do CIRE, antes justifica estar-se na presença de uma violação menor, que não põe em causa o interesse do devedor e dos credores afectados” (in Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/12/2015, proferido no processo 3245/14.2T8GMR.G1). (18) No caso, não foi manifestamente ultrapassado o prazo para a conclusão das negociações, estabelecido no artigo 17º-D, nº 5, do CIRE, ou seja, tendo cessado a 5 de Janeiro de 2016 o prazo para a conclusão das negociações e consequente aprovação ou não aprovação de um plano de recuperação, a verdade é que este foi alcançado e apresentado a juízo em 14 de Janeiro de 2016, o que não consubstancia violação dos artigos 17º-D, nº 5, 17º-G, nº 1 e o artigo 215º, todos do CIRE. (19) Em face das referidas razões e fundamentos, o Tribunal a quo não está obrigado a proferir decisão de recusa de homologação do plano de recuperação. (20) A Recorrente entende que a própria votação do plano é uma fase que não faz parte da fase negocial, podendo decorrer no prazo de 10 dias após o termo do prazo legal das negociações. (21) A Recorrente entende que a votação já não faz parte da fase das negociações stricto sensu, caso em que ao prazo máximo legal das negociações (o prazo do nº 5 do artigo 17º-D CIRE), deve acrescer o prazo de 10 dias para a votação do plano de recuperação entretanto alcançado em sede de negociações. (22) A suportar tal posição, veja-se o facto de as negociações terem por objectivo a definição das linhas gerais e concretas que hão-de descrever e determinar um plano de recuperação a submeter à votação dos credores e, assim, a votação tem por objecto o resultado conseguido em sede das negociações havidas, não se confundindo com estas. (23) Mais, dispondo o nº 4 do artigo 17º- F do CIRE que “a votação efectua-se por escrito, aplicando-se-lhe o disposto no artigo 211º com as necessárias adaptações”, dispondo, por sua vez, o nº 1 que “Finda a discussão do plano de insolvência, o juiz pode determinar que a votação tenha lugar por escrito, em prazo não superior a 10 dias”, então é pertinente e razoável considerar que a sujeição de uma proposta a votação pressupõe, a montante, o fim das negociações, sendo aquela – a proposta – o resultado final das negociações, que não também a própria negociação. (24) Atendendo ao disposto no artigo 17º-F, nº1, do CIRE, da letra da lei não resulta que a votação ainda faça parte da fase das negociações, pelo que tendo presente a factualidade relativa ao termo do prazo das negociações e a data de apresentação do plano em Juízo, a Recorrente entende que, tendo sido alcançado um plano e que o plano apresentado e conducente sua à revitalização, aprovado com base numa votação favorável, deve o Tribunal a quo concluir que o plano de revitalização da devedora foi aprovado em tempo, pois foi aprovado no decurso do prazo de 10 dias após a conclusão das negociações que resultaram no referido plano. (25) “A “simples” ultrapassagem não significativa do prazo das negociações, maxime a aprovação do plano ainda no decurso do prazo de 10 dias a que alude o nº 1 do artigo 211º do CIRE, por si só, não basta para obrigar o Tribunal a quo a proferir decisão de recusa de homologação do mesmo, com o fundamento de se mostrar ultrapassado o prazo de caducidade do nº 5 do artigo 17º-D do CIRE” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/12/2015, proferido no processo 3245/14.2T8GMR.G1). (26) No entendimento da Recorrente está-se perante violação menor, que não põe em causa o interesse do devedor e dos credores afectados, tanto mais que, com a aprovação – como é o caso – do plano apresentado, ficam devidamente equilibrados os interesses subjacentes ao regime da revitalização (a conclusão do procedimento em prazo célere e o favorecimento da solução negocial) protegendo, assim, os credores e os seus interesses. (27) Face do exposto, considera a Recorrente que a apresentação do plano de recuperação em 14.01.2016 não impede que o mesmo seja susceptível de homologação judicial, caso os respectivos requisitos relevantes se mostrem verificados – que é o caso. (28) O plano de revitalização da devedora ora Recorrente deve ser homologado. (29) A decisão a quo viola os artigos 17º-D, nº 5, 17º-G, nº 1 e 215º, todos do CIRE. (30) Termos em que deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente, por provado, revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo, substituindo-a por outra que homologue o Plano de Revitalização. V Não foram apresentadas contra-alegações e nesta Relação foi aceite o recurso interposto, tal como foi admitido em 1ª instância, nada obstando ao conhecimento do seu objecto. O seu objecto passa pela reapreciação das duas questões elencadas na própria decisão recorrida e nela tratadas e decididas, e que são: A - Apurar se o plano de recuperação em que se prevê a dação em pagamento de um imóvel a um credor sem a expressa aceitação de tal dação pelo credor visado pode ser homologado, ou se deve o Tribunal providenciar na correção desse vício substancial; B - Apurar se o plano de recuperação pode ser homologado apesar de se encontrar ultrapassado o prazo de três meses estabelecido na lei para a conclusão das negociações. Começando esta nossa apreciação pela referida questão A, resulta claro da exposição que antecede o desentendimento da Recorrente em relação à opinião do Tribunal recorrido, opinião esta que foi no sentido de que a dação em pagamento (de um imóvel) prevista no plano de revitalização para o total pagamento da dívida da Requerente à C... carece do consentimento do credor visado, pelo que, assim não tendo sucedido, não pode ser homologado esse Plano. A Recorrente defende que o Tribunal deveria, antes, ter dado a possibilidade de ser corrigido/modificado o Plano nesse aspecto, designadamente através da possibilidade da venda do imóvel em causa e do pagamento desse credor com o produto dessa mesma venda. Ou seja, por outras palavras, a Recorrente não discorda do entendimento do Tribunal recorrido, segundo o qual ‘... estando a dação em cumprimento dependente do consentimento do credor, na falta deste, como acontece no presente caso, não pode ser homologado um plano de recuperação que a contemple com preterição daquele pressuposto legal’. Este entendimento, como consta da decisão recorrida, assenta e deriva do disposto no artº 202º, nº 2 do CIRE, segundo a qual “A dação de bens em pagamento dos créditos sobre a insolvência, a conversão destes em capital ou a transmissão das correspondentes dívidas com efeitos liberatórios para o antigo devedor depende da anuência dos titulares dos créditos em causa, prestada por escrito”. Tal aplicação resulta do disposto no artº 17º-F, nº 5 do CIRE (na redação da Lei nº 16/2012, de 20/04), disposição esta que manda aplicar ao plano de recuperação, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artºs 215º e 216º do CIRE. E como a não observância daquela disposição se traduz na sua própria violação, nos termos do artº 215º do CIRE deve o juiz recusar oficiosamente a homologação do plano de recuperação. Como também consta do despacho recorrido, essa dita norma – nº 2 do artº 202º do CIRE – traduz-se na afirmação do princípio geral constante do artº 837º do C. Civil – Causa de extinção das obrigações além do cumprimento, por dação em cumprimento ou dação em pagamento -, segundo o qual a prestação de coisa diversa da que é devida só exonera o devedor se o credor der o seu consentimento. Ora, resultando dos autos - os factos dados como provados no despacho recorrido não foram objecto de impugnação - que o credor C... votou desfavoravelmente o plano de recuperação apresentado, manifesto se torna que até expressamente não deu o seu consentimento à pretendida e proposta dação em pagamento, pelo que claro se torna que esta posição deste credor obriga o juiz do processo a recusar a homolgação desse dito plano, nos termos do artº 215º do CIRE. Estamos, pois, em total sintonia com o despacho recorrido, neste aspecto, com o qual, alíás, a Recorrente também o está; esta apenas defende que deveria o Tribunal ter procurado fazer com que fosse tentada uma modificação do plano apresentado, com vista a ser ultrapassado esse obstáculo ou impedimento legal. Será assim? Convenhamos que tal possibilidade não resulta da letra nem do espírito do artº 215º do CIRE, e muito menos das normas especiais do chamado PER, onde se estatui que este processo especial tem carácter urgente – artº 17º-A, nº 3 – e onde se estatui acerca dos actos processuais, que se resumem ao absolutamente necessário e de uma forma dita ‘imediata’ – vejam-se os nºs 3 e sua al. a), e 4 do artº 17º-C; nºs 1, 3, 4 e 5 do artº 17º-D; nº 4 do artº 17º-E; nº 1 do artº 17º-F (aqui até consta que ‘concluindo-se as negociações com a aprovação unânime de plano de recuperação conducente à revitalização do devedor, em que intervenham todos os seus credores, este deve ser assinado por todos, sendo de imediato remetido ao processo, para homologação ou recusa da mesma pelo juiz, ...’); nº 5 do artº 17º-F, onde consta que ‘o juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação nos 10 dias seguintes à receção da documentação...’. Portanto, toda esta tramitação é muito célere e claramente compartimentada em termos de prazos, sendo que o nº 5 do artº 17º-D limita ao prazo de dois meses para a conclusão das negociações encetadas, logo que findo o prazo para impugnações, prazo esse que apenas pode ser prorrogado por uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor. Ora, sendo assim, como entender a pretensão da Recorrente, no sentido de que o Tribunal deveria ter procurado que fosse corrigido/modificado o plano!? E que fundamentos podiam ser invocados para o efeito? E qual o prazo então aplicável a essa tomada de posição? Poderia o Tribunal fixar prazos, mesmo para além daqueles que estão claramente fixados nesta forma especial de processo? Afigura-se-nos que assim não podia acontecer, sob pena de violação manifesta da lei aplicável e de desrespeito das citadas normas aplicáveis ao caso. Donde estarmos de acordo com a decisão proferida, a qual se imponha que fosse tomada, nas circunstâncias que se apresentaram. Neste sentido podem ver-se, p. ex., o Ac. Rel. de Coimbra de 3/11/2015, Proc.º nº 4312/14.8T8VIS.C1; o Ac. Rel. Coimbra de 16/03/2016, Proc. nº 112/16.9T8LRA,C1 (disponíveis em www.dgsi.pt), do qual transcrevemos a seguinte passagem: ‘Todavia, mesmo não tendo sido objecto de rejeição nos termos do art.º 207.º e tendo sido aprovado pela maioria qualificada dos credores exigida pela lei, não está garantida a aprovação do plano, deferindo o art.º 215.º ao Tribunal “o cargo de guardião da legalidade, cabendo-lhe, em consequência, sindicar o cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano”. Impõe este normativo ao juiz que recuse a homologação do plano aprovado pelos credores sempre que ocorra “violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza”, assim estando em causa tanto aspectos de procedimento como de substância, estes atinentes ao conteúdo do plano. “Normas procedimentais serão assim todas aquelas que regem a actuação a desenvolver no processo, ao passo que normas relativas ao conteúdo serão, por sua vez, todas as relativas à parte dispositiva do plano mas, além delas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente e as que definem os temas que a proposta deve contemplar”. Mas, atente-se, não é qualquer desvio que implica a recusa de homologação, exigindo a lei que se trate de “violação não negligenciável”, deixando ao intérprete a difícil tarefa de concretização do conceito. Pese embora a categorização dos vícios, porque submetidos ao mesmo regime, esbatido fica o relevo da distinção. Mas qual então o critério que permite a elevação de uma violação de lei à categoria de não negligenciável, permitindo a desconsideração de outra? Primeiro aspecto a destacar face à literalidade da disposição legal, é que violações menores deverão ser desconsideradas. Em contraponto, claramente não negligenciável será a violação de norma imperativa que acarrete a produção de um resultado vedado por lei; inversamente, poderá ser menosprezada a infracção que atinja apenas regras de tutela particular, as quais podem ser afastadas com o consentimento do titular do interesse protegido, critério avançado por Carvalho Fernandes e J. Labareda. Todavia, reconhecendo os mesmos autores que a violação de lei, pressupondo a prática de acto não admitido ou omissão de formalidade imposta, se reconduz sempre e a final à prática de uma nulidade processual, numa orientação mais geral, defendem ser de apelar ao critério geral consagrado no n.º 1 do art.º 195.º do CPC, tendo-se assim por desvio relevante aquele que afecta o exame e a boa decisão da causa.’. No mesmo sentido vejam-se o Ac. Rel. de Guimarães de 4/03/2013, Proc. nº 3695/12.9TBBRG.G1; o Ac. Rel. Guimarães de 5/2/2015, Proc. nº 6193/13.0TBBRG-F.C1, onde se escreve: “2- Para efeitos da não homologação oficiosa do Plano de insolvência, ao abrigo do art.º 215º do CIRE, a jurisprudência tem entendido como “não negligenciáveis” todas as violações de normas imperativas que acarretam a produção dum resultado que a lei não autoriza, assim como todas as violações de normas que interfiram com a justa salvaguarda dos interesses/posições dos credores. 3- A homologação de um Plano de insolvência que prevê a dação em cumprimento de imóveis a favor de um credor hipotecário, em vez do pagamento do seu crédito, depende, com o âmbito de aplicação do nº 2 do art.º 202º do CIRE, da anuência daquele credor, prestada por escrito, a não ser que tenha votado o Plano favoravelmente, caso em que se considera haver consentimento tácito. ... Estando a dação em cumprimento dependente daquele consentimento do credor, na falta deste, como no caso acontece, não pode, em princípio, ser homologado um Plano de recuperação que a contemple com preterição daquele pressuposto legal”. Donde sejamos levados a concluir pelo acerto do despacho recorrido, quanto a este aspecto, não tendo razão a Recorrente quando defende que o Tribunal deveria, antes, pugnar pela correção (oficiosa) do referido vício do plano apresentado. Face ao que se impôs, no caso presente, a recusa de homolação do plano apresentado, como foi entendido e decidido no despacho recorrido. Consequentemente, prejudicada fica a abordagem da 2ª questão suscitada – ultrapassagem do prazo de negociação do plano. No entanto, não deixamos de também abordar esta questão. Como decorre do próprio despacho recorrido e que não é objecto de impugnação, está provado que: - No caso dos autos, a lista provisória de créditos apresentada pelo administrador judicial foi publicitada no Citius em 28.09.2015. - O prazo de 5 dias úteis para a impugnação da lista – nº 3 do artº 17º-D - terminou em 5.10.2015. - Findo este prazo dispunham os declarantes de dois meses para concluir as negociações encetadas, podendo haver prorrogação do prazo, por uma só vez e por um mês – nº 5 do artº 17º-D. - Tendo em atenção estas premissas, o prazo de 2 meses terminou em 6.12.2015 e o prazo de 3 meses em 6.01.2016. Findo este prazo, o processo negocial é encerrado, devendo o administrador judicial provisório comunicar tal facto ao processo e publicá-lo no portal Citius – nº 1 do artº 17º-G. Porém, também resulta dos autos que o encerramento e a contagem dos votos dos negociadores/credores apenas ocorreu no dia 13/01/2016, data em que houve credores a enviar o seu voto – ver fls. 132, 133, 134, 136, 138, 141, 142 deste apenso -, pese embora em 6/01/2016 tenha sido proferido despacho judicial, que foi de imediato comunicado ao sr. A.J.P., no qual se escreveu que ‘a jurisprudência tem entendido maioritariamente que o prazo previsto no artº 17º-D, nº 5 do CIRE é um prazo de caducidade e, por isso, o acordo com os credores tem de ser obtido nesse prazo... Deste modo, o tribunal não pode conceder qualquer prazo para além do fixado no normativo citado’ – ver fls. 115 deste apenso. Ora, sendo assim, manifesto se torna que foi claramente excedido o referido prazo do nº 5 do artº 17º-D do CIRE, pelo que também por esta razão e nos termos do nº 1 do artº 17º-G se impunha o encerramento do processo, como também foi entendido no despacho recorrido. No apontado sentido, entre outros arestos – todos disponíveis em www.dgsi.pt/jt... -, como aqueles que são citados no despacho recorrido, veja-se: Ac. Rel. Coimbra de 15/09/2015, Proc.º nº 817/14.9T8ACB.C1; Ac. Rel. Coimbra de 16/02/2016, Proc.º nº 943/15.7T8ACB-A.C1; Ac. Rel. de Coimbra de 21/04/2015, Proc. nº 2460/14.3TBLRA.C1, este onde se escreve:
Veja-se, ainda, o Ac. Rel. de Coimbra de 21/10/2014, Proc.º nº 2081/13.8TBPBL-A.C1, onde também se escreve: “V - A aprovação do plano tem de ser efectuada dentro do prazo da fase das negociações, fase esta que comunga do carácter de urgência que é genericamente atribuído ao processo de revitalização pelo art.º 17º-A, n.º 3, do CIRE. VI - Inserindo-se a aprovação do plano de recuperação dentro da fase das negociações, uma vez decorrido o prazo máximo destas sem a aprovação unânime daquele impõe-se a não homologação do plano por ter sido aprovado em violação de norma legal imperativa – n.º 1 do art.º 17º-G conjugada com o n.º 5 do art.º 17º-D, ambos do CIRE.” Donde, com o devido respeito, também nesta questão não podermos dar razão à Recorrente, pese embora esta 2ª questão se deva considerar como prejudicada pela solução antes encontrada para a 1ª questão – de claro dever de recusa de homologação do plano de recuperação apresentado. Concluindo, entende-se ser de julgar improcedente o presente recurso, impondo-se a confirmação do despacho recorrido, o que se decide. VI Decisão: Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se o despacho recorrido, nos seus exactos e precisos termos. Custas pela Recorrente. Tribunal da Relação de Coimbra, em 26/04/2016 Relator: Des. Jaime Carlos Ferreira Adjuntos: Des. Jorge Arcanjo Des. Manuel Capelo
|