Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ELISA SALES | ||
Descritores: | ASSISTENTE MOMENTO DE CONSTITUIÇÃO | ||
Data do Acordão: | 05/26/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE TOMAR – 2º J | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 68º, 3 CPP | ||
Sumário: | 1-A qualidade de assistente tem de se verificar antes da prolacção da decisão que o afectou, 2-Tendo o inquérito terminado com um despacho de arquivamento com fundamento em dispensa de pena, perante o despacho de concordância do Juiz, se o queixoso requer a sua intervenção como assistente, após a prolação deste despacho o processo está findo, pelo que não deve ser admitida a sua intervenção nos autos, na qualidade de assistente | ||
Decisão Texto Integral: | I - RELATÓRIO N..., queixoso (e arguido) nos autos, veio interpor recurso da decisão do Mmº Juiz de Instrução de fls. 170 (proferida nos termos do n.º 1 do artigo 280º do CPP), que concordou com a decisão do Ministério Público de arquivamento do inquérito em caso de dispensa da pena. * E, da respectiva motivação extraiu as seguintes conclusões: I- Cabia ao Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal, confirmar se, atentos os elementos constantes do processo e aqueles que foram invocados pelo Ministério Público, se encontravam reunidos os requisitos para a aplicação do regime previsto no artigo 280º, n.º 1 do CPP, ou seja, o arquivamento do processo em caso de dispensa de pena. II- Do depoimento do ora recorrente, do queixoso T... e dos relatórios médicos de fls. 43 e 52 dos presentes autos, resultam fortes indícios de que as lesões sofridas pelo ora recorrente, nomeadamente a fractura do 1/3 médio do perónio esquerdo, hematoma do zigomático esquerdo, resultaram de traumatismo contundente perpetrado pelo arguido J…. III- Dos elementos constantes dos presentes autos não é passível concluir-se pelo grau diminuto da ilicitude do facto praticado pelo arguido J… e da sua culpa, atenta a gravidade das lesões sofridas pelo ora recorrente, do facto de aquele arguido não ter sofrido qualquer lesão, e de ser praticante de judo. IV- Em resultado das lesões sofridas, o ora recorrente padeceu de um período de doença de 60 dias com incapacidade para o trabalho profissional e 45 dias de incapacidade para o trabalho geral, para além de danos patrimoniais decorrentes das despesas médicas necessárias à sua cura e outros danos não patrimoniais resultantes das dores sofridas e do trauma incorrido. V- Os danos sofridos pelo ora recorrente não foram reparados. VI- Atenta a gravidade das lesões sofridas pelo ora recorrente e as especiais qualidades do arguido J… existem exigências de prevenção gerais e especiais que não se compaginam com o arquivamento do presente processo ao abrigo do disposto no artigo 280°, n.º 1 do Código do Processo Penal. Não estamos perante uma bagatela penal! VII- Ao ter prestado concordância com o arquivamento proposto pelo Ministério Público, o despacho ora em recurso violou as disposições legais constantes do artigo 280º, n.º 1 do CPP e das alíneas a), b) e c) do n.º 1 e do n.º 3 artigo 74º do Código Penal. Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o despacho ora em recurso ser revogado e ordenada a sua substituição por um outro que não dê concordância à decisão de arquivamento do inquérito no que respeita ao arguido J… . * Respondeu a Magistrada do MºPº junto do Tribunal “a quo” defendendo a confirmação da decisão recorrida, por considerar que, no caso vertente, se mostram verificados todos os requisitos de que depende a aplicação do instituto do arquivamento em caso de dispensa de pena. Nesta instância a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, louvando-se na argumentação expendida na resposta do MP na instância recorrida, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso. Os autos tiveram os vistos legais. *** II- FUNDAMENTAÇÃO Com relevância para os autos há a considerar: - nos presentes autos, N… e T… apresentaram queixa contra J... e C... porquanto, segundo os queixosos, no dia 11 de Janeiro de 2009, cerca das 4 horas e 45 minutos, no Recinto do Mercado de Tomar, os denunciados lhe desferiram diversos murros e pontapés, atingindo o queixoso N... na perna esquerda e no olho esquerdo e o queixoso T... no nariz e em ambos os olhos. Também nestes autos, J... e C... apresentaram queixa contra N… e T... porquanto, segundo os mesmos, no circunstancialismo de tempo e de lugar acima descritos estes lhes desferiram murros e pontapés, atingindo-os em diversas partes do corpo; - procedeu-se a inquérito no âmbito do qual foram realizadas todas as diligências necessárias ao apuramento dos factos e da responsabilidade jurídico-penal dos arguidos; - entendeu o MP que os factos apurados configuravam a prática, por cada um dos arguidos, na forma consumada, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, previstos e punidos pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal. Todavia, tendo resultado a existência de agressões mútuas entre todos e, não tendo sido possível determinar qual dos contendores agrediu em primeiro lugar, considerou o MP que estava preenchida, in casu, a previsão normativa do artigo 143º, n.º 3, alínea a) do Código Penal, e que se mostravam, de igual modo, preenchidos os pressupostos consagrados no artigo 74º, n.º 1 do Código Penal, aplicável, no caso dos autos, ex vi do n.º 3 do mesmo normativo legal. - em consequência, decidiu o Ministério Público pelo arquivamento do inquérito, ao abrigo do disposto no artigo 280º, n.º 1 do CPP; - foram os autos remetidos ao Mmº Juiz de Instrução, nos termos e para os efeitos do citado artigo 280º, n.º 1, tendo sido proferido o despacho recorrido, que é do seguinte teor: «Concordo com a decisão do Ministério Público, proferida a fls. 150 e ss. – art. 280º, n.º 1 do CPP. Notifique.». *** APRECIANDO Como resulta das conclusões da motivação de recurso, a questão colocada à apreciação deste tribunal é a da verificação dos requisitos para a aplicação do regime previsto no artigo 280º, n.º 1 do CPP, ou seja o arquivamento do processo em caso de dispensa de pena. * Tendo em conta o objecto do recurso, não nos suscitam dúvidas sobre a recorribilidade do despacho recorrido, face ao n.º 3 do artigo 280º do CPP que dispõe: “a decisão de arquivamento, em conformidade com o disposto nos números anteriores, não é susceptível de impugnação.”.No caso vertente, não vem questionada a oportunidade da decisão de arquivamento, mas a verificação judicial da ocorrência dos pressupostos que permitem legalmente aquela decisão de arquivamento – cfr. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, III vol., pág. 120. Porém, a questão que deve ser desde já colocada é a da legitimidade do recorrente (para o recurso). Os assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, competindo-lhe, todavia, interpor recurso das decisões que os afectem, mesmo que o MP não o tenha feito (art. 69º, n.º 2, al. c) do CPP). Esta legitimidade de interposição de recurso por banda dos assistentes quanto às decisões contra eles proferidas, encontra-se também prevista na al. b) do n.º 1 do art. 401º; contudo, a qualidade de assistente tem de se verificar antes da prolacção da decisão que o afectou, e não ser adquirida posteriormente à mesma – cfr. Ac. STJ de 1-4-98, in Acs STJ, ano VI, tomo II, pág. 189. In casu, após ter sido proferida a decisão recorrida, veio o ofendido N... requerer a sua constituição como assistente e, interpor recurso da mesma - cfr. fls. 191. E, por despacho de fls. 276, veio a ser admitida a sua intervenção nos autos como assistente. Ora, como resulta do n.º 3 do artigo 68º do CPP, os assistentes podem intervir em qualquer altura do processo, aceitando-o no estado em que se encontrar, desde que requeiram a sua intervenção ao juiz, em determinado prazo, consoante a fase processual. Nos presentes autos, tendo o MP proferido despacho de arquivamento, face ao despacho de concordância do Juiz, estava vedado ao queixoso N… requerer a abertura da instrução, nos termos dos artigos 286º e 287º do CPP e, consequentemente não poderia requerer a sua intervenção como assistente no prazo a que alude o artigo 68º, n.º 3, al. b) do mesmo Código. Ou seja, tendo o inquérito terminado com um despacho de arquivamento com fundamento em dispensa de pena, perante o despacho de concordância do Juiz, quando o queixoso/ora recorrente requereu a sua intervenção como assistente, o processo estava findo, pelo que não deveria ser admitida a sua intervenção nos autos, na qualidade de assistente. De qualquer forma, no momento da interposição do recurso, não tendo o queixoso N… ainda adquirido a qualidade de assistente, carece de legitimidade para recorrer, o que determina a rejeição do recurso nos termos do artigo 420º, n.º1, al. b) do CPP. ***** III- DECISÃO Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação em: - Rejeitar o recurso, dado o queixoso N… não ter legitimidade para o recurso, ao abrigo do disposto no artigo 420º, n.º1, al. b) do C.P.P.. Custas a cargo do recorrente, fixando-se em 4 UCs a taxa de justiça, aqui se incluindo a taxa de justiça a que alude o n.º 3 do artigo 420º do CPP. ***** Coimbra, |