Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00212/22.6BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/15/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Margarida Reis
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ATOS DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL;
COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA;
HERANÇA INDIVISA; BENEFÍCIO DA EXCUSSÃO PRÉVIA;
Sumário:I. Desde a alteração introduzida na alínea b) do art. 26.º do ETAF pelo art. 2.º da Lei n.º 114/2019, de 12 de setembro que se encontra expressamente excluído da competência do Supremo Tribunal Administrativo o conhecimento dos recursos que tenham por objeto decisões que não sejam de mérito, como é aqui o caso, uma vez que pela decisão recorrida não foi conhecido do mérito da reclamação da penhora, tendo a mesma decidido pela improcedência da ação com fundamento no entendimento de que não teria sido suscitada pela Recorrente uma qualquer causa de pedir adequada ao meio processual em causa.

II. Para efeitos de IRS a herança indivisa é considerada como uma situação de contitularidade, sendo cada herdeiro tributado relativamente à sua quota-parte dos rendimentos gerados, nos termos do disposto no art. 19.º do Código do IRS.

III. Respeitando o IRS exequendo à venda de património da herança indivisa de que a Recorrente é cotitular na qualidade de (co)herdeira, o mesmo é devido por si nessa qualidade e relativamente à sua quota parte na herança, e não correspondendo a uma qualquer dívida tributária pela qual a herança indivisa seja originariamente devedora e para cuja liquidação esteja a ser chamada a título de devedora subsidiária.

IV. O benefício da excussão prévia regulado no n.º 3 do art. 23.º da LGT, e no n.º 2 do art. 153.º do CPPT apenas tem aplicação no âmbito da responsabilidade subsidiária, que se concretiza através da reversão do processo de execução fiscal (cf. n.º 1 do art. 23.º da LGT).*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Suscitou a questão da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal para o conhecimento do presente recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
AA, inconformada com a sentença proferida em 2022-10-01 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal ... que julgou improcedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal por si interposta tendo por objeto a penhora do seu vencimento ordenada pelo Serviço de Finanças ... 5 no âmbito do processo de execução fiscal n.º ..........01, vem dela interpor o presente recurso.
A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES
- A reclamação apresentada pela reclamante, aqui recorrente, tem por fundamento a violação do princípio da excussão prévia do património do devedor originário principal, dada a existência de bens e garantias suficientes para pagamento do processo fiscal em causa.
- Tais bens e garantias estão devidamente documentadas nos autos e juntas pela própria AT, aqui recorrida, e foram dadas como assentes pela douta sentença recorrida.
- Na reclamação apresentada a recorrente, ali reclamante, não põe em causa a inexistência ou existência da divida exequenda, bem como a da sua legitimidade passiva para ser executada, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida.
- A reclamação apresentada tem um único objectivo: o de atacar o acto praticado pela AT, e foi isso que fez, reclamando do acto de penhora de vencimento nos termos do art.º 276.º e 278.º do CPPT e do art.º 153.º do CPPT, por considerar o mesmo ilegal precisamente pela ausência de prévia excussão do património do devedor principal.
- A sentença recorrida não julgou o verdadeiro objecto da reclamação apresentada, antes se alongou em razões que se prendem com a oposição judicial em processo de execução fiscal, que aqui não tem lugar nem motivos para ser invocada.
- A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento e em omissão de pronúncia nos termos dos artigos 125.º do CPPT e 615.º do CPC, uma vez que não se debruçou nem decidiu sobre o objecto da reclamação, mas sobre outra matéria a que a mesma não faz referência.
- A oposição judicial em processo de execução fiscal nos termos do art. 204.º do CPPT serve apenas para invocar a inexistência de um imposto, a ilegitimidade da pessoa citada, ou prescrição entre outos fundamentos, fundamentos tais, os dois primeiros, que não estão em causa na reclamação e não poderiam estar, ao contrário do que decidiu a douta sentença proferida, porque nela não tem lugar para ser apreciados.
- Houve, pois, uma confusão e erro de julgamento na apreciação da reclamação e dos motivos e razões nela descritos.
- Na douta sentença recorrida o julgador invoca como razões para a decisão proferida factos jurídicos e causa completamente diversas daquelas que a recorrente deduziu na reclamação.
10ª - pelo que tal sentença deve ser considerada nula.
11ª - No processo judicial tributário os vícios de omissão de pronúncia são causa de nulidade de sentença, tal como previsto no art.º 125.º do CPPT.
12ª - A reclamação deveria ter importado efeito suspensivo em relação à penhora, o que não aconteceu, e tal efeito foi invocado pela reclamante, sendo que a sentença recorrida também sobre isso não se pronunciou.
13ª - Tal efeito suspensivo deveria ter tido como consequência a imediata suspensão da penhora de vencimento da recorrente mesmo que não cancelada e mantida pela AT, aqui recorrida, aliás uma ilegalidade crónica e em prática na AT.
14ª - A ausência de suspensão acarreta a ilegalidade da penhora efectuada e efectivada nos autos antes da prolação da decisão judicial definitiva que recaía sobre a reclamação apresentada.
15ª - Tal suspensão, a não existir como foi o caso, violou os direitos e interesses da recorrente que se viram afectados e prejudicados pelos actos praticados pela AT nos termos dos art.ºs 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP.
16ª - Pelo que deve assim ser a sentença recorrida revogada e substituída por douto Acórdão que considere a reclamação procedente por provada com as legais consequências.
Termina pedindo:
Termos em que deve o presente recurso ser admitido, dando-se provimento ao mesmo, e revogando-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por Acórdão que considere a reclamação como procedente, assim se fazendo inteira JUSTIÇA.
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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A Digna Magistrada do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer, no qual suscitou a questão da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal para o conhecimento do presente recurso.
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo [cf. art. 36.º, n.º 2, do CPTA, aplicável ex vi art. 2.º, alínea d) do CPPT, e art. 278.º, n.º 3, do CPPT].
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Questões a decidir no recurso
Cumpre, antes de mais, apreciar e decidir da questão prévia suscitada pela Ex.ma Procuradora Geral Adjunta no parecer exarado nos autos, e caso a mesma improceda, apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações de recurso.
Assim sendo, importará apreciar se a sentença recorrida padece de nulidade, por omissão de pronúncia, ou, se assim não for, se a mesma se padece de erro de julgamento de direito, por não ter considerado a penhora ilegal por violação do “princípio da excussão prévia do património do devedor originário principal”, não tendo conhecido esta causa de pedir adiantada pela Recorrente na sua reclamação da penhora de vencimento.


II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz:
Dos autos considera-se como assente a seguinte factualidade com relevância para a decisão a proferir:
1) Com base na Certidão de Dívida n.º ...81, emitida em 05-10-2020 foi instaurado, contra AA e BB, o PEF n.º ...01, para cobrança coerciva da dívida de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares e respectivos juros compensatórios, referente ao ano de 2019, no montante global de € 258.873,81 – cfr. resulta de fls. 24 a 26 dos autos, numeração do SITAF;
2) No âmbito do PEF mencionado na alínea antecedente foi, em 12-01-2022, emitidos ofícios dirigidos à sociedade "C......, S.A.” e à “UNIVERSIDADE ...” a solicitar a penhora de 1/6 do vencimento da executada AA, até perfazer o montante de € 274.980,73 – cfr. resulta de fls. 35 e 36 dos autos, numeração do SITAF;
3) Por e-mail datado de 13-01-2022 foi comunicado pela UNIVERSIDADE ... à executada AA que passariam a proceder ao desconto da penhora de vencimento a partir do mês de Janeiro de 2022, no montante mensal de € 355,26, tendo aquela instituição académica respondido ao SF ... 5 informando que a penhora de vencimento – cfr. resulta de fls. 10 e 11 conjugada com a Informação de fls. 21 e 22, todas da numeração do SITAF;
4) Em 17-01-2022 a sociedade "C......, S.A.” respondeu ao pedido de penhora informando que a executada não é trabalhadora daquela sociedade – cfr. resulta da Informação de fls. 21 e 22 dos autos, numeração do SITAF;
5) Em 24-01-2022 foi remetida ao SF ...-1, sob registo postal, a presente reclamação judicial – cfr. resulta de fls. 1 a 7 e 20 dos autos, numeração do SITAF.
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Com interesse para a presente decisão nada mais resulta provado.
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O Tribunal alicerçou a sua convicção com base no exame crítico dos documentos que se encontravam juntos ao processo electrónico [no qual se insere o PEF].
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II.2. Fundamentação de Direito
Antes de mais, há que decidir a questão prévia colocada no parecer exarado nos autos pela Ex.ma Procuradora Geral Adjunta.
Com efeito, é ali suscitada a questão da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal para conhecer do presente recurso, nos termos do disposto nos arts. 26.º, alínea b) e 38.º, alínea a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), assim como do art. 280.º, n.º 1 do Código de Processo e Procedimento Tributário (CPPT), uma vez que no mesmo apenas teriam sido suscitadas questões de direito.
Sucede que desde a alteração introduzida na alínea b) do art. 26.º do ETAF pelo art. 2.º da Lei n.º 114/2019, de 12 de setembro que se encontra expressamente excluído da competência do Supremo Tribunal Administrativo o conhecimento dos recursos que tenham por objeto decisões que não sejam de mérito, como é aqui o caso, uma vez que pela decisão recorrida não foi conhecido do mérito da reclamação da penhora, tendo-se na mesma decidido pela improcedência da ação fundada no entendimento de que não teria sido suscitada pela Recorrente uma qualquer causa de pedir adequada ao meio processual em causa.
Assim sendo, improcede a questão da incompetência deste Tribunal, que é o competente em razão da hierarquia para o conhecimento do presente recurso, nos termos das citadas disposições legais.
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Resolvida que está a questão da competência deste Tribunal, há que apreciar o recurso aqui em causa.
Importa começar por apreciar a nulidade por omissão de pronúncia que a Recorrente imputa à sentença, por, alegadamente, na mesma não ter sido apreciado nem decidido o objeto da reclamação, mas apreciada outra matéria a que a Recorrente, ali Reclamante, não teria suscitado (cf. conclusão 6, das suas alegações de recurso).
Vejamos então.
Do disposto no art. 125.º do CPPT resulta que constitui causa de nulidade da sentença, entre outras, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer, encontrando esta disposição norma paralela na alínea d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC.
Por sua vez, do disposto na primeira parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º do CPPT, resulta que “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras(destacado nosso).
Como é sabido, as “questões” a que ali se alude não abarcam “todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista”, mas antes “os problemas concretos que [o Tribunal] haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas)” sendo que “… questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado” (cf. neste sentido o Acórdão proferido pelo STA em 2022-02-16, no proc. 01896/15.7BEPRT, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Ou seja, as “questões” a que se alude no n.º 2 do art. 608.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, não se confundem com os raciocínios, razões, argumentos ou considerações, invocados pelas partes na sustentação das causas de pedir que invocam, correspondendo estas últimas aos vícios ou desvalores jurídicos que imputam aos atos contestados, sendo neste entendimento, aliás, que se perfila unanimemente a jurisprudência dos nossos Tribunais superiores (cf. neste sentido, designadamente, os Acórdãos proferidos pelo STA em 2019-11-27, no proc. 0245/11.8BEMDL 0579/15, em 2021-04-07, no proc. 02886/14.2BEPRT 01449/17, em 2021-02-03, no proc. 0491/15.5BEMDL 0420/18, e em 2022-04-07, no proc. 02883/16.3BEPRT, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
Por outro lado, a nulidade por omissão de pronúncia também não se confunde com o erro de julgamento de direito, que ocorre quando é feita uma incorreta determinação da norma aplicável à matéria de facto relevante (erro de previsão), ou quando o vício que afeta a decisão recorrida diz respeito à fixação dos efeitos da norma ou normas aplicáveis (erro de estatuição) (cf. neste sentido PINTO, Rui – Manual do Recurso Civil. Volume I. Lisboa, AAFDL editora, 2020, p. 27).
A sentença sob recurso julgou improcedente a reclamação de decisão do órgão da execução fiscal interposta pela Recorrente tendo por objeto a penhora do seu salário, por ali se ter entendido que não foi invocada qualquer ilegalidade da penhora, mas antes a ilegalidade da própria dívida exequenda, tendo-se ainda deixado referido na respetiva fundamentação que embora uma primeira leitura da reclamação pudesse levar à conclusão de que “a ora reclamante invocara um fundamento de oposição judicial, concretamente o da falta de legitimidade substantiva para a execução fiscal, previsto no artigo 204.º, n.º 1 alínea b), do CPPT”, o que realmente estava em causa era a (i)legalidade da dívida exequenda.
Assim sendo, é manifesto que a sentença não padece de qualquer omissão (ou excesso) de pronúncia, pois o que da mesma resulta é que da interpretação que o Tribunal a quo fez do alegado pela Recorrente na sua reclamação resultou o entendimento de que a causa de pedir que ali foi avançada não se adequava ao meio processual selecionado, por se reconduzir à invalidade da liquidação de imposto exequenda, motivo pelo qual foi a reclamação julgada improcedente.
Em causa não está, assim, uma qualquer nulidade por omissão e/ou por excesso de pronúncia, pois o Tribunal de primeiro conhecimento da causa não deixou de explicitar o motivo pelo qual entendeu que a causa de pedir, tal como a interpretou, não seria adequada ao meio processual escolhido pela Recorrente.
Não padecendo a sentença da nulidade que lhe foi imputada, há que julgar o recurso improcedente relativamente a este segmento.
Prossegue a Recorrente insistindo na alegação de que a penhora do seu vencimento é ilegal, por “violação do princípio da excussão prévia do património do devedor originário principal, dada a existência de bens e garantias suficientes para pagamento do processo fiscal em causa”, sendo que identifica como “devedora originária” a sociedade irregular "F.... e Herdeiros"
Antes de mais, cumpre aqui referir que a causa de pedir que a Recorrente elegeu para sustentar a sua reclamação não se reconduz, como entendeu o Tribunal a quo, a uma qualquer questão relativa à ilegalidade da dívida de imposto em execução – IRS referente ao ano de 2019 - mas antes a uma interpretação incorreta que faz do regime legal constante nos arts. 23.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 153.º do CPPT, aplicável à excussão do património do executado nos casos de responsabilidade subsidiária por reversão do processo de execução fiscal.
Vejamos então.
Na PI da sua reclamação, a Recorrente alegou, em síntese, que a dívida tributária em causa adviria da atividade exercida pela sociedade irregular "F.... e Herdeiros" formada em 1999, por acordo dos sucessores de "F..." tendo em vista a prossecução da atividade comercial/industrial de sucata que aquele desenvolveu ao longo da sua vida, que se encontrava integrada na herança indivisa aberta por óbito do referido "F..." e Herdeiros, de que a reclamante, é herdeira e na qual nunca exerceu qualquer cargo de gestão ou de direção, de facto ou de direito, por ser outra a sua atividade profissional, e que a penhora reclamada diria respeito a imposto de mais valias proveniente da venda de património imobiliário da herança indivisa, disponibilizado com o objetivo de a Reclamante e restantes irmãos/herdeiros solverem as dívidas que a supramencionada sociedade tinha para com a ATA.
Mais ali acrescenta que o presente processo executivo teria sido instaurado sem prévia excussão de bens pertencentes à herança de "F...", além de que no mesmo não resultaria evidenciada a inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis ou do respetivo património, pelo que, dependendo o chamamento à execução e subsequente penhora da inexistência de bens penhoráveis ou insuficiência, devidamente comprovada nos autos, do património do devedor originário para a satisfação da dívida, nos termos do disposto no art. 153.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT, a penhora seria ilegal.
Ora, compulsados os autos o que se constata é que o que resulta da certidão de dívida constante no processo de execução fiscal n.º ...01, no âmbito do qual foi efetuada a penhora reclamada (cf. fls. 25-26 dos autos, na numeração do SITAF), assim como da consulta ao Anexo G (referente a mais valias e outros incrementos patrimoniais) da declaração de IRS referente ao ano de 2019 da Recorrente e de BB, junta pela Fazenda Pública com a respetiva contestação (cf. fls. 53 dos autos, numeração do SITAF), é que a dívida exequenda respeita a IRS do ano de 2019 liquidado à aqui Recorrente e a BB, resultando de mais valias referentes à sua quota parte na alienação dos imóveis ali descritos.
Com efeito, para efeitos de IRS a herança indivisa é considerada como uma situação de contitularidade, sendo cada herdeiro tributado relativamente à sua quota-parte dos rendimentos gerados, nos termos do disposto no art. 19.º do Código do IRS.
Ou seja, e a aceitar-se a alegação da Recorrente de que as mais-valias a que respeita o IRS exequendo respeitam à venda de património da herança indivisa de que é cotitular na qualidade de (co)herdeira, então o mesmo é devido por si nessa qualidade e relativamente à sua quota parte na herança, e não corresponde, como pretende, a uma qualquer dívida tributária pela qual a herança indivisa seja originariamente devedora e para cuja a liquidação esteja a ser chamada a título de devedora subsidiária.
Ora, o benefício da excussão prévia, a que alude, e que se encontra regulado no n.º 3 do art. 23.º da LGT, e no n.º 2 do art. 153.º do CPPT, apenas tem aplicação no âmbito da responsabilidade subsidiária, que se concretiza através da reversão do processo de execução fiscal (cf. n.º 1 do art. 23.º da LGT).
Sucede que no caso, manifestamente, não se verificou qualquer reversão passível de originar a responsabilidade subsidiária da aqui Recorrente que justifique a invocação pela mesma do benefício da excussão prévia.
Alega ainda a Recorrente que a sentença sob recurso não se pronunciou sobre a suspensão da penhora em consequência da Reclamação, e que o Órgão de Execução Fiscal não procedeu à respetiva suspensão.
Atendendo a que o ato reclamado nos autos é uma penhora, resulta do disposto no n.º 6 do art. 278.º do CPPT, que se a reclamação cumprir com os requisitos do disposto no n.º 3 do mesmo preceito, a interposição da reclamação suspenderá os efeitos do ato reclamado.
Sucede que a Reclamante não apresenta qualquer prova de que o ato reclamado não foi suspenso.
Assim sendo, e em face do exposto, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente
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Atento o decaimento da Recorrente, é sua a responsabilidade pelas custas, pelo presente recurso, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT.
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Conclusão:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:
I. Desde a alteração introduzida na alínea b) do art. 26.º do ETAF pelo art. 2.º da Lei n.º 114/2019, de 12 de setembro que se encontra expressamente excluído da competência do Supremo Tribunal Administrativo o conhecimento dos recursos que tenham por objeto decisões que não sejam de mérito, como é aqui o caso, uma vez que pela decisão recorrida não foi conhecido do mérito da reclamação da penhora, tendo a mesma decidido pela improcedência da ação com fundamento no entendimento de que não teria sido suscitada pela Recorrente uma qualquer causa de pedir adequada ao meio processual em causa.
II. Para efeitos de IRS a herança indivisa é considerada como uma situação de contitularidade, sendo cada herdeiro tributado relativamente à sua quota-parte dos rendimentos gerados, nos termos do disposto no art. 19.º do Código do IRS.
III. Respeitando o IRS exequendo à venda de património da herança indivisa de que a Recorrente é cotitular na qualidade de (co)herdeira, o mesmo é devido por si nessa qualidade e relativamente à sua quota parte na herança, e não correspondendo a uma qualquer dívida tributária pela qual a herança indivisa seja originariamente devedora e para cuja liquidação esteja a ser chamada a título de devedora subsidiária.
IV. O benefício da excussão prévia regulado no n.º 3 do art. 23.º da LGT, e no n.º 2 do art. 153.º do CPPT apenas tem aplicação no âmbito da responsabilidade subsidiária, que se concretiza através da reversão do processo de execução fiscal (cf. n.º 1 do art. 23.º da LGT).
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao presente recurso, mantendo a sentença recorrida com a fundamentação aqui preconizada.
Custas pela Recorrente.
Porto, 15 de dezembro de 2022 - Margarida Reis (relatora) – Cláudia Almeida – Paulo Moura.