Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01832/21.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2025
Tribunal:TAF do Porto
Relator:CARLOS DE CASTRO FERNANDES
Descritores:IVA; FATURAS FALSAS;
INDÍCIOS INTERNOS;
INDÍCIOS EXTERNOS;
Sumário:
I - No caso de faturas falsas, compete à AT fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação corretiva e, só caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto.

II - A AT pode lançar mão de elementos obtidos através de fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, porém, não se pode bastar com esses elementos (indícios externos), tem necessariamente de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as faturas não correspondem a operações efetivas (faturas falsas ou fictícias).*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – A Representação da Fazenda Pública – RFP (Recorrente) veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se julgou procedente a impugnação intentada pela [SCom01...], Unipessoal, Lda. (Recorrida), direcionada contra as liquidações de IVA relativas aos períodos de 02/2017, 03/2017, 04/2017, 05/2017, 06/2017, 07/2017, 10/2017, e 02/2018, assim como contra a correspetiva decisão de indeferimento da reclamação graciosa que contra aquelas foi deduzida.

No presente recurso, a Apelante (RPF) formula as seguintes conclusões:
A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação judicial intentada por “[SCom01...], Unipessoal, Lda”, com o NIPC ...94, tendo esta última, por objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, deduzida contra as liquidações adicionais de IVA, referentes aos períodos de Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho e Outubro de 2017 e Fevereiro de 2018, no valor global de € 241.401,97.
B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto, entende que a decisão proferida enferma de erro de julgamento, de facto e de direito.
C. Na verdade, a sentença começa por considerar, na respetiva fundamentação de facto, que a Impugnante, necessita de adquirir fio para a confeção de artigos de vestuário, dada a sua atividade declarada de confeção de vestuário em série; Por sua vez, na fundamentação de direito, considerou que a AT, acabou por concluir que as quantidades de fio introduzidas no processo produtivo se revelaram necessárias ao exercício da atividade da Impugnante, não resultando, portanto, qualquer elemento anómalo que levasse a concluir, por exemplo, pela desnecessidade de aquisição do fio, considerando a capacidade instalada e as vendas e prestações de serviços declaradas pela Impugnante.
D. Ora, a IT, nunca colocou em causa que a Impugnante sempre necessitaria de adquirir fio para a prossecução da sua atividade de confeção de vestuário exterior em série, que, por sua vez, vende aos respetivos clientes; O que efetivamente a IT não aceita, é que a aquisição do fio, tenha sido efetuada aos supostos fornecedores mencionados nas faturas em crise, a saber, a “[SCom02...] Unipessoal, Lda”, a “[SCom03...] Unipessoal, Lda” e a “[SCom04...], S.A.”, por todo um conjunto de razões e de indícios que recolheu, quer nas respetivas ações inspetivas realizadas às referidas empresas, quer através de esclarecimentos e de informação recolhida no âmbito da ação inspetiva realizada à Impugnante.
E. Começando pelas mercadorias adquiridas a montante pelas supostas fornecedoras da Impugnante, e no caso da “[SCom02...]”, verificou-se que a sua única fornecedora de fio de algodão, era uma empresa alemã designada, “[SCom05...]”, no entanto, o que a IT constatou, foi que as faturas emitidas pela “[SCom02...]” para a Impugnante, são anteriores às faturas de aquisição de fio pela “[SCom02...]” à “[SCom05...] GmbH”.
F. Ora, tendo em conta este facto, torna-se de todo inverosímil que o fornecimento de fio pela “[SCom02...]” à Impugnante, seja sustentado por uma aquisição efetuada pela referida fornecedora, que ocorreu em momento posterior.
G. Tal como a FP desde logo salientou, a AT, nunca colocou em causa a necessidade da Impugnante em adquirir fio a fornecedores para desenvolver a sua atividade de confeção de vestuário em série.
H. O que a AT não considera verosímil, é que a aquisição de fio pela Impugnante à empresa “[SCom02...]”, esteja justificada, quando de acordo com o apurado pela IT, esta última, adquiriu em momento posterior a uma empresa alemã, o fio que vendeu àquela.
I. Devendo tal situação anómala apurada pela IT, ter sido dada como provada na respetiva fundamentação de facto, considerando, por essa razão, a FP, que deverão ser aditados à matéria levada ao probatório, factos suportados por documentos constantes dos autos e não considerados pelo Tribunal a quo, que aqui se requer sejam dados como provados, nos seguintes termos:
“As faturas emitidas pela [SCom02...] para a [SCom01...], são anteriores às faturas de aquisição da [SCom02...] à sua fornecedora, a empresa alemã, “[SCom05...] GmbH”.
J. O que não aconteceu, incorrendo por essa razão a douta sentença, em erro de julgamento por insuficiente fundamentação de facto,
K. em erro de julgamento da matéria de facto na apreciação e seleção da matéria de facto relevante para a decisão, não levando ao probatório todos os factos resultantes dos elementos constantes dos autos pertinentes à boa decisão da causa, em ordem à descoberta da verdade material, em violação do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC,
L. e, em erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e subsequente subsunção em matéria de direito.
M. No caso da outra empresa, a “[SCom03...] Unipessoal, Lda”, o que se verificou, foi que a sua única fornecedora conhecida, era uma empresa de nome “[SCom06...]”, contudo, as aquisições a esta última, não eram de todo suficientes para justificar os fornecimentos da “[SCom03...]” à Impugnante.
N. De igual modo, e relativamente à também suposta fornecedora da Impugnante, a “[SCom04...], S.A.”, não foi detetado pela IT a existência de qualquer instalação física na qual a referida empresa pudesse concretizar as operações mencionadas nas faturas em crise ou lograsse armazenar as mercadorias ali mencionadas, nem tão pouco, se constatou a existência de qualquer fornecedor conhecido desta empresa, de fio de algodão, que esta última, por sua vez, faturou à Impugnante.
O. Ou seja, o que a IT demonstrou fundamentadamente no seu relatório, foi que estas supostas fornecedoras da Impugnante, nunca poderiam vender a esta última, aquilo que não possuíam a montante. Facto que foi completamente ignorado pela sentença recorrida.
P. De igual modo, analisados os documentos de transporte solicitados pela IT ao responsável da Impugnante e referentes ao transporte das mercadorias mencionadas nas faturas emitidas pela “[SCom02...]”, constatou a referida entidade que esse transporte, foi efetuado por uma viatura ligeira de passageiros, que, para além de estar registada em nome de um sujeito passivo individual, sem qualquer ligação a alguma das empresas aqui envolvidas, não tinha de todo capacidade para transportar as quantidades de fio discriminadas em cada uma das faturas em crise, superiores a 20 toneladas, conforme resulta do quadro discriminado no relatório inspetivo.
Q. Também em sede da ação inspetiva realizada à Impugnante, confrontou a IT o seu responsável, no sentido de este identificar com quem eventualmente negociou os fornecimentos mencionados nas faturas, tendo aquele mencionado nomes de pessoas totalmente desconhecidas em sem qualquer ligação profissional, laboral ou pessoal com cada uma das empresas fornecedoras.
R. De igual modo, não se vislumbra a existência de qualquer troca de correspondência entre a Impugnante e alguma destas supostas fornecedoras, seja através de emails, seja através da celebração de eventuais contratos destinados a discutir preços de fio, bem como, as quantidades a fornecer.
S. É que, a AT, trabalha com indícios, ora, um dos fortes indícios da não realização dos fornecimentos pelas entidades referidas para a Impugnante, prende-se com o facto de aquelas, nunca poderem ter fornecido a jusante, aquilo que nunca adquiriram a montante!
T. E, quanto a este ponto, salvo o devido respeito que é muito, o tribunal a quo, não alude, nem tão pouco, contraria em nenhum segmento do douto relatório, o facto de as supostas fornecedoras, não poderem vender à Impugnante, aquilo que nunca compraram a montante.
U. Razão pela qual, consideramos, que o respeitoso tribunal a quo, incorre, em erro de julgamento, na apreciação da matéria de facto e consequente subsunção ao direito.
V. É que, se não são por demais evidentes os indícios e prova recolhidos, quer em sede de ação inspetiva realizada para esse efeito às entidades mencionadas nas faturas em crise como fornecedoras da Impugnante, quer em sede de ação inspetiva a esta última, que outras diligências se impunham mais fazer à AT, para prova nesse sentido? No modesto entender da FP, nem por pura magia poderá ser dada como provada a venda de algo que não se produziu, nem comprou, em lado algum.
W. A AT, no seu esforço probatório, realizou o itinerário que se impunha, partindo das fornecedoras e terminando na utilizadora das faturas (a Impugnante), tendo recolhido, indícios mais do que suficientes de que aquelas nunca poderiam transmitir a jusante, o que não adquiriram a montante.
X. É que, note-se: a AT não coloca em causa as vendas da Impugnante aos seus clientes, nem tão pouco, que essas vendas englobaram matéria prima que aquela adquiriu a montante, o que a AT coloca efetivamente em causa, é que a matéria prima (fio de algodão) que a Impugnante incorporou nas suas vendas a clientes, tenha sido adquirida às entidades mencionadas, pelas razões que demonstrou e fundamentou!
Y. Assim, respeitosamente, entendemos que, mal andou o tribunal a quo, desconsiderando de motu proprio a fundamentação vertida nesta parte do relatório inspetivo.
Z. Não podendo a douta sentença, concluir como concluiu, no sentido de que a AT somente recolheu indícios junto das empresas fornecedoras de que as faturas em crise, não correspondem a verdadeiros fornecimentos, para considerar que não detetou qualquer situação anómala em ação inspetiva à Impugnante.
AA. Ora, muito pelo contrário: veja-se os documentos de transporte respeitantes às faturas da empresa “[SCom02...]”, obtidos junto da Impugnante, dos quais, se extrai que o único veículo (ligeiro de passageiros), utilizado para o transporte das mercadorias, não tinha de todo capacidade para transportar as quantidades de fio mencionadas em cada uma das faturas, para além de ser seu proprietário, um indivíduo sem qualquer ligação às empresas envolvidas; e, veja-se também, a informação obtida pela IT junto da Impugnante, a qual, indicou nomes de pessoas que supostamente negociaram com ela em nome das empresas fornecedoras, pessoas totalmente desconhecidas e sem qualquer ligação com cada uma dessas empresas, inexistindo quaisquer contratos ou troca de correspondência, demonstrativos de eventuais negociações entre as partes envolvidas, seja em termos de preços acordados ou quantidades de fio fornecidos.
BB. Sendo certo que, no seu esforço probatório, a AT realizou todas as diligências necessárias e possíveis, junto da Impugnante e das suas supostas fornecedoras.
CC. Acresce que, não vislumbra a FP, de que forma o facto de uma empresa se encontrar enquadrada em sede de IVA no regime normal trimestral, ou o facto de a Impugnante, ter retirado essa conclusão mediante a consulta que efetuou no respetivo portal da AT acerca da sua fornecedora, faz prova alguma, nomeadamente, de que os fornecimentos mencionados nas faturas em crise, correspondem a verdadeiros fornecimentos, efetuados por aquelas empresas, quando, foram reunidos nas respetivas ações inspetivas a estas últimas, uma série de elementos e de indícios que apontam precisamente o contrário.
DD. Da mesma forma, também não se alcança, de que modo o facto de a Impugnante ter consultado a informação de cadastro de cada uma destas empresas, faz prova de que desconhecia de todo a situação anómala em que se encontravam e da sua incapacidade em vender aquilo que não produziram, nem compraram, conforme parece concluir a douta sentença, tornando-se de todo inverosímil esse desconhecimento por parte da Impugnante, na medida em que nunca lhes poderia ter adquirido, aquilo que aquelas empresas nunca haviam produzido ou comprado em lado algum.
EE. Entendemos assim, que todos estes factos devem ser ponderados e devidamente sopesados em conjunto, os quais, se encontram devidamente elencados e referenciados no relatório inspetivo.
FF. Razão pela qual respeitosamente se entende, que do somatório da factualidade retro elencada e referenciada, se impunha ao Tribunal a quo decisão diferente, máxime, a improcedência do peticionado.
GG. Na verdade, tal como é entendimento unânime da jurisprudência, para que a Administração Tributária, obste à dedução do IVA nos termos consagrados no n.º 3 do artigo 19º do CIVA, basta que existam indícios sérios e objetivos que traduzam uma probabilidade elevada de que efetivamente as faturas não consubstanciam operações reais, incumbindo depois ao contribuinte demonstrar o contrário. (veja-se neste sentido entre outros, o Acórdão do STA de 16/03/2016, proferido no âmbito do Processo n.º 0587/15 e o Acórdão do TCA de 24/09/2002, proferido no âmbito do Processo nº 1361/98).
HH. Ora, partindo deste pressuposto, resta à Fazenda Pública questionar, que mais indícios teria a AT que recolher para além dos demonstrados, de forma a serem julgados sérios, credíveis e suficientes para abalar a presunção de veracidade das faturas? Ora, respeitosamente se entende ter a AT demonstrado, por intermédio dos SIT, indícios suficientes de falsidade das faturas, que pelo elenco fáctico vertido no relatório inspetivo e que fazem parte dos autos, se mostram sérios e reveladores de alta probabilidade de falsidade, conforme acima demonstrado.
II. Com o devido respeito, a entender-se o contrário, mais parece que a AT, tem que provar a simulação em si, não lhe bastando a recolha de indícios sérios e suficientes, o que, vai em sentido contrário do defendido pela jurisprudência citada.
JJ. Com efeito, os indícios são factos que, através de um raciocínio indutivo, permitem concluir pela existência de outros factos.
KK. Ora, essa indução, baseia-se em conhecimentos empíricos ou regras de experiência que devem ser comuns à generalidade das pessoas, embora seja admissível que ela possa respeitar também a um grupo mais pequeno, possuidor de conhecimentos específicos (por exemplo, os médicos).
LL. Os indícios, pela sua natureza, não oferecem uma certeza absoluta do facto indiciado, apenas oferecendo uma probabilidade que deve ser elevada, da ocorrência do facto indiciado.
MM. Em consequência, o juiz, perante um indício, não se pode bastar com a afirmação de que existe a probabilidade de que o facto indiciado não exista. O que ele tem de verificar, é se existe uma probabilidade séria de que o facto indiciado tenha ocorrido.
NN. Acresce que um indício, em regra, não é suficiente para afirmar o facto indiciado. Ele deve ser estabelecido através de um conjunto de indícios, que devem apontar no mesmo sentido e que têm que ser concordantes.
OO. A Inspeção, ao recolher indícios junto dos emitentes e dos utilizadores, está precisamente a dar cumprimento a essa necessidade que é inerente à prova indiciária. E, nesse quadro, o tribunal tem também que avaliar os indícios em conjunto, cuidar da sua coerência e conformidade intrínseca.
PP. Ora, é habitual que o tribunal não faça este trabalho de conjugação e avaliação global, antes optando por uma análise singular de cada indício como se cada um deles, só por si e sem mais, devesse permitir a indução do facto presumido. E isso sucedeu claramente no caso vertente. Se o tribunal tivesse atendido à globalidade dos indícios em conjunto e não singularmente, obteria um resultado totalmente diferente daquele a que chegou.
QQ. Ora, todos esses indícios, apontam de forma clara e fundada, que o fornecimento dos materiais faturados à Impugnante, nunca ocorreu, já que, não existe qualquer rasto do circuito físico das mercadorias, nem aquelas poderiam fornecer aquilo que não tinham, o que permite concluir, com base na experiência comum, que efetivamente aqueles bens, nunca foram fornecidas pelos referenciados fornecedores.
RR. Essa probabilidade é forte e fundada e o Juiz não a pode desvalorizar com o simples argumento de que o indício pode corresponder a facto diverso, designadamente, falta de cumprimento das obrigações de documentação pelos fornecedores, ou que, não foi encontrada qualquer situação anómala em sede declarativa no âmbito da inspeção à Impugnante, ou que esta desconhecia a situação anómala em que se encontravam as empresas fornecedoras e a sua incapacidade em fornecer os bens em questão, sem qualquer prova que aponte no sentido desse desconhecimento.
SS. A desvalorização e colocação em causa do indício sério deve ser feita pela contraparte, isto é, pela Impugnante, não cabendo, salvo o devido respeito, ao Juiz efetuar essa tarefa por ele e, sobretudo, sem qualquer elemento factual de suporte.
TT. Assim, cabia à Impugnante, provar a veracidade das operações materiais, o que teria de ser feito de forma cabal, não bastando lançar a dúvida, o que, respeitosamente, aquela não logrou fazer.
UU. Razão pela qual, consideramos, que as vicissitudes elencadas, estão comprovadas e demonstradas, não tendo sido devidamente relevadas pelo Tribunal a quo, uma vez que, a tê-lo sido, o itinerário decisório a implementar, certamente teria sido outro.
VV. Por conseguinte, salvo o devido respeito que é muito, o Tribunal a quo, incorreu em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, assim como, não considerou nem valorizou a prova como se impunha.
Termina a Recorrente pedindo que seja considerando procedente o presente recurso, revogando-se a sentença recorrida.
A Recorrida apresentou contra-alegações, nestas concluindo que:
A. A Recorrida foi notificada, em 28/02/2025, via SITAF, na pessoa da sua mandatária, da interposição do recurso e para apresentar contra-alegações, considerando-se notificada a 03/03/2025 e iniciando-se o prazo de 30 dias para apresentar contra-alegações em a 04/03/2025 e terminando a 02/04/2025, pelo que hoje – 02/04/2025 - as presentes contra-alegações, submetidas via SITAF, são tempestivas.
B. A douta sentença recorrida não enferma de erro de julgamento, quer quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito.
C. A matéria de facto dada como provada é clara, suficiente e traduz os factos alegados e demonstrados pela Recorrida.
D. A decisão do Tribunal baseou-se em prova documental, testemunhal e declarações de parte, confirmando a veracidade das relações comerciais da Recorrida com as sociedades fornecedoras.
E. A Autoridade Tributária (AT) não reuniu indícios concretos e credíveis que permitam concluir que as faturas emitidas pelas sociedades [SCom02...] Unipessoal Lda., [SCom03...] Unipessoal Lda. e [SCom04...] S.A. não correspondem a operações efetivamente realizadas.
F. Os indícios recolhidos junto da entidade especializada devem ser suficientemente fortes para afastar qualquer dúvida sobre a veracidade das operações e esses indícios não constam – nem poderiam constar – da matéria provada.
G. A douta sentença concluiu – e bem – que a AT apenas se limitou a basear as suas correções em elementos recolhidos junto das fornecedoras, sem comprovar qualquer irregularidade na contabilidade da Recorrida ou suas declarações.
H. Face ao exposto, e salvo melhor opinião, parece-nos que não assistirá razão à Recorrente, devendo ser negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.
*
Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, tendo este emitido parecer no sentido da improcedência do presente recurso (cf. fls. 330 e segs. dos autos – paginação do SITAF).
*
Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

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II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
1. A [SCom01...] - Unipessoal Lda. tem como objecto social o fabrico, comércio, importação e exportação de artigos de vestuário, calçado e acessórios de moda (cfr. certidão permanente do registo comercial da empresa constante do processo administrativo, a fls. 659 a 661 do Sitaf).
2. A principal actividade da [SCom01...] - Unipessoal Lda consiste na confecção de artigos de vestuário em malhas circulares (cfr. declarações de parte de «AA» e depoimento testemunhal de «BB»).
3. A [SCom01...] - Unipessoal Lda tem de adquirir fio para a confecção dos artigos de vestuário mencionados em 2) (cfr. declarações de parte de «AA» e depoimento testemunhal de «BB»).
4. Em 10/02/2017, a [SCom01...] - Unipessoal Lda consultou, através do portal da Autoridade Tributária, a informação de cadastro atinente à sociedade [SCom02...] Unipessoal Lda, onde constava que a sociedade tinha enquadramento em sede de IVA em vigor, no regime normal trimestral (cfr. Doc. 42 junto com a petição inicial, a fls. 127 do Sitaf).
5. Em 26/04/2017, a [SCom01...] - Unipessoal Lda. consultou, através do portal da Autoridade Tributária, a informação de cadastro atinente à sociedade [SCom03...] Unipessoal Lda, onde constava que a sociedade tinha enquadramento em sede de IVA em vigor, no regime normal trimestral (cfr. Doc. 77 junto com a petição inicial, a fls. 162 do Sitaf).
6. Em 21/02/2018, a [SCom01...] - Unipessoal Lda. consultou, através do portal da Autoridade Tributária, a informação de cadastro atinente à sociedade [SCom04...] S.A., onde constava que a sociedade tinha enquadramento em sede de IVA em vigor, no regime normal trimestral (cfr. Doc. 86 junto com a petição inicial, a fls. 174 do Sitaf).
7. Em 20/05/2019, a Autoridade Tributária, ao abrigo das Ordens de Serviço n.º ...97 e ...98, iniciou uma acção de inspecção, de âmbito parcial, em sede de IVA, IRC, retenções na fonte de IRS e retenções na fonte de IRC, à sociedade [SCom01...] - Unipessoal Lda, relativamente aos anos de 2017 e 2018 (cfr. ordens de serviço datadas e assinadas constantes do processo administrativo, a fls. 605 e 607 do Sitaf).
8. Em 04/11/2019, no âmbito da acção de inspecção mencionada em 2), foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária, no qual foi apurado IVA indevidamente deduzido no montante de € 226.811,51, relativamente ao ano de 2017, e no montante de € 14.590,46, relativamente ao ano de 2018 (cfr. página 1 do Relatório de Inspecção Tributária a fls. 129 a 156 do processo administrativo junto ao processo físico).
9. No capítulo II.2 do Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3) foi indicado que a acção de inspecção desencadeada decorreu das acções de inspecção realizadas a sociedades fornecedoras da Impugnante, nos termos que se extractam (cfr. página 2 do Relatório de Inspecção Tributária a fls. 129 a 156 do processo administrativo junto ao processo físico):
“(…)
II.2 – Motivo, âmbito e incidência temporal
A presente ação inspectiva decorre da ação inspectiva efectuada aos fornecedores [SCom02...] Unipessoal Lda., NIF ...85, a [SCom03...] Unipessoal Lda. NIF ...12, nos quais foram levantadas diversas dúvidas quanto à veracidade das operações tributárias.
(…)”
10. No capítulo II.3 do Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), sob a epígrafe “Análise global da empresa”, a Autoridade Tributária referiu-se ao enquadramento do sujeito passivo para efeitos de IVA e IRC, às obrigações declarativas e de pagamento, a divergências nos anexos O e P e procedeu a um controlo de quantidades do fio introduzido no processo produtivo da empresa, nos termos que se extratam (cfr. páginas 2 a 19 do Relatório de Inspecção Tributária a fls. 129 a 156 do processo administrativo junto ao processo físico):
“II.3 – Análise global da empresa
II.3.1 – Enquadramento do sujeito passivo
Trata-se de uma sociedade unipessoal por quotas constituída em 2014-01-09, actualmente com um capital social de 50.000,00 EUR, pertencente ao sócio [SCom07...] – SGPS SA, NIF ...29 tendo como objecto comercial: Fabrico, comércio, importação e exportação de artigos de vestuário.
Iniciou a sua actividade em 2014-01-21, estando registada para o exercício da actividade empresarial e comercial, enquadrada no CAE 14131 – Confecção de outro vestuário exterior em série.
Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime normal de periodicidade mensal e, para efeitos de IRC, encontra-se enquadrado no regime geral de tributação.
(…)
II.3.2 – Obrigações declarativas e de pagamento
Nos períodos em análise o sujeito passivo apenas procedeu:
À entrega de todas as declarações periódicas de IVA e correspondentes anexos recapitulativos de IVA;
À entrega das Declarações Mensais de Remunerações, bem como das correspondentes Modelo 10.
Comunicação de facturas (e-factura);
À entrega da declaração Modelo 22 de IRC e IES/DA para o período de 2017.
Não foram detectadas quaisquer dívidas à AT até 2019-05-29.
II.3.2.1 – Valores constantes nas declarações Modelo 22 de IRC e IES/DA
O sujeito passivo procedeu à entrega das declarações Modelo 22 de IRC e IES/DA dos anos de 2017 e 2018, sendo os valores constantes nas demonstrações financeiras os seguintes:
Demonstração Financeira20172018
Vendas e Prestações de Serviços 10 840 957,06 10 311 846,35
Subsídios à exploração 20 706,51 5 533,70
Variação dos inventários de produção -165 722,08 322 156,92
Custo das mercadorias vendidas 3 675 799,94 5 363 992,98
Fornecimentos e serviços externos 5 820 739,34 4 398 459,13
Gastos com o pessoal 644 508,20 606 606,27
Imparidades de dividas a receber 15 860,02 0,00
Outros rendimentos e ganhos 61 627,16 77 978,04
Outros gastos e perdas 69 385,70 3 702,54
Gastos/reversões de depreciações e de amortizações 98 854,41 85 655,58
Juros e gastos similares 7 591,37 11 138,13
Resultado antes de impostos 424 829,67 247 960,38
Imposto sobre o rendimento do período 92 071,07 64 927,74
Resultado líquido do período 332 758,60 183 032,64
Lucro tributável 451 328,16 257 608,09

II.3.2.2 – Divergências anexo O e P
II.3.2.2.1 – ANO DE 2017
Não foram detectadas quaisquer divergências relativas ao anexo O (clientes) relativas ao período de 2017. As divergências do anexo P de valor significativo detectadas são as seguintes:
ANEXO P
NIFDenominaçãoValor Anexo P (do Contribuinte)Valor Anexo O (declarado por terceiros)Diferença
...50[SCom08...] LDA 98 744,00 0,00 98 744,00
...85[SCom02...] UNIPESSOAL LDA 568 919,00 0,00 568 919,00
...12[SCom03...] UNIPESSOAL LDA 644 028,00 0,00 644 028,00
...450[SCom09...] M B H 138 946,00 0,00 138 946,00
...13[SCom10...] 198 642,00 270 194,00 -71 552,00

B – [SCom02...] Unipessoal Lda – NIF ...85
No ano de 2017 foram comunicadas pela [SCom02...] Unipessoal Lda. facturas de venda para a [SCom01...] que totalizam 568.919,77 EUR, IVA incluído, relativos à venda de 152.028 quilos de fio, conforme quadro abaixo:
Os documentos de transporte são os seguintes:
Data Cont.DiaN DocFacturaValorIVATotalQuant. (kgs)
2017-02-28412.001V/ Factura 0000658 968,0013 562,64 72 530,64 21 840,00
2017-02-28412.013V/ Factura 0000858 266,0013 401,18 71 667,18 21 580,00
2017-03-31413.001V/ Factura 0002267 704,0015 571,92 83 275,92 21 840,00
2017-03-31413.037V/ Factura 0003067 704,0015 571,92 83 275,92 21 840,00
2017-03-31413.049V/ Factura 0003467 704,0015 571,92 83 275,92 21 840,00
2017-04-30414.007V/ Factura 0005071 042,4016 339,75 87 382,15 21 528,00
2017-05-31415.017V/ Factura 0007071 148,0016 364,04 87 512,04 21 560,00
462 536,40106 383,37 568 919,77 152 028,00
Factura n.ºDoc. Transp.DataVeículo
1 2017/6GT 4 2017/607-02-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/8GT 4 2017/813-02-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/22GT 4 2017/2201-03-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/30GT 4 2017/3015-03-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/34GT 4 2017/3420-03-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/50GT 42017/5007-04-2017Matrícula ..-LZ-..
1 2017/70GT 4 2017/7015-05-2015Matrícula ..-LZ-..
Relativamente aos documentos de transporte, verifica-se o seguinte:
Embora consta nas referidas guias, que as mesmas foram emitidas no programa certificado n.º 1137/AT, não existe comunicação prévia à AT, conforme obrigatoriedade prevista na a) do nº 6 do artigo 5.º do regime de bens em circulação.
Consta ainda que o transporte foi remetido num veículo com a matrícula ..-LZ-.., porém, aquela matrícula pertence a um veículo ligeiro de passageiros, cuja propriedade pertence a um sujeito individual desde 2011.
Do descrito, resulta a impossibilidade de transporte superior a 20 toneladas, em cada factura emitida.
Ainda de acordo com a [SCom01...], os negócios com a [SCom02...] eram efectuados com o Sr. «CC», através do telemóvel ...47, email: geral@..........1@..... ou ..........2@......
Contudo, a [SCom02...] no período de 2017 apresenta declarações mensais de remunerações, declarando o pagamento de rendimento de trabalho dependente ao seu gerente. Não existe nenhum tipo de relação comercial entre a [SCom02...] e «CC», não constando como trabalhador da sociedade, nem como prestador de qualquer serviço, desconhecendo-se ainda, a identidade fiscal de «CC», e não foi possível o contacto para o referido número de telemóvel, pois o mesmo não se encontra disponível.
Resulta ainda de ação inspectiva à [SCom02...] o seguinte:
Caracterização do sujeito passivo – [SCom02...]
Trata-se de uma sociedade unipessoal por quotas constituída em 2015-03-19, com um capital social de 5.000,00 EUR (…) tendo como objecto comercial: Comércio geral, importação e exportação. Comércio de computadores e equipamentos eletrónicos.
(…)
Em 2017-01-30, foi alargado o objecto social da empresa para: Comércio geral, importação e exportação. Comércio de computadores e equipamentos eletrónicos. Comércio por grosso de artigos têxteis, fios, malhas e afins; importação e exportação de artigos têxteis, fios, malhas e afins. Comércio por grosso de óleos vegetais, brutos, azeite e afins. Transportes nacionais e internacionais de mercadorias.
(…)
A sociedade foi declarada insolvente em 2018-02-26, por sentença proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia – Juiz ..., no âmbito do processo n.º ..9/18...T8VNG.
(…)
Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o sujeito passivo encontrou-se enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral de 2015 a 2017, e no regime normal com periodicidade mensal de 2018-01-01 a 2018-06-16, data em que a actividade foi cessada nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 65.º do CIRE.
(…)
Obrigações declarativas e de pagamento
No ano de 2017 o sujeito passivo cumpriu com as seguintes obrigações fiscais:
Declarações de periódicas de IVA de 2017/03T e 2017/06T, existindo Declarações Oficiosas de IVA dos períodos 2017/09T e 2017/12T;
Não procedeu à entrega da Declarações de IRC (modelo 22), nem da IES/DA do ano de 2017;
Apresentou Declarações Mensais de Remunerações de janeiro a junho e de agosto a dezembro, declarando rendimento de categoria A (trabalho dependente), ao sócio-gerente à data (…)
Comunicou na aplicação e-factura, facturas num total de 16.536.519,43 EUR, com IV INCLUÍDO NO VALOR DE 1.900.128,33. Da análise às facturas comunicadas, verificou-se a existência de várias séries. No entanto, não constam totalidade das facturas emitidas em nome da [SCom02...]
Verificou-se ainda que foram comunicadas facturas com o mesmo número, emitidas em dias diferentes, com valores diferentes e para clientes diferentes. Atendendo à especificidade do disposto na Portaria 363/2010, um programa certificado não permite estas incoerências.
Instalações do sujeito passivo – local do exercício de actividade
A Direção de Finanças ..., no âmbito de inspecção inspectiva à [SCom02...], titulada pelas Ordens de Serviço n.ºs ...97, ...98 e ...99, efectuou diligências no sentido de contactar o sujeito passivo, tendo apenas sido possível contactar (nas instalações sitas na Praça ... – ... – ... andar, no ..., instalações pertencentes à “[SCom11...]”, com o N...28, local do domicílio da [SCom02...] – escritório virtual) a Administradora de Insolvência, Dra. «DD».
Desconhece-se a existência de quaisquer outras instalações da [SCom02...].
Conclusões da ação inspectiva efectuada à [SCom02...] Unipessoal Lda, NIF ...85, no âmbito das ...98 e ...299
Existem já extrapoladas conclusões quanto as operações existentes entre ambos os sujeitos passivos (tanto na qualidade de cliente como na qualidade de fornecedor), as quais se encontram vertidas no Relatório de Inspecção Tributária das Ordens de Serviço acima identificadas, tendo os Serviços de Inspecção Tributária concluído, e passamos a citar:
“… da análise às facturas emitidas e declaradas pelos fornecedores da [SCom02...], quer nacionais, quer intracomunitários, foi verificado que apenas existiu um fornecedor intracomunitário de fio 30/1 100% algodão penteado, o sujeito passivo alemão “[SCom05...] GmbH”, com o NIF DE ...86 (ver ponto 11.3.9.E). Apenas existam dois eventuais fornecimentos de fio efectuados pela [SCom05...], que ocorreram em 8 e 9 de junho de 2017, num total de 41.930 quilos.
Verifica-se, contudo, que a totalidade das facturas emitidas para a [SCom01...] são anteriores às facturas de aquisição de fio acima identificadas.
Foram também remetidas pela [SCom01...] cópia dos documentos de transporte dos bens contantes nas facturas acima referenciadas, sendo que as mesmas não dispõem de nº de comunicação prévia à AT.
Consta nos referidos documentos, que os transportes foram efectuados através do veículo com a matrícula ..-LZ-...
Da consulta à base de dados da AT, “consulta de matrículas”, verifica-se que aquela matrícula pertence a um veículo ligeiro de passageiros, de marca SEAT, modelo “1P”, pertencente desde 2011 a um sujeito passivo individual residente em Mafra. Constata-se a impossibilidade de aqueles bens terem sido transportados naquele veículo.
Em face do descrito, concluiu-se pela inexistência material desta operação.
Nestes termos, as operações constantes em todos os documentos relacionados neste ponto, não titulam verdadeiras operações tributárias”
Os factos descritos comprovam que as facturas emitidas para a [SCom01...] não configuram operações económicas reais, por inexistência material dos bens (a [SCom02...] não dispõe de posse daqueles bens, nomeadamente o fio).
Conclusões sobre as aquisições à [SCom02...]
Em face do descrito concluiu-se que as facturas emitidas pela [SCom02...] para a [SCom01...], não titulam verdadeiras operações tributarias (operações fictícias), pelos factos já descritos.
C – [SCom03...] Unipessoal Lda — NIF ...12
No ano de 2017 foram comunicadas pela [SCom03...] Unipessoal Lda. facturas de venda para a [SCom01...] que totalizam 644.028,76 EUR, IVA incluído relativos à venda de 165.762,2 quilos de fio conforme mapa abaixo:
Data Cont.DiaN DocFacturaValorIVATotalQuant. (kgs)
2017-06-30416.001V/ Factura 0000176 010,2217 482,3593 492,5723 033,40
2017-07-31417.044V/ Factura 0002071 072,0016 346,5687 418,5621 840,00
2017-07-31417.052V/ Factura 0002561 310,4014 101,3975 411,7920 436,80
2017-07-314110.008V/ Factura 0009661 236,0014 084,2875 320,2820 412,00
2017-04-30414.028V/ Factura 0000972 072,0016 576,5688 648,5621 840,00
2017-05-31415.028V/ Factura 0001369 300,0015 939,0085 239,0021 000,00
2017-06-30416.030V/ Factura 0001669 300,0015 939,0085 239,0021 000,00
2017-07-31417.003V/ Factura 0001942 300,009 729,0052 029,0016 200,00
522 600,62120 198,14642 798,76165 762,20

De acordo com os elementos remetidos pela [SCom01...] as mercadorias foram transportadas:
Fat. n.º Guia transp. Data Transportador Veículo
2017/9 GT 2017/9 19-04-2017 [SCom03...] às 13:00 Não identificado
2017/13 GT 2017/13 24-05-2017 [SCom03...] às 13:00 Não identificado
A/1 GT A/1 07-06-2017 [SCom03...] às 15:00 Não identificado
2017/16 GT 2017/16 16-06-2017 [SCom03...] às 14:30 Não identificado
2017/19 GT 2017/19 03-07-2017 [SCom03...] às 15:00 Não identificado
2017/20 GT 2017/20 18-07-2017 [SCom03...] às 10:30 Não identificado
2017/25 GT 2017/25 24-07-2017 [SCom03...] às 11:00 Não identificado
2017/96 GT 2017/96 10-10-2017 [SCom03...] às 10:30 Não identificado
Refira-se, contudo, que nas guias de transporte acima identificadas, consta que foram emitidas pelo programa de software certificado n° 1824/AT. Porém, estas guias não foram comunicadas à Autoridade Tributária, contrariando o disposto no artigo 3° da Portaria 161/2013, de 23 de abril.
Referiu ainda a [SCom01...] que a pessoa com quem eram efectuados os negócios com a empresa “[SCom03...]” era o Sr. «EE», com o nº de contacto móvel ...88, endereço de correio eletrónico ..........3@..... ou geral ..........4@......
Contudo, a “[SCom03...]”, no período de 2017 apresenta declarações mensais de remunerações, declarando o pagamento de rendimento de trabalho dependente à sócia-gerente. Não existe nenhum tipo de relação comercial entre a [SCom03...] e «EE», não constando como trabalhador da sociedade, nem como prestador de qualquer serviço, desconhecendo-se ainda, a identidade fiscal de «EE», e não foi possível o contacto para o referido número de telemóvel, pois o mesmo não se encontra disponível.
Resulta ainda de ação inspectiva a [SCom03...] o seguinte:
Caracterização do sujeito passivo — [SCom03...]
Trata-se de uma sociedade unipessoal por quotas constituída em 2017-02-23, com um capital social de 5 000,00 EUR (…) tendo como objecto comercial: Comércio, importação, exportação de fios e malhas: comércio, importação e exportação de óleos e azeites; comércio, importação & exportação de pneus, comércio, importação e exportação de peças e acessórios automóveis; actividades gerais de importação e exportação.
A empresa iniciou a sua actividade em 2017-03-14, encontrando-se registada para o exercício da actividade empresarial e comercial, enquadrada no CAE principal: 46410 — Comércio por grosso de têxteis: e nos CAE's secundários: 46332 — Comércio por grosso de azeite, óleos e gorduras alimentares; 45310 — Comércio por grosso de peças € acessórios para veículos automóveis; e 46494 — Outro comércio por grosso de bens de consumo NE. Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o sujeito passivo encontrou-se enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral até 31-12-2018, passando a estar enquadrado no regime normal de periodicidade mensal em 2019-01-01. Para efeitos de IRC encontra-se enquadrado no regime geral de tributação.
(…)
Obrigações declarativas e de pagamento
Nos períodos de 2017 e 2018 a [SCom03...] apenas procedeu:
À entrega das declarações periódicas de IVA de 2017/03T a 2017/12T,
À entrega das Declarações Mensais de Remunerações, de 2017/03 a 2018/04, apenas contando o pagamento de rendimentos de categoria A (trabalho dependente), à sócio-gerente «FF», NIF ...42.
Comunicação de facturas (e-factura), de margo de 2017 a abril de 2018.
À entrega da declaração Modelo 22-IRC e IES/DA para o período de 2017, em 2018-1108
Existem declarações oficiosas de IVA para os períodos 2017/127T a 2018/067
(…)
Ação inspectiva efectuada 3 [SCom03...] Unipessoal Lda, NIF ...12, no âmbito das ...257 e ...48
Existem já extrapoladas conclusões quanto às operações existentes entre ambos os sujeitos passivos (tanto na qualidade de cliente como na qualidade de fornecedor), as quais se encontram vertidas no Relatório de Inspecção Tributária das Ordens de Serviço acima identificadas, tendo os Serviços de Inspecção Tributaria concluído, e passamos a citar:
“Comparadas estas facturas, com as facturas de compras analisadas anteriormente, verifica-se que
Apenas existe registada uma factura de aquisição de Fio NE 30/1 100% algodão penteado emitida pela [SCom06...] em 2017-04-18 (factura 2017/6 ponto 1.3.5.8.3). que é coincidente com as factura de emitida pela [SCom03...] à [SCom01...], com o nº 2017/9;
Para essa operação, o prego unitário constante nas facturas emitidas pela [SCom06...] apresenta custo unitário inferior em 0,01 EUR à factura emitidas pela [SCom03...], isto é, apresentam margem de comercialização praticamente inexistentes atendendo o tipo de produto comercializado (0,01 EUR corresponde a 0,0303%).
Não foram detectadas mais quaisquer aquisições que respeitam às facturas emitidas para à [SCom01...] no período em análise, para além de que a [SCom03...] não apresenta nenhuma factura de aquisição, quer relativa a aquisições de fio NE 24/1 100% algodão, nem fio NE 30/1 100% viscose;
Pelo que, as facturas de venda não podem corresponder a operações efectivamente realizadas, por inexistência da posse material dos produtos incluídos nas facturas emitidas pela [SCom03...];
Acresce porém que os Serviços de Inspecção tendo concluíram pela inexistência económica da operação (ver ponto 1.3.5B.3) constante nas facturas emitidas pela [SCom06...], o que implica que a operação subsequente (facturas emitidas pela [SCom03...] para a [SCom01...]) também seja, por inexistência da posse dos bens incluídos nas referidas facturas.
De acordo com os elementos remetidos pela [SCom01...] as mercadorias foram transportadas de seguinte forma:
(…)
Refira-se, contudo, que nas guias de transporte acima identificadas, consta que foram emitidas pelo programa de software certificado nº 1824/AT. Porém, estas guias não foram comunicadas à Autoridade Tributárias, contrariando o disposto do artigo 3° da Portaria 161/2013, de 23 de abril.
Ainda segundo informação remetida pela [SCom01...], as facturas acima identificadas foram pagas da seguinte forma:
DataMeio pagamentoConta destinoValor
20-04-2017Chq ...34 Banco 1... Desconhecida88 648,56
25-05-2017Chq ...11 Banco 2... ...9085 239,00
08-06-2017Chq ...751 Banco 1... ...2393 492,57
20-06-2017Chq ...31 Banco 1... ...2385 239,00
10-07-2017Chq ...84 Banco 1... ...9052 029,00
19-07-2017Chq ...07 Banco 1... ...9088 648,56
24-07-2017Chq ...08 Banco 1... ...9075 411,79
17-10-2017Chq ...36 Banco 1... ...9075 320,28
Referiu ainda a [SCom01...] que a pessoa com quem eram efectuados os negócios era o Sr. «EE» com o nº de contacto móvel ...88, endereço de correio eletrónico ..........3@..... ou ..........5@......
Assim, concluímos que existindo fortes indícios de que as facturas de aquisições daqueles bens sejam fictícias ou inexistentes, permite-nos extrapolar a mesma conclusão para a transmissão dos mesmos bens.”
Conclusões sobre as aquisições à [SCom03...]
Em face do descrito concluiu-se que as facturas emitidas pela [SCom03...] para a [SCom01...], não titulam verdadeiras operações tributárias (operações fictícias), pelos factos já descritos.
(…)
II.3.2.2.2 – ANO DE 2018
Não foram detectadas quaisquer divergências relativas ao anexo O (clientes) relativas ao período de 2018. As divergências do anexo P de valor significativo detectadas são as seguintes:
ANEXO P
Atendendo que o DL 28/2019, de 15 de fevereiro, no seu artigo 36º, veio dispensar os sujeitos passivos com sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional, da obrigação de entrega do anexo O, da IES DA, apenas serão considerados divergentes os valores relativos aos fornecedores que não cumpriram até a data, com a entrega da IES/DA do ano de 2018.
NIFDenominaçãoValor Anexo P (do
Contribuinte)
Valor Anexo O (declarado por terceiros)Diferença
...99[SCom04...] SA 78 027,00 0,00 78 027,00
...33[SCom12...] SA 64 984,00 0,00 64 984,00
...75[SCom12...] SA 172 321,00 0,00 172 321,00

No ano de 2018 foi comunicado pela [SCom04...], uma factura de venda para a [SCom01...], relativos à venda de 18 000,00 quilos de fio conforme mapa abaixo:
Data Cont.DiaN DocFacturaValorIVATotalQuant. (kgs)
2018-02-28412025V/ Factura 0000963 436,8014 590,4678 027,2618 000,00
Relativamente à mesma factura não é conhecida a existência de qualquer fluxo físico documentado pelo respectivo documento de transporte, não tendo a alegada operação sido objecto de comunicação de qualquer guia de transporte, desconhecendo assim o eventual meio de transporte utilizado e os locais de carga e descarga.
Da contabilidade do sujeito passivo consta que a referida factura foi paga em data aproximada à data da factura, através da emissão de um chegue nominativo à ordem da [SCom04...], no montante de 78 027,26 EUR e depositado na conta com o NIB - ...37 titulada pela mesma [SCom04...]
Segundo a [SCom01...], a [SCom04...] era representada pelo comercial «GG», cujo contacto telefónico era o número ...57. Apesar de várias tentativas de contacto para o referido número de telefone, não foi possível no decurso da ação inspectiva contatar o mencionado «GG».
Caracterização e instalações do sujeito passivo – [SCom04...]
O sujeito passivo [SCom04...] SA tem a seu domicílio na Sala 69 do n.º 91 da Rua ..., em ... (prédio urbano n.º ...90, fração DP, da freguesia ... E ... -...27), localizada no quinto piso de um edifício de escritórios.
Em 2018-01-24, a referida sala 69, foi alienada pela sociedade [SCom04...] à sociedade [SCom13...] LDA — NIF ...97, encontrando-se actualmente alocada à sociedade [SCom14...] LDA — NIF ...06 (esta sociedade é sócia da [SCom13...] LDA).
De acordo com a empresa de condomínio - [SCom15...], Lda.), durante o ano de 2018, a mencionada sala 69 esteve afeta a sociedade [SCom13...] LDA, tendo esta empresa pago o valor do respectivo condomínio. Face à informação recolhida durante a ação inspectiva, desconhece-se a existência de qualquer instalação física onde a [SCom04...] pudesse concretizar as operações que foram declaradas em seu nome, designadas como o armazenamento de mercadorias.
(…)
A alteração de titularidade das ações da [SCom04...], verificada em 2017-11-06, não foi objecto de comunicação por parte dos anteriores acionistas nem do novo acionista, através da entrega da declaração modelo 4, prevista no artigo 139. ° do Código do IRS (CIRS).
Após a alteração de administração da sociedade, em 2018-01-18, foi alterado o objecto social da
[SCom04...] no sentido de permitir a importação, exportação e comercialização de fios têxteis, tecelagem, importação e exportação de óleos e azeite alimentar, importação e exportação de bens não especificados, para além da compra, venda e revenda de bens móveis e imóveis.
Até 2018-08-02 a sociedade [SCom04...] SA tinha um capital social de 50.000,00 EUR, tendo sido comunicada com referência a esta data, o aumento de capital de 200.000,00 em numerário, facto que não foi possível comprovar através da contabilidade da sociedade. De acordo com o portal da justiça — CITIUS, em 2019-06-06, a sociedade [SCom04...] SA foi declarada insolvente – processo de insolvência ...2/18...T8VNG.
Obrigações declarativas e de pagamento
Até ao ano de 2017, o sujeito passivo [SCom04...] cumpriu com regularidade com as suas obrigações fiscais declarativas e de pagamento. Relativamente ao ano de 2018, verifica-se o seguinte:
Procedeu 4 entrega da declaração periódicas de IVA do período 20148/03T;
Existem declarações oficiosas de IVA para os períodos de imposto de 2018/068T, 2018/09T e 2018/12T
Procedeu à entrega das Declarações Mensais de Remunerações (DMR) de janeiro a agosto de 2018, declarando mensalmente rendimentos de categoria A, apenas para o Administrador Único – «HH».
O sujeito passivo presenta dividas fiscais, designadamente as relativas às declarações oficiosas de IVA dos períodos de 2018/08T a 2018/12T.
Ação inspectiva efectuada à [SCom04...] SA, NIF ...98, no âmbito da ...86
Existem já extrapoladas conclusões quanto às operações existentes entre ambos os sujeitos passivos ([SCom04...] e [SCom01...]), as quais se encontram vertidas no Relatório de Inspecção Tributaria da Ordem de Serviço acima identificada, tendo os Serviços de Inspecção Tributária concluído, e passamos a citar:
“Como se verifica pela análise do quadro anterior, a [SCom04...] facturou à [SCom01...] fio de algodão, no montante global de 78.027,26 EUR (IVA incluído). Contudo, face à análise efectuada aos fornecedores declarados da [SCom04...], não é conhecida a aquisição do referido fio de algodão por parte da mesma [SCom04...].".
Conclusões sobre as aquisições à [SCom04...]
Em face do descrito concluiu-se que a facturas emitida pela [SCom04...] para a [SCom01...], não titulam verdadeiras operações tributárias (operações fictícias), pelos factos já descritos.
I1.3.2.3 — Controlo quantidades
Atendendo a que, nos anos de 2017 e 2018, foram registadas na contabilidade aquisições de fio suportadas em facturas emitidas por sujeitos passivos que não dispunham de estrutura empresarial que lhe permitissem efectuar as transmissões de bens constantes nas facturas por si emitidas ([SCom02...] Unipessoal, Lda - NIF ...85 e [SCom03...] Unipessoal, Lda — NIF ...512, para o ano de 2017, [SCom04...] SA — NIF ...99, para o ano de 2018), foi durante o procedimento inspectivo efectuado um controlo de quantidades, relativo as quantidades de fio/malhas, introduzidos no processo produtivo da empresa, isto é, na fase de confecção de artigos de vestuário. Pressupostos do procedimento do controlo de quantidades.
1. Na venda de fio não é considerada qualquer quebra, pois são vendidas exatamente as mesmas quantidades que são adquiridas;
2. Da transformação do fio em malha (parte da qual subcontratada em 2017), serviço de tricotagem, será considerada uma quebra de 3% (transformação de fio em malha em cru);
3. Da transformação da malha em cru em malha acabada (serviço de tinturaria, acabamento ramola, etc), será considerada uma quebra de 15% (transformação da malha em cru em malha acabada).
4. Não será considerado o serviço de tinturaria a metro, uma vez que, segundo informação da gerência, esse serviço é subcontratado após o acabamento da malha por parte da tinturaria (ponto anterior).
Assim, foram introduzidas no processo produtivo da empresa, as seguintes quantidades:
A – ANO DE 2017
(…)
Foram introduzidos no processo produtivo do sujeito passivo, 515.730,71 quilos.
No período em análise foram subcontratados serviços de tinturaria e acabamento de malha 480.287,54 quilos, encontrando-se uma divergência de quantidades de 35.443,17 quilos.
B – ANO DE 2018
(…)
Nota: não foram consideradas as vendas de malha acabada, nem os inventários finais de malha acabada. uma vez que a comercialização ocorre após o processo produtivo de tinturaria e acabamentos de malha.
Foram introduzidos no processo produtivo do sujeito passivo, 538.211,11 quilos.
No período em análise foram subcontratados serviços de tinturaria e acabamento de malha 551.788,44 quilos, encontrando-se uma divergência de quantidades de -13.577,33 quilos, isto é, entraram no processo produtivo quantidades superiores às determinadas no controlo de quantidades.
Isto ficar-se-á a dever a uma taxa de desperdícios ligeiramente inferior à da média do setor.
CONCLUSÕES
O controlo quantitativo apresenta divergências de valor pouco significativo atendendo às quantidades de fio introduzidas no processo produtivo.
Desse facto decorre, que embora existam registadas facturas de aquisições de inventários (fio) emitidas pelos sujeitos passivos [SCom02...], [SCom03...] e [SCom04...], que não titulam a verdadeira operação tributável, admite-se, contudo, que as aquisições de tais ativos seriam necessárias para o exercício da actividade declarada pela [SCom01...].
No entanto, decorre de ações inspectivas efectuadas por esta Direção de Finanças, aos sujeitos passivo, [SCom02...] (...98 e ...299), [SCom03...] (...257 e ...48) e [SCom16...], Lda, NIF ...10 (...95, ...96 e ...497), também este fornecedor a [SCom01...], o seguinte:
ELEMENTOS RECOLHIDOS
No âmbito da ação inspectiva titulada pelas Ordens de Serviço, ... ([SCom16...]), foram detectadas as seguintes facturas, emitidas para diversos sujeitos passivos espanhóis:
A - [SCom17...] SL, NIF ...02
Foram emitidas pela [SCom16...], para este sujeito passivo durante o mês de fevereiro de 2017, as seguintes quatro facturas, nas quais se encontrava aposto a seguinte menção “A [SCom01...] declara ter recebido a mercadoria constante nesta factura por conta da [SCom17...], S.L, destinando-se a executar encomendas do mesmo cliente.”
DataFat. n.ºQuant. kgDescrição mercadoriaP.U.Total
07-02-201783907.644Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,0523 314,20
07-02-201783917.644Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,0523 314,20
08-02-201783916.552Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,0519 983,60
13-02-2017842521.580Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,0565 819,00
43.420 132 431,00

Embora as facturas acima identificadas não se encontrem assinadas pela [SCom01...], as mercadorias constantes nas mesmas deram entrada na [SCom01...], conforme se poderá verificar pelas facturas emitidas em nome de [SCom02...] Unipessoal Lda, NIF ...85, que indiciam tratar-se das mercadorias incluídas nas facturas acima relacionadas:
DataDiaN.ºDescrição mercadoriaQuant.P.U.Valor
2017-02-07412.001 V/ Factura 00006 (*) 21.840 Fio 30/1 100% alg. pent. 2,70 58 968,00
2017-02-13412.013 V/ Factura 00008 21.580 Fio 30/1 100% alg. pent. 2,70 58 266,00
43.420 117 234,00
(*) a quantidade total da factura é igual à soma das quantidades das facturas 8385, 8390 e 8391, emitidas pela [SCom16...]
B — [SCom18...] SL, NIF ...43
Foram emitidas pela [SCom16...], para este sujeito passivo durante os meses de março e abril de 2017, as seguintes quatro facturas:
DataFat. N.ºQuant. kgDescrição mercadoriaP.U.Total
01-03-2017848421.840Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,0566 612,00
20-03--2017854721.840Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,9586 268,00
07-04-2017863721.528Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,2569 966,00
65.208 264 595,34

Deram entrada na [SCom01...], as mercadorias com as quantidades e descrições acima identificadas conforme se poderá verificar pelas facturas emitidas em nome de [SCom02...] Unipessoal Lda, NIF ...85 que indiciam tratar-se das mercadorias incluídas nas facturas acima relacionadas:
DataDiaN.ºDescriçãoQuant.DescriçãoP.U.Valor
2017-03-31413.001 1 2017/22 21.840 Fio 30/1 100% alg. pent. 3,1067 704,00
2017-03-31413.049 1 2017/34 21.840 Fio 30/1 100% alg. pent. 3,1066 898,00
2017-04-30414.007 1 2017/50 21.528 Fio 30/1 100% alg. pent. 3,371 042,40
65.208 205 644,40

C — [SCom19...] SL, NIF ES ...24
Foram emitidas pela [SCom16...], para este sujeito passivo durante os meses de abril a setembro de 2017, as seguintes quatro facturas:
DataFat. n.ºQuant. kgDescrição mercadoriaP.U.Total
19-04-2017867210.920 Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,25 35 490,00
19-04-2017867910.920 Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,25 35 490,00
18-05-201788238.400 Fio Ne 30/1 100% alg. 3,05 25 620,00
18-05-2017882512.600 Fio Ne 30/1 100% alg. 3,05 38 430,00
12-07-2017911010.920 Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,15 34 398,00
13-07-2017911410.920 Fio Ne 30/1 100% alg. pente 3,15 34 398,00
18-09-2017942910.206 Fio Ne 30/1 100% alg. pente 2,90 29 597,40
18-092017943310.206 Fio Ne 30/1 100% alg.
pente
2,90 29 597,40
85.092 263 020,80

Deram entrada na [SCom01...], as mercadorias de quantidades e descrições acima identificadas, conforme se poderá verificar pelas facturas emitidas em nome de [SCom03...] Unipessoal Lda, NIF ...912, que indiciam tratar-se das mercadorias incluídas nas facturas acima relacionadas:
DataDiaN.ºFat. n.ºQuant.DescriçãoP.U.Valor
2017-04-3041 4.028 2017/9 21.840 Fio NE 30/1 100% Algodão Pent. 3,30 72 072,00
2017-05-3141 5.028 2017/13 21.000 Fio 30/1 100% Algodão Pent. 3,30 69 300,00
2017-07-3141 7.044 2017/20 21.840 Fio 30/1 100% Algodão Pent. 3,30 72 072,00
2017-10-3141 10.00 8 2017/96 20.412 Fio 30/1 100% Algodão Pent. 3,00 61 236,00
85.092 274 680,00

Segundo elementos da contabilidade da [SCom01...], as facturas de aquisição emitidas em nome de [SCom02...] e da [SCom03...], foram transportadas com guias de remessa e/ou guias de transporte, e em nenhum dos casos foi efectuada a comunicação prévia do início de transporte de mercadorias, contrariando o disposto na a) do n.º 6 do artigo 5. ° do regime de bens em circulação.
Verifica-se ainda que, nos documentos de transporte emitidos em nome da [SCom02...]. Consta que as mercadorias foram transportadas no veículo com a matrícula ..-L2-... Da consulta a base de dados da AT, “consulta de matrículas”, verifica-se que aquela matrícula pertence a um veículo ligeiro de passageiros, da marca SEAT, modelo “1P", pertencente desde 2011 a um sujeito passivo individual residente em Mafra. Constata-se a impossibilidade de aqueles bens terem sido transportados naquele veículo. Refira-se ainda, que [SCom16...] forneceu comprovativos de CMR os transportes das mercadorias constantes nas facturas por si emitidas, que foram considerados fictícios.
Refira-se ainda relativamente a este ponto o seguinte:
Segundo consta no Relatório de Inspecção das Ordens de Serviço, ...........95/6/7. ao sujeito passivo [SCom16...], que os negócios efectuados com os seus clientes espanhóis acima identificados, foram efectuados por intermédio de «FF». «FF», como já referido é gerente da sociedade [SCom03...] (fornecedor já relacionado), como também é a única administradora no período de 2017, do sujeito passivo espanhol, [SCom19...] SL, conforme informação da Administração tributaria espanhola.
Estes indicadores permitem-nos concluir que, embora possa existir a operação económica de aquisição de fio por parte da [SCom01...] em 2017 e 2018, as mesmas encontram-se tituladas por facturas emitidas em nome da [SCom02...] e da [SCom03...] e em nome da [SCom04...] em 2018.
11. A descrição dos factos e dos fundamentos das correcções mencionadas em 3) encontra-se compreendida no capítulo III do Relatório de Inspecção Tributária, que se dá por integralmente reproduzido e do qual se extracta (cfr. páginas 20 e 21 do Relatório de Inspecção Tributária a fls. 129 a 156 do processo administrativo junto ao processo físico):
“III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável:
IVA – CORRECÇÕES EM SEDE DE IVA – DEDUÇÃO DE IVA DE OPERAÇÕES SIMULADAS
De acordo com as conclusões descritas nos pontos II.3.2.2.1.B., II.3.2.2.1.C e II.3.2.2.2.A, os sujeitos passivos. [SCom02...] Unipessoal Lda, NIF ...85, [SCom03...] Unipessoal Lda, NIF ...12, e [SCom04...] SA NIF ...98, respectivamente, não dispõem de estrutura adequada para efectuar as transmissões de bens e as prestações de serviços tituladas pelas facturas alegadamente emitidas. Concluindo-se assim pela existência de fortes indícios de que tais documentos, não correspondem a verdadeiras transmissões de bens e ou prestações de serviços, mas a operações simuladas.
Tendo ficado demonstrado que as facturas emitidas em nome dos fornecedores acima referidos, ao SP são falsas, dado que não correspondem a verdadeiras transmissões de bens, o imposto (IVA) nelas contido não é dedutível, pelos seguintes motivos:
a) A lei considera a situação tão grave que, em tais circunstâncias o imposto não é dedutível – artigo 19.º n.º 3 do Código do IVA - e o recetor da factura responde solidariamente pelo pagamento do IVA, ainda que prove ter entregue o seu montante ao emitente daquela – n.º 4 do artigo 79.º do referido Código.
b) Nas situações de facturação indevida de imposto, o imposto liquidado é devido nos termos do artigo 21.º, n.º1, c), da Diretiva de IVA 2006/112/CE – anterior 6º Diretiva (transposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 2.° do Código do IVA), não confere ao destinatário direito à dedução nos termos do artigo 17.° da Diretiva de IVA e, quando tenha efetivamente ocorrido perda de receitas fiscais, ou o risco de a mesma vir a ocorrer seja efetivo, não deve igualmente permitir-se a regularização desse imposto nos termos do artigo 20.º n.º 1 a), da Diretiva de IVA,
c) Resulta claramente que a Diretiva de IVA permite a introdução de regras que excluem o direito à dedução do imposto suportado, sempre que não se estabeleça uma relação direta entre o imposto suportado e a realização de operações tributadas a jusante, ou seja quando as aquisições efectuadas não se destinem à realização de uma actividade económica na aceção do artigo 4.° da Diretiva de IVA, quando o imposto não tenha subjacente a realização de uma qualquer operação tributável - porque não resulta de uma transmissão de bens ou prestação de serviços efectuada a titulo oneroso por um sujeito passivo agindo nessa qualidade -, e de um modo geral. sempre que o mesmo resulte de operações fraudulentas ou abusivas. Neste contexto, se inserem as disposições previstas no artigo 19.º n.º 3 do Código do IVA, “.... não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada”
d) Refira-se ainda que a 6.º Diretiva foi substituída pela Diretiva IVA, contudo, não houve qualquer alteração relativamente ao que aqui é referido.
Desta forma, neste caso, porque as operações foram simuladas, o SP não pode deduzir o imposto por força do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA.
O valor do IVA deduzido indevidamente pelo sujeito passivo é o seguinte:
Data Cont.DiaN DocFornecedorFacturaValorIVATotal
2017-02-28412.001[SCom02...]V/ Factura 0000658 968,0013 562,64 72 530,64
2017-02-28412.013[SCom02...]V/ Factura 0000858 266,0013 401,18 71 667,18
Total 2017/0226 963,82
2017-03-31413.001[SCom02...]V/ Factura 0002267 704,0015 571,92 83 275,92
2017-03-31413.037[SCom02...]V/ Factura 0003067 704,0015 571,92 83 275,92
2017-03-31413.049[SCom02...]V/ Factura 0003467 704,0015 571,92 83 275,92
Total 2017/0346 715,76
2017-04-30414.007[SCom02...]V/ Factura 0005071 042,4016 339,75 87 382,15
2017-04-30414.028[SCom03...]V/ Factura 0000972 072,0016 576,56 88 648,56
Total 2017/0432 916,31
2017-05-31415.017[SCom02...]V/ Factura 0007071 148,0016 364,04 87 512,04
2017-05-31415.028[SCom03...]V/ Factura 0001869 300,0015 939,00 85 239,00
Total 2017/0532 303,04
2017-06-30416.011[SCom03...]V/ Factura 0000176 010,2217 482,35 93 492,57
2017-06-30416.030[SCom03...]V/ Factura 0001669 300,0015 939,00 85 239,00
Total 2017/0633 421,35
2017-07-31417.044[SCom03...]V/ Factura 0002072 072,0016 576,56 88 648,56
2017-07-31417.052[SCom03...]V/ Factura 0002561 310,4014 101,39 75 411,79
2017-07-31417.003[SCom03...]V/ Factura 0001942 300,009 729,00 52 029,00
Total 2017/0740 406,95
2017-10-314110.00 8[SCom03...]V/ Factura 0009661 236,0014 084,28 75 320,28
Total 2017/1014 084,28
Total geral 2017226
811,51
2018-02-28412025[SCom04...]V/ Factura 0000963 436,8014 590,46 78 027,26
Total 2018/0214 590,46

12. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...39, com o documento n.º ...87, relativa a IVA do período de 02/2017, com uma correcção no valor de € 26.963,82, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 4 junto com a petição inicial, a fls. 88 do Sitaf).
13. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...41, com o documento n.º ...89, relativa a IVA do período de 03/2017, com uma correcção no valor de € 46.715,76, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 5 junto com a petição inicial, a fls. 89 do Sitaf).
14. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...43, com o documento n.º ...91, relativa a IVA do período de 04/2017, com uma correcção no valor de € 32.916,31, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 6 junto com a petição inicial, a fls. 90 do Sitaf).
15. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...45, com o documento n.º ...93, relativa a IVA do período de 05/2017, com uma correcção no valor de € 32.303,04, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 7 junto com a petição inicial, a fls. 91 do Sitaf).
16. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...048, com o documento n.º ...94, relativa a IVA do período de 06/2017, com uma correcção no valor de € 33.421,35, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 8 junto com a petição inicial, a fls. 92 do Sitaf).
17. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...51, com o documento n.º ...97, relativa a IVA do período de 07/2017, com uma correcção no valor de € 40.406,95, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 9 junto com a petição inicial, a fls. 93 do Sitaf).
18. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...53, com o documento n.º ...01, relativa a IVA do período de 10/2017, com uma correcção no valor de € 14.084,28, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 10 junto com a petição inicial, a fls. 94 do Sitaf).
19. Em 13/12/2019, com base nas correcções propostas no Relatório de Inspecção Tributária mencionado em 3), foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ...58, com o documento n.º ...06, relativa a IVA do período de 02/2018, com uma correcção no valor de € 14.590,46, da qual resultou apenas uma redução do valor de imposto a reembolsar (cfr. Doc. 11 junto com a petição inicial, a fls. 95 do Sitaf).
20. Em 18/03/2020, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra as liquidações adicionais de IVA mencionadas nos pontos 7) a 14), cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. fls. 173 do processo administrativo junto ao processo físico).
*
Na sentença recorrida considerou-se, igualmente, que:
«Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão a proferir.»
*
Na decisão recorrida, a título de motivação, exarou-se que:
«Os factos acima foram dados como provados com base no teor dos documentos juntos aos autos, em particular o relatório de inspecção, tal como indicado acima, por referência a cada concreto ponto de facto, devidamente concatenados com a prova testemunhal produzida.
Foram prestadas declarações de parte pelo gerente da sociedade Impugnante, «AA», que disse ser gerente de facto desde 2016 e gerente de direito desde 2017.
As suas declarações versaram sobre a actividade desenvolvida pela sociedade, a forma como normalmente ocorre a aquisição das matérias-primas para o processo produtivo e, em particular, a forma como foram concretizados os negócios com os fornecedores cuja veracidade das facturas é colocada em questão nos presentes autos. Das declarações prestadas ressaltou que a principal actividade desenvolvida pela Impugnante é a confecção de artigos de vestuário em malhas circulares. Afirmou que a empresa compra fio para produzir a malha e que compram de forma a garantir que têm possibilidade de executar encomendas para os clientes, mesmo que haja falhas no mercado, nomeadamente para poderem responder às solicitações do seu principal cliente, o Grupo «...W...». Afirmou que a venda ou revenda do fio não é “core business” da empresa. Aludiu ainda ao facto de ser abordado constantemente por parte de fornecedores de fio, referindo que é normal e frequente que sejam os próprios fornecedores a contactar os clientes para a venda desta matéria-prima. Nessa senda, disse ter sido abordado pela [SCom02...] Unipessoal Lda., pela [SCom03...] Unipessoal Lda. e pela [SCom04...] S.A. para a aquisição de fio, tendo-se referido, em concreto, às pessoas que o contactaram para esse efeito. Salientou ainda que sempre que a empresa tem um novo fornecedor verificam o enquadramento em sede de IVA.
Com efeito, as declarações prestadas permitiram esclarecer o tipo de actividade desenvolvida pela Impugnante (isto é, a produção de artigos de vestuário) e assim deixar esclarecida a necessidade das aquisições de fio por parte da Impugnante para o seu processo produtivo. Nessa medida, as declarações prestadas foram valoradas para a factualidade provada nos pontos 2) e 3) e permitiram ainda corroborar os factos referidos em 4), 5) e 6) da matéria dada como provada.
A testemunha «BB» é administrativa e exerce funções desde 2014, no Grupo “«...Y..»”, onde se integra a sociedade Impugnante. Esclareceu que presta funções para todas as empresas do Grupo e que nas suas tarefas se inclui, entre outras, a conferência de facturas. Prestou depoimento de forma segura, com conhecimento de causa, atendendo às funções que desempenha, merecendo, por isso, credibilidade.
Referiu-se à actividade desenvolvida pela Impugnante, afirmando que esta se dedica à confecção de vestuário em série, desde a concepção da amostra até à entrega ao cliente. Afirmou ainda que todas as matérias-primas são adquiridas pela empresa e que passam por si as várias facturas de compra de fio que a Impugnante realiza. O seu depoimento versou ainda, e sobretudo, sobre os procedimentos adoptados pela empresa no que concerne à verificação dos dados de novos fornecedores e ao pagamento de facturas a fornecedores. Afirmou que a referida verificação passa por consultar o portal da Autoridade Tributária, confirmar a identidade do fornecedor e o enquadramento em sede de IVA e anexar essa informação à factura em questão. Confirmou ainda que essa verificação foi feita quanto aos três fornecedores em causa, além de ter sido também verificado se os fornecedores fizeram a comunicação no portal “e-factura”.
O depoimento prestado permitiu igualmente esclarecer a actividade desenvolvida pela Impugnante e mostrou-se, aliás, em consonância com as declarações de parte prestadas. Nestes termos, foi igualmente valorado para a factualidade provada nos pontos 2) e 3). Da mesma forma, o depoimento prestado permitiu ainda corroborar os factos referidos em 4), 5) e 6) da matéria dada como provada, atinentes à verificação da informação do cadastro dos três fornecedores em causa nos presentes autos.
Por seu turno, «II» é gestor da sociedade “[SCom20...]”, empresa dedicada ao agenciamento no âmbito do comércio de têxteis, e conhece a Impugnante em virtude das relações profissionais com ela estabelecidas, por ser sua cliente. Referiu que a “[SCom20...]” tem uma relação comercial com a “[SCom05...]”, empresa alemã que vende fio no mercado português, nomeadamente para a Impugnante, fazendo o seu agenciamento. No seu depoimento afirmou ainda conhecer a [SCom02...], recordando-se de ter feito negócio entre ela e a sua representada, a “[SCom05...]”.
O depoimento prestado mostrou-se claro e credível e permitiu contextualizar a questão do fornecimento de matéria-prima (fio), a abordagem dos fornecedores às empresas de confecção de vestuário e a forma como aquele fornecimento pode ocorrer. Considerando as relações comerciais/profissionais estabelecidas entre a testemunha e a Impugnante, o depoimento prestado foi assim valorado para a factualidade dada como provada no ponto 3).»

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III – Questões a decidir.

No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, nomeadamente no que concerne aos erros de julgamento de facto e direito invocados.

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IV – Da apreciação do presente recurso.
Constitui objeto dos presentes recursos a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em sede de processo de impugnação, pela qual se concedeu integral provimento ao pedido anulatório formulado pela Recorrida, direcionado contra as liquidações de IVA relativas aos períodos de 02/2017, 03/2017, 04/2017, 05/2017, 06/2017, 07/2017, 10/2017, e 02/2018, assim como contra a correspetiva decisão de indeferimento da reclamação graciosa
As liquidações supra referidas tiveram por suporte uma ação inspetiva promovida pelos serviços da AT, relativamente aos períodos apontados, em cujas conclusões se determinou a aplicação de correções meramente aritméticas da matéria coletável, em sede de IVA, assente em faturas que os serviços da AT tiveram por falsas, por alegadamente não corresponderem a operações económicas que tenham tido efetivamente lugar.
Passemos, então, a analisar as questões suscitadas no presente recurso.
IV.1 – Dos erros de julgamento relativos à matéria de facto.
Para o apontado efeito, a Recorrente alega que deveria ser aditado à matéria de facto que:
“As faturas emitidas pela [SCom02...] para a [SCom01...], são anteriores às faturas de aquisição da [SCom02...] à sua fornecedora, a empresa alemã, “[SCom05...] GmbH”. (vide conclusão «I» da presente apelação).
Porém, ao invés do que vai invocado pela Recorrente, tal factualidade deve ter-se aqui por provada, na medida em que resulta expressamente do relatório inspetivo aqui em causa, cujo conteúdo sequer foi posto em causa. Efetivamente, no apontado relatório, aqui parcialmente transcrito, pode-se ler que: “Verifica-se, contudo, que a totalidade das facturas emitidas para a [SCom01...] são anteriores às facturas de aquisição de fio acima identificadas”, sendo que esta afirmação feita no citado relatório tem por referência as faturas emitidas pela «[SCom02...]» (cf. número «10» da factualidade tida por assente).
Por isso, seria redundante o pretendido acrescento factual agora sugerido pela Recorrente e, assim sendo, não se justifica o respetivo aditamento, inexistindo, assim, a invocada insuficiência da fundamentação de facto.
Acresce, assim, que não se vislumbra a existência de um erro na apreciação e seleção da matéria de facto relevante para a decisão, nem que existem dados factuais oportunamente e em sede própria devidamente alegados, que tivessem sido eventualmente omitidos e que importassem a boa decisão da causa. Aliás, neste ponto, a Recorrente apenas faz alusão à sobredita factualidade que supra enunciamos e que temos por não olvidada na sentença recorrida. Por outro lado, a decisão jurisdicional ora sob escrutínio encontra-se devidamente fundamentada quanto à factualidade provada e não provada, tendo sido feita a devida ponderação das provas apresentadas.
Assim sendo, quanto a estes itens, terá de improceder o presente recurso.
IV.2 – Das demais questões suscitadas no presente recurso.
Na presente apelação, a questão fulcral reside no erro de julgamento que a Apelante invoca no que diz respeito à decidida inexistência de indícios fortes, sérios e consistentes relativamente à faturação tida por falsa pelos serviços de inspeção tributária relativamente às liquidações de IVA aqui em causa.
A este propósito, na sentença recorrida elaborou-se nomeadamente o seguinte raciocínio:
“[…]
Aqui chegados, importará agora aferir se, no caso vertente, a Autoridade Tributária cumpriu o ónus da prova que lhe incumbia, isto é, se recolheu os indícios suficientes e capazes de abalar a presunção de veracidade das operações tituladas pelas facturas em questão. Conforme já mencionado, só depois de feita essa prova é que passa a recair sobre o sujeito passivo (a Impugnante) o ónus da prova quanto à veracidade ou efetiva realização das operações.
Do relatório de inspecção tributária que esteve na base das liquidações adicionais impugnadas consta, desde logo, que a ação de inspecção desencadeada decorreu das ações de inspecção realizadas a duas fornecedoras da Impugnante, a sociedade [SCom02...] Unipessoal Lda. e a [SCom03...] Unipessoal Lda. (cfr. ponto 9) do probatório).
Resulta também da factualidade provada (cfr. ponto 10) do probatório), que no capítulo II.3 do mesmo relatório de inspecção, e sob a epígrafe “Análise global da empresa”, a Autoridade Tributária procedeu ao enquadramento da Impugnante em sede de IVA e IRC (II.3.2 – Enquadramento do sujeito passivo), aludiu ao cumprimento das obrigações declarativas e de pagamento da Impugnante (II.3.2 – Obrigações declarativas e de pagamento), referiu-se às divergências nos anexos O e P (II.3.2.2 – Divergências anexo O e P) e realizou ainda um controlo de quantidades do fio introduzido no processo produtivo da empresa (II.3.2.3 – Controlo quantidades).
No que respeita às obrigações declarativas e de pagamento, conclui-se no mencionado relatório de inspecção que a Impugnante (i) entregou todas as declarações periódicas de IVA e correspondentes anexos recapitulativos, (ii) entregou as declarações mensais de remunerações e correspondentes Modelo 10, (ii) comunicou as facturas no portal “e-factura” e (iv) entregou a declaração Modelo 22 e IES referentes ao período de 2017. Além disso, encontra-se expresso naquele capítulo do relatório que não foram detectadas quaisquer dívidas à Autoridade Tributária até 29/05/2019.
Ainda a propósito das obrigações declarativas, a Autoridade Tributária referiu, em relação aos anos de 2017 e 2018, que não foram detectadas quaisquer divergências relativas ao anexo O (clientes). Por outro lado, referiu que foram detectadas divergências quanto ao anexo P (fornecedores). Em relação a 2017, referiu que a Impugnante declarou no referido anexo P os montantes de € 568.919,77 e de € 644.028,00, referentes à [SCom02...] Unipessoal Lda e [SCom03...] Unipessoal Lda, respectivamente, mas que tais entidades nada declararam nos seus respectivos anexos O, referindo, contudo, que as correspondentes facturas foram comunicadas por aquelas entidades à Autoridade Tributária. O mesmo sucede em relação a 2018, pois o relatório de inspecção refere que a Impugnante declarou no anexo P o montante de € 78.027,00, referente à [SCom04...] S.A., mas aquela entidade não incluiu o referido montante no seu anexo O, embora tenha comunicado a factura à Autoridade Tributária.
No restante, o capítulo atinente às divergências nos anexos O e P mais não faz do que verter no relatório de inspecção em questão os elementos relativos aos três fornecedores em causa e as conclusões que resultaram das ações de inspecção realizadas em relação a cada um deles.
Com efeito, em relação à [SCom02...] Unipessoal Lda., o relatório de inspecção em causa alude (i) às facturas emitidas por esta entidade à Impugnante e que foram comunicadas à Autoridade Tributária, no valor total de € 568.919,77; (ii) aos correspondentes documentos de transporte e respectivas incongruências detectadas (nomeadamente, o facto de não terem sido comunicados previamente à Autoridade Tributária e de a matrícula que consta desses documentos respeitar a uma viatura ligeira de passageiros, o que demonstra a impossibilidade de os bens terem sido transportados naquele veículo); (iii) à caracterização da entidade (capital social, gerência, objecto social, data da declaração de insolvência, entre outros); (iv) às obrigações declarativas daquela entidade; (v) às instalações/local de exercício de actividade; e (vi) às conclusões obtidas na acção inspectiva levada a cabo àquela entidade. Quanto a este último aspecto, refere-se que existiu somente um fornecedor intracomunitário de fio, a sociedade alemã “[SCom05...] GmbH”, que existem apenas “dois eventuais fornecimentos de fio” por parte daquela entidade, ocorridos em 8 e 9 de Junho de 2017, e que as facturas emitidas à Impugnante são anteriores a essas datas. Neste sentido, a Autoridade Tributária conclui pela “inexistência material da operação”, pois a [SCom02...] Unipessoal Lda não dispunha da posse daqueles bens, pelo que as facturas emitidas por esta entidade à Impugnante não titulam verdadeiras operações.
Relativamente à [SCom03...] Unipessoal, Lda, e de igual forma, o relatório de inspecção refere-se (i) às facturas emitidas por esta entidade à Impugnante e que foram comunicadas à Autoridade Tributária, no valor total de € 644.028,76; (ii) aos correspondentes documentos de transporte e respectivas falhas detectadas (nomeadamente, o facto de não terem sido comunicados à Autoridade Tributária); (iii) à caracterização da entidade (capital social, gerência, objecto social, entre outros); (iv) às obrigações declarativas daquela entidade; (v) às instalações/local de exercício de actividade; e (vi) às conclusões obtidas na acção inspectiva levada a cabo àquela entidade. No que concerne a este último ponto, a Autoridade Tributária refere que apenas existe registada uma factura de aquisição de fio, emitida por uma entidade designada “[SCom06...]” em 18/04/2018, que é coincidente com uma das facturas emitidas pela [SCom03...] Unipessoal Lda à Impugnante e que tal aquisição de fio apresenta uma margem de comercialização reduzida. Além disso, refere-se que não foram detectadas quaisquer outras aquisições de fio por parte da [SCom03...] Unipessoal Lda. e conclui-se que as facturas de venda emitidas por esta entidade não podem corresponder a operações efectivamente realizadas e que a inexistência económica da operação entre a [SCom03...] Unipessoal Lda e a “[SCom06...]” implica que a operação subsequente, entre a [SCom03...] Unipessoal Lda e a Impugnante, também seja inexistente.
Em relação à [SCom04...] S.A., o relatório de inspecção ora em causa refere-se (i) à factura emitida por esta entidade à Impugnante e que foi comunicada à Autoridade Tributária, no valor total de € 78.027,26; (ii) à inexistência de qualquer guia de transporte que documente o fluxo físico dos bens; (iii) à inexistência de qualquer instalação física onde a entidade pudesse concretizar as suas operações; (iv) às alterações societárias verificadas naquela entidade; (v) às obrigações declarativas da entidade; e (vi) às conclusões obtidas na acção inspectiva levada a cabo àquela entidade, que se restringem à consideração de que não é conhecida a aquisição de fio por parte da [SCom04...] S.A., pelo que a Autoridade Tributária concluiu que a factura emitida à Impugnante não titula uma verdadeira operação.
Do capítulo II.3 do relatório de inspecção em causa consta ainda que foi realizada uma análise de controlo de quantidades (cfr. II.3.2.3 – Controlo quantidades) relativamente ao fio/malhas introduzidos no processo produtivo da sociedade Impugnante. A este respeito, acabou a Autoridade Tributária por concluir que o controlo efectuado apresentou divergências pouco significativas considerando as quantidades de fio introduzidas no processo produtivo, acrescentando inclusivamente que “(…) embora registadas facturas de aquisições de inventários (fio) emitidas pelos sujeitos passivos [SCom02...], [SCom03...] e [SCom04...], que não titulam a verdadeira operação tributável, admite-se, contudo, que as aquisições de tais ativos seriam necessárias para o exercício da actividade declarada pela [SCom01...]”.
No final do referido capítulo do relatório de inspecção e na sequência da análise às quantidades introduzidas no processo produtivo, a Autoridade Tributária alude ainda aos elementos recolhidos durante a acção de inspecção desencadeada à sociedade [SCom16...], Lda., referindo-se à emissão de facturas por parte desta entidade a diversos sujeitos passivos espanhóis e relacionando-as com as facturas emitidas pelos fornecedores da Impugnante, a [SCom02...] Unipessoal Lda e a [SCom03...] Unipessoal Lda. Em relação a uma dessas entidades espanholas (“[SCom17...] SL”) é referido que a [SCom16...], Lda terá emitido quatro facturas em que apôs a menção “A [SCom01...] declara ter recebido a mercadoria constante nesta factura por conta da [SCom17...], S.L”, ressalvando-se, todavia, que tais facturas não se encontram assinadas pela Impugnante. Refere-se ainda que as mercadorias constantes de tais facturas “deram entrada na [SCom01...]” pois as facturas emitidas pela [SCom02...] Unipessoal Lda à Impugnante indiciam tratar-se das mesmas mercadorias. Esta mesma consideração é feita quanto às facturas emitidas pela [SCom16...], Lda. aos outros sujeitos passivos espanhóis referenciados (“[SCom18...] SL” e “[SCom19...] SL”), referindo-se igualmente que as mercadorias “deram entrada na [SCom01...]”, pois as facturas emitidas pela [SCom02...] Unipessoal Lda e pela [SCom03...] Unipessoal Lda indiciam tratar-se das mesmas mercadorias. Quanto à sociedade [SCom16...], Lda é ainda referido que os documentos de transporte fornecidos “foram considerados fictícios”, não se encontrando vertidos no relatório de inspecção, no entanto, os motivos para tal consideração.
Ainda relativamente ao mesmo ponto, a Autoridade Tributária faz também referência ao facto de os negócios com os aludidos sujeitos passivos espanhóis terem sido realizados por intermédio de pessoa que é, simultaneamente, gerente da sociedade [SCom03...] Unipessoal Lda. e única administradora de uma das sociedades espanholas em questão, a “[SCom19...] SL”.
Contudo, e nessa sequência, a Autoridade Tributária não conclui pela inexistência das operações económicas (aquisições de fio) por parte da Impugnante, referindo apenas que o que se verifica é que as mesmas se encontram tituladas por facturas emitidas pela [SCom02...] Unipessoal Lda e pela [SCom03...] Unipessoal Lda, nos seguintes termos: “Estes indicadores permitem-nos concluir que, embora possa existir a operação económica de aquisição de fio por parte da [SCom01...] em 2017 e 2018, as mesmas encontram-se tituladas por facturas emitidas em nome da [SCom02...] e da [SCom03...] e em nome da [SCom04...] em 2018”.
Resulta ainda da factualidade provada (cfr. ponto 11 do probatório) que as correcções realizadas pela Autoridade Tributária decorreram das conclusões obtidas relativamente aos três fornecedores em questão nos presentes autos, ou seja, a [SCom02...] Unipessoal Lda, a [SCom03...] Unipessoal Lda e a [SCom04...], S.A. Na verdade, a Autoridade Tributária entende que tais entidades não dispõem de estrutura adequada para a concretização das operações e, assim, existem indícios de que os documentos não correspondem a verdadeiras transmissões de bens, mas a operações simuladas, pelo que o IVA constante das facturas em causa não é dedutível.
Em suma, constata-se que a Autoridade Tributária realizou as correcções em causa (entendendo que o IVA incluído nas facturas dos três fornecedores da Impugnante em questão foi indevidamente deduzido) suportada nas conclusões alcançadas nas ações de inspecção levadas a cabo relativamente às entidades que emitiram as facturas em causa à Impugnante. O mesmo é dizer que assentou a sua fundamentação nos elementos/indícios recolhidos junto das entidades emitentes das facturas.
Todavia, e tal como previamente referido, estes indícios recolhidos junto de terceiros, ainda que admissíveis, não são suficientes para a prova que a Autoridade Tributária tem de realizar no caso concreto. Com efeito, a Autoridade Tributária teria de obter indícios junto da Impugnante que, conjugados com os indícios obtidos junto de terceiros e à luz das regras da experiência comum, traduzissem a elevada probabilidade de que as facturas em causa não correspondem a verdadeiras operações realizadas.
Ora, no que respeita à Impugnante, os únicos elementos que a Autoridade Tributária recolheu junto dela limitam-se à referência às obrigações declarativas cumpridas pela Impugnante nos anos em questão e às divergências verificadas no Anexo P, e à análise ao controlo de quantidades realizados no decurso da ação de inspecção (cfr. ponto 10 do probatório). No que se refere às divergências no anexo P, sempre se diga que essa divergência ocorre porque os fornecedores da Impugnante ([SCom02...] Unipessoal Lda., [SCom03...] Unipessoal, Lda. e [SCom04...] S.A.) não declararam qualquer valor nos respectivos anexos O (clientes). Ora, não indagando aqui da veracidade ou não das operações, o que é certo é que a Impugnante, ao declarar no seu anexo P os valores atinentes às facturas em causa, foi coerente com os elementos documentais que tinha e não incorreu em qualquer omissão declarativa. Além do mais, embora os fornecedores da Impugnante não tenham incluído os valores no correspondente anexo O, comunicaram, todavia, as facturas em causa à Autoridade Tributária, tal como se encontra vertido no próprio relatório de inspecção tributária. Quanto ao controlo de quantidades realizado, e como já mencionado, a Autoridade Tributária acabou por concluir que as divergências verificadas são de valor pouco significativo e que as quantidades de fio introduzidas no processo produtivo se revelaram necessárias ao exercício da actividade da Impugnante. Portanto, não resultou desta análise qualquer elemento anómalo que levasse a concluir, por exemplo, pela desnecessidade de aquisição do fio, considerando a capacidade instalada e as vendas e prestações de serviços declaradas pela Impugnante.
Nestes termos, o que resulta claro do relatório de inspecção em causa é que a Autoridade Tributária levou a cabo ações de inspecção aos emitentes das facturas – a [SCom02...] Unipessoal Lda., a [SCom03...] Unipessoal Lda. e a [SCom04...] S.A. – em que concluiu que estas entidades não dispunham de estrutura adequada para realizar as transmissões de bens tituladas pelas facturas em questão, e extrapolou tais conclusões para a ação inspectiva que levou a cabo à Impugnante, concluindo assim pela existência de fortes indícios de que tais documentos não correspondem a verdadeiras transmissões de bens mas a operações simuladas.
Em relação à Impugnante, a ação de inspecção que lhe foi movida e que deu origem ao relatório de inspecção ora em crise apenas resultou na conclusão das divergências nos valores declarados no anexo P nos anos de 2017 e 2018, nos termos referidos, e na análise das quantidades de fio introduzidas no processo produtivo da sociedade, tendo a Autoridade
Tributária admitido que as quantidades introduzidas se revelaram necessárias à sua actividade. Nesta medida, os elementos recolhidos pela Autoridade Tributária relativamente à Impugnante, nos termos aludidos, não bastam, juntamente com os demais elementos coligidos quanto aos emitentes das facturas, para desconsiderar as operações e, assim, considerar indevidamente deduzido o IVA incluído nas facturas em questão.
Reitera-se que a Autoridade Tributária se limitou a sustentar as correcções efectuadas à Impugnante nas acções de inspecção que realizou aos seus fornecedores, pretendendo extrapolar as conclusões que alcançou nessas ações às facturas emitidas por aquelas entidades à Impugnante, sem que tenha logrado recolher indícios concretos e credíveis relacionados com esta. Tal como já referido, independentemente dos indícios recolhidos junto daquelas entidades, certo é que a Autoridade Tributária deveria confrontar tais conclusões com os indícios que recolhesse a partir das declarações ou dos elementos da contabilidade da Impugnante. Embora o relatório de inspecção não seja omisso quanto à actividade da Impugnante, dele não se extrai, contudo, qualquer elemento passível de constituir um indício sério e credível que permita abalar a veracidade das operações realizadas.
Assim sendo, conclui-se que a Autoridade Tributária não logrou cumprir com o ónus da prova que lhe competia, pois não demonstrou, relativamente à Impugnante e na sua esfera, a existência de indícios fundados – objectivos, sólidos e consistentes – de que as facturas em questão não titulam operações reais.
Acresce que a Autoridade Tributária nem sequer alegou que a Impugnante tinha conhecimento das irregularidades declarativas cometidas pelas entidades emitentes das facturas ou participava no esquema das entidades emitentes das facturas. A esse propósito, e diversamente, foi a própria Impugnante que alegou que consultou a situação fiscal dos fornecedores em causa previamente à emissão das facturas e que, aliás, provou que dessa consulta resultou a conclusão de que aquelas entidades tinham enquadramento em sede de IVA em vigor (cfr. pontos 4), 5) e 6) do probatório).
Conclui-se, assim, que a Autoridade Tributária não apurou indícios sólidos, consistentes e suficientes para demonstrar, com elevada probabilidade, que as operações tituladas pelas facturas em questão não correspondem a verdadeiras transmissões de bens efectuadas, nem sequer alegou que a Impugnante sabia ou deveria saber que, ao adquirir os bens em causa, participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA cometida pelos seus fornecedores ou por outro operador a montante na cadeia daqueles fornecimentos.
Não tendo a Autoridade Tributária cumprido com o ónus que lhe incumbia, nos termos mencionados, fica assim a Impugnante desonerada de fazer prova da realização efetiva das operações em causa.
Perante tudo quanto fica exposto, julga-se verificado o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, quanto à inexistência de indícios sérios que legitimem a Autoridade Tributária a considerar indevida a dedução do IVA em questão por parte da Impugnante e, consequentemente, a proceder à liquidação adicional de imposto.
Consequentemente, não poderão manter-se as liquidações adicionais de IVA impugnadas, realizadas com o fundamento da não dedutibilidade do IVA, nos termos do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA, devendo as mesmas ser anuladas.
Nestes termos, assiste razão à Impugnante, pelo que será de julgar procedente o seu pedido de anulação das liquidações adicionais de IVA impugnadas.
[…]”
A propósito desta questão, para melhor compreensão da mesma, fazemos aqui apelo ao que foi decidido nesta instância, no acórdão proferido no processo n.º 00714/18.9BEBRG, datado de 13.04.2023 (in www.dgsi.pt), de onde se retira que:
“[…]
2.2.1. O direito à dedução faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado, exercendo-se imediatamente em relação à totalidade do IVA que incidiu sobre as operações a montante [Vide, entre outros, Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 22 de dezembro de 2010, Dankowski, C-438/09, n.ºs 22 e 23].
Nesta acepção do princípio da neutralidade, o regime instituído pela Directiva Imposto sobre o Valor Acrescentado (DIVA) permite aos sujeitos passivos deduzir o IVA que tenha onerado as aquisições de bens e serviços destinados à atividade tributada. Cumpre ainda salientar que o TJUE se refere ao princípio da neutralidade do IVA ainda numa outra acepção, de acordo com a qual o sistema do IVA não deve interferir com as decisões económicas, nem com a formação dos preços ao longo do circuito económico.
Em suma, o mecanismo do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante retirando o efeito cumulativo e a tributação em cascata que caracterizavam sistemas anteriores de tributação do consumo.
Assim, o direito à dedução assenta no designado método da dedução do imposto, método do crédito de imposto, método subtrativo indireto ou ainda método das faturas.
O Código do IVA, na esteira do previsto na DIVA, determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos.
No que ora nos importa, cumpre uma chamada de atenção para a jurisprudência emanada pelo TJUE, nomeadamente, entre outros, nos acórdãos de 21 de fevereiro de 2006, Halifax C-255/02, n.ºs 68 e 71; de 27 de outubro de 2011, Tanoarch, C-504/10, n.ºs 50; de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C-80/11 e C-142/11, n.º 41, e de 6 de dezembro de 2012, Bonik, C-285/11, n.ºs 35 e 36, nos quais se vem reiterando que a luta contra a fraude, a evasão fiscal e os eventuais abusos constitui um objetivo reconhecido e incentivado pela DIVA, não podendo os sujeitos passivos, fraudulenta ou abusivamente, aproveitar-se das normas do direito da União.
Incumbe, pois, às autoridades nacionais e aos tribunais dos Estados membros recusar o direito à dedução, se se demonstrar, face a elementos objectivos, que esse direito é invocado fraudulenta ou abusivamente [Cfr. acórdãos de 6 de junho de 2006 Kittel e Recolta Recycling, C-439/04 e 440/04 n.º 55, e acórdãos já referenciados Mahagében e Dávid, n.º 42; Bonik, n.º 37].
Em jeito de conclusão, temos que, pode recusar-se o direito à dedução que tenha sido exercido de forma fraudulenta ou quando o sujeito passivo sabia ou devia saber que participava numa fraude ao IVA (ainda que a operação em causa preencha os critérios objetivos em que se baseiam os conceitos de transmissões de bens efetuadas por um sujeito passivo agindo enquanto tal).
Neste particular, cumpre ter em atenção, a jurisprudência do TJUE presente nos acórdãos de 12 de janeiro de 2006, Optigen C-354/03, C-355/03 e C-484/03, n.ºs 52 e 55, e dos , já mencionados, Kittel e Recolta Recycling, n.ºs 45, 46 e 60, Mahagében e David, n.º 47, e Bonik, n.º 41, em que se afirma não ser compatível com o regime do direito à dedução, a recusa desse direito a um sujeito passivo que não sabia nem podia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou que outra operação incluída na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior à realizada pelo referido sujeito passivo, estava viciada por fraude ao IVA.
Em sede do direito interno, as disposições previstas no artigo 19.º n.ºs 3 e 4, do Código do IVA visam precisamente consagrar o impedimento do direito à dedução que resulte de operações fraudulentas. Imbuído do princípio de que só confere direito à dedução o IVA que tenha onerado aquisições de bens e serviços destinados ao exercício da atividade tributada realizada pelo sujeito passivo, por um lado, e consequentemente, por outro lado, de que não confere necessariamente direito à dedução, imposto que não se reporte a efectivas transmissões de bens ou prestações de serviços, determinando o n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA que “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente”. Este preceito legal, em face da sua formulação, aplica-se quer em situações de simulação absoluta em que constituem paradigma, no âmbito do IVA, as designadas “facturas falsas”, quer em situações de simulação relativa (quando existe a vontade de dissimular um outro negócio).
Esta premissa de que o direito à dedução pressupõe que o IVA tenha onerado efetivas prestações de serviços ou transmissões de bens é amplamente reconhecida pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores ao afirmar-se que “O direito de dedução do IVA pago a montante apenas poderá existir, segundo a própria natureza das coisas, relativamente a imposto efectivamente suportado em operações económicas efectivamente acontecidas. De contrário, estaríamos perante um simples arquétipo intelectual ou virtual e não perante um tributo que visa atingir de forma geral o consumo real de bens e serviços nos diversos estádios do circuito económico. A inadmissibilidade da dedução do imposto relativo a operação simulada ou em que seja simulado o preço, afirmada positivamente no n.º 3 do art.º 19º do CIVA, corresponde, deste modo, a uma conclusão forçosa ou decorrente da própria natureza do imposto, cuja explicitação formal apenas se justifica por questões de clareza” [acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), proc. n.º 026635, de 17.04.2002 (citado), bem como os recentes acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, entre outros, de 16.03.2016, processo n.º 587/15; de 16.11.2016, processo n.º 600/15; de 17.02.2016, processo n.º 591/15 e de 30.09.2020, processo n.º518/17.6BALSB].
E, no Despacho proferido pelo Tribunal de Justiça do TJUE, Menidzherski Biznes Reshenia, Processo C-572/11, de 4 de Julho de 2013, aí se afirmou que “[o]s artigos 168.°, alínea a), e 203.° da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, bem como os princípios da neutralidade fiscal e da protecção da confiança legítima, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que seja recusado ao destinatário de uma factura o direito a deduzir o imposto sobre o valor acrescentado mencionado nessa factura quando as operações a que esta última se refere não foram efectivamente realizadas, ainda que o risco de perda de receitas fiscais não exista por o emissor da referida factura ter pago o imposto sobre o valor acrescentado nesta indicado. Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efectuar, de acordo com as regras nacionais relativas à produção de prova, uma apreciação global de todos os elementos e de todas as circunstâncias de facto do litígio que lhe foi submetido para determinar se tal sucede com as operações a que as facturas em causa no processo principal dizem respeito.”. (sublinhados nossa autoria)
2.2.2. Tecidos estes considerando, atenhamos então às regras do ónus da prova vigente no nosso direito interno, fundamentais nas situações em que as facturas (ou documentos equivalentes) são emitidas na forma legal, mas que (no entender da AT) não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem não tiveram lugar, é sobre a AT que recai o ónus da prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação, ou seja, dos pressupostos legais da sua actuação, considerando o princípio da legalidade administrativa. Em contraposição, num segundo momento, é ao contribuinte que cabe provar a existência dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito, ou seja, a efectiva existência das alegadas transacções (cf. neste sentido entre outros acórdãos do STA de 30.04.2003, proc. n.º 0241/03 e de 24.04.02, proc. n.º 102/02).
Neste domínio como tem sido amplamente firmado por este Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), quando a AT desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção (cf. entre outros, acórdãos do TCAN de 24.01.2008, processo n.º 01834/04BEVIS, de 24.01.2008, processo n.º 2887/04BEVIS, de 27.01.2011, processo n.º 455/05.7BEPNF, de 18.03.2011, processo n.º 456/05BEPNF e de 11.04.2014, processo n.º 142/08.4BEBRG.)
É consabido, que o art. 75.º, n.º 1 da LGT estabelece uma presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes, bem como dos dados que constam da sua contabilidade e escrita: “[p]resumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”.
O que significa que AT não precisa de demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo (acórdão do STA de 27.10.2004, processo n.º 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, susceptível de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade, não se impondo a “prova provada” de que por detrás dos documentos, das facturas não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam.
Em suma, a AT não necessita de demonstrar a falsidade das facturas, basta-lhe evidenciar a consistência daquele juízo, invocando factos que traduzam uma probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade (art. 75.º da LGT).
Sobre a AT não recai o ónus de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratório, no intuito de enganar terceiros – cf. art. 240.º do CC) para lograr o ónus de prova que sobre si impende (cf. nesse sentido, entre outros, acórdãos do Pleno da secção do CT do STA de 16.11.2016 e proc. n.º 0600/15, de 19.10.2016, proc. n.º 511/15).
“(…) II - Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.
III - Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.” (parte do sumário do acórdão do Pleno da secção do CT do STA de 16.03.2016, proc. n.º 587/15).
Assim nesta esfera, em regra, se os indícios denunciam que com forte probabilidade os emitentes das facturas não tinham capacidade empresarial para vender a mercadoria mencionada nas facturas, tanto bastaria para se criar um juízo sério de que aquelas transacções não existiram, ou seja, que aqueles emitentes não venderam ao sujeito passivo aqueles materiais ou prestaram os serviços, logo, o sujeito passivo não os comprou ou os mesmos não foram prestados, traduzindo assim a factura uma simulação de transacção entre o emitente e o utilizador da factura.
Sendo que a AT está legitimada a recorrer à prova indirecta “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, de ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” (cfr. Alberto Xavier, in Conceito e Natureza do Acto Tributário, 1972, pág. 154). E, consequentemente, a lançar mão de elementos obtidos através de fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, a questão que se coloca é a de saber se se pode bastar com esses elementos (indícios externos), ou se necessariamente tem paralelamente de granjear alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) e, conjugados estes com aqueles outros, aferir que os mesmos conduzam à elevada probabilidade de que as facturas não correspondem a operações efectivas (facturas falsas ou fictícias).
2.2.3. Ora, in casu estamos perante uma situação em que a AT qualifica de facturas falsas, recorrendo ao mecanismo previsto no n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA, sobre tal matéria, pronunciou-se o acórdão de 14.06.2020, proferido no âmbito do processo 879/10.8BEAVR, deste TCAN, e com o qual concordando não se vê motivo para divergir, pelo que aqui se transcreve partes:
“É sabido que a circunstância de as operações se encontrarem documentadas em factura e recibo e terem sido devidamente inscritas na contabilidade faz presumir a existência da operação; mas, tal presunção deixa de se verificar, nomeadamente, quando a contabilidade ou escrita do contribuinte revelarem indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75º, nº 1 da Lei Geral Tributária). Portanto, se a administração tributária recolher indícios fundados de que os documentos de suporte, apesar de formalmente correctos, não reflectem uma verdadeira transacção (seja relativamente aos sujeitos, objecto, datas, valores), cessa a presunção de veracidade das operações constantes de tais documentos.
Por outro lado, é jurisprudência pacífica, reiterada e uniforme, quando a liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais legitimadores da sua actuação constantes do artigo 82.º, n.º 1 do CIVA, ou seja, assentando o juízo da administração tributária na consideração de que as operações e o valor a que se referem as facturas em causa não correspondem à realidade, terá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas foram simuladas.
(...), cumpre averiguar se a administração tributária fez prova, como lhe competia, da existência de indícios sérios e objectivos, susceptíveis de permitir a conclusão de que as facturas contabilizadas pela Impugnante não correspondem a reais operações, e, nessa medida, pela indevida dedução do respectivo IVA.
(...), sendo suficiente a prova indirecta a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” (cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Coimbra, 1972, p. 154).
Os indícios são definidos por de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - citado por José Luís Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2 edição, p. 311.” (fim de transcrição)
[..]”
Na presente situação, como se afirma na sentença recorrida, os factos indiciantes apontados pela AT encontram-se apenas na esfera das entidades emitentes das faturas aqui tidas por falsas. Com efeito, no âmbito interno, ou seja, junto da ora Recorrida, não foram encontradas quaisquer incongruências relevantes, estando documentada fiscalmente as transações tidas por falsas, assim como os respetivos pagamentos. Também, no que concerne à matéria-prima fundamental (fio têxtil), consideram os serviços da AT que as quantidades potencialmente adquiridas e utilizadas, não divergiam substancialmente das existências encontradas junto da contribuinte, sendo que a tal torna frágil e duvidosa a conclusão de que a mesma não teria sido comprada às entidades emitentes, conjugada com a circunstância que o circuito de pagamentos estava demonstrado. Por isso, não podemos divergir da sentença recorrida quando nesta se consideraram insuficientes os indícios factuais apontados pela AT no sentido de não se terem efetivamente consumado os negócios subjacentes às faturas tidas por falsas. Assim sendo, se é que verdade que a AT se pode socorrer de elementos obtidos através de fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, porém, não se pode bastar com esses elementos (indícios externos), tem necessariamente de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as faturas não correspondem a operações efetivas (e, como tal, se tratam de faturas falsas ou fictícias).
Por outro lado, há que realçar que não caberia à Recorrida o ónus de demonstrar a realização das ditas operações tidas por falsas, ónus este que só existiria se, previamente, a AT tivesse concretamente demonstrado a existências de indícios fortes, sérios e credíveis da existência de faturação falsa.
Assim, como se refere, por exemplo, no sumário do acórdão do TCAS de 12.05.2022, proferido no processo n.º 521/11.0BELRA (in www.dgsi.pt):
I - No domínio da faturação falsa, compete à AT demonstrar que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas.
II - Não é exigível que a AT efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo esse ónus e ilidindo a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo consagrada no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, passa a competir a este o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.
III - Não sendo controvertido que foram emitidos cheques nominativos pela Recorrida à ordem dos visados fornecedores, materializado o correspondente pagamento, emitidas as respetivas notas de pagamento, cujos fluxos de saída se encontram registados nos correspondentes extratos bancários, então para legitimar a insusceptibilidade de dedução dos custos, a AT teria de ter ido mais longe, não sendo suficiente bastar-se em elementos (indícios externos), tendo, necessariamente, de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as faturas não correspondem a operações efetivas.
Há ainda que salientar que na sentença recorrida não se fez qualquer alusão no sentido de se considerar que caberia a AT o ónus da prova da simulação dos negócios subjacentes. Com efeito, na decisão jurisdicional aqui em causa, o que é dito é exatamente o oposto, tendo-se naquela o Tribunal recorrido se limitado a aferir da consistência dos indícios apresentados, ponderados no seu conjunto, decidindo-se pela insuficiência destes no âmbito interno, isto é, no que concerne à esfera da ora Recorrida.
Também se afirme que da sentença recorrida não emana qualquer juízo ou ilação quanto à consulta feita pela Recorrida através do portal da Autoridade Tributária, no que tange à informação do cadastro atinente às sociedades emitentes, sendo, por isso, inócua a invocação feita a este propósito pela Recorrente na presente apelação.
Por isso, concluiu-se que também terão de improceder as demais questões suscitadas pela Recorrente no presente recurso.
*
Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário:
I - No caso de faturas falsas, compete à AT fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação corretiva e, só caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto.
II - A AT pode lançar mão de elementos obtidos através de fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, porém, não se pode bastar com esses elementos (indícios externos), tem necessariamente de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as faturas não correspondem a operações efetivas (faturas falsas ou fictícias).

-/-

V – Dispositivo
Nestes termos, acordam em conferência os juízes desta subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente (por vencida).


Porto, 15 de maio de 2025

Carlos de Castro Fernandes
Maria da Conceição Pereira Soares
Irene Isabel das Neves