Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00644/10.2BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/17/2022
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Tiago Miranda
Descritores:ÚNICO GERENTE DE DIREITO E GERÊNCIA DE FACTO
Sumário:I – O artigo 37º nº 1 do CPPT provê ao suprimento de insuficiências na notificação – não da fundamentação – de um acto tributário.
II – Invocados, na sentença recorrida como factos indiciadores da gerência de facto, não só a realidade de o revertido ser o único gerente de direito, mas também outros factos concretos tidos como integrantes do exercício de gerência de facto, não se pode concluir que a sentença recorrida arcou a conclusão pela gerência de facto do revertido apenas na exclusividade da detenção da gerência de direito.
Recorrente:A..
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução Fiscal - Oposição - 1ª espécie - Recursos jurisdicionais [Desp. 11/2016]
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Foi emitido parecer no sentido da procedência parcial.
1
Decisão Texto Integral:I. Relatório
"A..", NIF 15...65, inconformado com sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente, excepto quanto às dívidas de coimas, a oposição por si intentada à execução fiscal nº 18...8167, por dívidas respeitantes a IVA, IRC, IRS e coimas dos anos de 2001 a 2006 no montante global de € 98 762,32 €, veio interpor o presente recurso de apelação.
Termina as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES
A) O objecto do presente recurso é a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, 11.07.2011, que julgou parcialmente procedente a Oposição ao Processo de Execução Fiscal n.° 18...8167, apresentada pelo aqui Recorrente.
B) Considera o Recorrente que deve a sentença recorrida ser revogada por padecer de erro de julgamento por errada interpretação do direito vigente, uma vez que é acolhida uma interpretação do art. 23.° e 24.° da LGT que é, actualmente, rejeitada.
C) Desde logo, a oposição à execução fiscal é o meio próprio para impugnar contenciosamente o despacho de reversão que padece de vício de falta ou insuficiência de fundamentação.
D) Considera o Recorrente que o despacho de reversão padece de vício de falta de fundamentação, não por ocorrer uma total ausência de fundamentação mas sim por esta ser insuficiente, não permitindo conhecer as razões, de facto e de direito, que o motivaram.
E) Neste âmbito, o disposto no art. 37.° do CPPT consagra uma mera faculdade, cuja inobservância não acarreta qualquer cominação legal.
F) Como tal, o Tribunal continuava obrigado a conhecer da existência do referido vício, pelo que, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, a omissão de recurso ao art. 37.° do CPPT não acarreta a sanação dos vícios formais do despacho de reversão.
G) Para além disso, é jurisprudência pacífica que não se pode, a partir do exercício da gerência de direito, presumir a gerência de facto.
H) Como tal, do facto de o Recorrente ser o único gerente de direito da devedora originária não decorre que esta não podia exercer a sua normal actividade sem actos de gestão efectiva daquele.
I) Ao fundar a sua decisão em semelhante entendimento incorre o Tribunal a quo em erro de julgamento por errada interpretação do direito vigente, o qual obriga a que seja feita prova efectiva da gerência de facto.
J) Não existindo na legislação tributária um conceito de gerente de facto, toma-se necessário, nos termos do art. 11.°, n.° 2 da LGT, recorrer ao disposto em outros ramos do direito, nomeadamente no direito comercial.
K) Neste âmbito, para estarmos perante um gerente de facto tem que existir o exercício efectivo de funções de gestão equivalentes às dos administradores de direito, a actuação com a autonomia que lhes é própria e ainda uma certa permanência e sistematicidade, a qual não se coaduna com a prática de meros actos esporádicos.
L) Como tal, e sendo as declarações de alteração de actividade, assim como os extractos de remunerações, meros actos isolados, estes não estão aptos a preencher o conceito de gerente de facto constante do art. 24.° da LGT.
M) Em face do exposto, entende o Recorrente que a sentença de que se recorre padece de erro de julgamento, quanto à interpretação dos normativos legais aplicáveis, devendo a mesma ser revogada.
Termos em que deve a sentença ser revogada, sendo substituída por uma decisão que julgue procedente a oposição à execução fiscal apresentada, com as demais consequências legais, assim se fazendo inteira e costumada justiça
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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Neste Tribunal, o Digno Magistrada do Ministério Público remeteu-se para o parecer do MP na 1ª instância no sentido da procedência parcial da oposição, nos termos em que viria ser decidido na sentença recorrida.
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Dispensados os vistos legais, importa apreciar e decidir.
II
Questões a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
Assim, as questões que cumpre apreciar são as seguintes:
1ª questão
Errou no julgamento de Direito, a sentença recorrida, violando o artigo 37º do CPPT por errada interpretação, quando julgou que o despacho de reversão não padecia de insuficiência de fundamentação e que, mesmo que sofresse de alguma falta de requisitos da fundamentação, isso achar-se-ia suprido por a Revertida não ter exigido a notificação dos requisitos em falta, nos termos do artigo 37º nº 1 do CPPT, pois esta norma consagra uma mera faculdade, sem a pretendida cominação?

2ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de direito, violando o artigo 24º nº 1 alª b) da LGT, ao fundar a improcedência da oposição no juízo de que da detenção pelo oponente, com exclusão de outrem, da gerência de direito resultava a sua gerência de facto, sem mais, já que se encontra consagrada a jurisprudência de que a gerência de direito não permite só por si presumir a de facto?
3ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de direito, violando o artigo 24º nº 1 alª b) da LGT, ao fundar a improcedência da oposição no juízo detenção, pelo oponente, da gerência de facto, apesar de se terem provado apenas actos esporádicos de gerência, os quais, porque esporádicos, não corresponde a um exercício da gerência de facto?
III
Apreciação do Recurso
Fundamentação
Para a discussão destas questões releva, antes de mais a decisão tomada na instância recorrida em matéria de facto, que foi a seguinte:
«A- Dos factos provados, com relevância para a decisão da causa:
1.° - Contra o ora Oponente corre termos no Serviço de Finanças de ..., o processo de execução fiscal n° 18...8167 e aps.
2º - Foi efectuada a citação pessoal do Executado, ora Oponente, no dia 15.12. 2009.
3.° - Estão em causa dívidas emergentes da retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento Singular das Pessoas Singulares e Colectivas, não entregues nos cofres do Estado e da aplicação de coimas fiscais, no âmbito dos respectivos processos de contra-ordenação, por falta de pagamento de liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado apurado nas declarações periódicas, relativas aos anos de 2001 a 2006 aplicadas à executada originária, a sociedade "B..., Ld.ª", e para cujo pagamento foi citado, por reversão, o ora Oponente, na sua qualidade de responsável subsidiário - cfr. cfr. does. de fls.24 a 56 dos autos.
4.° - Em sede de informações preparatórias da reversão fiscal (documentos números 33, a fls.59 da presente oposição, apresentada pelo Oponente, “(...) compulsado o sistema informático (...) verifica-se que os únicos bens penhoráveis são quatro veículos: veículo ligeiro de mercadorias, de marca M..., modelo ..., com a matrícula ..-.. - IJ de 07-011998; veículo ligeiro de mercadorias, de marca P...., modelo ..., com a matricula ..-.. -DQ de 05-05-1994; veículo ligeiro de passageiros, de marca O..., modelo ..., com a matrícula ..-.. -FO de 26-07-1995; veículo ligeiro de passageiros, de marca O..., com a matrícula ..-..-CI de 12-03-1984, foi feita a penhora no processo n.° 18...8167 e aps., a fim de se marcar a venda por negociação particular.
Foram vendidos os três primeiros veículos por negociação particular, pelo preço de 1.000,00 euros e o último veículo não foi vendido por se encontrar em estado de sucata; Por consulta à Certidão da Conservatória do Registo Comercial conclui-se que no período a que respeitam as dividas é gerente (...) António Carlos Oliveira Ferreira (...).
Verifica-se assim a inexistência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida e o acrescido, pelo que estão reunidos os pressupostos a que se refere o n.° 2 do artigo 23.° da Lei Geral Tributária e n.°2 al. a) do art.153º do Código de Procedimento e Processo Tributário (...) para reversão contra aquele gerente, na qualidade de responsável subsidiário, nos termos da alínea b) n.° 1 do artigo 24.° da I.GT (...)”.
5.° - Com os referidos fundamentos, o referido Serviço de Finanças desconsiderou, por infundada, a alegações de falta de demonstração de insuficiência de bens da Executada, para tramitação subsequente da demonstração de insuficiência de bens da Executada para a subsequente da reversão da execução fiscal contra o Oponente. (SIC)
6.° - Os períodos de tributação a que respeitam os impostos e coimas aplicadas, em processo de contra-ordenação, de que emerge a dívida exequenda remontam ao ano de 2006, durante o período de gerência efectiva do Oponente - certidões de dívida, que se juntam sob does. números 3 a 26, por parle do Oponente, a fls.de 29 a 57 dos autos.
7.° - Constante dos autos de Oposição, junta sob a designação de documento número um, verifique-se a fundamentação constante da citação (reversão) e das informações preparatórias do despacho de reversão (juntas sob a designação de documentos número 33, apresentada pelo Oponente, a fls 59 da presente Oposição e documento número catorze, da junção da FP) e do próprio despacho de reversão (junto sob a designação de documento número 32, apresentado pelo Oponente, a fls. 58 da presente Oposição), fundamentação esta que é posta em causa pelo Oponente:
Verifica-se que a executada “"B..., Ld.ª" NIPC 50...79, é devedora à Fazenda Pública nos presentes autos da quantia exequenda de 98,762,32 euros acrescido de juros e custas, por dívidas de IVA, IRC, retenção na fonte e coimas, por não terem sido pagas dentro do prazo de cobrança voluntária.
Consta da informação de preparação para a reversão que: “A executada iniciou a sua actividade em 50/03/1997, encontrando-se cessada em IVA, em 31/12/2008 e não se encontrado cessado em IRC;”
«(...) Compulsado o sistema informático (...) verifica-se que os únicos bens penhoráveis são quadro veículos: veículo ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., com a matrícula ..- ..-JJ de 07-011998; veículo ligeiro de mercadorias, de marca P...., modelo ..., com a matrícula ..-..-DQ de 05-05-1994; veículo ligeiro de passageiros, de marca O..., modelo ..., com a matricula ..-..-FO de 26-07-1995; veículo ligeiro de passageiros, de marca O..., com a matrícula ..-..-CJ de 12-03-1984, foi feita a penhora no processo n.° 18...8167 c aps.< a fim de se marcar a venda por negociação particular.
Foram vendidos os três primeiros veículos por negociação particular, pelo preço de 1.000,00 euros e o último veículo não foi vendido por se encontrar em estado de sucata;...””
8.° - A sociedade executada originária iniciou a sua actividade em 05.03.1997 e cessou-a a 31.12.2008.
9.° - O ora Oponente foi o único gerente da devedora originária.
10.° - Foi nomeado gerente da sociedade executada em 30 de Janeiro de 2003.
11° - O ora Oponente foi remunerado pelo cargo exercido na qualidade de MOE {membro dc órgão estatutário) entre Janeiro de 2004 e Dezembro de 2006.
12.°" Tem a sua assinatura aposta em duas declarações de actividade (Declaração de Alterações e de Cessação de Actividade da sociedade devedora originária).

B- Factos não provados com relevância para a decisão da causa:
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.»

Aditamento aos factos provados:
Nos termos do artigo 662º nº 1 do CPC ex vi 280º do CPPT, altera-se a decisão recorrida em matéria de facto aditando-lhe o seguinte facto provado:
13º - Em 11/8/2005 o Oponente, assinou, como representante legal da executada original, um requerimento em que solicitava o desbloqueamento da conta bancária da sociedade, bloqueada à ordem da AT, indicando outros bens à penhora, tudo conforme doc. 10 da Informação junta pela AT nos termos do artigo 208º nº 1 do CPPT (fs. 115 sitaf e 96 do suporte de papel).

Vista esta selecção de factos provados relevantes, apreciemos as questões cima enunciadas.

1ª questão:
Cumpre julgar se a Sentença recorrida errou no julgamento de Direito violando o artigo 37º do CPPT por errada interpretação, quando julgou que o despacho de reversão não padecia de insuficiência de fundamentação e que, mesmo que sofresse de alguma falta de requisitos da da fundamentação, isso achar-se-ia suprido por a Revertida não ter exigido a notificação dos requisitos em falta, nos termos do artigo 37º nº 1 do CPPT, pois esta norma consagra uma mera faculdade, sem a pretendida cominação.
No que pode relevar, em concreto, para a discussão desta questão, o teor da sentença foi o seguinte:
«(…)
“(…) A fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido peio autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.
Demonstrado no procedimento administrativo... que o destinatário do acto o conheceu e o compreendeu na sua integralidade...não ocorre o vício de falta efe fundamentação”.
O despacho de reversão está fundamentado na insuficiência de bens da executada originária, no exercício da gerência e na prova de culpa na insuficiência de bens da executada por o facto constitutivo ter ocorrido no período da gerência.
A administração tributária fundamentou de facto e de direito esse despacho de tal forma que se constata que o Oponente o conheceu e compreendeu perfeitamente.
Se aquela decisão não tivesse, eventualmente, os requisitos de fundamentação legalmente exigidos, podia o Oponente exigir a notificação dos requisitos que tivessem sido omitidos nos termos do arl.37°, n.º 1, do CPPT.
Como o não fez, a eventual irregularidade está sanada, sendo certo que, como se disse, não se verifica o vício de falta de fundamentação por ter ficado demonstrado que o Oponente conheceu e compreendeu o acto administrativo tributário de reversão da execução fiscal.»
É forçoso reconhecer que a Mª Juiz a qua labora numa errada interpretação do artigo 37º nº 1 do CPPT, não por o não exercício da faculdade aí reconhecida ao notificado não ter o efeito de sanar as omissões ocorridas, mas porque esta norma não trata do acto tributário insuficientemente fundamentado, mas da “notificação insuficiente” do acto tributário, para usarmos a expressão contida na epígrafe do artigo.
É obvio que uma insuficiência de requisito na fundamentação do acto tributário não pode ser suprida pela menção, a posteriori designadamente na notificação do que ao acto faltou.
Mas esse erro não bole só por si com a questão da bondade do decidido em matéria da alegação de insuficiência de fundamentação do acto administrativo da reversão, pois foi usado pela Mª Juiz a quo apenas a título subsidiário.
Com efeito, a título principal a Mª Juiz formulou expressamente o juízo de que a reversão estava plenamente fundamentada, de facto e direito, inclusive quanto à insuficiência de bens e quanto à prova da gerência de facto no período em que venceram as dívidas revertíveis, arrimando-se, inclusivamente, numa descrição do teor da informação prévia homologada ou invocada por remissão no despacho de reversão, que desce ao concreto dos bens existentes e do seu exíguo resultado da sua venda, pelo que não e pode sustentar, sequer, que sufragou um despacho de reversão assente em meras proposições conclusivas.
Como assim, embora a sentença tenha invocado erroneamente o artigo 37º a mesma não errou, por isso, quando consigna que o despacho de reversão não padece da insuficiência de fundamentação apontada pela Impugnante.

2ª Questão
Cumpre agora apreciar se a Mº Juiz a qua errou no julgamento de direito, violando a al. a) do artigo 24º da LGT, ao fundar a improcedência da oposição no juízo de que da detenção pelo oponente, com exclusão de outrem, da gerência de direito no período de constituição e termo do pagamento voluntário das dívidas revertidas resultava a sua gerência de facto, sem mais, nesse mesmo período, já que se encontra consagrada a jurisprudência de que a gerência de direito não permite só por si presumir a de facto?
Antes demais, há que notar que não encerra a mesma proposição dizer-se que a gerência de facto se conclui ou presume a partir da de direito; ou que a mesma se conclui da detenção exclusiva da de direito.
Logo depois, e de todo o modo, importa verificar, atento o teor da sentença recorrida, se em verdade a mesma se funda no juízo de que a conclusão pela gerência de facto do oponente no período de vencimento das dívidas resulta, sem mais, do facto de ele ser o único gerente de Direito.
Revisitando a discriminação doa factos provados, verificamos o seguinte:
O “facto provado” 6º inclui uma proposição conclusiva quando se refere à gerência de facto sem concretizar os factos e ou actos por que a mesma foi exercida. Porém, a função desse artigo, na economia da fundamentação da sentença, é apenas a de situar no tempo os impostos e as coimas em dívida pela devedora principal.
Os factos susceptíveis de relevarem para a conclusão pela gerência de facto encontram-se outrossim nos artigos 8º a 12º. Designadamente, provou-se que o oponente foi o único gerente da devedora originária, que foi nomeado em 30 de Janeiro de 2003 e foi remunerado por esse cargo entre Janeiro de 2004 e Dezembro de 2006 e que assinou duas declarações de actividade (alteração e cessação).
Escrutinado o segmento da sentença intitulado “Do Direito”, verificamos que a Mª Juiz a qua, a dada altura, diz o seguinte:
«“Não basta a mera gerência nominal ou de direito para responsabilizar o gerente, exigindo-se também a gerência efectiva ou de facto.
É à Fazenda Pública, como titular do direito de reversão da execução contra o responsável subsidiário, que cumpre fazer prova da gerência como pressuposto da obrigação de responsabilidade subsidiária.
A gerência de direito faz presumir a gerência de facto, mas, porque se trata de mera presunção judicial, admite-se a sua elisão por qualquer meio de prova bastando para o efeito a contraprova, não sendo exigível a prova do contrário (cfr. artigos 350° e 351° do CC)» (Ac. do TC AN de 27/7/2006).
Resulta do teor da certidão de matrícula da sociedade que, o Oponente era o único gerente da executada pelo que a mesma nunca podia exercer a sua actividade sem o exercício efectivo de funções de gerência.
O Oponente assinou a Declaração de início de actividade da executada e outras declarações de alterações.
O Oponente foi remunerado como gerente da executada no período compreendido entre 2003 e Dezembro de 2008.
O despacho de reversão fundamentou-se no facto de serem desconhecidos ou serem insuficientes bens penhoráveis do devedor principal, de ter sido exercida a gerência efectiva, de facto, da executada originária e de o gerente não ter provado que não lhe era imputável a falta de pagamento da dívida quando o prazo de pagamento ou entrega terminava no período de exercício do seu cargo.»
Pelo que, incumbia à administração tributária demonstrar que o Oponente tinha exercido a gerência efectiva da executada originária.
Esse exercício de funções de gerência dos administradores, directores e gerentes, ainda que somente de facto, tem vindo a ser entendido pela jurisprudência como uma «gerência efectiva, de facto, traduzida na prática de actos de administração ou disposição em nome e no interesse da sociedade» (Ac. do TCA de 25/5/2004, processo 00072/04)
Ocorre, assim, a invocação cumulativa, quer em matéria de facto quer em matéria de direito, tanto da exclusividade da gerência de direito, como dos comprovados actos concretos tidos por próprios dos poderes e das funções de um gerente da sociedade comercial, pelo que não se pode considerar que a sentença recorrida conclui o preenchimento do conceito de gerência de facto apenas a partir da exclusividade da de direito.
Tanto basta para ter de ser negativa a resposta a esta segunda questão.

3ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de direito, violando o artigo 24º alª b) da LGT, ao fundar a improcedência da oposição no juízo detenção, pelo oponente, da gerência de facto, apesar de se terem provado apenas actos esporádicos de gerência, os quais, porque esporádicos, não corresponde a um exercício da gerência de facto?
Antes de se discutir em abstracto se a prática meramente esporádica de actos de gerência corresponde a um exercício da gerência de facto para efeitos do artigo 24º da LGT – não vá ela revelar-se inútil – há que considerar os actos de gerência – e sua circunstância – que se provou e apreciar se os mesmos correspondem a essa prática esporádica em cujo pressuposto a questão labora.
É que, na verdade, a prova de alguns actos de gerência não implica logicamente a de que foram praticados só esses, pelo que a ilação do recorrente relativamente à esporadicidade é infundada.
Pelo contrário a prática – remunerada – de alguns determinados actos, atenta a sua importância na condução dos destinos da sociedade, em determinada circunstância, pode ser, mesmo, e é, in casu, um forte indício de se não tratar de actos esporádicos, mas de actos inseridos num contexto de gerência de facto.
In casu, os actos de gerência provados são os referidos nos artigos 11º a 13º. A circunstância específica – não forçosamente determinante só por si, mas ainda assim bem relevante – consiste no facto provado 9º: o oponente era o único gerente de direito.
Com efeito, na circunstância de ser o único gerente, o recebimento da correspondente remuneração, a apresentação de declarações de alteração e de cessação de actividade e a apresentação de requerimento de desbloqueamento da conta bancária da sociedade e de indicação de bens à penhora, são factos que, no seu conjunto, indiciam a efectiva condução dos destinos da empresa, pelo que a natureza esporádica dos mesmos de modo nenhum se pode ter por adquirida.
Como assim, a resposta a esta 3ª questão é também negativa.

Conclusão
Das respostas dadas às questões acima enunciadas resulta que, apesar de assistir parcial razão à recorrente no que respeita à uma errada invocação do artigo 37º do CPPT, nem por isso o recurso procede, sendo, portanto, de manter o dispositivo da sentença recorrida.

Decisão
Termos em que acordam, os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Norte, em negar provimento ao recurso e, em consequência, manter a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Porto, 17 de Novembro de 2022.
Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina Santos da Nova
Cristina Travassos Bento