Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00546/21.7BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/19/2023
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paulo Moura
Descritores:PRESUNÇÃO DE NOTIFICAÇÃO;
PRAZO DE RECURSO HIERÁRQUICO;
Sumário:I – A presunção de recebimento de notificação no terceiro dia útil após o registo do correio, estabelecida no n.º 1 do artigo 39.º do CPPT, pode ser ilidida pelo interessado, competindo-lhe alegar factos concretos no sentido de ocorrer justo impedimento ou causa de força maior.

II – O levantamento da notificação nos correios em data posterior à presumida, não vale como data da notificação efetiva, se o interessado não alegou qualquer facto impeditivo do funcionamento da presunção legal referida em I.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

«A...., Lda.», interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial, deduzida na sequência da rejeição de recurso hierárquico, por extemporâneo, alegando que o recurso hierárquico foi apresentado tempestivamente e que deve ser conhecido.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
1. A Impugnante não pode, de forma alguma, conformar-se com a decisão e motivação do tribunal recorrido, acima transcritas;
2. É inequívoco que a correspondência em causa foi recepcionada pelo mandatário em 28 de Dezembro de 2022, tal como resulta do ponto e) dos factos provados;
3. E que o aviso postal foi deixado no seu escritório em 16 de Dezembro, pelas 8h01.
4. Na hora em que foi deixado o aviso na caixa postal do mandatário, o escritório do mandatário encontrava-se fechado.
5. Nesta hora é manifesto que não é suposto o escritório estar aberto e em funcionamento, já que o mesmo, tal como a generalidade, abre às 9 horas.
6. Tudo isto ocorreu no período de natal, como se constata pelas datas.
7. Em que existem ferias judiciais e muitos dos serviços se encontram encerrados ou a funcionar de forma parcial, logo, de forma muito mais lenta, como se invocou.
8. Desta forma, tendo a notificação em causa ocorrido em 28 de Dezembro, quando em 22 de janeiro foi remetido o recurso hierárquico, tal ocorreu dentro do prazo legal de 30 dias estipulado para o efeito.
9. E, por essa razão, inexistem razões para a decisão impugnada com fundamento em extemporaneidade.
10. Uma vez que o prazo de interposição foi, em nosso modesto entendimento, perfeitamente cumprido.
11. Veja-se a este propósito o decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo datado de 20/10/2010, no âmbito do processo que sob o numero 0526/10 ali correu termos:
Com efeito, a mera comprovação da data em que a correspondência relativa à notificação da liquidação oficiosa de IRS foi depositada na caixa do correio, nada pode adiantar a respeito da data precisa em que o destinatário teve efectivo conhecimento do respectivo conteúdo, apresentando-se abusiva e infundamentada a conclusão de que nessa mesma data se deve considerar concretizada a notificação.
Para mais, como resulta do disposto no n.º 2 do artigo 39.º do CPPT, a presunção apenas pode ser ilidida pelo notificado/contribuinte no sentido da demonstração de que a notificação ocorreu em data posterior à presumida – cfr. Jorge Lopes de Sousa, in, CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição a fls. 353, anotação 3 ao art. 39.º.
12. Logo, estando ilidida por completo a presunção de que a carta foi recebida no terceiro dia após o envio, mas sim, dado como assente que foi efectivamente recebida em 28 de dezembro (tal consta da factualidade provada em e)), a decisão a tomar não poderia ser outra que não a de que foi praticado o acto dentro do respectivo prazo.
13. Pelo que se impunha uma decisão favorável à pretenção da impugnante e consequente revogação do acto impugnado.
14. A sentença recorrida é igualmente nula por omissão de pronúncia.
15. Na sua PI a impugnante invocou que a notificação da decisão em causa deveria ter sido efectuada por carta registada com AR, nos termos do disposto no artigo 38º n.º 1 do CPPT.
16. Relativamente a este ponto a sentença recorrida nem sequer se pronuncia.
17. Nada dizendo quanto à argumentação expendida.
18. Sendo certo que o Tribunal está obrigado a pronunciar-se sobre todas as questões colocadas pelas partes e neste caso não o fez.
19. O que torna a decisão nula.
20. Acresce que, relativamente a este concreto ponto, reitera-se o que se disse em sede de PI, ou seja, que artigo 38º n.º 1 do CPPT refere que “As notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em actos ou diligências.”
21. E, por outro lado, o numero 3 do art.º 39º do mesmo diploma, estabelece que, havendo aviso de recepção, a notificação considera-se efectuada na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
22. Ou seja, para além de esta notificação dever ser efectuada por carta registada com aviso de recepção, também a comprovação da data da recepção da mesma é feita pela data da efectiva entrega (assinatura do AR).
23. O que neste caso não ocorreu e deveria ter ocorrido.
24. Razão pela qual, também por esta razão, deveria ter sido revogada a decisão impugnada.
Nestes termos, e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente nos seus precisos termos e por força dessa procedência, ser a sentença recorrida revogada e substituída por uma que revogue o acto administrativo impugnado e admita o recurso hierárquico.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente, sem prejuízo de considerar hierarquicamente incompetente o TCA, por entender que a questão a decidir ser meramente de direito.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se o TCAN é hierarquicamente competente; se a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia e se o recurso hierárquico foi apresentado tempestivamente.

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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
3 – Fundamentação.
3.1 – De facto.
3.1.1 – Factos provados.
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provados os seguintes factos:
A) A impugnante apresentou uma reclamação graciosa das liquidações adicionais de IVA, dos exercícios de 2014, 2015 e 2016 (fls. 8 a 10 do processo administrativo (PA)).
B) A referida reclamação graciosa foi indeferida a 9/12/2020 (fls. 8 do PA).
C) A notificação do indeferimento da reclamação graciosa, supra-referida, foi efetuada por notificação remetida para a morada do seu mandatário judicial, por correio registado em 15/12/2020 (registo n.º RF .........88 PT) em 15/12/2020 (fls. 1 a 4 da Petição Inicial e fls.07 e 10 do PA).
D) Em 16/12/2020, pelas 8.00 da manhã, o carteiro deixou aviso dos do CTT na morada do mandatário da impugnante, para o levantamento da notificação sub judice (Doc. n.º 2 fls. 9 a 14).
E) A notificação acima referida, foi levantada na loja CTT ... em 28/12/2020 (fls. 4 a 6 da petição inicial).
F) A impugnante apresentou recurso hierárquico do indeferimento da sua reclamação graciosa, por correio eletrónico em 22/1/2021 (fls. 113 e 118 a 129 do PA).
G) Em 24/5/2021, o aludido recurso hierárquico foi rejeitado por extemporaneidade, por despacho emitido pela Direção de Serviços de Imposto sobre valor Acrescentado (DSIVA), sendo a decisão notificada na mesma data e remetido via correio registado, para a morada do seu mandatário judicial (fls. 132 e 138 do PA).
H) No dia 30/8/2021, a impugnante impugnou judicialmente a decisão (dos autos e por acordo das partes).
3.1.2 – Factos não provados.
Inexistem factos julgados não provados, com interesse para a decisão da causa.
3.2 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)).
A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa.

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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar cumpre apreciar se este Tribunal Central Administrativo Norte é hierarquicamente competente ou se a competência se defere ao Supremo Tribunal Administrativo, conforme propugna o Digno Magistrado do Ministério Público.
Ora, não obstante a Recorrente não impugnar a matéria de facto ou de não pretender o seu aditamento, resulta das alegações e respetivas conclusões de recurso que não está somente em causa a apreciação de questões de direito.
Assim, a Recorrente alega matéria relativa ao depósito do aviso postal na sua caixa de correio, que o escritório se encontrava fechado a essa hora, que se estava no período de Natal, em que existem, férias judicias e que ilidiu a presunção de que a carta não foi recebida no terceiro dia após o envio, mas efetivamente recebida no dia 28 de dezembro, conforme dado por assente na sentença.
Ora, basta ter que apreciar se ocorreu ou não esta ilisão, para se estar diante de matéria de facto, ou pelo menos, matéria de direito sobre a qual é necessário retirar ilações de facto, para que a competência seja deste TCA Norte.
O STA assim tem decidido em situações semelhantes, pelo que não é de acolher o propugnado pelo Digno Magistrado do Ministério Público.
Em face do exposto, julga-se este TCA Norte, hierarquicamente competente para conhecer o presente recurso.
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De seguida compete apreciar a alegada nulidade de sentença por omissão de pronúncia.
Para este efeito, alega a Recorrente que na Petição Inicial invocou que a notificação da decisão deveria ter sido efetuada com carta registada com aviso de receção, nos termos do disposto no artigo 38.º, n.º 1 do CPPT e que sobre o assunto a sentença nada disse, pelo que estando obrigado a pronunciar-se sobre esta questão, enferma de nulidade.
Ora, analisado o teor integral da Petição Inicial, não se vislumbra onde é que a Recorrente invocou o que agora alega como necessidade de a notificação ter sido realizada através de carta registada com aviso de receção.
Na Petição Inicial, a Recorrente refere-se ao artigo 38.º do CPPT, precisamente em sentido contrário, ou seja, remete para os preceitos que determinam a notificação por registo simples e a respetiva presunção de recebimento no terceiro dia útil ao do registo, conforme se pode ver pelo que decorre do teor dos artigos 10.º e 11.º do articulado inicial.
Desta forma, a Recorrente não invocou na Petição Inicial a necessidade de notificação com aviso de receção da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, pelo que a sentença não enferma da alegada nulidade de omissão de pronúncia, nem a novel alegação pode ser conhecida em sede de recurso, por não ser matéria de conhecimento oficioso.
Conforme decorre do artigo 627.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, os recursos jurisdicionais são um meio processual específico de impugnação e de reexame de decisões judiciais e como tal, o tribunal de recurso está impedido de apreciar questões novas, com exceção daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou suscitadas pela própria decisão recorrida sob pena de se produzirem decisões em primeiro grau de jurisdição sobre matérias não conhecidas pelas decisões recorridas (neste sentido, veja-se Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, Volume II, 2007, pág. 786).
Na situação em apreço, não se está diante de questão de conhecimento oficioso, nem é matéria suscitada pela própria decisão recorrida, pelo carecia de ter sido invocada no articulado inicial.
Portanto, tratando-se de questão nova no recurso, não pode ser conhecida, conforme é entendimento firmado da jurisprudência. Vejam-se, entre outros, os seguintes Acórdãos: do Supremo Tribunal Administrativo, de 13.03.2013, proc. n.º 0836/12; de 28.11.2012, recurso 598/12, de 27.06.2012, recurso 218/12, de 25.01.2012, recurso 12/12, de 23.02.2012, recurso 1153/11, de 11.05.2011, recurso 4/11, de 1.07.2009, recurso 590/09, 04.12.2008, rec. 840/08, de 30.10.08, rec.112/07, de 2.06.2004, recurso 47978 (Pleno), de 2911.1995, recurso 19369 e do Supremo Tribunal de Justiça, recurso 259/06.0TBMAC.E1.S1, todos em www.dgsi.pt.).
Veja-se, também sobre o assunto, a anotação realizada pelo Conselheiro Abrantes Geraldes ao artigo 635.º do CPC, no seu livro, Recursos em Processo Civil, (6.ª edição, 2020, Almedina), a págs. 139-141, quando refere o seguinte:
«5. A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Seguindo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos seguido um modelo de reponderação, que visa o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso.

Assim da conjugação do n.º 1 do art.º 627.º, do n. º 2 do art.º 639.º e n.º 1 art.º 640.º, todos do Código de Processo Civil, resulta que o tribunal de recurso fica impedido de conhecer questões novas, ou seja, matéria que não tenha sido anteriormente alegada e apreciada; como é o caso da agora em apreço.

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Cumpre agora saber se o recurso hierárquico foi ou não apresentado tempestivamente.
Alega a Recorrente que a notificação ocorreu no dia 28 de dezembro de 2020, pelo que a apresentação do recurso hierárquico em 22/01/2021, se encontra dentro do prazo de 30 dias disponíveis para o efeito.
A sentença recorrida decidiu a questão da forma que se passa a transcrever:
«Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 76.º do CPPT, “Do indeferimento total ou parcial da reclamação graciosa cabe recurso hierárquico no prazo previsto no artigo 66.º, n.º 2, com os efeitos previstos no artigo 67.º, n.º 1”.
Acrescentando o art. 66.º, n.º 2, do CPPT que: “Os recursos hierárquicos são dirigidos ao mais elevado superior hierárquico do autor do ato e interpostos, no prazo de 30 dias a contar da notificação do ato respetivo, perante o autor do ato recorrido.”.
Ora, o predito prazo de 30 dias a contar da notificação do ato respetivo é um prazo de natureza substantiva, contínuo e contado de acordo com as regras dos arts. 279.º do CC, 57.º, n.º 3, da LGT e 20.º, n.º 1, do CPPT.
De resto, e apesar de tal matéria não ter sido controvertida pelas partes, sempre se esclarece que a decisão de indeferimento total ou parcial da reclamação graciosa, sempre teria de ser notificada ao mandatário da impugnante, ao abrigo do n.º 1 do art. 40.º do CPPT, como de resto foi (alínea C) dos factos julgados provados).
Nos casos em que os interessados tenham constituído mandatário judicial, todas as notificações que hajam de ser feitas a eles serão feitas na pessoa deste e no seu escritório, salvo quando a notificação tenha em vista a prática pelo interessado de atos de natureza estritamente pessoal, o que não sucede no caso dos autos, uma vez que a notificação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, não implica a prática de atos de natureza pessoal pela parte.
A sufragar o que se afirmou acima, veja-se o douto acórdão do STA, de 4/5/2011, proferido no processo n.º ...7/10, que assim sumariou: «I - Tendo sido constituído mandatário judicial no procedimento tributário de reclamação é obrigatória notificação deste do ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa, não sendo esta notificação substituível pela notificação do reclamante (artigo 40.º do CPPT). II - Sendo constitucionalmente imposta a notificação dos atos administrativos aos interessados, na forma prevista na lei (artigo 266º n.º 3 da Constituição da República), e impondo a lei tributária a notificação aos mandatários constituídos no procedimento dos atos lesivos nele praticados (artigo 40.º do CPPT) como condição de eficácia do ato notificando (artigo 36º n.º 1 do CPPT), ter-se-á de concluir que a notificação feita na pessoa do reclamante é ineficaz, designadamente para o efeito da determinação do termo inicial do cômputo do prazo de impugnação do indeferimento expresso da reclamação, não sendo, por isso, intempestiva, a impugnação deduzida.».
A decisão de indeferimento, por rejeição liminar do recurso hierárquico interposto pela impugnante, como a própria Fazenda Pública refere na contestação apresentada (ponto 5 da mesma), remetida para a morada do seu mandatário, através de correio registado (registo n.º RF .........88 PT) datado de 15/12/2020 (alínea C) da matéria de facto provada).
A notificação, prevista no n.º 1 do art. 35.º do CPPT, tem por objetivo dar conhecimento pessoal aos interessados dos atos administrativos suscetíveis de afetar a sua esfera jurídica, decorrendo do n.º 3 do art. 268º da CRP, que a administração tem o dever de dar conhecimento aos administrados dos atos que lhes respeitam.
No entanto, é ao legislador ordinário que se deixa o encargo de determinar concretamente o modo de proceder a essa notificação e que deverá ser constitucionalmente adequado, observado que seja o princípio constitucional da proibição da indefesa.
Nesta linha, tendo a notificação sido efetuada por correio registado ao abrigo do n.º 3 do art. 38.7º do CPPT, foi observada a forma que a Lei preconiza para a notificação do indeferimento da pretensão material do contribuinte, consubstanciadas em atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária do contribuinte, que, contudo, não estejam abrangidas pelo n.º 1 do mesmo artigo.
Deste modo, estabelece o n.º 1 do art. 39.º do CPPT, sob a epígrafe “Perfeição das Notificações”, a presunção que, tendo a notificação sido efetuada nos termos do n.º 3 do artigo anterior (notificação efetuada por carta registada), a mesma presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.
O regime estabelecido neste artigo, aplicável às notificações efetuadas nos procedimentos tributários, estabelece no seu n.º 2 um meio de ilidir a referida presunção pelo notificado, (desde que não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida), caso em que deveria a administração deveria requerer aos correios informação sobre a data efetiva da receção da mesma.
Nas palavras de Jorge Lopes de Sousa “O único meio de prova admissível para a comprovação da não efetivação da notificação na data presumida nos termos do nº 1, é a informação dos correios, que tem de ter como suporte um requerimento do interessado em diligenciar para ser ilidida a referida presunção, não podendo o tribunal ou o serviço de finanças, se tal não lhes for requerido, diligenciar no sentido da obtenção daquela informação” (JORGE LOPES DE SOUSA, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado”, Áreas Editora, 6.ª edição, I volume, anotação 2 ao art. 99.º, pág. 382 e 383)..
Neste mesmo sentido, veja-se o douto acórdão do STA, de 17/1/96, processo n.º 14497, AP-DR de 30/1/1997, página 6 e ainda o douto acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo “(…) a lei presume que a comunicação postal demora três dias posteriores ao registo, que se transfere para o 1º dia útil, se o último dia não for dia útil (cfr. nº 1 do art.º. 39º do CPPT e nº 6 do art.º 45º da LGT).
O registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo. Trata-se, pois, de uma presunção legal destinada a facilitar à administração tributária a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando.
A atribuição legal de certa relevância ao registo da carta não permite, porém, inferir a certeza de que o seu destinatário a recebeu naquele prazo. Como tal forma de notificação não exclui o risco da carta não ser efetivamente recebida pelo destinatário, o nº 2 do artigo 39º permite que o notificado possa ilidir tal presunção “quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida”, solicitando à administração tributária e ao tribunal que requeiram aos correios a informação sobre «a data efetiva da receção». Esta norma põe em luz o efeito que a lei quer atribuir ao registo: trata-se de uma presunção juris Tatum da demora que levará a fazer a comunicação postal (cfr. Ac do STA, de 2/3/2011, rec nº 0967/10). Se o registo da carta liberta a administração tributário do ónus de provar que a mesma ficou em condições de ser recebida pelo destinatário em três dias, este tem o ónus de provar que, na situação concreta, a recebeu posteriormente.
In brevis, “o único meio de prova admissível para a da não efetivação da notificação na data presumida nos termos do nº.1 é a informação dos correios, normalmente a pedido do notificando e no sentido de se apurar que a carta não foi entregue ou se extraviou” (douto acórdão do STA – 2.ª Secção, de 20/10/2010, recurso n.º 526/10, in www.dgsi.pt).
Ou seja, a lei permite que a presunção legal seja ilidida, mas exige que o notificado demonstre que a notificação não foi efetuada ou que ocorreu em data posterior à presumida, por razões que não lhe são imputáveis.
Em suma, recaindo sobre a impugnante o ónus de ilidir a presunção prevista no n.º 1 do art. 39.º do CPPT e sendo o único meio de prova admissível, a informação sancionada pelos correios, necessariamente se constata que a impugnante, através do documento n.º 2 (fls. 9 a 14 do SITAF), demonstra que no dia 16 de dezembro de 2020, pelas 8.00 da manhã, foi deixado na morada do seu mandatário, o aviso para o levantamento da referida notificação e que esta apenas foi efetivamente levantada pelas 17.00 do dia 28 de dezembro (alíneas D) e E) dos factos provados).
Porém, e tal como prevê a Lei, designadamente a primeira parte do n.º 2 do art. 39.º do CPPT, “a presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida”.
Assim, sempre caberia ao notificado alegar e demonstrar que, tendo sido deixado aviso para levantamento da carta, facto esse que o mesmo até refere no ponto 16 da sua petição, a existência de qualquer facto que tenha obstado a que fosse levantar a carta (justo impedimento) mais cedo do que o dia em que efetivamente foi: dia 28 de dezembro de 2020.
Sendo que o único motivo que é alegado pelo mesmo, é o facto de se tratar de uma época de Natal, em que tudo se processa de forma mais lenta. Ora, pese embora se compreenda que no dia 24 existam os constrangimentos normais dessa época e que dia 25 seja feriado, a verdade é que o aviso para levantamento da notificação foi deixado na morada do notificado no dia 16 e ele levantou a carta apenas no dia 28 do mesmo mês, não tendo porém alegado nem demonstrado qualquer motivo capaz de consubstanciar um justo impedimento, conforme o disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 140.º do CPC.
Neste conspecto, e pese embora a impugnante prove que a notificação apenas chegou ao conhecimento do seu mandatário no dia 28 de dezembro, não logrou, porém, demonstrar a ocorrência de qualquer circunstância, algum facto ocorrido por motivo que não lhe seja imputável e que tenha motivado a que a notificação apenas fosse levantada no dia em que foi.
Neste mesmo sentido, veja-se o douto acórdão do STA, proferido a 11/1/2017, processo n.º 01017/14 (in www.dgsi.pt), nos termos do qual:
“No caso vertente, não colhem as razões invocadas para demonstrar que não é imputável ao mandatário o facto de a notificação ter ocorrido em data posterior à presumida e que se traduzem no facto de (alegadamente) se tratar de advogado que trabalha em prática isolada e se encontrava ausente do seu escritório, não tendo funcionário ou outra pessoa que possa receber a correspondência no local onde exerce a sua profissão. É que, como a jurisprudência vem entendendo, quem é mandatário num processo judicial e sabe que vai receber notificações para a prática de determinados atos, deve providenciar no sentido de haver alguém presente no escritório por si indicada no processo, ou, pelo menos, abrir ou mandar abrir a caixa de correio para se inteirar dos avisos de registos que os correios ali depositem e proceder ao respetivo levantamento.
Não é, pois, com base nesta argumentação que o mandatário do recorrente consegue demonstrar que foi por razões alheias à sua vontade que a notificação ocorreu em data posterior à presumida. E nos termos dos citados preceitos legais, a notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido ou ulteriormente reencaminhado para outra morada por força de pedido que posteriormente formula junto dos serviços administrativos dos CTT, uma vez a remessa da carta foi feita para o escritório indicado pelo próprio mandatário (art. 249.º do CPC).
Como é consabido, o advogado tem um ónus qualificado de ligação com o seu domicílio profissional ou eletivo, isto é, com o seu escritório ou domicílio escolhido no processo, tendo de organizar-se por forma a que o sistema de notificações instituído e a sequência de atos processuais que disso depende possa funcionar num quadro de razoabilidade e boa fé.”.
De facto, a Lei ao estabelecer a presunção que, quando uma notificação é efetuada por carta registada, dirigida para o escritório ou domicílio escolhido, a mesma tem-se por efetuada no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte quando esse o não seja e ao estabelecer que a presunção só pode considerar-se ilidida se o notificado provar que a notificação não foi efetuada ou que ocorreu em data posterior por razões que lhe não sejam imputáveis, supõem duas coisas: que esse é o tempo normal para assegurar a entrega da correspondência por parte dos serviços dos correios e que o destinatário se organiza em termos de assegurar a correspondente receção.
Quem detém a qualidade de advogado, quer atue em representação de terceiro, quer atue em causa própria, assume os ónus ou encargos inerentes ao exercício dessa profissão e sofre as consequências desvantajosas de lhes não dar satisfação. Consequências que lhe são legalmente referidas por um nexo de imputação face às responsabilidades de organização decorrentes de determinada qualidade profissional, mais do que por um juízo de censura pessoal.
Assim, embora não seja, em si, censurável que os destinatários da correspondência não se encontrem no seu domicílio à hora da distribuição postal, sendo frequente a passagem de avisos para levantamento da correspondência na estação postal competente, a intervenção no processo na qualidade de advogado implica a assunção da responsabilidade pela criação de condições para a receção das notificações relativas aos processos em que intervém nessa qualidade, no escritório ou domicílio escolhido, em circunstâncias normais. É o que está implícito no sistema de notificações estabelecido pelo art. 254.º do CPC, interpretado à luz do princípio da cooperação (art. 266.º, n.º 1, do CPC).
Pelo que, só a prova que a não entrega da carta registada, expedida para o domicílio indicado, na data que a lei presume, ficou a dever-se a circunstâncias anormais é suscetível de destruir os efeitos que a lei liga à notificação efetiva – em conformidade, veja -se o entendimento proferido pelo Douto Acórdão do Tribunal de 9/10/2006, processo n.º 367 – A/05.
Assim, necessariamente teremos que concluir que a impugnante não logrou ilidir totalmente a presunção contida no n.º 1 do art. 39.º do CPPT, e, por conseguinte, que a decisão de rejeição liminar do recurso hierárquico, impugnada nos presentes autos, esteja eivada de qualquer vício de violação de lei, não se mostrando censurável a decisão adotada pela AT.
A presunção legal de notificação no 3º dia útil posterior ao envio da carta não pode deixar de funcionar quando se demonstra, como acontece no caso, que antes mesmo da data presumida de notificação, no dia 16 de dezembro, foi efetuada uma tentativa (frustrada) de entrega no escritório do mandatário e deixado aviso para levantamento da carta nos serviços postais - frustração essa que é imputável ao notificado – mandatário da impugnante, uma vez que este não alegou nem provou os motivos que o impediram de ter diligenciado nesse mesmo dia ou noutro próximo (que não apenas no dia 28 de Dezembro), pelo levantamento da aludida notificação.
Neste sentido, considera-se que a interposição do recurso hierárquico, ocorreu para além do prazo previsto no n.º 2 do art. 66.º do CPPT, e que nenhuma censura merece a decisão de rejeição liminar do mesmo por parte da administração tributária, não se encontrando a mesma eivada de qualquer vicio de ilegalidade, devendo manter-se na ordem jurídica.» [Fim de citação]

Antes de mais, cumpre dizer que concordamos com assim sentenciado, pois analisa de forma clara e escorreita o regime legal aplicável e explica que, no caso concreto a recorrente não logrou alegar factos passíveis de poderem ilidir a ressunção legal de notificação, conforme previsto no n.º 1 do artigo 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Assim, conforme acima se deu por assente na matéria de facto, a notificação foi realizada mediante registo simples, sendo que nestes casos a lei faz presumir a sua receção no terceiro dia útil subsequente ao do registo dessa correspondência, conforme estabelece o n.º 1 do artigo 39.º do CPPT - Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Desta forma, tendo o expediente sido registado no dia 15 de dezembro de 2020 (terça-feira), presume-se recebido no dia 18 de dezembro (sexta-feira), por este ser dia útil; iniciando o prazo disponível para recurso hierárquico no dia imediato, ou seja, no dia 19 de dezembro de 2022.
Conforme mencionado na sentença recorrida e segundo o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CPPT, na redação dada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro (que era a aplicável à data dos factos): 1 — Os prazos do procedimento tributário e de impugnação judicial contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em dia em que os serviços ou os tribunais estiverem encerrados, para o primeiro dia útil seguinte.
Considerando que, conforme refere a sentença, o prazo para interpor recurso hierárquico é de 30 dias, contados seguidos, resulta que o trigésimo dia, contado com início no dia 19 de dezembro de 2022, correspondeu ao dia 17 de janeiro de 2021, que por ser um domingo, transfere o termo do prazo para a segunda feira seguinte (vide n.º 1 do artigo 20.º do CPPT), que foi o dia 18 de janeiro de 2021.
O recurso hierárquico foi apresentado no dia 22 de janeiro de 2021 – vide alínea F) da matéria de facto supra.
Entende a Recorrente que a notificação efetivamente apenas ocorreu no dia 28 de dezembro de 2020, conforme dado por assente na alínea E) da matéria de facto, por isso o recurso hierárquico foi interposto dentro do prazo de trinta dias.
O que a alínea E) deu por assente foi que a notificação da rejeição do recurso hierárquico, foi levantada na loja dos CTT no dia 28 de dezembro de 2020 e apenas isso.
Tal situação levada ao probatório, não contende com o decidido, na medida em que, o momento efetivo em que a notificação é levantada nos correios, só é passível de produzir efeito positivo na esfera da Recorrente, caso esta tivesse alegado e provado que não podia funcionar a presunção legal de que a notificação se presumia recebida no terceiro dia útil após o respetivo registo de expedição.
Como bem refere a sentença, era ao interessado que competia alegar factos concretos sobre a impossibilidade de a presunção legal poder funcionar.
Mas não foi isso que a Recorrente fez, limitou-se a invocar generalidades, como o período de Natal, sem explicar porque motivo em concreto não teria podido receber a notificação, antes da data em que efetivamente a levantou nos correios.
A Recorrente não apresente um único facto passível de ser apreciado no sentido de ocorrer justo impedimento ou causa de força maior, pelo que não logra ilidir a presunção de que a notificação se operou no dia 18 de dezembro de 2020.
Tendo a notificação da rejeição do recurso hierárquico de se considerar realizada no dia 18 de dezembro de 2020, trinta dias contados com início no dia seguinte (ou seja, no dia 19 de dezembro de 2020), terminavam no dia 17 de janeiro de 2021; o qual por ser domingo, se transferiu para o dia imediato.
Desta forma, terminando o prazo disponível para apresentar recurso hierárquico no dia 18 de janeiro de 2021 e tendo sido apresentado no dia 22 de janeiro de 2021, o mesmo foi deduzido já fora de prazo, pelo que a rejeição por extemporaneidade está correta.
Em face do exposto, verifica-se que o recurso não merece provimento.
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No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
I – A presunção de recebimento de notificação no terceiro dia útil após o registo do correio, estabelecida no n.º 1 do artigo 39.º do CPPT, pode ser ilidida pelo interessado, competindo-lhe alegar factos concretos no sentido de ocorrer justo impedimento ou causa de força maior.
II – O levantamento da notificação nos correios em data posterior à presumida, não vale como data da notificação efetiva, se o interessado não alegou qualquer facto impeditivo do funcionamento da presunção legal referida em I.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 19 de janeiro de 2023.

Paulo Moura
Vítor Salazar Unas
Ana Patrocínio