Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00615/13.7BEVIS |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 05/23/2024 |
Tribunal: | TAF de Viseu |
Relator: | VIRGÍNIA ANDRADE |
Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL; IRS; ANALOGIA-CASOS OMISSOS; SERVIÇOS PRESTADOS-ÂMBITO ACTIVIDADES HOTELEIRAS E SIMILARES; RESTAURAÇÃO E BEBIDAS |
Sumário: | I. Para efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária, “há analogia sempre que se verificar um núcleo fundamental semelhante em dois casos – um regulado pela lei, e outro omisso – que exige a mesma estatuição”. II. Enquadram-se no n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, os serviços prestados no âmbito de actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, que, para além do fornecimento de alimentação, bebidas e alojamento facultem serviços de apoio que permitem ao cliente o consumo desses mesmos bens ou espaço nas instalações ou local onde o serviço é prestado.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
Votação: | Unanimidade |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte 1 – RELATÓRIO «AA» e «BB» vêm interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 30.12.2021 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou improcedente a impugnação intentada pelos aqui Recorrentes contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e juros compensatórios n.º ...76 e ...97, referentes aos anos de 2010 e 2011. Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: ”1. O recorrente prestou serviços prestados, sob a forma de “horas/sala”, “horas/cozinha, no âmbito da atividade de restauração; 2. O n.º 5, do Art.º 31º, do CIRS, à época referia “serviços prestados no âmbito da atividade de restauração” e esta referência, tanto se aplicava a consumos finais, como a consumos intermédios; 3. O consumo intermédio fornecido pelo recorrente, de fornecimento de pessoal, encontrava-se em nexo causal direto, com a atividade de restauração; 4. O recurso à analogia, efetuada pelo tribunal a quo, no pressuposto da quantificação é proibida constitucionalmente, pelo n.º 2, do Art.º 103º da CRP; 5. Os serviços prestados efetuados pelo recorrente encontravam-se no âmbito da atividade de restauração e a taxa a aplicar para apuramento do rendimento líquido era de 0,20, cf. n.º 5, do Art.º 31º, do CIRS. 6. Pelo que deve ser decretada, sem mais, a anulação das liquidações recorridas. Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, anulando-se as liquidações de IRS e Juros Compensatórios, com todas as consequências legais, referentes aos anos de 2010 e 2011, para que assim se faça JUSTIÇA.” O Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal Administrativo de Viseu apresentou resposta, sustentando o não provimento do recurso interposto pelos Recorrentes. A Exmo. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos ao abrigo do disposto no artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. ** Objecto do recurso O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos Recorrentes, como resulta do disposto no artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil. Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir do erro de julgamento de direito. ** 2 - Fundamentação 2.1. Matéria de Facto O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma, que aqui se reproduz: “ 1. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2014....04, os Serviços da Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., desencadearam procedimento inspetivo externo a «AA», aqui Impugnante marido, de âmbito parcial, em sede de IRS, para controlo declarativo e com incidência aos anos de 2010 e 2011 – cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 30 do Processo Administrativo apenso aos autos. 2. «AA», aqui Impugnante marido, encontrava-se coletado pela atividade de “Fornecimento de refeições para eventos” – CAE 56210, e enquadrado nos anos de 2010 e 2011, em sede de IVA, no regime normal de periodicidade trimestral e em IRS no regime simplificado de determinação do rendimento tributável – cfr. capítulo II.3.1 do relatório de inspeção de fls. 16 a 30 do Processo Administrativo apenso aos autos. 3. Em 05/06/2013, na sequência do procedimento inspetivo referido em 1), foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária, projeto de relatório de inspeção tributária, onde foi proposta a correção de natureza meramente aritmética ao rendimento coletável dos anos de 2010 e 2011, para € 71.019,08 e € 90.229,25, com fundamento no apuramento da atividade do Impugnante marido ser distinta da declarada na sua atividade como sendo de “fornecimento de refeições para eventos”, propondo a alteração do CAE da atividade para “Outras atividades de colocação de pessoal – CAE 78300”, tendo sido emitido Boletim de Alteração Oficiosa para alteração no cadastro da AT da atividade exercida - cfr. projeto de relatório de inspeção tributária, de fls. 78 verso a 85 verso do processo físico. 4. Por ofício n.º ...12, de 05/06/2013, dos Serviços da Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., dirigido aos aqui Impugnantes, via postal por carta registada com aviso de receção, o qual se mostra assinado por terceiro com data de 12/06/2013, foi remetido o projeto de relatório a que se alude em 3), tendo sido concedido o prazo de quinze dias para exercício do direito de audição – cfr. cópia do ofício e aviso de receção de fls. 77 verso e 78 do processo físico. 5. O Boletim de Alteração Oficioso a que se alude no projeto de relatório de inspeção tributária referido em 3), para alteração do código de atividade (CAE) do Impugnante marido, foi elaborado pelo inspetor tributário que procedeu ao procedimento inspetivo com data de 04/05/2013, remetido ao Diretor de Serviços de Registo de Contribuintes, para tratamento informático, por ofício datado de 13/06/2013 – cfr. Docs. de fls. 86 a 88 do processo físico. 6. Em 27/06/2013, os Impugnantes, na sequência da notificação do projeto de relatório a que se alude em 4), apresentaram exposição exercendo o seu direito de audição, ali sustentando, em súmula, que ainda que não forneça serviços de alimentação e bebidas, os serviços prestados são no âmbito de atividades hoteleiras e similares e foram prestados a entidades na vertente da sua atividade de hotelaria e restauração – cfr. fls. 31 a 37 do Processo Administrativo apenso aos presentes autos. 7. Em 04/07/2013, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária, relatório de inspeção tributária, onde foi efetuada por referência aos Impugnantes, correção de natureza meramente aritmética ao rendimento coletável dos anos de 2010 e 2011, para € 71.019,08 e € 90.229,25 - cfr. relatório de inspeção tributária, de fls. 16 a 30 do Processo Administrativo apenso aos autos. 8. As correções referidas no ponto que antecede, resultaram da seguinte fundamentação inclusa no relatório, como dali se extrai: “(…) II.3.3. Atividade exercida Não obstante o CAE em que o SP está enquadrado, a atividade exercida de facto pelo SP consiste no fornecimento de serviços de mão-de-obra relacionados com a indústria hoteleira e restauração, que fatura em unidades de tempo, horas. O contribuinte não explora qualquer restaurante ou possui instalações, própria ou de terceiros, para confecionar refeições para os eventos. Também não nos demonstrou que tivesse recorrido a subcontratação para a realização dos serviços que presta. Com efeito, todas as faturas emitidas pelo sujeito passivo têm uma descrição semelhante quanto aso serviços que presta, por exemplo a fatura nº 2011000008 no campo “Artigo” refere Serviços Prestados CASA ... (horas/sala) no mês de Março de 2011. Na verdade, verificámos que todas as faturas emitidas nos exercícios de 2010 e 2011, resultam da cedência de pessoal a outras entidades (ver a título exemplificativo o Anexo I), sendo essa, de facto, a verdadeira atividade desenvolvida pelo contribuinte. Aliás, o próprio contribuinte líquida, e bem, IVA à taxa normal em todas as faturas emitidas, uma vez que os serviços por ele prestados não tinham enquadramento na verba 3.1 – Prestação de serviços de alimentação e bebidas da lista II – BENS E SERVIÇOS SUJEITOS À TAXA INTERMÉDIA do CIVA. Código CAE Em face do relatado, verifica-se que a atividade efetivamente exercida pelo contribuinte é aquela a que corresponde o código CAE 78300 – Outras atividades de colocação de pessoal. Por isso, foi emitido BAO (Boletim de Alteração Oficiosa) para alterar no cadastro a atividade exercida pelo sujeito passivo. II. 3.4 Imobilizado O sujeito passivo não possui qualquer Imobilizado afeto à atividade. II.3.5 Pessoal Apesar da cedência de pessoal ser o negócio desenvolvido pelo contribuinte a verdade é que não tem qualquer trabalhador no seu quadro de pessoal. Segundo nos confirmou o Sr. «AA», para cada evento contrata e coloca no local de trabalho quem está disponível no momento. Também não exibiu qualquer comprovativo de pagamento ou recibo ao pessoal que colocou nos locais de trabalho dos clientes. (…) III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas O contribuinte preencheu o quadro 402 do quadro 4 do anexo B da declaração mod. 3 de IRS, nos exercícios de 2010 e 2011, como se de prestação de serviços de atividades hoteleiras, restauração e bebidas se tratasse. Daí resultou, por aplicação do n.º 5 do art.º 31.º do CIRS, o resultado tributável demonstrado no quadro seguinte:
Assim, o coeficiente a aplicar ao total dos serviços prestados não é o do referido n.º 5 do art.º 31.º do CIRS, mas aquele a que se refere o n.º 2 do mesmo artigo, pelo que o resultado tributável da categoria B não é o do quadro acima, mas sim o que resulta do quadro abaixo:
IX Direito de Audição O sujeito passivo foi notificado (…) para exercer, querendo, o direito de audição (…) tendo a notificação sido acompanhado do respetivo projeto de relatório de inspecção tributária. (…) Em relação ao alegado pelo sujeito passivo, cumpre-nos referir o seguinte: 1º) Nos parágrafos 2º a 4º, o contribuinte vem contestar o ponto II.3.3 do projeto de relatório, cujos fundamentos não colhem, uma vez que todas as faturas emitidas pelo sujeito passivo se referem a horas de mão de obra. Por outro lado, por exemplo, na faturação referente ao mês de maio de 2011, faturas nºs (…), o total de horas faturadas é de 1.532. Ora, tendo o mês de maio de 2011 um total de 720horas, resultado de 30diasx24horas, não se compreende que o Sr. «AA» tenha faturado 1.532horas sem o recurso a mão de obra externa. 2º) o projeto de relatório, no ponto II.3.3, refere que o sujeito passivo “…não nos demonstrou que tivesse recorrido a subcontratação para realização dos serviços que presta”, apenas no sentido de realçar a incapacidade do contribuinte de realizar, sem outrem, as referidas 1.532horas. 3º) Cabe aqui fazer a destrinça entre a atividade realizada pelo Sr. «AA», colocação de pessoal, e as tarefas realizadas por quem é colocado nos hotéis, quintas e restaurantes que contratam os seus serviços. 4.º) A atividade do Sr. «AA» não mudaria se colocasse pessoal numa oficina ou numa farmácia, em substância o que mudaria seriam as tarefas desempenhadas por essas pessoas (…) 5.º) Também quando procura caracterizar a atividade exercida, no parágrafo 8º, o sujeito passivo é vago e impreciso, ou seja: a. A atividade do sujeito passivo não se “traduz em horas, serviços, pacotes, refeições”, sendo que apenas emitiu faturas de horas de serviços prestados; b. Segundo nos referiu o próprio «AA», ele é contactado pela empresa X a solicitar o envio de pessoal para as instalações dos clientes ou para outras por estes designadas e não para que o sujeito passivo lhe preste um qualquer outro serviço, aliás, serviços para os quais até nem possui os meios humanos e materiais minimamente indispensáveis. c. Nunca prestou um serviço de refeições ou outro, que fosse, foi sempre horas de mão de obra que faturou, aliás, como atestam as faturas emitidas. 6º) Pelo exposto (…), não tem aplicação o n.º 5 do artº 31º do CIRS, porquanto a atividade desenvolvida pelo SP não se trata, de facto, do exercício de uma atividade hoteleira e similar, ou de restauração e bebidas. 7º) Nos parágrafos 10º a 12º, refere o sujeito passivo que foi a 1.ª Repartição de Finanças ... que enquadrou o sujeito passivo na atividade de FORNECIMENTO DE REFEIÇÕES PARA EVENTOS com o CAE: 056210, o que é verdade, mas tal enquadramento resultou, como não poderia deixar de ser, da descrição da atividade feita naquela data e pelo próprio contribuinte. Como ficou demonstrado, essa descrição não é exata, uma vez que, e como já vimos, e o atestam as faturas que o próprio emitiu, o negócio do sujeito passivo, não é, nem de longe nem de perto, o fornecimento de refeições. 8º Relativamente ao declarado nos parágrafos 13º a 18º, é fiscalmente irrelevante se a caracterização jurídica é a de “cedência de pessoal” ou “cedência ocasional”, porque nem uma nem outra têm cabimento no n.º 5 do art.º 31º do CIRS, e é isso que está em questão (…)” - cfr. relatório de inspeção tributária, de fls. 16 a 30 do Processo Administrativo apenso aos autos. 9. Em 03/08/2013, em resultado da correção efetuada pelos Serviços da Inspeção Tributária, referida em 7) e descrita em 8), foi emitida, por referência aos Impugnantes, a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios, relativamente ao ano de 2010, com o n.º ...78, no montante total a pagar de € 36.008,46, a qual após acerto de contas com a liquidação anterior com o n.º ...30, resultou na nota de cobrança no valor a pagar de € 28.746,32 - cfr. cópia da demonstração de liquidação e demonstração de acerto de contas juntas como Doc. n.º 1 da petição inicial, a fls. 11 a 13 do processo físico. 10. Em 23/08/2013, em resultado da correção efetuada pelos Serviços da Inspeção Tributária, referida em 7) e descrita em 8), foi emitida, por referência aos Impugnantes, a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios, relativamente ao ano de 2011, com o n.º ...97, no montante total a pagar de € 51.304,53, a qual após acerto de contas com a liquidação anterior com o n.º ...21, resultou na nota de cobrança no valor a pagar de € 40.267,67 - cfr. cópia da demonstração de liquidação e demonstração de acerto de contas juntas como Doc. n.º 2 da petição inicial, a fls. 14 a 16 do processo físico. 11. Por não ter sido efetuado o pagamento das notas de cobrança relativas às liquidações a que se alude em 9) e 10) dentro do prazo de pagamento voluntário, foram emitidas as certidões de divida n.ºs ...67 e ...34 e instaurados pelo Serviço de Finanças ... os processos de execução fiscal n.ºs ...85 e ...25 – cfr. informação prestada pelo Serviço de Finanças ..., constante de fls. 39 do Processo Administrativo apenso aos autos. Mais se provou que, 12. Com data de 18/02/2010, o aqui Impugnante marido, emitiu a fatura n.º 2010000003, em nome de [SCom01...], no montante total de € 1.890,60, referente a, como dali se extrai:
13. Com data de 07/07/2010, o aqui Impugnante marido, emitiu a fatura n.º 2010000011, em nome da sociedade [SCom02...], S.A., no montante total de € 3.347,77, referente a, como dali se extrai:
14. Com data de 05/05/2011, o aqui Impugnante marido, emitiu a fatura n.º 2011000008, em nome de [SCom03...], no montante total de € 94,09, referente a, como dali se extrai:
15. Com data de 28/08/2011, o aqui Impugnante marido, emitiu a fatura n.º 2011000043, em nome de [SCom03...], no montante total de € 491,39, referente a, como dali se extrai:
16. O Impugnante marido no âmbito da sua atividade não fornece alimentação e bebidas – facto admitido (artigo 31º da p.i.). 17. Nos anos de 2010 e 2011, «CC», «DD» e «EE», foram contactados pelo Impugnante marido, por várias vezes, para, a troco de remuneração, efetuarem em determinado dia ou durante algumas horas, serviços de mesas em estabelecimentos hoteleiros/restauração indicados pelo Impugnante, servindo à mesa os clientes daqueles estabelecimentos festas, casamentos e outros eventos, sob ordens dos seus chefes de sala ou representantes – cfr. prova testemunhal (depoimento dos próprios) ** Inexistem quaisquer factos relevantes para a decisão a proferir que se tenham considerado não provados. ** Motivação da decisão de facto A convicção do tribunal relativamente à matéria de facto dada como assente relevante para a decisão da causa, resultou da análise conjugada da prova produzida nos autos, baseando-se essencialmente numa livre apreciação, bem como dos factos admitidos, conforme discriminado nos vários pontos do probatório. No que respeita à prova documental, teve-se em consideração os documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo apenso, discriminados no acervo, que não foram impugnados. De referenciar, no que concerne ao facto assente em 8), que constitui o relatório de inspeção tributária aí coligido, um documento autêntico (cf. artigo 371.º, n.º 1 do Código Civil), na medida em que é exarado por funcionário da Administração Tributária e Aduaneira, no âmbito e exercício das respetivas funções, o qual tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela Administração Tributária e Aduaneira ou com base na perceção dos seus órgãos e que apenas pode ser ilidida nos termos da lei, sendo que os juízos conclusivos aí considerados só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do tribunal, segundo a sua prudente convicção, atenta a análise crítica e conjugada de todos os meios de prova (cfr. artigo 76.º, n.º 1 da LGT e artigos 363º e ss. do Código Civil e 607.º, n.º 5 do Código do Processo Civil). Quanto aos documentos a que se alude nos pontos 12) a 15) do acervo factual, tratam-se de documentos particulares cuja força probatória se circunscreve às declarações de ciência ou de vontade que deles constam como feitas pelo seu subscritor, não fazendo prova plena dos factos nele narrados como efetivamente praticados pelo seu autor ou como objeto da sua perceção direta, sujeitos como tal a valoração pelo Tribunal na sua livre apreciação, numa análise crítica e conjugada da demais prova produzida. Na apreciação da prova testemunhal, tendo o tribunal a valorado na sua livre apreciação, jamais se perdeu de vista um critério objetivo que permitiu aferir do rigor da narração dos factos, bem como da razão de ciência da testemunha e das qualidades de isenção e convicção denotadas. Especificando, e iniciando pelas testemunhas apresentadas pelos Impugnantes, «CC», foi questionada aos factos constantes dos artigos 13 a 18 e 27 da p.i.. Prestou um depoimento claro e convincente, sem manifestações de quaisquer contradições, afirmando que entre os anos de 2011 e 2012, o Impugnante marido a contratou esporadicamente para prestar serviços como empregada de mesa, a troco de remuneração, nunca tendo sido formalmente sua funcionária. Esclareceu o tribunal que era o Impugnante marido que a contratava para um determinado dia ou horas, para efetuar o serviço de mesa em estabelecimentos hoteleiros/restauração, servindo os clientes destes em festas, casamentos e outros eventos, sob ordens dos chefes de sala daqueles estabelecimentos. Permitiu assim, e por resultar da instrução dos autos, como facto instrumental, para o facto assente em 17) do acervo factual. «DD», foi questionado aos factos constantes dos artigos 13 a 18 e 27 da p.i.. Prestou um depoimento claro e convincente, sem manifestações de quaisquer contradições, afirmando que entre os anos de 2010 e 2012, o Impugnante marido o contratava esporadicamente como empregado de mesa, nunca tendo sido formalmente seu funcionário. Esclareceu o tribunal que era o Impugnante marido que o contratava para um determinado dia ou horas, para efetuar o serviço de mesa em estabelecimentos hoteleiros/restauração, servindo os clientes destes em festas, casamentos, batizados e outros eventos, em conjunto com outros empregados daqueles estabelecimentos, sendo que a organização daqueles eventos não era realizado pelo Impugnante mas outrossim pelos estabelecimentos onde prestou os seus serviços como empregado de mesa, a solicitação do impugnante. Permitiu assim, e por resultar da instrução dos autos, como facto instrumental, para o facto assente em 17) do acervo factual. «EE», foi questionado aos factos constantes dos artigos 13 a 18 e 27 da p.i.. Prestou um depoimento claro e convincente, sem manifestações de quaisquer contradições, afirmando que entre os anos de 2009 a 2012, o Impugnante marido o contratava esporadicamente para prestar serviços como empregado de mesa. Esclareceu o tribunal que era o Impugnante marido que o contratava para um determinado dia, mormente ao fim de semana e mais na época de Verão, para efetuar o serviço de mesa em estabelecimentos hoteleiros/restauração, servindo os clientes destes em casamentos, batizados e outros eventos, em conjunto com outros empregados daqueles estabelecimentos e sob ordens dos responsáveis ou chefes destes estabelecimentos. Permitiu assim, e por resultar da instrução dos autos, como facto instrumental, para o facto assente em 17) do acervo factual. No que respeita à testemunha apresentada pela Impugnada, «FF», Inspetor Tributário em exercício de funções na Direção de Finanças ..., procedeu à ação inspetiva dirigida à atividade do Impugnante marido, tendo sido o subscritor do relatório de inspeção fundamentador das liquidações controvertidas. Corroborou com declarações espontâneas e coerentes, a factualidade por si apurada nas diligências que efetuou junto do Impugnante, explicando a correção efetuada, nos termos em que se mostra descrita no relatório de inspeção.” *** 2.2 – O direito Constitui objecto do presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação intentada pelos aqui Recorrentes contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e juros compensatórios n.º ...76 e ...97, referentes aos anos de 2010 e 2011. 2.2.1. O erro de julgamento de direito Consideraram os Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ... que a actividade efectivamente exercida pelo Recorrente marido consiste no fornecimento de serviços de mão de obra relacionados com a indústria hoteleira e restauração e que facturou em unidades de tempo/horas, não se enquadrando na prestação de serviços de refeições para eventos, mas sim na cedência de pessoal. A Juíza do Tribunal a quo, em consonância com o considerado pelos Serviços da Inspecção Tributária julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pelos Recorrentes, por ter entendido que “os serviços prestados pelo Impugnante não se consubstanciam em fornecimento de refeições, alimentação, bebidas que permitem ao cliente o consumo desses mesmos bens ou espaço nas instalações ou local onde o serviço foi prestado, e assim não sendo, a atividade por si desempenhada não cabe na previsão do disposto no referido n.º 5 do artigo 31.º do CIRS” Os Recorrentes, discordam do assim decidido, sustentando, no essencial, que “não sobram dúvidas, de que os serviços prestados pelo recorrente, foram “horas/sala”, “horas/cozinha” no âmbito de atividades de restauração”, não estando assim “afastados do n.º 5, do Art.º 31º do CIRS, os serviços prestados pelo recorrente, que consiste em fornecer pessoal (serviços prestados) diretamente (aos que prestaram os serviços de restauração aos consumidores finais) no âmbito da atividade de restauração”. Vejamos. Como dispunha à data dos factos o nº 1 do artigo 3.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares “Consideram-se rendimentos empresariais e profissionais: a) Os decorrentes do exercício de qualquer actividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária; b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer actividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com actividades mencionadas na alínea anterior; c) Os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico, quando auferidos pelo seu titular originário. (…)” A par, estatuía o n.º 1 do artigo 4.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares que “Consideram-se atividades comerciais e industriais, designadamente, as seguintes: (…) h) Atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas , bem como a venda ou exploração do direito real de habitação periódica; (…)” Por outro lado, estabelecia o n.º 1 do artigo 28.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares, sob a epígrafe “Formas de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais” que “A determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, salvo no caso da imputação prevista no artigo 20.º, faz-se: a) Com base na aplicação das regras decorrentes do regime simplificado; b) Com base na contabilidade.” Relativamente à tributação da categoria B de rendimentos por via do regime simplificado, estabelecia o artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares que “1 - A determinação do rendimento tributável resulta da aplicação de indicadores objectivos de base técnico-científica para os diferentes sectores da actividade económica. 2 - Até à aprovação dos indicadores mencionados no número anterior, ou na sua ausência, o rendimento tributável é obtido adicionando aos rendimentos decorrentes de prestações de serviços efectuadas pelo sócio a uma sociedade abrangida pelo regime de transparência fiscal, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IRC, o montante resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente de 0,70 aos restantes rendimentos provenientes desta categoria, excluindo a variação de produção. 3 - O rendimento colectável é objecto de englobamento e tributado nos termos gerais. (…) 5 - Para os efeitos do disposto no n.º 2, aplica-se aos serviços prestados no âmbito de actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, bem como ao montante dos subsídios destinados à exploração, o coeficiente de 0,20 aí indicado.” Por fim, estabelecia o artigo 151.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares que “As actividades exercidas pelos sujeitos passivos do IRS são classificadas, para efeitos deste imposto, de acordo com a Classificação das Actividades Económicas Portuguesas por Ramos de Actividade (CAE), do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados em tabela de actividades aprovada por portaria do Ministro das Finanças.” O Decreto-Lei n.º 381/2007, de 24.11 veio proceder à revisão da Classificação Portuguesa de Actividades Económicas, harmonizada com as classificações de actividades da União Europeia e das Nações Unidas, estabelecendo na secção I, divisão 56 (grupos 561 a 563), os CAE´s respeitantes à Restauração, designadamente na classe 5621 o CAE 56210 relativo a “Fornecimento de refeições para eventos”. Por sua vez, na Secção N, divisão 78 (781 a 783), consta o CAE 78300 atinente a “Outro fornecimento de recursos humanos”. Retornando ao caso presente e como bem decidiu o Tribunal a quo “No caso em apreço, como resulta do quadro probatório, à data dos factos, o Impugnante encontrava-se coletado pela atividade de “Fornecimento de refeições para eventos” - CAE 56210, tendo declarado no anexo B da declaração de rendimentos referentes aos anos de 2010 e 2011, que a atividade se enquadrava no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, com a consequente aplicação do coeficiente de 0,20 previsto no n.º 5 do artigo 31.º do CIRS. Como decorre do probatório, em sede de procedimento inspetivo efetuado à atividade do Impugnante marido, a AT considerou então que, sendo a atividade desenvolvida pelo contribuinte de fornecimento de serviços de mão de obra para a indústria hoteleira e restauração, os rendimentos constituem na sua totalidade rendimentos de prestações de serviços, com a consequente aplicação do coeficiente de 0,70, previsto na parte final do n.º 2 do artigo 31.º, do CIRS. Ora, não obstante o CAE que consta no cadastro fiscal ou que vem a ser alterado pela AT, como no caso vertente, a aplicação dos coeficientes para determinação do rendimento tributável de serviços prestados, no âmbito da categoria B em regime simplificado, faz-se pela verificação da atividade realmente exercida pelo contribuinte e não pela constatação do código de atividade, seja este um código de atividade da lista anexa ao artigo 151.º ou um código da Classificação Portuguesa de Actividades Económicas. Assim e descendo ao probatório, não subsiste dúvida que, em face da matéria de facto assente, a atividade exercida pelo Impugnante marido não consiste no fornecimento de refeições para eventos. Com efeito, e desde logo, como o próprio Impugnante admite, no âmbito da atividade exercida, não fornece quaisquer alimentação e bebidas (cfr. ponto 16) do probatório). Por outro lado, e como decorre da factualidade assente, mormente do relatório inspetivo coligido em 8) do acervo factual, os Serviços de Inspeção Tributária (doravante, SIT), apuraram em sede de procedimento inspetivo, que o Impugnante marido não possui qualquer restaurante ou instalações para confecionar refeições para eventos, nem recorreu a subcontratação para a realização de tais serviços, não possui qualquer imobilizado afeto à atividade, factos não contrariados pelos Impugnantes. Mais resulta que da análise de todas as faturas emitidas nos anos em causa, os SIT constataram resultar a cedência de pessoal para os serviços prestados em horas aos seus clientes, apesar do Impugnante marido não ter qualquer pessoal em quadro, pois e conforme ainda decorre do relatório de inspeção tributária, o número de horas faturados nos anos em causa é incompatível com o exercício da atividade pelo Impugnante marido sem recurso a mão de obra externa, sendo exemplo disso a análise dos SIT ao mês de maio de 2011, em que “o total de horas faturadas é de 1.532. Ora, tendo o mês de maio de 2011 um total de 720horas, resultado de 30diasx24horas, não se compreende que o Sr. «AA» tenha faturado 1.532horas sem o recurso a mão de obra externa.”. Ademais, e como ainda resulta do probatório, segundo declarações do próprio Impugnante marido no procedimento inspetivo, para cada evento contratava e colocava no local de trabalho quem estava disponível no momento. Tal como a AT constatou, decorre provado que o Impugnante marido, contactado por empresas do ramo da hotelaria e da restauração (o que não se coloca em causa, desde logo porque resulta das faturas emitidas quem eram os seus clientes), contratava pessoas singulares ao dia ou à hora para que os mesmos prestassem serviços como empregados de mesa ou ajudantes de sala/cozinha em eventos em estabelecimentos de hotelaria e restauração. Com efeito, tal como resultou dos factos instrumentais decorrentes da instrução da causa, por referência ao depoimento das testemunhas arroladas pelos próprios Impugnantes, «CC», «DD» e «EE», confirmaram que foram contactados pelo Impugnante marido, por várias vezes, para, a troco de remuneração, efetuarem em determinado dia ou durante algumas horas, serviços de mesas em estabelecimentos hoteleiros/restauração indicados pelo Impugnante, servindo à mesa os clientes daqueles estabelecimentos em festas, casamentos e outros eventos, sob ordens dos seus chefes de sala ou representantes (cfr. ponto 17) do probatório), o que veio confirmar o afirmado pelo Impugnante marido no procedimento inspetivo de que para cada evento contratava e colocava no local de trabalho quem estava disponível no momento, bem como veio confirmar o descrito de serviços prestados em “horas/sala”/”horas/cozinha” nas faturas por si emitidas a esses mesmos estabelecimentos hoteleiros/restauração (cfr. relatório de inspeção e exemplos de faturas coligidas de 12) a 15) do acervo factual). Não podemos esquecer que, por definição, a prestação de serviços consiste numa operação constituída por um conjunto de atos e atividades concatenadas com vista a proporcionar a outrem um determinado resultado, e os atos e atividades que decorreu provado o Impugnante marido realizar, foi a contratação de pessoal com vista a proporcionar aos seus clientes a existência de pessoas suficientes para bem servir em determinados eventos a realizar nos estabelecimentos hoteleiros por organização e conta dos mesmos, não fornecendo o Impugnante qualquer bem alimentício ou de bebidas ou cafetaria acompanhado dos serviços de apoio suficiente para permitir o seu consumo. Mesmo assim sendo, sustentam os Impugnantes que a atividade exercida se situa no âmbito da atividade hoteleira e similar, restauração e bebidas, pelo que se enquadra no âmbito do n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, ou seja, se bem percebemos, entendem que mesmo fornecendo mão de obra para prestarem serviços no âmbito da hotelaria/restauração, tais serviços se subsumem nos “serviços prestados no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas”. Todavia, assim não podemos concluir. Com efeito, cabe aqui fazer a destrinça entre a atividade realizada pelo Impugnante marido, colocação de pessoal em eventos de restauração/hotelaria, e as tarefas realizadas por quem é colocado nos hotéis, quintas e restaurantes que contratam os seus serviços. Como resultou da factualidade assente, o aqui Impugnante contrata pessoal para servir às mesas ou ajudar em cozinha, durante determinados momentos contabilizados em horas, sendo que quem presta os serviços ligados à restauração aos seus clientes são as pessoas que contrata. O que decorre do n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, ao referir-se o legislador “aos serviços prestados no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas”, foi referir-se àqueles serviços prestados aos clientes finais e não que prestadores, ou seja, o que interessa é o tipo de serviço prestado e no caso o serviço prestado aos clientes do Impugnante marido, mesmo sendo estabelecimentos hoteleiros e/ou de restauração, é o fornecimento de mão de obra, de pessoal.” Ora, não tendo os Recorrentes logrado impugnar a matéria de facto assente, esta solidificou-se na ordem jurídica. Assim, e como decidiu o Tribunal a quo, não obstante, o CAE pelo qual o Recorrente marido se encontrava colectado respeitar a “Fornecimento de refeições para eventos” – CAE 56210” (cfr. ponto 2. acervo probatório), para além de ter resultado comprovado que da descrição das facturas emitidas consta a prestação de serviços cobrados à hora (cfr. pontos 12. a 15. da matéria assente), também resultou comprovado da instrução os autos que “o Impugnante marido no âmbito da sua atividade não fornece alimentação e bebidas”. Nessa medida, o Recorrente marido contratava para esse efeito «CC», «DD» e «EE», (cfr. pontos 16. e 17. da matéria assente). Ademais, e, como decorre do relatório do procedimento inspectivo, coligido no ponto 8. da matéria assente, o Recorrente marido não possui qualquer restaurante ou instalações para confecionar refeições para eventos, nem foi percepcionado que este tenha recorrido a subcontratação para a realização de tais serviços. Nesta medida, impõe-se concluir que a actividade desenvolvida pelo Recorrente marido respeita à cedência de pessoal e não ao fornecimento de refeições e/ou bebidas. Não obstante, a factualidade que aqui demos conta, nem o n.º 5 do artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares nem qualquer outro preceito legal do mesmo Diploma nos esclarece quanto ao que deve entender-se por “serviços prestados no âmbito de”. No entanto, consideramos que o Decreto -Lei n.º 381/2007 de 14.11, que aprovou a Nomenclatura das Actividades Económicas da Comunidade Europeia, já supra enunciado, ao designar os CAE´s para cada actividade económica, veio estabelecer na Secção I, Divisão 56 (grupos 561 a 563), o que se entende por “Restauração e similares”, “Fornecimento de refeições para eventos e outras actividades de serviço de refeições” e ainda “Estabelecimentos de bebidas” e nessa medida delimitar o âmbito de tais actividades, situando-se a tónica sempre no fornecimento de comida e/ou bebidas. Por outro lado, a cedência de pessoal, como também já aqui demos conta, pertence a outra actividade prevista na Secção N, divisão 78 (781 a 783), com a nomenclatura “Outro fornecimento de recursos humanos Nessa senda, e, quanto à abrangência das normas aqui em questão, concordamos com o decidido pelo Tribunal a quo quando considerou que “O que decorre do n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, ao referir-se o legislador “aos serviços prestados no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas”, foi referir-se àqueles serviços prestados aos clientes finais e não que prestadores, ou seja, o que interessa é o tipo de serviço prestado e no caso o serviço prestado aos clientes do Impugnante marido, mesmo sendo estabelecimentos hoteleiros e/ou de restauração, é o fornecimento de mão de obra, de pessoal”, e ainda que “(…) o legislador pretendeu com o expresso no n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, foi incluir os serviços que forneçam comida, bebida ou alojamento, acompanhados dos serviços de apoio suficientes para permitir o seu consumo imediato, fazendo então parte integrante de um serviço mais alargado, havendo assim um usufruto por parte dos clientes de um conjunto alargado de bens e o servir desses mesmos bens alimentares ou de bebidas, ou de hotelaria, em que para além do espaço, inclui o servir o cliente. Existe assim serviços prestados no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, quando para além do fornecimento de alimentação, bebidas e alojamento são facultados serviços de apoio que permitem ao cliente o consumo desses mesmos bens ou espaço nas instalações ou local onde o serviço é prestado” Com efeito, por forma a enquadrar uma qualquer prestação de serviços no disposto no n.º 5 do artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, consideramos indispensável que em complemento de serviços de apoio que permitam o consumo de refeições, esteja inerente a essa prestação de serviços o fornecimento da própria refeição, à luz do assim explicitado no Decreto-Lei n.º 381/2007 de 14.11. Ora, como resulta da matéria de facto assente, vertida no ponto 16., o Recorrente marido não fornece alimentos/bebidas/alojamento, por forma a permitir que os serviços por ele prestados ao nível do fornecimento de pessoal se incluam no âmbito da prestação de serviços de restauração e bebidas, pois, apesar de tais serviços permitirem aos clientes o apoio necessário para o consumo ou usufruto de bens, este não fornece refeições, alimentação e/ou bebidas. Sustentam também os Recorrentes que o Tribunal a quo leu “a expressão “serviços prestados”, à época, como se fosse a de “prestação de serviços”, que vigora a partir de 2014 (redação introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31.12.). 7. A expressão “prestação de serviços” era conhecida do legislador, v.g., al. b), do n.º 1, do Art.º 3º do CIRS, “de qualquer atividade de prestação de serviços”, pelo que os termos “serviços prestados” e “prestação de serviços” devem designar factos diferentes.” Ora, como aqui já demos conta, o nº 5 do artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares estatuía à data dos factos que “Para os efeitos do disposto no n.º 2, aplica-se aos serviços prestados no âmbito de actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, bem como ao montante dos subsídios destinados à exploração, o coeficiente de 0,20 aí indicado” A Lei n.º 83-C/2013, de 31.12 veio alterar a redacção do disposto nos artigos 2.º, 5.º, 10.º, 13.º, 17.º-A, 22.º, 28.º, 31.º, 40.º-A, 55.º, 73.º, 78.º, 81.º e 102.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, conforme decorre do artigo 175.º da sobredita Lei, tendo inclusive revogado o sobredito n.º 5 do artigo 31.º. Por sua vez, a alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares mantém desde 2002 a mesma redacção. Nessa medida, considera o Tribunal que a discordância dos Recorrentes não se verifica ao nível das expressões tidas na lei, assim como na evolução legislativa, mas sim ao nível da abrangência do âmbito em que tais serviços são prestados, isto porque, entende-se que as alterações legislativas não fundamentam o alegado. Alegam também os Recorrentes na conclusão 4ª que o recurso à analogia, efetuada pelo Tribunal a quo, no pressuposto da quantificação é proibida constitucionalmente pelo n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa. Vejamos. Estabelece o n.º 2. do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa que “Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes” Por sua vez, o n.º 4 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária estabelece que “As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica”. Segundo José Oliveira de Ascensão (in “O Direito, Introdução e Teoria geral – Uma perspectiva Luso-Brasileira, 10ª Edição, Almedina, Coimbra, 1999, pag. 445), há analogia sempre que se verificar um núcleo fundamental semelhante em dois casos – um regulado pela lei, e outro omisso – que exige a mesma estatuição. Parafraseando Diogo de Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (in Lei Geral Tributária, anotada e comentada, 4ª edição, 2012, Encontro de escrita editora, pag. 122) “A analogia em geral, refere-se ao procedimento de aplicação das normas jurídicas que consiste na aplicação das normas retiradas da regulamentação legal de uma certa situação de facto, a outra situação de facto que parece essencialmente igual, mas diferente nos pormenores, e que não aparece expressamente contemplada naquelas normas. O procedimento de aplicação analógica assenta na determinação da mesma razão (“eadem ratio”) existente nos casos em análise. Identidade de razão que só é possível determinar caso a caso. (…)” Retornando ao caso presente, temos que o Tribunal a quo, na decorrência do seu iter cognoscitivo referenciou que “Como bem refere a AT no relatório de inspeção tributária, a atividade do Impugnante marido “não mudaria se colocasse pessoal numa oficina ou numa farmácia, em substância o que mudaria seriam as tarefas desempenhadas por essas pessoas”, ou seja, não é pelo facto do pessoal que contrata para prestar um serviço de apoio na restauração aos seus clientes que os serviços prestados pelo Impugnante marido se transmutam em serviços prestados no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas” Assim, o Tribunal a quo, serviu-se também de um exemplo mencionado no relatório do procedimento inspectivo para concluir que o Recorrente marido exerce uma actividade de cedência de pessoal, independentemente do local e das tarefas desempenhadas. Ora, não se vislumbra em que medida é que se verifica a alegada violação do n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa. Senão vejamos. Por um lado, não estamos perante a omissão de norma que regule a situação sob apreço, isto porque, cabendo decidir se tem aplicação ao caso concreto o coeficiente 0,20 ou 0,70 ao valor global das operações, não há qualquer lacuna na Lei, pois a situação fáctica sob apreciação há-de encontrar sempre respaldo no disposto no.º 2 ou no n.º 5 do artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares. Por outro lado, o Tribunal a quo limitou-se a exemplificar a actividade exercida pelo Recorrente marido com recurso à comparação com a colocação de pessoal numa farmácia ou em uma oficina, não tendo preenchido qualquer omissão legal, sendo tão só mais um fundamento que esteou a decisão do Tribunal a quo. Nesta senda, fixada a matéria de facto assente, que supra demos conta, qualificando-se a actividade do Recorrente marido como sendo de fornecimento de pessoal, e considerando-se, como bem decidiu a sentença recorrida, “que o legislador pretendeu com o expresso no n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, foi incluir os serviços que forneçam comida, bebida ou alojamento, acompanhados dos serviços de apoio suficientes para permitir o seu consumo imediato, fazendo então parte integrante de um serviço mais alargado, havendo assim um usufruto por parte dos clientes de um conjunto alargado de bens e o servir desses mesmos bens alimentares ou de bebidas, ou de hotelaria, em que para além do espaço, inclui o servir o cliente”, impõe-se concluir que a decisão recorrida não padece do erro de julgamento que lhe vem assacado ao ter considerado que “o rendimento líquido resultante da atividade assente nessas prestações determinar-se-á pela aplicação do coeficiente 0,70 ao valor global das operações previsto no n.º 2 do artigo 31.º do CIRS, tal qual assim entendeu a AT, não enfermando assim as liquidações do vício de violação de lei que veio invocado”. Nestes termos, concluímos pela improcedência do recurso. *** Nos termos do disposto no artigo 663.º nº 7 do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte SUMÁRIO: I. Para efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária, “há analogia sempre que se verificar um núcleo fundamental semelhante em dois casos – um regulado pela lei, e outro omisso – que exige a mesma estatuição”. II. Enquadram-se no n.º 5 do artigo 31.º do CIRS, os serviços prestados no âmbito de actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, que, para além do fornecimento de alimentação, bebidas e alojamento facultem serviços de apoio que permitem ao cliente o consumo desses mesmos bens ou espaço nas instalações ou local onde o serviço é prestado. *** 3 – Decisão Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. Custas pelos Recorrentes. Porto, 23 de Maio de 2024 Virgínia Andrade Serafim José da Silva Fernandes Carneiro Carlos Alexandre de Castro Fernandes |