Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01292/14.3BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/07/2024
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores: ISV; AVALIAÇÃO VALOR COMERCIAL;
LIQUIDAÇÃO OFICIOSA;
ONÚS DA PROVA;
Sumário:
I. Sempre que se verifique a introdução no consumo, por particulares, de veículos usados sujeito a Imposto Sobre Veículos, após a liquidação provisória de acordo com a “tabela D”, a que se refere o nº 1, do artº 11º, do Código, pode ser requerido a determinação do valor comercial, nos termos considerados no nº 3, do mesmo preceito legal, podendo o mesmo revestir-se de um procedimento avaliativo que tem em consideração certos factores concretos vertidos na lei.

II. Tendo-se efectuado tal avaliação do veículo, sendo em concreto considerado o factor de ponderação relativo à quilometragem, tendo o contribuinte cumprido as suas obrigações relativas a sua introdução no consumo através da apresentação de Declaração Aduaneira de Veículo (DAV), sendo o mesmo acompanhado dos documentos que comprovam os elementos pertinentes à sua determinação (nº2, do artigo 20º, do CSV), resulta fixado aquele valor de avaliação).

III. Efectuada uma liquidação definitiva do imposto nos termos do disposto na alínea c), do nº 1, do artigo 25º, do CISV, não é licita a realização de uma liquidação oficiosa ao abrigo do disposto no artigo 26º, do mesmo diploma legal, com fundamento em novos elementos obtidos após aquele procedimento avaliativo sem o respaldo legal da possibilidade de realizar nova avaliação, tendo-se firmado na ordem jurídica o resultado daquela avaliação.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. Fazenda Pública (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 29.02.2020, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por «AA», contra a liquidação oficiosa de ISV (Imposto Sobre Veículos) relativo ao veículo automóvel de marca Mercedes Benz, modelo E 280 CDI, que adquiriu a [SCom01...], SL, inconformada vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A) A sentença recorrida, ao considerar que os elementos factuais demonstrados pela Alfândega não são suficientemente sólidos para convencer sobre a grande probabilidade de que a declaração do Impugnante não corresponde à verdade, enferma de erro de julgamento.
Face ao alegado, requer-se a revogação da douta sentença.»
1.2. A Recorrida («AA»), notificada da apresentação do presente recurso, contra alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1. Interpôs a Recorrente recurso da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou a impugnação apresentada pela aqui Recorrida totalmente procedente, e nessa conformidade anulou a liquidação impugnada, tudo com as legais consequências, concluindo assim a Recorrente pela sua revogação.
2. Na perspectiva da aqui Recorrida, o Tribunal de 1ª instância decidiu de forma justa e conforme a legislação em vigor.
3. Porquanto, consta dos factos dados como provados que “1. Em 1/7/2011 foi emitida a fatura nº ...7 relativa à venda, pela sociedade espanhola “[SCom01...], SL”, com sede em ..., de um veículo automóvel de matrícula espanhola “.... GNM”, de marca Mercedes Benz, Modelo E 280 CDI, a favor da agora impugnante” tendo ficado ainda provado que dessa fatura consta (em idioma castelhano) que “Este automóvel tem 345.289 quilómetros”.
4. A aqui recorrida transportou a viatura, pelos seus próprios meios, por estrada, desde ... para Portugal e isso justifica que a mesma apresentasse 348.349 km em 6/7/2011, aquando da inspeção técnica para o IMTT.
5. A Alfândega não negou nem alegou factos que permitam contrapor - nem o poderia fazer uma vez que a aqui recorrida diz a verdade.
6. Ou seja, a Alfândega não demonstra ter efetuado qualquer diligência de apuramento desses factos, para apurar se a impugnante, aqui recorrida, praticou alguma ação conducente à adulteração do hodómetro antes da data da compra que fez em 1/7/2011, ou se ela sabia da existência dessa adulteração ou para saber quem era o requerente do serviço prestado na [SCom02...], se era a agora recorrida a utilizadora do automóvel.
7. Pelo que, não podia o Tribunal recorrido ter dado como assentes, factos para os quais não constavam dos autos elementos probatórios suficientes nem para os quais tinha grau de convicção suficiente.
8. Igualmente no âmbito do processo n.º 145/15.2BEAVR, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, Unidade Orgânica 2, e que também deu razão ao recurso apresentado pela aqui recorrida, na sua sentença refere “Por outro lado, a testemunha inquirida – agente aduaneiro e autor da DAV datada de 7/7/2011, onde consta que a viatura apresentava 345.289 km – reconheceu que essa indicação não resulta de qualquer verificação física do hodómetro da viatura efetuada por si na data indicada, mas que se limitou a copiar o número de quilómetros que constava da fatura de compra de 1/7/2011 (acrescentou que o procedimento atual já não é esse). Ou seja, está provado que, nesse âmbito, não existe efetivamente qualquer discrepância “para mais” gerada no período de 1/7/2011 a 7/1/2011 (...).”
9. Por outro lado, também não se percebe se o Autuante considera falsa a declaração, na Alfândega, de que o veículo percorreu 1255km por dia, em média, nos últimos 234 dias ou se considera falso que a viatura indicava efetivamente no seu conta-quilómetros o número 345.289.
10. Considera a Recorrida que também na fundamentação de Direito, o tribunal recorrido esteve, na perspetiva da contra-alegante, muito bem na sua análise.
11. Destarte, a douta sentença recorrida não merece qualquer censura, fez correcta interpretação da lei e consequente aplicação desta aos factos, devendo por isso ser integralmente mantida, aderindo-se na íntegra ao seu teor.
TERMOS EM QUE NEGANDO PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMANDO A DECISÃO RECORRIDA, FARÃO V. EXAS., A ACOSTUMADA JUSTIÇA!»
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 179 e ss. do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida errou ao julgar que não resultava da avaliação do veículo automóvel adquirido pela recorrida qualquer irregularidade que legitimasse a liquidação oficiosa do Imposto Sobre Veículos em razão do factor quilometragem no apuramento do valor comercial da referida viatura ao abrigo do disposto no nº 3, do artigo 11º, do CISV.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 De facto
2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Compulsados os autos e analisada a prova documental apresentada e não impugnada, encontra-se assente por provada a seguinte factualidade:
1. Em 01-07-2011 foi emitida a fatura n.º ...7 relativa à venda, pela sociedade espanhola “[SCom01...], SL”, com sede em ..., de um veículo automóvel de matrícula espanhola “.... GNM”, de marca Mercedes Benz, Modelo E 280 CDI, a favor da agora Impugnante (fls. 10 do processo físico);
2. Dessa fatura consta (em idioma castelhano) que “Este automóvel tem 345.289 quilómetros” (fls. 10 do processo físico);
3. Em 06-07-2011 foi emitido “certificado de aprovação em inspecção técnica para matrícula”, destinado a ser apresentado no Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, IP, para matrícula do veículo acima referido, dele constando que o mesmo indicava 348.349 km (fls. 11 do processo físico);
4. Em 07-07-2011 foi emitida a DAV (declaração aduaneira de veículo) para o automóvel acima referido, nele constando que tem 345.289 km (fls. 9 do processo físico);
5. A indicação dos quilómetros que consta da DAV aludida no ponto anterior foi feita pelo agente aduaneiro com base no número de quilómetros que consta da factura (cfr. ponto 5. do Relatório de Inspecção, a fls. 4 v.º do Proc. CF/CP/...0/2014 apenso);
6. Com base nos factos verificados no âmbito da ação da ação de fiscalização nº 14-0163 da Alfândega ..., em 27-06-2014 foi elaborado o Relatório Final, que se dá por integralmente reproduzido, e que tem, nomeadamente, o seguinte teor: “(…) Em 2011-07-07, foi declarado o veículo de marca Mercedes-benz, matricula espanhola ....GNM e chassis n.º ...17, na Alfândega ..., através da DAV n.º 2011/......4, pelo sujeito passivo «AA», NIF: ...54.
Pelo sujeito passivo foi através de requerimento datado de 2011-07-06, solicitada a tributação em sede de ISV, por aplicação da fórmula de cálculo prevista no n.º 3 do artigo 11.º (método de avaliação) do Código do Imposto sobre Veículos (CISV), aprovado pela Lei n.° 22-N2007, de 29 de junho. Na instrução do processo de legalização foi apresentada a. avaliação 1975, efetuada pela "EUROTAX", em 2011-07-06. Na referida avaliação verifica-se que a quilometragem apresentada é de 345.289 Km, o preço em novo é de €70.351, a cotação de venda Eurotax Guia é de €44.450, valor de venda é de €15.417 e o valor de compra proposto é de €10.877.
Através do certificado de aprovação em inspecção técnica para matrícula n° KA.....53, emitido em 2011-07¬06, a viatura apresentava 348.349 km. De acordo com o processo de legalização da viatura, verifica-se que a mesma deu entrada em território nacional em 2011-07-02 pelos próprios meios.
Do controlo cruzado com os dados emanados pela Mercedes Benz em 2013-10-21, apurou-se na intervenção a que a viatura foi sujeita em 2010-11-15 na [SCom02...], a mesma marcava no conta-quilómetros 51.494 Km. Em 2011-07-07, a viatura foi apresentada na Alfândega ... com um valor comercial de €15.417, valor este considerado na ficha técnica de avaliação e que levou a determinação do valor comercial de €15.725,34. A viatura foi tributada em sede de ISV por aplicação da fórmula de cálculo, prevista no n.° 3 do artigo 11.0 do CISV (método de avaliação), tendo sido apurado e cobrado o montante de ISV de € 4.567,80.
Em suma e considerando que a viatura aquando da última intervenção (2010-11-15) na Mercedes-Benz marcava no conta-quilómetros 51.494 Km e em 2011/07/07 aquando da apresentação na Alfândega ... marcava 345.289 Km apura-se que entre as duas fases decorreu um período de 234 dias percorreu 293.795 Km, o que faz uma média de 1.255 km/dia.
Considerando ainda a data em que a viatura foi submetida à inspeção técnica (06-07-2011) e a data em que foi apresentada na Alfândega ... (201107-07), constata-se que a mesma foi apresentada no dia seguinte á inspeção com menos 3.060 Km do que aqueles que constam do certificado de inspeção emitido.
Considerando a diferença de quilómetros encontrada fica demonstrado e documentado estarmos perante uma situação indiciadora de uma alteração para mais dos quilómetros da viatura.
Fica ainda demonstrado que a viatura foi apresentada com um valor de quilómetros que não eram reais face aos constantes no certificado de inspeção técnica.
8. CONCLUSÕES FINAIS / FUNDAMENTOS LEGAIS DO PROJETO
8.1. Projeto de Conclusões
Ora, sendo a quilometragem um dos factores que influencia o valor de um veículo usado, valor esse que por sua vez vai ser decisivo no cálculo do imposto, quando o sujeito passivo requer que o mesmo seja calculado nos termos do n.º 3 do artigo 11.0 (método de avaliação) do CISV, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, verifica-se que, no presente caso, o processo foi instruído com documentos que não correspondem à realidade dos factos, documentos esses que são da inteira responsabilidade do declarante/proprietário à data da DAV, pelo que não se encontram reunidos os requisitos necessários para que sejam aplicadas ao veículo as taxas aplicadas no método de avaliação.
Considerando a Instrução de Serviço n.º 35008/2013, Série II de 2013.03.26 da Divisão do Imposto sobre Veículos e que mereceu despacho de Sr.
Subdirector-Geral, Dr. A. «BB», no qual refere a aplicação da tributação para estes casos.
Assim sendo, o veículo deverá ser sujeito à tributação através do valor médio de referência indicado nas publicações especializadas quilometragem média / teórica indicada na revista Eurotax) ou seja, a 1ª parte do factor V, enunciado no n.º 3 do artigo 11.0 do CISV, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007 de 29 de Junho e que resulta no seguinte imposto a liquidar.
Por conseguinte, no factor V da fórmula de cálculo, que representa o valor comercial do veículo será considerado o valor da cotação Eurotax sem a subtracção do valor respeitante à correcção quilométrica.
Assim:
(…)
Proposta de liquidação de ISV por aplicação da fórmula considerando factor V da fórmula de cálculo, que representa o valor comercial do veículo em função do valor da cotação Eurotax sem a subtracção do valor respeitante à correcção quilométrica, n.º 3 do art.º 11.º do CISV, conforme se demonstra:
PROCESSO (DAV) OBS
MARCA MERCEDES-BENZ
MODELO E 280 CDI
DATA 1 .a MATRÍCULA 14-07-2009
PAÍS PROVENIÊNCIA Espanha
CLASSIFICAÇÃO LIGEIROS PASSAGEIROS
TABELA A
COMBUSTÍVEL GASOLEO
CILINDRADA (CM3) 2987
CO2 (G/KM) 183
PARTICULAS (G/KM) 0,023_
9. Tabela 1- Características do veiculo
COMPONENTE 'V' (VALOR COMERCIAL) 44.450,00 E
COMPONENTE "VR" (PREÇO DE VENDA EM NOVO)70.351,00 E
10.
Tabela 2- valores apurados na avaliação Eurotax
CALCULO DA COMPONENTE Y + C
TAXA PARCELA A ABATER MONTANTE
CILINDRADA CM 3 – Y 2987 4,34 E 4.964,37 E7.999,21 E
CO2 EM G/KM – C 183 166,53€ 20.761,61 E
Coeficiente de atualização ambiental - 1,05 174,86 E 21.799,69 E10.199,05 E
TOTAL - Y + C 18.198,26€
Tabela 3- Calculo da componente Y+C
Aplicação da Formula:
ISV = (V: VR) x (Y + C)
ISV =44.450,00: 70.351,00 € x18.198,26 € 11.498,24
Agravamento art° 70, n°3 do CISV 500,00
Total de ISV 11.998,24
Tabela 4 – Cálculo de ISV
Face ao acima exposto e considerando as tabelas, o montante de imposto a liquidar pela aplicação da fórmula, em que o factor V da fórmula de cálculo representa o valor comercial do veículo em função do valor da cotação Eurotax sem a subtracção do valor respeitante à correcção quilométrica, o valor de ISV a pagar é de € 11.998,24 (onze mil novecentos e noventa e oito euros e vinte e quatro cêntimos), nos termos do artigo 7.º do CISV.
Considerando que em 2011-07-13, através do movimento de caixa nº ...134, o sujeito passivo pagou o valor do ISV € 4.567,80 (quatro mil quinhentos e sessenta e sete euros e oitenta cêntimos), correspondente ao valor determinado pela aplicação do método de avaliação do veículo nos termos do artigo 11.º do CISV.
Considerando que o valor de ISV apurado no presente relatório através da tabela 4 é de €11.998,24, que foi pago o valor de €4.567,80, encontrando-se por liquidar a quantia de € 7.430,44 (sete mil quatrocentos e trinta euros e quarenta e quatro cêntimos).
(…)
8.2. Audição prévia
(…)
No entanto e após informação enviada via email pela [SCom02...] em ..., registada nesta Alfândega sob o n.º ..51 de 23-07-2014, verifica-se que após a aquisição (01-07-2011) a viatura foi, de acordo com a tabela abaixo, submetida a três intervenções:
Data Quilometragem Detalhes
26-06-2013 151.086 Serviço de manutenção
26-06-2013 151.086 Substituir para-brisas
17-01-2013 126.010 Substituir coletores de escape

11.
Conforme se verifica na tabela acima uma das intervenções foi realizada em 17-01-2013 e a quilometragem registada era de 126.010 Kms. As outras duas intervenções realizaram-se no mesmo dia, 26-06-2013, sendo a quilometragem de 151.086 Kms. Neste sentido e tratando-se de intervenções realizadas após aquisição, estas são do conhecimento do sujeito passivo.
Em suma e perante os factos apresentados no ano 2013 a viatura apresentava uma quilometragem muito inferior à declarada na DAV e a registada pelo Centro de inspeções.
É facto provado que no dia 26-06-2013, a viatura tem menos 197.263 Kms do que a quilometragem registada no certificado emitido pelo IMTT em 06-072011.
(…)
a informação prestada pela [SCom02...] menciona as datas, a quilometragem e os detalhes das intervenções que aquele veículo foi sujeito em território nacional antes e a posteriori da aquisição (ver tabela abaixo), desconhecendo-se se a empresa espanhola proprietária do veículo não teria negócios ou outros assuntos em Portugal.
Data Quilometragem Detalhes
26-06-2013 151.086 Serviço de manutenção
26-06-2013 151.086 Substituir para-brisas
17-01-2013 126.010 Substituir coletores de escape
29-03-2011 56.978 Repara sinistro
16-11-2010 . 51.494 Serviço de manutenção
12-05-2010 25.270 Serviço de manutenção
19-03-2010 17.593 Montar alarme
19-03-2010 17.593 Substituir vidro de porta
(…)
8.3. Conclusões finais:
1- Considerando as conclusões do relatório projeto relatadas no ponto 8.1 cuja ação se concretizou na comparação da quilometragem do veículo legalizado ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 11.º do CISV, através do método avaliação com a quilometragem registada na marca (Mercedes-Benz), antes da introdução no consumo do veículo e consequente apuramento de diferença de imposto.
2- Considerando que o sujeito passivo, «AA», em sede de audição prévia veio pronunciar-se sobre os factos imputados mas nada acrescentou ou modificou uma vez que foram apresentados dados que comprovam que a viatura foi legalizada com uma quilometragem elevada face à real que a mesma possuía à data da apresentação na estância aduaneira.
3- Considerando a tabela 6 do presente relatório conclui-se que a viatura em todas as intervenções que foi submetida após o processo de legalização nunca registou igual ou superior à que consta do dito processo de legalização.
4- Que a legalização da viatura ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 11.º do CISV, teve por base uma quilometragem não real que originou a obtenção de um benefício e vantagem fiscal em veículo tributável;
5- Considerando que em relação à infração o sujeito passivo nada solicitou nos termos do art.º 29º e 30º do RGIT.
4- Considerando a Instrução de Serviço n.º 35008/2013, Série II de 2013.03.26, da Divisão do Imposto sobre os Veículos e que mereceu despacho do Sr. Subdirector-Geral, Dr. A. «BB», no qual refere a aplicação da tributação para estes casos.
5- Considerando o art.º 7º do CISV e as tabelas n° 1,2,3 e 4, do ponto 8.1 do presente relatório, o montante de imposto a liquidar pela aplicação da fórmula, em que o factor V da fórmula de cálculo representa o valor comercial do veículo em função do valor da cotação Eurotax sem a subtracção do valor respeitante à correcção quilométrica, o valor de ISV a pagar é de €11.998,24 (onze mil novecentos e noventa e oito euros e vinte e quatro cêntimos);
6- Considerando que o valor de ISV apurado no presente relatório através da tabela 4 é de €11.998,24, que foi pago o valor de €4.567,80, encontrando-se por liquidar a quantia de €7.430,44 (sete mil quatrocentos e trinta euros e quarenta e quatro cêntimos).
7- Em suma, pelos fatos constatados, conclui-se que o sujeito passivo obteve um benefício e vantagem fiscal em veículo tributável, por meio de falsas declarações, conforme se pode constatar no processo de regularização fiscal do veículo, através da DAV” (cfr. fls. 5 e seguintes do Proc. CF/CP/...0/2014 apenso);
7. O Relatório Final que antecede foi enviado à Impugnante através do ofício nº ...13, de 14-08-2014, remetido sob registo postal cujo aviso de recepção foi assinado em 21-08-2014 (fls. 14 e 14 v.º do Proc. CF/CP/...0/2014 apenso);
8. Em 03-09-2014, através do ofício nº ...68, de 27-08-2014, remetido sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado naquela data, a Alfândega ... notificou a Impugnante, entre outras situações, para pagar o valor de € 8.339,19, no prazo de 10 dias úteis, dando conta de que se tratava de valor apurado no Relatório da Acção n.º 14-0163, já notificado (fls. 15 e 16 do Proc. CF/CP/...0/2014 apenso);
9. A presente impugnação foi apresentada na Alfândega ..., remetida por carta registada com data de 25-11-2014 (fls. 3 a 13 dos autos em suporte físico).
2.2. Factos não provados
Não há factos a dar como não provados com interesse para a decisão da causa.
A decisão quanto à matéria de facto dada como provada realizou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos e do processo administrativo, conforme é especificado nos vários pontos da matéria de facto provada.


2.2 De direito
Está em causa no presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela Impugnante, contra a liquidação do Imposto Sobre veículos (ISV), relativa à introdução no consumo, no território nacional, de veículo automóvel procedente de Espanha, adquirido pela aqui Recorrida, no estado de usado, emitida na sequência de acção de fiscalização da Alfândega ... realizada ao sujeito passivo, com o objetivo de proceder ao controlo da quilometragem do veículo apresentado pela Declaração Aduaneira de Veiculo (DAV) datada de 07.07.2011, nela constando que tem 345.289 Km, no que concerne aos elementos apresentados para cálculo do ISV com recurso ao métodos alternativo, no âmbito da qual a AT concluiu que a titular da referida DAV beneficiou indevidamente de uma redução em sede de imposto (ISV) decorrente de um valor comercial do veículo inferior ao que deveria ter sido considerado, sendo que tal vantagem fiscal foi obtida mediante a prestação de falsas declarações, em consonância com a viciação do respectivo conta-quilómetros.
A este respeito, a Mma. Juiz a quo considerou, no essencial, que se bem que possa ter ocorrido manipulação do conta-quilómetros, para mais, atento os elementos descritos no probatório, nada permite concluir que tal manipulação não tenha ocorrido antes da aquisição do veículo pela Impugnante, pois dos autos não existem elementos que permitam concluir que esta tinha conhecimento da alteração, a fez ou a mandou fazer a alguém.
Mais se consigna na sentença que a prova dessa manipulação cabe à Alfândega, nos termos do artigo 74º, nº 1 da LGT, não podendo ancorar-se em meras conjeturas e inverter o ónus da prova fazendo recair sobre o contribuinte a demonstração de que a sua declaração era verdadeira.
Discorda a Recorrente alegando erro de julgamento, formulando uma única conclusão que aqui se transcreve “A sentença recorrida, ao considerar que os elementos factuais demonstrados pela Alfândega não são suficientemente sólidos para convencer sobre a grande probabilidade de que a declaração do Impugnante não corresponde à verdade, enferma de erro de julgamento.”.
Se bem interpretamos as alegações e conclusões de recurso, aderindo ao espelhado no parecer do Exmo. Procurador do MP, diremos que AT pretende fazer valer o seu entendimento de que está legitimada a recorrer à avaliação do veículo nos moldes em que o fez, ou seja, com base no valor médio de referência indicado nas publicações especializadas, em observância do fator V da fórmula de cálculo a que se refere o artigo 11, nº 3 do CISV, assente de que a realização de 1 255 KM/dia durante 234 dias constitui um elemento suficientemente sólido para convencer que a declaração da Impugnante não corresponde à realidade, passando a caber a esta, enquanto sujeito passivo, o ónus da prova da veracidade dos factos que declarou e sendo irrelevante a autoria da manipulação do conta-quilómetros.
Vejamos.
A sentença sob recurso ostenta o seguinte discurso fundamentador:
«É manifesto que a Recorrente não pretende invocar o vício de forma correspondente a falta de fundamentação (em sentido formal), referida nos artigos 268.º n.º 3 da CRP e 152.º do CPA. Com efeito, ao dizer que “efectivamente a presente impugnação consubstancia-se no desfasamento entre a realidade factual e a realidade registral ou lapso de escrita do interveniente no processo, isto é, de quem transcreveu para a DAV a quilometragem da viatura ..-LX-..” [artigo 3º, a), da p.i., a fls. 4 do processo físico], a Recorrente pretende impugnar com fundamento em vício material correspondente a erro sobre os pressupostos de facto e ou de direito em que assentou a liquidação, porque “na versão da recorrente a quilometragem apresentada aquando da sua aquisição (01-07-2011) seria pseudo-correta porque foi a apresentada no conta-quilómetros no momento da sua aquisição e nunca deu conta de ter sofrido qualquer alteração anormal ou contra-natura. Dedução essa que saí corroborada pelo facto de aquando da sujeição da viatura à inspeção técnica de 06-07-2011 a referida quilometragem veio a confirmar-se e totalmente em consonância com a do momento da sua aquisição, acrescida de 3.060km, que fora a distância percorrida entre ... e Portugal e entre a Figueira da Foz e - Aveiro -......., e vice-versa nos dias que distam entre a aquisição e a sujeição à inspeção técnica” e “como facilmente se depara, a recorrente não tem o manifesto controle dos factos que ditaram a menção da referida quilometragem no momento da emissão da factura em seu nome. (…) Apenas o que sabe e constata é que efetivamente constam tais dizeres, mas (…) nunca lhe poderá ser atribuído o nexo-causal entre tais inclusões e a alegada falsidade de declarações de que vem acusada” (fls. 5 a 7 do processo físico).
Retira-se dessas alegações da Impugnante que pretende invocar que desconhecia a quilometragem que viatura exibia no seu conta-quilómetros antes da aquisição, isto é, antes de 01-07-2011, e que, se houve algum erro no preenchimento da factura ou da DAV, tais factos não lhe podem ser imputados a si.
Vejamos, então, se há o invocado erro nos pressupostos de facto e/ou de direito.
A Alfândega, na contestação, defende que está legitimado o recurso à avaliação do valor comercial do veículo efectuada pela Eurotax, com ponderação da quilometragem média para o tempo de matrícula do veículo, já que, em acção de fiscalização, foi apurado, através de informação prestada pela Mercedes Benz Portugal, SA, que o veículo tinha como último registo, em 15-11-2010, na [SCom02...], em ..., 51.494 kms e que, em 06-07-2011, aquando da inspecção técnica para a matrícula, registava 348.349 kms, e que a diferença de 293.795 kms reportada a 234 dias, dava um valor de 1.255 kms por dia, que era inverosímil, concluindo-se pela manipulação do instrumento de registo de quilómetros e, consequentemente, pela impossibilidade de recurso ao método de avaliação consagrado no n.º 3 do art. 11.º do CISV, na medida que, pela sua incerteza, não havia possibilidade de levar o factor quilometragem à ponderação do valor comercial do veículo, tendo-se procedido à tributação do veículo com base no valor médio de referência indicado nas publicações especializadas, ou seja, em observância da 1.ª parte do factor “V” da fórmula de cálculo a que se refere o art. 11.º n.º 3 do CISV.
De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 75.º da LGT, “Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.”.
Por seu turno, o n.º 1 do art. 74.º da LGT dispõe que “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Significa isto, no que ao caso em apreciação diz respeito, que, se a Alfândega ... entende que a declaração e os documentos apresentados pela Impugnante estão errados e que os quilómetros do veículo adquirido eram muito inferiores aos declarados, compete-lhe o ónus de o demonstrar. Só depois passa a competir à Impugnante o ónus de demonstrar que os juízos em que assentaram as conclusões da Alfândega, que validaram as correcções efectuadas, estavam errados.
Ou seja, no caso, terá que se averiguar se os pressupostos da actuação da Alfândega se encontram verificados e, em caso afirmativo, se dos autos resulta demonstrada a existência de fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, caso em que o acto tributário deverá ser anulado.
Isto porque, nesta matéria, rege o art. 100.º do CPPT que, no seu n.º 1 dispõe que “Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado”.
Tal como tem sido decido de forma recorrente pela jurisprudência dos Tribunais
Superiores, “Em sede de impugnação judicial, actualmente, no âmbito da vigência do CPPT, cabe à Administração Fiscal assentar os pressupostos que levaram à tributação, em juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, em que a maior parte das vezes, não é possível;
E ao contribuinte, que alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação” (cfr. Acórdãos do TCA Sul, de 07-07-2009, 1110-2011, 12-05-2010, 20-01-2009, proferidos nos proc. n.º 02827/09, 04238/10, 03493/09 e 01968/07, respectivamente).
Voltando ao caso concreto, de acordo com o relatório de inspecção, que fundamentou a liquidação impugnada, em 15-11-2010 a viatura aqui em causa foi objecto de uma intervenção física numa oficina da Mercedes Benz, em ..., que verificou que o conta-quilómetros registava 51.494 km, e que, cerca de 8 meses depois, em 01-07-2011, a Impugnante comprou essa viatura a uma empresa espanhola que declarou na factura que o conta-quilómetros registava 345.289 km.
Em Portugal, o veículo foi inspecionado para atribuição de matrícula e submetido aos procedimentos alfandegários quando o conta-quilómetros registava 348.349 km.
Ou seja, a actuação da Alfândega baseou-se na comparação entre os quilómetros registados na última intervenção da Mercedes antes da aquisição e os quilómetros registados pelo vendedor espanhol aquando da venda do veículo.
Do relatório resulta não resulta ter havido verificação física do veículo.
Entre 15-11-2010 e 07-07-2011 decorreram cerca de 8 meses. Nesse período o conta-quilómetros registou uma variação positiva de 293.795km, o que significa que o carro terá percorrido, em média, 1.255 quilómetros por cada dia, durante esses 8 meses.
É difícil, mas não fisicamente impossível.
De qualquer maneira, pressupondo que houve manipulação do conta-quilómetros, não se percebe qual a factualidade que terá levado a Alfândega a concluir que a Impugnante era a autora desse acto, sendo certo que isso ocorreu antes da aquisição. Mesmo tendo em conta a informação de que em 2013 o veículo apresentava quilometragem inferior à apresentada na Alfândega, a verdade é que nunca é dito que o veículo ainda pertencia à Impugnante nessas datas ou que terá sido ela a ordenar as respectivas reparações.
Crê-se que os factos descritos no probatório apontam no sentido de que, a ter havido manipulação, terá acontecido necessariamente antes da aquisição da viatura pela Impugnante.
É isso que resulta da documentação emitida na altura da venda, ainda em Espanha.
Ora, dos autos não consta qualquer elemento que permita acompanhar a tese da Alfândega ... segundo a qual a Impugnante manipulou ou mandou manipular o conta-quilómetros aumentando o respetivo registo com a intenção de desvalorizar o veículo e reduzir o valor do tributo a pagar pela introdução desse bem no consumo.
A prova desses factos compete à Alfândega, nos termos do art. 74.º n.º 1 da LGT, como acima se disse, que não cumpriu tal ónus, tendo-se limitado a meras conjecturas (que nem sequer estão completamente explicitadas).
E o certo é que, para efeitos de desconsideração do declarado, a Alfândega não pode ancorar-se em conjecturas, tendo antes de alegar e demonstrar elementos factuais suficientemente sólidos para convencer sobre a grande probabilidade de que a declaração do contribuinte não corresponde à verdade.
Ora, o que a Alfândega fez foi invertendo o ónus da prova, pôr a cargo da contribuinte a demonstração de que a sua declaração era verdadeira.
Esta actuação da Alfândega é legalmente inadmissível, nos termos vistos.
Na verdade, os indícios recolhidos pela Alfândega, constituindo uma situação pouco comum (a efectivação de tantos kms por dia) apenas lhe permitia iniciar um processo de averiguação mais minucioso, na busca de factos concretos indiciadores de que teria havido, de facto, manipulação do conta-quilómetros.
Ou seja, tudo visto e pesado, entende o Tribunal que a Alfândega não assentou os pressupostos que levaram à tributação em juízos de probabilidade elevada, não tendo conseguido demonstrar que a declaração da Impugnante estava errada e que os quilómetros do veículo eram inferiores aos declarados.
Por isso, sendo à Alfândega quem competia, em primeira linha, o ónus de o demonstrar – como acima se viu –, não tinha a Impugnante que provar o contrário, mantendo-se incólume a presunção de veracidade da sua declaração.
Tanto vale para concluir que a impugnação tem que proceder por aqui, verificando-se ter havido erro nos pressupostos de facto e de direito na liquidação.
Não sendo devido o imposto, também não são devidos os juros compensatórios.» (fim de citação)
Há que referir que esta questão não é nova, tendo este Tribunal Central Administrativo Norte em acórdão proferido em 02.07.2020, proferido no âmbito do proc. n.º 1021/15.4BEAVR (disponível para consulta em www.dgsi.pt), em que se apreciava situação em tudo idêntica à destes autos, sendo a sentença da 1ª instância subscrita pela mesma Juíza e ali intentado também recurso pela FP, com idênticos fundamentos.
Acolhendo-se o discurso fundamentador do citado acórdão, aqui o transcrevemos, com as necessárias adaptações, no seu trecho significativo para a sorte do recurso:
Dos factos apurados na ação inspetiva, o entendimento de que teria havido qualquer adulteração ou manipulação na DAV apresentada para o efeito pelo contribuinte quanto a esse “item”, tendo considerado, para apuramento do valor comercial do veículo apenas o valor médio de referência indicado na publicação especializada do sector apresentado pelo interessado, sem ter em conta a ponderação da avaliação do veículo reportado ao fator concreto da respetiva quilometragem dela constante, resulta em mero juízo conclusivo de que tal indicação não seria a correta e não de qualquer facto apurado que demonstrasse a inveracidade dos elementos que a sustentavam, ónus que a si cabia, como bem refere a sentença recorrida, sendo para mais certo que os elementos que serviram de base á primitiva liquidação do tributo ao abrigo do referido nº 3, do artº 11º, não se limitaram aos elementos constantes do DAV por si fornecidos, já que no caso de introdução ao consumo de tais veículos por particulares tal declaração aduaneira tem de ser acompanhada dos documentos referidos no nº 2, do artº 20º daquele Código, do qual consta o correspondente certificado de conformidade tendo-lhe sido exigido e junto um certificado de aprovação em inspeção técnica para matricula dado que o mesmo já não possuía certificado de matricula estrangeiro por o mesmo havia sido cancelada, e documento de compra da viatura, do qual constava os referidos registos de quilómetros devidamente quantificados, pelo que em caso de dúvida pelos elementos recolhidos pela I.T. ( em sede de intervenção técnica sobre o veículo ainda no âmbito da vigência da sua matriculação no estrangeiro), caberia à ATA indagar e infirmar, se assim fosse o caso, daquela falta de aderência á realidade dos valores assim registados, como salienta o Mº Juiz do Tribunal “A Quo”, não resultando dos autos qualquer elemento que permita considerar como especialmente qualificados para o efeito o indicado pela empresa que procedeu á intervenção técnica na viatura relativa a diferente relação jurídica pelo menos quanto aos seus sujeitos. E a ATA, tendo dúvidas sobre a consideração desse concreto fator, não estava impossibilitada de averiguar, aquando do procedimento avaliativo por si desenvolvido, de outros fatores relativos ao estado mecânico e conservação da viatura, de que expressamente prescindiu realizar, pelo que, ao conformar-se com os elementos anteriormente constantes daquela determinação do imposto assim liquidado, carece de suporte legal a invocada irregularidade de tal liquidação atinente a anterior procedimento avaliativo assim firmado na ordem jurídica, inexistindo qualquer disposição legal em sede do mencionado tributo que permita á ATA promover uma segunda avaliação por não concordar com anterior resultado avaliativo e caso tal fosse viável, então impunha-se oficiosamente a sua realização, o que não foi o caso, pelo que não pode proceder a pretensão recursiva formulada pela F.P., decisão a que se procede na parte dispositiva do presente Acórdão”.
Acolhendo-se o presente discurso fundamentador improcede o presente recurso, o que se determinará.

2.3 Conclusões
I. Sempre que se verifique a introdução no consumo, por particulares, de veículos usados sujeito a Imposto Sobre Veículos, após a liquidação provisória de acordo com a “tabela D”, a que se refere o nº 1, do artº 11º, do Código, pode ser requerido a determinação do valor comercial, nos termos considerados no nº 3, do mesmo preceito legal, podendo o mesmo revestir-se de um procedimento avaliativo que tem em consideração certos factores concretos vertidos na lei.
II. Tendo-se efectuado tal avaliação do veículo, sendo em concreto considerado o factor de ponderação relativo à quilometragem, tendo o contribuinte cumprido as suas obrigações relativas a sua introdução no consumo através da apresentação de Declaração Aduaneira de Veículo (DAV), sendo o mesmo acompanhado dos documentos que comprovam os elementos pertinentes à sua determinação (nº2, do artigo 20º, do CSV), resulta fixado aquele valor de avaliação).
III. Efectuada uma liquidação definitiva do imposto nos termos do disposto na alínea c), do nº 1, do artigo 25º, do CISV, não é licita a realização de uma liquidação oficiosa ao abrigo do disposto no artigo 26º, do mesmo diploma legal, com fundamento em novos elementos obtidos após aquele procedimento avaliativo sem o respaldo legal da possibilidade de realizar nova avaliação, tendo-se firmado na ordem jurídica o resultado daquela avaliação.

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente.

Porto, 07 de março de 2024


Irene Isabel das Neves
Carlos de Castro Fernandes
Paula Moura Teixeira