Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00655/12.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/24/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:PAULA MOURA TEIXEIRA
Descritores:IRC, IVA;
CORREÇÕES POR MÉTODOS DIRETOS E INDIRETOS;
QUANTIFICAÇÃO; ÓNUS DA PROVA;
Sumário:
I. O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial.

II. Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados.

III. A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).

IV. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso da respetiva quantificação nos termos do n.º 3 do artigo 74.º da LGT.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, [SCom01...], Lda., NIPC ...71, melhor identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Fiscal Administrativo do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial IRC do exercício de 2008, no valor de € 3.272,92, e juros compensatórios.
Por ordem do tribunal, foram apensadas ao presente processo as seguintes impugnações judiciais:
· 659.12.6BEPRT, referente a IRC do exercício de 2009, liquidação adicional com o valor de €9.703,50, e juros compensatórios;
· 714.12.2BEPRT, referente a IVA devido pelo exercício de 2008, liquidação adicional com o valor de €12.068,56, e juros compensatórios;
· 715.12.0BEPRT, referente a IVA devido pelo exercício de 2009, liquidação adicional com o valor de €18.642,41, e juros compensatórios, no valor global de € 43.687,39.

A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

A) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo TAF Porto que julgou improcedente a impugnação da liquidação de IRC relativa a 2008 e a que foram apensados os processos de impugnação judicial:
Nº 659/12.6BEPRT, relativo a IRC de 2009;
Nº 714/12.2BEPRT, relativo a IVA de 2008 e
Nº 715/12.0BEPRT, relativo a IVA de 2009
B) A então impugnante e ora recorrente atacou quer as liquidações decorrentes de fixações de matéria efetuadas através de correções meramente aritméticas, por erro nos pressupostos de facto e de direito, quer as decorrentes do recurso à avaliação indireta, por violação de lei, falta de fundamentação (vício dos pressupostos) e excesso de quantificação,
C) Argumentos que o tribunal recorrido não atendeu, validando o procedimento da AT e as consequentes liquidações efetuadas.
D) O tribunal julgou incorretamente quando valida as liquidações decorrentes de correções meramente aritméticas à matéria coletável com base na informação que consta da coluna detalhes do ficheiro pontos,
E) Tomando apenas a informação relativa ao valor bruto dos serviços e olvidando os abatimentos decorrentes da atribuição de pontos aos clientes,
F) Abatimentos que o tribunal não ignora mas de que não resultou qualquer consequência prática,
G) Levando-o a validar tributações de rendimentos efetivamente não auferidos, o que faz incorrer a sentença em vício de violação de lei.
H) O tribunal validou, ainda, decisões da AT (alterações aos proveitos registados e consequentes liquidações) feitas com base em pressupostos irreais, quais sejam os de que a “última modificação” tinha ocorrido na data indicada pela AT quando os elementos juntos à PI permitem concluir o contrário
I) Do mesmo modo o tribunal também não avaliou a alegação da ora recorrente que afirmava inexistir qualquer fundamento racional para “modificações” em datas fiscalmente inócuas.
J) O tribunal não apreciou, adequadamente, os argumentos vertidos pela ora recorrente quanto às razões por que se verificaram falhas na sequência numérica das linhas,
K) Assim incorrendo em erro de julgamento.
L) No que respeita à avaliação indireta o tribunal valida, inexplicavelmente, pressupostos de quantificação (o número de talões modificados mas que não deram origem a pontos) que a própria AT não consegue comprovar,
M) Não ignorando, por certo, que a quantificação efetuada pela AT resultou da conjugação do número de talões pelo preço médio de cada um (também arbitrado pela AT),
N) E que a hipotética correção, a justificar-se, deveria corresponder, apenas, à diferença entre o valor estimado e o que a contabilidade já registava,
O) O que se afigura impossível de determinar, por desconhecimento dos talões que serviram de base a tal alteração, desconhecimento assumido pela própria AT (Direção de Finanças ...); sem embargo o tribunal validou o procedimento questionado,
P) Ultrapassando, deste modo, o ónus que impendia sobre a AT, de comprovar os pressupostos de quantificação,
Q) O que torna a sentença viciada.
R) A sentença enferma ainda de contradições quando dá como assente que a informação solicitada pela recorrente relativa à listagem dos talões que originaram correções já havia sido fornecida pela AT em 2010 e, simultaneamente reconhece que a AT afirmou, em 2011 não possui elementos que permitissem responder à questão suscitada.

Termos em que se requer a prolação de acórdão que revogue a sentença em recurso, substituindo-a por outra que conceda provimento aos pedidos formulados nas PI.(…)”

1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso por não se verificarem os vícios alegados.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, com o seu consentimento, submetendo-se à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu: (i) nulidade por contradição, e, (ii) em erro de julgamento de direito e facto.

3. JULGAMENTO DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)
1. A Sociedade Impugnante, foi constituída em setembro de 2006 sob a denominação “[SCom02...], Lda.” assumindo, desde 2008 a atual designação “[SCom01...], Lda.” e encontra-se coletada para o exercício da atividade de “salões de cabeleireiros” com o CAE 096021, a qual é exercida através da exploração de um só salão de cabeleireiro sito na morada da sua sede - facto que resulta do RIT constante de fls. 18 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos;

2. A sociedade encontra-se enquadrada em IVA no regime normal de periodicidade trimestral e em sede de IRC do regime geral de determinação do lucro tributável, não se verificando a existência de faltas declarativas, de pagamentos de montantes de imposto ou de incumprimento de obrigação de pagamentos especiais por conta (PEC) devidos - facto que resulta do RIT constante de fls. 18 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos;

3. No âmbito de uma ação conjunta que incidiu sobre Sujeitos Passivos que desenvolvem a atividade de cabeleireiro, realizada em cumprimento do despacho DI2010....15 e com extensão aos exercícios de 2007 a 2010, foi a sociedade impugnante objeto de consulta e recolha de dados nos computadores utilizados para emissão de faturação, no termo da qual, e considerando as anomalias verificadas, se propôs que esta sociedade deveria ser objeto de ação inspetiva externa de forma a serem confirmadas as situações irregulares detetadas e efetuadas as correções que, nessa sede, venham a revelar-se necessárias - cf. relatório/informação elaborada no termo de tal ação de análise dos programas informáticos de faturação, constante de fls. 535 dos autos e CD correspondente preso na contracapa do processo, documentos juntos com a contestação e cuja junção foi notificada à impugnante, que serviu de base ao RIT que veio a ser elaborado posteriormente, para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

4. Em análise aos valores constantes da declaração anual de informação contabilística e fiscal (IES), declaração Modelo 22 de IRC e DP’s de IVA, dos exercícios de 2007, 2008 e 2009, apurou-se, além do mais, um valor total de proveitos de €277.433,37; €123.076,38 e €119.661,61 em cada um daqueles exercícios, sendo que o total de custos correspondentes foi apurado nos valores de €312.051,31; €179.984,14 e €174.667,80, a que correspondem os resultados líquidos (negativos) de €-34.706,94; €­56.907,76 e €-55.006,19, respetivamente - cf. quadro constante da página 7 do RIT constante de fls. 18 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos, quadro cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
5. Considerado o quadro id. supra, foi feita a análise:
II.3.5. Análises Efetuadas
Proveitos
Tratando-se e um salão de cabeleireiro, a análise incidiu sobre a faturação dos erviços prestados e dos produtos vendidos. Para registo dos proveitos o Sujeito Passivo utiliza um programa de faturação.
(...)
Como documento de suporte aos registos contabilísticos das vendas e prestações de serviços consta um mapa resumo mensal com o total dos movimentos diários repartido entre vendas e prestações de serviços.
No decurso da análise verificou-se a existência de duas fontes de faturação, a do salão e a do escritório, dando origem a dois mapas resumo mensais distintos. A faturação a partir do salão corresponde às vendas de produtos e prestações de serviços de cabeleireiro e estética efetuadas aos clientes do salão, a faturação a partir do escritório respeita à venda de produtos e a prestação de serviços de formação a outros salões de cabeleireiro com sócios comuns, nomeadamente, [SCom01...], Lda. (...).
Apresentam-se nos quadros seguintes os valores mensais faturados pelo salão e pelo escritório nos exercícios de 2007, 2008 e 2009, recolhidos a partir dos referidos mapas e dos registos contabilísticos:
(quadros constantes das páginas 8, 9 e 10 do RIT que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais - destes extrai-se a faturação do salão, no ano de 2007 um total de €83.968,95; no ano de 2008 um total de €92.110,24 e no ano de 2009 um total de €110.887,69; por seu lado a faturação do escritório, apresenta-se com totais, no ano de 2007 de €230.692,58; no ano de 2008 €51.448,99 e no ano de 2009 €31.367,17)
Segundo informação prestada pela gerência, a diminuição dos valores faturados a outros salões de cabeleireiros deve-se ao facto de a concentração das compras de produtos efetuada no salão Anabela & Poça, para posterior fornecimento dos outros salões, com o objetivo de obter vantagens financeiras junto dos fornecedores, não ter dado o resultado esperado,
Perante o motivo que deu origem à presente ação inspetiva, os prejuízos fiscais consecutivos apresentados nas declarações fiscais dos exercícios de 2006 a 2009, foram analisados os dados recolhidos no âmbito de uma ação especial conjuntam a partir do sistema informático utilizado pelo Sujeito Passivo para registo das operações. Em resultado desta diligência, confirmou-se a existência de proveitos omitidos à Administração Fiscal nos exercícios de 2007, 2008 e 2009, que deram origem a correções efetuadas em sede de IVA e de IRC, quer meramente aritméticas, quer com recurso a métodos indiretos, que se encontram descritas e fundamentadas nos pontos III, IV e V deste relatório.
Custos
Foram analisados os custos contabilizados pelo Sujeito Passivo com maior ênfase nas contas “6 - Custo de mercadorias vendidas e matérias consumidas”, “62 - Fornecimentos e serviços externos” e “64 - Custos com pessoal” por terem maior peso no total dos custos e no volume de negócios.
(...)
Na análise da conta “64 - Custos com pessoal” verificou-se que a maior parte dos custos registados na contabilidade resultaram das remunerações do trabalho dependente pagas e respetivos encargos (...)
(...)
Os custos com remunerações dos órgãos sociais respeitam à remuneração de um sócio-gerente, que exerce apenas funções de gerência.
Excluindo o sócio-gerente, o número de funcionários a trabalhar no salão nos exercícios de 2007, 2008 e 2009 variou entre 5 e 8.
No que respeita aos restantes custos, nomeadamente, amortizações e reintegrações do exercício, foram detetadas algumas irregularidades de que resultaram correções aritméticas, em sede de IRC que se descrevem e fundamentam no ponto III deste relatório.
Em sede de IVA foram detetadas falhas no IVA deduzido que deram origem a correções meramente aritméticas, conforme se descreve no ponto III do presente relatório” - cf. ponto II.3 do RIT, páginas 7 a 11, constante de fls. 18 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos;

6. Consideradas as análises realizadas, no que respeita às correções meramente aritméticas, do RIT consta:
III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável:
Na sequência da análise efetuada foram propostas as correções a seguir evidenciadas e fundamentadas:
III.1 Correções em sede de IRC
III.1.1. Proveitos omitidos
Conforme já referido no ponto II.3.5. - Análises efetuadas, foram analisados os elementos do sistema informático de registo das operações utilizado pelo Sujeito Passivo, recolhidos no âmbito de uma ação especial conjunta, tendo-se detetado indícios da existência de proveitos omitidos à administração fiscal nos exercícios de 2007, 2008 e 2009. Na sequência da auditoria efetuada à aplicação informática, verificou-se o seguinte:
ü Nas instalações visitadas, o Sujeito Passivo possuía um computador na receção do salão e outro no escritório, tendo sido, ambos, objeto de cópia e de análise das bases de dados dos programas de faturação.
ü O Sujeito Passivo utilizava dois programas de faturação: Merlin X2, software relativamente recente, utilizado para as prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão; Stylus, utilizado anteriormente ao Merlin X2 para as prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão, e, utilizado para gestão de stocks e para emissão de faturas relativas à venda de artigos a uma empresa do mesmo ramo, com sócios comuns;
ü No programa de faturação Stylus verificou-se a existência de duas bases de dados: CAPESC.MDB, presente no computador do escritório; e CAPS1.MDBm presente do computador da receção do salão
ü Na base de dados CAPESC.MDB consta a faturação de duas filiais: a filial “S1 - Salão Porto” relativa às prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão do salão, no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009; e a filial “E - Porto Sede” para emissão de faturas relativas à venda de artigos a empresas, abrangendo o período compreendido entre 18.01.2007 e 25.05.2010;
ü Constatou-se a existência de divergências entre os valores na base de dados CAPESC.MDB e os valores declarados nas declarações periódicas de IVA em todos os períodos do exercício de 2007;
ü Na mesma base de dados, CAPESC.MDB, concretamente no que respeita à filial “S1 - Salão Porto”, foram apurados factos que comprovam, de forma inequívoca, que houve manipulação dos talões de venda, em data posterior à da sua emissão, realizada através da eliminação de linhas dos talões, com o intuito de reduzir fortemente os valores das prestações de serviços que servem de base ao preenchimento das declarações fiscais (...)
ü Constatou-se a existência de diferenças entre o valor total dos talões obtido a partir das tabelas de cabeçalhos dos talões de venda (Talão-Cab) e obtido a partir das tabelas de linhas dos mesmos talões de venda (Talão-Lin);
ü Constatou-se também, com base numa análise efetuada às várias tabelas da base de dados CAPESC.MDB, a existência de divergências entre a data de emissão dos talões e a data da última modificação dos mesmos talões, em 9571 talões emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009. Grupos de talões relativos a determinados períodos (semana, quinzena, mês, trimestre, ...) apresentam a mesma data da última modificação e uma divergência temporal entre o primeiro e o último talão alterado de apenas alguns segundos ou minutos, o que permite concluir que tais modificações foram efetuadas por processamento automático ou rotina informática e não manualmente.
Constatou-se também que as modificações são frequentemente efetuadas em horas fora do expediente ou em dias não úteis. A título exemplificativo refere-se que 334 dos 599 talões emitidos em outubro de 2007 pela filial S1, foram modificados, tendo o primeiro talão, n.° 4776 de 01.10.2007 sido modificado em 01.11.2007 às 21:05:31 horas e o último, n.° 5374 de 31.10.2007, sido modificado em 01.11.2007 às 21:05:48 horas (...)
(...)
✓ Constatou-se, ainda, a existência de falhas na sequência da numeração das linhas de diversos talões que foram objeto de modificação, sendo que, em alguns talões apenas aparecem linhas referentes aos consumos de artigos em serviços prestados, faltando o registo dos próprios serviços que deveria estar presente nas linhas em falta. Veja-se a título exemplificativo, o talão n.° 14316, no qual se constata que apenas aparecem linhas referentes a consumos de artigos sem serviços prestados, faltando o registo dos próprios serviços que deveriam estar presentes nas linhas em falta (1 e 2 )
(...)
✓ Mais se constatou a existência de divergências significativas entre o valor dos talões constantes da tabela de “pontos”, que possui o registo dos pontos atribuídos aos clientes em função dos serviços e artigos faturados, podendo posteriormente ser trocados por serviços, e o valor dos mesmos talões que se encontram nas tabelas “Talão_Cab” e “Talão_lin”. Importa referir que as divergências detetadas apenas se encontram relacionadas com serviços prestados e não com vendas de artigos. As referidas divergências verificam-se em todos os meses dos exercícios de 2007, 2008 e 2009 em que houve modificação de talões, nos termos referidos anteriormente, emitidos no período compreendido ente 09.02.2007 e 29.08.2009 através do programa de faturação Stylus.
ü Conforme se depreende pelo anteriormente exposto, os talões que deram origem à atribuição de pontos apresentam indícios de manipulação, nomeadamente, a existência de divergências entre a data de emissão e a data da última modificação e a existência de falhas na sequência da numeração das linhas, nas tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lin”, situação que não se verifica nos mesmos talões na tabela “Pontos”. Este facto permite concluir que o valor real dos talões que deram origem à atribuição de pontos, emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009 através do programa de faturação Stylus, é o valor que consta da tabela de “Pontos” e que esses mesmos talões foram objeto de manipulação nas tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lina”;
ü Relativamente à base de dados CAPS1.MDB que, conforme já referido apenas contém registos relativos à filial “S1 - Salão Porto”, verificou-se que os 685 talões emitidos nos meses de julho e agosto de 2009, que foram objeto de manipulação na base de dados CAPESC.MDB, não foram manipulados na base de dados CAPS1.MDB, tendo-se verificado que, em todos eles, o valor presente na base de dados CAPS1.MDB é superior ao da CAPESC.MDB e que na base de dados CAPS1.MDB a data da última modificação à igual à data de emissão, ao contrário do que se passa na base de dados CAPESC.MDB. este facto permitiu concluir que os dados correspondentes às transações efetivamente realizadas pelo Sujeito Passivo nos meses de julho e agosto são os constantes na base de dados CAPS1.MDB e que a base de dados CAPESC.MDB contém dados manipulados.
ü No que respeita ao programa de faturação Merlin.X2, constante no computador da receção do salão, verificou-se a existência das bases de dados Merlin.mdf e Merlin_3.mdf, utilizadas recentemente para registar as transações do salão, contendo os registos das vendas e prestações de serviços do salão efetuadas a partir de 29.08.2009. também nestas bases de dados foram apurados factos que comprovam, de forma inequívoca, que houve manipulação dos talões de venda, com o intuito de reduzir fortemente os valores das prestações de serviços que servem de base ao preenchimento das declarações fiscais que, a seguir, se descrevem de forma sucinta:
§ Constatou-se que na numeração dos documentos de venda emitidos não é seguida uma sequência numérica, conforme disposto no artigo 36º do CIVA. A título de exemplo podemos referir que a primeira fatura registada na base de dados (campo ID da tabela CaisseTicket) possui a numeração ...59 e a segunda a numeração ...62
§ Verificou-se a existência de indícios de que houve eliminação de registos de venda. A base de dados Merlin_3.mdf contém registos de venda que foram eliminados na base de dados Merlin.mdf, facto comprovado através do número de visitas efetuadas por cada cliente constante do campo “NumVisite” dos documentos de venda (...)
Este facto permitiu concluir que os dados correspondentes às transações efetivamente realizadas pelo Sujeito Passivo no período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009 são os constates na base de dados Merlin_3.mdf e que a base de dados Merlin.mdf contém dados manipulados.
Os factos descritos comprovam que houve manipulação dos registos de venda/prestações de serviços, com o intuito de diminuir os montantes das transações realizadas, e, inerentemente, os valores declarados à Administração Fiscal, pelo que, se conclui que estamos perante uma situação de omissão de proveitos relativos a prestações de serviços de cabeleireiro;
Em conformidade com o exposto, o valor dos proveitos omitidos, relativamente aos talões cujo valor original é conhecido, é apurado de uma forma para o período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009, de outra forma para o período compreendido entre 01.07.2009 e 29.08.2009 e de outra forma para o período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009, conforme se apresenta nos pontos III.1.1.1., III.1.1.2 e III.1.1.3 seguintes:
III.1.1.1 Período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009
Para os talões que foram modificados e que deram origem à atribuição de pontos, emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009 através do programa de faturação Stylus, o valor dos proveitos omitidos é o que resulta da diferença entre o valor total dos talões constantes da tabela de “Pontos”, que, conforme já referido anteriormente, possui o registo dos pontos atribuídos aos clientes em função dos serviços e artigos faturados, e o valor total dos mesmos talões que se encontram nas tabelas “Talão_Cab” e “Talão_Lin”, sendo que ambas as tabelas estão contidas na base de dados CAPESC.MDB do software Stylus e respeitam à filial “S1-Salão Porto”. do cruzamento das referidas tabelas apuram-se as diferenças por mês, trimestre e exercício que se apresentam nos quadros seguintes:
(cf. quadros referentes aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, contantes de páginas 16 e 17 do RIT, para cujo integral teor se remete e os quais aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais - naqueles quadros resulta uma diferença apuada, entre os valores dos talões e os valores da tabela de pontos de €49.976,49 no exercício de 2007; €53.936,08 no exercício de 2008 e €38.752,69 no exercício de 2009)
III.1.1.2. Período compreendido entre 01.07.2009 e 29.08.2009
Conforme já referido anteriormente, concluiu-se que o valor real dos 685 talões emitidos no período compreendido entre 01.07.2009 e 29.08.2009, através do programa de faturação Stylus, é o que consta da base de dados CAPS1.MDB e que esses mesmos talões foram objeto de manipulação na base de dados CAPESC.MDB, uma vez que na base de dados CAPS1.MDB a data da última modificação é igual à data da emissão, ao contrário do que se passa na base de dados CAPESC.MDB e que o valor presente na base de dados CAPS1.MDB é superior ao da CAPESC.MDB.
Assim, o valor dos proveitos omitidos relativamente aos talões modificados emitidos no período compreendido entre 01.07.2009 e 29.08.2009 é o que resulta do cruzamento entre as duas bases de dados, isto é, é a diferença entre o valor dos talões não manipulados, constantes na base de dados CAPS1.MDB, e o valor dos mesmos talões constante na base de dados manipulada CAPESC.MDB, conforme se apresenta no quadro seguinte:
(cf. quadro referente ao exercício de 2009, contantes de página 18 do RIT, para cujo integral teor se remete e o qual aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais - naquele quadro resulta uma diferença apuada, entre os valores presentes em CAPS1 e não em CAPESC de €16.513,27 no exercício de 2009)
III.1.1.3. Período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009
Conforme também já foi referido, a partir de 29.08.2009 passou a ser utilizado o programa de faturação Merlin.X2 para registo das vendas e prestações de serviços do salão, tendo-se verificado a existência de duas bases de dados, Merlin.mdf e Merlin_3.mdf. Do cruzamento da informação contida nas duas bases de dados verificou-se que na base de dados Merlin_3.mdf contém registos de venda que foram eliminados na base de dados Merlin.mdf, tendo-se concluído que os dados correspondentes às transações efetivamente realizadas pelo Sujeito Passivo são os constantes na base de dados Merlin_3.mdf e que a base de dados Merlin.mdf contém dados manipulados.
Face ao exposto, o valor dos proveitos omitidos, relativamente aos registos de venda emitidos no período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009 através do programa de faturação MerlinX2, corresponde ao valor dos registos de venda presentes na base de dados Merlin_3.mdf e não em Merlin.mdf resultante do cruzamento das duas bases de dados, conforme se apresenta no quadro seguinte:
(cf. quadro referente ao exercício de 2009, contante de página 19 do RIT, para cujo integral teor se remete e o qual aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais - naquele quadro consta o valor apurado de registos presentes em Merlin_3 e não em Merlin, no período em análise de €47.730,39)
III.1.1.4. Cômputo global dos proveitos omitidos
Nos quadros seguintes apresenta-se o valor global dos proveitos omitidos por mês, trimestre e exercício, relativamente aos talões emitidos pelo Sujeito Passivo no período compreendido entre 09.02.2007 e 31.12.2009, cujo valor original é conhecido, agrupando os valores apurados os pontos III.1.1.1, III.1.1.2 e III.1.1.3.:
(cf. quadros referentes aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, contantes de páginas 19 e 20 do RIT, para cujo integral teor se remete e os quais aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais - naqueles quadros consta: o valor total no exercício de 2007, relativo à diferença de valores entre as tabelas de “pontos” e as tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lin”, num total de €49.976,49; no exercício de 2008 relativo à diferença de valores entre as tabelas de “pontos” e as tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lin”, num total de €53.936,08; e no exercício de 2009 relativo à diferença de valores entre as tabelas de “pontos” e as tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lin”, valores presentes em CAPS1 e não em CAPESC e registos presentes em Merlin_3 e não em Merlin, num total de €102.996,35).
III.1.2. Encargos não dedutíveis
Confrontados os mapas de reintegrações com os valores registados na contabilidade verificou-se a existência de divergências no que respeita ao valor de aquisição do imobilizado bruto, que se apuram no quadro seguinte:
[cf. quadro referente aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, contante de página 21 do RIT, para cujo integral teor se remete e o qual aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais - naquele quadro constam os valores apurados de mapas de reintegrações e total da contabilidade, apurando-se uma diferença, no exercício de 2007 de €51.979,12; no exercício de 2008 uma diferença de €51.979.12 e no exercício de 2009 uma diferença de €-54.760,88(negativo)]
Estas divergências foram justificadas pelo Sujeito Passivo como sendo um erro contabilístico que resultou da alteração de códigos de alguns bens, tendo como consequência a duplicação desses mesmos bens no programa informático, cujo valor bruto global ascendeu a €51.979,12. Esta situação deu origem ao registo contabilístico indevido de custos com reintegrações do exercício no montante de €6.789,09 em cada um dos exercícios de 2007, 2008 e 2009.
Não tendo tais custos enquadramento no n.º1 do art. 23º do CIRC não são dedutíveis fiscalmente, pelo que, deverá ser acrescido ao resultado fiscal declarado o montante de €6.798,09 e cada um dos exercícios de 2007, 2008 e 2009.
No que respeita ao exercício de 2009, importa referir que existe outra diferença entre os mapas de amortizações e a contabilidade, para além da divergência referida anteriormente, que tem a ver com o registo contabilístico da aquisição do edifício onde esta sedeada a empresa e instalado o salão de cabeleireiro. Esta diferença de €108.000,00, a mais na contabilidade, corresponde ao valor total dos adiantamentos efetuados ao banco por conta da compra, antes da realização da escritura, de acordo com o contrato de promessa de compra e venda efetuado em 28.09.2006. esta situação não influenciou as amortizações do exercício, uma vez que este valor não consta no respetivo mapa de reintegrações, sendo que o valor do edifício que nele consta é de €476.932,80 e é inferior ao valor da respetiva escritura realizada em 29.06.2009 de €520.000,00. A TOC comprometeu-se a corrigir estas divergências no exercício de 2010.
Assim, temos
Exercício
200720082009
Custos não aceites fiscalmente6.798,096.798,096.798,09
Correções ao resultado fiscal declarado6.798,096.798,096.798,09

III.1.3. Resumo das correções em sede de IRC
Exercício
200720082009
Custos não aceites fiscalmente6.798,096.798,096.798,09
Proveitos omitidos41.302,8944.745,0985.830,30
Total das correções meramente aritméticas48.100,9851.543,2492.628,39

III.2 Correções em sede de IVA
III.2.1. IVA adicional a liquidar
As correções em sede de IVA (imposto em falta) correspondem ao imposto incluído no valor total dos proveitos omitidos, obtido de acordo com a taxa de IVA em vigor em cada período, 21% no exercício de 2007 e no 1º semestre de 2008 e 20% no 2º semestre de 2008 e no exercício de 2009, e, já apurado nos quadros apresentados no ponto III.1.1.4 na coluna IVA
Em conformidade com os valores apurados no ponto III.1.1.4., apresentam-se nos quadros seguintes as correções propostas em sede de IVA, por período e exercício:
[cf. quadros referentes aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, contante de página 22 do RIT, para cujo integral teor se remete e os quais aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais - naqueles consta o valor da correção de IVA proposta, num total, no exercício de 2007 de €8.673,59; no exercício de 2008 de €9.190,94 e no exercício de 2009 de €17.166,07].
III.2.2. IVA deduzido indevidamente
Confrontados os valores registados nas contas “2432 - IVA - Dedutível” com os valores constantes nos respetivos documentos de suporte, verificou-se o seguinte:
No exercício de 2007 (...)
IV Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos
No decurso da ação foram apuradas várias situações suscetíveis de conduzir à aplicação de métodos indiretos conforme estipulado no art. 88º da Lei Geral Tributária.
Nos termos do art. 88º da LGT, (...)
Ora, o que se verificou foi o seguinte:
■ O Sujeito Passivo apresenta nas suas declarações fiscais prejuízos fiscais consecutivos desde o início da sua atividade.
(...)
■ Como consequência dos prejuízos fiscais, o Sujeito Passivo apresenta também uma rentabilidade fiscal negativa nos exercícios de 2007 a 2009
(...)
■ Na sequência dos testes de coerência efetuados aos valores inscritos nas declarações fiscais, verificou-se uma divergência no Resultado Líquido do Exercício de 2007 entre o valor inscrito no quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22 e o valor apurado na contabilidade e inscrito na Demonstração de Resultados do Anexo A da IES
(...)
■ Conforme já referido no ponto III.1.2. deste relatório, através dos testes efetuados aos mapas de reintegrações verificou-se a existência de divergências entre os valores registados na contabilidade e os valores constantes nos referidos mapas (...)
(...)
Em consequência destas divergências, as reintegrações do exercício praticadas e registadas na contabilidade encontram-se empoladas no montante de €6.798,09 em cada um dos exercícios de 2007, 2008 e 2009.
■ Conforme se mostra no quadro abaixo, a conta de suprimentos “25 - Accionistas (sócios)” apresenta um elevado saldo no final de cada exercício e diversos registos a crédito ao longo dos exercícios, não se encontrando nas pastas da contabilidade qualquer documento de suporte.
(...)
Verificou-se a existência de diversos movimentos de elevado montante registados na conta corrente dos sócios, a crédito. Nos exercícios de 2007 e 2008 os registos a crédito nas contas dos sócios eram efetuados em partes iguais na proporção das suas quotas. No exercício de 2009 foram efetuados registos a crédito de elevado montante na conta corrente do sócio-gerente «AA», situação não compatível com os seus rendimentos declarados.
Verificou-se também que em 2008, aquando da alteração da estrutura societária, os saldos credores dos sócios que saíram foram transferidos contabilisticamente para os sócios que ficaram, sem que tenha havido qualquer movimento financeiro.
(...)
(...) o Sujeito Passivo veio justificar a necessidade de suprimentos e o saldo elevado da respetiva conta com o facto da faturação não ser suficiente para fazer face às despesas da empresa, nomeadamente, relativas a rendas, obras, equipamentos, pagamentos a fornecedores e à compra do imóvel. Mais afirmou que o dinheiro aplicado em suprimentos foi obtido com recurso a empréstimos bancários particulares (...)
Relativamente aos movimentos registados a crédito na conta “2551” (...) foram apresentados extratos bancários da empresa onde se confirmam os movimentos financeiros correspondentes a entradas de dinheiro, na maior parte das vezes através de depósitos bancários em numerário. Ora, o facto de terem sido efetuados diversos depósitos em numerário de elevado montante constitui um indício de que tais montantes poderão ser provenientes de prestações de serviços não faturadas.
(...) não foram apresentados documentos comprovativos dos movimentos financeiros subjacentes porque, efetivamente, não houve qualquer restituição de suprimentos aos sócios cessantes. Foram efetuados meros movimentos contabilísticos de transferência do saldo das contas correntes dos sócios que saíram para as contas correntes dos sócios que ficaram.
Nos exercícios de 2008 e 2009 é utilizado o TPA n.º ...04 para pagamento de produtos e serviços faturados pelo salão através de multibanco. No decurso da análise efetuada aos documentos de suporte aos registos contabilísticos foram comparados, mensalmente, os montantes totais recebidos através do referido TPA, constantes nos documentos bancários mensais que resumem as operações de Multibanco por fecho de TPA, com os valores totais faturados pelo salão, constantes dos mapas resumo mensais com o total dos movimentos diários efetuados pelo salão repartido entre vendas e prestações de serviços, tendo-se constatado que em diversos meses aqueles montantes eram superiores a estes (...)
(...)
Conforme já referido no ponto III.1.1 - proveitos omitidos, foi efetuada uma análise aos elementos do sistema informático de registos das operações utilizado pelo Sujeito Passivo, recolhidos no âmbito de uma ação especial conjunta, tendo-se detetado indícios da existência de proveitos omitidos à administração fiscal nos exercícios de 2007, 2008 e 2009. Na sequência da auditoria efetuada à aplicação informática, foram apurados factos que comprovam, de forma inequívoca, que houve manipulação dos talões de venda, em data posterior à da sua emissão, realizada através da eliminação de linhas dos talões, com o intuito de reduzir fortemente os valores das prestações de serviços que servem de base ao preenchimento das declarações fiscais, nomeadamente, a existência de divergências entre a data de emissão de diversos talões e a data da última modificação dos mesmos talões, modificação essa efetuada por processamento automático ou rotina informática, a existências de falhas na sequência da numeração das linhas de diversos talões que foram objeto de modificação, a existência de divergências significativas entre o valor dos talões constantes da tabela “Pontos” e o valor dos mesmos talões que se encontram nas tabelas “Talão_Cab” e “Talão_Lin”, a existência de diferenças de valor entre as duas bases de dados que contêm os mesmos talões de venda (CAPESC.MDB e CAPS1.MDB), no que respeita ao programa de faturação Stylus, e a eliminação de registos de venda emitidos pelo programa de faturação MerlinX2, facto comprovado através da comparação entre as bases de dados Merlin_3.mdf e Merlin.mdf. Nos talões emitidos pelo programa de faturação Merlin X2 constatou-se ainda que na numeração dos documentos de venda emitidos não é seguida uma sequência numérica, conforme disposto no art. 36º do CIVA.
Os factos descritos comprovam que houve manipulação dos registos de venda/prestações de serviços, com o intuito de diminuir os montantes das transações realizadas, e, inerentemente os valores declarados à Administração Fiscal, pelo que se conclui que estamos perante uma situação de omissão de proveitos relativos a prestações de serviços de cabeleireiro.
Face ao exposto, conclui-se que a contabilidade não merece credibilidade e que estamos perante uma impossibilidade de comprovação direta e exata da matéria tributável dos exercícios de 2007, 2008 e 2009, encontrando-se preenchidos os pressupostos previstos na alínea b) do art. 87º e alínea a) do artigo 88º, ambos da LGT, pelo que a matéria tributável deste exercício será determinada com recurso a métodos indiretos nos termos do art.90º do mesmo normativo legal.
V. Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos
V.1. Correções em sede de IRC
V.1.1. Determinação dos proveitos omitidos
Conforme já foi referido e justificado no ponto IV estamos perante uma situação de omissão de proveitos relativos a prestações de serviços de cabeleireiro.
Considerando a atividade exercida pelo Sujeito Passivo, a prestação de serviços de cabeleireiro, e que estão reunidas as condições para aplicação de métodos indiretos para a determinação da matéria coletável, utilizámos os valores apurados a partir dos elementos recolhidos do sistema informático de registos das operações utilizado pelo Sujeito Passivo.
Assim, temos:
V.1.1.1. Período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009
No ponto III.1.1.1 foi apurado o valor dos proveitos omitidos para os talões emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009 que foram modificados e que deram origem à atribuição de pontos, cujo valor original é conhecido, através da diferença entre o valor total dos talões constantes da tabela de “Pontos” e o valor total dos mesmos talões que se encontram nas tabelas “Tabela_Cab” e “Tabela_Lin”.
Para os talões que foram objeto de modificação, emitidos no mesmo período, mas que não deram origem à atribuição de pontos, cujo valor original não é conhecido, o valor presumido dos proveitos omitidos foi apurado com base no valor médio das prestações de serviços dos talões modificados que deram origem à atribuição de pontos, apurado dividindo os valores constantes na coluna “Pontos-Valores” dos quadros apresentados no ponto III.1.1.1. correspondentes aos valores originais conhecidos das prestações de serviços, depois de expurgada a venda de produtos contida nesses talões, pelo número total de talões contido na coluna “N.º Talões” dos mesmos quadros, conforme se mostra no quadro seguinte:
Talões modificados com atribuição de pontos
PeríodoNº TalõesValor originalValor médio
original
(1)(2)(3=2/1)
09.02.2007 a 31.12.20072.36965.43827,62
01.01.2008 a 31.12.20082.56675.487,9329,42
01.01.2009 a 31.12.20091.59048.393,5230,44

Aplicado o valor médio original das prestações de serviços dos talões modificados apurado no quadro anterior ao número de talões modificados mas que não deram origem à atribuição de pontos, apuramos, nos quadros seguintes, o valor presumido desses talões por mês, trimestre e exercício:
[dão-se por reproduzidos os quadros referentes aos exercícios de 2008 e de 2009, constantes de páginas 31 e 32 do RIT, dos quais resulta, no exercício de 2008 um total de 579 talões alterados, num valor presumido total de €17.034,19 (incluindo €2.878,14 de IVA); e no exercício de 2009um total de 291 talões modificados num valor presumido total de €8.858,04 (incluindo €1.476,34 de IVA)].
V.1.2. Cômputo global do valor dos proveitos omitidos nos exercícios de 2007, 2008 e 2009
Agrupando o valor dos proveitos omitidos apurado nos pontos V.1.1 e III.1.1, temos o valor total dos proveitos omitidos por mês, trimestre e exercício que se apresenta nos quadros seguintes:
[dão-se por reproduzidos os quadros referentes aos exercícios de 2008 e de 2009, constantes de página 33 do RIT, dos quais resulta um valor total de proveitos omitidos, no exercício de 2008 de €70.970,26 (dos quais €12.369,25 de IVA) e no exercício de 2009 de €111.854,39 (dos quais €18.642,41 de IVA)].
Exercício
200720082009
Volume de negócios
declarado (DA/IES)
(1)(...)118,978,07117.513,10
Valor total dos proveitos
omitidos
(2)(...)58.901,2093.212,00
Volume de negócios corrigido(3=1+2)(...)177.879,27210.725,10
Desvio(4=2/1)(...)49,5%29,3%

Considera-se, assim, que nos exercícios de 2007, 2008 e 2009, foram omitidos proveitos relativos a prestações de serviços, nos montantes de €69.059,85; €58.901,20 e €93.212,00, respetivamente.
VI - 1.3. Determinação do resultado fiscal corrigido
As correções em sede de IRC, e o apuramento do resultado fiscal corrigido, foram efetuadas a partir do resultado fiscal declarado e correspondem ao valor das prestações de serviços omitidas e presumidas, de acordo com o descrito anteriormente, e às correções de natureza meramente aritmética descritas no ponto III.
Assim temos:
Determinação do lucro fiscal corrigido

Exercício
20082009
Correções efetuadas por métodos indiretos: Valor presumido dos proveitos omitidos (1)14.156,057.381,70
Correções de natureza meramente aritmética
Proveitos omitidos (1)
Custos não aceites fiscalmente (2)
44.745,15
6.798,09
85.830,30
6.798,09
Total das correções (4=1+2+3)65.699,29100.010,09
Prejuízo fiscal declarado (5)-49.606,51-55.006,19
Total das correções (6=4)65.699,29100.010,09
Lucro tributável corrigido (7=5+6)16.092,7845.003,90
Volume de negócios corrigido (8)177.879,27210.725,10
Rentabilidade fiscal corrigida (9=7/8)9,05%21,36%

(...)
V-2 Correções em sede de IVA
V-2.1. IVA adicional a liquidar
As correções em sede de IVA (imposto em falta) correspondem ao imposto incluído no total presumido dos proveitos omitidos, obtido de acordo com a taxa de IVA em vigor em cada período, 21% no exercício de2007 e primeiro semestre de 2008 e 20% no 2º semestre de 2008 e no exercício de 2009, e já apurado nos quadros apresentados no ponto V.1.1.1. na coluna “IVA”.
Em conformidade com os valores apurados no ponto V.1.1.1. apresentam-se nos quadros seguintes as correções propostas em sede de IVA, por trimestre e exercício:
(...)
Exercício de 2008
PeríodoCorreções propostas
Base tributável
(Campo 3 da DP)
IVA
(campo 4 da DP)
08.03T2.942,00617,82
08.06T1.750,61367,64
08.09T2.721,36544,26
08.12T6.742,081.348,42
Total14.156,052.878,14

Exercício de 2009
PeríodoCorreções propostas
Base tributável
(Campo 3 da DP)
IVA
(campo 4 da DP)
08.03T3.779,63755,93
08.06T3.602,07720,41
Total7.381,701.476,34

V.2.2. Cômputo global do IVA adicional a liquidar nos exercícios de 2007, 2008 e 2009
Apurado o valor do IVA adicional a liquidar apurado nos pontos V.2.1. e III.2.1. apresentam-se nos quadros seguintes o total das correções propostas em sede de IVA e os valores das DP’s de IVA corrigidas, por período e por exercício:
[dão-se por reproduzidos os quadros referentes aos exercícios de 2008 e de 2009, constantes da página 30 do RIT, onde constam os valores totais de IVA liquidado corrigido, de €58.901,20 (campo 4 da DP - IVA de €12.069,08) no exercício de 2008 e de €93.212,00 (campo 4 da DP - IVA de €18.642,41).
- cf. Relatório de Inspeção Tributária constante de fls. 18 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

7. Sobre este RIT recaiu parecer, datado de 22.07.2011, do Inspetor Tributário Assessor, com o seguinte teor: “Confirmo a aplicação dos Métodos Indiretos a que se referem os art. 871 a 901 da LGT pelos motivos expostos no ponto IV deste relatório e referente aos exercícios de 2007, 2008 e 2009. Confirmo as correções propostas e que se discriminam no mapa anexo” - cf. parecer constante de fls. 18 do processo administrativo apenso aos autos, para o qual se remete e cujo integral teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

8. Sobre este parecer e RIT recaiu despacho de concordância, datado de 25.07.2011, da Diretora de Finanças Adjunta - cf. despacho constante de fls. 18 do processo administrativo apenso aos autos, para o qual se remete e cujo integral teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

9. Pelo ofício n.º ...03/0504 de 25.07.2011 da Direção de Finanças ..., remetido via postal registada com aviso de receção, pelo registo RM .......... 5PT, em 26.07.2011, foi a sociedade impugnante notificada do RIT, pelo qual se procede à fixação da matéria coletável de IRC e de IVA por métodos indiretos - cf. ofício e prova de entrega constantes de fls. 78 a 81 do processo administrativo apenso aos autos, documentos para cujo integral teor se remete e os quais se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais;

10. Inconformada com a matéria coletável fixada, com recurso à avaliação indireta, instaurou a impugnante pedido de revisão, no âmbito do qual, verificada a falta de acordo entre os peritos, da contribuinte e da AT, resulta da reunião a decisão: “face aos pareceres dos senhores peritos, cumpre decidir: Perante os factos evidenciados no Relatório de Inspeção Tributária (RIT), afigura-se-nos estarem reunidos os pressupostos que permitem o recurso à tributação por métodos de avaliação indireta, nos termos dos art. 871 e 881 da Lei Geral Tributária. Concordo com a quantificação da matéria tributável proposta pelo perito da Administração Tributária, pelas razões expostas no seu parecer que acompanho e aqui dou por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
Concluindo
Nos termos e para os efeitos do n.16 do art. 21 da LGT, com o meu acordo ao parecer do perito da Administração Fiscal pelas razões constantes e que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais e face ao exposto, indefiro o pedido de revisão apresentado mantendo os valores propostos no RIT no que concerne ao IRC e IVA e aos exercícios de 2007/08/09.” - cf. decisão constante de fls. 74 a 77 do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

11. Em 04.11.2011 pela AT foi emitida a liquidação n.° 2011............158 referente a IRC do exercício de 2008 no valor de €3.014,58 a que acrescem juros compensatórios de €258,34 resultantes da liquidação n.º 2011 ........320, tudo num total de €3.272,92 - cf. detalhe de nota - demonstração de compensação, documento constante de fls. 91 do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

12. Em 08.11.2011 pela AT foi emitida a liquidação n.° ...91 referente a IRC do exercício de 2009 no valor de €9.279,45 a que acrescem juros compensatórios de €424,05 resultantes da liquidação n.° ...67, tudo num total de €9.703,50 - cf. detalhe de nota - demonstração de compensação, documento constante de fls. 71 a 75 do processo administrativo apenso à impugnação 659.12.6BEPRT apensada a estes autos, documentos para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

13. Em 29.11.2011, pela AT, foram emitidas as liquidações n.º ..........55, n.º..........57, n.º...........59 e n.º..........61, todas referentes a IVA do exercício de 2008, períodos 0803T, 0806T, 0809T e 08.12T, nos valores a pagar de €3.457,82; €2.607,41; €2.466,21 e €3.537,12, respetivamente, todas com data limite de pagamento voluntário em 31.01.2012 - cf. cópia de liquidações juntas pela impugnante, constantes de fls. 632 a 635 dos autos de impugnação 714.12.2BEPRT, apensados à presente impugnação, documentos para cujo integral teor se remete e que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

14. Ainda relativamente ao IVA do exercício de 2008, com as liquidações supra identificadas, foram emitidas ainda as liquidações com os números ......56, .......58, ......60 e ......62, todas elas referentes a juros compensatórios, relativos aos períodos 0308T, 0608T, 0908T e 1208T, com os valores de €440,71; €305,17; €264,05 e €343,44, respetivamente - cf. cópias das liquidações juntas aos autos pela impugnante, constantes de fls.636 a 639 da impugnação 714.12.2I3EPRT, apensada à presente impugnação, documentos para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

15. Em 19.11.2011, pela AT, foram emitidas as liquidações n.º .......63, n.º........65, n.º........67 e n.º........69, todas referentes a IVA do exercício de 2009, períodos 0903T, 0906T, 0909T e 0912T, nos valores a pagar de €3.329,40; €4.605,73; €5.086,18 e €5.621,10, respetivamente, todas com data limite de pagamento voluntário em 31.01.2012 - cf. listagem de liquidações juntas pela Administração Tributária, constante de fls. 97 do processo administrativo apenso à impugnação 715.12.0I3EPRT, apensado à presente impugnação, documentos para cujo integral teor se remete e que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

16. Em 13.03.2012 deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a presente impugnação - cf. comprovativo de entrega de documentos a fls.2 dos autos, numeração referente ao processo físico.

Mais se provou que:

17. As alterações aos talões, ocorreram por “processamento automático ou rotina informática” procedendo à modificação de todos os talões em causa (ver facto provado n.°6, onde se faz larga referência ao RIT e à fundamentação das correções) fora das horas de expediente ou em dias não úteis e ocorrem praticamente em simultâneo - facto que resulta não só do RIT já mencionado em 6., mas também das declarações de testemunhas prestadas em sede de inquirição;

18. Os talões manipulados têm um valor médio de €6 e todos refletem a atribuição de pontos - facto que resulta das declarações de testemunhas prestadas em sede de inquirição.

Resulta, ainda, dos autos que:

19. A pedido de listagem discriminada dos talões que foram objeto de modificação dirigido pela impugnante à AT, foi a mesma informada, pelo ofício n.º ..16/0504 de 10.01.2010, remetido por correio registado, que: “(..) estando concluídos os procedimentos referidos e notificados todos os elementos que constituem a fundamentação dos atos tributários respetivos, não existem quaisquer elementos que adicionalmente sejam de notificar” - cf. pedidos remetidos pela sociedade impugnante à AT e resposta remetida por esta constantes de fls. 27 a 30 dos autos, numeração referente ao processo físico, documentos para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

20. Reiterado o pedido, pelo ofício n.º..86/0504 de 06.02.2010, enviado por correio registado, informou a AT: “(..) No processo organizado relativo ao procedimento inspetivo (..) não consta qualquer listagem discriminada dos talões que foram objeto de modificação mas que não deram origem à atribuição de pontos.
Os referidos talões em número de, nomeadamente, (..) 578 em 2008 e 291 em 2009, resultam das análises aos elementos que constam do CD gravado no dia 28 de maio de 2010 com os dados recolhidos no vosso sistema informático. Deste CD foi-vos entregue cópia no momento da recolha dos dados e posteriormente uma segunda via através do ofício (..) de 11.08.2011 na sequência da vossa solicitação alegando extravio.
Face ao exposto, dá-se conhecimento de que não existe qualquer listagem dos talões que foram objeto de modificação, mas que não deram origem à atribuição de pontos que possa ser objeto de notificação em satisfação do pedido formulado” - cf. pedido remetido pela sociedade impugnante à AT e ofício de resposta, documentos constantes de fls. 31 e 32 dos autos, numeração referente ao processo físico, para os quais se remete e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

21. Por requerimento de 10.05.2013 a Representante da Fazenda Pública juntou aos autos cópia do CD contendo os dados recolhidos em 28.05.2010 no sistema informático da sociedade impugnante (recolhidos no âmbito da ação conjunta referida no facto provado n.º3) - cf. requerimento de junção e CD junto fls. 562 e CD junto à contracapa, numeração do processo físico;

22. Esta junção foi notificada à sociedade impugnante - cf. ofício de notificação deste Tribunal Administrativo e Fiscal constante de fls. 568 dos autos, numeração referente ao processo físico.

Factos Não Provados
a) Que fossem atribuídos pontos por via de sorteio realizado informaticamente - facto que resulta do depoimento das testemunhas inquiridas nos autos;

Inexistem factos não provados com relevância para a boa decisão da causa.
***
MOTIVAÇÃO
A convicção do tribunal baseou-se na análise dos documentos constantes do processo administrativo junto aos autos, bem como daqueles que foram juntos pelo Impugnante juntamente com a Petição Inicial, especificados em cada um dos pontos relativos aos factos provados, dos quais estes resultam com toda a evidência.
Foi ainda analisada a prova testemunhal produzida, designadamente os depoimentos das testemunhas arroladas pela impugnante, «BB» e «CC», técnicos informáticos que trabalharam na empresa que forneceu os programas de faturação e prestava suporte informático à sociedade impugnante. Ambos revelaram ter conhecimento quanto à forma de funcionamento dos programas em causa, das suas funcionalidades e possibilidades de utilização, contudo, pouco puderam ou souberam esclarecer quanto à efetiva utilização dos mesmos pela sociedade impugnante que os utilizava.
Estas testemunhas, ainda que tendo prestado um depoimento calmo, ponderado e com conhecimento técnico quanto ao funcionamento dos programas utilizados pela impugnante, não foram relevados na fixação da matéria de facto, porquanto o conhecimento revelado no que concerne à forma de funcionamento da impugnante ou da utilização que fazia do programa em causa, revelou-se inexistente.
Explicaram a possibilidade de haver descontinuidade na numeração das linhas, o que podia ficar a dever-se à inserção de produtos e serviços num talão e haver correções, tendo dito que, quando o sistema anula uma linha a numeração mantém-se, uma vez que o programa não renumera para trás. Contudo, confrontados com a rotina de alteração de datas nada souberam explicar.
Ainda que pudesse haver situações de supressão de uma linha por lapso na criação do documento/talão, as modificações a que se refere o RIT estão ligadas a modificações massivas de documentos por processamento automático ou rotina informática, pelo que não são compreendidas nas correções realizadas, possíveis alterações pontuais de talões por lapso.
Por seu turno a testemunha da Fazenda Pública, «DD», que depôs de firma isenta, coerente e revelando grande lucidez de raciocínio, foi por isso considerada de forma plena pelo Tribunal.
Por um lado, tirou qualquer significado ao que foi dito pelas testemunhas da Impugnante, ao dizer que:
§ Nos talões onde foram usados pontos não foi detetada qualquer manipulação;
§ Ao nível da base de dados não foi verificada a atribuição de qualquer ponto por sorteio ou a atribuição de qualquer bónus [facto não provado a)];
§ Apenas as modificações por “rotina de manipulação informática” foram consideradas, não tendo sido detetadas correções esporádicas ou isoladas de um ou outro talão
§ Nos talões que não estão modificados, que não foram objeto de manipulação informática, não se verifica qualquer situação de supressão de linhas;
§ Os talões manipulados têm uma média de valor que se aproxima dos €6, apesar disso todos refletem a atribuição de ponto sendo que estes são atribuídos a cada €10 e múltiplos de €10 (facto provado n.º18);
§ A alteração de milhares de documentos num espaço de segundos, tem de ocorrer por rotina informática.
Mais concretizou que existiam dois programas informáticos (Merlin e Stylus), duas bases de dados (CAPESC.MDP e CAPS1.MDP), dois computadores (um no escritório e outro na recepção) e elucidou que a sua análise decorreu do confronto realizado, essencialmente, entre os ficheiros “Cabeçalhos”, “Linhas” e “Pontos”.
Nesta sequência explicou, ainda, que a supressão de linhas, conjugada com a modificação de talões e as divergências apuradas com a confrontação com a tabela “Pontos”, revelam a supressão de linhas relativas a serviços prestados. Mais disse que, quando eram usados pontos esta opção/ato, deixava rasto no programa, pelo que é sempre possível, em talões não manipulados, seguir o rasto da atribuição de pontos e a sua utilização.
A tabela “Pontos” era de mais difícil adulteração/manipulação, uma vez que contém um campo de observações muito detalhado, que dizia claramente qual foi o valor faturado de artigos e de serviços - consta a informação sobre o valor da fatura e os pontos atribuídos.
A título exemplificativo disse que no ano de 2007 apenas por 45 vezes foram usados pontos, onde o valor do serviço é substituído pela utilização de pontos, o que se verificou num universo de 2300 talões manipulados.
Conclui que foram considerados manipulados talões com caraterísticas de manipulação, quando comparados com a tabela “Pontos”, verificada a supressão de linhas. Nos talões que não foram manipulados não se verifica qualquer situação de supressão de linhas.
Relativamente ao facto não provado a), afirmou esta testemunha não haver qualquer rasto no sistema informático relativo a qualquer atribuição de pontos por sorteio aleatório realizado informaticamente, tal como sustentado pela impugnante.
Por outro lado, atendendo à forma clara e lúcida como o seu depoimento foi prestado, além de corroborar dando inteira credibilidade a todo o teor de relatório de inspecção tributária, contribuiu para a fixação do facto provado n.º 17 e 18, o qual resulta de forma cabal do seu depoimento, ainda que harmonizado e sustentado, tanto pelo relatório da ação conjunta de inspeção do sistema informático de faturação (facto provado n.º3) e do RIT (facto provado n.º6). (…)
4. JULGAMENTO DE DIREITO
Nos presentes autos estão em questão a legalidade das liquidações de IRC ano de 2008 e 2009 (655/12.3BEPRT e 659.12.6BEPRT) e IVA dos anos de 2008 e 2009 (714.12.2BEPRT e 715.12.0BEPRT) respetivos juros compensatórios no valor de € 43.687,39, as quais foram apuradas por recurso avaliação direta e por recurso a métodos indiretos.
Por sentença do TAF de Porto de 10.11.2023 foram apreciados os vícios invocados e foi julgada improcedente a pretensão da Recorrente/Impugnante.
A Recorrente encontra-se coletada para o exercício da atividade de “Salão de Cabeleireiro”. A atividade é desenvolvida através da exploração de salão de cabeleireiro que presta serviços de cabeleireiro, estética e de comercialização de produtos de beleza.
4.1. Da nulidade de sentença por contradição
Na conclusão R) alega a Recorrente que a sentença enferma de contradição quando dá como assente que a informação por si solicitada relativa à listagem dos talões que originaram correções já havia sido fornecida pela AT em 2010 e, simultaneamente reconhece que a AT afirmou, que em 2011 não possuía elementos que permitissem responder à questão suscitada.
Vejamos.
A nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão contemplada no artigo 615.º n.º 1, al c), do Código de Processo Civil pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente entre a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la.
A contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto ou pelo menos de sentido diverso.
Saliente-se ainda que tal nulidade ocorre, na contradição entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão, e não entre factos provados e a decisão.
A Recorrente, confunde vicio intrínseco que afeta a validade da sentença recorrida com erro de julgamento de facto e de direito.
Assim, a questão equacionada, não se reconduz a esse vício, mas sim a eventual erro de julgamento de facto e de direito, que melhor infra se verá.
Nesta conformidade, a sentença recorrida não incorreu na nulidade que lhe vem assacada.

4.2. Nas conclusões D) a K) a Recorrente alega que o tribunal julgou incorretamente quando valida as liquidações decorrentes de correções meramente aritméticas à matéria coletável com base na informação que consta da coluna detalhes do ficheiro pontos.
Tomando apenas a informação relativa ao valor bruto dos serviços e olvidando os abatimentos decorrentes da atribuição de pontos aos clientes. Abatimentos que o tribunal não ignora, mas de que não resultou qualquer consequência prática.
Levando-o a validar tributações de rendimentos efetivamente não auferidos, o que faz incorrer a sentença em vício de violação de lei.
E que o tribunal validou, ainda, decisões da AT (alterações aos proveitos registados e consequentes liquidações) feitas com base em pressupostos irreais, quais sejam os de que a “última modificação” tinha ocorrido na data indicada pela AT quando os elementos juntos à PI permitem concluir o contrário.
E também não avaliou a alegação da ora Recorrente que afirmava inexistir qualquer fundamento racional para “modificações” em datas fiscalmente inócuas.
O tribunal não apreciou, adequadamente, os argumentos vertidos, pela Recorrente, quanto às razões por que se verificaram falhas na sequência numérica das linhas, incorrendo em erro de julgamento.
Vejamos:
O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial.
Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados.
A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).
Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos.
No entanto, e por força do art.º 74.º da LGT, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte.
É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil, de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT.
E como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado,actuando a Administração Tributária no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas que suportam essa liquidação”. – cf., por todos, acórdão do STA de 28/9/2011, Processo 0494/11.
Daqui resulta, que a determinação da matéria coletável deve preferencialmente ser efetuada através dos elementos da própria contabilidade do sujeito passivo e só pode haver recurso a métodos indiretos quando aquele apuramento direto se mostre de todo inviável, não gozando a Fazenda Pública de qualquer margem de discricionariedade relativamente à opção do método (direto ou indireto) de avaliação da matéria tributável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr., neste sentido, o Acórdão do TCA Sul proferido em 13/03/2014, proc. n.º 07215/13).
A sentença recorrida, na fundamentação de direito iniciou o seu julgamento pela verificação do vício de falta de fundamentação e excesso de quantificação da matéria coletável, relativamente às correções aritméticas, tendo concluído que “(…) Ainda que se diga que esta menção a falta de fundamentação se entenda vazia de conteúdo, uma vez que não são especificadas as razões pelas quais entende a impugnante haver falta de fundamentação na fixação de matéria tributável, considerada a redação dada aos artigos 13º e 14º da Petição Inicial, poderemos entender em que medida considera a autora não estar devidamente fundamentada a posição/decisão da Administração Tributária.
Manifestando a sua discordância tanto na parte das correções meramente aritméticas, quanto nas correções por métodos indiciários, por ambas resultarem de pressupostos “divorciados” da realidade, diz no art. 14º que tal é “bem evidente no comportamento adotado pela AT, que assumiu expressamente não possuir elementos que permitam prestar informação concreta à impugnante, apesar das notificações já efetuadas nesse sentido”.
Acrescenta nas Petições Iniciais relativas às liquidações de IVA (714/12.2BEPRT e 715/12.0BEPRT) que os elementos fornecidos consistiram apenas na entrega de uma cópia de base de dados da impugnante, o que não dá, em seu entender, resposta às questões suscitadas, o que, conclui, consubstancia o vício de falta de fundamentação.
Conforme resulta dos factos provados n.º 19 a 22, o que a impugnante pretendia era que lhe fosse fornecida uma lista discriminada dos talões que, tendo sido objeto de modificação, não deram origem à emissão de pontos.
De facto, tal específica informação não lhe foi fornecida pela impugnada, que informou já ter notificado todos os elementos que serviram de fundamento aos atos tributários impugnados (facto provado n.º 19), ainda assim a impugnante insistiu tendo a AT, explicado (facto provado n.º19) que os talões considerados manipulados, que correspondem no ano de 2008 a 579 e no ano de 2009 a 281, resultam da análise realizada ao elementos recolhidos do seu sistema informático em 28.05.2010, sendo que logo nessa altura foi lhe foi fornecida uma cópia de tal elementos. Mais, resulta do RIT (facto provado n.º6 toda a metodologia usada na análise desses elementos e que levou às conclusões que deram lugar à emissão das liquidações impugnadas.
Mais resulta dos autos, (factos provados n.º 21 e 22) que tais elementos, resultantes da recolha realizada ao sistema informático de faturação da impugnante, constam de CD junto a estes autos, sendo certo, ainda, que tal junção foi devidamente notificada à impugnante, estando, também neste processo, à sua inteira disposição.
O que a impugnante pretende é saber quais, de entre os talões considerados manipulados, não procederam à atribuição de pontos.
Ora, a consideração de manipulação de talões encontra-se devidamente fundamentada no Relatório de Inspeção Tributária, designadamente no ponto III.1.1., resultando de uma análise realizada aos elementos recolhidos.
A questão que é colocada relativamente à tabela “Pontos” prende-se com o facto de não apresentar manipulação, há mais pontos atribuídos do que o montante de faturação respetivo, sendo que esta tabela, por conter um campo de observações mais detalhado, não permitia alteração/manipulação.
Assim, considerada a argumentação do impugnante relativamente à possível falta de fundamentação da fixação da matéria que serviu de base à emissão das liquidações impugnadas, em contraposição ao acervo documental junto aos autos bem como a posição assumida pela AT, seja no relatório de ação conjunta (facto provado n.º3) no âmbito da qual procedeu à recolha de dados do programa informático de faturação da sociedade seja no relatório de inspeção tributária (facto provado n.º6) momentos onde são analisados todos os dados recolhidos, harmonizando os valores contantes de todas as tabelas encontradas (“Talão_Cab”; “Talão_Lin” e “Pontos” ), conclui-se, necessariamente pela improcedência de tal argumento.
Pelo exposto, não enfermam as liquidações de falta de fundamentação na fixação da matéria tributável, pelo que improcede, neste segmento, a presente impugnação.(…).
Como resulta do factos provados nos pontos 6, 17 e 18 as liquidações em causa, nos presentes autos, decorrem de correções que apelidaram de aritméticas efetuadas pela Administração Tributária na sequência de uma ação de inspeção aos dados contidos em dois programas de faturação da Recorrente denominado: Merlin X2, utilizado para as prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão; Stylus, utilizado anteriormente ao Merlin X2 para as prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão, e, utilizado para gestão de stocks e para emissão de faturas relativas à venda de artigos a uma empresa do mesmo ramo, com sócios comuns.
No programa de faturação Stylus, os SIT verificaram a existência de duas bases de dados: CAPESC.MDB, no computador do escritório e CAPS1.MDB no computador da receção do salão.
Apurando que na base de dados CAPESC.MDB consta a faturação de duas filiais: a filial “S1 - Salão Porto” relativa às prestações de serviços e vendas faturadas ao balcão do salão, no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009; e a filial “E - Porto Sede” para emissão de faturas relativas à venda de artigos a empresas, abrangendo o período compreendido entre 18.01.2007 e 25.05.2010.
Constataram ainda existência de divergências entre os valores na base de dados CAPESC.MDB e os valores declarados nas declarações periódicas de IVA em todos os períodos do exercício de 2007.
Na mesma base de dados, CAPESC.MDB, no que respeita à filial “S1 - Salão Porto”, foram apurados factos que comprovam, de forma inequívoca, que houve manipulação dos talões de venda, em data posterior à da sua emissão, realizada através da eliminação de linhas dos talões, com o intuito de reduzir os valores das prestações de serviços que servem de base ao preenchimento das declarações fiscais.
Os SIT contataram a existência de diferenças entre o valor total dos talões obtido a partir das tabelas de cabeçalhos dos talões de venda (Talão-Cab) e obtido a partir das tabelas de linhas dos mesmos talões de venda (Talão-Lin) e com base numa análise efetuada às várias tabelas da base de dados CAPESC.MDB, a existência de divergências entre a data de emissão dos talões e a data da última modificação dos mesmos talões, em 9571 talões emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009. Grupos de talões relativos a determinados períodos (semana, quinzena, mês, trimestre, ...) apresentam a mesma data da última modificação e uma divergência temporal entre o primeiro e o último talão alterado de apenas alguns segundos ou minutos, o que permite concluir que tais modificações foram efetuadas por processamento automático ou rotina informática e não manualmente.
Constatando-se que as modificações são frequentemente efetuadas em horas fora do expediente ou em dias não úteis.
Verificaram ainda a existência de divergências significativas entre o valor dos talões constantes da tabela de “pontos”, que possui o registo dos pontos atribuídos aos clientes em função dos serviços e artigos faturados, podendo posteriormente ser trocados por serviços, e o valor dos mesmos talões que se encontram nas tabelas “Talão_Cab” e “Talão_lin”. Sendo certo que as divergências detetadas apenas se encontram relacionadas com serviços prestados e não com vendas de artigos.
Concluíram que os talões que deram origem à atribuição de pontos apresentam indícios de manipulação, nomeadamente, a existência de divergências entre a data de emissão e a data da última modificação e a existência de falhas na sequência da numeração das linhas, nas tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Lin”, situação que não se verifica nos mesmos talões na tabela “Pontos”. Este facto permite concluir que o valor real dos talões que deram origem à atribuição de pontos, emitidos no período compreendido entre 09.02.2007 e 29.08.2009 através do programa de faturação Stylus, é o valor que consta da tabela de “Pontos” e que esses mesmos talões foram objeto de manipulação nas tabelas “Talão-Cab” e “Talão-Line”.
No que concerne à base de dados CAPS1.MDB apenas contém registos relativos à filial “S1 - Salão Porto”, verificou-se que os 685 talões emitidos nos meses de julho e agosto de 2009, que foram objeto de manipulação na base de dados CAPESC.MDB, não foram manipulados na base de dados CAPS1.MDB, tendo-se verificado que, em todos eles, o valor presente na base de dados CAPS1.MDB é superior ao da CAPESC.MDB e que na base de dados CAPS1.MDB a data da última modificação à igual à data de emissão, ao contrário do que se passa na base de dados CAPESC.MDB. este facto permitiu concluir que os dados correspondentes às transações efetivamente realizadas pelo Sujeito Passivo nos meses de julho e agosto são os constantes na base de dados CAPS1.MDB e que a base de dados CAPESC.MDB contém dados manipulados.
No que respeita ao programa de faturação Merlin.X2, constante no computador da receção do salão, verificou-se a existência das bases de dados Merlin.mdf e Merlin_3.mdf, utilizadas para registar as transações do salão, contendo os registos das vendas e prestações de serviços do salão efetuadas a partir de 29.08.2009. também nestas bases de dados foram apurados factos que comprovam, que houve manipulação dos talões de venda, com o intuito de reduzir os valores das prestações de serviços que servem de base ao preenchimento das declarações fiscais que, a seguir, se descrevem de forma sucinta:
- Constatou-se que na numeração dos documentos de venda emitidos não é seguida uma sequência numérica, conforme disposto no artigo 36º do CIVA
- Verificou-se a existência de indícios de que houve eliminação de registos de venda. A base de dados Merlin_3.mdf contém registos de venda que foram eliminados na base de dados Merlin.mdf, facto comprovado através do número de visitas efetuadas por cada cliente constante do campo “NumVisite” dos documentos de venda.
Este facto permitiu concluir que os dados correspondentes às transações efetivamente realizadas pelo Sujeito Passivo no período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009 são os constantes na base de dados Merlin_3.mdf e que a base de dados Merlin.mdf contém dados manipulados.
Os factos descritos comprovam que houve manipulação dos registos de venda/prestações de serviços, com o intuito de diminuir os montantes das transações realizadas, e, inerentemente, os valores declarados à Administração Fiscal, pelo que, se conclui que estamos perante uma situação de omissão de proveitos relativos a prestações de serviços de cabeleireiro.
Em conformidade com o exposto, o valor dos proveitos omitidos, relativamente aos talões cujo valor original é conhecido, é apurado de uma forma para o período compreendido entre 09.02.2007 e 30.06.2009, de outra forma para o período compreendido entre 01.07.2009 e 29.08.2009 e de outra forma para o período compreendido entre 30.08.2009 e 31.12.2009, conforme se apresenta nos pontos III.1.1.1., III.1.1.2 e III.1.1.3.
Aqui chegados, teremos de concluir que a Administração Fiscal logrou provar os pressupostos da sua atuação, ou seja, os fundamentos vertidos no relatório de inspeção são de molde a suportar a correção aritméticas que está na origem das liquidações adicionais de IVA e IRC sendo que, para tal concluiu no sentido da omissão de proveitos.
Face à atuação da AT, competia ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT.
Da matéria de facto provada e não impugnada, não resulta provado qualquer facto que ponha em causa a atuação da AT bem como os pressupostos das correções aritméticas efetuadas, ónus que impendia sobre o Recorrente.
A Recorrente, quer na petição inicial quer no presente recurso, limita-se a descredibilizar o método efetuado, sem, contudo, explicar e provar algo em contrário e sem afrontar a matéria de facto provada.
No que concerne ao alegado na conclusão K) relativo ao eventual erro de julgamento da sentença quando dá como assente que a informação por si solicitada relativa à listagem dos talões que originaram correções já havia sido fornecida pela AT em 2010 e, simultaneamente reconhece que a AT afirmou, em 2011 não possui elementos que permitissem responder à questão suscitada, não se vislumbra qualquer erro de julgamento quer de facto quer de direito.
A afirmação da Recorrente não tem respaldo na sentença recorrida cujo enxerto se encontra supra transcrito, nem mesmo resulta dos factos provados n.º 19 a 22.
Nesta conformidade, improcede o alegado vicio de erro de julgamento.

4.3. Nas conclusões K) a R) a Recorrente, no que respeita à avaliação indireta, alega que o tribunal valida, inexplicavelmente, pressupostos de quantificação (o número de talões modificados mas que não deram origem a pontos) que a própria AT não consegue comprovar. Não ignorando, que a quantificação efetuada pela AT resultou da conjugação do número de talões pelo preço médio de cada um (também arbitrado pela AT).
E que a hipotética correção, a justificar-se, deveria corresponder, apenas, à diferença entre o valor estimado e o que a contabilidade já registava.
O que se afigura impossível de determinar, por desconhecimento dos talões que serviram de base a tal alteração, desconhecimento assumido pela própria AT (Direção de Finanças ...), sem embargo o tribunal validou o procedimento questionado.
Ultrapassando, deste modo, o ónus que impendia sobre a AT, de comprovar os pressupostos de quantificação.
Vejamos:
No caso sub judice, está em causa a quantificação efetuada pela AT para o apuramento quer do IRC quer do IVA dos anos de 2008 e 2009.
Como é sabido, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso da respetiva quantificação, nos termos do n.º 3 do artigo 74.º da LGT.
A Recorrente não questiona o uso do método invocado pela AT, nem os pressupostos e critério efetuado para a quantificação, somente questiona a quantificação por entender que a quantificação efetuada resultou da conjugação do número de talões pelo preço médio de cada um.
E que a hipotética correção, a justificar-se, deveria corresponder, apenas, à diferença entre o valor estimado e o que a contabilidade já registava.
Como refere a sentença recorrida a determinação da matéria tributável por métodos indiretos efetuada por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação concreta.
Por isso, tem a Administração Tributária de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, sejam pautados por critérios de razoabilidade e de normalidade e tenham em linha de conta as especificidades próprias do contribuinte, para que conduzam à extrapolação dos factos desconhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
Após competirá ao contribuinte, em segunda linha, demonstrar os factos relevantes para a fixação da matéria tributável, nos pontos em que há deficiências nas declarações, contabilidade ou escrita, alegar e provar que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização das mencionadas regras, que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada por força do art. 74.º, n.º 3, 2.ª parte da LGT.
A sentença recorrida após fazer enquadramento legal e jurisprudencial com a qual concordamos, refere que: “(…) Ora, ainda que a Impugnante tenha vindo colocar em causa, em vários artigos ao longo da sua petição inicial, os pressupostos em que se fundou a Administração Tributária para lançar mão dos métodos indiretos, a verdade é que o fez com recurso a generalidades, referindo apenas a alteração de talões que ocorreria em situações pontuais no caso de haver registos onde fosse detetada uma inserção por lapso; sustenta ainda as diferenças entre os valores das tabelas “Talão_cab” e “Talão_Lin” com a tabela “Pontos”, que serviu de base aos SIT no apuramento da faturação, pela atribuição de pontos por via de sorteio.
Contudo, apesar da argumentação da impugnante, verifica-se que a mesma cai por terra ao verificarmos, por um lado que está em causa é a alteração sistemática e massiva de talões o que não logrou explicar, não se trata de correção de lapsos, são, como vimos, centenas de talões a ser manipulados (ou alterados) em segundos. Por outro lado, conforme resulta de forma cabal da prova documental junta aos autos e da prova testemunhal produzida, não houve situações de atribuição aleatória, ou por sorteio, de ponto, tal ato deixaria “rasto” no sistema, o que não foi verificado na análise realizada ao sistema informático de faturação da impugnante.
Concluímos assim, que a sociedade Impugnante, não produziu qualquer prova relevante que invalidasse os pressupostos assumidos pela Administração Tributária e que fundamentaram o recurso à determinação do lucro tributável pela aplicação de métodos indiretos.
Em suma, com a prova produzida nos autos, a Impugnante ficou longe de colocar em dúvida, muito menos séria e fundada, os pressupostos de facto relevados pela Administração Tributária e que levaram a concluir que estaria inviabilizada a comprovação e quantificação direta e exata da sua matéria tributável, ou seja, que tais pressupostos estão errados e/ou são desajustados à realidade em causa.
Suscita a impugnante a questão de, tendo os SIT apurado os valores de faturação por métodos indiretos, considerando os valores inscritos na tabela “Pontos”, por entenderem que está tabela não teria sido objeto de manipulação (ao menos não relevante para efeitos declarativos), pretendem por em causa os resultados por considerar que, poderá haver talões manipulados que não deram origem a pontos.
Diz a impugnante que os SIT usaram como referência o preço médio dos talões que deram origem a pontos, o que poderia compreender-se se o preço médio destes talões se assemelhasse aos que não deram origem a pontos. Para além da AT nada dizer quanto aos motivos da adoção de tal critério, o mesmo apresenta-se contrário à prática de funcionamento deste sistema, que é a de atribuir pontos em despesas de valor igual a €10 ou múltiplos.
Compreende-se que, num talão, não modificado com o valor de €6, que não daria lugar a atribuição de pontos, ao atribuir-lhe o valor médio dos talões que deram origem a pontos (necessariamente superiores a €10,00) estaria, em teoria, a AT a empolar os níveis de faturação da impugnante.
Ainda que, em teoria, esta fosse uma possibilidade, a verdade é que, por um lado temos talões com correspondência na tabela de pontos, com valores inferiores aos supostos €10, os talões manipulados (com valores médios de €6) – facto provado n.º18. Por outro lado, estamos perante uma avaliação indireta, por métodos indiciários, onde nunca será possível fixar exatamente o valor preciso da faturação, uma vez que a contabilidade que o Sujeito Passivo tem o dever de organizar de forma a permitir chegar a tal valor não o permite, sendo que o valor em causa será achado, sempre e necessariamente, por aproximação, embora de uma forma que se apresente, de forma objetiva, passível de apurar a situação o mais próximo da verdade que se mostre possível.
Ora, considerando que, no apuramento de tal valor os SIT se fundamentaram na única tabela, resultante do sistema informático de faturação do contribuinte, que não apresentava manipulação passível de adulterar os seus resultados, económicos e fiscais, apurando o montante de faturação a partir daqui, não vemos em que medida tal poderá sustentar a alegação da impugnante.(…)”
E desde já se diga que a sentença não nos merece reparo, competia à Recorrente/Impugnante, no âmbito do ónus probatório, provar que a quantificação apurada era excessiva. No entanto, a Recorrente/Impugnante recorre a generalidades, referindo que a alteração de talões que ocorriam em situações pontuais. Sustenta ainda as diferenças entre os valores das tabelas “Talão_cab” e “Talão_Lin” com a tabela “Pontos”, que serviu de base aos SIT no apuramento da faturação, pela atribuição de pontos por via de sorteio.
Todavia, a tese da Recorrente/Impugnante, não convence, por um lado está em causa a alteração sistemática e massiva de talões que não logrou explicar, não se tratando de correção de lapsos, mas sim alteração de centenas de talões num curto espaço de tempo/segundos. Por outro lado, não houve situações de atribuição aleatória, ou por sorteio, de pontos, uma vez, que essa operação deixaria vestígios no sistema, o que não foi verificado na análise realizada ao sistema informático de faturação da Recorrente/impugnante, conforme resulta da prova documental e da prova testemunhal produzida, nos autos.
Nesta conformidade entendemos que a Recorrente/Impugnante não produziu qualquer prova que demonstrasse a sua posição, contrariamente à Administração Tributária, que explicou a forma de obter o valor médio dos talões, considerando os pontos atribuídos bem como os valores da tabelas geradas por cada uma das operações em causa, com base em suporte destas operações, nos mapas constantes do relatório, e no CD e o relatório resultante da ação conjunta, cópia dos suportes informáticos, onde se encontram explicitados e discriminados os valores que permitiram a elaboração destes mapas.
Como se pode infirmar quer pela petição inicial, quer pelas alegações de recurso, a Recorrente/Impugnante foca-se, essencialmente, em invalidar e descredibilizar o critério de quantificação adotados sem, todavia, demonstrar que a Administração Tributária partiu de premissas desajustadas ou apresentar outro(s) critérios mais adequados(s) por serem mais próximos da realidade que se visa alcançar.
Nesta conformidade, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento, que lhe vem assacada, pelo, que improcede a pretensão da Recorrente.

4.4. E assim formulamos as seguintes conclusões:
I. O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial.
II. Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados.
III. A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).
IV. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso da respetiva quantificação nos termos do n.º 3 do artigo 74.º da LGT.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, negar provimento ao recurso, mantendo-se sentença recorrida.

Custas pela Recorrente termos dos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
Porto, 24 de abril de 2024

Paula Maria Dias de Moura Teixeira (Relatora)
Maria Celeste Oliveira
Graça Maria Valga Martins