Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01871/20.0BEPRT |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
Data do Acordão: | 07/12/2024 |
Tribunal: | TAF do Porto |
Relator: | MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO |
Descritores: | EXCEPÇÃO DILATÓRIA DE INTEMPESTIVIDADE DA PRÁTICA DO ACTO PROCESSUAL; ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA DA ENTIDADE DEMANDADA; |
Votação: | Unanimidade |
Meio Processual: | Acção Administrativa Comum |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte - Subsecção Social -: RELATÓRIO «AA» propôs acção administrativa contra o Ministério da Educação, ambos melhor identificados nos autos, tendo em vista o reconhecimento do direito a progredir ao 4.º escalão da carreira docente em 30.09.2009 e a condenação da Entidade Demandada à prática do acto devido, consubstanciado na progressão ao 4.º escalão, com efeitos a 30.09.2009, e ao pagamento das diferenças salariais devidas acrescidas de juros. Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada verificada a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual e absolvida a Entidade Demandada da instância. Desta vem interposto recurso. Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: * DE DIREITO - É objecto de recurso a decisão que concluiu pela intempestividade da ação e consequente absolvição da instância do Recorrido. Com o presente meio processual, a Recorrente veio invocar que «Estando em causa o reconhecimento do direito à progressão, “está em causa o reconhecimento de situações jurídicas subjetivas diretamente decorrentes de normas jurídico-administrativas [artº 37º, n.º 1, f) do CPTA] e a condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar que igualmente decorrem de normas jurídico-administrativas, não envolvendo a necessidade de emissão de um ato administrativo impugnável, e que, no caso, terá por objeto e objetivo o pagamento de uma quantia [artº 37º, n.º 1, j) do CPTA].», realçando que «(...) a Ação adequada à satisfação da pretensão formulada será atualmente a ação administrativa não impugnatória.», invocando, ainda, que «(...) resulta da PI que a Autora peticionou o reconhecimento do direito à progressão ao 4.º escalão, sendo que o Réu não entregou/notificou a Autora de qualquer ato administrativo que recusasse a sua pretensão. (...); pelo contrário, o que aqui está em causa é uma omissão de um ato, o ato de progressão da A. ao 4.º escalão, em 30/09/2009.» Mais refere a Recorrente que «(...) a A. não pretendeu, em momento algum, impugnar qualquer ato administrativo. E não pretendeu impugnar nem um ato que tenha sido omitido, nem um que tenha sido proferido.», aduzindo também que «Quanto à alegada falta de impugnação (...) das listas de antiguidade e/ou recibos de vencimento, pela ora recorrente (...) estamos perante um contrato de trabalho em funções públicas, duradouro, portanto, e que não se esgota no mero processamento da retribuição.». Mais invocou que «(...) no que diz respeito às listas de antiguidade (...) mesmo que se considere que estamos perante um verdadeiro ato administrativo, sempre se dirá que, nem a ora recorrida alegou, nem faz parte dos factos dados como provados, que a publicitação das listas de antiguidade se tenha realizado em pleno.», acrescentando que «(...) nada consta que permita concluir que as listas de antiguidade (...) tenham sido publicadas pela Escola Secundária ..., nem resulta que as mesmas tenham sido objeto de oportuna publicitação em determinados locais de estilo do estabelecimento de ensino em causa (...). A ausência de prova quanto à publicação do aviso em Diário da República da fixação das listas de antiguidade impede a consolidação dos efeitos jurídicos de tais atos (...). Por último, conclui que (...) ao contrário do que é entendido pelo Tribunal a quo, o facto de estarmos no âmbito de um contrato de trabalho, impõe a remissão para o Código do Trabalho (...), onde no n.º 1 do art.º 337.º se refere expressamente que o crédito de empregador ou de trabalhador, emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. Cremos que carece de razão. Vejamos, Da forma de processo - Vem a Recorrente invocar que intentou a presente ação administrativa de reconhecimento de situações jurídicas subjetivas diretamente decorrentes de normas jurídico-administrativas, invocando que «(...) a A. não pretendeu, em momento algum, impugnar qualquer ato administrativo. E não pretendeu impugnar nem um ato que tenha sido omitido, nem um que tenha sido proferido.» Contudo, a par do pedido de reconhecimento do direito a progredir ao 4.º escalão em 30-09-2009, a Recorrente peticiona a condenação do Réu (...) à prática do ato administrativo devido, ou seja, à progressão da Autora ao 4.º escalão da carreira docente, com efeitos reportados a 30/09/2009(...). Assim, atendendo ao objeto da lide, definido pela causa de pedir e pelos pedidos formulados, estamos em presença de uma ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido, sendo que a pretensão material que a Recorrente pretende fazer valer na ação é a condenação da Administração em fazê-la progredir ao 4.º escalão, com efeitos a 30-09-2009. Pretende a Recorrente subsumir a causa de pedir nas alíneas f) e j) do n.º 1 do artigo 37.º do CPTA. Contudo não tem razão. Em primeiro lugar, não se encontra preenchido o requisito da alínea f) do n.º 1 dado que o direito que se pretende ver reconhecido não se encontra definido na norma administrativa com um mínimo de clareza ou precisão, carecendo ainda de formulação dum juízo valorativo próprio do exercício da função administrativa. Com efeito, determinava o artigo 37.º do Estatuto da Carreira Docente, na sua redação em vigor à data [Decreto-Lei n.º 270/2009, 30 de setembro], as seguintes regras para a progressão na carreira docente: «1 - A progressão na carreira docente consiste na mudança de escalão dentro de cada categoria. 2 - O reconhecimento do direito à progressão ao escalão seguinte da categoria depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) Na categoria de professor, da permanência de um período mínimo de serviço docente efectivo no escalão imediatamente anterior com, pelo menos, dois períodos de avaliação de desempenho em que seja atribuída a menção qualitativa mínima de Bom; b) Na categoria de professor titular, da permanência de um período mínimo de serviço docente efectivo no escalão imediatamente anterior com, pelo menos, três períodos de avaliação de desempenho em que seja atribuída a menção qualitativa mínima de Bom; c) Frequência, com aproveitamento, de módulos de formação contínua que, no período em avaliação, correspondam, em média, a 25 horas anuais.» Assim, decorria da referida disposição legal que, no âmbito da carreira docente, a progressão para o escalão seguinte exige a verificação cumulativa dos três requisitos acima mencionados (tempo de serviço, avaliação do desempenho e frequência com aproveitamento de módulos de formação), os quais, naturalmente, podem ter-se por verificados em diferentes momentos temporais. Por sua vez, decorria do n.º 9 da mesma disposição legal que a listagem dos docentes que progrediram de escalão é afixada semestralmente nos estabelecimentos de educação ou de ensino, sendo indubitável concluir que a pretensão peticionada pela Recorrente (progressão ao 4.º escalão) carece de um ato administrativo prévio por parte da Administração, que passa, obrigatoriamente, pela verificação do cumprimento dos requisitos consignados na lei, bem como pela própria inclusão dos docentes na listagem supra referida, não estando em causa o reconhecimento de situações jurídicas subjetivas diretamente decorrentes de normas jurídico-administrativas, conforme alega. Assim, andou bem o Tribunal a quo ao referir que «Destarte, a progressão ao 4.º escalão envolve, em diversos momentos, o exercício de poderes de autoridade, por parte da Entidade Demandada, nomeadamente, em sede de avaliação de desempenho e de contagem do tempo de serviço.» Por outro lado, também não se encontra preenchido o requisito da alínea j) do n.º 1 do artigo 37.º do CPTA, uma vez que esta disposição contempla as pretensões dirigidas à condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar, que podem ter por objeto o pagamento de quantias, a entrega de coisas ou a prestação de facto - cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª ed., Almedina. Sobre esta disposição legal, referem estes autores que «O pressuposto do exercício do direito de ação, neste caso, é, pois, a existência de uma vinculação da Administração aos deveres de prestar, que resulte diretamente de uma norma administrativa ou de um ato administrativo anteriormente praticado. Isto é, a obrigação de prestar por parte da Administração deve encontrar-se já definida por um anterior ato jurídico, pelo que a recusa de entregar a coisa ou a quantia ou de prestar o facto não corresponde a um ato administrativo de indeferimento, mas a uma mera declaração de recusa, contra a qual se impõe reagir, não através da impugnação contenciosa, mas por via de uma ação condenatória.» Assim, andou bem a sentença quando também aponta: «Por conseguinte, a progressão ao 4.º escalão não decorre diretamente da lei, sem necessidade de intermediação de atos administrativos. Por outras palavras, a progressão ao 4.º escalão depende da prática de vários actos administrativos, sucessivos no tempo, isto é, depende da intermediação do exercício de poderes jurídico-administrativos, pela entidade competente para o efeito, com vista a definir, de forma unilateral e autoritária, a situação jurídica, individual e concreta, do docente em matéria de progressão na carreira (...).» Logo, a ação em apreço consubstancia uma ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido, aplicando-se os prazos consignados no artigo 69.º do CPTA. E estabelece o n.º 1 do artigo 69º do CPTA que, em situações de inércia da administração, o direito de ação caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do ato ilegalmente omitido. Ora, tendo em conta a data reclamada pela Recorrente para a progressão ao 4.º escalão (30-09-2009) e que a sua omissão não foi oportunamente impugnada graciosa ou contenciosamente, temos de concluir que a mesma se encontra consolidada na sua esfera jurídica. Por outro lado, nunca poderia a Recorrente pretender alcançar através da ação administrativa especial para a prática de ato devido, aquilo que já não poderia obter através de ação administrativa especial de pretensão conexa com atos administrativos, uma vez que as listas de antiguidade se tornaram inimpugnáveis por efeito da decorrência do tempo legalmente previsto para que pudesse ser declarada a sua eventual anulabilidade e, por conseguinte, revogada a contagem de tempo de serviço já efetuada. Ora, se a Recorrente pretendia lançar mão da ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido deveria ter, previamente, impugnado as listas de antiguidade e depois, caso a Administração não tivesse decidido, recusasse a prática do ato ou apreciação de requerimento destinado à pratica do ato, aí sim, utilizava o mecanismo processual previsto no artigo 66.º, do CPTA, de acordo com os prazos previstos no artigo 69.º do mesmo Código. Sucede que a Recorrente não fez nem uma coisa nem outra e deixou, com a sua inércia, consolidar as listas de antiguidade publicadas na ordem jurídica, tornando-as atos inimpugnáveis. Com efeito, a Recorrente nunca impugnou as listas de tempo de serviço sucessivamente publicadas na sede do Agrupamento de Escolas ..., referentes ao período de 2007/2008 a 2015/2016. Nunca tendo a Recorrente, em momento algum, apresentado, atempadamente, reclamação do tempo de serviço constante das supracitadas listas. Assim, tendo decorrido o prazo de impugnação de um ano, sem que tenha sido interposta a competente impugnação contenciosa, o vício de que um ato administrativo de contagem de tempo de serviço, para efeitos de progressão, poderia padecer, considera-se sanado e o ato fica consolidado na ordem jurídica. Por outro lado, nos meses seguintes à data em que entendeu que deveria ter progredido para o 4.º escalão, a Recorrente poderia ter detetado, através das remunerações auferidas e dos respetivos recibos, que essa progressão não havia sido feita ou, pelo menos, não estaria a ser considerada para efeitos remuneratórios. Todavia, a Recorrente jamais impugnou, graciosa ou contenciosamente, o processamento do seu vencimento no 3.º escalão, índice 205, no período de outubro de 2009 a setembro de 2010. Com efeito, os atos de processamento de vencimentos são verdadeiros atos administrativos, que se vão sucessivamente firmando na ordem jurídica, se não forem objeto de oportuna impugnação ou revogação. Assim, desde a data de processamento do vencimento de outubro de 2009 (data reclamada pela Recorrente para o referido posicionamento) até ao processamento do vencimento de outubro de 2010 (data efetiva do seu posicionamento no índice 218), que a Recorrente bem sabia que o posicionamento pretendido não teve lugar, por via dos recibos de vencimento e da respetiva remuneração. A passagem do tempo e a omissão da interessada levou à consolidação na ordem jurídica dos atos de processamento dos vencimentos no índice 205, referente a esse período, mesmo que os mesmos se encontrassem feridos de anulabilidade. Da forma de notificação da Recorrente das listas nominativas de tempo de serviço - Vem a Recorrente invocar que «(...) nem a ora recorrida alegou, nem faz parte dos factos dados como provados, que a publicitação das listas de antiguidade se tenha realizado em pleno.» Vejamos, Estatui o n.º 1 do artigo 132.º do ECD, que «(...) a contagem do tempo de serviço do pessoal docente, incluindo o prestado em regime de tempo parcial, considerado para efeitos de antiguidade, obedece às regras gerais aplicáveis aos restantes funcionários e agentes da Administração Pública.» Por seu turno, determinava o artigo 95.º do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de março: «1 - As listas de antiguidade, depois de aprovadas pelos dirigentes dos serviços, devem ser afixadas em local apropriado, de forma a possibilitar a consulta pelos interessados. 2 - A afixação pode ser substituída pela inclusão das listas em publicação oficial dos respetivos serviços. 3 - Até 31 de Março de cada ano, deve ser publicado no Diário da República o aviso da afixação ou publicação das listas de antiguidade.» Assim, decorria do n.º 1 da referida disposição legal que as listas de antiguidade deviam ser afixadas em local apropriado. Por outro lado, o n.º 3 estabelecia a obrigatoriedade da publicação em Diário da República das próprias listas de antiguidade ou do aviso da afixação das mesmas, tendo o Agrupamento de Escolas ... publicado em DR os respetivos avisos de afixação das mesmas [Veja-se, a título de exemplo, o Aviso n.º 3015/2013, publicado no DR, 2.º Série, n.º 43, de 01-03-2013, referente à lista de antiguidade de 2012]. Assim, as listas de tempo de serviço publicadas no Agrupamento de Escolas ... foram elaboradas com as regras estabelecidas no n.º 1 do artigo 132.º do ECD e no artigo 95.º do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de março, tendo as mesmas sido conhecidas por todos os docentes da escola, não podendo a Recorrente afirmar que não tomou conhecimento delas. Com efeito, estabelecia a alínea d) do n.º 1 do artigo 70.º do CPA, na versão vigente à data, que as notificações podiam ser feitas por edital ou anúncio a publicar no Diário da República, no boletim municipal ou em dois jornais mais lidos da localidade da residência ou sede dos notificandos, se os interessados forem desconhecidos ou em tal número que torne inconveniente outra forma de notificação. In casu, destinando-se as referidas listas de antiguidade a serem divulgadas a todos os docentes do Agrupamento de Escolas ..., o recurso a esta forma de comunicação apresentava-se como uma inevitabilidade face à impossibilidade objetiva de notificar pessoalmente todos os interessados. Temos assim que o artigo 70.º do CPA, ao permitir que a notificação seja feita através da publicação de editais e anúncios, quando “os interessados forem desconhecidos ou em tal número que torne inconveniente outra forma de notificação”, não colidia com o n.º 1 do artigo 95.º do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de março. Constando no Aviso n.º 3015/2013, de 01-03-2013, que as reclamações deveriam ser apresentadas no prazo de 30 dias a contar da data da publicação do referido aviso e não tendo a Recorrente impugnado aquelas listas, com a apresentação da respetiva reclamação, a mesma firmou-se na ordem jurídica. As listas de antiguidade do pessoal docente configuram verdadeiros atos administrativos e, como tal, consolidam-se na ordem jurídica se não forem oportunamente impugnadas. Decidiu o STA, no Proc. n.º 0401/15.BECBR, de 14-07-2022, que « I - As listas de antiguidade enquanto actos declarativos de verificação constitutiva (accertamenti constitutivi) são verdadeiros actos administrativos porque, “embora sejam manifestações de ciência, criam a certeza jurídica oficial quanto aos factos verificados” configurando, assim, um comando unilateral dotado de imperatividade e vinculativo para a própria Administração. II - Cada lista de antiguidade aprovada referente aos anos lectivos de 2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010 e não impugnada de conformidade com o disposto nos artºs 96º e 97º DL 100/99, 31.03 firma-se na ordem jurídica como caso decidido». Tem, pois, de concluir-se que as listas de tempo de serviço sucessivamente publicadas pelo Agrupamento de Escolas ..., referente ao período de 2007/2008 a 2015/2016, bem como os sucessivos atos de posicionamento remuneratório constantes dos recibos de vencimento, se consolidaram na ordem jurídica, dado que não foram oportunamente impugnadas. Logo, andou bem a sentença ao referir que «(...) a situação jurídica da Autora, relativa à progressão ao 4.º escalão, encontra-se consolidada, na ordem jurídica, há cerca de 10 anos, porquanto a Autora, nesse tempo não diligenciou no sentido de impugnar os atos relativos à progressão na carreira, nomeadamente os que resultam das Listas de Antiguidade (...) e, nessa medida, as pretensões que, agora, formula são intempestivas à luz do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA.» Da exclusão da aplicabilidade do n.º 1 do artigo 337.º do CT - A este propósito vem a Recorrente invocar que «(...) não faz qualquer sentido a exclusão da aplicabilidade do disposto no n.º 1 do artigo 337.º da LGTFP (...). Vejamos, De acordo com o n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12-02, o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. Ou seja, vem a Recorrente invocar que, de acordo com tal normativo legal, a progressão por si peticionada apenas prescreve no prazo de um ano a partir do dia seguinte à cessação do seu contrato de trabalho em funções públicas. Porém, sem razão. É que estes créditos emergentes do contrato de trabalho, estabelecidos no n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho, apenas englobam os créditos remuneratórios (v.g. salários e diversos subsídios regulares - férias, natal, alimentação), bem como os créditos compensatórios (por cessação posterior do contrato de trabalho); isto, é, apenas englobam os créditos laborais dos trabalhadores, que correspondem a valores devidamente quantificados, que, uma vez terminado o contrato de trabalho, têm de ser pagos pela entidade patronal, sendo que estes valores são provenientes de salários, subsídios de férias e de Natal, de compensações e/ou indemnizações por cessação do contrato de trabalho que não haviam ainda sido liquidadas. A aplicação do regime prescricional especialmente aplicável na área laboral pressupõe, assim, que estejamos em presença de reclamação de um crédito cuja fonte seja o contrato de trabalho, a sua violação ou cessação. No caso concreto, a progressão visada pela Recorrente não consubstancia um crédito laboral. Crédito (ou direito de crédito) é o lado ativo da relação jurídica obrigacional. Como se extrai da lição de Antunes Varela diz-se “obrigação a relação jurídica por virtude da qual uma (ou mais) pessoa pode exigir de outra (ou outras) a realização de uma prestação”, noção que encontra amparo no artigo 397º do CC. A obrigação compreende o dever de prestar e o poder de exigir a prestação, ou seja, o débito e o crédito - Das Obrigações em Geral, 4ª ed., Almedina, Coimbra, pág. 51 e ss.. Na situação em apreço, a Recorrente peticiona a progressão para o 4.º escalão, com efeitos a 30-09-2009. Logo, não estando a reclamar o pagamento de um crédito (previamente definido), não se lhe aplica o prazo prescricional contemplado no artigo 337º/1 do CT. Acresce que a existência de um eventual direito de crédito relativo à diferença dos índices remuneratórios que correspondem aos 3.º e 4.º escalões, dependeria da demonstração da invalidade da progressão ao 4.º escalão em 01-09-2010, o que já não é possível, por se ter formado caso julgado. Assim, bem andou sentença quando concluiu que o n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho não se aplica ao caso vertente, uma vez que a existência de um eventual direito de crédito relativo à diferença salarial entre o 3.º e 4.º escalões, no período de 30.09.2009 e 01.09.2010, dependeria da demonstração da invalidade da progressão ao 4.º escalão somente nesta última data, o que, como se acaba de ver, já não é possível, por força do decurso do tempo e da consolidação da situação jurídica da Autora, quanto à progressão na carreira ao 4.º escalão. Em suma, Com a estipulação de prazos para a reação a atos administrativos, pretende o Legislador a estabilidade nas relações jurídico-administrativas, as quais não podem estar dependentes do mero alvedrio, liberalidade ou escolha de timing do interessado e/ou da Administração, sob pena de se eternizar a indefinição acerca da situação jurídica das partes. Sendo, portanto, forçoso, em nome da segurança jurídica, impor um limite à reação a atos administrativos, de modo a conciliar de forma equilibrada estes princípios com o da tutela jurisdicional efetiva. Assim, no âmbito do CPTA, ato administrativo impugnável é um ato dotado de eficácia externa, atual ou potencial, neste caso desde que seja seguro ou muito provável que o ato irá produzir efeitos. Como referem Fausto de Quadros e outros (in Comentários à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, Almedina, 2016, pág. 296), “a exigência da produção direta dos efeitos externos implica, em rigor, a exclusão do conceito de ato administrativo dos atos inseridos no procedimento, ainda que determinantes do conteúdo da decisão, sempre que sejam meramente preparatórios, isto é, se e na medida em que não visem produzir quaisquer efeitos externos por si, mas apenas através de uma outra decisão, que constitui o ato principal do procedimento - sem prejuízo, porém, da possibilidade de atos inseridos no procedimento produzirem efeitos externos, bem como da existência de atos administrativos prévios ou de atos parciais em procedimentos complexos”. Assim, estes autores entendem que o conceito legal abarca “as decisões administrativas concretas às quais a lei reconhece força jurídica para a definição unilateral e estável de relações jurídicas administrativas, designadamente quando conformam ou afetam (em termos desfavoráveis ou favoráveis) a esfera jurídica dos particulares”. Na mesma linha, o artigo 51º, nº 1 do CPTA dispõe que “ainda que não ponham termo a um procedimento, são impugnáveis todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta, incluindo as proferidas por autoridades não integradas na Administração Pública e por entidades privadas que atuem no exercício de poderes jurídico-administrativos”. A intempestividade da prática do acto processual é uma excepção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo e importa a absolvição do Réu da instância, nos termos da al. h), do nº 1 e nº 2 do artigo 89º (actual artigo 89º, nºs 1, 2 e 4, al. k)) do CPTA, conjugado com os artigos 278º, nº 1, al. e), 576º, nº 2 e 577º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, mostrando-se por esse facto prejudicado o conhecimento do fundo da causa. Na verdade, a caducidade do direito de acção é consagrada a benefício do interesse público da segurança jurídica que reclama que a situação das partes fique definida de uma vez para sempre com o transcurso do respectivo prazo - (v. Manuel Andrade “Teoria Geral da Relação Jurídica”, II, 3ª reimpressão, pág. 464). Improcedem as Conclusões das alegações. DECISÃO Termos em que se nega provimento ao recurso. Custas pela Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que possa beneficiar. Notifique e DN. Porto, 12/7/2024 Fernanda Brandão Rogério Martins Paulo Ferreira de Magalhães |