Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00136/23.0BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/31/2024
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:RICARDO DE OLIVEIRA E SOUSA
Descritores:REFORMA QUANTO A CUSTAS;
DISPENSA DE PAGAMENTO DO REMANESCENTE;
Sumário:
I – Nos termos do art.º 1.º, n.º 2, do RCP, cada recurso é um processo autónomo para efeito de custas.

II - De acordo com a regra geral em matéria de custas, “a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito”, considerando-se que “dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for” [art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 1º do CPTA].

III- Apresentando-se distintivo que a Recorrente teve êxito no recurso, e a Recorrida foi por ele negativamente afetada, é esta a parte nele vencida e, consequentemente, deu causa às custas concernentes, donde inexiste no acórdão qualquer erro jurídico ou, sequer, qualquer lapso, na condenação da Recorrida em custas do recurso, que importe reformar.

IV- Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, « Nas causas de valor superior a [euro] 275 000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.».

V. Legitimando os autos a aquisição de que o valor da taxa de justiça paga pela Recorrente é proporcional ao serviço de justiça que lhe foi prestado, impõe-se dispensar a mesma, no “processo autónomo” que o presente recurso é, e apenas neste, do pagamento da taxa de justiça remanescente sob pena de violação do princípio constitucional da proporcionalidade.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Indeferir a reforma quanto a custas.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos:
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I – RELATÓRIO

1. [SCom01...], LDA., com os sinais dos autos, notificada do Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 21.06.2024, e exarado a fls. 940 e seguintes [suporte digital], que concedeu provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Ré [SCom02...], EIM, S.A., vem atravessar requerimento destinado a requerer a reforma do dito Aresto quanto a custas judiciais “(…) no sentido de não dever ser a Autora/Recorrida, condenada a pagar as custas do recurso para o TCA Norte (…) [e ser] dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final (…)”.

2. Estriba tais pretensões na alegação de que foi a Ré/Recorrente quem exerceu o seu direito potestativo de exercício judicial de interposição de recurso contra uma decisão adversa, a que a recorrida não deu causa, nem teve qualquer intervenção processual no presente recurso, devendo, por isso, “(…) alterada a decisão no sentido de não dever ser a Autora/Recorrida, condenada a pagar as custas do recurso para o TCA Norte (…)”.

3. Arrima ainda no entendimento que se mostram verificados os pressupostos previstos no artigo 6.º, n.º 7 do RCP, justificando-se, por isso, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

4. Não se antolham obstáculos de natureza adjetiva impeditivos da apreciação do presente requerimento, pelo que cumpre apreciar e decidir.

5. Dispõe o art.º 1.º, n.º 2, do RCP, que «para efeitos do presente Regulamento, considera-se como processo autónomo cada acção, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria.»

6. Quer isto significar que, para efeitos de custas, cada recurso passou a ser considerado um processo autónomo.

7. De acordo com a regra geral em matéria de custas, “a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito”, considerando-se que “dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for” [art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 1º do CPTA].

8. Como a Recorrente teve êxito no recurso, e a Recorrida foi por ele negativamente afetada, é esta a parte nele vencida e, consequentemente, deu causa às custas concernentes, donde, por decorrência do princípio da causalidade consagrado no art.º 527.º, a decisão contida no acórdão, de que “Custas da ação e do recurso pela Autora/Recorrida” [sublinhado nosso].

9. O argumentário invocado pela Recorrente em nada altera o juízo decisório assim firmado, relevando, quando muito, em sede de elaboração da conta de custas por efeito da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 7º do RCP, o que nem se patenteia no presente momento processual.

10. Inexiste, portanto, no acórdão, qualquer erro jurídico ou, sequer, qualquer lapso, na condenação da Recorrida em custas, que importe reformar.

11. Resta-nos, no entanto, a questão de saber se se mostra devida [ou não] a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça no “processo autónomo” que o presente recurso é.

12. A resposta a esta indagação é positiva.

13. Na verdade, quanto ao comportamento da Recorrida, nada há a censurar à sua atuação processual, que se limitou [sem qualquer violação dos deveres de boa-fé, cooperação, razoabilidade ou prudência] a lançar mão dos normais meios, que teve por adequado à defesa dos seus interesses, sem qualquer excesso ou requerimento abusivo ou injustificável.

14. No que concerne à complexidade da tramitação processual em análise, está-se em crer que a mesma não é em molde a legitimar, em termos de adequação e proporcionalidade, a cobrança de mais um valor pecuniário de 6.164.00 €, enquanto valor remanescente das custas, se não for utilizado o poder de conformação casuística invocado nos autos.

15. Em tais termos, e em aplicação do critério normativo previsto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, justiça-se dispensar, no “processo autónomo” que o presente recurso é, e apenas nele, pois que apenas a ele se reporta a presente decisão, a Recorrida do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

16. Mercê de tudo o quanto ficou exposto, impõe-se conceder parcial provimento às pretensões veiculadas no requerimento em análise, e, dessa sorte, por um lado, indeferir a reforma quanto a custas do Acórdão promanado em 21.06.2024, e, por outro, dispensar, no “processo autónomo” que o presente recurso é, e apenas nele, a Recorrida do pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a 275.000,00 €, atento o grau de complexidade do processado e a conduta processual da litigante.

17. Ao que se proverá no dispositivo.


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II – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP em:

(i) INDEFERIR a requerida reforma quanto a custas do Acórdão promanado em 21.06.2024;

(ii) DISPENSAR, no “processo autónomo” que o presente recurso é, e apenas nele, a Recorrida do pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a 275.000,00 €, atento o grau de complexidade do processado e a conduta processual da litigante.

Sem custas.

Notifique-se.


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Porto, 31 de julho de 2024


O Coletivo de Juízes,

Ricardo de Oliveira e Sousa

Maria Conceição Silvestre

Ana Paula Santos