Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00915/06.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/25/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:MAIS VALIAS; AVALIAÇÃO DE PRÉDIO; FALTA DE NOTIFICAÇÃO DE AVALIAÇÃO
Sumário:I. Decorre do n.º 1 e 2 do art.º 134.º do CPPT que os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, autonomamente, com fundamento em qualquer ilegalidade ou preterição de formalidade legal. No entanto, só depois de ter sido esgotados os meios graciosos, o sujeito passivo poderá impugnar judicialmente a fixação do valor patrimonial.

II. Decorre do n.º 1 do art.º 37. º do CPPT, que as decisões em matéria tributária devem ser notificadas com inclusão da fundamentação legalmente exigida, da indicação dos meios de reação e dos outros requisitos exigidos pelas leis tributárias.

III. O n.º 9 do art.º 39.º (atualmente n.º11) somente prevê a nulidade do ato de notificação em caso de “falta de indicação do autor do ato e no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, na qualidade que decidiu do seu sentido e data.”

IV. O regime previsto no art.º 36º, n.ºs 1 e 2, e 39.º, n.º 9, do CPPT é o de que, só nos casos previstos nesta última disposição, é que a notificação se considera nula.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:G.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

1. RELATÓRIO

Os Recorrentes, G. e mulher A. contribuinte fiscal n.º (...) e (…), respetivamente interpuseram recurso da sentença prolatada, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto, que julgou improcedente a impugnação judicial visando a liquidação adicional de IRS do ano de 2001, derivada de mais valias, no montante de € 712 332,48.

Os Recorrentes não se conformaram com a decisão tendo interposto o presente recurso formularam nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
1. Visa o presente Recurso obter a revogação da douta sentença acima referida que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pelos ora recorrentes contra as liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativo ao ano de 2001, e de juros compensatórios, no total de € 712.332,48, embora o Exmo. Magistrado do Ministério Público tenha emitido douto parecer em sentido contrário.
De facto:
2. A liquidação-de RS e de juros compensatórios impugnadas resultaram:
- de a AT ter considerado que, face a avaliação nos termos do art. 57° do então Código da Sisa, o valor para efeitos de Sisa dos imóveis que, em 2001, os impugnantes venderam à sociedade I., Lda. foi de 2.684.740.000$00 (€ 13.391.416,67) e não de 2.150.000.000$00 (€ 10.724.154,79), como foi declarado na escritura das ditas vendas;
- e, assim, a AT, corrigiu o valor de alienação que os recorrentes declararam para apuramento das mais-valias sujeitas a IRS do ano de 2001, daí resultando a liquidação adicional do referido imposto, que se impugnou.
3. O que os ora recorrentes impugnaram e submeteram à apreciação do Tribunal não foi a atrás referida avaliação, em si, mas as já mencionadas liquidações de IRS, do ano de 2001, de juros compensatórios, tendo a avaliação sido invocada, porque, no entender dos recorrentes, enfermava dos vícios alegados na PI, que, por sua vez, se refletiram na liquidações impugnadas e determinaram a ilegalidade dessas liquidações.
4. Com efeito, os ora recorrentes não foram notificados dessa mesma avaliação e respetivo resultado para, querendo, requererem uma segunda avaliação, notificação quer nos termos da lei, era obrigatória, tanto mais que, face ao n° 2 do art. 44° do Código do IRS, o valor definitivamente fixado em tal avaliação era (como foi para a AT) o relevante para efeitos de IRS, categoria de mais-valias, afetando, por isso, os seus legítimos direitos e interesses, o que exigia a dita notificação para requerimento de segunda avaliação (art. 268°, n° 3 da Constituição da República - CRP - e n° 1 do art. 36° do CPPT).
5. O que os recorrentes receberam foi apenas o ofício da AT, de 11 de fevereiro de 2003, referido no facto 5 do probatório, que tem apenas por finalidade dar cumprimento às instruções administrativas transmitidas pelo Ofício Circular n° X-2/93, de 15 de fevereiro, ela DGCI, no sentido de "convidar" ao cumprimento do n° 2 do art. 60° do Código elo IRS, face ao diferencial entre os valores de avaliação e da venda dos prédios, finalidade que mais se confirma com a emissão, em 10 de dezembro de 2003, pela Direção de Serviços do IRS, da DGCI, do Ofício-Circulado n° 20089/2003.
6. De resto, tal qual a sociedade compradora dos imóveis avaliados, deveriam os ora recorrentes ser notificados da avaliação na mesma data, que foi 13 de dezembro de 2001 (cfr. doc. n° 4 junto à PI e o referido no facto 8 dado como provado), o que não aconteceu, pois, como se disse, apenas em 11 de fevereiro de 2003 (cerca de 2 anos mais tarde que a compradora) os recorrentes receberam da AT o ofício atrás referido.
7. Daí que admitir-se, como faz a douta sentença recorrida, que a notificação dos recorrentes foi realizada pelo já mencionado ofício de 11 de fevereiro de 2003, com o devido respeito, não parece razoável nem compreensível, considerando até que o art. 95° do Código da Sisa estabelece que a notificação da avaliação deve ser feito "em seguida" à sua redução a termo.
8. Por isso, o facto 19 do probatório deva ser alterado, passando a ter o seguinte teor:
19. Os aqui impugnantes não foram notificados do início daquele procedimento e avaliação, nem nele intervieram.
9. Desta alteração da matéria de facto e do a este propósito anteriormente exposto, tem de concluir-se que não se verifica o que a douta sentença recorrida conclui de que os ora recorrentes foram notificados da avaliação em causa.
10. Aliás, esta conclusão da Meritíssima Juiz não pode extrair-se do facto de o recorrente marido ter apresentado o requerimento referido no facto 7 dado como provado e recebidas as cópias certificadas a que alude o facto 8 do probatório.
11. Bem assim como não se pode extrair, como também faz a douta sentença recorrida, que, recebidas as ditas cópias certificadas, surgiu o momento em que os recorrentes podem reagir contra a avaliação, requerendo a segunda avaliação, o que não fizeram e, assim, a avaliação tornou-se definitiva.
12. Sendo certo que; repetimos, a notificação recebida por ofício de 11 de fevereiro de 2003 (facto 5 dado como provado) não reveste a natureza de uma notificação efetuada nos termos do disposto no art. 96° do Código da Sisa, tanto mais que nem sequer indica prazo para requerimento de segunda avaliação (facto 20 dado como provado), veja-se que, na verdade, os ora recorrentes efetivamente reagiram, na altura própria e através do meio processual próprio.
13. Reagiram na altera própria que foi aquela em que viram na realidade afetados os seus direitos e interesses legítimos, altura que foi a que receberam as notificações das liquidações de IRS e de juros compensatórios que impugnaram a que alude o facto 12 dado como provado, e através do meio processual próprio que foi a impugnação judiciai apresentada nos presentes autos, pois, a mesma destinou-se a anular aquelas liquidações, as quais decorreram do resultado da avaliação aos imóveis que se vem apreciando.
14. Por isso e, com a devido respeito, ao contrário da Meritíssima Juiz não podemos conformar-nos como que a Meritíssima Juiz refere quando, diz "que o prévio pedido de segunda avaliação previsto no artigo 96º do CIMSISSD [que os recorrentes não fizeram] constitui pressuposto processual para a dedução da respetiva impugnação judicial."
15. Por outro lado e com o devido respeito, também não pode aceitar-se que, embora reconhecendo "que o pedido anulatório que as impugnantes formulam na sua Petição Inicial não é dirigido àquela avaliação, mas à liquidação adicional de IRS relativa ao ano de 2001", a Meritíssima Juiz entenda que não podem "...agora os Impugnantes obter a anulação da liquidação adicional de IRS do ano de 2001,que no âmbito da tributação das mais-valias decorrentes daqueles dois imóveis tornou por base aquele valor nos termos do disposto no n° 2 do artigo 44° do CIRS".
16. Com efeito, a impugnação das liquidações por a avaliação dos imóveis, que foi determinante para aquelas liquidações, enfermar de ilegalidade, nomeadamente, por não ter sido observado pela AT o disposto no art. 57° do Código da Sisa, inclusive devida à circunstância de o despacho que autorizou a avaliação não evidenciar, de forma objetiva, congruente e acessível, quaisquer indícios sérios dos quais fosse lícito admitir que a transação dos imóveis se realizou por preço superior ao que consta das respetivas escrituras públicas de venda, é admissível, isto porque tal despacho estava sujeito a impugnação autónoma a deduzir pelos ora recorrentes e, por isso, a impugnação judicial não tem por objeto a reação contra o referido despacho.
17. O que verdadeiramente se colocou em causa na impugnação foi a ilegalidade das liquidações do IRS de 2001 e dos juros compensatórios que a AT efetuou e nela estão identificados.
18. E sendo certo que na sua petição os impugnantes, ora recorrentes, alegam a ilegalidade das liquidações, por ilegalidade da decisão que determinou a avaliação dos imóveis alienados por escritura pública, de 10 de janeiro de 2001, nomeadamente, par ilegalidade do aludido despacho, isso é feito no âmbito da impugnação da ilegalidade daquelas mesmas liquidações.
19. Ora, parece-nos ser pacificamente entendido que na impugnação judicial podem ser alegados quaisquer vícios de que enferme o procedimento que conduziu ao ato impugnado, tendo sido exatamente isso o que os reclamantes fizeram.
20. E, salvo melhor opinião, afigura-se não se levantarem dúvidas de que o despacho que, com base no art. 57° do Código da Sisa, autorizou a avaliação em apreço é ilegal.
21. Pelo menos não se suscitaram dúvidas ao Exmo. Magistrado do Ministério Público que emitiu douto parecer, que com o devido pedido de permissão, aqui damos por reproduzido, no qual conclui a ilegalidade do dito despacho e, consequentemente, a ilegalidade das liquidações impugnadas, entendendo que a impugnação devia proceder.
22. Acresce que os ora recorrentes também alegaram a ilegalidade das liquidações, par ilegalidade da avaliação dos imóveis alienados por escritura pública, de 10 de janeiro de 2001, consistente na preterição de formalidades legais essenciais.
23. Efetivamente, o Termo de Avaliação (cfr. facto 6 do probatório) não contém a indicação dos critérios utilizados e a ponderação dos fatores que influenciaram a determinação do resultado da avaliação, nem justificação alguma sobre os mesmos, nomeadamente quanto às razões que levaram a considerar os preços por metro quadrado que dele constam, nem os louvados atenderam às condições em que o prédio se encontrava à data em que realizaram a avaliação e não à data da transmissão.
24. Acresce ainda que a Meritíssima Juiz entendeu não ser de anular a liquidação de juros compensatórios, porque entendeu que:
"... a invocação que os Impugnantes fazem de que não se descortinando dos Doc. nas 5 a 9 que juntam a data da conclusão da Inspeção estão os Impugnantes impossibilitados de saber se os juros que a Administração Tributária calculou observam ou não o que determina o n° 7 do art. 35° da LGT não se subsume no vício de falta de fundamentação do ato de liquidação dos juros. Tal questão respeitará já ao erro nos pressupostos, de facto e de direito, em que assentou aquela liquidação, por respeitar aos períodos a considerar no cálculo dos juros, por referência aos momentos de início e fim a atender para o efeito no caso. Por outro lado a impossibilidade, a que aludem, de saberem se os juros que a Administração Tributária calculou observam ou não a que determina o n° 7 do art. 35° da LGT, decorrerá, a existir, não do ato de liquidação, mas da ausência de elementos nos referidos Doc. nos 5 a 9 que juntam com a Pelicão Inicial que permitam aferir da data de conclusão do mencionado procedimento de inspeção".
25. Com o maior respeito, não podemos de forma alguma perfilhar o que acabámos de transcrever e consta da douta sentença recorrida, visto que o ato de liquidação, como qualquer ato tributário, deve estar devidamente fundamentado, e se o não está ou seja, se todos os elementos que a AT forneceu ao contribuinte quanto a esse ato, no caso à liquidação dos juros compensatórios, não permitem ao contribuinte fica ciente de como, por quê e quanto por ele é devido e está a ser exigido pela AT, isso só pode fazer concluir que o ato não está devidamente fundamentado e, por isso, é ilegal, tanto mais que, nos termos da lei, é à AT que compete o fornecimento ao contribuinte de todos esses elementos.
26. Finalmente, na PI foram requeridos juros indemnizatórios que a Meritíssima Juiz considerou não serem devidos por a improcedência da impugnação, que decidiu, conduzir à improcedência do pedido de tais juros.
27. Contudo, por todo o anterior exposto, admitimos, salvo melhor opinião, que a impugnação devia proceder, razão por que são devidos os juros compensatórios, tal como peticionados na PI.
28. Em suma: a douta sentença recorrida devia ter decidido pela anulação das liquidações do IRS e dos juros compensatórios que foram impugnadas, e condenado a AT nos juros indemnizatórios que foram pedidos.
29. Não foi isso, porém, que decidiu a douta sentença recorrida, pelo que a mesma violou, entre outros, o disposto nos arts. 96° do Código da Sisa, 44° do Código do IRS, 35°, 43° e 77º da LGT.
Nestes termos
Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra que julgue a impugnação totalmente procedente, e condene a AT nos juros indemnizatórios pedidos..(…)”


1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
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Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto e de direito, ao considerar que os Recorrentes foram devida e oportunamente notificados da avaliação aos prédios e como tal poderiam ter reagido em tempo, pese embora a notificação efetuada fosse imperfeita e ao considerar fundamentados os juros.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)
1. Por escritura pública outorgada em 10/01/2001 (junta com a PI sob Doc. n° 1, a fls. 50 ss. dos autos) os aqui Impugnantes G. e mulher A., venderam à sociedade I., LDA., NIPC (…), os seguintes imóveis:
- a fração autónoma letra "AVF" destinada a hotelaria (hotel de apartamentos), formada por 19 pisos, com entrada pelos n°s 280 a 344 da Rua (…), do prédio constituído em regime de propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n° (…) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) da Freguesia de Massarelos, Porto;
- o prédio urbano destinado a hotelaria, composto de cave, sub-cave, rés do chão, primeiro a nono andares, sitio na Rua (…), descrito na conservatória do Registo Predial do Porto sob o n° (…) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) da Freguesia de Massarelos, Porto.
2. Aqueles dois prédios são contíguos, são ambos destinados a hotelaria e integram o complexo vulgarmente conhecido por "Hotel (...)" (cfr. Processo Administrativo).
3. Naquela escritura foi declarado como preço global de venda o de 2.150.000.000$00, sendo o de cada um daqueles imóveis o seguinte:
- de 1.600.000.000$00 (7.980.766,36 €) quanto à fração "AVF", sita na Rua (…) (artigo (…));
- de 550.000.000$00 (2.743.388,43 €) quanto ao prédio sito na Rua (…) (artigo (…)).
4. Relativamente às transações daqueles dois imóveis, foi liquidado e pago pela compradora I., LDA., Imposto Municipal de Sisa devido em função dos valores de venda (que totalizaram 2.150.000.000$00/10.724.1564,79€), por ser superior aos respetivos valores patrimoniais, através do conhecimento de SISA n' 22, emitido em 09/01/2001 pelo Serviço de Finanças do Porto 6.
5. Por ofício datado de 11/02/2003 do Serviço de Finanças do Porto 6 (junto sob Doc. n° 2 com a Petição Inicial, a fls. 56 dos autos) o Impugnante marido foi notificado que por avaliação levada a efeito ao imóvel que constitui a fração "AVF" artigo 2.937, nos termos do artigo 57° do CIMS, foi atribuído ao imóvel o valor de 2.684.740.000$00 (13.391A26,67 €), que tal valor serviu de base à liquidação adicional de SISA no 126, de 13/02/2002, e que os valores resultantes daquela avaliação são relevantes para efeito de tributação em sede de IRS - Categoria G, e que assim o aqui Impugnante, caso ainda o não tivesse feito, deveria dar cumprimento ao disposto no n° 2 do artigo 60° do CIRS, procedendo à apresentação da declaração de substituição relativa ao ano da transmissão. (cfr. fls. 56 dos autos).
6. Com aquele ofício foi junto o «Termo de Avaliação» (constante de fls. 57 dos autos -Doc. n° 2 junto com a Petição Inicial), datado de 09/11/2001, elaborado pela Comissão de Avaliação, nos termos do qual esta, por unanimidade, atribuiu aos dois identificados imóveis - artigo 2.937-AVF e artigo 2.722 - o valor global de 2.684.740.000$00 (13.391.426,67 €).
7. Na sequência do que o Impugnante marido dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças do Porto 2 em 20/02/2003 requerimento (junto sob Doc. n° 3 com a Petição Inicial, a fls. 59 ss. dos autos) pelo qual requereu que lhe fosse passada certidão contendo os requisitos que considerou terem sido omitidos naquela notificação:
- tratar-se de uma primeira ou de segunda avaliação;
-se para a realização de uma ou outra o requerente (aqui Impugnante) foi para elas notificado;
-os meios de reação contra o ato notificado, tal como o determina o artigo 37° do CPTT.
8. Àquele requerimento o Impugnante marido recebeu, através do ofício datado de 17/03/2003 (junto sob Doc. n° 4 com a Petição Inicial, a fls. 66 dos autos) cópia certificada dos elementos existentes no processo (Proc. n° 1/2001 - art° 57° do CIMS) (juntos a fls. 67-83 dos autos).
9. Posteriormente foram os aqui Impugnantes notificados através do ofício no 537766/03.14, datado de 25/10/2005 (junto sob Doc. n° 5 com a Petição Inicial, a fls. 78 dos autos) para exercerem o direito de audição sobre o projeto de decisão anexo àquele ofício (junto a fls. 79 ss. dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido), nos termos do qual era proposta a alteração do conjunto de rendimentos líquidos de IRS dos aqui Impugnantes para o ano de 2001, passando a incluir o rendimento de 1.333.635,94 € a título de mais-valias (Categoria G) a tributar (50% do valor de 2,667.271,88 €), rendimento que não havia sido declarado (cfr. fls. 78-83 dos autos).
10. Os aqui Impugnantes não se pronunciaram em sede de audiência prévia nem apresentaram declaração de substituição do IRS de 2001.
11. Em face do que foi mantida, por despacho de 21/11/2005 do Chefe da Divisão de Liquidação de Impostos sobre o Rendimento e sobre a Despesa (junto a Eis. 85 ss., dos autos), a proposta de correções à matéria coletável, do que os aqui Impugnantes foram notificados através do ofício n° 62539/0314 datado de 21/11/2005 (junto sob Doc. n° 6 com a Petição Inicial, a fls. 84 dos autos).
12. Após o que foi efetuada em 07/12/2005 a liquidação adicional de IRS do ano de 2001 (liquidação n° 2005-5004463877), tendo os aqui Impugnantes recebido a respetiva Nota Demonstrativa da Liquidação do Imposto (junta sob Doc. n° 7 com a Petição Iniciai, a fls. 89), a Demonstração de Liquidação de Juros (junta sob Doc. n° 8 com a Petição Inicial, a fls. 90) e a Demonstração de Acerto de Contas (junta sob Doc. n° 9 com a Petição Inicial, a fls. 91) - cfr. fls. 89-90 dos autos e Processo Administrativo.
13. A Demonstração de Liquidação de Juros (junta sob Doc. n° 8 com a Petição Inicial, a fls. 90) tem o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

O rendimento considerado de 1,333.635,94 C a título de mais-valias (Categoria G) a tributar corresponde a 50% do valor de 2,667.271,88 €, que constitui a diferença entre o valor dos dois imóveis vendidos resultante da avaliação (13.391.426,67 €) e o valor constante como valor da pelo qual foram vendidos (10.724.154,79 €),
14. Nos termos da Demonstração de Acerto de Contas (junta sob Doc. no 9 com a Petição Inicial, a fls. 91) resultou um saldo no montante de 712.332,48 €, a pagar até 18/01/2006, que os aqui Impugnantes pagaram em 17/01/2006 (cfr. fls. 91 e informação de fls. 113 dos autos).
15. A Petição Inicial da presente Impugnação Judicial foi remetida a este Tribunal por correio registado em 07/04/2006 (cfr. fls. 93 dos autos).
16. O procedimento de avaliação dos identificados imóveis, vendidos pelos aqui Impugnantes no ano de 2001, foi promovido pelo ofício de 11/01/2001 do Chefe de Serviço de Finanças do Porto 6 dirigido ao Diretor de Finanças do Porto (junto a fls. 69-verso dos autos - Doc. n° 4 junto com a Petição Inicial), nos seguintes termos.
«Em 9 do corrente foi liquidada, neste serviço fiscal, Sisa no valor de 215 000 contos devida pelas transmissões das frações "AVF" do artigo (…) e do artigo (…) ambos da Freguesia de Massarelos.
Os aludidos artigos são contíguos, estão destinados a hotelaria e constituem o complexo vulgarmente conhecido por "HOTEL (...)" sito no gaveto formado pela Rua (…)/Rua (…).
Conforme cópia da Sisa que se anexa, serviu de base à liquidação o Preço no valor global de 2 150 000 contos por superior ao valor patrimonial de 2 038 365 734$00.
Atentos os valores envolvidos e porque se diz (sem assumir) que o preço da transação se terá aproximado dos 2 500 000 contos, o chefe deste Serviço Fiscal no uso da competência conferida no artigo 57° do CMISID entende ser de promover a avaliação dos bens transmitidos pelo que solicita a indispensável autorização superior como determina o referido normativo legal.»
17. Aquele pedido foi autorizado por despacho de 13/03/2001 do Chefe da Divisão de Liquidação dos impostos sobre o Património e Outros, da Direção de Finanças do Porto (junto a fls. 71-verso dos autos - Doc. n° 4 junto com a Petição Inicial), com o seguinte teor:
«Nos termos do artigo 57° do código da Sisa, autorizo a avaliação dos prédios urbanos, frações "AVF", inscritos sob os artigos (…) e (…) da freguesia de Massarelos, a que respeita a Sisa de 9 de janeiro do ano em curso, liquidada no Serviço de Finanças do Porto 6, por ter concluído que são perfeitamente fundadas as suspeitas de que não foram transacionados por preço inferior a 2 500 000 000$00 (dois milhões e quinhentos mil contos) tendo em conta:
a) - Que aponta nesse sentido a informação do Senhor Chefe do Serviço de Finanças em resultado de rumores não confirmados, a qual indicia a suspeita de não haver coincidência entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na transação.»
19. Os aqui Impugnantes não foram notificados do início daquele procedimento de avaliação, nem nele intervieram, tendo sido notificados do resultado dessa avaliação pelo ofício de 11/02/2003, com o qual foi junto o respetivo «Termo de Avaliação» de 09/11/2001 referidos em 5. e 6. supra, respetivamente.
20. Naquele ofício de notificação de 11/02/2003 (junto sob Doc. n° 2 com a Petição Inicial, a fls. 56 dos autos) dirigido aos aqui Impugnantes não é mencionada a possibilidade de ser requerida por eles, no prazo de oito dias, a segunda avaliação a que se refere o artigo 96° do Código da Sisa.
21. Na sequência daquela avaliação de 09/11/2001 («Termo de Avaliação» constante de fls. 57 dos autos - Doc. n° 2 junto com a Petição Inicial), foi efetuada a liquidação adicional de Sisa no 126/2001, para que a compradora, I., LDA., foi notificada (por ofício de 13/12/2001, constante de fls. 75 dos autos -Doc. n° 4 junto coma Petição Inicial) e a cujo pagamento procedeu em 13/02/2002 (cfr. fls. 61 e fls. 75-75-verso dos autos).
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Não existem factos não provados com relevância para a decisão.
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A matéria de facto dada como provada foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito, alicerçando-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados, nos documentos juntos aos autos, que integram também o Processo Administrativo, supra referenciados. (…)”

3.2. Os Recorrentes nas conclusões alegam que o facto n.º 19 do probatório deve ser alterado, passando a ter o seguinte teor: “19. Os aqui impugnantes não foram notificados do início daquele procedimento e avaliação, nem nele intervieram.”

Porém analisado o ponto 19.º da matéria de facto confrontado com os elementos de prova não merece qualquer alteração para além do pretendido pelos Recorrentes configurar uma conclusão que se extrai dos demais elementos de prova.

4. JULGAMENTO DE DIREITO

4.1 A questão principal dos presentes autos é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao concluir pela legalidade da liquidação de IRS, decorrentes de mais valias, tendo por pressuposto a alteração do valor declarado com base em avaliação efetuada ao prédio e comunicada oportunamente ao alienante.

Vejamos:
Os Recorrentes insurgem-se contra a liquidação adicional de IRS, decorrente de mais valias, do ano de 2001.

O facto tributário gerador da liquidação adicional de IRS decorre da alienação pelos Recorrentes à sociedade I., LDA.: fração autónoma letra "AVF" destinada a hotelaria (hotel de apartamentos), formada por 19 pisos, com entrada pelos n°s 280 a 344 da Rua (…), e: o prédio urbano destinado a hotelaria, composto de cave, sub-cave, rés do chão, primeiro a nono andares, sitio na Rua (…).

Tendo auferido a quantia de 1.600.000.000$00 (7.980.766,36 €) quanto à fração "AVF" e 550.000.000$00 (2.743.388,43 €) quanto ao outro prédio.

Sobre estes valores foram pagos pela adquirente a competente Sisa e os Recorrentes/alienantes declaram as competentes mais valias, em sede de IRS.

No entanto a Administração Fiscal, usando o mecanismo previsto no § único do art.º 57.º do CIMSISSD, o qual permite, no prazo de 180 dias a contar da liquidação da sisa, promover avaliação dos bens transmitidos, mediante prévia autorização da Direção Geral de Contribuições e Impostos.

Esta avaliação, tem por pressuposto, “elementos fundados para suspeitar que o valor sobre que incidiu a sisa é inferior em 100 contos, pelo menos, ao preço porque os bens foram transmitidos….”

Como resulta da matéria facto provada - pontos n.ºs 17 a 19 e 21 – a avaliação foi efetuada e foi alterado o valor patrimonial dos prédios alienados, tendo o comprador se conformado com a avaliação procedendo ao pagamento da Sisa adicional.
Nesta sequência o Recorrente marido foi notificado, pela Administração Fiscal, em 11.02.2003, informando-o que por avaliação levada a efeito aos imóveis, nos termos do artigo 57.° do CIMS, foi atribuído o valor de 2.684.740.000$00 (13.391A26,67 €), que tal valor serviu de base à liquidação adicional de SISA n.º 126, de 13.02.2002, e que os valores resultantes daquela avaliação são relevantes para efeito de tributação em sede de IRS - Categoria G, e que o Recorrente/Impugnante, caso ainda o não tivesse feito, deveria dar cumprimento ao disposto no n.° 2 do artigo 60.° do CIRS, procedendo à apresentação da declaração de substituição relativa ao ano da transmissão.

A esta notificação foi anexada o termo de avaliação efetuada aos imóveis.

Os Recorrentes face a esta notificação, pediram ao abrigo do art.º 37.º do CPPT certidão contendo os requisitos que considerou terem sido omitidos naquela notificação e em 17.03.2003 obtiveram resposta, porém não reagiram.

Posteriormente, em 25.10.2005 foram os Recorrente notificados para exercerem o direito de audição sobre o projeto de decisão nos termos do qual era proposta a alteração do conjunto de rendimentos líquidos de IRS dos aqui Impugnantes/Recorrentes, para o ano de 2001, passando a incluir o rendimento de 1.333.635,94 € a título de mais valias (Categoria G) a tributar (50% do valor de 2,667.271,88 €), direito que não exerceram.

Em 07.12.2005 foram notificados da liquidação adicional do IRS, e da demonstração de resultados onde foi apurado o saldo de 712.332,48 €, de IRS a pagar.

Os Recorrentes Impugnaram judicialmente a liquidação de IRS, no entanto não lhe imputando vícios próprios da liquidação do IRS, alegando vícios relativos à avaliação efetuada pela Administração, pondo em questão a ilegalidade da avaliação efetuada ao imóvel, por preterição de formalidades legais.

Entendem os Recorrentes que tal ato de avaliação os afetou de facto, é lesivo e como tal deviam ter sido notificados dessa avaliação, nos termos do art.º 36.º 1 do CPPT e 96.º do CIMSISSD, para se entendessem, contra ela reagir.

Aqui chegados importa saber se os Recorrentes, no processo de avaliação dos prédios deveriam ter sido notificados para nela participar.
Do Código da Sisa, em vigor à data, não resulta norma expressa que obrigue a notificar ou participar na avaliação o alienante, tal como reconhece os Recorrentes na sua petição inicial.

Prescrevia o n.º 4 do art.º 109.º do mesmo diploma que:Se se tratar de transmissão onerosa de terreno considerado para construção em cuja fixação do valor seja também directamente interessado, para efeitos tributários, o alienante do terreno, deverá este ser igualmente notificado do resultado da primeira avaliação a fim de usar, querendo, nos mesmos termos e com as consequências previstas no n.º 3.º, de idênticos direitos conferidos ao contribuinte pelos artigos 96.º e 97.º, § único; porém, o louvado nomeado pelo alienante só intervirá na avaliação na falta de nomeação ou de comparência do designado pelo contribuinte;”

Da análise do n.º 4 do art.º 109.º, do CIMSISSD resulta que somente na transmissão onerosa de terrenos para a construção que o vendedor do terreno seria notificado do resultado da avaliação a fim de usar, querendo, nos mesmos termos e com as consequências previstas no n.º 3.º, de idênticos direitos conferidos ao contribuinte pelos artigos 96.º e 97.º, § único; porém, o louvado nomeado pelo alienante só intervirá na avaliação na falta de nomeação ou de comparência do designado pelo contribuinte.

Os Recorrentes na sua petição inicial reconhecem que não há norma expressa e que o n.º 4 do art.º 109.º ter de ser interpretado no sentido que “a notificação do resultado da avaliação realizada para efeitos de SISA, terá de ser efetuada, não só aos adquirentes mas também aos alienantes de quaisquer imóveis, a fim destes poderem usar “de idênticos direitos conferidos ao contribuinte pelos artigos 96.º e 97.º § único

Estando em causa o ato de liquidação de Sisa, o sujeito passivo envolvido no processo de avaliação é o adquirente dos prédios transacionados, não exigindo a lei que participe o alienante.

A sentença recorrida entendeu que a notificação dos Recorrentes foi realizada pelo ofício de 11 de fevereiro de 2003, e que o prazo para requerer nova avaliação começou a correr a partir dessa data, pese embora a mesma não os notificasse expressamente e indicasse os meios de reação, prazo esse que foi interrompido e alargado em consequência do pedido dos Recorrentes de elementos nos termos do art.º 37.º do CPPT.

Com efeito, decorre do ponto de n.º 19 que os Recorrentes não foram notificados do início daquele procedimento de avaliação, nem nele intervieram, tendo sido notificados do resultado dessa avaliação pelo ofício de 11.02.2003, com o qual foi junto o respetivo Termo de Avaliação de 09.11.2001 referidos em 5. e 6. supra, respetivamente.
Não é controverso que os Recorrentes só tiveram conhecimento em 11.02.2003 da existência de uma avaliação aos imóveis efetuada por iniciativa da Administração Fiscal, tendo por suporte a liquidação de Sisa.

A partir desta data os Recorrentes tinham possibilidade de reagir contra um ato que os afetou diretamente.
A partir desta data podiam os Recorrentes nos termos do art.º 96.º do Código da Sisa, o qual dispunha que “Se o contribuinte ou o chefe da repartição de finanças não concordarem com o resultado da avaliação, poderá ser requerida ou promovida, no prazo de oito dias contados da data da notificação, uma segunda avaliação…”.

Preceitua o art.º 134.º do CPPT que 1 - Os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de três meses após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade.
2 - Constitui motivo de ilegalidade, além da preterição de formalidades legais, o erro de facto ou de direito na fixação
3- (…)
7 - A impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação. (…)”

Decorre do n.º 1 e 7 do art.º 134.º do CPPT que os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, autonomamente, com fundamento em qualquer ilegalidade ou preterição de formalidade legal. No entanto, só depois de ter sido esgotados os meios graciosos, o sujeito passivo poderá impugnar judicialmente a fixação do valor patrimonial.

Como refere o Sr. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Código do Processo e Procedimento Tributário anotado, volume II, Áreas Editora, 2011, pág. 433, (…) Esta impugnabilidade autónoma esta em sintonia com o preceituado no art.º 86.º, n.º 1 do LGT, em que se estabelece que os actos de avaliação directa são directamente impugnáveis.
Estes actos, assim, quando inseridos num procedimento de liquidação de um tributo, são actos destacáveis para efeitos de impugnação contenciosa.
Tratando-se de actos destacáveis e inexistindo qualquer restrição relativas às ilegalidades que podem ser objecto de impugnação contenciosa, os vícios de que enferme o referido acto de avaliação apenas podem ser arguidos em impugnação do acto de avaliação e não do acto de liquidação que seja praticado com base naquele, já que a atribuição da natureza de acto destacável tem por fim, precisamente, autonomizar os vícios deste acto para efeitos de impugnação contenciosa.
Sendo assim, não haverá possibilidade de apreciação da correção do mesmo acto em impugnação do acto de liquidação, tendo aí de ter-se como pressuposto o valor fixado na avaliação. (…)” (destacado nosso).

Ter-se-á de concluir que a impugnação judicial do IRS, com base em ilegalidades ou preterição de formalidades legais da avaliação do imóvel, não podem ser apreciadas em sede de impugnação judicial do IRS.

Os Recorrente alegam que a notificação recebida por ofício de 11 de fevereiro de 2003 não reveste a natureza de uma notificação efetuada nos termos do disposto no art.º 96° do Código da Sisa, tanto mais que nem sequer indica prazo para requerimento de segunda avaliação.

Com efeito prevê o art.º 36.º do CPPT que “Os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.
2 - As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o ato notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências.
3 - Constitui notificação o recebimento pelo interessado de cópia de ata ou assento do ato a que assista.”

O art.º 36.º da CPPT densifica o n.º 3 do art.º 268.º do CRP, que os atos administrativos estão sujeitos à notificação dos interessados, na forma prevista na lei.


Por sua vez, o n.º 6 do art.º 77.º da LGT preceitua que “A eficácia da decisão depende da notificação.”
Decorre do n.º 1 do art.º 37. º do CPPT, que as decisões em matéria tributária devem ser notificadas com inclusão da fundamentação legalmente exigida, da indicação dos meios de reação e dos outros requisitos exigidos pelas leis tributárias.

O n.º 9 do art.º 39.º (atualmente n.º 11) somente prevê a nulidade do ato de notificação em caso de “falta de indicação do autor do ato e no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, na qualidade que decidiu do seu sentido e data.”

O regime previsto no art.º 36º, n.ºs 1 e 2, e 39.º, n.º 9, do CPPT é o de que, só nos casos previstos nesta última disposição, é que a notificação se considera nula.

É jurisprudência consolidada do STA, a qual se encontra espelhada no acórdão de 18.11.2009, proferido no processo nº 0128/09, o seguinte:O regime previsto no art. 37.º, n.ºs 1 e 2, e 39.º, n.º 9, do CPPT é o de que, fora dos casos previstos nesta última disposição, em que a notificação se considera nula, o acto de comunicação ao destinatário de um acto em matéria tributária que não o informa de todos os elementos do acto notificado só é irrelevante para efeitos de determinação dos prazos de reacção contra o acto notificado, por via administrativa ou judicial, e mesmo esta única consequência apenas ocorre se for utilizada a faculdade prevista no n.º 1 daquele art. 37.º.
Na verdade, por um lado, fora dos casos de nulidade previstos no art. 39.º, n.º 9, é aquela a única consequência prevista para a irregularidade da notificação, no referido n.º 2 do artº. 37.º.
O facto de apenas nos casos previstos no art. 39.º, n.º 9, do CPPT a não observância dos requisitos legais das notificações implicar a sua nulidade, que tem como consequência a eliminação jurídica da totalidade dos efeitos do acto que dela enferma (artº. 134.º, n.º 1, do CPA), revela que se pretendeu legislativamente que, em todos os outros casos de não observância dos requisitos legais, a notificação irregular produza todos os efeitos para os quais é idónea, com excepção da determinação do início dos prazos de reacção contra o acto notificado, no caso de vir a ser usada a faculdade prevista no n.º 1 deste art. 37.º.
Por outro lado, o facto de não se exigir, para regularização da situação gerada com a notificação irregular, a realização de uma nova notificação substituindo a anterior, mas apenas a «notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha» (n.º 1 deste artº. 37.º), confirma que se pretendeu que se mantenham os efeitos produzidos pela notificação dos elementos não omitidos, pois não se impõe que eles sejam comunicados novamente. À mesma conclusão conduz o facto de, se não for pedida, no prazo legal, a comunicação dos requisitos omitidos, a notificação produzir todos os seus efeitos, como se os contivesse.

Sendo assim, a notificação sem todos os requisitos exigidos, mas que contenha aqueles sem os quais ela é considerada nula, indicados no n.º 9 do art. 39.º do CPPT, não deixará de valer como acto de comunicação ao destinatário quanto a tudo o que comunicou, produzindo os efeitos próprios de uma notificação quanto àquilo de que o informou, só não produzindo, no caso de o destinatário utilizar tempestivamente a faculdade prevista no artº. 37.º, n.º 1, do CPPT, o efeito de determinar o início dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa do acto notificado“. (Neste sentido acórdãos de 18.11.09 – processo nº 0801/09, de 16.09.2009 -processo nº 0611/09 e de 12.10.2011 – processo nº 0789/10 25.11.209 processo n.º 005552/09 citado na sentença recorrida.).

Aqui chegados, a notificação efetuada em 11.02.2003, aos Recorrente, na qual lhe foi notificado o valor da avaliação dos imóveis e o Termo da Avaliação, apesar de não indicar os meios de defesa e prazo para reagir à avaliação, não se pode considerar nula, mas sim validamente efetuada.

Acresce ainda que o artigo 37.º do CPPT estipula, para os casos em que a notificação das decisões em matéria tributária foi realizada em termos incompletos ou insuficientes, o seguinte:
1- Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a sua fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reação contra o ato notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento.
2- Se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida.
(…)».

Nos termos do n.º 1 do art.º 37.º do CPPT, se a notificação for incompleta, o interessado pode requerer a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha dentro do prazo ali fixado.

Nesta situação, o prazo para reagir, graciosa ou contenciosamente, contra o ato tributário conta-se a partir da notificação dos requisitos que haviam sido omitidos ou da passagem de certidão que os contenha.
Assim sendo teremos de concordar com a sentença recorrida, pois os Recorrentes tiveram conhecimento que foi efetuada uma avaliação aos prédios e em consequência da mesma foi alterada o valor patrimonial dos mesmos. E também foram informados que tal alteração tinha relevância para efeito de liquação do seu IRS do ano 2001.

Não pode vingar o argumento da Recorrente que aquela notificação tinha apenas por finalidade dar cumprimento às instruções administrativas transmitidas pelo Ofício Circular n° X-2/93, de 15 de fevereiro, ela DGCI, no sentido de "convidar" ao cumprimento do n° 2 do art.º 60° do Código do IRS, face ao diferencial entre os valores de avaliação e da venda dos prédios.

Como refere a sentença recorrida o prazo de reação perante o resultado da avaliação, passou a contar-se da notificação ou entrega da certidão, requerida nos termos do art.º 37.º do CPPT.

Os Recorrente ficaram nessa data, na posse de todos os dados que lhe permitiam reagir ou aceitar a avaliação efetuada.

Não tendo requerido a segunda avaliação dos prédios, nos termos do art.º 96.º do CIMSISSD, os valores patrimoniais dos imóveis consolidaram, bem como as eventuais ilegalidades ou irregularidades ocorridas no processo de avaliação.

Não tendo os Recorrentes reagido, o resultado da avaliação consolidou-se sendo esse o valor que atender para efeito de IRS.
Destarte improcede o recurso.

Nas conclusões 24.ª a 27.ª alegam que a sentença recorrida entendeu não ser de anular a liquidação de juros compensatórios, com o entendimento que:
"... a invocação que os Impugnantes fazem de que não se descortinando dos Doc. nas 5 a 9 que juntam a data da conclusão da Inspeção estão os Impugnantes impossibilitados de saber se os juros que a Administração Tributária calculou observam ou não o que determina o n° 7 do art. 35° da LGT não se subsume no vício de falta de fundamentação do ato de liquidação dos juros. Tal questão respeitará já ao erro nos pressupostos, de facto e de direito, em que assentou aquela liquidação, por respeitar aos períodos a considerar no cálculo dos juros, por referência aos momentos de início e fim a atender para o efeito no caso. Por outro lado a impossibilidade, a que aludem, de saberem se os juros que a Administração Tributária calculou observam ou não a que determina o n° 7 do art. 35° da LGT, decorrerá, a existir, não do ato de liquidação, mas da ausência de elementos nos referidos Doc. nos 5 a 9 que juntam com a Peticão Inicial que permitam aferir da data de conclusão do mencionado procedimento de inspeção".

Entendem os Recorrente que o ato de liquidação, como qualquer ato tributário, deve estar devidamente fundamentado, e se o não está, ou seja, se todos os elementos que a AT forneceu ao contribuinte quanto a esse ato, no caso à liquidação dos juros compensatórios, não permitem ao contribuinte ficar ciente de como, por quê e quanto por ele é devido e está a lhe ser exigido, só pode fazer concluir que o ato não está devidamente fundamentado e, por isso, é ilegal, tanto mais que, nos termos da lei, é à AT que compete o fornecimento ao contribuinte de todos esses elementos.

Vejamos:
A sentença recorrida após ter procedido a um enquadramento legal e jurisprudencial concluiu que os juros compensatórios se encontravam suficientemente fundamentados e após fazer este julgamento acrescentou, a título de esclarecimento, o parágrafo que os ora Recorrentes, questionam.

E desde já se diga que a sentença não merece censura pois como decorre dos factos provados (12.º 13.º 15.º) e essencialmente, na demostração de liquidação de juros vertida no ponto 13.º da matéria de facto contém os elementos suficientes para que um cidadão médio fique a conhecer as razões os critérios, as datas a partir das quais foram quantificados juros, a duração, e respetivas taxas e os montantes que foram apurados.

Em matéria de fundamentação de decisões de cálculo de juros compensatórios, o art.º 35.º, n.º 9, da LGT estabelece que “a liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas”.

Acresce referir que os documentos a que se referem os Recorrentes (doc. 5 e 6 juntos com a petição inicial) reportam-se ao direito de audição do projeto de alteração da liquidação do IRS (direito que não exerceram) e à notificação das alterações efetuadas. Nesta fase foi apurada a matéria coletável (diferença entre o declarado e apurada através da avaliação) não sendo, nem devia ser apurado quer o imposto a pagar nem os correspondentes juros compensatórios e indemnizatórios dai derivados.
Face ao exposto, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento pelo que improcede também nesta parte o recurso ficando prejudicadas a questão relacionada com os juros indemnizatórios.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões/Sumário:

I. Decorre do n.º 1 e 2 do art.º 134.º do CPPT que os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, autonomamente, com fundamento em qualquer ilegalidade ou preterição de formalidade legal. No entanto, só depois de ter sido esgotados os meios graciosos, o sujeito passivo poderá impugnar judicialmente a fixação do valor patrimonial.

II. Decorre do n.º 1 do art.º 37. º do CPPT, que as decisões em matéria tributária devem ser notificadas com inclusão da fundamentação legalmente exigida, da indicação dos meios de reação e dos outros requisitos exigidos pelas leis tributárias.

III. O n.º 9 do art.º 39.º (atualmente n.º11) somente prevê a nulidade do ato de notificação em caso de “falta de indicação do autor do ato e no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, na qualidade que decidiu do seu sentido e data.”

IV. O regime previsto no art.º 36º, n.ºs 1 e 2, e 39.º, n.º 9, do CPPT é o de que, só nos casos previstos nesta última disposição, é que a notificação se considera nula.

V. Nos termos do n.º 1 do art.º 37.º do CPPT, se a notificação for incompleta, o interessado pode requerer a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha dentro do prazo ali fixado.

5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
*
Custas pelos Recorrentes, nos termos do art.º 527.º do CPC, dispensando-se o pagamento da remanescente nos termos do n.º 7 do art.º 6.º do RCP.
*
Porto, 25 de fevereiro de 2021

Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes