Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00541/10.1BEAVR |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 11/17/2022 |
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Tribunal: | TAF de Aveiro |
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Relator: | Tiago Miranda |
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Descritores: | IVA, NULIDADE DA SENTENÇA, MÉTODOS INDIRECTOS, ERRO NOS PRESSUPOSTOS DO RECURSO AOS MÉTODOS INDIRECTOS. |
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Sumário: | I – Não padece de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão (artigo 125º nº 1 do CPPT) a sentença que julga que a contabilidade do Impugnante padecia de erros e omissões que não permitiam determinar e quantificar a matéria tributável real, mas julga procedente a impugnação das liquidações adicionais de IVA feitas nesse pressuposto, quando também ficou julgado que face aos elementos colhidos na Inspecção e no procedimento de revisão ficou por demonstrar ser impossível comprovar e quantificar a restante matéria tributável. II – A impossibilidade de comprovação e quantificação da matéria tributável, enquanto pressuposto sine quo non do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, nos termos dos artigos 87º alª b) e 88º alª a) da LGT, tem de ser uma impossibilidade absoluta. Assim, não se verifica se a contabilidade ou as declarações do contribuinte, por via de erros e omissões detectados, não permitirem a quantificação exacta, mas o permitirem dados, informações e documentos obtidos no procedimento de Inspecção e no procedimento de revisão da matéria tributável. III - Por isso a demonstração de insuficiências, erros e omissões na contabilidade ou nas declarações do contribuinte e mesmo da impossibilidade das comprovação e quantificação da matéria tributável através daquelas pode não bastar para demonstrar, em concreto, aquela efectiva impossibilidade. |
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Recorrente: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Recorrido 1: | A..., S.A. |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Impugnação Judicial - Liquidação de tributos - 1ª espécie - Recursos jurisdicionais [Del. 2186/2015] |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | A Fazenda Pública interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 10 de Dezembro de 2020, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou procedente a impugnação apresentada pela Sociedade, "A..., S.A.", NIPC 50...061, com sede na Av.ª ..., contra as liquidações adicionais de IVA relativamente aos períodos mensais de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2006 e juros compensatórios, no valor total de 36 918,66 €, de que foi objecto, resultantes de correcções aos valores declarados, com recurso à avaliação da matéria tributável por métodos indiciários, no seguimento de uma acção de fiscalização. Da sua alegação transcrevemos as conclusões: «A. O Tribunal a quo julgou procedente a impugnação judicial à margem referenciada, por sentença proferida em 09/12/2020, determinando a anulação das liquidações adicionais de IVA e JC, referentes aos exercícios de 2005 e 2006, no montante de €36.918,66. B. Entendeu a RFP dever recorrer da mesma, por não poder manifestar concordância com o vertido em tal decisão no que tange à consideração de inexistência dos pressupostos de que dependia a tributação por métodos indirectos. C. Afigura-se-nos, com o devido respeito, que o Tribunal a quo, atenta a prova carreada para os autos e levada ao probatório pelo juiz, não podia senão ter considerado que estava impossibilitada a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, D. Porquanto a contabilidade da Impugnante não merecia qualquer credibilidade, dadas as omissões, erros, inexactidões e incongruências apontadas pela inspecção tributária, e reiteradas na resolução fundamentada do pedido de revisão da matéria colectável e no despacho de indeferimento da reclamação graciosa, não gozando da presunção de verdade. E. Com efeito, o Tribunal a quo, considerou como assente a factualidade elencada como provada nos pontos A) a UU) da IV. Fundamentação de facto, para onde se remete por razões de economia processual, e alicerçando-se [n]a análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos e do processo administrativo apenso, os quais não foram impugnados, realçou que [d]o conjunto da prova arrolada nos autos resulta a convicção de que a contabilidade da agora impugnante contém várias omissões, inexactidões e irregularidades que não possibilitaram a determinação directa e exacta da matéria colectável, sendo irrelevante a argumentação produzida no sentido de imputar toda a responsabilidade ao seu antigo trabalhador (dependente) - TOC, que trabalhava exclusivamente para a empresa [sobre as suas ordens e direcção efectiva, mais exprimindo que (…) é a própria impugnante que admite que as omissões apontadas à sua contabilidade são verídicas, existem, de onde resulta que esta não reflecte a exacta e real situação tributária do momento a que se reporta. (pág. 22 da sentença). F. Afirmou ainda o Tribunal a quo que (…) não restam dúvidas de que há vários registos de operações efectuadas que foram erradamente contabilizados (v.g. num exercício diferente daquele a que dizem respeito) e várias regularizações contabilísticas, fruto daquelas (originais) omissões, também foram mal corrigidas (regularizadas). Em alguns casos, essa regularização parece ter visado o acerto de outras “contas” [v.g. recorrendo à conta de “suprimentos”]. De notar que, além dos elementos fornecidos pelo sujeito passivo, a Administração Tributária efectuou diligências adicionais com vista ao apuramento da verdade material, nomeadamente procedeu à recolha “exaustiva” de todas as vendas registadas na escrituração, pediu informações junto da D... e E... (…) – (pág. 22 da sentença). G. O Tribunal a quo afiançou ainda que (…) resulta a convicção de que havia pouco rigor com a imputação dos custos de cada entidade (juridicamente independentes entre si) à respectiva contabilidade, que havia um considerável descontrole interno relativo a custos e proveitos e sua imputação a cada uma das entidades do “grupo Vilarinho” (…) – (pág. 22 da sentença). H. Chegando mesmo a ilustrar que (…) devido ao referido descontrole interno assumido pela impugnante, quando os documentos relativos à captura/venda de pescado chegavam à empresa eram registados por valores inferiores ou nem sequer eram registados (ou, pelo menos, não eram registados no exercício correcto); noutros casos os documentos nem sequer chegariam a entrar na empresa, ou as operações eram registadas sem um documento de suporte válido. – (pág. 24 da sentença). I. Mais se disse na referida sentença, por remissão para a decisão proferida no âmbito da impugnação judicial n.º 1...4/....0.7BEAVR, e ao abrigo do artigo 8.º/3 do CC, que (…) a AT logrou trazer para o processo argumentos e indícios suficientemente sólidos, concretos e específicos, conseguindo provar desta forma as inexactidões e omissões na contabilidade e nas declarações apresentadas pela aqui Impugnante, e, em certos casos por ela admitida também – (pág. 33 da sentença). J. Bem como que [a] Impugnante limitou-se a invocar genericamente, sem qualquer pormenor, - que é normal existir várias contas para as quais se faz a regularização de contas de exercícios anteriores‖ [entre outros argumentos, abaixo discriminados], sem conseguir convencer que a realidade contabilista se coaduna com a realidade económico-financeira e com a constante nas declarações fiscais por si apresentadas (pág. 33 da sentença). K. Ademais, e analisando concretamente os indícios recolhidos pela inspecção tributária que justificaram o recurso a métodos indirectos para a avaliação da matéria tributável, foi ainda mencionado na sentença ora recorrida que (...) no caso dos autos a AT se fundou em vários outros elementos que se reforçam mutuamente e permitem sustentar a tese de que a agora Impugnante não declara a totalidade dos rendimentos obtidos, acrescentando ainda que [a] Impugnante não provou qualquer facto concreto que leve a concluir que tais omissões de vendas resultaram de um mero lapso, como afirma – (págs. 35 e 39 da sentença, respectivamente). L. Por conseguinte, estabeleceu-se na sentença ora recorrida que [n]ão possuindo a contabilidade devidamente organizada, conforme as normas comerciais, contabilísticas e tributárias, a responsabilidade é-lhe imputada, bem como a falta de controlo interno normalmente exigido. A consequência é a perda da presunção de verdade de que gozava inicialmente ao abrigo do artigo 75.º, n.º 1, da LGT (cfr. n.º 2 do mesmo artigo) – (pág. 43 da sentença). M. Tendo sido constatação do julgador que [a] AT aponta as incorrecções que encontrou na contabilidade e nas declarações da Impugnante, e que permitem concluir que há inúmeros pagamentos que não foram registados ou que foram registados sem a necessária documentação de suporte. O que reforça a convicção de que a contabilidade da Impugnante não merece credibilidade – (pág. 46 da sentença). N. Exemplificativamente, na sentença a quo entendeu-se que (…) a contabilidade da Impugnante reflecte um desfasamento evidente entre o registo contabilístico e a realidade das várias operações efectuadas. Também quanto aos “Custos Não Registados Com Fornecedores” (P..., K..., T..., M...), que se traduziram em omissões aos registos na contabilidade da Impugnante, já que alguns dos pagamentos foram realmente efectuados (as empresas confirmaram que receberam o dinheiro) sem que tal fluxo de saída de caixa tenha sido registado contabilisticamente e desconhecendo-se a existência da respectiva documentação – (pág. 47 da sentença) O. Concluindo que [a]s ditas omissões do registo de custos são a evidência da descredibilidade da contabilidade da Impugnante (…) – (pág. 47 da sentença). P. Mais afirmando que (…) o registo de tais operações (na contabilidade) ocorreu sem documentos comprovativos (e vinculativos) correspondentes às operações em causa (…) [a] própria Impugnante também reconhece, em sede de direito de audição, que tais operações foram registadas na contabilidade muito tempo após a sua efectiva realização, ou seja, que não foi observado o prescrito pelo princípio da especialização dos exercícios, pelo que as “necessárias” regularizações a que procederam foram feitas incorrectamente – (pág. 48 da sentença). Q. Ali se afiançando ainda que (…) a questão não é, portanto, a de saber se tal regularização causou ou não algum prejuízo ao Estado, mas apenas de saber se está contabilística e fiscalmente correcta. A resposta só pode [ser] negativa, o que ilustra o desmerecimento da presunção de verdade a que alude o n.º 1 do artigo 75.º da LGT – (pág. 48 da sentença). R. Por si só revela um descuido interno inaceitável numa empresa que é obrigada a ter contabilidade regularmente organizada, registando movimentos financeiros e um fluxo de caixa que não se coaduna com a realidade, no sentido em que se desconhecem os custos e a origem e o destino de fluxos financeiros, por não terem uma base documental de suporte que a comprove adequadamente, obrigando a regularizações em exercícios posteriores, com o potencial de “desvirtuar as demonstrações financeiras” – (pág. 49 da sentença). S. Em suma, tudo o exposto aponta no sentido explicitado pela AT, de que a contabilidade não merece credibilidade – (pág. 49 da sentença). T. Concludentemente, tendo o Tribunal a quo enumerado os indícios recolhidos pelos serviços de inspecção tributária da Direcção de Finanças de ..., levando-os ao ponto H) do probatório e reproduzindo-os nos factos dados como provados (págs. 7 a 9 da sentença), concluiu, por um lado que, (…) a contabilidade da agora Impugnante padece de vários erros, incorrecções e irregularidades que evidenciam uma manifesta falta de rigor e de controlo interno, que a Impugnante reconhece e atribui pessoalmente, mas inaceitavelmente, ao antigo responsável pela contabilidade, e que esses (…) erros e omissões são suficientemente graves para se poder afirmar que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial do sujeito passivo e que, por isso, já não merece a presunção de verdade de que gozava nos termos do artigo 75.º, n.º 1, da LGT, atendendo o disposto no n.º 2 do mesmo artigo, carecendo mesmo de algumas correcções de âmbito fiscal que a AT identificou – (pág. 63 da sentença). U. Contudo, por outro lado, considerou o Tribunal a quo que (…) só por si, tal desmerecimento não justifica automaticamente o recurso a métodos indirectos. A aplicação de tal método de avaliação tributária depende da verificação de outro requisito, que é imprescindível: que se verifique a impossibilidade de quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável do imposto, nos termos dos artigos 85.º, n.º 1, 87.º, n.º 1, al. b), 88.º e 90.º da LGT e 52.º do CIRC. Ora, do que vem sendo exposto resulta que as omissões e outros erros quantitativamente relevantes se encontram concretamente determinados/quantificados, pelo que não se comprova a dita impossibilidade de quantificação directa e exacta, não se podendo dizer que existem indícios suficientemente fortes e relevantes que justifiquem a aplicação de métodos indirectos de avaliação (sem prejuízo das evidentes incorrecções contabilísticas apontadas pela AT nos pontos IV.3, IV.5, IV.6 e IV.8 do Relatório, quantitativamente determinadas ou susceptíveis de quantificação exacta) – (pág. 63 da sentença). V. Ora, a sentença é nula por oposição entre os fundamentos e a decisão quando os fundamentos conduzem a determinada solução, mas a decisão final é outra, o que sucedeu, com respeito por opinião diferente, nos presentes autos. W. Por sua vez, tal nulidade constitui vício da estrutura lógica da sentença, por contradição entre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão: os fundamentos invocados pelo juiz não conduziriam ao resultado expresso na decisão; conduziriam, isso sim, a resultado oposto, ou seja, existe um vício real no raciocínio do julgador, uma real contradição entre os fundamentos e a decisão: a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente. X. Ora, para efeitos de aplicação de métodos indirectos para apuramento da matéria tributável, a lei fiscal, no artigo 88.º da LGT, estabelece as anomalias e incorrecções que podem inviabilizar tal apuramento. Y. O que implica que aí se encontra reunido o pressuposto da impossibilidade de comprovação e quantificação directa dos elementos indispensáveis à sua correcta determinação. Z. É assim definido que a impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável pode resultar designadamente de inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução, quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais (artigo 89.º/n.º 1/al. a) da LGT), ou recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação (artigo 89.º/n.º 1/al. b) da LGT). AA. Logo daí decorre que o pressuposto da impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável está fortemente relacionado com a contabilidade. BB. Assim, se esta não está conforme a lei contabilística, se é inexistente ou insuficiente, se existem diversas contabilidades ou se existem anomalias e incorrecções na execução da mesma que evidenciem que o declarado não corresponde à capacidade contributiva do sujeito passivo, está a inspecção tributária impedida de determinar directa e exactamente a matéria tributável do sujeito passivo, CC. E como é sobejamente sabido, com o recurso a métodos indirectos, como metodologia alternativa no apuramento da matéria tributável dos contribuintes, o legislador pretendeu obstar que os contribuintes, por circunstâncias que lhes sejam imputáveis e que se traduzam na violação do seu dever de cooperação para com a AT, de lhe revelarem, legal e adequadamente, os elementos relevantes ao apuramento dos seus rendimentos tributáveis, se eximam ao pagamento dos impostos devidos. DD. Mas porque assim é e porque tal metodologia é, por natureza, meramente aproximativa da realidade acontecida, ela é apenas utilizada de forma residual, e quando não seja possível obter os valores reais por outra via ou, como doutrina o Prof. Saldanha Sanches, a metodologia indiciária, porque «marcada por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação, tem de se conservar como a ultima ratio fisci». EE. Ou seja, o pressuposto inultrapassável para que a AT, vinculadamente, lance mão de uma ou de outra de tais metodologias, radica na circunstância de os factos fiscalmente relevantes serem, à luz de parâmetros de razoabilidade e normalidade, incontroversamente conhecidos, – caso em que não pode deixar de corrigir aritmeticamente –, ou de o não serem e de, então, se tornar necessário determiná-los a partir de outros que o sejam e que em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência, se mostrem consubstanciar factos-índice adequados a tal extrapolação. FF. Deste modo, e salvo o devido respeito, o cumprimento do princípio da legalidade impunha à AF que, no caso concreto, recorresse a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável da Impugnante. GG. Pois se, a administração tributária não recorre nem tem necessidade de recorrer a métodos indirectos se reúne indicadores de que os dados inscritos numa dessas contabilidades correspondem aos rendimentos realmente auferidos pelo sujeito passivo e registam o valor exacto da matéria tributável. HH. Contudo, conforme apontou o Juiz a quo na sentença ora recorrida, da resolução fundamentada que indeferiu o pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos foi expressamente mencionado que (…) apesar da contabilidade estar impecavelmente organizada, sob o ponto de vista técnico-contabilístico, a I.T. provou, pela enumeração de várias incorrecções, tais como, omissões de registo de vendas e custos; várias “regularizações” e “acertos de contas” por contrapartida de contas de terceiros, v. g. contas de accionistas e sociedades participadas, haver uma grave e notória falta de controlo interno, aliás admitida pelo próprio sujeito passivo [e] (…) apesar de existirem incorrecções “perfeitamente delimitadas”, a sua análise tem de ser vista num contexto global face aos vários indícios apurados que, demonstram a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável (…) Perante os factos descritos, através dos quais se torna evidente a realização de vendas sem o correspondente registo contabilístico, verifica-se não ser possível proceder à quantificação do lucro tributável por recurso a avaliação directa (…) - (cfr. pág. 29 da sentença e fls. 34 e 35, respectivamente da resolução fundamentada, constante do PA). II. Com efeito, o artigo 123.º do Código do IRC, de entre muitas obrigações, impunha que a ora Impugnante devesse ter: • A contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal; • Todos os lançamentos contabilísticos apoiados em documentos justificativos; • Todas as operações registadas cronologicamente. JJ. Assim, e regressando aos autos, é manifesto que o conjunto das omissões, irregularidades e incongruências, verificadas pela inspecção tributária, e atentas na sua globalidade, implicaram a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, KK. Pelo que se tornou imperativo a sua determinação com recurso a métodos indirectos, procurando a inspecção tributária apurar o rendimento real e efectivamente obtido, através de critérios objectivos, tendo em conta o estabelecido no n.º 1 do artigo 90.º da LGT. LL. Sendo que, no caso concreto, a inspecção tributária recorreu à utilização do rácio R11 Rentabilidade Corrente das Vendas, existente nas bases de dados da então DGCI, para o CAE 05011, evidenciado no 1.º quartil dos valores nacionais, e que traduz a relação entre os resultados correntes e as vendas, tal como se extrai a fls. 48 e seguintes do relatório da inspecção tributária, constante do PA, e para onde se remete por questões de economia processual. MM. Pautando-se assim por critérios de razoabilidade, extraídos de parâmetros gerais e comuns, e adequados às actividades desenvolvidas pela Impugnante. NN. Cabendo ao sujeito passivo o ónus de prova do excesso na quantificação da matéria tributável, conforme decorre do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, OO. Ora, a Impugnante não conseguiu, salvo o devido respeito, demonstrar o erro ou o manifesto excesso de quantificação, pois não lhe bastava suscitar meras dúvidas quanto ao resultado alcançado, antes pelo contrário, era forçoso que demonstrasse a inadequação ou errada aplicação dos critérios utilizados. PP. Não se olvide que, sendo característico das situações apontadas por lei como de impossibilidade de avaliação directa da matéria tributável o aparecimento de dúvidas sobre a quantificação real, inerentes e consequentes da utilização de métodos indirectos, que, actuando indicadores, sempre e só podem alcançar um valor aproximado do que provavelmente a matéria tributável efectiva terá tido, só é viável e legalmente sustentável uma decisão no sentido da anulação do acto tributário impugnado, por alegado erro em sede de quantificação da matéria tributável, caso a Impugnante, sem reticências ou necessários reparos, demonstre, comprove, a ocorrência de “erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada”. QQ. Cumpre recordar que, grosso modo, a utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável se impõe, destacadamente, nas situações em que o respectivo apuramento se mostra inviabilizado pela falta de credibilidade, inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração da responsabilidade do sujeito passivo. RR. Desta forma, a provável falibilidade, inverosimilhança, da quantificação é resultado da apontada inevitabilidade em accionar o método indirecto ou presuntivo, derradeira possibilidade de repor a legalidade e apurar uma determinante e insubstituível matéria tributável que, apenas por motivos, deficiências, imputáveis ao sujeito passivo, não pode estabelecer-se com recurso à via normal (directa) que é a contabilidade ou escrita comercial deste. SS. Neste sentido, torna-se muito provável que o valor, então, apurado seja “um valor probabilístico e não um valor absolutamente certo”, pelo que só pode decidir-se pelo afastamento dos resultados obtidos se, posta em causa a quantificação pelo impugnante, este, mediante a produção de provas adequadas e fortemente convincentes, conseguir demonstrar que o funcionamento daquele poder discricionário conduziu e traduziu-se na fixação de resultados, no apuramento de valores, objectiva e inquestionavelmente, fora dos limites da razoabilidade, da mais ampla e impressiva aceitabilidade. TT. Destarte, e mesmo que subsistissem eventuais dúvidas sobre o lucro tributável, elas decorrem, pela própria natureza das coisas, porquanto, são co-naturais ao próprio método de apuramento de um valor por meio de métodos indiciários, onde o valor encontrado é sempre probabilístico e não um valor absolutamente certo UU. Portanto, o importante, e decisivo, é que o critério utilizado pela Administração Fiscal seja claro, justificado e razoável - ainda que ele não produza certezas sobre o valor tributável. VV. Por conseguinte, foram, pois, indicados os vícios e irregularidades verificadas na contabilidade da Impugnante que lhe retiraram a sua credibilidade como ponto de partida para a determinação do lucro tributável, de modo que era impossível a quantificação directa e exacta da mesma. WW. Por sua vez, a Impugnante só de si própria pode queixar-se quanto à existência da falta de certeza sobre os factos tributários - pois que, por insuficiência de elementos de que devia dispor, é que não foi possível que a liquidação impugnada tivesse sido operada com base nos valores tributáveis reais (rectius: declarados). XX. Concludentemente, foi identificado um conjunto de factos evidenciados no relatório da IT, para onde se remete por questões de economia processual, que demonstraram que os registos da contabilidade da Impugnante não mereciam credibilidade, o que lhe permitiu formular um juízo com suficiente congruência de que a contabilidade não reflectia o rendimento real e que a capacidade contributiva do sujeito passivo era superior à declarada. YY. Desta forma, os rendimentos e os gastos teriam assim de ser presumidos, afastando a possibilidade de determinar o real volume de negócios com base na contabilidade da Impugnante, por sobre esta recair uma falta generalizada de credibilidade, mesmo que organizada de acordo com as regras legais estabelecidas nos códigos tributários e comerciais. ZZ. E, estando em causa a globalidade da actividade, e não apenas uma ou outra operação, estava afastada a possibilidade de qualquer recurso a correcções técnicas para apuramento do real volume de negócios, logo encontrava-se aberto o caminho para a AT recorrer a métodos indirectos por impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável e indicar os critérios indicados na sua determinação. AAA. Ora, estando o sujeito passivo obrigado a possuir contabilidade organizada de acordo com a lei comercial e fiscal, esta deveria demonstrar de forma clara e precisa todas as operações realizadas, tendo como suporte documentação válida e credível, o que não aconteceu. BBB. Por conseguinte, atendendo a que as irregularidades enumeradas, sendo concretas e claras, eram genéricas, pois abrangiam toda a actividade do sujeito passivo e não apenas um ou outro aspecto da actividade comercial, não seria possível ao sujeito passivo proceder a uma regularização da sua contabilidade, o que permitiria o recurso a correcções técnicas. CCC. Então, face a esta impossibilidade de determinar o rendimento real e efectivamente obtido através da contabilidade, e estando em causa uma generalidade de omissão de rendimentos e de gastos, tornava-se necessário o seu apuramento com recurso aos métodos indirectos, por impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável. DDD. E face a tais anomalias, não permitindo através da contabilidade da impugnante apurar a verdadeira situação patrimonial da empresa e nem o resultado efectivamente obtido, não restava outro caminho à AT senão lançar mão de tais métodos indiciários, sob pena de beneficiar o infractor que não organiza a sua contabilidade de acordo com as regras legais previstas nos códigos tributários e comerciais, de molde a apurar e controlar o lucro tributável da sua actividade nesses exercícios. EEE. Não podendo também no caso apenas operar-se com correcções técnicas no apuramento da matéria colectável, quando o que se encontra em causa, é uma falta generalizada de credibilidade da sua escrita comercial, quer ao nível dos proveitos quer ao nível dos custos, pelos apontados vícios supra, que não uma ou outra operação mal contabilizada ou um outro proveito a acrescer ou um ou outro custo a não ser elegível, em que apenas haveria que os desconsiderar no apuramento da matéria colectável. FFF. Ademais, o próprio juiz a quo ao longo da sentença, e como já amplamente se deixou expresso, considerou e reconheceu que a contabilidade da Impugnante perdeu a presunção de verdade, nos termos do artigo 75.º/1 e 2, da LGT, GGG. Por conseguinte, e salvo o devido respeito, ressalta à evidência a contradição entre a decisão de procedência da impugnação judicial com fundamento na alegada não demonstrada impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria colectável e o reconhecimento judicial da falta de verdade da contabilidade da Impugnante na sua generalidade, HHH. O que acarreta a sua nulidade, nos termos do artigo 125.º/1 do CPPT e do artigo 615.º/1/al. c) do CPC, III. E implica igualmente vício de incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 74.º/3, 75.º/1 e 2/al.a), 77.º/4, 85.º/1, 87.º/1/al. b), 88.º/al. a) e 90.º da LGT e artigo 90.º/1 do CIVA, pretendendo a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação totalmente improcedente, mantendo na ordem jurídica a(s) liquidação(ões) impugnada(s), com as demais consequências legais». Notificada, a Impugnante respondeu à alegação terminando com as seguintes conclusões: «I. Contrariamente ao alegado pela Fazenda Pública, a douta sentença recorrida não merece qualquer censura; II. A Fazenda Pública considera que o Tribunal, atenta a prova carreada para os autos e levada ao probatório pelo juiz, não podia senão ter considerado que estava impossibilitada a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos; III. Todavia, sem qualquer razão, dado que a sentença recorrida procedeu à correcta identificação das questões que ao Tribunal cumpria decidir, procedeu à fixação da matéria de facto relevante para a decisão das mesmas e procedeu, também, a uma adequada e correcta subsunção dos factos ao direito aplicável; IV. Estão em causa liquidações de IVA dos anos de 2005 e de 2006 que resultam da fixação da matéria tributável através de métodos indirectos, após precedência de acção de inspecção externa e de procedimento de revisão nos termos do artigo 91.° da LGT, com a intervenção de perito independente; V. Para que a AT possa lançar mão dos métodos indirectos, tem que demostrar, sem margem para dúvidas, a existência de erros, omissões e inexactidões na contabilidade do sujeito passivo que justifiquem a necessidade de recorrer a presunções ou estimativas por inexistência de elementos que permitam apurar, de forma directa, a matéria tributável; VI. Pelo que lhe competia demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por tais métodos (artigo 74°, n.° 1 da LGT), especificando os motivos por que não podia quantificar de forma directa e exacta a matéria tributável e qual o critério utilizado na sua determinação (artigo 77.°, n.° 4 da LGT); VII. O que não fez, já que os vícios alegados pela AT na contabilidade da Recorrida não são susceptíveis de enquadrar os pressupostos legais de verificação de existência de omissões ou irregularidades que impossibilitassem a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos necessários à correcta determinação da matéria tributável; VIII. Sobre a aplicação dos métodos indirectos, a jurisprudência é profícua e unânime quanto aos seus pressupostos e ónus da prova, como é exemplo o Acórdão do TCA Sul, Processo n.° 7537/14.2BCLSB de 05.03.202 quando refere:” 1. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação - art.°74/3 da LGT. 2. Cabendo à AT o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indirectos, é a ela que cumpre demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação” IX. Todavia, os exemplos em causa nos presentes autos demonstram o contrário, isto é - e como assinala a sentença - que apesar de existirem erros, irregularidades ou omissões nos documentos contabilístico-fiscais do contribuinte, não era impossível quantificar e comprovar de forma directa e exacta os elementos indispensáveis para a fixação da matéria tributável. X. Como se refere na decisão recorrida, “A aplicação de tal método de avaliação tributária depende da verificação de outro requisito, que é imprescindível: que se verifique a impossibilidade de quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável do imposto, nos termos dos artigos 85°, n° 1, 87°, n° 1, al. b), 88° e 90° da LGT e 52° do CIRC. Ora, do que vem sendo exposto resulta que as omissões e outros erros quantitativamente relevantes se encontram concretamente determinados/quantificados, pelo que não se comprova a dita impossibilidade de quantificação directa e exacta, não se podendo dizer que existem indícios suficientemente fortes e relevantes que justifiquem a aplicação de métodos indirectos de avaliação (sem prejuízo das evidentes incorrecções contabilísticas apontadas pela AT (...) quantitativamente determinadas ou susceptíveis de quantificação exacta).” XI. Por outro lado, assinala ainda a sentença que “Relevante para a questão é apenas saber se o indício em causa contribui fundadamente para a convicção de que a contabilidade não reflecte a exacta situação tributária do contribuinte, como alega a AT (outra questão é a de saber se esse indício determina a impossibilidade de determinação directa e exacta da situação tributária). Ora, não há dúvida de que esse indício (omissão do registo de proveitos, embora quantitativamente determinada), sobretudo depois da respectiva confissão, permite concluir, só por si, qua a contabilidade regista proveitos em valores inferiores aos reais. Isto é, pode dizer-se com propriedade que a contabilidade da Impugnante não reflecte a sua exacta situação patrimonial e tributária, o que não basta para justificar a aplicação de métodos indirectos, como se sabe”: XII. Pelo que, não existe qualquer contradição entre os factos provados, a sua fundamentação e a decisão de procedência da impugnação judicial, uma vez que não estão reunidos os pressupostos para a tributação por métodos indirectos, uma vez que, para ser legítimo o recurso a essa via de tributação não basta apurar incorrecções e divergências na contabilidade, sendo necessário, ainda, que se verifique a impossibilidade de apuramento de forma directa e exacta da matéria tributável, o que não ocorre no caso em apreço; XIII. Pelas razões expostas, a sentença recorrida não padece de qualquer nulidade, não cometeu erro de julgamento nem violou qualquer disposição legal ao caso aplicável, devendo ser integralmente mantida. A Mª Juiz a qua emitiu, oportunamente, o despacho a que se refere o artigo 617º nº 1 do CPC, cujo teor é redutível ao seguinte excerto: «(…) O artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC dispõe que “É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível”. Como refere Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6.ª Edição 2011, Anotado e Comentado, Volume II, anotação ao artigo 125.º, pág. 361, “Tal nulidade apenas ocorre quando os fundamentos invocados na decisão deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada na decisão. Como decorre do texto legal, só releva, para efeito desta nulidade, a contradição entre a decisão e os respectivos fundamentos e não eventuais contradições entre fundamentos de uma mesma decisão, por um lado, ou contradição entre decisões, fundamentadas ou não, por outro. Esta contradição também não é entre os fundamentos que o recorrente entende que deveriam constar da sentença e a decisão nesta contida, mas entre esta e os fundamentos que dela, efectivamente, constam”. Analisada a sentença sob crítica, não se vislumbra a apontada nulidade, por contradição entre os fundamentos da sentença e a decisão proferida. Segundo a recorrente, tal nulidade resulta do facto de a sentença recorrida reconhecer que a contabilidade da impugnante não é merecedora da presunção de verdade atribuída pelo artigo 75º da LGT e, apesar disso, considerar que não ficou demonstrada a impossibilidade de determinação directa a exacta da matéria tributável. Porém, é nosso entendimento que tais afirmações não são contraditórias, pois que, para se mostrar justificada a aplicação de métodos indirectos, não basta a verificação de factos que demonstrem que a contabilidade e as declarações do sujeito passivo não merecem credibilidade, sendo ainda necessário que se alegue e demonstre a impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável real. Para além disso, a alegação da recorrente concretiza uma discordância quanto ao que foi decidido que, a verificar-se, constituirá apenas um erro de julgamento e não a nulidade que vem assacada, sendo certo que tal matéria não pode ser objecto de reapreciação por parte do juiz, atento o esgotamento do poder jurisdicional com a prolação da sentença (cfr. artigo 613.º do CPC). Pelo exposto, porque, a nosso ver, a sentença recorrida não padece da nulidade que a recorrente lhe assaca, indefere-se o requerido (…). O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal teve a devida vista no processo. Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir. II- Âmbito do recurso e questões a decidir Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações. Assim, diremos que o mesmo se analisa em duas questões pela seguinte ordem lógica: 1ª Questão Pergunta-se se a sentença recorrida é nula, nos termos dos artigos 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 alª c) do CPC, por os fundamentos – fortes indícios, se não mesmo a certeza de a contabilidade não espelhar o desempenho económico e financeiro da Recorrente, devido a omissões de registos de proveitos e despesas – estarem em contradição com a conclusão de que a AT não demonstrou ocorrerem os pressupostos de recurso aos métodos indirectos para determinação da matéria tributável e a consequente decisão de julgar procedente a impugnação. 2ª Questão Pergunta-se se a sentença recorrida, ao julgar procedente a impugnação com fundamento em não estarem reunidos os pressupostos do recurso a métodos indirectos, apesar de ter reconhecido que a AT fizera prova das omissões e deficiências da contabilidade da Recorrida (artigos 75º nº 2 alª a) da LGT) e de que estas não permitiam a determinação da matéria tributável dos anos em causa (artigos 87º b) e 88º a) da LGT) errou de direito, designadamente violou a conjugação dos artigos 74.º/3, 75.º/1 e 2/al. a), 77.º/4, 85.º/1, 87.º/1/al. b), 88.º/al. a) e 90.º da LGT e ainda o artigo 90.º/1 do CIVA, por isso que estavam reunidos todos os requisitos que destas normas decorrem para o recurso a métodos indirectos. III – Apreciação do Recurso A discriminação de factos provados e não provados feita na sentença recorrida foi a seguinte: «Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos: A) A sociedade “"A..., S.A."”, aqui impugnante, exerce a actividade de “pesca marítima – CAE Rev.2 05011” e tem como objecto social “pesca marítima não especificada e todas as actividades relativas à produção, transformação e comercialização de peixe, nomeadamente aquicultura” – cfr. fls. 131 do processo administrativo apenso aos autos; não impugnado. B) No início do ano 2005 a impugnante dispunha de quatro embarcações, designadas "X..." e "Z...", afectas a pesca em alto mar predominantemente no oceano atlântico ao largo de África; “"C..."” e “V...”, afectas a pesca na costa do Algarve e na zona sudoeste da província espanhola de Andaluzia contígua à costa algarvia, tendo a última embarcação sido abatida em meados de 2005 – cfr. fls. 131 do processo administrativo apenso aos autos; não impugnado. C) A empresa "A..., S.A." [doravante "A..., S.A." ou "A..., S.A."] é uma empresa de cariz familiar, cujo capital social é detido pelos herdeiros de A...: AA [filha e detentora de 53% do capital social]; BB...; CC...; e DD... [netos e detentores cada um – ainda que em conjunto com o respectivo cônjuge – de cerca de 15,7%] – cfr. fls. 131 do processo administrativo apenso aos autos. E) A R..., S.A, é detida em 50% por membros da família A... [25% na posse de CC..., e os outros 25% de BB...], sendo os restantes 50% detidos por “terceiros” – cfr. fls. 138 do processo administrativo apenso aso autos. F) A “"A..., S.A."‖, é proprietária ¯e legítima possuidora, do prédio urbano sito em Praia dos ..., freguesia e concelho de ... (…), descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha número 1..8/...520 (…) e inscrito na respectiva matriz predial urbana da dita freguesia sob o artigo 1...54. (…) com a área coberta de 5.153,01m² [com valor patrimonial tributário 1.141.570,00 €] e descoberta 35.746,99 m² - cfr. fls. 240/241 e 254 do processo administrativo apenso aos autos. G) Com base na ordem de serviço n.º OI...29, de 24/09/2008, os serviços de inspecção tributária da Direcção de Finanças de ... procedeu, entre 26/11/2008 e 28/04/2009, a acção inspectiva à actividade da agora impugnante, na sequência da qual, em 10/07/2009, elaborou o relatório de inspecção tributária, homologado por despacho de 27/07/2009, no qual, com recurso a métodos indirectos de avaliação, foram apuradas correcções à matéria tributável de IRC dos anos de 2005 e 2006 e IVA em falta dos mesmos anos – cfr. fls. 127/205 do processo administrativo apenso aos autos. b. Liquidação adicional n.º ...48, referente a IVA do período 0502, no montante de 2.191,50 €; c. Liquidação adicional n.º ...50, referente a IVA do período 0503, no montante de 2.191,50 €; d. Liquidação adicional n.º ...52, referente a IVA do período 0504, no montante de 2.191,50 €; e. Liquidação adicional n.º ...54, referente a IVA do período 0505, no montante de 2.191,50 €; f. Liquidação adicional n.º ...56, referente a IVA do período 0506, no montante de 2.191,50 €; g. Liquidação adicional n.º ...58, referente a IVA do período 0507, no montante de 2.191,50 €; h. Liquidação adicional n.º ...60, referente a IVA do período 0508, no montante de 2.191,50 €; i. Liquidação adicional n.º ...62, referente a IVA do período 0509 no montante de 2.191,50 €; j. Liquidação adicional n.º ...64, referente a IVA do período 0510, no montante de 2.191,50 €; k. Liquidação adicional n.º ...66, referente a IVA do período 0511, no montante de 2.191,50 €; m. Liquidação adicional n.º ...70, referente a IVA do período 0601, no montante de 489,25 €; n. Liquidação adicional n.º ...72, referente a IVA do período 0602, no montante de 489,25 €; o. Liquidação adicional n.º ...74, referente a IVA do período 0603, no montante de 489,25 €; p. Liquidação adicional n.º ...76, referente a IVA do período 0604, no montante de 489,25 €; q. Liquidação adicional n.º ...78, referente a IVA do período 0605, no montante de 489,25 €; r. Liquidação adicional n.º ...80, referente a IVA do período 0606, no montante de 489,25 €; s. Liquidação adicional n.º ...82, referente a IVA do período 0607, no montante de 489,25 €; t. Liquidação adicional n.º ...84, referente a IVA do período 0608, no montante de 489,25 €; u. Liquidação adicional n.º ...86, referente a IVA do período 0609, no montante de 489,25 €; v. Liquidação adicional n.º ...88, referente a IVA do período 0610, no montante de 489,25 €; w. Liquidação adicional n.º ...90, referente a IVA do período 0611, no montante de 489,25 €; x. Liquidação adicional n.º ...92, referente a IVA do período 0612, no montante de 489,25 €; y. Liquidação n.º ...47, referente a juros compensatórios do período 0501, no montante de 380,18 €; z. Liquidação n.º ...49, referente a juros compensatórios do período 0502, no montante de 372,49 €; bb. Liquidação n.º ...53, referente a juros compensatórios do período 0504, no montante de 357,36 €; cc. Liquidação n.º ...55, referente a juros compensatórios do período 0505, no montante de 350,64 €; dd. Liquidação n.º ...57, referente a juros compensatórios do período 0506, no montante de 343,44 €; ee. Liquidação n.º ...59, referente a juros compensatórios do período 0507, no montante de 335,51 €; ff. Liquidação n.º ...61, referente a juros compensatórios do período 0508, no montante de 328,79 €; gg. Liquidação n.º ...63, referente a juros compensatórios do período 0509, no montante de 321,34 €; hh. Liquidação n.º ...65, referente a juros compensatórios do período 0510, no montante de 313,65 €; ii. Liquidação n.º ...67, referente a juros compensatórios do período 0511, no montante de 306,69 €; jj. Liquidação n.º ...69, referente a juros compensatórios do período 0512, no montante de 299,24 €; kk. Liquidação n.º ...71, referente a juros compensatórios do período 0601, no montante de 65,30 €; ll. Liquidação n.º ...73, referente a juros compensatórios do período 0602, no montante de 63,64 €; mm. Liquidação n.º ...75, referente a juros compensatórios do período 0603, no montante de 62,03 €; nn. Liquidação n.º ...77, referente a juros compensatórios do período 0604, no montante de 60,26 €; oo. Liquidação n.º ...79, referente a juros compensatórios do período 0605, no montante de 58,76 €; qq. Liquidação n.º ...83, referente a juros compensatórios do período 0607, no montante de 55,33 €; rr. Liquidação n.º ...85, referente a juros compensatórios do período 0608, no montante de 53,83 €; ss. Liquidação n.º ...87, referente a juros compensatórios do período 0609, no montante de 52,01 €; tt. Liquidação n.º ...89, referente a juros compensatórios do período 0610, no montante de 50,51 €; uu. Liquidação n.º ...91, referente a juros compensatórios do período 0611, no montante de 48,90 €; vv. Liquidação n.º ...93, referente a juros compensatórios do período 0612, no montante de 47,13 € - cfr. fls. 66/113 do suporte físico dos autos. N) Em 11/05/2010 foi remetida a este Tribunal, por via postal sob registo, a petição inicial que deu origem aos presentes autos – cfr. fls. 2 do suporte físico dos autos. P) O navio “V...” foi abatido em meados de 2005 e nesse ano esteve inativo durante cerca de um mês por motivo de arresto – cfr. ponto 2.5. do parecer do perito independente, a fls. 62 do processo administrativo apenso; e artigo 27.º da petição inicial não impugnado. Q) O Navio "X..." sofreu em 2005 várias avarias, tendo estado inactivo entre seis e sete meses - ponto 2.5. do parecer do perito independente, a R) O mesmo navio teve uma nova paragem em 2006, por um período de 4 meses, e interrompeu as campanhas de pesca de 15/03/2005 a 15/05/2005, e entre 18/09/2005 a 27/03/2006 – ponto 2.5. do parecer do perito independente, a fls. 62 do processo administrativo apenso aos autos; e artigo 28.º da petição inicial não impugnado. S) Os talões de venda de pescado transaccionado na lota da Isla Cristina (Huelva- Espanha) são emitidos pela entidade que a gere, “F...., S.L.” – cfr. artigo 39.º da petição inicial, não impugnado. T) Todas as embarcações possuem [são obrigadas a possuir] licença de pesca, apenas podendo usar a “arte” para a qual estão licenciadas e pescar as espécies nelas compreendidas, podendo ser sujeitas a inspecção; e possuindo todas elas, obrigatoriamente, “Diários de Pesca CE” e “Diários de Carga/Descarga CE” onde são anotados as datas, origem e volume das capturas e respectivas descargas – facto público e notório para o sector de actividade; artigos 62.º, 63.º e 64.º da petição inicial, não impugnado. U) Os navios "Z..." e "X..." são palangreiros – usam a arte do palangre [¯que consiste no lançamento de anzóis em alto mar a partir de uma linha flutuante, que depois são recolhidos na plataforma continental, por causa da profundidade‖]1 – artigo 70.º da petição inicial, não impugnado. V) O navio “"C..."‖ é de arrasto -lança redes que pescam crustáceos demersais junto do fundo do mar (camarão, lagostim) e peixes seus predadores (pescada, tamboril)‖, reconduzindo-se a zona de pesca à plataforma continental – cfr. artigo 71.º da petição inicial, não impugnado. X) Nessa viagem à Guiné-Bissau, a 4 de Agosto de 2005 “ficou presa uma rede na hélice do navio, tendo sido rebocado para o porto de Dakar pelo navio "S..."‖ da “Sociedade de Pesca H ...., S.A.‖ onde chegou no dia 6 de Agosto – artigo 94.ºda petição inicial, não impugnados; fls. 129/130 do suporte físico dos autos. Y) Por força dessa avaria, o navio “... ficou na doca, nos estaleiros Dakarnave, no elevador (syncrolift), a seco, com máquinas desligadas, tendo para isso sido obrigado ao descarregamento de ¯todos os produtos congelados que existiam a bordo para um frigorífico em terra‖ – artigo 95.º e 96.º da petição inicial não impugnado; e fls. 126/128 do suporte físico dos autos. Z) No dia 10 de Agosto de 2005, o navio “"C..." saiu do porto de Dakar e em 11 de Agosto tendo teve uma avaria na sonda [não tendo sido substituída de imediato por inexistência da mesma], tendo ficado ancorado em alto-mar até ao dia 16 de Agosto – artigos 97.º e 98.º, não impugnado; e fls. 129/130 do suporte físico dos autos. AA) “Forçado pela tripulação”, o mestre do navio “"C..." contactou a impugnante e cumprindo ordens desta, dirigiu-se a Bissau, onde chegou em 18/08/2005, e aí permaneceu até 26 de Agosto de 2005 – artigo 99.º da petição inicial não impugnado, fls. 129/130 do processo administrativo apenso aos autos. BB) A 27 de Agosto de 2005, após “lance efectuado em alto-mar”, o navio “"C..." sofreu uma avaria no guincho [usado para largar e recolher redes], tendo regressado a Bissau para a sua substituição, embarcando de novo para o mar a 29 de Agosto – artigos 106.º e 107.º da petição inicial, não impugnado; fls.129/130 do suporte físico dos autos. DD) Entre os dias 4 e 12 de Setembro o navio “... pescou apenas durante o dia, tendo rumado a Dakar para se reabastecer (a 12 de Setembro), onde chegou a 14/09/2005 – artigo 109.º da petição inicial não impugnado, fls. 129/130 do suporte físico dos autos. EE) A 16 de Setembro o navio “... retomou a sua actividade, tendo parado a 18 de Setembro para ir em auxílio do navio "X...", que rebocou até Portugal ¯depois de ir a Bissau desembarcar os marinheiros autóctones e o Observador Oficial” – fls. 129/130 do suporte físico dos autos; artigo 110.º da petição inicial não impugnado. FF) Do relatório do Observador Oficial de Pesca dessa viagem do navio “"C..." consta o registo de 3 caixas de camarão queimadas “por falta de produto conservante”, correspondente a 447,40 kg – cfr. fls. 129 do suporte físico dos autos. GG) O navio "X...", esteve parado para reparações em Cabo-Verde, de onde saiu em 12/05/2005, e posteriormente ¯levou a efeito uma campanha de pesca entre 15/05/2005 e 27/06/2005‖ – cfr. fls. 157 e 66 do suporte físico dos autos. HH) O navio "X..." abasteceu em Cabo-Verde em 29/06/2005, tendo entrado no porto de ... em 09/07/2005 onde ficou “em doca seca” (...) para efectuar reparações desde 19/07/2005 até 16/08/2005, abasteceu em ... em 18/08/2005 e saiu do porto de ... em 23/08/2005 com destino a Cabo-Verde, onde chegou em 30/08/2005 e pescou entre 05/09/2005 e 19/09/2005 – artigos 119.º, 120.º e 122.º da petição inicial não impugnado, fls. 133/137, verso do suporte físico dos autos.32 do suporte físico dos autos. II) O navio "Z..." levou a cabo uma campanha de pesca entre (pelo menos) 13/01/2005 (...) e 06/02/2005 (Cabo Verde), tendo abastecido em JJ) Entre 19/06/2006 e 24/08/2006 houve uma campanha de pesca do navio "Z...", cujo valor do pescado ascendeu a 137.056,47 €, num peso global de 49.783,00 kg, tendo ido a terra, ao porto de Dakar (Senegal), permanecendo lá de 26/6/2006 até 30/6/2006 e de 10/07/2006 até 12/07/2006 – artigos 140.º, 141.º, 142.º e 143.º da petição inicial não impugnados; fls. 133/137, verso, do suporte físico dos autos; e fls. 160 do processo administrativo apenso aos autos. KK) Em Agosto de 1968, por escritura pública lavrada no 1º Cartório Notarial da Secretaria de ..., a "A..., S.A." adquiriu um imóvel sito na Praia dos ... em ..., inscrito na matriz predial sob o n.º 1254 [complexo industrial], pelo montante de 25.018,61 € (5.015.780$00 – também valor matricial), tendo sido emitida a correspondente Declaração de Sisa n.º 82, em 22 de Agosto de 1968 emitida na Repartição de Finanças de ... – fls. 236/237 do processo administrativo apenso aos autos. LL) Em 30/01/1990 foi celebrado contrato de arrendamento entre a "A..., S.A." e S..., S.A., tendo por objecto ¯a totalidade da área descoberta (cerca de 35.474 m²) e parte da área coberta (cerca de 2.532 m², de um total de cerca 5.153 m²), não abrangendo os armazéns n.º 1,2,3,4,5 e 6, nem as câmaras frigoríficas n.º 1, 2 e 3‖; alterado em 07/07/1994, por sublocação à sociedade ¯V..., Limitada‖ que se destinava a exercer actividades ligadas à indústria hoteleira, nomeadamente “restaurante e bar e a área de 1000 m² a esplanada‖, com renda anual de trezentos mil escudos; excluindo expressamente do objecto do contrato a ¯parcela de terreno primitivamente usada como seca de bacalhau, que se situa entre os armazéns números um, dois, três, quatro, cinco e seis e a margem esquerda do ..., excepto a lagoa aí existente‖ – cfr. fls. 402/407 do processo administrativo apenso aos autos. OO) Do contrato a que se alude na alínea anterior, foi acordado o preço da renda anual no valor de 300.000,00 € – cláusula terceira do contrato – conferindo-lhe a possibilidade de “sublocar a totalidade ou parte do espaço arrendado‖ – cláusula quarta -; direito de preferência na eventual venda do imóvel [ulteriormente não exercido], bem como ¯o direito de tomar de arrendamento toda a área nesta data arrendada à S..., S.A., sofrendo a renda ora acordada um aumento de 5%‖ – cláusula oitava – cfr. fls. 161 e 232/235 do processo administrativo apenso aos autos. PP) Em 12/07/2006 a "A..., S.A." e a "S...LLC" celebraram um contrato promessa de compra e venda do “prédio” sito em ..., inscrito na matriz sob o artigo 1...54, pelo preço de 1.600.000,00 € (um milhão e seiscentos mil euros), ¯livre de ónus ou encargos, com excepção do contrato de arrendamento celebrado com a S..., S.A., por escritura pública de 30 de Janeiro de 1990 e alterado por escritura pública de 7 de Julho de 1994‖, tendo ficado estabelecido que a escritura definitiva seria outorgada no “prazo de 40 dias a contar da presente data‖ (que veio a celebrar-se a 06/09/2006) – cfr. fls. 239/250 do processo administrativo apenso aos autos. SS) No seguimento da celebração desse acordo compensatório foi, à N..., S.A., atribuído o direito irrevogável na aquisição do prédio urbano, sito na ..., U-...10 – [terreno para construção urbana sito na Rua ..., com área de 1.010 m², com valor patrimonial de 67.249,37 €], sobre o qual, à data, impendia uma hipoteca voluntária sobre ele, tendo a "A..., S.A." comprometido ¯a cancelar o ónus até 31 de Dezembro de 2010‖ e a escritura definitiva ¯ser celebrada até 31 Janeiro de 2011‖; e, adicionalmente acordado que a N..., S.A. não pagaria “qualquer renda referente ao período de Janeiro a Agosto de 2006‖ face à necessidade imediata de a "A..., S.A." “terminar o Arrendamento” – cfr. fls. 408/409 do processo administrativo apenso aos autos. TT) Com a construção da Ponte Vasco da Gama bem como com “a construção de espaços comerciais de grande porte e projectos de índole turística‖, a região de ... desenvolveu-se, e o valor dos terrenos à sua volta aumentou de forma exponencial [incluindo o do imóvel em questão], encontrando-se essa área, a partir de 2004, ¯vocacionada para o Turismo e Lazer‖ – facto público e notório, fls. 173 do processo administrativo apenso aos autos. UU) Nos anos de 2005 e 2006 a "A..., S.A.", em sede de IRC era tributada pelo regime geral; e em sede de IVA no regime normal de periodicidade mensal – cfr. fls. 132 do processo administrativo apenso aos autos. 2. Na arte do palangre são lançados anzóis com isco, numa extensão de cerca de 60 milhas (aproximadamente 108 km) – artigo 134º da petição inicial». Porto, 17/11/2022 |