Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00399/13.9BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2025
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES
Descritores:IRC; MÉTODOS INDIRECTOS;
REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL; ACORDO DOS PERITOS;
REVOGAÇÃO; ARTIGO 62º DO CPPT;
Sumário:
I. O artigo 92º, n.º 3, da LGT, quando diz que, havendo acordo entre os peritos, o valor encontrado servirá de base à liquidação do imposto, conjugado com o n. º5 do mesmo preceito, que reafirma que “em caso de acordo, a administração tributária não pode alterar a matéria tributável acordada...”, determina que o director de finanças deve respeitar esse acordo e não decidir como se esse acordo não existisse e/ou contra ele.

II. Pelo que, da vinculatividade do acordo alcançado em sede de revisão tributária de que não se verificavam os pressupostos de aplicação dos métodos indirectos in casu, a administração só excepcionalmente [artigo 92.º n. 5 LGT e artigo 62.º n.º 1 in fine e 2 CPPT] poderá tributar com base em matéria tributável diferente da acordada.

III. O director de serviço que ao abrigo do artigo 62º n.º 1 in fine e 2 CPPT, revogou o acordo firmado pelos peritos assente em falta de fundamentação da posição do perito da AT incorre em vício de violação de lei, por aquele fundamento no caso concreto não se verificar e, como tal não ser reconduzível a uma “manifesta violação das competências legais do perito” a que alude o preceito.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1.RELATÓRIO
1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 30.06.2022, que julgou procedente a impugnação intentada por [SCom01...], Lda., (Recorrida), contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC), referente ao exercício económico de 2010, inconformado veio dela recorrer.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(…)
A. Incide o presente recurso sobre a sentença, que julgou procedente a presente impugnação judicial, por considerar ilegal o despacho que revogou o acordo alcançado pelos peritos em sede de procedimento de revisão da matéria coletável, no qual se assentiu que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) por métodos indiretos não se justificavam, entendendo o decisor que tal despacho (de anulação) não cabia no art.62.º, n.º1 do CPPT.
B. O Tribunal a quo concede, na sua motivação de direito, que “a falta de fundamentação do acordo pode estar na base da aferição do respeito pelas competências legais dos peritos, a fim de verificar a sua manifesta violação, para que a liquidação não se efetue de acordo com a decisão do procedimento, como pressupõe o artigo 62.º do CPPT”.
C. Todavia, entende o decisor que, no caso em apreço, a fundamentação externada do acordo dos peritos que sancionou o não preenchimento dos pressupostos do recurso aos métodos indiretos se mostra suficiente, pelo que não se verifica uma manifesta violação de competências legais.
D. A Fazenda Pública não se conforma com o juízo proferido, considerando ter o Tribunal a quo incorrido em erro de julgamento de facto e de direito, pelos motivos que a seguir se enunciam.
E. O decisor na sentença sob crítica considera que: “a fundamentação externada [na Ata n.º 02/...-D, de 08-02-... (constante do ponto 10 do probatório)] se mostra clara, contextual e suficiente, mostrando o itinerário cognitivo e valorativo seguido pelos peritos, num juízo lógico de ponderação factual, sendo que não existe qualquer obstáculo legal a que o perito da AT utilize os mesmos fundamentos que o perito do contribuinte, por remissão”.
F. Atento o teor do acordo plasmado na Ata n.º 02/...-D (transcrita no ponto 10 do probatório) considera, ainda, o decisor que a plena concordância do perito da AT com toda a argumentação e documentação apresentada pelo perito da Impugnante foi, como por aquele descrito na ata, sequente a uma análise efetuada a todos os elementos apresentados pelo perito da Impugnante e de observações aquando da visita às instalações da Impugnante.
G. A Fazenda Pública não pode acompanhar o decidido, pois o Tribunal a quo limita-se na sua sentença a secundar as conclusões firmadas pelo perito da AT na ata, mas do acordo e do acervo documental anexo ao procedimento de revisão, não é possível discernir quais as análises e averiguações realizadas pelo perito da AT para comprovar a factualidade sustentada pelo perito da Impugnante, nem inferir as razões determinantes da sua adesão à factualidade sustentada pelo perito da Impugnante.
H. O Tribunal a quo na sua decisão expõe que “referindo-se o acordo aos pressupostos do recurso a métodos indiretos que como vimos consistiu essencialmente na utilização de critério utilizado pelo inspetor para determinação do valor médio de ovos por quilograma, para determinação da quantidade de ovos vendidos ao peso, ali foi concluído que os mesmos não têm aderência à realidade da empresa, bem como se considerou demonstrado a consideração indevida de ovos pelos SIT e demonstrado quebras que os SIT não haviam considerado, o que reduzindo-se a divergência praticamente na totalidade, concluíram que os pressupostos de recurso à avaliação indireta, inexistiam, tanto mais que outros factos ou elementos não foram apurados. [sublinhado e realce nossos]
I. Ou seja, o próprio decisor acaba por remeter para meras conclusões e considerações tecidas no acordo de peritos, mas em parte alguma da sua motivação elucida em que se concretizou a invocada demonstração da veracidade dos factos e documentos apresentados pelo perito da Impugnante ou as alegadas análises efetuadas pelo perito da AT que permitissem concluir pela “demonstração” de que as divergências detetadas pelos SIT se encontravam justificadas e que, por isso, não se encontravam preenchidos os pressupostos do recurso a métodos indiretos.
J. Aqui, é de relevar o facto do Tribunal a quo na sua motivação da decisão de facto (v. os excertos da sentença sob crítica supra transcritos nos artigos 10 e 11 do presente recurso) acabar por reconhecer que os documentos apresentados pela Impugnante, por si só, não se revelam idóneos e suficientes a sustentar a sua tese e que as explicações dadas, em sede de inquirição de testemunhas, pelo perito da Impugnante sobre a alegada correção dos cálculos por esta fornecidos relativos ao n.º de ovos por quilograma, também não configuram factos, mas meros juízos opinativos.
K. Assim, de forma alguma é possível acompanhar a asserção constante da sentença em crise de que: “Percebe-se, assim, que os peritos se basearam em vários elementos documentais fornecidos pelo perito da Impugnante que contrariaram os cálculos de alegadas omissões de vendas de ovos apuradas pelos SIT, que, não obstante poder ser discutível, não restam dúvidas de que os peritos explicaram com clareza o modo como chegaram à conclusão de que não se reuniam os pressupostos de recurso a métodos indiretos.”.
L. Isto porque, o que resulta percetível do acordo são conclusões e considerações firmadas pelos peritos e a identificação dos elementos e documentos apresentados pelo perito do contribuinte que foram considerados relevantes para a justificação das divergências detetadas pelos SIT.
M. Porém, já não resultam explicitadas quais as análises e averiguações que, alegadamente, foram efetuadas pelo perito da AT e em que medida as mesmas permitem justificar a sua adesão aos vários elementos documentais fornecidos pelo perito da Impugnante.
N. É esta insuficiente fundamentação formal do acordo que motiva o despacho de anulação proferido pelo Diretor de Finanças e não qualquer juízo de censura quanto ao mérito do acordo estabelecido entre os peritos como entende o Tribunal a quo.
O. De notar que a fundamentação do despacho de revogação reporta-se (no seu ponto 9), à documentação apresentada pelo perito da Impugnante e enuncia as questões controvertidas que contendem com as correções efetuadas pelos SIT, unicamente, para evidenciar não ter o perito da AT concretizado as razões que determinaram a sua aceitação dos factos e documentos apresentados pelo perito da Impugnante, e bem assim, não ter demonstrado que diligências foram efetuadas nas instalações da Impugnante, de forma a poder conhecer e determinar as verificações ou testes que permitiram ao perito da AT corroborar os factos propostos pelo perito da Impugnante.
P. Como resulta expresso no despacho do Diretor de Finanças (cf. ponto 11 do probatório) que ora parcialmente se transcreve: “(…) na sequência da reunião efectuada em 08.02...., nos termos do art.º 91.º, n.º 3 da LGT (…) ressalta uma mera aderência do perito da Fazenda Pública ao invocado pelo perito do contribuinte, não espelhando o porquê da mesma”, (…) 11. Impunha-se uma concretização dos motivos que conduziram à aceitação da proposta em análise, uma vez que está em causa uma alteração da matéria tributável apurada, em cumprimento do art. 92º, n.º 4 da LGT. 12. Exigia-se, sobretudo, a demonstração do porquê da justificação das divergências detectadas, assim como, a razão de ser da adesão do perito da fazenda pública aos factos e documentos apresentados pelo perito do sujeito passivo, o que não sucedeu (nem tão pouco se verifica a existência de qualquer teste, qualquer amostragem realizada pelo perito da fazenda pública que vá de encontroo, ou que confirme, os elementos apresentados pelo contribuinte)”.
Q. É, pois, de reiterar que, no caso, o perito da AT preteriu o dever de fundamentação preceituado nos arts. 77.º da LGT e 124.º a 126.º (atuais 152.º a 154.º) do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
R. Afirma, ainda, o Tribunal a quo: “O que o diretor podia e devia ter demonstrado era uma manifesta violação das competências legais do perito, ou seja, que o mesmo, em clara violação do que lhe competia incorreu, não podendo, no entanto, invocar-se o erro nos pressupostos”.
S. Salvo o devido respeito, entende a Fazenda Pública que os fundamentos do despacho de revogação não interferem com a independência técnica do perito da AT ou implicam um juízo de mérito, sendo antes a situação aventada pelo decisor que se encontra concretizada na motivação do despacho em apreço, na medida em que o mesmo reporta-se ao não cumprimento dos deveres funcionais do perito da AT concernentes à necessária fundamentação do acordo alcançado no procedimento de revisão.
T. Acrescenta o Tribunal a quo que: “(…) ao invés do Diretor de Finanças ter enveredado pela revogação do acordo atenta a invocada falta de fundamentação, deveria preliminarmente diligenciar que os peritos diligenciassem pela sanação desse vício, como seja a sanação da fundamentação exigida pelo artigo 92.º, n.º 4 da LGT”.
U. Sucede que, no caso, tendo o vício sido detetado em momento posterior ao acordo dos peritos, o Diretor de Finanças não podia deixar de proceder à sua anulação, nos termos do art.62.º do CPPT.
V. A função da revogação (anulação) consiste em reintegrar a legalidade ofendida pelo ato inválido, sem prejuízo dos princípios fundamentais da proporcionalidade, da proteção da confiança e da segurança jurídica que, na situação em análise, não foram lesados, uma vez que a Impugnante foi notificada do despacho de revogação, no prazo de 15 dias preceituado no art.62.º, n.º 2 do CPPT. Ou seja, foi respeitado o prazo concedido pelo legislador para a anulação do acordo de peritos plasmado na Ata n.º 02/...-D, não se encontrando prejudicados os princípios da proteção da confiança ou da segurança jurídica.
W. Na sequência da anulação administrativa foram, igualmente, observados os deveres que não haviam sido cumpridos por referência aos elementos convocados pelo perito da Impugnante. Houve um reexame das situações fáticas controvertidas - a AT retomou o procedimento no âmbito do qual foi proferido o acordo anulado e praticou outra decisão atinente às mesmas questões suscitadas pelo perito da Impugnante.
X. Aqui, convém ter presente que a AT atua na prossecução de interesses na titularidade dos quais foi institucionalmente investida, tendo o poder-dever de remover o acordo ilegal e a subsequente reinstrução do procedimento de revisão da matéria tributável, o que ocorreu, in casu, pois a AT promoveu a realização de novas reuniões entre os peritos, conforme descrito na Ata n.º09/..., de 11-03-... e na Ata n.º 09/... (continuação), de 21-03-... - documentos juntos aos autos para cujo teor se remete para todos os efeitos legais, sendo que esta última ata integra o ponto 13 do probatório.
Y. Ante o exposto, entende a Fazenda Pública que o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento quando conclui que o despacho de revogação do acordo alcançado, em 0802-..., entre o perito designado pela Impugnante e o perito designado pela AT, é ilegal, por não caber no art.62.º, n.º 1 do CPPT e nesta sequência decide pela anulação de todos os atos que lhe foram subsequentes e julga procedente a pretensão de juros indemnizatórios formulada pela Impugnante.
Z. Na verdade, ao contrário do decido pelo Tribunal a quo, entende a Fazenda Pública que o dever de fundamentação formal não se encontra satisfeito, pois do acordo firmado na Ata n.º02/...-D, de 08-02-..., não é possível apurar a racionalidade da decisão do perito da AT, i.e., as concretas razões que determinaram a sua adesão aos elementos e documentos apresentados pelo perito da Impugnante, tanto mais que aquele desconsidera ou não faz qualquer menção aos elementos recolhidos e analisados no precedente procedimento inspetivo.
AA. O objetivo último do dever de fundamentação é assegurar uma decisão materialmente correta através da reflexão racional e valorativa implicada na própria exposição dos motivos que a determinaram e, simultaneamente, permitir a sua cognoscibilidade e fiscalização. Não bastam simples juízos conclusivos, fundamentações abstratas ou vagas traduzidas numa mera indicação do resultado de uma avaliação pessoal, sem indicação das concretas diligências efetuadas.
BB. É de notar que estamos no âmbito de um procedimento administrativo em que a vontade do perito da AT não corresponde a uma vontade arbitrária/livre, mas a uma vontade do órgão, funcionalmente dirigida à satisfação de interesses definidos por lei. O poder discricionário (e não arbitrário) de que o perito da AT se encontra investido existe para a realização de necessidades públicas.
CC. Como expõe Vieira de Andrade, in “O Dever da Fundamentação Expressa de Actos Administrativos”, Almedina, 1991, p.360, que se divisa transponível para o acordo assente no procedimento de revisão: “(…) defendemos que o imperativo de fundamentação expressa se projecta no plano substancial como um instrumento específico de garantia da reflexão e ponderação da autoridade responsável pela decisão e, bem assim, da possibilidade de controle da correção desse momento de autoria real, no contexto definido pelo princípio da juridicidade da Administração”.
DD. Na situação dos autos, o perito da AT quanto às razões determinantes da sua decisão apenas fez constar na Ata n.º02/...-D, o seguinte: “o perito da fazenda pública, da análise efectuada aos elementos apresentados pelo perito do sujeito passivo, bem como das observações aquando da visita efectuada às instalações do sujeito passivo, não encontra motivos que contrariem os factos e documentos apresentados pelo sujeito passivo e seu perito, pelo que deste modo os considera relevantes para a justificação das divergências detectadas”.
EE. Ora, como indicado no despacho de revogação: “Do acima transcrito ressalta uma mera aderência do perito da Fazenda Pública ao invocado pelo perito do contribuinte, não espelhando o porquê da mesma.” (cf. despacho do Diretor de Finanças ..., de 22-02-..., junto aos autos e integrante do ponto 11 do probatório, que se dá aqui por reproduzido para todos os efeitos legais).
FF. A constatação do incumprimento do dever de fundamentação, por parte da AT faria sempre recair sobre esta o poder-dever de anular o acordo, nos termos do disposto no art.62.º do CPPT – o que foi feito através do despacho de revogação em referência.
GG. Importa mencionar que o procedimento tributário e, em especial, o procedimento de revisão pressupõe um dever de colaboração recíproco, porém não deixa de ser conduzido pelo perito da AT, que na sua atuação tem de observar o princípio do inquisitório e a necessidade de averiguação da verdade material, de forma a garantir a correta aplicação do imposto.
HH. Assim, a anulação do acordo dos peritos, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo não padece do vício de violação de lei, antes se mostra legal e devido face ao princípio da juridicidade que deve conformar toda a atividade da AT.
II. De referir que a decisão de anulação justifica-se não só pelo facto dos poderes-deveres da AT deverem ser exercidos com respeito pelo princípio da juridicidade tributária (art.266.º, n.º2 da CRP), mas também pela própria constituição da relação jurídica de imposto (arts.36.º, n.º1 da LGT), pela precedência e preeminência da lei (art.103.º, n.º2 e 165.º, n.º1, al.i) da CRP) e, bem assim, pelo respeito dos direitos subjetivos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos/contribuintes (arts. 266.º, n.º 1 e 103.º, n.º 3 da CRP).
JJ. Reitera-se que a prossecução das atribuições da AT implica a conformidade e compatibilidade da sua atuação com a juridicidade, logo a AT deve exercer os seus poderes-deveres tributários no quadro de um procedimento imparcial marcado pelo inquisitório, com vista à descoberta da verdade material, de modo a conseguir a correta manifestação de vontade funcional do legislador expressa no âmbito da sua reserva de lei parlamentar (266.º, n.º2 e 165.º, n.º1, al.i) da CRP) e com o simultâneo respeito dos direitos e garantias dos contribuintes, de forma a assegurar o seu direito fundamental à legalidade na tributação (arts.266.º, n.º1 e 103.º, n.º3 da CRP), i.e., que a liquidação do imposto seja feita, nos termos da lei.
KK. Obiter dictum, refira-se, ainda, que dos fundamentos do despacho de revogação decorre uma razoabilidade de dúvida séria sobre a imparcialidade da atuação do perito da AT, pelo que, também, por isso, se divisa legal a decisão de anulação do Diretor de Finanças, atendendo ao art.76.º, n.º4 do CPA aplicável ex vi do art.2.º, al.d) do CPPT, que dispõe que: “A falta ou decisão negativa sobre a dedução da suspeição não prejudica a invocação da anulabilidade dos atos praticados ou dos contratos celebrados, quando do conjunto das circunstâncias do caso concreto resulte a razoabilidade de dúvida séria sobre a imparcialidade da atuação do órgão, revelada na direção do procedimento, na prática de atos preparatórios relevantes para o sentido da decisão ou na própria tomada da decisão.”. A norma citada constitui uma clara opção do legislador em reforçar a credibilidade da decisão administrativa, salvaguardando o interesse público, o qual, na situação dos autos, não podia deixar de determinar a decisão de anulação, que se divisa conforme ao princípio da boa administração (art.5.º do CPA), pelo que, mais uma vez, se reitera a sua legalidade.
LL. Em suma, no caso, a não fundamentação do acordo obtido além de configurar um ato ilegal, constitui uma conduta ilícita por parte do perito da AT, pois este não cumpriu o dever de fundamentação exigido pelo legislador, no procedimento de revisão em causa.
MM. Dispõe o art.92.º, n.º 4 da LGT que: “O acordo deverá, em caso de alteração da matéria inicialmente fixada, fundamentar a nova matéria tributável encontrada.”. Tal exigência de fundamentação resultaria já da disposição geral do art.77.º da LGT e, bem assim, dos arts. 124.º a 126.º [atuais 152 a 154] do CPA como mencionado no despacho de revogação.
NN. Todavia, como anotam José Maria Fernandes Pires, Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal, Maria João Menezes, in Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, Almedina, p.971: “[tais exigências de fundamentação] são mais acentuadas nos casos em que do procedimento de revisão resulta uma matéria tributável divergente da apurada (também de forma fundamentada) em inspecção”. O que sucede no caso dos autos.
OO. Acresce que “[há que] considerar um princípio incontornável do direito tributário português: o crédito tributário é indisponível, de acordo com o n.º 2 do artigo 30.º da LGT. No respeito para com este princípio, não pode o valor do imposto ser “negociado” entre administração tributária e contribuinte. Valerá o princípio da legalidade (e não da arbitrariedade) e é em obediência à Lei que deve ser determinada a matéria tributável. Assim, não se pretende um mero acordo das partes, mas um acordo “nos termos da lei”, como está expresso no n.º 1 deste artigo 92.º. Esta é uma das razões que exigem a fundamentação da decisão, ainda que haja acordo, para que possa aferir-se se tal ajuste está enquadrado legalmente.” (José Maria Fernandes Pires et al., ibidem, p.969).
PP. Já Lima Guerreiro na sua Lei Geral Tributária Anotada (p.384) defendia a continuação da aplicação subsidiária ao procedimento de revisão das disposições do CPA que constitui “um procedimento exclusivamente de duas partes, em que o contribuinte tenta convencer a Fazenda Pública, que continua a agir em vestes de direito público, da bondade das suas razões”. O mesmo Autor esclarece ainda que “o próprio perito independente, quando intervém no procedimento de revisão, não enverga as vestes do juiz independente em relação ao contribuinte. É um órgão da Administração que, no entanto, não deixa de estar sujeito a um dever reforçado de imparcialidade e de prossecução do interesse publico.” (ibidem, p.385).
QQ. No procedimento de revisão exige-se a fixação rigorosa dos pressupostos da decisão e a obtenção de decisões legais e justas (cf. art.60.º, n.º 1 do CPA), logo a factualidade alegada e os elementos documentais trazidos ao procedimento pelo perito da Impugnante têm de ser confrontados, validados e ponderados (art.115.º do CPA), o que não resulta evidenciado no acordo objeto de anulação.
RR. Tendo em conta o acima exposto, a não anulação do acordo expresso na Ata n.º 02/2013D, de 08-02-... equivaleria a uma inatividade administrativa não autorizada por lei, a violação do dever de fundamentar consagrado no art.92.º, n.º4 da LGT e a uma ilegal disposição do crédito tributário.
SS. Assim, entende a Fazenda Pública que o despacho de revogação, proferido nos termos do art.62.º do CPPT não se divisa ilegal, antes configura um ato necessário, adequado e proporcional a salvaguardar a imparcialidade da Administração, a excluir o arbítrio e a realizar o Interesse Público, em conformidade com o princípio da legalidade tributária que pressupõe o direito fundamental à legalidade da tributação enquanto limite do dever fundamental de pagar impostos, devendo, por isso, o despacho de revogação e todos os atos que lhe foram consequentes manter-se na ordem jurídica.
Nestes termos e nos mais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e a douta sentença recorrida ser eliminada e substituída por outra que julgue, totalmente, improcedente a pretensão da Impugnante, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!»
1.2. A Recorrida [SCom01...], Lda., notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 400 e ss. do SITAF, pugnando pela procedência do recurso, com o teor que aqui por extracto se transcreve:
«(...) Alega a recorrente, em síntese, que a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito, conforme fundamenta em sede conclusiva e para cuja leitura remetemos.
Cremos que lhe assiste razão, sendo que acompanhamos na íntegra as razões de facto e de direito invocadas pela ora recorrente.
Acompanhamos, também, o Parecer proferido pelo Ministério Público na 1ª Instância, com data de 19/09/2019 (fls. 311), o qual remeteu para os termos da Contestação oportunamente apresentada pela AT.
O recurso merece provimento.»
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
1.5. Delimitação do objecto do recurso – questões a apreciar
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito ao ter considerado ilegal o despacho proferido pelo Diretor de Finanças que revogou o acordo alcançado pelos peritos em sede de procedimento de revisão da matéria coletável, ao abrigo do preceituado no artigo 62º do CPPT.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 De facto
2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«1. [SCom01...], S.A., NIPC: ...84, aqui Impugnante, no exercício económico de 2010, encontrava-se coletada pela atividade principal de "Comércio por grosso de leite, seus derivados e ovos" (CAE 46331 e pelas atividades secundárias de “Outras atividades de embalagens” (CAE 82922), “Avicultura” (CAE 01470) e “Atividades de ensaios e análises técnicas” (CAE: 71200)– cfr. capítulo II – C. 1 do relatório de inspeção, de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
2. No exercício da sua atividade, a Impugnante dedica-se essencialmente à produção, compra e venda de ovos – cfr. capítulo II – C. 1 do relatório de inspeção, de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
3. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º ...18, os Serviços da Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., desencadearam procedimento inspetivo externo à aqui Impugnante, de âmbito geral e com incidência sobre o exercício económico de 2010 – cfr. capítulo II – B do relatório de inspeção tributária de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
4. Em 23/11/2012, na sequência do procedimento inspetivo referido no ponto que antecede, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária, relatório de inspeção tributária, onde, por referência ao exercício económico de 2010, foram efetuadas correções à matéria tributável em sede de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC) com recurso a métodos indiretos, no montante de € 57.488,48 - cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
5. A correção com recurso a métodos indiretos, referida no ponto que antecede, resultou da seguinte fundamentação inclusa no relatório de inspeção, que dali se extrai:
“ (…)
Capítulo II – Objetivos, âmbito e extensão da ação inspetiva
(…)
5. Outras situações relevantes
5.1 - Análise aos registos contabilísticos
5.1.1 - Análise à diminuição de resultado tributável
Conforme se verifica pela análise ao mapa do ponto B do capítulo II deste relatório, ao exercício em análise (2010), verificou-se um acentuada redução do rendimento tributável declarado pelo sujeito passivo.
Julgamos importante perceber qual o motivo dessa diminuição do resultado da sociedade, pelo que, analisadas as demonstrações de resultados dos exercícios de 2007 a 2010, verifica-se que a sociedade tem vindo numa tendência de crescimento.
No entanto no exercício de 2010 deu-se uma redução do volume de negócio, que apesar de acompanhada pelos custos das existências vendidas, não o foi pelos restantes custos, nomeadamente FSE e custos com o pessoal.
Para além desta redução do volume de negócios verificou-se ainda uma redução significativa dos proveitos extraordinários, relativamente a 2009, passando de 197 mil euros para apenas 88 mil euros.
5.1.2 – Gastos
Relativamente aos gastos foram verificadas, por amostragem todas as contas de custos, sendo verificados os documentos com relevância no apuramento do rendimento tributável. Consideraram-se documentos com relevância no apuramento do rendimento tributável, todos os que suportavam registos contabilísticos de valor igual ou superior a 1000 euros.
Sempre que numa conta não existia qualquer registo de valor igual ou superior a 1000 euros, este limite era reduzido para que pelo menos um documento fosse verificado.
Para além da análise documental, foram ainda efetuados outros testes aos gastos da sociedade, nomeadamente aos consumos de combustíveis das viaturas da empresa.
5.1.3 – Rendimentos
5.1.3.1 – Vendas de ovos
No que aos rendimentos diz respeito, foram efetuados testes às vendas de ovos, por ser o produto responsável por cerca de 97% das vendas da sociedade, sendo estes devidamente descritos no capítulo IV deste relatório.
(…)
Capítulo IV – Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos
1 – Divergências nas vendas de ovos
Conforme já anteriormente se referiu, no decurso da ação de inspeção foi efetuado um teste ao universo das vendas de ovos, por ser este o produto responsável por cerca de 97% das vendas.
Assim, o teste consistiu na recolha, da totalidade dos mapas de produção elaborados pelos responsáveis por cada um dos aviários explorados pela sociedade, tendo sido, desta forma criada uma base de dados com o número de galinhas em postura e o número de ovos produzidos por dia e aviário, da qual foram retirados os dados do anexo a este relatório (anexo I).
Por outro lado, dado que a sociedade, para além de produzir, compra também ovos para venda, foi recolhida a informação constante das faturas de fornecedores contabilizadas na conta de compras, as quantidades adquiridas bem como as datas de aquisição (anexo II).
Quanto às vendas de ovos, foi utilizada a informação retirada da base de dados fornecida pelo sujeito passivo, através do ficheiro normalizado SAF’T, sendo retirados da mesma os documentos comerciais anulados pelo sujeito passivo (anexo III e IV).
Com base nesta e tendo em consideração as informações prestadas pelo administrador da sociedade (Sr. «AA»), quanto à forma como apurar o número de ovos constante em cada tipo de embalagem, ou seja, código de produto, foi apurado o número de ovos faturado.
Os produtos, para além de serem divididos em categorias de ovos por razões diretamente relacionadas com especificidades dos mesmos, são também discriminados pelo tipo de embalagens, sendo vendidos à dúzia ou ½ dúzia, mas em embalagens que agrupam um determinado número destas unidades.
Assim em cada embalagem vendida corresponde a um determinado número de ovos, sendo este variável em cada código de produto, por exemplo, o produto com o código 131031212, que corresponde a “Ovo Gai Ct.A M Caído 20 Dz P1*12”, cada unidade vendida corresponde a 240 ovos (20x12), isto porque cada unidade é composta por 20 embalagens de uma dúzia de ovos.
No entanto, verificou-se que em determinados documentos de venda, apesar de serem utilizados os mesmos códigos e consequentemente descrição do produto, a vendas são quantificadas em dúzias ou ½ dúzias. Este facto, que foi detetado pela análise do preço unitário dos produtos, verifica-se em algumas faturas e vendas a dinheiro e na totalidade das notas de crédito (documentos identificados no anexo V).
Para além das vendas quantificadas por dúzias ou ½ dúzias, existem ainda vendas de ovos a peso (kg), pelo que para quantificar por unidades estas vendas de ovos foi considerada a média apurada pelas compras de ovos (anexo II).
Ou seja, dado que uma parte significativa dos ovos adquiridos são quantificados a peso, mas simultaneamente os documentos de compra identificam o número de ovos em causa, foi possível, com base nesta informação apurar que um quilo de ovos corresponde em média a 15 ovos (ovos de galinha), esta questão não se coloca a ovos de codorniz (ovos mais pequenos e consequentemente mais leves) dado estes não serem nem adquiridos nem vendidos ao peso.
Assim, apurado o número de ovos produzidos, adquiridos e faturados, sem esquecer as existências de ovos no início e no fim do exercício e as quebras contabilizadas pela sociedade, verificou-se, conforme mapa que se segue, que as vendas faturadas não corresponde às vendas efetivas.
Outro dado relevante prende-se com o facto de na base de dados das vendas de ovos, constarem alguns documentos com data de transmissão efetiva dos bens de 28, 30 e 31 de dezembro de 2009, os quais, tendo em consideração tratar-se de ovos produzidos ou adquiridos e vendidos no ano de 2009, naturalmente ficam excluídos deste teste ou sejam devem ser abatidos às quantidades faturadas.
Por outro lado, também no final do exercício se verificou a saída de ovos, até 31 de dezembro de 2010, com faturação apenas em 2011 (anexo VII), os quais devem ser considerados neste teste como ovos vendidos. (dados recolhidos através do ficheiro SAF’T para o mês de janeiro de 2011.
Mapa 5
OvosDúzias de ovos
Existência inicial de ovosa)248.36420.697
Compra de ovosb)14.876.1971.239.683
Produção de ovosc)29.433.0402.452.753
Existência final de ovosd)480.36640.031
Quebras contabilizadase)153.60012.800
Vendas calculadas(f)=(a)+(b)+(c)-(d)-€43.923.6353.660.302
Vendas faturadas(g)43.002.7293.583.561
Vendas faturadas com data de saída de 2009(h)131.19910.933
Ovos com saída em 2010 e fatura em 2011(i)48.7324.061
Vendas faturadas líquidas(j)=(g)-(h)+(i)42.920.2623.576.689
Diferença(k)=(f)-(j)1.003.37383.613

2 – Teste ao número de galinhas em postura
Foi também efetuado um teste ao número de galinhas em postura, tendo em consideração as aves adquiridas, a sua colocação em postura (o que se verifica entre as 18 e 20 semanas) e a posterior retirada de postura e venda para abate.
Este teste teve ainda por base a mortalidade das aves ao longo de período de postura, evidenciada nos mapas de produção exibidos pelo sujeito passivo.
Verificou-se assim existirem algumas divergências, entre o número de aves que, segundo os mapas de produção terminam a postura e as galinhas vendidas para abate, facto que pode ter várias justificações, como sejam erros de contagem ou quebras reconhecidas no abate das aves (aves rejeitadas pelo matadouro).
No entanto, verificou-se, relativamente ao pavilhão 15 uma divergência quanto ao número de aves vendidas e a data da venda das mesmas, conforme consta da fatura 140390 resultante da guia de transporte 22358.
Verifica-se assim que as galinhas do pavilhão 15 foram vendidas no dia 14 de fevereiro, existindo recolha de ovos neste pavilhão apenas até ao dia 10 desse mesmo mês, encontrando-se assim em falta o9 registo dos ovos produzidos nesse pavilhão nos dias 11 a 14 de fevereiro (considera-se também o dia 14 dado que a saída se verificou às 20 horas, ou seja, no fim do dia).
Trata-se de animais vivos, que durante esses 4 dias teriam naturalmente que manter a atividade biológica”, ou seja, alimentar-se e pôr ovos.
3 – Avaliação indireta no apuramento do rendimento tributável
Pelo resultado dos testes referido nos pontos 1 a 3 deste capítulo, ficou demonstrada a existência de “factos concretamente identificados através dos quais”, é “patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”, pelo que fica, nos termos da alínea d) do artigo 88º da LGT (Lei Geral Tributária), comprovada a impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável.
Desta forma, estão reunidas as condições para o apuramento do rendimento tributável com recurso à avaliação indireta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 87º da LGT.
A aplicação dos métodos indiretos no apuramento do rendimento tributável torna-se inevitável dado que apuradas as omissões que evidenciam um volume de negócios superior ao declarado não é possível valorizar as mesmas de forma direta, por não ser conhecido o preço praticado nas vendas omitidas.
Capítulo V – Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos
Demonstrada a impossibilidade de determinar de uma forma clara e inequívoca o volume de negócios e consequentemente a matéria tributável, propõe-se que o apuramento seja efetuado com base no seguintes critérios e cálculos, conforme previsto na alínea i) do n.º 1 do artigo 90.º da LGT.
1 – Critério utilizado no apuramento do rendimento tributável
Para apurar o valor das correções propostas com recurso à aplicação de avaliação indireta, são utilizados os resultados dos testes efetuados às vendas da sociedade, referidos no capítulo IV deste documento.
Assim às divergências nas quantidades faturadas, apuradas no ponto 1 do capítulo IV (mapa 5), devem ser acrescidas a produção de ovos não registada a que se refere o ponto 2 do mesmo capítulo, sendo esta apurada com base na última produção conhecida, ou seja, os ovos recolhidos nesse pavilhão no dia 10 de fevereiro, multiplicados pelos 4 dias sem registos (2.380 x 4= 9520).
Desta forma a omissão de vendas corresponde à divergência apurada no teste referido no ponto 1 do capítulo IV (1.003.373 ovos) acrescido da postura de ovos não registada, a que se refere o parágrafo anterior (9.520 ovos) ou seja 1.012.893 de ovos não faturados.
Apuradas as omissões nas vendas de ovos em quantidade, serão estão valorizadas com base na média ponderada do preço de venda de ovos faturadas, o qual é apurado no final do mapa do anexo IV, tendo em consideração o valor líquido das vendas de ovos faturadas e o número de ovos que lhe deram origem.
A opção pelo preço médio ponderado é inevitável, não apenas por não ser conhecido o código do produto onde se verificaram as omissões de vendas, como ainda pelo facto de, para cada um dos códigos de produtos se verificarem variações de preços durante o exercício, em função da data e do mesmo cliente.
Nesta fase estaremos em condições de apurar o valor das omissões nas vendas, que corresponderão às correções ao rendimento tributável, dado que estas não implicam qualquer correção aos custos da sociedade.
(…)
2 - Cálculo dos valores corrigidos com recurso a avaliação indireta
2.1 – Correções ao rendimento tributável
Conforme se referiu anteriormente, as correções ao rendimento tributável da sociedade resultam do apuramento das vendas de ovos omitidas, valorizadas ao preço médio das vendas faturadas pela sociedade, conforme mapa que se segue.
Mapa 6
Omissões nas vendas de ovosA1.012.893
Preço médio ponderado de venda de ovos faturados pelo sujeito passivo - apurado no mapa do anexo IVB€ 0,0974
Valor das omissões de vendas / correções propostas ao rendimento tributável com recuso à avaliação indireta.C = A x B€ 98.655,78
(…)
Capítulo IX – Direito de audição – fundamentação
(…)
O sujeito passivo ao exercer o direito de audição, referiu alguns factos que, por carência da informação, obrigaram a esclarecimentos posteriores, os quais, com autorização do administrador da sociedade, foram recolhidos nas instalações desta.
Assim, no ponto 2 do direito de audição, o sujeito passivo refere-se a faturas de venda de ovos que não haviam sido consideradas nos testes efetuados, remetendo para uma listagem das mesmas em anexo.
No entanto, os dados constantes nesse anexo, nomeadamente as quantidades e valores das vendas de ovos documentadas pelas faturas em causa, diferem dos constantes da base de dados recolhida no decorrer da ação de inspeção para esses mesmos documentos, pelo que foi necessário verificar qual a informação correta.
Por outro lado, refere o sujeito passivo, no ponto 3 do direito de audição, que as faturas de aquisição de ovos (a peso) ao fornecedor “[SCom02...]” para além dos ovos transacionados incluíam também o peso das embalagens, pelo que foi também necessário verificar cada um destas faturas.
1 – Desta forma, seguidamente será analisado cada um dos pontos do direito de audição
Ponto 1 – Neste ponto o sujeito passivo apenas refere que se irá referir aos critérios e cálculos dos valores com recurso a métodos indiretos.
Ponto 2 – É aqui referido que nas quantidades de ovos vendidas, não foram consideradas as faturas constantes do documento em anexo ao direito de audição. Analisada a base de dados considerada no apuramento das quantidades de ovos vendidas, constata-se que de facto, essas faturas, por razões que se desconhecem, mas que estarão naturalmente ligadas à utilização de mecanismos informáticos (nomeadamente filtros do Excel ou outros), ao selecionar as linhas de vendas referentes a ovos.
No entanto, e conforme já anteriormente se referiu, os dados constantes do anexo ao direito de audição divergem dos constantes da base de dados fornecida pelo sujeito passivo, no entanto após ser verificado cada um dos documentos em causa, verificou-se que estes conferem com a base de dados fornecida pelo sujeito passivo no decorrer da ação de inspeção (ficheiro SAF’T).
Desta forma, no mapa que se segue são indicadas as linhas de vendas não consideradas no apuramento das quantidades de ovos vendidas, devendo as quantidades em causa ser abatidas às correções propostas.
Verificou-se, no entanto, que uma das faturas em causa (146116) foi anulada, pelo que não será considerada.
Mapa 8
N.º docTipo docEstadoDataCódigo produtoProdutoUnid. Quant. Preço Valor
(…)(…)(…)(…)(…)(…)(…)(…)(…)(…)
Totais (não inclui fatura anulada)16.233,02 € 14.774,41

Desta forma, considerando o número de ovos por quilograma, apurado com base nas faturas de compras de ovos (15), verifica-se não ter sido considerada a faturação de 243.345 ovos (16.233,02 x 15).
Ponto 3 e 4 – Refere o sujeito passivo que relativamente a um dos fornecedores ([SCom02...]), o peso dos ovos faturados inclui as embalagens, facto não considerado no teste efetuado às vendas. Desta forma, foram mais uma vez visionadas asa faturas de compra de ovos desse fornecedor, por forma a verificar a veracidade desse argumento do sujeito passivo, verificando-se que nestas, ou nas guias de transporte correspondentes, não consta qualquer informação que certifique o facto invocado pelo sujeito passivo, motivo pelo qual este não influenciará os cálculos anteriormente efetuados.
Este facto a ser verdadeiro, apenas influenciaria os cálculos no apuramento do número de ovos por quilograma, utilizado no apuramento das quantidades de ovos vendidos a peso, pois relativamente às compras, a fatura ou a guia de transporte, para além do peso, identifica também as quantidades (em dúzias) de ovos adquiridos, tendo sido estes os dados considerados.
Ponto 5 – De facto, os estudos existentes identificam um intervalo para o número médio de ovos por quilograma, no entanto neste caso não estamos a utilizar qualquer estudo, mas pelo contrário dados concretos do sujeito passivo em causa. Ora ao utilizar um intervalo, qual seria o valor considerado, o mais alto, o mais baixo, ou uma média deste? O critério utilizado, para além se encontrar dentro dos intervalos revelados pelos estudos conhecido, foi apurado com base em dados concretos da sociedade em análise, pelo que será o mais correto para os testes em causa.
Ponto 6 e 7 – Refere o sujeito passivo que o ovo perde peso, com o decorrer do tempo, entre a aquisição e a venda e ainda com a temperatura. Relativamente a este ponto, não foi considerada qualquer eventual perda de peso do ovo, pois para além de não ser esta, caso exista, conhecida, trata-se de um produto “fresco” e como tal com muito pouco tempo de stock e que mesmo quando em armazém se encontra em ambiente com temperatura controlada.
Desta forma, apenas foram consideradas as quebras contabilizadas pelo sujeito passivo, e que este indica, se referirem apenas a centro de classificação.
Ponto 8 – Relativamente ao facto de as quebras das devolvidas ou do transporte, não serem contabilizadas por serem incontroláveis, não pode a administração tributária concordar, pois verificou-se que para cada entrega de o9vos (vendas) é efetuada uma verificação pelo cliente ou representação deste, da qual resulta um documento emitido por este ou uma confirmação nos documentos que acompanham a mercadoria emitido pelo sujeito passivo.
Ponto 9 a 14 – Nestes 6 pontos refere-se o sujeito passivo às correções resultantes do teste efetuado ao número de galinhas em postura, ponto 2 do capítulo IV deste relatório, o qual com base na explicação agora dada se verifica tratar-se de um lapso na elaboração dos documentos de transporte das galinhas, pelo que as omissões nas vendas (9.520 ovos) resultantes deste teste serão anuladas.
2. Cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos após direito de audição.
2.1 – Correções ao rendimento tributável
Desta forma, tendo sido considerados os argumentos invocados pelo sujeito passivo, nos pontos 2 e 9 a 14 do seu direito de audição, será de seguida, nos mapas que se seguem recalculadas as omissões nas vendas de ovos (em quantidade), sendo para tal utilizada a mesma estrutura do mapa do ponto 1 do capítulo IV deste relatório, mas com inclusão das vendas agora reconhecidas (linha h).
Mapa 9
OvosDúzias de ovos
Existência inicial de ovosa)248.36420.697
Compra de ovosb)14.876.1971.239.683
Produção de ovosc)29.433.0402.452.753
Existência final de ovosd)480.36640.031
Quebras contabilizadase)153.60012.800
Vendas calculadas(f)=(a)+(b)+(c)-(d)-(e)43.923.6353.660.302
Vendas faturadas(g)43.002.7293.583.561
Vendas faturadas verificadas no D.A(h)243.34520.279
Vendas faturadas com data de saída de 2009(i)131.19910.933
Ovos com saída em 2010 e fatura em 2011(j)48.7324.061
Vendas faturadas líquidas(k)=(g)+(h)-(i)+(j)43.163.6073.596.967
Diferença(l)=(f)-(k)760.02863.335

Desta forma e dado que também após direito de audição não serão consideradas as correções inicialmente propostas por omissão no registo de ovos produzidos (ponto 2 do Capítulo Iva deste relatório), o valor das correções às vendas, pela aplicação de métodos indiretos passa a ser de € 74.026,73, resultante da aplicação do preço por ovo considerado, o número de ovos não faturados (706.028 x € 0,0974).
2.2 Resumo das correções ao rendimento tributável
Desta forma, o mapa 1 do ponto 1.1.1 do capítulo I deste relatório passa a ser composto da seguinte forma.
Mapa 10
Exercício de 2010
Rendimento tributável declarado€ 36,82
Correções técnicas ao rendimento tributável
- Correções a favor do estado€ 3.402.37
- Correções a favor do sujeito passivo-€ 19 940,62
Correções com recurso a avaliação indireta
- Correções ao volume de negócios€ 74.026,73
Rendimento tributável após correções€ 57.525,30
(…)”
- cfr. relatório de inspeção tributária e seus anexos, de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
6. Do relatório de inspeção tributária referido no ponto precedente, fazem parte integrante sete anexos - cfr. relatório de inspeção tributária e seus anexos, de fls. 10 a 177 do Processo Administrativo apenso aos autos.
7. Em 27/11/2012, sob o relatório de inspeção tributária a que se alude no ponto que antecede, foi proferido despacho pela Chefe de Divisão, em regime de substituição do Diretor de Finanças Adjunto, por delegação de competências do Diretor de Finanças ..., com o seguinte teor:
“Concordo.
O Relatório de Inspeção Tributária, onde são evidenciadas as propostas, os fundamentos e os critérios de correção, que foram objeto de notificação para audição nos termos o art.º 60º da L.G.T. e art.º 60º do R.C.P.I.T., demonstra que se encontram verificados os pressupostos de direito e de facto estabelecidos nos art.ºs 87º e 88º da LGT, por remissão do art.º 57.º do Código d IRC e art.º 90º do Código do IVA, para apuramento da matéria tributável de IRC e imposto em falta (IVA), com recurso a métodos indiretos, não sendo possível a sua quantificação e comprovação direta e exata.
Desta forma, com os fundamentos referenciados, determino, nos termos do artº 90º da LGT, a matéria tributável do IRC e imposto (IVA) em falta, com recurso à aplicação de métodos indiretos para o seu apuramento, os seguintes montantes:
Matéria tributável IRC:
2010: €57.525,30
(…)
Notificar o sujeito passivo, nos termos do art.º 62.º do R.C.P.I.T. (…)”
- cfr. despacho ínsito na página do relatório de inspeção tributária, de fls. 10 e 10 verso, do Processo Administrativo apenso aos autos.
8. Em 28/11/2012, foi elaborado ofício com o n.º ...88, subscrito pela Chefe de Divisão, em regime de substituição do Diretor de Finanças Adjunto, por delegação de competências do Diretor de Finanças ..., dirigido à aqui Impugnante e remetido por correio registado com aviso de receção, o qual se mostra assinado em 28/11/2012, nos seguintes termos:
“(…) N.º Ordem de Serviço: ...18
(…)
Fica(m) por este meio notificado(s), nos termos do artigo 62.º do RCPIT, do Relatório de Inspeção Tributária, que se anexa como parte integrante da presente notificação, respeitante à ordem de Serviços acima referenciada.
Da fixação da matéria tributável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) por métodos indiretos, nos termos dos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributável (LGT), por remissão do artigo 57.º do Código do IRC nos seguintes exercícios:
ANO(S)/EXERCICIO(S) MATÉRIA TRIBUTÁVEL FIXADA (*)
2010 57.525,30
(…)
A decisão de avaliação indireta tem por base os factos, motivos e fundamentos constantes do Relatório de Inspeção, tendo os valores sido fixados de acordo com os critérios e cálculos mencionados no referido Relatório. (…)”
- cfr. ofício e aviso de receção, de fls. 9 e 9 verso do Processo Administrativo apenso aos autos.
9. A aqui Impugnante apresentou junto do Diretor de Finanças ..., ao abrigo do artigo 91.º da LGT, pedido de revisão da matéria coletável fixada por métodos indiretos – cfr. Doc. n.º 2 junto com p.i., de fls. 42 a 92 do processo físico.
10. No âmbito do procedimento de revisão da matéria coletável, onde se reuniram os peritos nomeados pela Administração Tributária e pela Impugnante, nas datas de 16/01/..., 25/01/... e 04/02/..., fez-se constar o teor da reunião realizada em 08/02/..., em ata elaborada para o efeito com o n.º 02-...-D, que se mostra assinada pelos dois peritos, em como chegaram a acordo, nos seguintes termos, como dali consta:
“ (…)
1. No seguimento das reuniões anteriores, procedeu-se à análise de toda a informação apresentada pelo perito do sujeito passivo e que seguidamente se apresenta:
1.1. O critério utilizado pelo inspector para determinação do valor médio de ovos por quilograma, para determinação da quantidade de ovos vendidos ao peso, não têm aderência à realidade da empresa, porquanto:
1.1.1. Foram considerados os ovos adquiridos ao peso ao fornecedor “[SCom02...]”, sem ter em consideração que no peso indicado nas facturas estavam consideradas as embalagens. -
1.1.2. Apresentou declaração emitida pelo fornecedor a confirmar o afirmado. --------------------
1.1.3 Apresentou listagem (que se anexa), bem cópia dos relatórios (que se anexam) retirados do centro de classificação e embalagem, relativos às aquisições efectuadas à “[SCom02...]”, na qual apurou um peso médio por ovo de 63,87gr, o que se traduz numa média de 15,66 ovos por quilo. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
1.1.4. O perito do s.p. acrescentou, que os ovos adquiridos ao fornecedor “[SCom02...]”, não são os ovos vendidos ao peso para o cliente industrial, pois já são ovos que foi feita uma pré-escolha e não incluem os ovos com dimensões inferiores à dimensão mínima para venda ao público, e que por norma são os que o sujeito passivo vende para a indústria, e nos quais a média será sempre superior a 16 ovos por quilo. ----------------------------------------------------------------------------
1.1.5. Questionado pelo facto de não apresentar dados relativos ao peso e classificação dos ovos vendidos à indústria o mesmo informou que não possui tais dados, pois os ovos vendidos à indústria não são processados no centro de classificação e embalagem, pois são acondicionados em embalagens (tabuleiros) especificas para o cliente, não se procedendo a qualquer calibração dos mesmos. ------------------------------------------------------------------------------------------------
1.1.6. Apresentou igualmente declaração (que se anexa) do seu cliente industrial a corroborar tal facto.
1.1.7. Acrescentou ainda que a estrutura de vendas da empresa é diferente da [SCom02...], pois, a empresa vende essencialmente ovos de dimensão M (Média), sendo que os ovos adquiridos à “[SCom02...]” contêm mais ovos de dimensão superior (L e XL), conforme se constata nos relatórios do centro de triagem e classificação. --------------------------------------------------------------------------------
1.1.8. Apresentou igualmente resumo (que se anexa) das quantidades vendidas por tamanho, pela empresa, bem como dos adquiridos à “[SCom02...]”, a confirmar o afirmado. --------------------------
1.1.9. Tendo em consideração os factos atrás referenciados, e refazendo os cálculos tendo em consideração o valor mínimo de 16 ovos/kg, a divergência apurada no relatório de inspeção seria reduzida em 494.723, isto é, 65% da mesma, conforme documento que se anexa.
1.2 Na recolha efectuada pelo inspector das quantidades produzidas, a partir dos mapas de produção, foi considerada a quantidade total, sem ter em consideração que nesse valor estavam incluídos e referenciados nos respetivos mapas os ovos partidos, e os ovos de duas gemas, os quais não são comercializados, conforme declaração do seu cliente industrial. --
1.2.1. O perito do sujeito passivo apresentou relação (que se anexa) de todos os ovos indevidamente considerados no relatório de inspecção, bem como cópia dos mapas de produção (que se anexam).-------------------------------------------------------------------------------------------------
1.2.2. Este facto reduz a divergência detectada no relatório de inspecção tributária em 215.506 ovos, ou seja 29% da mesma. -------------------------------------------------------------------------------
1.3. – Não foi considerado qualquer valor para as quebras que ocorrem no transporte e armazenamento dos ovos, e que são normais.----------------------------------------------------------------------------------
Este facto, bem como o facto de a média de ovos vendidos ao peso ser superior a 16, justificam no seu entender a restante mínima divergência. ---------------------------------------------------------------
2 – O perito da fazenda pública, da análise efectuada aos elementos apresentados pelo perito do sujeito passivo, bem como das observações aquando da visita efectuada às instalações do sujeito passivo, não encontra motivos que contrariem os factos e documentos apresentados sujeito passivo e seu perito, pelo que deste modo os considera relevantes para a justificação das divergências detectadas. ---------------------------
3 – Tendo em consideração o atrás descrito os peritos acordam que as correcções apuradas por métodos indiretos não se justificam, pelo que a mesma deverá ser anulada. ----------------------------------------- (…)”
- cfr. Docs. n.º de fls. 130 a 137 do processo físico.
11. Em 22/02/..., por relação ao procedimento de revisão, foi elaborada pelo Diretor de Finanças ..., despacho de revogação do acordo alcançado pelos peritos da Administração Tributária e da Impugnante a que se alude no ponto que antecede, com o seguinte teor:
PROCEDIMENTO DE REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL
SUJEITO PASSIVO: [SCom01...], S.A.
NIPC: ...84
DESPACHO
1. No presente Procedimento de Revisão, na sequência da reunião efectuada em 08.02.... nos termos do art.º 91.º, n.º 3 da LGT, foi estabelecido um acordo entre o Perito da Autoridade Tributária e Aduaneira e o Perito do Contribuinte.
2. De facto, à luz do art.º 92º da LGT o procedimento de revisão assenta num debate contraditório entre ambos os peritos, da Administração Fiscal e do contribuinte, e visa estabelecer um acordo em relação ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de liquidação.
3. Sendo que, na inexistência deste, o tributo será liquidado com base na matéria tributável acordada (cfr. art.º 92.º, n.º 3 da LGT).
4. Atente-se, no entanto que estabelece a lei determinadas exigências no caso de acordo que tenha determinado alteração do valor da matéria tributável inicialmente apurado, porquanto, preceitua o art.º 92º, n.º 4 do mesmo diploma legal que: “O acordo deverá, em caso de alteração da matéria inicialmente fixada, fundamentar a nova matéria tributável encontrada”.
5. Impõe-se questionar, no caso em concreto, se o acordo obtido respeitou os requisitos legais previstos, mormente se foram cumpridas as exigências de fundamentação que a situação determina.
6. Na reunião de 08-02-... relativa ao Pedido de Revisão apresentado “o perito da fazenda pública, da análise efectuada aos elementos apresentados pelo perito do sujeito passivo, bem como das observações aquando da visita efectuada às instalações do sujeito passivo, não encontra motivos que contrariem os factos e documentos apresentados sujeito passivo e seu perito, pelo que deste modo os considera relevantes para a justificação das divergências detectadas..
7. Culminando com a obtenção do acordo entre os peritos no sentido de as correcções operadas na acção de fiscalização não se encontrarem justificadas.
8. Do acima transcrito ressalta uma mera aderência do perito da Fazenda Pública ao invocado pelo perito do contribuinte, não espelhando o porquê da mesma.
9. Apoia-se o perito da Fazenda Pública nos elementos carreados pelo perito do sujeito passivo que não podem ser aceites como elementos e prova susceptíveis de infirmar as correcções em apreço, nomeadamente:
• Declaração de cliente industrial, referida no ponto 1.2, na qual não se encontra aposta qualquer assinatura, não tendo portanto qualquer validade à luz do art.º 373º do CC, além de que daquele apenas se retira que tal cliente não recepcionou ovos de duas gemas, não se podendo extrapolar que estes não são susceptíveis de comercialização ou mesmo que não foram vendidos no exercício em causa – inexiste, portanto, qualquer elemento de prova, qualquer diligencia instrutória, que demonstre o destino dos ovos de duas gemas, sendo estes separados pelo próprio sujeito passivo nos respectivos mapas de produção;
• Relação constante do ponto 1.2.1., a qual, além de não se encontrar rubricada pelo sujeito passivo, se mostra desconforme com os mapas de produção anexos;
• Ponto 1.3, é considerado que não foi considerado qualquer valor para as quebras que ocorrem no transporte e armazenamento dos ovos, todavia, nenhum elemento consta do procedimento de revisão suscetível de confirmar o alegado.
10. É ainda invocada uma visita às instalações do sujeito passivo, contudo, nenhuma referência é feita às diligências aí realizadas, aos elementos recolhidos no âmbito dessa visita, aos testes realizados, enfim, ao que decorreu no âmbito dessa deslocação suscetível de justificar as divergências apuradas.
11. Impunha-se uma concretização dos motivos que conduziram à aceitação da proposta em análise, uma vez que está em causa uma alteração da matéria tributável apurada, em cumprimento do art. 92º, n.º 4 da LGT.
12. Exigia-se, sobretudo, a demonstração do porquê da justificação das divergências detectadas, assim como, a razão de ser da adesão do perito da fazenda pública aos factos e documentos apresentados pelo perito do sujeito passivo, o que não sucedeu (nem tão pouco se verifica a existência de qualquer teste, qualquer amostragem realizada pelo perito da fazenda pública que vá de encontroo, ou que confirme, os elementos apresentados pelo contribuinte).
13. Não se pode ignorar o dever de fundamentação dos actos tributários constante do art.º 77º da LGT e dos art.ºs 124º a 126º do CPA, diploma este aplicável na área tributária por força do disposto no art.º 2º, d) do CPPT, e plasmado constitucionalmente no art.º 268º, nº3 da CRP.
14. Preconiza o art.º 77º, nº 1 da LGT, bem como o art.º 125º, nº 1 do CPA, que a fundamentação deve consistir numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão ou numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas.
15. Deve, portanto, a fundamentação dar a conhecer o destinatário o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor da decisão para decidir no sentido que decidiu e não em qualquer outro.
16. Mais, se a fundamentação, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclarecer a concreta motivação do acto, considera-se este não fundamentado, art.º 125, nº2 do CPA.
17. Entendo, portanto, que a explicação tanto do perito da Administração Fiscal como do contribuinte (ver articulados n.ºs 9 a 12 do presente despacho), não esclarece cabalmente a motivação de facto e de direito que deu origem a tal acordo, considerando-se assim, este acto não fundamentado.
18. Cumpre agora apreciar se o acordo estabelecido em sede de Procedimento de Revisão na reunião de 08.02...., pode ser revogado e em que termos.
19. Dispõe o art.º 62º n.º 1 do CPPT, que “Em caso de a fixação ou a revisão da matéria tributável dever ter lugar por procedimento próprio, a liquidação efectua-se de acordo com a decisão do referido procedimento, salvo em caso de esta violar manifestamente competências legais.”
20. No conceito de competências legais “(…) não se tiveram presentes apenas os casos de incompetência em sentido estrito, mas se pretenderá também ou principalmente aludir aos casos em que a decisão da comissão de avaliação ou revisão não se contém dentro dos limites legalmente fixados”, In CPPT Anotado e Comentado de Jorge Lopes de Sousa, Volume I, anotação 4 ao art.º 62.º do CPPT.
21. Tratando-se de uma situação de manifesta violação de lei, por falta de fundamentação, conclui-se que a Administração Fiscal pode anular administrativamente a deliberação da Comissão de Revisão, com fundamento em ilegalidade.
22. Sobre a questão da forma de revogação do acto praticado (acordo), aplica-se o art.º 62º n.º 2 do CPPT, segundo o qual “A declaração da violação das referidas competências legais pode ser … efectuada pela administração tributária, sendo neste caso obrigatoriamente notificada ao contribuinte no prazo máximo de 15 dias após o termo do procedimento referido no número anterior.”
23. Podendo a declaração de manifesta violação de lei ser oficiosamente proferida pela Administração Tributária.
24. Neste caso, a declaração de revogação do acordo por ilegalidade terá de ser proferida e notificada ao sujeito passivo no prazo de 15 dias (prazo este contado nos termos do art.º 279º do Código Civil, por força do disposto nos art.º 57.º, n.º 3 da LGT e 20.º, n.º 1 do CPPT), a contar do termo do procedimento de revisão da matéria tributável.
Termos em que, por estar em tempo, possuir legitimidade para o efeito e por terem sido manifestamente violadas competências legais, revogo o presente acordo alcançado no Procedimento de Revisão, ficando o mesmo sem efeito, devendo ainda providenciar-se pela notificação do contribuinte no prazo previsto no art.º 62º n.º 2 do CPPT.
Em consequência do presente despacho de revogação, deverá em conformidade o procedimento de revisão ser reaberto na fase imediatamente anterior ao acordo, com a legais consequências. (…)”
- cfr. Doc. n.º 3 junto com a p.i., de fls. 94 verso a 95 verso do processo físico.
12. Em 22/02/..., foi elaborada “Certidão de Notificação”, certificando que a Impugnante, na pessoa do Presidente do Conselho de Administração, foi notificada do teor integral do despacho do Diretor de Finanças descrito no ponto antecedente, a qual se mostra assinada por aquele e três Técnicos de Administração Tributária - cfr. Doc. n.º 3 da p.i., de fls. 94 a 95 verso do processo físico.
13. No âmbito de nova reunião do procedimento de revisão da matéria coletável, onde se reuniram o novo perito nomeado pela Administração Tributária e o já antes designado pela Impugnante, fez-se constar o teor da reunião em ata elaborada para o efeito com o n.º 09/... (continuação), que se mostra assinada pelos dois peritos, em como não chegaram a acordo, nos seguintes termos, entre o demais, como dali consta:
“(…)
4. Analisados todos os elementos constantes do processo e argumentos do perito nomeado pelo contribuinte, o perito da Administração Tributária, considera manterem-se os pressupostos para a aplicação de métodos indiretos, com os fundamentos, constantes do relatório de inspecção tributária, que seguidamente se resumem: -------------------------------------------------------------------------------------------
4.1 O sujeito passivo não quantificou, nem comprovou no direito de audição, nem no pedido de revisão, que existiram quebras superiores às que se encontram contabilizadas. ---------------------------------
Refere apenas tratar-se de quebras normais, não demonstrando o que distingue estas quebras das quebras que se encontram contabilizadas, uma vez que não apresentam comprovativos do apuramento das contabilizadas, verso das que deveria ter contabilizado. ------------------------------
Certo é, que se encontram contabilizadas quebras com valores diferentes, em todos os meses, o que significa, terem as mesmas sido apuradas no decorrer de todo o processo produtivo da empresa, até porque o conceito de quebras, mais não é do que a diferença entre o que é produzido e/ou comprado e o que é posteriormente vendido. ---------------------------------------------------------------------------
Apesar dos mapas apresentados, aquando da presente reunião, anexo II, com 14 folhas, os mesmos não identificam, nem comprovam a forma e a fonte subjacente aos valores que deles constam. ---
4.2 O sujeito passivo põe em causa a quantidade de ovos por kg, sem, no entanto, quantificar, nem demonstrar que a quantidade que foi utilizada, se afasta da realidade. ---------------------------------
Apenas apresenta elementos referentes a um fornecedor, quando a maioria dos ovos vendidos, resultam de produção própria. Mesmo por amostragem, poderia o sujeito passivo calcular o peso médio para os ovos produzidos por classe (S, M, L, XL, …) para além de que, os ovos são normalmente vendidos em quantidade (dúzias) e não ao peso, pelo que deveria ser esta a unidade de medida (dúzias/n.º de ovos) utilizada em toda a faturação. ----------------------------------------------
4.3. Relativamente ao número de ovos por quilo, sustentou o sujeito passivo que um dos seus fornecedores de ovos ([SCom02...]), que identifica nas suas facturas o número e o peso dos ovos, inclui no peso facturado as embalagens onde estes são acondicionados, o que influencia a relação encontrada. ----
Este fundamento foi utilizado pelo sujeito passivo aquando do exercício do direito de audição, pelo que esta situação foi analisada, pelo técnico que realizou a inspecção e da análise que foi efectuada não ficou demonstrado o argumentado pelo sujeito passivo. ----------------------------------------------
O sujeito passivo veio agora juntar, no procedimento de revisão, uma declaração do fornecedor em causa, onde é afirmado que o peso facturado inclui todo o tipo de embalagens (paletes, papelões e cartões). ----------------------------------------------------------------------------------------------------------
Nem nas facturas de compra de ovos a esse fornecedor, nem nas guias de transporte correspondentes, consta qualquer informação que certifique o facto invocado pelo sujeito passivo. Não apresentam documentos de prova do alegado. ----------------------------------------------------------------------------
4.4. Relativamente ao argumento invocado, de que os ovos de duas gemas são vendáveis, nem mesmo para a indústria, o sujeito passivo, veio agora juntar, no procedimento de revisão, uma declaração de um cliente espanhol, que lhe adquire ovos de indústria, onde é referido que não é possível incluir nesta categoria os ovos de 2 gemas. -------------------------------------------------------------------------
Da referida declaração de cliente industrial, apenas se retira que tal cliente não rececionou ovos de duas gemas, não se podendo extrapolar que estes não são suscetíveis de comercialização ou mesmo que não foram vendidos no exercício em causa. ----------------------------------------------------------
Não existe, qualquer elemento de prova, que demonstre o destino dos ovos de duas gemas, constando estes dos mapas de recolha de ovos nos aviários, ou seja, se estes ovos não fossem vendáveis, não constariam dos mapas de produção dos aviários e certamente também não seriam recolhidos e transportados, dado que, desta logística resultariam encargos para o sujeito passivo, sem qualquer retorno. -----------------------------------------------------------------------------------------------------------
O transporte dos ovos da “[SCom02...]” é efectuada pelo sujeito passivo, sendo que no transporte estão também incluídos os ovos de 2 gemas, resultando também, sem qualquer retorno, encargos substancialmente elevados, dada a distância entre o local de produção (... – ...) e a sede da empresa (... – ...). --------------------------------------------------------
A Administração Tributária apurou o número de ovos em falta, independentemente do número de gemas. Competia ao sujeito passivo demonstrar que os ovos de 2 gemas, que foram adquiridos, produzidos e transportados para os armazéns não foram vendidos. ------------------------------------
Não havendo qualquer comprovativo de destruição de ovos, tudo o que é produzido ou comprado e não consta das existências, presumem-se transmitidos, de acordo com o artigo 86.º do CIVA. -------
5. O recurso a métodos indiretos para determinação do imposto em falta é uma faculdade que assiste à Administração tributária quando haja razões fundadas para concluir que não é possível a comprovação e a quantificação direta e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável. ------
6. Assim, não tendo havido acordo entre os peritos, são de manter as correções fixadas com recurso a métodos indirectos (…)”
- cfr. Doc. de fls. 181 a 196 do Processo Administrativo apenso aos autos.
14. Em sede de procedimento de revisão, a Impugnante juntou declaração emitida pela sociedade denominada “[SCom03...]”, com carimbo comercial da mesma e com rúbrica impercetível quanto ao seu subscritor, que se mostra junta à ata a que se alude no ponto antecedente como Anexo I, com o seguinte teor:
“[SCom03...], S.L.U, sita en ctra. ..., Km. 156. ...00 ... (Burgos), dedicada a la elaboración de Ovoproductos, com nº de registro sanitário .../BU,
Comunica:
1º) Que en nuestra planta de Ovoproductos no se recepcionaran huevos de dos yemas debido a las elevadas mermas en su processado.
2º) Que en nuestra planta de Ovoproducto no se recepcionaran huevos en bandejas de 20 alveolos a la imposibilidad de su processado em nuestras instalaciones.
Y para que conste a los efectos oportunos firmo la presente. (…)”
- cfr. Doc. de fls. 100 verso do processo físico.
15. Em sede de procedimento de revisão, a Impugnante juntou “Mapa de quebras mensal”, que se mostra junta à ata a que se alude em 13) como Anexo II, fazendo ali constar por relação a todos os meses do ano, as “Quebras”, “PM Compr” e “Valor”, no total anual respetivamente de, “12.800,0”, “0,61” e “7.853,09” - cfr. Doc. de fls. 101 do processo físico.
16. Em sede de procedimento de revisão, a Impugnante juntou declaração dirigida à aqui Impugnante e emitida pela sociedade denominada “[SCom02...], Lda.”, com carimbo comercial da mesma e com rúbrica impercetível quanto ao seu subscritor, com o seguinte teor:
“(…), 2012/11/25
(…) Conforme vossa solicitação vimos confirmar que os ovos fornecidos pela nossa empresa são pesados à carga e os pesos incluem paletes, papelões e cartões de transporte desde o início da nossa relação comercial. (…)”
- cfr. Doc. de fls. 176 do processo físico.
17. Em 27/03/..., foi elaborada pelo Diretor de Finanças ..., Decisão no âmbito do procedimento de revisão, junta aos autos pela Impugnante na petição inicial, nos seguintes termos, como dali se extrai:
“(…)
Nos termos do nº 6 do artº 92º da Lei Geral Tributária, cumpre ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver, na falta de acordo entre os peritos.
Analisada a respectiva acta verifica-se o seguinte:
1 - O perito do Sujeito Passivo mantem os argumentos contantes na reclamação apresentada nos termos do Art. 91º da LGT, nomeadamente o seguinte:
- As facturas de aquisição de ovos (a peso) ao fornecedor “[SCom02...]” para além dos ovos transaccionados incluem também o peso das embalagens;
- Nem todas as quebras foram contabilizadas, pois só foram as dos ovos abertos no centro de classificação de ovos;
- Não existe, nem a Administração Tributária indica um único indício de que os ovos de duas gemas tenham sido vendidos, uma vez que estes não passam na máquina de calibragem.
2 - Por sua vez, o Perito da Administração Tributária mantem os valores do relatório de inspecção, com os fundamentos nele contantes, afirmando o seguinte:
- Relativamente à inclusão do peso das embalagens nas facturas do fornecedor “[SCom02...]”, o técnico que realizou a inspecção analisou essa situação, aquando da apreciação do direito de audição, e dessa análise não ficou demonstrado o argumento apresentado.
- “O sujeito passivo não quantificou, nem comprovou no direito de audição, nem no pedido de revisão, que existiram quebras superiores às que se encontram contabilizadas”, tendo-se verificado que foram “contabilizadas quebras com valores diferentes, em todos os meses, o que significa, terem as mesmas sido apuradas no decorrer de todo o processo produtivo da empresa”;
- No que diz respeito ao argumento de que os ovos de duas gemas não são vendáveis, “não existe, qualquer elemento de prova, que demonstre o destino dos ovos de duas gemas, constando estes dos mapas de recolha de ovos nos aviários”, e “não havendo qualquer comprovativo de destruição de ovos, tudo o que é produzido ou comprado e não consta das existências, presumem-se transmitidos, de acordo com o artigo 86º do CIVA”.
Assim, considerando todos os elementos existentes, relatório de Inspecção Tributária, posição dos peritos, Decido, por falta de elementos que, nesta fase, os ponham em causa e nos termos do n.º 6 do Artº 92º da LGT, atendendo à posição/defesa do Perito da Administração Tributária, manter os valores fixados em sede de IRC e IVA, no exercício de 2010. (…)”
- cfr. Doc. n.º 4 junto com a p.i., de fls. 96 a 100 do processo físico.
18. Por ofício n.º ...12 de 28/03/..., da Direção de Finanças ..., dirigido à Impugnante e remetido, via postal, foi dado conta do teor da decisão do pedido de revisão da matéria coletável, e por esta rececionado - cfr. Doc. n.º 4 junto com a p.i., de fls. 96 a 97 do processo físico.
19. Em resultado da correção com recurso a métodos indiretos efetuada pelos Serviços da Inspeção Tributária a que se alude em 4) e descrita em 5), mantida por decisão referida em 17), por referência à aqui Impugnante e ao exercício económico de 2010, foi emitida, a liquidação de IRC aqui impugnada com o n.º ...22, no montante total a pagar de € 1.219,52, dos quais € 862,88, respeitam a derrama e € 720,76 a juros compensatórios, a qual após compensação da liquidação anterior com o n.º ...33, originou a emissão da demonstração de acerto de contas/nota de cobrança n.º ...41, no montante total a pagar de Eur € 14.396,39, a qual se mostra paga na data de 26/04/... – cfr. demonstrações de liquidações de IRC e juros compensatórios e de acerto de contas, juntas como Doc. n.º 1 da p.i., de fls. 39 a 41 do processo físico, e quanto à data de pagamento da nota de cobrança – cfr. Docs. juntos pela AT, a fls. 212 e 213 do Processo Administrativo apenso aos autos.
20. Do documento de liquidação de IRC identificado no ponto que antecede, consta da linha n.º 21, o seguinte: "Derrama € 0,55 [respeitante a "Importâncias Liq. Anterior”], € 862,88 [respeitante a "Importâncias Corrigidas"] - cfr. Demonstração de liquidação de IRC, junta como Doc. n.º 1 da petição inicial, a fls. 39 do processo físico.
Mais se provou que,
21. Por referência ao cálculo do peso médio dos ovos adquiridos pela Impugnante no ano de 2010, a aqui Impugnante dispõe de quadro/tabela elaborado em programa Word/Excel, onde fez constar, entre o demais, os seus fornecedores identificados no Anexo II do relatório de inspeção tributária, a descrição por artigo, a quantidade no documento, os subtotais, o total faturação dos ovos, os kilos, e o peso médio dos ovos, constando no final um total de kilos de 747.707,240 (coluna “Kilos”), um total de unidades adquiridas de 11.574.948 ovos (coluna “Ovos Pmédio”), e um peso médio por ovo de 64,597028 (coluna “Pm”) – cfr. Doc n.º 5 junto com a p.i., de fls. 114 a 118 do processo físico.
22. Por referência ao cálculo do peso médio dos ovos adquiridos pela Impugnante no ano de 2010 ao fornecedor “[SCom02...], Lda.” identificado, a aqui Impugnante dispõe de quadro/tabela elaborado em programa Word/Excel, onde fez constar, entre o demais, a descrição por artigo, a quantidade no documento, os subtotais, o total faturação de dúzias, os kilos, e o peso médio dos ovos, constando no final um total de kilos de 231.020,00 (coluna “Kilos”), um peso médio por ovo de 67,370 (coluna “Pm”), o que dividido por 1000 kg, corresponde a 14,8 ovos e um peso médio no centro de classificação de 64,09 (coluna Peso Classificação), o que dividido por 1000 kg, corresponde a 15,6 ovos – cfr. Doc n.º 6 junto com a p.i., de fls. 119 a 119 verso do processo físico.
23. Nos termos em que se mostra aposto nas faturas emitidas à Impugnante pela sociedade “[SCom02...], Lda.”, no ano de 2010, as quantidades vendidas, sob a designação “Ovos a Granel (Para Classf.)” têm como unidade “Kg”, não fazendo qualquer referência a embalagens ou unidades de ovos – cfr. faturas juntas pela Impugnante na p.i., de fls. 45 a 92 do processo físico.
24. Nos termos em que se mostra aposto na guia de remessa n.º 2010008 de 09/01/2010, referente à fatura n.º 2010008 de fls. 45 verso do processo físico, dirigida à Impugnante e emitida pela sociedade “[SCom02...], Lda.”, as quantidades remetidas de ovos, têm como unidade “Duz” (dúzia), não fazendo qualquer referência a embalagens ou Kgs de ovos – cfr. guia de remessa, de fls. 169 do processo físico.
25. A Impugnante no âmbito da sua atividade de produção e aquisição a fornecedores de ovos, antes da sua venda, faz passar todos os ovos, pelo denominado “Centro de classificação”, que consiste na passagem dos ovos por uma máquina que, de forma automática, os classifica de acordo com as classificações “M, L e XL”, e que faz a triagem dos que se mostram quebrados e/ou com duas gemas - cfr. prova testemunhal (depoimento da testemunha da Impugnante).
26. Antes da triagem efetuada no “Centro de Classificação” é efetuada uma triagem pelos funcionários na atividade de produção, sendo que os ovos quebrados já não dão entrada naquele centro - cfr. prova testemunhal (depoimento da testemunha da Impugnante).
27. A triagem efetuada no “Centro de Classificação” dos ovos quebrados ou impróprios para venda, é descrita em mapa elaborado pela Impugnante em Excel, onde é registado o seu número, e registado na contabilidade como “quebras” - cfr. prova testemunhal (depoimento da testemunha da Impugnante).
28. Os ovos adquiridos via produção e via fornecedores, são vendidos pela Impugnante maioritariamente, à dúzia, vendendo ao peso/kilo quando vende para a indústria, que normalmente são os ovos de dimensão menor - cfr. prova testemunhal (depoimento da testemunha da Impugnante).
29. Os ovos adquiridos a fornecedores ao peso/kilo, tanto podem depois ser vendidos pela Impugnante à dúzia como ao peso/kilo, uma vez que todos passam pela triagem no centro de classificação - cfr. prova testemunhal (depoimento da testemunha da Impugnante).
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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão.
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Motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto dada como assente relevante para a decisão da causa, resultou da análise conjugada da prova documental constante dos autos, bem como da prova testemunhal produzida em sede de audiência de inquirição de testemunhas, baseando-se essencialmente numa livre apreciação (cf. artigos 396.º do Código Civil e 607.º, n.º 5 do Código do Processo Civil), conforme discriminado nos vários pontos do probatório.
No que respeita à prova documental, teve-se em consideração os documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo apenso, relevantes para a decisão, que não foram impugnados.
No que respeita ao relatório de inspeção tributária, coligido no ponto 5) do acervo factual, constituindo documento autêntico (cfr. artigo 371.º, n.º 1 do Código Civil) uma vez que é exarado por funcionário da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito e exercício das respetivas funções, apenas tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira ou com base na perceção dos seus órgãos e que pode ser ilidida nos termos da lei, sendo que, no entanto, os juízos conclusivos aí considerados só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do Tribunal, segundo a sua prudente convicção, atenta a análise crítica e conjugada de todos os meios de prova (cfr. artigo 76.º, n.º 1 da LGT e artigos 363º e ss. do Código Civil e 607.º, n.º 5 do Código do Processo Civil).
Quanto aos documentos e seu teor a que se alude nos factos assentes em 14) a 16) e 21) a 24) do acervo factual, tratam-se de documentos particulares cuja força probatória se circunscreve às declarações de ciência ou de vontade que deles constam como feitas pelo seu subscritor, não fazendo prova plena dos factos nele narrados como efetivamente praticados pelo seu autor ou como objeto da sua perceção direta, sujeitos como tal a valoração pelo Tribunal na sua livre apreciação, numa análise crítica e conjugada da demais prova produzida.
Na apreciação do depoimento das testemunhas arroladas pelas partes, tendo o tribunal as valorado na sua livre apreciação (cf. artigos 396.º do Código Civil e 607.º, n.º 5 do Código do Processo Civil), jamais se perdeu de vista um critério objetivo que permitiu aferir do rigor da narração dos factos, da razão de ciência e das qualidades de isenção e convicção denotadas.
Especificando,
No que respeita à testemunha apresentada pela Impugnante,
«BB», Revisor Oficial de Contas da Impugnante desde os anos noventa, foi de igual modo o perito da Impugnante designado no pedido de revisão da matéria coletável.
Questionado à matéria de facto constante dos artigos 13, 24, 25, 27, 28, 29, 30, 39, 40, 42, 44, 46, 51, 52, 53, 54, 56, 57, 58, 60, 61, 62, 64, 77, 78, 81, 86, 89, 99, 100, 102, 103, 109, 113, 114, 115, 116, 126, 128, 129, 130, 132, 157, 158, 173, 174, 175, 176, 182, 183, 185, 186, 187, 188, 189, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 204, 205, 208, 209, 210, 211 e 212, da p.i., prestou um depoimento claro e espontâneo, mostrando ter conhecimento direto da atividade da Impugnante, contribuindo para a convicção, com segurança, porque não se viu razões para duvidar, em conjugação com a demais prova produzida, dos factos assentes de 25) a 29) do acervo factual.
No demais do seu depoimento, apesar de claro e assertivo, consistiu na explicação da tese da Impugnante de que os cálculos dos Serviços de Inspeção Tributária, por relação ao número de ovos por quilo se encontra errónea, sustentando e explicando porque considera os cálculos fornecidos pela Impugnante, que juntou como Doc. n.º 5 da p.i., fornecem uma média mais ponderada e correta, bem como ainda sustentou e explicou em que medida a inclusão das embalagens no peso dos ovos de um dos fornecedores influencia tais cálculos, o que, por não se tratar de qualquer factualidade mas outrossim juízos explicativos e opinativos, não extraiu o tribunal dessa parte qualquer facto a dar por assente pertinente para a decisão.
No que respeita às testemunhas apresentadas pela Impugnada,
«CC», Inspetor Tributário em exercício de funções na Direção de Finanças ..., procedeu à ação inspetiva dirigida à atividade da Impugnante e foi o subscritor do relatório de inspeção Tributária fundamentador da liquidação de IRC controvertida.
Corroborou com declarações espontâneas e coerentes a factualidade e realidade por si apurada nas diligências que efetuou junto da Impugnante, explicando o teor dos anexos ao relatório e todos os cálculos por si efetuados constantes do relatório, não tendo, no entanto, acrescentado nada mais ao que deixou vertido no relatório coligido em 5) do acervo.
«DD», Inspetora Tributária desde 1995, exerce funções de Chefe Adjunta desde outubro de 2018 no Serviço de Finanças ....
Participou como perita designada pela Administração Tributária no procedimento de revisão da matéria coletável após o despacho de revogação do Diretor de Finanças ... do acordo antes efetuado pelos peritos designados.
Não obstante ter prestado um depoimento claro, apenas esclareceu a razão porque não teve necessidade de se deslocar às instalações da Impugnante e explicou, fundando-se no geral na falta de demonstração pela Impugnante, porque não considerou os argumentos aduzidos pela Impugnante no pedido de revisão da matéria coletável, não tendo, no entanto, acrescentado nada mais à sua posição vertida, enquanto perita designada pela Administração Tributária, na ata da reunião coligida em 12) do acervo factual.»
2.1.2. Aditamento oficioso
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC adita-se a seguinte matéria de facto:
30. No âmbito do procedimento de revisão da matéria coletável, os peritos nomeados pela Administração Tributária e pela Impugnante reuniram na data de 16.01...., tendo ficado constado em acta elaborada para o efeito com o n.º 02/... –A(A-D), que se mostra assinada pelos dois peritos, e da qual consta:
«1. Aberta a reunião os peritos debruçaram-se sobre o relatório da inspecção bem como o conteúdo da reclamação Interposta pela reclamante, apresentando as suas posições relativas mente a ambos.
2.O perito nomeado pelo sujeito passivo, reiterou que não existia justificação para a aplicação por métodos indirectos, em virtude de as divergências detectadas no decurso da acção de inspecção são irrelevantes face ao volume de negócios do sujeito passivo, e tendo em consideração o tipo de produto comercializado pelo sujeito passivo, as divergências apuradas seriam justificadas pelas quebras normais.
3. No entanto acrescentou que no relatório de inspecção foram cometidos erros, que tiveram influência no apuramento das divergências apresentadas, nomeadamente:
3.1. O critério utilizado pelo ínspector para determinação do valor médio de ovos por quilograma, para determinação da quantidade de ovos vendidos ao peso, não têm aderência à realidade da empresa, porquanto:
3.1.1. Foram considerados os ovos adquiridos ao peso ao fornecedor "[SCom02...]”, sem ter em consideração que no peso indicado nas facturas estavam consideradas as embalagens.
3.1.2. Apresentou declaração emitida pelo fornecedor a confirmar.
3.1.3. Apresentou para o efeito listagem (bem alguns relatórios a título de exemplo) com os dados (quantidades e pesos), retirados do centro de classificação e embalagem, relativos às aquisições efectuadas à “[SCom02...]", na qual apurou um peso médio por ovo de 63,87gr„ o que se traduz, numa média de 15,66 ovos por quilo.
3.1.4. O perito do s.p. acrescentou, que os ovos adquiridos ao fornecedor "[SCom02...]", não são os ovos vendidos ao peso para o cliente industrial, pois já são ovos em que foi feita uma pré-escolha e não incluem os ovos com dimensões inferiores á dimensão mínima para venda ao público, e que por norma são os que o sujeito passivo vende para a indústria, e nos quais a média é superior a 16 ovos por quilo.
3.1.5. Questionado pelo: facto de não apresentar dados relativos ao peso e classificação dos ovos vendidos à indústria o mesmo informou que não possuiu tais dados, pois os; ovos vendidos à indústria são processados no centro de classificação e embalagem, pois são acondicionados em embalagens (tabuleiros) especificas para o cliente.
3.2. Na recolha efectuada pelo inspector das quantidades produzidas, a partir dos mapas de produção, foi considerada a quantidade total, sem ter em consideração que nesse valor estavam incluídos e referenciados nos respectivos mapas os ovos partidos, e os ovos de duas gemas, os quais não são comercializados.
3.2.1. O perito do sujeito passivo apresentou relação de todos os ovos indevidamente considerados no relatório de ínspecção, bem como cópia de alguns mapas a título de exemplo.
3.3. Não foi considerado qualquer valor para as quebras que ocorrem no transporte e armazenamento dos ovos, e que são normais.
4 - Por forma a analisar e validar a informação apresentada pelo perito do sujeito passivo, propôs-se a que a presente reunião prossiga no próximo dia 25/01/..., peias 9:30, data em que o perito do sujeito passivo apresentará igualmente cópia dos restantes documentos que serviram de base aos mapas apresentados e referenciados em 3.1.3 e 3.2.1.»
- cfr. Docs. n.º de fls. 130 a 131 do processo físico.
31. No âmbito do procedimento de revisão da matéria coletável, os peritos nomeados pela Administração Tributária e pela Impugnante reuniram na data de 25.01...., tendo ficado comportado em acta elaborada para o efeito com o n.º 02/... – B, que se mostra assinada pelos dois peritos, e da qual consta:
«1. No seguimento da reunião anterior, o perito do sujeito passivo apresentou cópia dos restantes documentos comprovativos das listagens apresentadas na reunião anterior.
2. Em virtude da quantidade de informação apresentada pelo perito do sujeito passivo, e por forma a analisar e validar a informação apresentada, propôs-se a que a presente reunião prossiga no próximo dia 4/02/..., pelas 9.30.»
- cfr. Docs. n.º de fls. 132 do processo físico.
32. No âmbito do procedimento de revisão da matéria coletável, os peritos nomeados pela Administração Tributária e pela Impugnante reuniram na data de 04.02...., tendo ficado constado em acta elaborada para o efeito com o n.º 02/... – C, que se mostra assinada pelos dois peritos, e da qual consta:
«1. No seguimento das reuniões anteriores, e após análise dos documentos apresentados pelo perito do sujeito passivo, foram colocadas algumas questões sobre os mesmos ao perito do sujeito passivo.
2. Na sequência das dúvidas colocadas pelo perito da Fazenda Pública, o perito do sujeito passivo propôs a realização de uma visita ás instalações do sujeito passivo, por forma à sua análise no local.
3. Desta forma agendou-se a visita às instalações do sujeito passivo, para o dia de hoje às 14:00, pelo que a presente reunião prosseguirá no próximo dia 8/02/..., eplas 14:30, após a realização da mesma.»
- cfr. Docs. n.º de fls. 134 do processo físico.
2.2. De direito
Inconformados com a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, vêm a Autoridade Tributária interpor recurso para este Tribunal daquela que julgou procedente a impugnação deduzida pela recorrida, por ter considerado «... que o despacho de revogação do acordo alcançado entre o perito designado pela Impugnante e o perito designado pela AT de que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária por métodos indiretos não se justificavam, é ilegal, por não caber assim no artigo 62.º, n.º 1 do CPPT, o que por enfermar tal despacho de vício de violação de lei, conduz, consequentemente, à anulação dos atos dele consequentes, incluindo a liquidação impugnada emitida em violação do acordo alcançado pelos peritos em sede do procedimento de revisão, nestes autos impugnada na parte relativa à correção por recurso a métodos indiretos».
Tanto quanto se apura das conclusões das respectivas alegações, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, são as seguintes as questões que a recorrente vem submeter à apreciação deste Tribunal ad quem:
(i) Da legalidade da revogação por despacho ao abrigo do preceituado no artigo 62º do CPPT do acordo dos peritos plasmado na Acta n.º02/...-D [item 10 do probatório] no âmbito do procedimento de revisão da matéria coletável, no qual se assentiu que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) por métodos indiretos não se justificavam;
(ii) Da verificação da falta de fundamentação da posição assumida pelo perito da AT no âmbito do referido acordo, enquanto pressupostos da legalidade do acto revogatório.
Vejamos da primeira questão, que passa pelo enquadramento legal, posições doutrinais e jurisprudências sobre a matéria.
2.2.1. Insurge-se a recorrente contra o julgamento efectuado pelo Tribunal a quo alegando desde logo à cabeça que “Incide o presente recurso sobre a sentença, que julgou procedente a presente impugnação judicial, por considerar ilegal o despacho que revogou o acordo alcançado pelos peritos em sede de procedimento de revisão da matéria coletável, no qual se assentiu que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) por métodos indiretos não se justificavam, entendendo o decisor que tal despacho (de anulação) não cabia no art.62.º, n.º1 do CPPT.
Cumpre desde logo, concretizar que em momento algum o Tribunal a quo afastou ipsis verbis a possibilidade de revogação do acordo firmado pelos peritos ao abrigo do artigo 62º do CPPT, o que o Tribunal num discurso amplamente fundamentado e preciso considerou foi que os fundamentos da revogação não se verificaram, o que é questão distinta, e que nos conduz única e exclusivamente a premência de dar resposta à segunda questão formulada, a da “falta de fundamentação do acordo” enquanto esta integra o pressuposto da revogação, qual seja, o de “violar manifestamente competências legais”.
Preparando a apreciação a operar contextualizamos a mesma de facto.
In casu a liquidação de IRC do ano de 2010, decorrente de procedimento inspectivo efectuado pelos Serviços de Inspeção Tributária que procedeu à avaliação da matéria tributável por métodos indiretos, sendo que desta fixação, a aqui recorrida apresentou pedido de revisão da matéria coletável, ao abrigo do estatuído no artigo 91.º da LGT (cfr. pontos 4) a 9) do probatório).
Em sede do respectivo procedimento de revisão da matéria coletável, após várias reuniões entre os peritos designados pela recorrida e pela AT, na sequência do analisado a todos os elementos constantes desse procedimento, incluindo a deslocação dos peritos às instalações da recorrida (cfr. pontos 31 a 33 aditados oficiosamente por este Tribunal ad quem, assim se densificando o teor daquelas reuniões expresso em acta), os peritos chegaram a acordo de que as correções efetuadas em sede de procedimento inspetivo não se justificavam, abrangendo a decisão de utilização de métodos indirectos pelos SIT por não reunião dos pressupostos para recurso a tal avaliação indiciária, nos termos em que deixaram exarado em acta da última reunião ocorrida em 08.02.... (cfr. ponto 10 do probatório).
E, em acto sucedâneo aquele acordo firmado, o Diretor de Finanças ..., em 22/02/..., proferiu despacho revogando o acordo alcançado entre os peritos no procedimento de revisão, com fundamento, ao abrigo do artigo 62.º do CPPT, em terem sido “manifestamente violadas competências legais”, determinando após notificação do sujeito passivo desse despacho, a reabertura do procedimento de revisão na fase imediatamente anterior ao acordo (cfr. item 11 do probatório).
Quid iuris?
A possibilidade de o sujeito passivo solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indiretos em requerimento fundamentado dirigido ao órgão da administração tributária da área do seu domicílio fiscal, a apresentar no prazo de trinta dias contados a partir da data da notificação da decisão, contendo a indicação do perito que o representa, conforme discorre do preceituado no artigo 91º n.º 1 da LGT (Lei Geral Tributária).
O perito designado pela Administração Tributária (AT) para intervir no procedimento de revisão, preferencialmente não deve ter tido qualquer intervenção anterior no procedimento (cfr. n.º 3 do artigo 91.º, da LGT), de forma a garantir a imparcialidade da intervenção da AT no procedimento.
Por sua vez, preceitua o artigo 92.º da LGT que, “1 - O procedimento de revisão da matéria coletável assenta num debate contraditório entre o perito indicado pelo contribuinte e o perito da administração tributária, com a participação do perito independente, quando houver, e visa o estabelecimento de um acordo, nos termos da lei, quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de liquidação.
2 - O procedimento é conduzido pelo perito da administração tributária e deve ser concluído no prazo 30 dias contado do seu início, dispondo o perito do contribuinte de direito de acesso a todos os elementos que tenham fundamentado o pedido de revisão.
3 - Havendo acordo entre os peritos nos termos da presente subsecção, o tributo será liquidado com base na matéria tributável acordada.
4 - O acordo deverá, em caso de alteração da matéria inicialmente fixada, fundamentar a nova matéria tributável encontrada.
5 - Em caso de acordo, a administração tributária não pode alterar a matéria tributável acordada, salvo em caso de trânsito em julgado de crime de fraude fiscal envolvendo os elementos que serviram de base à sua quantificação, considerando-se então suspenso o prazo de caducidade no período entre o acordo e a decisão judicial.
6 - Na falta de acordo no prazo estabelecido no n.º 2, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos. (…)”.
É explícito o artigo 92.º n.º 1, da LGT a determinar que o procedimento de revisão “assenta num debate contraditório (...) que visa o estabelecimento de um acordo, nos termos da lei, quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de tributação”, acordo esse em relação ao qual a administração tributária fica vinculada (n. 3). Estamos perante um procedimento de natureza auto-compositória e pericial, que com a eventual participação de um perito independente se torna numa mediação.
Temos por adquirido que a fixação da matéria tributável por métodos indirectos é subsidiária da avaliação directa (artigo 85.º LGT) e surge apenas em situações de patologia da relação jurídica tributária, em que é impossível a avaliação directa. Nesta situação pressupõe-se um litígio, uma divergência, mas ao mesmo tempo uma incerteza, incerteza essa que resulta cumulativamente das razões do recurso aos métodos indirectos e da congénita incerteza ínsita na aplicação destes métodos. Por isso, não é de estranhar a previsão normativa positiva de aplicação aos métodos indirectos das formas concertadas de actuação administrativa. Não é de estranhar que se fale em acordo, um acordo que é alcançado “nos termos da lei” e que vincula as partes (v. artigos 86.º n.º 4, 92.º n.º 4 LGT e 62.º CPPT).
Neste sentido, de que o acordo alcançado pela comissão de revisão tem carácter vinculante, mesmo quando o acordo alcançado seja meramente parcial, veja-se o acórdão do STA de 16.02.2002, proferido no âmbito do processo n.º 25959, cujo sumário aqui se deixa “I - O art.º 87º, n.º 2, do CPT, quando diz que, havendo acordo entre o vogal do contribuinte e o vogal da Fazenda Pública, o valor encontrado servirá de base à liquidação do imposto, tanto abrange o acordo total com o acordo parcial. II - Se esses vogais estiverem de acordo sobre uma verba, o director distrital de finanças deve respeitar esse acordo e não decidir como se esse acordo não existisse”.
A vinculatividade do acordo alcançado em sede de revisão tributária resulta do disposto no artigo 92.º n.º 3 e 5 da LGT, segundo o qual a administração só excepcionalmente [artigo 92.º n. 5 LGT e artigo 62.º n.º 1 in fine e 2 CPPT] poderá tributar com base em matéria tributável diferente da acordada. Por outro lado, não poderá em princípio o contribuinte impugnar a fixação por acordo, salvo raros casos.
Mas centrando o nosso discurso, ao caso em apreço, atentemos ao artigo 62º do CPPT mencionado.
Efectivamente dispõe o n.º 1 do artigo 62.º do CPPT, que “[e]m caso de a fixação ou a revisão da matéria tributável dever ter lugar por procedimento próprio, a liquidação efetua-se de acordo com a decisão do referido procedimento, salvo em caso de esta violar manifestamente competências legais”, sendo que, e como dispõe o n.º 2, “[a] declaração da violação das referidas competências legais pode ser requerida pelo contribuinte ou efetuada pela administração tributária, sendo neste caso obrigatoriamente notificada ao contribuinte no prazo máximo de 15 dias após o termo do procedimento referido no número anterior.”.
E, aderindo às menções sobre o mesmo pelo Tribunal a quo, aqui deixamos o ali explanado:
«Decorre então que este preceito, que abrange o caso da fixação da matéria tributável por métodos indiretos cuja revisão está sujeita ao regime específico dos artigos 91.º e seguintes da LGT, estabelece uma limitação ao dever da AT de efetuar a liquidação com base no acordo alcançado no procedimento de revisão, quando o mesmo violar “manifestamente competências legais”, permitindo à AT a anulação administrativa da deliberação da comissão de revisão com fundamento em manifesta violação de competências legais.
Sobre o alcance de violação manifesta de “competências legais”, e recorrendo aos ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa, o mesmo abrange “[o]s casos que se têm em vista, em face do teor literal deste artigo, serão, pelo menos, aqueles, em que se detectar uma violação evidente das regras procedimentais relativas à competência das entidades que devem intervir no procedimento de revisão”, bem como face ao “plural utilizado (<<competências>>) parece deixar entrever que não se tiveram presentes apenas os casos de incompetência em sentido estrito, mas se pretenderá também e principalmente aludir aos casos em que a comissão de avaliação ou revisão não se contêm dentro dos limites legalmente fixados” [in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª edição, 2011, Vol. I, p. 577].
Na senda do entendimento de alguma doutrina, “a aplicação do mecanismo ao artigo 62.º do CPPT impõe igualmente a fundamentação do acordo: caso não tenha sido fundamentado não é possível avaliar se foram respeitadas as competências legais dos peritos do contribuinte e da Fazenda Pública. Não deve, pois, ser confirmado o acordo não fundamentado. A confirmação, não abrange, no entanto, os critérios técnicos seguidos no acordo, dada a independência técnica garantida pela presente lei à atuação do perito da Fazenda Pública” [cfr. António Lima Guerreiro, in Lei Geral Tributária Anotada. Editora Rei dos Livros, p. 396].
Isto porque, “Valerá o princípio da legalidade (e não da arbitrariedade) e é em obediência à Lei que deve ser determinada a matéria tributável. Assim, não se pretende um mero acordo das partes, mas um acordo “nos termos da lei”, como está expresso no n.º 1 deste artigo 92.º. Esta é uma das razões que exigem a fundamentação da decisão, ainda que haja acordo, para que possa aferir-se se tal ajuste está enquadrado legalmente. - cfr. José Maria Fernandes Pires, Gonçalo Bulcão e outros, in Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, Almedina, 2015, p. 969.
Já outra parte da doutrina entende que “[a] falta de fundamentação [do acordo] não é razão para a administração tributária não aceitar o valor acordado, mas poderá diligenciar que esta diligencie no sentido de ser sanada a deficiência. (…) A falta de fundamentação, no entanto, poderá constituir fundamento de impugnação por parte do sujeito passivo, já que consubstancia uma ilegalidade suscetível de conduzir à sua anulação- cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária Anotada e comentada, Encontro da Escrita, 4ª edição, 2012, em anotação ao artigo 92.º, p. 814.
De qualquer forma, mesmo que se considere ser a falta de fundamentação do acordo motivo para avaliar se foram respeitadas as competências legais dos peritos, não pode, no entanto, “o diretor de finanças afastar o acordo alcançado, por mera discordância (ainda que fundamentada) quanto aos resultados propostos. Há independência técnica do perito nomeado pela administração tributária. Independência que deve ser respeitada. Apenas nos casos em que, manifesta e comprovadamente, a matéria tributável acordada não foi quantificada dentro do quadro legal (de forma grosseira, diríamos), não se procederá à liquidação baseada na matéria tributável assente pelos peritos” [cfr. José Maria Fernandes Pires e outros, in Op. Cit., p. 970].
Com efeito, a liquidação apenas se pode afastar do acordo alcançado pelos peritos nos casos de desvio grosseiro do quadro legal, onde comprovada e manifestamente o acordo não se alcançou pelo respeito da lei, ou seja, das competências que são atribuídas, sendo então seguro que “se a decisão procedimental for proferida pelas entidades competentes e estas atuarem no âmbito dos poderes que a lei lhes confere, não pode deixar-se de efectuar-se a liquidação com base no valor determinado no procedimento, não podendo, designadamente, deixar-se de a efectuar com base num juízo de censura quanto ao mérito da decisão de fixação” [cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Op. Cit, pp.577-578].» (fim de transcrição)

Volvendo aos autos, mais concretamente ao vertido no item 11 do probatório perante o acordo firmado entre o perito do contribuinte e perito da AT de que não se verificavam os pressupostos do recurso aos métodos indirectos (item 10 do probatório), entendeu o Diretor de Finanças ..., que a lei, no n.º 4 do artigo 92.º da LGT, estabelece a exigência da fundamentação do acordo no caso do mesmo ter determinado a alteração do valor da matéria tributável inicialmente apurada, entendendo que o acordo em causa não cumpriu as exigências de fundamentação que a situação determina, porquanto ressalta a mera aderência do perito da AT ao invocado pelo perito do contribuinte não espelhando o porquê da mesma, apreendendo que este apenas se apoia nos elementos carreados pelo perito do sujeito passivo que, no seu entendimento, e ali explicando, “não podem ser aceites como elementos de prova susceptíveis de infirmar as correcções em apreço”, entendendo que se exigia “a demonstração do porquê da justificação das divergências detectadas, assim como, a razão de ser da adesão do perito da fazenda pública aos factos e documentos apresentados pelo perito do sujeito passivo, o que não sucedeu (nem tão pouco se verifica a existência de qualquer teste, qualquer amostragem realizada pelo perito da fazenda pública que vá de encontro, ou que confirme, os elementos apresentados pelo contribuinte)”, concluindo “que a explicação tanto do perito da Administração Fiscal como do contribuinte (ver articulados n.ºs 9 a 12 do presente despacho), não esclarece cabalmente a motivação de facto e de direito que deu origem a tal acordo, considerando-se assim, este acto não fundamentado.”, ao que “Tratando-se de uma situação de manifesta violação de lei, por falta de fundamentação, conclui-se que a Administração Fiscal pode anular administrativamente a deliberação da Comissão de Revisão, com fundamento em ilegalidade.”.
E, prosseguindo, em sede de apreciação concreta do despacho proferido pelo Director de Serviço de Finanças ..., o Tribunal a quo aceita, que na senda de algumas das considerações doutrinais retratadas, a aceitar-se que a falta de fundamentação do acordo pode estar na base da aferição do respeito pelas competências legais dos peritos, a fim de verificar a sua manifesta violação, para que a liquidação não se efectue de acordo com a decisão do procedimento, como pressupõe o artigo 62.º do CPPT, cumpre então aferir se a fundamentação externada do acordo dos peritos que sancionou o não preenchimento dos pressupostos do recurso aos métodos indiretos se mostra suficiente ou não do dever legal de fundamentação da matéria coletável obtida, consubstanciando assim ou não uma evidência de uma manifesta violação de competências legais dos peritos.
2.2.2. Aliás o que vai de encontro com a segunda questão por nós equacionada a constituir objecto desta apelação.
Sobre a questão a sentença sob recurso tem o seguinte teor:
«Cumpre primeiro referir que, a AT, no relatório de inspeção tributária coligido em 5), como preenchimento dos pressupostos do recurso à avaliação indireta ancorou-se essencialmente na divergência nas vendas de ovos declaradas e apuradas suportada em testes de apuramento dos ovos produzidos e adquiridos e faturados, tendo por base a totalidade dos mapas de produção de ovos dos aviários explorados pela Impugnante, as faturas de compras dos ovos adquiridos a fornecedores e as faturas de vendas, tendo a AT concluído que por os resultados desses testes terem demonstrado a existência de factos identificados em como a Impugnante não declarava a venda de todos os ovos, mostrando-se, na sua ótica, patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada, e como tal ficava assim, nos termos da alínea d) do artigo 88.º da LGT, comprovada a impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável.
No cálculo dos ovos adquiridos, nos seus testes, a AT essencialmente suportou-se em apurar as unidades de ovos que vinham quantificados a peso nas faturas dos fornecedores, tendo chegado ao apuramento de um quilo de ovos corresponde a 15 ovos, sendo aqui o grande ponto de discórdia da Impugnante, por ter sido o teste de apuramento que levou ao apuramento de diferenças entre os ovos adquiridos e os ovos faturados, acrescendo a divergência nas quebras de ovos que a AT teve em consideração.
Tendo presente os pressupostos de recurso à matéria tributável, adianta-se desde já que, em nosso entender, a fundamentação constante do acordo é clara e suficiente.
Desde logo, depois de apresentados todos os fundamentos do perito da Impugnante, baseado em documentação analisada pelos dois peritos e junta naquele procedimento, o perito da AT justifica, mostrando-se suficiente que, “da análise efectuada aos elementos apresentados pelo perito do sujeito passivo, bem como das observações aquando da visita efectuada às instalações do sujeito passivo, não encontra motivos que contrariem os factos e documentos apresentados sujeito passivo e seu perito, pelo que deste modo os considera relevantes para a justificação das divergências detectadas”, o que emerge claro que o perito da AT não encontrou motivos para contrariar os elementos apresentados pelo Impugnante, (i) de que um quilo de ovos correspondia a 16 ovos e não a 15 como calculado pelos SIT o que acarreta, como ali se diz, que a divergência apurada seria reduzida em 494.723 ovos, ou seja, em 65% da mesma, e (ii) elementos dos valores de ovos indevidamente considerados no relatório, o que acarreta, como ali se diz, que reduz a divergência encontrada em 2115.506 ovos, ou seja, 29% da mesma, revelando então, por remissão, a plena concordância com toda a argumentação e documentação apresentada pelo perito da Impugnante, e como descreve, após análise efetuada a todos os elementos e observações aquando da visita efetuada às instalações da Impugnante, sendo que todos esses elementos, como se constata da ata coligida em 10) do acervo se referem aos elementos tidos em conta que o perito da Impugnante contrariou nos ditos testes de determinação do valor médio de ovos por quilograma, para determinação dos ovos produzidos, adquiridos e vendidos, ficando reduzida a divergência a 6%, porque justificada pelo perito do contribuinte os outros 94%, a que ainda acrescia não ter sido considerada pelos SIT, as naturais quebras que ocorrem no transporte e armazenamento dos ovos.
Constata-se então que a fundamentação externada se mostra clara, contextual e suficiente, mostrando o itinerário cognitivo e valorativo seguido pelos peritos, num juízo lógico de ponderação factual, sendo que não existe qualquer obstáculo legal a que o perito da AT utilize os mesmos fundamentos que o perito do contribuinte, por remissão, aliás por essa razão é que chegaram a acordo, significando então que o perito da AT entendeu que os mesmos eram adequados ao caso concreto, não resultando, no seu entender, quaisquer razões de facto e de direito para dos mesmos divergir ou contrariar, como expressamente o refere, daí a sua aderência, e note-se, tendo em consideração todos os documentos/elementos apresentados pelo perito da Impugnante e a sua observação da sua atividade.
Com efeito, e referindo-se o acordo aos pressupostos do recurso a métodos indiretos que como vimos consistiu essencialmente na utilização de critério utilizado pelo inspetor para determinação do valor médio de ovos por quilograma, para determinação da quantidade de ovos vendidos ao peso, ali foi concluído que os mesmos não têm aderência à realidade da empresa, bem como se considerou demonstrado a consideração indevida de ovos pelos SIT e demonstrado quebras que os SIT não haviam considerado, o que reduzindo-se a divergência praticamente na totalidade, concluíram que os pressupostos de recurso à avaliação indireta, inexistiam, tanto mais que outros factos ou elementos não foram apurados.
Percebe-se, assim, que os peritos se basearam em vários elementos documentais fornecidos pelo perito da Impugnante que contrariaram os cálculos de alegadas omissões de vendas de ovos apuradas pelos SIT, que, não obstante poder ser discutível, não restam dúvidas de que os peritos explicaram com clareza o modo como chegaram à conclusão de que não se reuniam os pressupostos de recurso a métodos indiretos.
Temos então de aceitar que esta fundamentação é suficiente para se aferir das razões que se consideraram justificativas do acordo obtido entre a administração e o contribuinte, bem percetível então o iter cognoscitivo do acordo, o que bem se denota percetível, aliás pelo Diretor de Finanças no seu despacho de revogação daquele acordo.
E pela fundamentação externada no acordo que se mostra suficiente, não alcançamos nem aliás se retira da decisão do Diretor, qualquer manifesta violação das competências legais dos peritos.
Aliás, lida e relida a decisão do diretor de finanças, o mesmo em boa verdade, colocou em causa tão só e apenas a não aceitação dos elementos de prova apresentados pelo perito da Impugnante, constatando-se uma discordância (ainda que fundamentada) quanto ao acordo, quanto aos critérios técnicos seguidos no acordo.» (fim de transcrição; destacados nossa autoria)
Acompanha-se integralmente o assim decidido.
Mais se diga, em jeito de complemento, que a tomada de posição do perito da administração não pode ser interpretada e/ou alcançada desgarrada do procedimento de revisão e dos actos que o integram, nomeadamente de toda a documentação e prova considerada, das reuniões tidas, as quais ficaram plasmadas nas respectivas actas, cujos extractos insertos nos itens 31 a 33 do probatório demonstram que o perito da administração por duas vezes pediu tempo, para por forma a analisar e validar a informação apresentada pelo sujeito passivo, tendo na sequência da mesma colocado dúvidas ao perito do sujeito passivo, cuja melhor oportunidade de resposta levou os mesmos a uma deslocação ao local. O que nos permite concluir que o firmado pelo perito da administração no acordo, o foi depois de solvidas todas as suas dúvidas, aliás o que discorre do seu próprio texto de que “da análise efectuada aos elementos apresentados pelo perito do sujeito passivo, bem como das observações aquando da visita efectuada às instalações do sujeito passivo, não encontra motivos que contrariem os factos e documentos apresentados sujeito passivo e seu perito, pelo que deste modo os considera relevantes para a justificação das divergências detectadas”.
Acresce, que existe uma independência técnica do perito nomeado pela AT, independência essa que tem que ser respeitada, não podendo a não confirmação do acordo abranger os critérios técnicos seguidos no acordo, dada a independência técnica garantida pela lei à atuação do perito da AT, sendo que apenas no caso em que o acordo manifestamente e comprovadamente não se conter de forma grosseira dentro do quadro legal, é que o acordo pode ser afastado pelo director de finanças, não se bastando com um mero juízo de censura quanto ao mérito do acordo alcançado.
Ora, como disso dá nota o Tribunal a quo actuação do director de Finanças ... afastou-se da simples constatação de uma “violação manifesta de competências legais” para embarcar num mero juízo de censura ao acordo estabelecido entre os peritos, encapotado numa falta de fundamentação, que formalmente não ocorre, pretendeu ele próprio sindicar o erro nos pressupostos do recurso a métodos indiretos, o que por se tratar de matéria técnica do perito da AT lhe estava vedado.
E, não podíamos estar mais de acordo com o julgado, quando invoca que perante uma eventual dúvida que assacasse o director perante o acordo firmado, o que não concebemos, sempre podia e devia o mesmo, ao invés de ter enveredado pela revogação do acordo atenta a invocada falta de fundamentação, preliminarmente diligenciar que os peritos diligenciassem pela sanação desse vício, como seja a sanação da fundamentação exigida pelo artigo 92.º, n.º 4 da LGT [neste sentido vide Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária Anotada e comentada, Encontro da Escrita, 4ª edição, 2012, em anotação ao artigo 92.º, p. 814]
É certo que será sempre pertinente, a referência ao princípio da indisponibilidade dos créditos tributários e ao princípio da legalidade que a recorrente aclama. Mas quanto ao primeiro, relembre-se apenas que os procedimentos de revisão surgem para se (re)fixar a matéria tributável que servirá de base à liquidação do imposto, não havendo ainda crédito tributário determinado de que se pudesse dispor. Por outro lado, já quanto ao princípio da legalidade, como qualquer princípio, deve ser articulado com respeito aos normativos inerentes ao procedimento de revisão e à imutabilidade decorrente do acordo firmado, conjugado com o artigo 62º do CPPT.
E, quanto a este, baseando-se a decisão do Diretor numa alegada falta de fundamentação do acordo, que formalmente como vimos não ocorre, e não demonstrando que ocorreu qualquer violação manifesta de competências legais, cumpre concluir que a sua actuação extravasa a limitação que o artigo 62.º do CPPT lhe facultava do dever que sobre si impedia de efectuar a liquidação com base no determinado no procedimento de avaliação pelos peritos.
«Com efeito, e como até aqui dito, a determinação legal pela qual a AT não pode alterar a matéria tributável acordada reporta-se diretamente à quantificação da matéria tributável, ao quantum da matéria tributável bem como quanto à decisão de utilização de métodos indiretos, sendo neste âmbito que não pode ocorrer qualquer revogação ou alteração posterior pela AT (nem de igual modo impugnação por parte do contribuinte, não podendo pois invocar-se qualquer erro na quantificação da matéria tributável ou erro nos pressupostos do recurso à matéria tributável), seja por os elementos utilizados não facultarem tal quantificação, seja por utilização inadequada ou incorreta dos elementos relevantes para cada caso (exceto se se verificar o disposto na parte final do n.º 5 do artigo 92.º da LGT).
Pois, “Apenas nos casos em que, manifesta e comprovadamente, a matéria tributável acordada não foi quantificada dentro do quadro legal (de forma grosseira, diríamos), não se procederá à liquidação baseada na matéria tributável assente pelos peritos” [cfr. José Maria Fernandes Pires e outros, in Op. Cit., p. 970].
Com efeito, a liquidação apenas se pode afastar do acordo alcançado pelos peritos nos casos de desvio grosseiro do quadro legal, onde comprovada e manifestamente o acordo não se alcançou pelo respeito da lei, sendo então seguro, e reiterando, que “se a decisão procedimental for proferida pelas entidades competentes e estas atuarem no âmbito dos poderes que a lei lhes confere, não pode deixar-se de efectuar-se a liquidação com base no valor determinado no procedimento, não podendo, designadamente, deixar-se de a efectuar com base num juízo de censura quanto ao mérito da decisão de fixação” [cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Op. Cit, pp.577-578].
Destarte, perante o exposto, há que concluir que o despacho de revogação do acordo alcançado entre o perito designado pela Impugnante e o perito designado pela AT de que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária por métodos indiretos não se justificavam, é ilegal, por não caber assim no artigo 62.º, n.º 1 do CPPT, o que por enfermar tal despacho de vício de violação de lei, conduz, consequentemente, à anulação dos atos dele consequentes, incluindo a liquidação impugnada emitida em violação do acordo alcançado pelos peritos em sede do procedimento de revisão, nestes autos impugnada na parte relativa à correção por recurso a métodos indiretos.» (extracto da sentença)
Como se antecipa de todo o exposto, acolhemos, integralmente, o discurso fundamentador da sentença sob recurso, pelo que, em consequência, cumpre manter a mesma na ordem jurídica nos seus exactos termos, negando-se provimento ao recurso.

2.3. Conclusões
I. O artigo 92º, n.º 3, da LGT, quando diz que, havendo acordo entre os peritos, o valor encontrado servirá de base à liquidação do imposto, conjugado com o n. º5 do mesmo preceito, que reafirma que “em caso de acordo, a administração tributária não pode alterar a matéria tributável acordada...”, determina que o director de finanças deve respeitar esse acordo e não decidir como se esse acordo não existisse e/ou contra ele.
II. Pelo que, da vinculatividade do acordo alcançado em sede de revisão tributária de que não se verificavam os pressupostos de aplicação dos métodos indirectos in casu, a administração só excepcionalmente [artigo 92.º n. 5 LGT e artigo 62.º n.º 1 in fine e 2 CPPT] poderá tributar com base em matéria tributável diferente da acordada.
III. O director de serviço que ao abrigo do artigo 62º n.º 1 in fine e 2 CPPT, revogou o acordo firmado pelos peritos assente em falta de fundamentação da posição do perito da AT incorre em vício de violação de lei, por aquele fundamento no caso concreto não se verificar e, como tal não ser reconduzível a uma “manifesta violação das competências legais do perito” a que alude o preceito.

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente.

Porto, 15 de maio de 2025

Irene Isabel das Neves
(Relatora)
Maira da Conceição Pereira Soares
(1.ª Adjunta/em substituição)
Paula Moura Teixeira
(2.ª Adjunta)