Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00334/18.8BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/24/2025
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA CONTRA O MUNICÍPIO DE ...;
TRABALHADORES PRECÁRIOS;
PREVPAP;
Sumário:
I - A Lei nº 112/2017, de 29 de dezembro, que estabelece os termos da regularização prevista no Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários de quem tenha exercido funções que correspondam a necessidades permanentes da Administração pública, de autarquias locais, sem vínculo adequado, com sujeição ao poder hierárquico, de disciplina ou direção e horário completo (art.º 1º, bem como art.º 25º da lei 42/2016), não impõe qualquer contratação aos municípios;

II - A Lei previu um Programa que podia ser usado, desde que se cumprissem vários requisitos, para abrir procedimentos concursais extraordinários;
II. 1 -E cabia sempre à entidade - aqui ao Réu/Município - decidir se existiam situações que se enquadravam nas disposições legais e, mesmo assim, se avançava ou não com o procedimento concursal;
II. 2 - A lei define e regula os termos em que o procedimento extraordinário pode ser feito;
II. 3 - E não pode olvidar-se que a avaliação das situações enquadráveis, ou não - sendo que a da Autora não era - na Lei ou no Programa, é uma avaliação de mérito, de oportunidade e política, de competência exclusiva da Autarquia;

III - Mas o que mais releva, como bem defendeu o Tribunal recorrido, é que a Autora/Recorrente não cumpria os requisitos legais para ser enquadrada no Programa; Aliás, a própria não fez qualquer prova que contrariasse essa realidade;
III. 1- Como ficou assente a Autora não podia integrar o âmbito de pessoas para ser abrangida pelo Programa, conforme dispõe o art.º 3º, nº 1, al. a) da Lei, porquanto não teve qualquer vínculo com o Município entre 01.01.2017 e 04.05.2017, mas sim com uma entidade terceira (empresa denominada Cineduca, Lda.);
III. 2 -Sucumbe a pretensão da Recorrente.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO

«AA» instaurou Acção Administrativa contra o MUNICÍPIO ..., ambos melhor identificados nos autos, peticionando que a acção seja declarada procedente, devendo, em consequência:
“a. Anular-se o ato impugnado;
b. Condenar-se a Câmara Municipal ... a, no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão da presente ação, proferir um ato administrativo que inclua a Autora na lista de trabalhadores precários;
c. e, em consequência disso, a abertura do respetivo procedimento concursal nos termos da lei 112/2017, de 29 de dezembro.”
O TAF de Penafiel julgou:
(i) procedente a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual e absolveu a Entidade Demandada da instância, relativamente ao pedido formulado em a);
(ii) improcedente a acção, e absolveu a Entidade Demandada dos pedidos formulados em b) e c).

Desta decisão vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
1. A decisão sub judicie resulta numa gritante injustiça para a A. e aqui Recorrente, que não vê como reconhecida a sua pretensão, uma vez que desde 2014 trabalha na Câmara Municipal ... (aliás, continua a fazê-lo passado cinco anos) e, apesar de ser uma necessidade constante daquele Município, continua com um vínculo precário, tendo diversos outros trabalhadores visto a sua situação regularizada.
2. A Entidade Demandada e aqui Recorrida refere que, tendo sido a deliberação publicitada por edital afixado nos termos legais no dia 30.01.2018, a Autora dispunha do prazo de 3 meses a contar dessa data para intentar a ação, o qual terminou no dia 9.05.2018, pelo que, quando a presente ação foi interposta, mostrava-se intempestiva.
3. O Tribunal a quo decide sobre a “intempestividade da prática do ato processual”, dizendo essencialmente que “o ato impugnado na acção administrativa está sujeito a publicação obrigatória, nos termos do disposto no artigo 56.°, n.º 1, do regime jurídico das autarquias locais, aprovado e publicado em anexo à Lei n.º 75/2013, de 12.09, que estabelece a obrigatoriedade da publicidade das deliberações dos órgãos autárquicos e das decisões dos respetivos titulares destinadas a ter eficácia externa, as quais eram objeto de publicação em edital afixado nos lugares de estilo durante cinco dos 10 dias subsequentes à tomada da deliberação ou decisão. Assim sendo, o prazo de impugnação para a Autora, que não era destinatária do ato em causa, mas “outros interessados” nesse ato, começava a correr a partir da data da publicação, por haver preceito expresso a estabelecer a obrigatoriedade dessa publicação, em conformidade com o previsto no artigo 59.º n.º 1 e 3, a contrario, do CPTA. Atento o facto de tal publicação ter ocorrido no dia em 30.01.2018, iniciando-se, por isso, a contagem do prazo de 3 meses para impugnação, verifica-se que o termo deste prazo ocorreu no dia 30.04.2018”.
4. Ora, salvo respeito por melhor e mais douta opinião, incorre em erro o Tribunal a quo.
5. "Nos termos do art.º 58.º, n.º 1, al. b) do CPTA, a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de três meses. A pretensão da A. deverá ser considerar tempestiva, uma vez interpôs reclamação e recurso hierárquico.
6. Com a revisão do CPA de 2015 e com a previsão constante do seu art.º 185º, a regra no nosso ordenamento jurídico é a de que as reclamações e os recursos hierárquicos são facultativos (o acesso à via judicial é imediatamente possível) por contraposição aos de natureza necessária (em que não é possível aceder-se à tutela judicial sem que previamente a Administração tenha-se pronunciado por uma última vez), prevendo-se no nº. 2, que só se a lei o denominar expressamente, é que assumirão esta última natureza, sendo aliás, esta solução esta preconizada pelo legislador mais consentânea com a tutela judicial efetiva.
7. Nos termos do nº. 3 do artigo 190º do CPA, a utilização de meios de impugnação administrativa facultativos contra atos administrativos suspende o prazo de propositura da ação judicial, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal.
8. Tal suspensão não impede o interessado de enveredar pela via contenciosa mesmo na pendência da impugnação administrativa, nos termos do n.º 4 do mesmo preceito legal.
9. Relativamente à reclamação prevê o artigo 191º, n.º 3 do CPA, que, quando a lei não estabeleça prazo diferente, a mesma deve ser apresentada no prazo de 15 dias úteis contados desde a notificação do ato.
10. Assim, tendo, mesmo a considerar que a Autora não teria de ser notificada do ato administrativo, tendo apresentado a reclamação em 01.02.2018, a mesma deve ser considerada tempestiva.
11. O mesmo juízo se terá que fazer em relação ao recurso hierárquico, sendo que, em relação a este, o prazo de interposição é de 90 dias (art.ºs 193º, n.º 2 do CPA e 58º, n.º 1. al. b) do CPTA), e também aqui, se verifica a tempestividade do mesmo, atendendo a que notificação do ato ocorreu em 28.02.2018 e o recurso hierárquico foi apresentado em 21.03.2018.
12. Concluímos, portanto, que a A. utilizou os dois meios graciosos tempestivamente.
13. Como já se evidenciou o prazo para propositura da ação judicial é de três meses, prazo que, com a revisão operada pelo Decreto-Lei nº. 214-G/2015, passou a contar-se nos termos do artigo 279º do Código Civil.
14. A contagem do prazo de três meses, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais, é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais. Quando o prazo abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138.º, números 1 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 58.º, número 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
15. O prazo foi interrompido após 2 dias (com a reclamação); em 01.03.2017, o prazo judicial retomou o seu curso vendo-se novamente suspenso pela apresentação do recurso hierárquico, em 21.03.2018; e tendo obtido resposta a 6.04.2018, voltou a correr.
16. O prazo judicial correu, até aquele dia 06.04.2018, um total de 22 dias.
17. O termo do prazo judicial ocorreria a 13.06.2018, tendo a ação dado entrada a 01.06.2018, pelo que aquando da instauração da presente ação, estava ainda a A. e Recorrente dentro do prazo legal para a impugnação do ato administrativo.
18. Assim, sendo, salvo o devido respeito, não se verifica a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual.
19. Independentemente disso, como conclui o Tribunal a quo, mesmo que se verificasse a exceção dilatória (que não é o caso), tal não levaria à absolvição da instância relativamente aos pedidos formulados em b) e c) do petitório, uma vez que naquelas alíneas a Recorrente peticiona o seguinte: “b. Condenar-se a Câmara Municipal ... a, no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão da presente ação, proferir um ato administrativo que inclua a Autora na lista de trabalhadores precários; c. e, em consequência disso, a abertura do respetivo procedimento concursal nos termos da lei 112/2017, de 29 de dezembro”.
20. Conforme entende o Tribunal a quo e foi sempre este o entendimento da Recorrente, “apenas com os referidos atos posteriores a Autora ficou a conhecer os fundamentos em que se baseou a Entidade Demandada para não incluir a Autora na lista dos postos de trabalhos a regularizar, pelo que não se pode concluir que esses atos sejam meramente confirmativos de ato anterior consolidado na ordem jurídica”.
21. Ora, no que concerne à pretensão da A., criticamente, entende o Tribunal a quo que não lhe assiste razão.
22. Esta, conforme se explanou na p.i., pretende ser inserida na lista de trabalhadores precários, uma vez que trabalha na Câmara, nas mesmas funções, desde 2014, sendo a sua função uma necessidade permanente.
23. Salvo o devido respeito, o problema que aqui temos é uma interpretação restritiva da portaria e da Lei, mas fundamentalmente dos seus objetivos.
24. O XXI Governo Constitucional, através da resolução 32/2017, do Conselho de Ministros, tomou como necessário a criação de um programa de regularização extraordinária dos vínculos precários, que resultou na lei 112/2017, de 29 de dezembro. A Recorrente pretende que lhe seja reconhecido o direito a ser aberto o respetivo procedimento concursal nos termos da lei 112/2017, de 29 de dezembro, isto é, ao abrigo do regime do PREVPAP (programa de regularização extraordinária dos vínculos precários na Administração Pública).
25. A A. alegou e demonstrou de forma documental que iniciou o seu trabalho na Câmara Municipal ... em 11 de novembro de 2014, através de um contrato para “aquisição de serviços colaboração técnica especializada – psicologia”, com duração de um ano.
26. E viu esse contrato de prestação de serviços renovado nos mesmos termos, com início no dia 28 de dezembro de 2015, pelo prazo de seis meses. Terminado este contrato, a Câmara Municipal ... fez uma aquisição de serviços para a Divisão de Administração Geral com a Empresa [SCom01...], serviços estes a serem prestados no prazo de prestação de serviços, entre o dia 12 de agosto de 2016 e 11 de fevereiro de 2017.
27. Este contrato de prestação de serviços exigiu a contratação, por parte da empresa, de uma profissional, uma vez que não possuía profissionais para colmatar aquela obrigação a que se obrigou... e contrataram a Autora e aqui Recorrente.
28. No próprio contrato, “a 1ª Outorgante contrata ao seu serviço a 2ª Outorgante para mediante as suas diretrizes e autoridade, desempenhar as funções de Técnica Superior na área funcional de Psicologia, funções estas que passam pela necessidade de proceder ao acompanhamento das crianças das EB1 do concelho de ..., em articulação direta com os agrupamentos de escolas, conforme protocolo assinado entres estes e o MUNICÍPIO ..., proceder ao acompanhamento de crianças sinalizadas pela CPCJ, proceder ao acompanhamento de Munícipes que o solicitem junto do Gabinete de Ação Social e dinamizar no ano letivo de 2016/2017 o projeto CRESC – LERL”,
29. ou seja, garantem à A. que continuaria a fazer as mesmas funções que já anteriormente fazia. E, como se não bastasse, limitam o seu vínculo à existência daquele contrato celebrado com a Câmara Municipal ....
30. Para além disso, após terminar aquele contrato com a Empresa, em virtude da verificação do seu termo, a A. continuou a trabalhar junto da Câmara Municipal, nas mesmas funções, com o mesmo horário, tendo para tanto celebrado um terceiro (!!!!) contrato de prestação de serviços.
31. O referido diploma refere que pessoas no período correspondente entre 1 de Janeiro e 4 de Maio de 2017, ou parte dele, e pelo menos durante um ano à data do início do procedimento concursal de regularização.
32. Ora, a Recorrente, aliás como reconhece a R., prestou funções naquele período na referida área funcional.
33. Contudo, no período até fevereiro de 2017 fê-lo indiretamente, através de uma “ficção” criada pela Câmara Municipal.
34. É aqui que colide com o entendimento da Recorrente com a Câmara Municipal, e com o Douto Tribunal.
35. Exmos. Juízes Desembargadores, se, por uma obra do acaso, o contrato celebrado com a Recorrente em maio de 2017 e com a Empresa trocassem a data, a A. passaria a estar abrangida por aquele programa, no que concerne ao disposto do artigo terceiro n.º 1, alínea a)...
36. A R. na contestação defendeu-se com três argumentos: 1) a Autora não cumpre o requisito exigido pelo art.º 2º, no 1, 1ª parte da Lei, conjugada com o n.º 3, da lei 112/2017, de 29 de dezembro, ou seja, a função da Autora não satisfaz necessidades permanentes do município, nem tal foi declarado pelo respetivo órgão executivo; 2) a Autora não integra o âmbito de pessoas para ser abrangida pelo Programa, conforme dispõe o art.º 3º, n.º 1, al. a) da referida Lei, porquanto não teve qualquer vínculo com o município entre 01.01.2017 e 04.05.2017, mas sim com uma entidade terceira (empresa denominada [SCom01...]). 3) afirma ainda que o vínculo jurídico que tem vindo a ser utilizado não é inadequado à prestação do serviço em causa, pois a sua execução pela Autora não está sujeita ao poder hierárquico, à disciplina ou direção do Réu.
37. A A. foi contratada, em 2014, para exercer serviços de colaboração técnica especializada – psicologia, tendo, no período compreendido entre agosto de 2016 e fevereiro de 2017, prestado os mesmos serviços, no mesmo local, para a mesma entidade, precisamente nos mesmos termos.
38. Não se pode concluir daqui, sem qualquer outra fundamentação, que a Recorrente não cumpre o requisito do artigo 3º, n.º 1, al. a) da Lei. De facto, o artigo 2º n.º 1 daquela Lei diz o seguinte: a presente lei abrange as pessoas que exerçam ou tenham exercido funções que correspondam ao conteúdo funcional de carreiras gerais ou especiais e que satisfaçam necessidades permanentes dos órgãos ou serviços abrangidos pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, e alterada pelas Leis n.os 84/2015, de 7 de agosto, 18/2016, de 20 de junho, 42/2016, de 28 de dezembro, 25/2017, de 30 de maio, 70/2017, de 14 de agosto, e 73/2017, de 16 de agosto, bem como de instituições de ensino superior públicas de natureza fundacional, de entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo e de entidades do setor empresarial do Estado ou do setor empresarial local, cujas relações laborais são abrangidas, ainda que em parte, pelo Código do Trabalho, com sujeição ao poder hierárquico, à disciplina ou direção desses órgãos, serviços ou entidades, sem vínculo jurídico adequado.
39. Salvo respeito por melhor e mais douta opinião, em nenhum momento é definido que tipo de vínculo jurídico precisaria de existir durante o período referido no artigo 3 n.º 1, alínea a).
40. O que a lei refere é que tem de existir uma necessidade permanente, cujos trabalhadores não possuam um vínculo adequado, não referendo a norma que esse vínculo tem de ser direto.
41. Precisamos de atentar ao objetivo desta lei para podermos ajuizar da justeza desta alegação:

42. O artigo 25, n.º 1, da Lei n.º 42/2016, de 28/12 (aprovou a Lei do Orçamento do Estado para 2017), veio prever que, “no âmbito da estratégia de combate à precariedade (...) o Governo apresenta à Assembleia da República até ao final do primeiro trimestre de 2017 um programa de regularização extraordinária dos vínculos precários na Administração Pública para as situações do pessoal que desempenhe funções que correspondam a necessidades permanentes dos serviços, com sujeição ao poder hierárquico, de disciplina ou direção e horário completo, sem o adequado vínculo jurídico”.
43. E, nessa sequência, resolveu que são abrangidos pelo PREVPAP todos os casos relativos a postos de trabalho que, não abrangendo carreiras com regime especial, correspondam a necessidades permanentes dos serviços de administração direta, central ou desconcentrada e da administração indireta do Estado, incluindo o setor empresarial do Estado, sem o adequado vínculo jurídico, desde que se verifiquem alguns indícios de laboralidade previstos no artigo 12º do Código do Trabalho.
44. O Tribunal a quo entende que “para determinar a natureza e o conteúdo das relações estabelecidas entre as partes de um contrato, há que averiguar qual a vontade por ambas revelada – quer quando procederam à sua qualificação, quer quando definiram as circunstâncias em que se exerceria a atividade – e proceder à análise do condicionalismo factual em que, em concreto, se desenvolveu o exercício da atividade no âmbito daquela relação jurídica. Aqui chegados, temos que, porém, no caso concreto, não resulta do probatório que entre a Autora e o Réu foi estabelecida uma verdadeira e própria relação de trabalho subordinado. Com efeito, da factualidade assente não se descortinam elementos que permitam concluir, que esta se encontrou sujeita – muito menos no período temporal relevante - à direção e disciplina do Réu e, bem assim, que se mostrou inserida na sua estrutura hierárquica, em termos tais que revelem a existência de subordinação jurídica na relação de trabalho entre ambos estabelecida”.
45. Chegados aqui, não podemos discordar mais do alegado pelo Douto Tribunal. De facto, conforme se disse, durante todo o período, a Recorrente realizava a sua atividade em local pertencente à Câmara e por esta determinado (al. a)); os equipamentos e instrumentos pertencem à Câmara Municipal (al. b)); a Autora cumpria um horário definido pela Câmara (al. c)); a Autora era paga com periocidade mensal (al. d)), seja antes de janeiro de 2017, seja após janeiro de 2017, sendo que nesse período (janeiro e fevereiro de 2017) havia uma entidade terceira, sendo que em nada se alterava a relação jurídica.
46. Ora, verifiquem alguns indícios de laboralidade previstos no artigo 12º do Código do Trabalho.
47. O artigo 12 do Código do Trabalho estabelece uma presunção de laboralidade, presumindo a existência do contrato de trabalho desde que se verifiquem algumas das circunstâncias – e bastam duas – elencadas no n.º 1, do artigo 12º, do Código de Trabalho.
48. Presunção em benefício exclusivo do trabalhador, uma vez que, quem tem a seu favor a presunção legal, escusa de provar o facto a que ela conduz, por força do estatuído no nº 1 do art. 350º, do Código Civil.
49. Ora, a A. alegou e a R. não nega que realizava a sua atividade em local pertencente à Câmara e por esta determinado (al. a)); os equipamentos e instrumentos pertencem à Câmara Municipal (al. b)), estando, pois, reunidos os requisitos necessários para a Recorrente se valer da presunção.
50. Resta, pois, a questão alegada pela Recorrente de o contrato de trabalho a termo celebrado entre si e a “[SCom01...]” ser uma ficção que a Câmara Municipal ... usou para contratar a Autora.
51. Relativamente a esta parte fundamental, o Tribunal a quo diz-nos que “a Autora, nesse concreto período temporal (entre 12.08.2016 até 24.05.2017) não foi interveniente de contrato (de trabalho ou prestação de serviços) com a Entidade Demandada.
52. E conclui, dizendo que “a relação, aqui em causa, e a que a Autora se agarra para sustentar a sua pretensão, não foi estabelecida entre ela e a Entidade Demandada, mas antes entre a empresa, para a qual passou a trabalhar, o que só por si faz soçobrar a sua pretensão”.
53. Nunca a A. referiu que era parte do contrato entre a [SCom01...] e a Entidade Demandada.
54. A A. alega, contudo, que a Câmara Municipal nunca teve intenção de deixar de receber o trabalho prestado pela Recorrente nem a dispensar, tanto é que convidou uma entidade terceira para contratar a trabalhadora, continuando a ser beneficiária do seu trabalho, apesar de ter não ter um vínculo direto.
55. E, quando terminou aquele contrato de aquisição, contratou, mais uma vez a Recorrente através de um contrato semelhante aos primeiros... aliás, ainda nesta data, a Recorrente contínua a prestar trabalho para a Câmara Municipal...
56. O Tribunal a quo refere que a A. não conseguiu provar que “a alegada entidade empregadora da Autora foi tão só e apenas um intermediário para a renovação da sua prestação de serviços (facto 7). Contudo, salvo o devido respeito, a A. demonstra cabalmente que existiu uma ficção.
57. De facto, que razão é que seria para a existência de dois contratos de prestação de serviços com a A., um contrato de prestação de serviços com uma empresa (por ajuste direto) que contrata a A. para continuar no mesmo local a prestar trabalho e, por fim, um novo contrato de prestação de serviços diretamente com a A., contratos esses realizados sempre por ajuste direto... tal apenas se deveu às limitações aos contratos por ajuste direto...
58. Exmos. Senhores Juízes Desembargadores, perdoem a confissão, a Recorrente teve muito azar... tivessem os contratos trocado de ordem e a Recorrente estaria imediatamente em condições de aceder à Administração Pública através da regularização de trabalhadores precários, como de facto é...
59. Chegados aqui, entende a Recorrente que devemos fazer uma interpretação ampla da lei.
60. Estabelece o Código Civil no artigo 9 n.º 1 que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
61. Devemos, pois, reconstituir o pensamento legislativo, recorrendo às circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas em que é aplicada. Como vimos, a lei resulta de uma resolução do Conselho de Ministros que tem como objetivo corrigir as situações de trabalhadores precários nas diversas entidades da Administração do Estado.
62. Ora, socorrendo-nos desse elemento e do próprio texto dessa resolução, resulta claro que o objetivo primordial da lei é eliminar situações de instabilidade laboral existentes no seio da Administração.
63. Examinando a letra da lei, mas também o espírito do legislador, torna-se evidente que não era intenção deste eliminar dos requisitos estabelecidos no artigo 3º da lei as pessoas que tinham um vínculo de forma indireta com a Administração e que, contudo, possuem todos os indícios de um contrato de trabalho, tal como definido pelo artigo 12º do Código do Trabalho.
64. Estabelece ainda o artigo 9º do Código Civil que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
65. Não restam dúvidas que a interpretação mais acertada é aquela que abranja os trabalhadores naquele período que, apesar de não possuírem vínculo direto com a Administração, trabalham exclusivamente para esta, seguindo as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, utilizando os instrumentos daquela e cumprindo o horário por si imposto.
66. Não pode a Recorrente ficar prejudicada e continuar com um vínculo precário, devido a uma ficção a que se teve de submeter para manter o seu posto de trabalho.

Nestes termos e nos mais de direito que suprirão, deve ser revogada a sentença recorrida, proferindo-se nova decisão em conformidade com o explicitado nas presentes alegações,
assim se fazendo a tão famigerada e costumeira
JUSTIÇA!
O Réu juntou contra-alegações, concluindo:
I. O recurso interposto pela Autora (A.) da decisão contra si proferida – plasmada na douta sentença prolatada em 06/06/2023 pelo meritíssimo Juiz do tribunal a quo – não tem qualquer sustentação de facto ou de direito.

II. A decisão recorrenda não enferma de nenhum vício, seja técnico seja de facto, que a Recorrente lhe pretende assacar.

III. No entender do Recorrido a sentença agora colocada em crise espelha bem a justeza na apreciação técnica dos factos que foram levados a juízo e que conduziram à decisão final, de forma sustentada.

IV. A decisão do Tribunal foi a de que a acção era efectivamente intempestiva estribada nas datas em que os factos ocorreram e que são inequívocas.

V. De forma cristalina entendeu que “na data em que a presente ação foi proposta, em 01.06.2018, já havia caducado o direito de instaurar a presente acção com vista à invalidade do acto impugnado, por já se mostrar esgotado o prazo previsto no artigo 58°, n°. 2 alínea b) do C.P.T.A.”

VI. O juízo e fundamentação do Tribunal não deixa margem para subjetividades na análise sendo que as datas dos documentos são peremptórias e sustentam em absoluto o juízo transcrito na decisão proferida.

VII. Ainda assim a verificação da excepção de caducidade não se traduziu na absolvição da instância relativamente aos pedidos formulados pela A. em b) e c) na sua peça processual pelo que o Tribunal ainda os apreciou.

VIII. Dessa apreciação resultou uma decisão desfavorável para a A.

IX. A interpretação da lei que estabelece o PREVPAP feita pelo Tribunal foi a correcta e não pode a A. contrariar os factos objectivos carreados para o processo, nomeadamente as datas dos contratos e as entidades neles intervenientes.

X. O Tribunal recorrido andou bem ao interpretar a lei aplicável de forma abstracta e geral, como se impõe.

XI. A própria Recorrente admite que à luz da lei em vigor e dos elementos objectivos em apreciação não podia haver decisão diversa daquela que foi proferida nos autos.

XII. A Lei nº 112/2017 não impõe qualquer contratação aos municípios.

XIII. A Lei previu um Programa que podia ser usado, desde que se cumprissem requisitos, para abrir procedimentos concursais extraordinários.

XIV. Era ao MUNICÍPIO ..., Recorrido, que cabia decidir se existiam situações que se enquadravam nas disposições legais e, mesmo assim, se avançava ou não com o procedimento concursal.

XV. A A. não cumpria, desde logo, os requisitos legais para ser enquadrada no Programa.

XVI. A A. não fez qualquer prova que contrariasse essa realidade.

XVII. A A. não podia integrar o âmbito de pessoas para ser abrangida pelo Programa, conforme dispõe o art.º 3º, nº 1, al. a) da Lei, porquanto não teve qualquer vínculo com o Município entre 01.01.2017 e 04.05.2017.

XVIII. Neste período o Município estava vinculado com uma entidade terceira, a empresa denominada [SCom01...]).

XIX. Sublinha-se na douta decisão que “a relação, aqui em causa, e a que a Autora se agarra para sustentar a sua pretensão, não foi estabelecida entre ela e a Entidade Demandada, mas antes entre a empresa, para a qual passou a trabalhar, o que só por si faz soçobrar a sua pretensão.”

XX. Contrato entre o R. e a entidade [SCom01...], Lda, não é uma qualquer ficção sendo essa afirmação falsa e abusiva.

XXI. Os alegados contratos de prestação de serviços em que a A. interveio não a fazem enquadrar no tipo de situações abrangidas pelo Programa por não cumprir a exigência de exercício de funções com sujeição ao poder hierárquico, à disciplina ou direcção do Recorrido.

Nestes termos, deve a sentença recorrida manter-se em toda a sua extensão e quanto aos fundamentos ali expressos, sendo confirmada em absoluto, o que se requer para a que seja reafirmada a JUSTIÇA.
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A. A Autora é psicóloga, tendo obtido a licenciatura em 12 de Setembro de 2008 e o Mestrado em 28 de setembro de 2012, possuindo a cédula profissional ...83 – facto não controvertido.
B. Em 11.11.2014, a Autora e o MUNICÍPIO ... celebraram documento escrito denominado de “contrato para aquisição de serviços colaboração técnica especializada – psicologia”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
Disse o primeiro outorgante: - Que de harmonia com o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal, datado de 07 de Novembro de 2014, autorizou a celebração do presente contrato, aprovou a respectiva minuta, tendo sido adjudicada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal a 07 de Novembro de 2014 ao segundo outorgante aquisição de serviços de colaboração técnica especializada - psicologia.
(...)
PRIMEIRA: - O segundo outorgante compromete-se a prestar os serviços de acordo com o respectivo caderno de encargos, pelo valor de 10.560,00€ (dez mil quinhentos e sessenta euros), isento de IVA, de harmonia com a proposta apresentada, e que fica a fazer parte integrante deste contrato;
SEGUNDA: - A aquisição de serviços será executada de acordo com a proposta e em articulação com o caderno de encargos, aprovado por despacho de 31 de Outubro de 2014, pelo prazo de um ano, com início na data do presente contrato.
(...)
SÉTIMA: - Quanto ao mais, aplicar-se-ão as especificações do Caderno de Encargos e, na parte não especialmente prevista, as normas do Regime Jurídico do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei número 18/2008, de 29 de Janeiro (…)”
– cf. doc. n.º 1 da p.i..
C. Decorrido um ano, apesar do contrato ter deixado de produzir os seus efeitos, a Autora continuou a prestar as mesmas funções que iniciou em 2014 – facto não controvertido.
D. Em 28.12.2015, a Autora e o MUNICÍPIO ... celebraram documento escrito denominado de “contrato para aquisição de serviços colaboração técnica especializada – psicologia”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
Disse o primeiro outorgante: - Que de harmonia com o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal, datado de 21 de Dezembro de 2015, autorizou a celebração do presente contrato, aprovou a respectiva minuta, tendo sido adjudicada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal a 21 de Dezembro de 2015 ao segundo outorgante aquisição de serviços de colaboração técnica especializada - psicologia.
Que vem celebrar o presente contrato com o segundo outorgante, nas seguintes condições e cláusulas:
PRIMEIRA: - O segundo outorgante compromete-se a prestar os serviços de acordo com o respectivo caderno de encargos, pelo valor de 7.716,00€ (sete mil setecentos e dezasseis euros), acrescido de IVA, de harmonia com a proposta apresentada, e que fica a fazer parte integrante deste contrato;
SEGUNDA: - A aquisição de serviços será executada de acordo com a proposta e em articulação com o caderno de encargos aprovado por despacho de 09 de dezembro de 2015, pelo prazo de seis meses, com início na data do presente contrato.
(...)

SÉTIMA: - Quanto ao mais, aplicar-se-ão as especificações do Caderno de Encargos e, na parte não especialmente prevista, as normas do Regime Jurídico do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei número 18/2008, de 29 de Janeiro (…)”
- doc. n.º 2 da p.i.
E. Em 11.08.2016, o MUNICÍPIO ... e a empresa [SCom01...], Lda celebraram documento escrito denominado de “CONTRATO PARA "AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS PARA DIVISÃO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
Disse o primeiro outorgante: - Que de harmonia com o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal em exercício, datado de 05 de Agosto de 2016, autorizou a celebração do presente contrato, aprovou a respectiva minuta, tendo sido adjudicada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal a 04 de Agosto de 2016 ao segundo outorgante, AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS PARA DIVISÃO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL.
Que vem celebrar o presente contrato com o segundo outorgante, nas seguintes condições e cláusulas:
PRIMEIRA: - O segundo outorgante compromete-se a prestar os serviços de acordo com o respectivo caderno de encargos, pelo valor de 58.911,94€ (Cinquenta oito mil novecentos e onze euros e noventa e quatro cêntimos), acrescido de IVA, de harmonia com a proposta apresentada, e que fica a fazer parte integrante deste contrato;
SEGUNDA: - A aquisição de serviços será executada de acordo com a proposta e em articulação com o caderno de encargos, aprovado por despacho de 01 de Agosto de 2016, pelo prazo de seis meses, com início na data de assinatura do presente contrato.
(...)
SÉTIMA: - Quanto ao mais, aplicar-se-ão as especificações do Caderno de Encargos e, na parte não especialmente prevista, as normas do Regime Jurídico do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei número 18/2008, de 29 de Janeiro (...)” – cfr. doc. n.º 3 da p.i..

F. Em 12.08.2016, a Autora e [SCom01...], Lda celebraram instrumento escrito denominado de “contrato de trabalho a termo certo”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
É celebrado o presente Contrato de Trabalho a Termo Certo, nos termos das disposições conjugadas do Contrato Coletivo de Trabalho aplicável ao Setor e da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro e regido pelos termos e condições das cláusulas seguintes:
1.ª
Pelo presente contrato, a 1.ª outorgante contrata ao seu serviço a 2.ª Outorgante para mediante as suas diretrizes e autoridade, desempenhar as funções de Técnica Superior na área funcional de Psicologia, funções estas que passam pela necessidade de proceder ao acompanhamento das crianças das escolas EB1 do concelho de ..., em articulação direta com os agrupamentos de escolas, conforme protocolo assinado entre estes e o MUNICÍPIO ..., proceder ao acompanhamento de crianças sinalizadas pela CPCJ - Comissão de Proteção de Crianças e Jovens, proceder ao acompanhamento de Munícipes que o solicitem junto do Gabinete de Ação Social e dinamizar no ano letivo 2016/2017 o projeto "CRESC - LERL (intervenção Precoce na Aprendizagem da Leitura e da Escrita)", dando porém desde já o seu consentimento para a realização de outras tarefas, similares e enquadráveis nas acima descritas.
2.ª
A razão motivadora do presente contrato a termo certo, celebra-se ao abrigo do n.º 2 alínea f) do artigo 140.ª do Código do Trabalho, fruto do contrato assinado entre a 1.ª Outorgante e o MUNICÍPIO ... que tem como objeto a "Aquisição de Serviços para a Divisão de Administração Geral, serviços estes a serem prestados no prazo de prestação de serviços, entre o dia 12 de agosto de 2016 e 11 de fevereiro de 2017. Dado que a 1.ª Outorgante não possui colaboradores que permitam assegurar tal acréscimo, vê-se a 1.ª Outorgante obrigada a recorrer à contratação temporária de mais colaboradores.

3.ª
A 2.ª outorgante declara ter conhecimento e aceitar as circunstâncias excecionais e temporárias que justificam a respetiva aposição de termo certo.
4.ª
A 2.ª outorgante prestará o seu trabalho nos Estabelecimentos Municipais na área geográfica do Concelho de ..., com o período normal de trabalho de 7 horas diárias, e 35 horas por semana.
5.ª
Em contrapartida da sua atividade profissional exercida pela 2.ª outorgante a 1.ª outorgante pagará à 2.ª outorgante até ao dia 8 de cada mês a retribuição ilíquida de 1.000,00€ (mil euros), acrescida dos duodécimos de Subsídio de Férias e Natal, sobre a qual incidirão os respetivos descontos legais e um subsídio de alimentação no valor de 4,27€ (quatro euros e vinte e sete cêntimos) por cada dia útil de trabalho.
6.ª
A 2.ª outorgante tem direito a férias, nos termos da lei.
(...)
8.ª
O presente contrato tem a duração de 06 meses, sendo o seu início a 12 de agosto de 2016 e término a 11 de fevereiro de 2017, salvo se os Outorgantes acordarem na renovação ou na prorrogação do contrato, sendo que este só poderá ser renovado no máximo duas vezes.
9.ª
Ao abrigo do n.º 5 do artigo 112.º e do artigo 114.º da Lei n.ª 7/2009 de 12 de fevereiro, durante o período experimental, que é acordado em 30 dias, qualquer das partes pode denunciar o contrato sem aviso prévio e invocação de justa causa, não havendo direito de indemnização.

10.ª
A caducidade do contrato no termo do prazo, depende da comunicação escrita, com 15 dias de antecedência se a iniciativa for da 1.ª outorgante, ou com 8 dias de antecedência por vontade da 2.ª outorgante.
11.ª
A cessação do contrato por qualquer das Outorgantes rege-se pelo disposto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei nª 7/2009, de 12 de Fevereiro (...)” - Doc. n.º 4 da pá.
G. Em 24.05.2017, a Autora e o MUNICÍPIO ... celebraram documento escrito denominado de “CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS DE PISCOLOGIA CLÍNICA E DA SAÚDE - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NO ÂMBITO DA COLABORAÇÃO TÉCNICA ESPECIALIZADA”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
Disse o primeiro outorgante: - Que de harmonia com o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal, datado de 11 de maio de 2017, autorizou a celebração do presente contrato, aprovou a respetiva minuta, tendo sido adjudicada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal a 11 de maio de 2017 ao segundo outorgante, - aquisição de serviços de Psicologia Clínica e da Saúde - prestação de serviços no âmbito da colaboração técnica especializada.
Que vem celebrar o presente contrato com o segundo outorgante, nas seguintes condições e cláusulas.
PRIMEIRA: - O segundo outorgante compromete-se a prestar os serviços de acordo com o respetivo caderno de encargos, pelo valor de 10.082,00€ (dez mil e oitenta e dois euros), isento de IVA, de harmonia com a proposta apresentada, e que fica a fazer parte integrante deste contrato;

SEGUNDA: - A aquisição de serviços será executada de acordo com a proposta e em articulação com o caderno de encargos, aprovado por despacho de 21 de abril de 2017, até 31 de dezembro de 2017, com início na data de assinatura do presente contrato.
(...)
SÉTIMA: - Quanto ao mais, aplicar-se-ão as especificações do Caderno de Encargos e, na parte não especialmente prevista, as normas do Regime Jurídico do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei número 18/2008, de 29 de Janeiro (...) – cfr. doc. n.º 5 da pá.
H. Em 26.01.2018, A Câmara Municipal ... deliberou através de votação nominal de que resultou maioria, reconhecer 21 vínculos precários de postos de trabalho que correspondem a necessidades permanentes do Município e cujo vínculo jurídico dos colaboradores é inadequado, nos termos do n° 3, do artº. 2º, da Lei 112/2017, bem como que seja apresentada à Assembleia Municipal proposta de alteração ao mapa de pessoal aprovado para o corrente ano, nos termos do n°. 2, do art. 6º., da Lei 112/2017 de 29 de Dezembro, a fim de permitir a abertura dos correspondentes procedimentos concursais de regularização, designadamente nas seguintes carreiras/categorias/áreas funcionais:
- 01 Posto de trabalho para a carreira geral e categoria de técnico superior, área funcional de Educação Física e Desporto;
- 01 Posto de trabalho para a carreira geral e categoria de técnico superior, área funcional de Comunicação e Design Gráfico;
- 01 Posto de trabalho na carreira geral e categoria de assistente técnico, na área funcional de topógrafo;
- 01 Posto de trabalho na carreira geral e categoria de assistente técnico, na área funcional de medidor orçamentista;

- 01 Posto de trabalho na carreira geral e categoria de assistente técnico, na área funcional de Relações Públicas e Marketing;
- 01 Posto de trabalho na carreira geral e categoria de assistente técnico, na área funcional de Assistente Administrativo;
- 01 Posto de trabalho na carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de mecânico;
- 02 Postos de trabalho para a carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de auxiliar de ação educativa;
- 01 Posto de trabalho para a carreira e categoria de assistente operacional, na área funcional de motorista;
- 01 Posto de trabalho para a carreira e categoria de assistente operacional (generalista);
- 02 Postos de trabalho para a carreira e categoria de assistente operacional, na área funcional de auxiliar de serviços gerais;
- 01 Posto de trabalho para a carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de motorista de pesados;
- 01 Posto de trabalho para a carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de jardineiro;
- 02 Postos de trabalho para a carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de cantoneiro de limpeza;
- 04 Postos de trabalho para a carreira geral e categoria de assistente operacional, na área funcional de pedreiro. – cfr. docs. juntos com a contestação.
I. Em 30.01.2018, foi publicado edital nos locais de estilo, contendo a deliberação referida na alínea anterior - cf. documento junto com a contestação; fls. 248/250 do sitaf.

J. Por requerimento apresentado no dia 1 de fevereiro de 2018, a Autora requereu ao Sr. Presidente da Câmara Municipal ... o seguinte:
“(...) que se digne informar se a requerente consta da Lista de Precários identificados pelo Município ao abrigo da Regularização Extraordinária dos vínculos precários - Lei n.ª 112/2017 de 29 de Dezembro;
quais os critérios seguidos para a elaboração da lista referida e quem a integra” – cf. doc. n.º 6 da p.i..
K. Nessa sequência, em 28.02.2018, foi elaborada a seguinte informação:
“No seguimento do despacho do Exmo. Sr. Vereador de 2018/02/26, no âmbito do requerimento em título, tenho a informar o seguinte:
1. Como ponto prévio, importa informar que a requerente prestou serviços à Câmara Municipal (regime de prestação de serviços - colaboração técnica especializada - Psicologia Clínica e da Saúde) em três períodos distintos:
- Entre 2014/11/11 e 2015/11/10; - Entre 2015/12/28 e 2016/06/29; - Entre 2017/05/24 e 2017/12/31.
A requerente também prestou serviços à Câmara Municipal na referida área funcional no período compreendido entre 2016/08/11 e 2017/02/10, enquanto trabalhadora contratada pela empresa "[SCom01...], Lda", no âmbito de um contrato de prestação de serviços outorgado entre o Município e a referida empresa.
2. Vem a requerente questionar se consta da lista de precários identificados pelo Município ao abrigo da Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários - Lei n.° 112/2017, de 29 de Dezembro.
Consultada a proposta do Exmo. Sr. Presidente da Câmara de 2017/02/01, relativa a este assunto (que resultou, na parte em apreço, da minha informação de 2018/01/31), aprovada pela Câmara Municipal em 5 de Fevereiro, verifica-se que o posto de trabalho correspondente à área funcional de "Psicologia Clínica e da Saúde" não consta da referida proposta.

3. Questiona também quais os critérios seguidos lista e quem a integra.
Atendendo única e exclusivamente ao caso em Divisão de Administração Geral avaliar se requerente na Câmara Municipal se enquadravam artigo 2.° e artigo 3.° da Lei n.° 112/2017, de 29 único critério que se teve em consideração na para a elaboração da referida concreto, coube à DAG - as funções exercidas pela no previsto no n.° 1, do de Dezembro, sendo este o avaliação da situação em análise.
As funções desenvolvidas pela requerente, e respectivo vínculo contratual, enquadram-se no previsto na alínea a), do n.° 1, do artigo 3.° da Lei n.° 112/2017, de 29 de Dezembro, ou seja, o diploma abrange as pessoas referidas no n.° 1, do artigo 2.° (no qual a requerente se enquadra), que exerçam ou tenham exercido funções no período correspondente entre 1 de Janeiro e 4 de Maio de 2017, ou parte dele, e pelo menos durante um ano à data do inicio do procedimento concursal de regularização.
Daqui resulta que a requerente não reunia condições para integrar a proposta do Exmo. Sr. Presidente da Câmara de 2017/02/01, exerçam ou tenham exercido funções no período compreendido entre 1 de Janeiro e 4 de Maio, ou parte dele, não detinha qualquer vínculo contratual com a Câmara Municipal. Detinha sim, um vínculo contratual com a empresa "[SCom01...], Lda.”, conforme resulta do exposto no ponto 1) da presente informação.
Quanto à divulgação da informação solicitada pela prestação à consideração superior” – cfr. doc. n.º 7 da p.i..
L. Por ofício com a referência 0751, expedido a 13-01-2018, remetido pela Entidade Demandada à Autora, foi esta notificada do seguinte que ora se transcreve:
“Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários, junto se envia cópia da informação interna sobre o assunto”

M. A Autora, notificada da cópia da informação interna referente ao requerimento apresentado no dia 01.02.2018, remeteu requerimento escrito com o teor constante de doc. n.º 8 da p.i., no qual terminou peticionou o seguinte: “venho, ao abrigo do art.° 120 e ss. do CPA, requerer a V. Ex.a que seja enquadrada na lista de trabalhadores precários e a minha situação seja regularizada ao abrigo da lei 112/2017, de 29 de dezembro”.
N. Nessa sequência foi elaborada informação técnica com o seguinte teor que ora se transcreve na parte que releva:
“(...)
No seguimento do despacho do Exmo. Sr. Vereador de 2018/03/27, no âmbito da resposta da requerente ao nosso ofício n.° 751 de 18 de Março, tenho a informar que reitero o conteúdo da minha informação de 28 de Fevereiro, nos seguintes aspectos relevantes para a tomada de decisão no âmbito do processo de regularização de vínculos precários:
1. Reitero que a requerente prestou serviços à Câmara Municipal (regime de prestação de serviços - colaboração técnica especializada - Psicologia Clínica e da Saúde) em três períodos distintos, conforme reconhece na sua carta de 21 de Março:
- Entre 2014/11/11 e 2015/11/10;
- Entre 2015/12/28 e 2016/06/29;
- Entre 2017/05/24 e 2017/12/31.
2. A requerente também prestou serviços à Câmara Municipal na referida área funcional no período compreendido entre 2016/08/11 e 2017/02/10, enquanto trabalhadora contratada pela empresa `'[SCom01...]. Lda", no âmbito de um contrato de prestação de serviços outorgado entre o Município e a referida empresa, conforme também reconhece na sua carta de 21 de Março.
3. As funções desenvolvidas pela requerente, e respectivo vinculo contratual, enquadram-se no previsto na alínea a), do n.° 1, do artigo 3.° da Lei n.° 112/2017, de 29 de Dezembro, ou seja, o diploma abrange as pessoas referidas no n.° 1, do artigo 2.° (no qual a requerente se enquadra), que exerçam ou tenham exercido funções no período correspondente entre 1 de Janeiro e 4 de Maio de 2017, ou parte dele, e pelo menos durante um ano à data do inicio do procedimento concursal de regularização.

Reitera-se que daqui resulta que a requerente não reunia condições para integrar a proposta do Exmo. Sr. Presidente da Câmara de 2017/02/01, uma vez que no período compreendido entre 1 de Janeiro e 4 de Maio de 2017, ou parte dele, não detinha qualquer vinculo contratual com a Câmara Municipal.
Detinha sim, um vínculo contratual com a empresa "[SCom01...], Lda., conforme resulta do exposto no ponto 1) da presente informação, o que também não é posto em casa pela requerente.
Conclusão:
A requerente não apresentou na resposta ao nosso ofício n.° 751 de 18 de Março, argumentos de facto e de direito que contrariassem as razões, também elas de facto e de direito, que conduziram a que o posto de trabalho na área funcional de Psicologia Clínica e da Saúde não reunisse condições para integrar a proposta do Exmo. Sr. Presidente da Câmara de 2017.02.01.
Anexos:
- Carta/resposta ao nosso ofício n.° 751 de 18 de Março;
- Cópia da minha informação de 28 de Fevereiro;
- Cópia do requerimento inicial.
É o que me cumpre informar” – cfr. doc. n.º 9 da p.i.
O. Por ofício com a referência 1281, expedido a 16.04.2018, remetido pela Entidade Demandada à Autora, foi esta notificada do seguinte que ora se transcreve:
“Em resposta ao pedido formulado por V.Exa., sobre o processo de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários, no âmbito do direito de audiência dos interessados previsto nos artigos 121°. e seguintes da Lei 4/2015, de 7 de Janeiro (novo CPA), informo que V.Exa, não apresentou novos argumentos de facto e de direito que contrariassem as razões, também elas de facto e de direito, que conduziram a que o posto de trabalho na área funcional de Psicologia Clínica e da Saúde, não integrasse a proposta do Exmo. Presidente da Câmara de 1 de Fevereiro de 2018, e que constam do nosso oficio n°.751, de 18 de Março.” – cfr. doc. n.º 9 da p.i.

P. A Entidade Demandada elaborou documento intitulado de “plano anual de recrutamentos – ano 2018”, com o teor constante de doc. n.º 10 da p.i.
Q. A Entidade Demandada elaborou documento intitulado de “mapa de pessoal para 2018”, com o teor constante de doc. n.º 11 da pá.
R. Por ofício constante de doc. n.º 12 da p.i., a Autora foi convidada para apresentar uma proposta no âmbito de uma aquisição de serviços através de ajuste direto – cf. doc. 12.
S. Nessa sequência, em 16.03.2018, a Autora e o MUNICÍPIO ... celebraram documento escrito denominado de “CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS DE PISCOLOGIA CLÍNICA E DA SAÚDE - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NO ÂMBITO DA COLABORAÇÃO TÉCNICA ESPECIALIZADA”, no qual constam as seguintes cláusulas que ora se transcrevem na parte que releva:
“(...)
DISSE O PRIMEIRO OUTORGANTE: - Que de harmonia com o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal, datado de 13 de março de 2018, autorizou a celebração do presente contrato, aprovou a respetiva minuta, tendo sido adjudicada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal a 13 de março de 2018 ao segundo outorgante, - aquisição de serviços de Psicologia Clínica e da Saúde - prestação de serviços no âmbito da colaboração técnica especializada.
Que vem celebrar o presente contrato com o segundo outorgante, nas seguintes condições e cláusulas:
Primeira: - O segundo outorgante compromete-se a prestar os serviços de acordo com o respetivo caderno de encargos, pelo valor de 12.602,50€ (doze mil seiscentos e dois euros e cinquenta cêntimos), isento de IVA, de harmonia com a proposta apresentada, e que fica a fazer parte integrante deste contrato;

Segunda: - A aquisição de serviços será executada de acordo com a proposta e em articulação com o caderno de encargos, aprovado por despacho de 02 de março de 2018, até 31 de dezembro de 2018, com início na data de assinatura do presente contrato.
Sétima: - Quanto ao mais, aplicar-se-ão as especificações do Caderno de Encargos e, na parte não especialmente prevista, as normas do Regime Jurídico do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei número 18/2008, de 29 de Janeiro, Com as alterações introduzidas pelo DL n2111-13/2017, de 31/08.” – cfr. doc. n.º 13 da pá.
T. A petição inicial que motiva os presentes autos foi deduzida em juízo em 01.06.2018 – cfr. fls. 1 e ss do sitaf.
DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
Julgou o Tribunal a quo que a acção era intempestiva, sem, contudo, se considerar impedido de prosseguir com a análise aos pedidos ínsitos na PI sob as alíneas b) e c).
Na óptica da Recorrente a acção devia ter sido considerada tempestiva.
Não vemos que assim seja.
Como consta da sentença, o acto impugnado na acção administrativa está sujeito a publicação obrigatória, nos termos do disposto no artigo 56.°, n.° 1, do regime jurídico das autarquias locais, aprovado e publicado em anexo à Lei n.° 75/2013, de 12.09, que estabelece a obrigatoriedade da publicidade das deliberações dos órgãos autárquicos e das decisões dos respetivos titulares destinadas a ter eficácia externa, as quais eram objeto de publicação em edital afixado nos lugares de estilo durante cinco dos 10 dias subsequentes à tomada da deliberação ou decisão.
Assim sendo, o prazo de impugnação para a Autora, que não era destinatária do acto em causa, mas “outros interessados” nesse acto, começava a correr a partir da data da publicação, por haver preceito expresso a estabelecer a obrigatoriedade dessa publicação, em conformidade com o previsto no artigo 59.º n.ºs 1 e 3, a contrario, do CPTA.
Atento o facto de tal publicação ter ocorrido no dia em 30.01.2018, iniciando-se, por isso, a contagem do prazo de 3 meses para impugnação, verifica-se que o termo deste prazo ocorreu no dia 30.04.2018.

Pelo que, na data em que a presente ação foi proposta, em 01.06.2018, já havia caducado o direito de instaurar a presente acção com vista à invalidade do acto impugnado, por já se mostrar esgotado o prazo previsto no artigo 58°, n°. 2 alínea b) do C.P.T.A.
E continua:
Não se olvida que a Autora invoca a falta de notificação de tal acto.
Sucede que a Autora não se encontrava constituída como interessada no procedimento nos termos do qual veio a ser praticado a deliberação em causa, nem a notificação é imposta, nos termos do art. 114.º do CPA, a contrario.
Nestes termos, julga-se procedente a excepção dilatória de intempestividade da prática do processual, nos termos do art. 89.º, n.º 4, al. k) do CPTA, o que conduz à absolvição da instância da Entidade Demandada, relativamente ao pedido formulado em a) do petitório.
A decisão do Tribunal foi, e bem, a de que a acção era efectivamente intempestiva, atentos os factos carreados para o processo que, pelas datas em que ocorreram e que são inequívocas, não deixam margem para qualquer outra conclusão que não a de acolher o entendimento explicitado.
Andou bem o Tribunal a quo ao referir que “o acto impugnado na acção administrativa está sujeito a publicação obrigatória, nos termos do
disposto no artigo 56.°, n.° 1, do regime jurídico das autarquias locais, aprovado e publicado em anexo à Lei 75/2013, de 12.09, que estabelece a obrigatoriedade da publicidade das deliberações dos órgãos autárquicos e das decisões dos respetivos titulares destinadas a ter eficácia externa, as quais eram objeto de publicação em edital afixado nos lugares de estilo durante cinco dos 10 dias subsequentes à tomada da deliberação ou decisão.
Assim sendo, o prazo de impugnação para a Autora, que não era destinatária do acto em causa, mas “outros interessados” nesse acto, começava a correr a partir da data da publicação, por haver preceito expresso a estabelecer a obrigatoriedade dessa publicação, em conformidade com o previsto no artigo 59.º n.ºs 1 e 3, a contrario, do CPTA.
Com efeito, atento o facto de tal publicação ter ocorrido no dia em 30.01.2018, iniciando-se, por isso, a contagem do prazo de 3 meses para impugnação, verifica-se que o termo deste prazo ocorreu no dia 30.04.2018.
Temos, pois, que, na data em que a ação foi proposta - 01.06.2018 - já havia terminado o direito de a instaurar com vista à invalidade do acto impugnado, por já se mostrar esgotado o prazo previsto no artigo 58°, n° 2 alínea b) do CPTA.
As datas são peremptórias e sustentam o juízo plasmado na decisão posta em crise.
Porém, entendeu ainda o Tribunal a quo que a verificação da excepção de caducidade invocada pelo Réu e procedente não significava, por si só, a absolvição da instância relativamente aos pedidos formulados em b) e c), a saber:
“b. Condenar-se a Câmara Municipal ... a, no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão da presente ação, proferir um ato administrativo que inclua a Autora na lista de trabalhadores precários.”
“c. e, em consequência disso, a abertura do respetivo procedimento concursal nos termos da lei 112/2017, de 29 de dezembro.”
E decidiu que “os autos prosseguem para o conhecimento das pretensões condenatórias formuladas em b) e c) do petitório, por a tal nada obstar.”; e assim fez, proferindo a decisão com a qual a aqui Recorrente não se conforma.
Porém, mais uma vez, sem razão.
Vejamos,
Do mérito da acção -
Na óptica da Recorrente o Tribunal andou mal, pugnando agora por uma interpretação alargada da lei que estabelece o PREVPAP defendendo, uma interpretação adaptada às suas pretensões - quase teleológica - para que se aplique a lei da melhor forma possível em benefício da sua tese.
Mas, carece de suporte.
O Tribunal recorrido andou bem ao interpretar a lei aplicável de forma geral e abstracta, como se impõe, não relevando o “muito azar” que a Recorrente alega que teve e ignorando a confissão que aquela faz: “tivessem os contratos trocado de ordem e a Recorrente estaria imediatamente em condições de aceder à Administração Pública através da regularização de trabalhadores precários...”.
Atente-se:
“Artigo 9º do C. Civil -
Interpretação da lei
1 - A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2 - Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3 - Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Com efeito, funcionando a letra da lei como ponto de partida e como limite da interpretação - na expressão de José Oliveira Ascensão, “[a] letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação” - Introdução e Teoria Geral, 13.ª ed., Almedina, 2005, pág. 396.
Ora, ao confessar e “desabafar” desta forma, a própria Recorrente admite rigorosamente que à luz da lei em vigor e dos elementos objectivos em apreciação não podia haver decisão diversa daquela que foi proferida nos autos.
Onde o legislador não legisla, não deve o intérprete legislar, não podendo ser tomado em conta o pensamento legislativo que não recolha na letra da lei um mínimo de correspondência textual (artº 9º/2 do Código Civil).
Segundo este preceito, relativo à interpretação da lei, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso; assim, mesmo quando o intérprete “...se socorre de elementos externos, o sentido só poderá valer se for possível estabelecer alguma relação entre ele e o texto que se pretende interpretar”- cfr. João Baptista Machado, em Introdução ao Direito Legitimador, 1983-189.
E refere José Lebre de Freitas, in BMJ 333º-18 “A “mens legislatoris” só deverá ser tida em conta como elemento determinante da interpretação da lei quando tenha o mínimo de correspondência no seu texto e no seu espírito”.
Assim, presumindo-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, ao abrigo do n.º 3 do mencionado artigo 9.º, a interpretação avançada pela Recorrente não encontra um mínimo de apoio na letra da lei.
Como também é sabido, na interpretação de uma norma jurídica, isto é, na tarefa de fixar o sentido e o alcance com que ela deve valer, intervêm, para além do elemento gramatical (o texto, a letra da lei), elementos lógicos, que a doutrina subdivide em elementos de ordem histórica, racional ou teleológica e sistemática.
O elemento teleológico consiste na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma, “o conhecimento deste fim sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a “decisão” legislativa (occasio legis) constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Basta lembrar que o esclarecimento da ratio legis nos revela a “valoração” ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime. Sem esquecer ainda que, pela descoberta daquela “racionalidade” que (por vezes inconscientemente) inspirou o legislador na fixação de certo regime jurídico particular, o intérprete se apodera de um ponto de referência que ao mesmo tempo o habilita a definir o exato alcance da norma e a discriminar outras situações típicas com o mesmo ou com diferente recorte”, como escreveu o Prof. Baptista Machado, ob. cit. págs. 182/183. A ratio legis revela, portanto, a valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma jurídica disciplina.
Voltando ao caso concreto, a verdade é que a Lei nº 112/2017 que estabelece os termos da regularização prevista no Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários de quem tenha exercido funções que correspondam a necessidades permanentes da Administração pública, de autarquias locais, sem vínculo adequado, com sujeição ao poder hierárquico, de disciplina ou direcção e horário completo (art.º 1º, bem como art.º 25º da lei 42/2016), não impõe qualquer contratação aos municípios.
A Lei previu um Programa que podia ser usado, desde que se cumprissem vários requisitos, para abrir procedimentos concursais extraordinários.
E cabia sempre à entidade - aqui ao Réu/Município - decidir se existiam situações que se enquadravam nas disposições legais e, mesmo assim, se avançava ou não com o procedimento concursal.
A lei define e regula os termos em que o procedimento extraordinário pode ser feito.
E não pode olvidar-se que a avaliação das situações enquadráveis, ou não - sendo que a da Autora não era - na Lei ou no Programa, é uma avaliação de mérito, de oportunidade e política, de competência exclusiva da Autarquia.
Mas o que mais releva, como bem defendeu o Tribunal recorrido, é que a Autora/Recorrente não cumpria os requisitos legais para ser enquadrada no Programa. Aliás, a própria não fez qualquer prova que contrariasse essa realidade.
E como ficou assente a Autora não podia integrar o âmbito de pessoas para ser abrangida pelo Programa, conforme dispõe o art.º 3º, nº 1, al. a) da Lei, porquanto não teve qualquer vínculo com o Município entre 01.01.2017 e 04.05.2017, mas sim com uma entidade terceira (empresa denominada [SCom01...], Lda.).
Como referido na sentença: “Da matéria de facto assente supra, resulta, no entanto, que a Autora, nesse concreto período temporal (entre 12.08.2016 até 24.05.2017) não foi interveniente de contrato (de trabalho ou prestação de serviços) com a Entidade Demandada. A entidade contraente do contrato de prestação de serviço foi [SCom01...], Lda. e a Entidade Demandada; nos termos do contrato de trabalho, a Autora ficou adstrita às diretrizes e autoridade da referida empresa [SCom01...], Lda. (conforma cláusula primeira do contrato). Aliás, desse contrato de trabalho resulta claro que era a entidade privada que assegurava a contratação, remuneração (incluindo subsídios de férias e de natal e subsídio de alimentação), o direito a férias, nos termos da lei, regalias sociais.
Nenhum vínculo laboral foi estabelecido com a Entidade Demandada (embora esta pudesse ser a beneficiária do exercício de funções da Autora, prestados por esta nos termos do contrato de trabalho, contudo, tal sucedeu indirectamente e sob a égide de um contrato de prestação de serviços celebrado com um prestador de serviços privado - empresa privada, [SCom01...], Lda. que empregou a Autora).
Portanto, a relação, aqui em causa, e a que a Autora se agarra para sustentar a sua pretensão, não foi estabelecida entre ela e a Entidade Demandada, mas antes entre a empresa, para a qual passou a trabalhar, o que só por si faz soçobrar a sua pretensão.”
Claramente foi esta entidade - [SCom01...], Lda. - que contratou com a Câmara Municipal.
Assim, aquele requisito geral não foi cumprido, como resulta da orientação que é dada pela Direcção Geral das Autarquias Locais no guião elaborado para a matéria, onde responde expressamente a esta questão (http://www.portalautarquico.dgal.gov.pt/pt-PT/destaques/precarios-guiao), pág. 6:
«FAQ.II.3. Pode considerar-se que o sócio gerente de uma de sociedade unipessoal que preste serviços (avença) numa entidade da administração local pode ser abrangido pelo PREVPAP? Não. Excecionalmente pode ser abrangido quando esteja subjacente o exercício de funções sujeitas a poder hierárquico, de disciplina e direção, e a horário de trabalho (trabalho subordinado) e que essas funções correspondam a necessidades permanentes das entidades.»
Quanto à invocada “ficção” na relação contratual entre Município e [SCom01...], Lda. -
A Recorrente refere que o contrato que havia com esta entidade - [SCom01...] - era uma ficção para contornar a lei, sendo que essa afirmação, além de infundada é abusiva, até porque a Recorrente transmite a ideia que fez parte de um conluio, ou dele teve conhecimento, para continuar a prestar serviços no Município por intermédio de entidade terceira.
Como bem refere o Tribunal a quo, o vínculo jurídico era entre o Município e a entidade [SCom01...]. Além de que os alegados contratos de prestação de serviços celebrados com a Autora não a fazem enquadrar no tipo de situações abrangidas pelo Programa por não cumprir a exigência de exercício de funções com sujeição ao poder hierárquico, à disciplina ou direcção do aqui Recorrido.
E tanto assim é que a Recorrente não logrou fazer prova alguma disso.
Em suma,
Como sentenciado,
A Autora não conseguiu provar que, na ocasião em que vigorou o referido contrato de trabalho celebrado com a empresa privada em causa estivesse sob as ordens, direcção e fiscalização do Réu.
Destarte, uma vez que os pressupostos para a regularização implicam que (além de estarem em causa necessidades permanentes) haja um vínculo, uma relação precária, entre o trabalhador e a entidade pública, e que este vínculo, esta relação, aqui, não se verifica, é forçoso concluir pela ausência de razão da Autora e, com tal, julgar improcedente a presente acção, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas (desde logo a existência ou não de necessidades permanentes da actividade em causa).
Ficou por provar que, no período entre 1 de janeiro e 4 de maio de 2017, ou parte dele, existiu uma relação de trabalho subordinado entre a Autora e Entidade Demandada e que os vínculos jurídicos que uniu a Autora e Entidade Demandada (contratos de prestação de serviços) e que ligou a Autora e a sociedade [SCom01...], Lda. eram, na verdade, desadequados e incompatíveis com as reais características da prestação de trabalho a que a Autora se encontrava adstrita, em particular no que respeita aos reflexos que tal tinha na execução do serviço prestado à Entidade Demandada.
Sucumbem igualmente a alegação violação dos princípios da igualdade e do direito à segurança no emprego, previstos na Constituição da República Portuguesa, invocados apenas genericamente e sem substanciação, o que não permite a sua demonstração.

Improcedem as Conclusões das alegações.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente, sem prejuízo de eventual apoio judiciário.
Notifique e DN.

Porto, 24/4/2025

Fernanda Brandão
Paulo Ferreira de Magalhães
Isabel Jovita