Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00670/10.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/23/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:CRISTINA DA NOVA
Descritores:QUESTÕES NOVAS, OBSCURIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO;
VALORAÇÃO CRÍTICA DA PROVA:
FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DA COMISSÃO DE REVISÃO, MÉTODOS INDIRETOS;
Sumário:
1-O recurso está limitado às questões concretas suscitadas no recurso, sendo sobre estas que o tribunal ad quem tem de se pronunciar, para além destas as que são do conhecimento oficioso do tribunal. Ora as questões suscitadas que o recorrente entende que o tribunal não se pronunciou, apenas uma é do conhecimento oficioso, as demais não são do conhecimento oficioso, tal como a caducidade do direto de liquidar e os vícios procedimentais no âmbito inspetivo.

2-A prescrição da obrigação tributária [da dívida exequenda] embora do conhecimento oficioso [art. 175º do CPPT] não é fundamento de impugnação judicial, mas de oposição fiscal [art. 204º, n. º1. al. d)], contudo poderá ser conhecida a título incidental, se o processo dispor de elementos bastantes para o efeito, considerando que em termos processuais pode levar à inutilidade da lide impugnatória, não tendo reflexos ao nível da relação substancial respetiva, poderá a decisão da impugnação ter alcance prático, a sua continuação será uma pura inutilidade.

3- O que fundamenta e delimita a liquidação impugnada, no caso de aplicação de métodos indiretos, é, pois, a decisão do diretor [enquanto ato que define os pressupostos e o quantum do tributo] no âmbito do procedimento de revisão que se abriu com o requerimento do sujeito passivo.

4-Está fundamentada decisão do diretor que assentou, sucintamente, no facto de os valores detetados no procedimento inspetivo terem origem no acesso às contas bancárias do sujeito passivo através do competente levantamento do sigilo bancário, não tendo demonstrado o s.p. que aquelas quantias provinham de empréstimos feitos ao Sr. Domingos Ribeiro, nenhum documento apresentou nesse sentido, que não é verosímil a inexistência de um documento e a falta de colaboração do contribuinte não permitiu identificar uma justificação para os incrementos patrimoniais, para além de terem origem numa atividade comercial não declarada.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes, na Subsecção Comum do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
«AA», vem recorrer da sentença o TAF de Braga que julgou improcedente a Impugnação, relativamente às liquidações adicionais de IRS e IVA referentes ao período compreendido entre janeiro de 2005 a dezembro de 2007 e respetivos juros compensatórios, tudo no montante global de € 21.557,62.
*
Formula o recorrente, «AA», nas respetivas alegações as seguintes conclusões, que se reproduzem:
«I – O recorrente deve ver anulados todos os procedimentos de Inspecção tributária, pelo desrespeito das normas violadas, o qual se consubstancia num vício de forma.
Caso assim se não entenda, deve:
II - O recorrente deve ver declarado nulo e de nenhum efeito o acto de liquidação de IRS referente ao ano de 2007, ou/e
a) Ver declarada nula e de nenhum efeito aquela liquidação por haver errónea qualificação e quantificação do rendimento (artº 99º a) CPPT).
III - O recorrente deve ver anulados todos os actos tributários de liquidação adicional de IVA, respectivos juros compensatórios, e custas do processo, referentes aos anos de 2005,2006 e 2007, todas com as demais consequências.
IV - O recorrente deve ver anulados todos os actos tributários de liquidação a de IRS, respectivos juros compensatórios, e custas do processo, referente ao ano de 2007, todas com as demais consequências.
V - O recorrente dever ver admitido o que ora alega, e/ou o apuramento da matéria colectável ser alterado por excesso de quantificação e qualificação.
VI - Estão feridos de caducidade todos os eventuais direitos reclamados por aquela Administração Fiscal relativos àqueles períodos, (IVA, IRS, etc.), e
VII - Estão prescritas todas as eventuais dividas fiscais alegadamente reclamadas, por aquela Administração Fiscal referentes aqueles mesmos períodos (IVA, IRS, etc.),
VIII - O recorrente nunca exerceu a actividade “venda de artigos de vestuário, entre os anos de 2005,2006,2007…
IX – A administração tributária não fundamentou nem provou os pressupostos da tributação por “métodos indiciários”, e nem demonstrar que a liquidação não podia assentar nos elementos dados pelo contribuinte.
X - O recorrente sempre recusou ser tributado, pela actividade de «47711» Comércio a retalho de vestuário para adultos»,
XI - O recorrente encontra-se o mesmo a ser tributado erroneamente.
XII – O recorrente nunca vendeu nem vende artigos de vestuário.
XIII - Não existindo factos tributários, não podem haver correspectivos impostos
XIV – A Administração Fiscal não fez prova de que se verificavam os factos que integravam as condições para a determinação do rendimento por métodos indirectos para o exercício entre outros do ano de 2007, nos termos do artigo 87º b) e a) do artigo 88º da LGT… e esta não o fez (artº 342º do CC)
XV – O recorrente estava desempregado.
XVI – A Autoridade Tributária não provou que o recurso àquele método indiciário era a ÚNICA FORMA de calcular o imposto…e de fazer assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais, e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários.
XVII – O recorrente sempre colaborou com a administração fiscal.
XVIII- Tudo quanto alega devem à data de hoje, considerarem-se feridos de caducidade todos os eventuais direitos reclamados por aquela Administração Fiscal relativos àquele período e prescritas todas as eventuais dividas fiscais alegadamente reclamadas, por aquela Administração Fiscal referentes aquele mesmo período, ( IVA, IRS, etc.)
XIX - Foram violados, ao artº 342º do código civil, os Artºs 615º CPC, artx 46 nº 4 eº 61 nº2 e 62 RCPIT, o artº 63º C, o artº 67º, artº 85º,artº 87 ,artº 88º, artº 90º, artº 91ºda LGT, artº 99º do CPPT, e ainda os artº 20 nº 4 e 5 e artº 202º nº 2 da CRP.
XX - A Administração Fiscal, apenas poderia recorrer à avaliação indirecta, para efeitos de fixação da matéria tributável, quando, de todo, não lhe seja possível proceder a essa fixação a partir da utilização de métodos directos.
XXI -O recorrente, não apenas pôs em causa a base indiciária em que assentavam os pressupostos dos métodos indirectos tomados por base para a avaliação indirecta, como provou a origem diversa das quantias constantes das contas bancárias.
Termos em que, nos melhores de Direito e como suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ter provimento e em consequência ser revogada a douta sentença da qual se recorre, e substituída por outra que aprecie e decida todas as questões supra elencadas , entre outras, nomeadamente ,a nulidade ,e/ou a anulação de todos os actos tributários de liquidação do IVA e IRS, que a seu tempo foram impugnados, e sejam declarados nulos e ou anulados todos os procedimentos da Inspecção Tributária, e ser considerada para os devidos efeitos legais a impugnação judicial da qual se recorre procedente , ser apreciada e decidida as invocadas caducidades e prescrição e ainda tudo o que nos termos legais seja favorável ao aqui recorrente «AA».
Assim se fazendo SÃ JUSTIÇA.»
*
A Recorrida Fazenda Pública, notificada do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
*
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer com o seguinte teor:
«O impugnante «AA» veio recorrer da douta sentença proferida nos autos que considerou improcedente a impugnação instaurada quanto às liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) relativas aos exercícios de 2005 e 2007 e de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) referentes ao período compreendido entre Janeiro de 2005 a Dezembro de 2007 e respectivos juros compensatórios, tudo no montante global de €21.557,62.
No essencial o recorrente suporta o seu desacordo com a douta sentença alegando que a AT “não fundamentou nem provou os pressupostos de tributação por métodos indiciários, e nem demonstrou que a liquidação não podia assentar nos elementos dados pelo contribuinte.”
Mais refere o recorrente:
“O recorrente, não apenas pôs em causa a base indiciária em que assentavam os pressupostos dos métodos indirectos tomados por base para avaliação indirecta, como provou a origem diversa das quantias das contas bancárias”.
Parece-nos desde já que o recorrente carece de razão.
Na verdade, e como resulta da douta sentença o recurso pela AT aos métodos indirectos para apuramento dos rendimentos tributáveis mostra-se perfeitamente justificado e fundamentado, tal como ali se refere concluiu o tribunal “ …, tais elementos, analisados de forma conjugada e à luz das regras da experiência, sugerem fortemente que o Impugnante exercia uma actividade comercial nos anos em causa, sem que se encontrasse registado para efeitos fiscais, omitindo assim a declaração dos rendimentos auferidos no âmbito do exercício daquela actividade, pelo que não sendo possível a quantificação exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável, mostram-se efectivamente reunidas as condições para a utilização do método de avaliação indirecta”.
Parece-nos, pois que a douta sentença não merece qualquer reparo pelo que concordando, por inteiro, com os seus termos e fundamentos, é nosso parecer que o recurso deve improceder.»
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO: QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações:
I- Se a sentença padece de nulidade porque o tribunal a quo não quis decidir sobre as questões das nulidades, caducidades, prescrições e outros de notória e obrigatória pronúncia [art. 615.º., n.º1, al. d), do CPC] e se a sua fundamentação fáctica é obscura ao tentar justificar a improcedência da impugnação [art. 615.º, n.º1, als. c) e d)]
II- Se a sentença fez uma valoração acrítica do vertido pela Inspeção Tributária.
III-Saber se a decisão no âmbito da comissão de revisão se não encontra fundamentada, não demonstrou que estavam verificados os pressupostos para aplicação dos métodos indiretos de determinação da matéria coletável, no que respeita à base indiciária, e, bem assim, quanto à sua quantificação porquanto justificou a origem das quantias constantes das contas bancárias.
*
3. FUNDAMENTOS DE FACTO
Em sede de probatório, a 1.ª Instância fixou os seguintes factos:
«1) A coberto das Ordens de Serviço números OI2009.....32 e OI2009....33, foi iniciado um procedimento inspectivo de âmbito geral ao Impugnante para os exercícios de 2005, 2006 e 2007 – cfr. fls. 6 do processo administrativo apenso aos autos (doravante PA).
2) O procedimento inspectivo teve origem numa informação remetida à Direcção de Finanças ... pelos Serviços do Ministério Público de ... acompanhada de uma certidão retirada do processo identificado pelo n.º ...1/04.5.... – cfr. fls. 6 e 7 do PA.
3) Através de ofício datado de 15.07.2009, o Impugnante foi notificado para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projecto de relatório de inspecção tributária, o que fez através de requerimento cujo teor consta de fls. 68 a 72 do suporte físico dos autos e se dá aqui por reproduzido – cfr. fls. 1 a 20 do PA.
4) Em 24.08.2009, foi elaborado o relatório de inspecção, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, incluindo os respectivos anexos – cfr. fls. 24 a 47 do PA.
5) Na sequência das conclusões do relatório de inspecção, foi fixada matéria colectável de IRC, por métodos indirectos, conforme segue:
Anos 2005 2006 2007
Matéria Tributável €8.034,40 €4.235,40 €6.234,10
[cfr. fls. 36 do PA]
6) Na sequência das conclusões do relatório de inspecção, foi efectuado o apuramento do imposto (IVA) considerado em falta, conforme quadro que segue:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. fls. 36 do PA].
7) Em 07.10.2009, o Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos – cfr. fls. 50 a 53 do PA.
8) No dia 28.10.2009, teve lugar a reunião para apreciação do pedido de revisão da matéria colectável, extraindo-se da respectiva acta que “perante a impossibilidade de celebrar um acordo, com a consequente inutilidade do prosseguimento do debate, deu-se o mesmo por concluído, mantendo-se as quantificações efectuadas” – cfr. fls. 57 e 58 do PA.
9) Por decisão de 25.11.2009, o Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças ... indeferiu o pedido de revisão da matéria colectável, extraindo-se da respectiva fundamentação o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. fls. 69/72 do PA].
10) A decisão referida no ponto anterior foi notificada ao impugnante em 27.11.2009 – cfr. fls. 73/74 do PA.
11) Em consequência das correcções à matéria tributável referidas no ponto 5, foram emitidas em 12.12.2009 liquidações adicionais de IRC e respectivos Juros Compensatórios, nos seguintes montantes:
2005 €1.020,41
2007 €1.509,85

– cfr. doc. 1 junto com a PI da impugnação nº 861/10.5BEBRG e doc. 1 junto com a PI da impugnação nº 670/10.1BEBRG.
12) Em consequência dos valores apurados referidos no ponto 6, foram emitidas em 12.12.2009 as liquidações adicionais de IVA e respectivos Juros Compensatórios, relativas aos anos de 2005, 2006 e 2007, no montante global de €19.027,36 – cfr. doc. 1 junto com a contestação da impugnação nº 1059/10.8BEBRG.
Mais se provou que:
13) Em 2007, o Impugnante auferiu €8.518,08 de rendimentos de trabalho dependente – cfr. fls. 63 do PA (nota 1 do quadro do capítulo 1.4) e declaração de rendimentos respeitante ao ano de 2007 (cfr. fls. 64/65 do suporte físico dos autos).
14) Em 30.10.2008, foi proferida sentença, transitada em julgado, no processo ...1/04.5.... (a que se alude no ponto 2), da qual se extrai o seguinte:


[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]” – cfr. certidão de fls. 103 e ss. do suporte físico dos autos.
Factos não provados:
No período a que se reportam as liquidações impugnadas (2005, 2006 e 2007), o Impugnante não exercia qualquer actividade profissional, nomeadamente, de comercialização de artigos de vestuário.
*
III.2 MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
A decisão da matéria de facto provada efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos e do processo administrativo apenso constam, tudo conforme referido a propósito de cada um dos pontos do probatório.
O facto não provado resultou da falta de elementos de prova que confirmassem a sua veracidade, não se mostrando relevante a inscrição do Impugnante no Centro de Emprego ..., designadamente no período de 15.09.2003 a 25.08.2006 (cfr. fls. 63 do suporte físico dos autos), nem o facto de não ter apresentado declarações de rendimentos nos anos de 2005 e 2006, atenta a possibilidade de aquela actividade ser exercida clandestinamente.»
*
4.APRECIAÇÃO JURÍDICA DO RECURSO

4.1.O recorrente invoca uma panóplia de vícios formais à sentença, os quais a verificarem-se conduzem à nulidade da sentença.
Imputa, desde logo, omissão de pronúncia sobre a caducidade do direito de a AT liquidar, prescrição das dívidas e, ainda, a inspeção ter excedido o prazo máximo de 6 meses a contar da notificação, bem assim, a nota de diligências não indicar as tarefas realizadas, consubstanciando em si um vício de forma do procedimento.
Não obstante,
Como já esclarecido o recurso está limitado às questões concretas suscitadas no recurso, sendo sobre estas que o tribunal ad quem tem de se pronunciar, para além destas as que são do conhecimento oficioso do tribunal.
Ora as questões suscitadas que o recorrente entende que o tribunal não se pronunciou, apenas uma é do conhecimento oficioso, as demais não são do conhecimento oficioso, tal como a caducidade Ac. STA, de 23-06-2021, no processo n.º 01866/05 BEPRT; Ac. TCAN de 17-02-2022, no processo 01638/08BEPRT do direto de liquidar e os vícios procedimentais no âmbito inspetivo, como passaremos a explicar.
No que tange à sentença não há qualquer omissão na medida em que o tribunal a quo afastou o seu conhecimento por exorbitar o âmbito do que havia sido alegado na p.i..
Contudo, sendo a prescrição do conhecimento oficioso, no âmbito da impugnação não se impõe ao tribunal conhecer dela por não ser fundamento de impugnação, isto é, a prescrição não tem por objeto um ato tributário, a sua ilegalidade ou vício, com vista anulação da liquidação.
A prescrição da obrigação tributária [da dívida exequenda] embora do conhecimento oficioso [art. 175º do CPPT] não é fundamento de impugnação judicial, mas de oposição fiscal [art. 204º, n. º1. al. d)] As normas citadas são as que vigoravam à data da remessa do processo ao tribunal tributário..

Não obstante, tem sido jurisprudência unânime Por todos, os Acs. do STA de 12-06-2007 no recurso 0291/07 1174/11 de 2/5/2012 e de 18/6/2013 no recurso 07252, disponíveis em www.dgsi.pt
poder ser conhecida a título incidental, se o processo dispor de elementos bastantes para o efeito, considerando que em termos processuais pode levar à inutilidade da lide impugnatória, não tendo reflexos ao nível da relação substancial respetiva, poderá a decisão da impugnação ter alcance prático, a sua continuação será uma pura inutilidade.
No caso não é possível afirmar haver elementos que permitam avançar no conhecimento da prescrição no sentido de concluir-se pela inutilidade impugnatória, aliás, no processo n.º 1059/10 que se iniciou como oposição à execução fiscal, nunca o recorrente aventou a prescrição da dívida e dele não resultam elementos que autorizem essa análise.
É evidente que o Recorrente tem o direito ou interesse juridicamente protegido em que seja declarada judicialmente a prescrição, caso se verifiquem os respetivos pressupostos.

Mas essa posição subjetiva terá que ser feita valer no âmbito do processo de execução que se encontra pendente.

Já a caducidade do direito à liquidação é um vício gerador de ilegalidade do ato, na medida em que consubstancia a prática de um ato tributário ferido de vício de violação de lei, o que gera uma mera anulabilidade e não nulidade do ato, devendo ser invocado pelo contribuinte na petição inicial.
Deste modo, improcede este segmento das conclusões do recurso, quer porque não é possível apreciar a prescrição quer porque os demais vícios não foram apreciados pelo tribunal a quo e não são do conhecimento oficioso, não havendo, assim, omissão de pronúncia.

Por fim, imputa obscuridade à sentença, contudo não concretiza esse vício.
Da sentença resulta a descriminação dos factos provados e não provados e a análise crítica da prova através da motivação que estruturou o julgamento de facto, num claro silogismo judiciário sem que se detete qualquer obscuridade.

O recorrente, no recurso, vem ainda afirmar que a AT não atendeu aos princípios da igualdade e proporcionalidade, mas também aqui não concretiza como é que a AT na inspeção e na sua atuação violou os princípios da igualdade e proporcionalidade, parece fazer crer que o facto de tão terem sido atendidos os argumentos de que as contas eram unicamente da sua vida privada, que os movimentos respeitavam a empréstimos e de que se encontrava reformado pelo sistema social francês e, em Portugal, encontrava-se na situação de desempregado, não foi tratado como os demais sujeitos passivos e que as correções foram muito para além da sua concreta situação.
Na avaliação o recorrente foi chamado a participar e requereu a revisão da avaliação indireta efetuada pela AT.
A concreta situação foi analisada pela sentença quando apreciou a fundamentação acionada pela AT quanto aos pressupostos da aplicação dos métodos indiretos quer ainda quanto à quantificação da matéria coletável, como se verá na apreciação do erro de julgamento que imputa à sentença.

4.2.O recorrente imputa erro de julgamento porquanto o tribunal a quo fez uma valoração acrítica do que foi coligido pela inspeção, não se encontrando fundamentada a decisão de aplicação dos métodos indiretos e sua quantificação.

Antes demais, importa dilucidar, que o que fundamenta e delimita a liquidação impugnada, uma vez que a matéria coletável foi determinada por forma indireta ou presuntiva, é, pois, a decisão do diretor [enquanto ato que define os pressupostos e o quantum do tributo] no âmbito do procedimento de revisão que se abriu com o requerimento do sujeito passivo.

De facto, no seu requerimento o recorrente, em sede procedimento de revisão, suscitou que o quantum de 2007 está erroneamente calculado, nada haveria que aditar a título de proveitos do recorrente já que os valores de 31.000,00€ correspondiam a reembolsos de empréstimos concedidos a «BB»; o recorrente não exercia atividade profissional de comércio a retalho de vestuário e que tudo se baseou num auto de apreensão no âmbito de uma investigação penal de contrafação de roupa; ao analisar as contas bancárias do recorrente entre 2005 e 2007, a AT, apesar de ter detetado movimentos cuja a proveniência foi identificada a origem, detetou outros movimentos cuja origem não foi identificada, apenas confirmou que provinham de sujeitos passivos coletados em atividade de comércio a retalho de têxteis, [alguns deles também envolvidos em processo por venda de têxteis contrafeitos], valores que entraram nas suas contas a crédito (depósitos e transferência), no valor de 31.000,00.

Não aceita que para cálculo das vendas tenha sido considerado o valor dos movimentos de 31.000,00 em face da espaçada e rara frequência dos valores que deram entrada nas suas contas nos três anos [2005 a 2007], considerando que tinha um bom relacionamento com o Sr. «BB», não tem aderência à realidade tratarem-se de transações comerciais, pelo que deveria ser expurgado para efeitos de determinação da matéria coletável.

Contudo a decisão do diretor assentou, sucintamente, no facto de os valores detetados no procedimento inspetivo terem origem no acesso às contas bancárias do sujeito passivo através do competente levantamento do sigilo bancário, não tendo demonstrado o s.p. que aquelas quantias provinham de empréstimos feitos ao Sr. «BB», nenhum documento apresentou nesse sentido, que não é verosímil a inexistência de um documento e a falta de colaboração do contribuinte não permitiu identificar uma justificação para os incrementos patrimoniais, para além de terem origem numa atividade comercial não declarada.

Do que se vem de expor torna-se, pois, claro, que as correções estão fundamentadas quer do ponto de vista formal quer do ponto de vista substancial, não só o recorrente percebeu e acompanhou o raciocínio da AT, como esta elencou e explicitou as razões que lhe permitiram concluir que não era possível determinar de forma direta a matéria coletável do contribuinte porque este além de omitir a existência de uma qualquer atividade, também, não prestou qualquer colaboração, apenas o acesso às suas contas bancárias possibilitou encontrar fluxos financeiros relacionados com comerciantes de têxteis, considerando, ainda, que foi apanhado com roupa contrafeita no seu veículo junto às instalações nas quais foi apreendida a roupa, armazém pertencente a «BB».

Na determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação [art. 74º, n. º3 da LGT] ora da fundamentação adotada pela AT resultam motivos pelos quais se deve considerar legalmente justificado o recurso ao método indireto, indiscutivelmente, ficou demonstrada a impossibilidade de ela ser realizada pelo método que a lei elege como o primacial, a avaliação direta, segundo os critérios próprios do IRS e do IVA [art. 81.º da LGT], tendo que ser acionados os arts. 87.º, n. º1, al. b) e 88.º n. º1, al. a) da LGT, ou seja, a avaliação indireta, realizada com base em indícios e presunções ou outros elementos que a administração disponha.
Neste conspecto a sentença, em face dos factos coligidos e não contraditados, discreteou de modo que não nos oferece reparo, para o que fundamentou de modo seguinte: (…)Resulta do relatório de inspecção que a AT considerou estarem reunidos os pressupostos para a determinação da matéria colectável através de métodos indirectos, de acordo com o disposto na alínea b) do artigo 87º e alínea a) do artigo 88.º da LGT, com base nos seguintes elementos:
- O teor da certidão retirada do processo ...1/04.5...., que identificava como fornecedor de mercadorias contrafeitas o ora Impugnante (“Consta do auto de notícia da Guarda Fiscal que o sujeito passivo («AA») assumiu que se encontrava no local a vender os referidos casacos (…)”), mais referindo que na viatura do Impugnante foram detetados vários documentos relacionados com a comercialização de artigos de vestuário;
- O resultado da análise dos movimentos das contas bancárias de que é titular o Impugnante:
• O sujeito passivo efectuou diversos movimentos a crédito e a débito da conta não compatíveis com os rendimentos auferidos nos diversos anos (na conta nº ... foram movimentados a crédito 103.194,78€ nos três exercícios e na conta nº ... foram movimentados a crédito 55.470,00€ nos três exercícios).
• Efectua diversos depósitos em numerário não sendo possível identificar a origem do dinheiro.
• Efectua diversos levantamentos em numerário não sendo também possível identificar o destino do dinheiro.
• Efectua diversos depósitos de cheques emitidos por entidades ou indivíduos com os quais afirma não ter tido qualquer relação comercial, desconhecendo a que se deve tal movimento, mas que estará relacionado com empréstimos que tem efectuado a diversas pessoas.
- Apurou, ainda, a administração fiscal que os sujeitos passivos identificados através dos documentos bancários exercem actividade de comércio de têxteis.
Ora, tais elementos, analisados de forma conjugada e à luz das regras da experiência, sugerem fortemente que o Impugnante exercia uma actividade comercial nos anos em causa, sem que se encontrasse registado para efeitos fiscais, omitindo assim a declaração dos rendimentos auferidos no âmbito do exercício daquela actividade, pelo que não sendo possível a quantificação exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável, mostram-se efectivamente reunidas as condições para a utilização do método de avaliação indirecta.
Argumenta, todavia, o Impugnante que foi proferida sentença no processo ...1/04.5...., absolvendo-o dos factos de que foi acusado, pelo que a decisão de fixação da matéria tributável por métodos indirectos não pode ser fundamentada numa acusação da qual o impugnante foi julgado inocente.
Ora, tal como refere o Ministério Público, a aludida sentença não só nada prova do que alega o autor como, ao invés, corrobora as suas actividades fiscalmente ilícitas. Na verdade, os factos descritos nos pontos 8 e 9 do respectivo probatório permitem com segurança inferir que ele transportava quantidades assinaláveis de mercadoria contrafeita para o armazém onde era aguardado pelo co-arguido «CC». De resto, a leitura atenta da sentença logo permite concluir facilmente que a decisão absolutória resultou tão só da falta de prova do elemento subjectivo do crime e não dos factos objectivos em si mesmos.
Assinale-se, ainda, que a decisão de aplicação de métodos indirectos não assentou na mera análise dos movimentos bancários, mas sim na conjugação dessa análise com os elementos recolhidos no inquérito criminal e com o facto de os sujeitos passivos identificados através dos documentos bancários exercerem a actividade de comércio de têxteis, mostrando-se dessa forma cumprido o ónus probatório que recaía sobre a administração fiscal.
Competia, pois, ao Impugnante demonstrar que os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos não se verificavam, ou seja, que não exerceu a actividade de venda de artigos de vestuário nos anos em causa, o que não logrou fazer, como se encontra evidenciado no probatório.

A sentença que assim decidiu não merece reparo pelo que terá de ser confirmada.
*
5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção Comum do Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo do recorrente.
Notifique-se.

Porto, 23 de maio de 2024

Cristina da Nova
Rui Esteves
Irene Neves (em substituição)