Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00234/24.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/12/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:ROSÁRIO PAIS
Descritores:RAC;
FUNDAMENTOS DE RECLAMAÇÃO DO ATO DE PENHORA;
Sumário:
I – A reclamação prevista no artigo 276º do CPPT apenas pode ter como objeto atos materialmente administrativos praticados no âmbito do processo de execução fiscal, pelos órgãos da AT, sendo que os atos de penhora apenas são passíveis de reclamação com um dos fundamentos previstos no artigo 278º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 784º do Código de Processo Civil.

II - Não é possível conhecer nesta reclamação quaisquer vícios da liquidação exequenda ou qualquer fundamento que seja próprio do processo de oposição.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. «AA», devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida em 09.02.2024 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi LIMINARMENTE INDEFERIDA a reclamação que deduziu na sequência da notificação da penhora com o nº ....................714.

1.2. O Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
«A. O PRESENTE RECURSO VEM INTERPOSTO DA DOUTA SENTENÇA PROFERIDA NO ÂMBITO DO PROCESSO DE RECLAMAÇÃO JUDICIAL N.º 234/24.2BEPRT, DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO, REFERENTE AO ATO DE PENHORA EM VALORES MOBILIÁRIOS E CONTAS BANCÁRIAS CONCRETIZADO PELA ORDEM DE PENHORA N.º ....................714 NO MONTANTE DE € 11.860,03.
B. SALVO MELHOR ENTENDIMENTO, NÃO PODERÁ O ENTENDIMENTO VERTIDO NA DOUTA SENTENÇA RECORRIDA PROCEDER DE MODO ALGUM, CONTANTO SEREM CONFUNDIDOS CONCEITOS DE DIREITO, NOMEADAMENTE, E TECNICAMENTE, ENTRE O QUE DISPÕE O ARTIGO 276.º DO CPPT E O QUE CONSAGRA O ARTIGO 278.º DO CPPT, E ENTRE O QUE PODE SER FUNDAMENTO DE UMA PENHORA ILEGAL.
C. O ARTIGO 276.º DO CPPT PREVÊ A POSSIBILIDADE DE IMPUGNAÇÃO DE QUAISQUER DECISÕES DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL OU DE OUTRAS AUTORIDADES DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA QUE AFETEM OS DIREITOS OU INTERESSES LEGÍTIMOS DO EXECUTADO OU DE TERCEIROS
D. PODEM, PORTANTO, SER OBJETO DA IMPUGNAÇÃO QUAISQUER DECISÕES DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL QUE AFETEM DIREITOS OU INTERESSES LEGALMENTE PROTEGIDOS DOS INTERESSADOS.
E. ASSIM, ESTA RECLAMAÇÃO ESTÁ IGUALMENTE PREVISTA NO N.º 2 DO ARTIGO 103.º DA LGT QUE ESTABELECE QUE É GARANTIDO AOS INTERESSADOS O DIREITO DE RECLAMAÇÃO PARA O JUIZ DA EXECUÇÃO FISCAL DOS ATOS MATERIALMENTE ADMINISTRATIVOS PRATICADOS POR ÓRGÃOS DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA,
F. CONCLUI-SE ASSIM QUE É RECONHECIDO ESSE DIREITO DE OS PARTICULARES SOLICITAREM A INTERVENÇÃO DO JUIZ NO PROCESSO RELATIVAMENTE A QUAISQUER ATOS PRATICADOS NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA QUE TENHAM POTENCIALIDADE LESIVA.
G. TANTO MAIS QUE PARA «BB» A IMPORTÂNCIA DESTA RECLAMAÇÃO DECORRE DO FACTO DESTE MEIO PROCESSUAL SER MUITAS VEZES O ÚNICO MEIO A UTILIZAR.
H. O FACTO DE CONSTITUIR FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO JUDICIAL A SUSTENTAÇÃO DE QUE O RECLAMANTE NÃO É PARTE LEGÍTIMA NA EXECUÇÃO FISCAL EM CAUSA (SENDO A PARTE LEGÍTIMA A SUA MASSA INSOLVENTE), NÃO INVALIDA O FACTO DE TAL VIR A SER MENCIONADO NA RECLAMAÇÃO APRESENTADA, QUANDO É O ÚNICO MEIO PROCESSUAL À DISPOSIÇÃO.
I. EM BOM RIGOR, AO NÍVEL DO PRAZO DE INTERPOSIÇÃO, DAS FORMALIDADES DA PETIÇÃO INICIAL E DOS SEUS FUNDAMENTOS, A OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL DEVE OBEDECER A REQUISITOS ESPECÍFICOS, EM GRANDE PARTE ATINENTES AO PRAZO DE INTERPOSIÇÃO.
J. NA VERDADE, DE ACORDO COM AS ALÍNEAS A) E B) DO N.º 1 DO ARTIGO 203.º DO CPPT, A OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL DEVE SER APRESENTADA NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS A CONTAR DA CITAÇÃO PESSOAL, OU, NÃO A TENDO HAVIDO, DA PRIMEIRA PENHORA, BEM COMO DA DATA EM QUE TIVER OCORRIDO O FACTO SUPERVENIENTE OU DO SEU CONHECIMENTO PELO EXECUTADO.
K. É DE SALIENTAR QUE O PRAZO DE APRESENTAÇÃO DA OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO CONSTITUI UM PRAZO DE NATUREZA JUDICIAL, NA MEDIDA EM QUE ESTA INSERIDO NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL QUE, COMO SABEMOS, ASSUME IGUALMENTE UMA NATUREZA JUDICIAL – NESTES TERMOS, SALVO MELHOR ENTENDIMENTO, NÃO PODERIA SER USADA A OPOSIÇÃO, PRECISAMENTE POR NÃO SE ESTAR EM PRAZO PARA TAL.
L. ASSIM, SALVO MELHOR ENTENDIMENTO, NÃO ESTAMOS, AGORA, EM MOMENTO DE APRESENTAÇÃO DE OPOSIÇÃO JUDICIAL – O QUE MOTIVA A APRESENTAÇÃO DE RECLAMAÇÃO.
M. E ASSIM, REFORÇA-SE QUE RELATIVAMENTE AOS ATOS QUE PODERÃO SER OBJETO DE RECLAMAÇÃO NOS TERMOS DO ARTIGO 276.º DO CPPT, ESTES SERÃO ATOS QUE EXTERIORIZEM DECISÕES DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL E QUE AFETAM DIREITOS E INTERESSES LEGÍTIMOS DO EXECUTADO, COMO BEM INDICA FREITAS DA ROCHA.
N. VERIFICA-SE A CONSAGRAÇÃO DE UM “DIREITO DE ARREPENDIMENTO” DA ADMINISTRAÇÃO QUE PODERÁ REVOGAR UM ATO ANTES DA SUA APRECIAÇÃO JUDICIAL, EM PROL DA CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL – NÃO QUIS A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA MANIFESTAR ESTE ARREPENDIMENTO E REPOR A LEGALIDADE.
O. NA SUA ATUAÇÃO A AUTORIDADE TRIBUTARIA ESTA VINCULADA PELO PRINCIPIO DA VERDADE MATERIAL; ORA, SENDO O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL UM PROCESSO CRESCENDO, A TODO O TEMPO, PODERÃO E DEVERÃO SER SUSCITADAS MATÉRIAS PASSÍVEIS DE DETERMINAR UMA ATUAÇÃO DIVERSA; E NÃO UMA COBRANÇA CEGA – NOMEADAMENTE ATRAVÉS DO MEIO EXPEDIDO.
P. NÃO PODE, ADEMAIS, PROCEDER O ENTENDIMENTO DE QUE O ARTIGO 278.º, N.º 3 DO CPPT E O 713.º CO CPC SE REFERE A FUNDAMENTOS DE ILEGALIDADE DA PENHORA.
Q. NA VERDADE, FALA-SE, SIM, DA ARGUIÇÃO DE UM PREJUÍZO IRREPARÁVEL E DOS FUNDAMENTOS ENUNCIADOS PARA O EFEITO E QUE LEVAM A QUE OCORRA UMA SUBIDA IMEDIATA A JUÍZO DA RECLAMAÇÃO – NUNCA, REFORCE-SE, DE FUNDAMENTOS DE ILEGALIDADE DA PENHORA.
R. NO CASO CONCRETO, TRATANDO-SE DE UM PROCESSO NASCIDO DE UMA DÍVIDA NÃO PAGA E CUJA GARANTIA NÃO FOI PRESTADA, É UM PROCESSO QUE SERÁ NATURALMENTE INQUINADO SE A SUA ANTERIORIDADE E DÍVIDA SUBJACENTE FOR ILEGAL.
S. NA VERDADE, O RECORRENTE NÃO RECONHECE A DÍVIDA COMO SUA TENDO, PARA O EFEITO, APRESENTADO RECLAMAÇÃO GRACIOSA E RECURSO HIERÁRQUICO – QUE SE ENCONTRA PENDENTE HÁ LARGOS ANOS, NUMA INACREDITÁVEL INÉRCIA ADMINISTRATIVA POR PARTE DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA.
T. VIU-SE CONFRONTADO COM A EXISTÊNCIA DE UM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL INVALIDAMENTE NASCIDO, ASSACADO DE ILEGALIDADE DESDE INÍCIO.
U. DE ONDE RESULTA, ALIÁS, A PRÓPRIA ILEGALIDADE DA PENHORA, POIS QUE NÃO SENDO A DÍVIDA DIRETAMENTE EXIGÍVEL AO RECORRENTE, NÃO É, POR CONSEGUINTE, A PENHORA LEGAL, SENDO POR DEMAIS EVIDENTE O PREJUÍZO IRREPARÁVEL CAUSADO POR ESTA PENHORA ILEGALMENTE NASCIDA.
TERMOS EM QUE, COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXAS., E EM FACE DA MOTIVAÇÃO ENUNCIADA, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E, EM CONSEQUÊNCIA, SER ORDENADA
(I) A SUBSTITUIÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA POR OUTRA QUE ADMITA A APRECIAÇÃO E PROPRIEDADE DO MEIO PROCESSUAL EXPEDIDO, E
(II) JULGADA PROCEDENTE A RECLAMAÇÃO APRESENTADA, POR A DÍVIDA EM CRISE NÃO SER DEVIDA PELO RECORRENTE.»

1.3. A Recorrida Fazenda Pública notificada do presente recurso não apresentou contra-alegações.


1.4. O DMMP junto deste TCAN teve vista dos autos e emitiu parecer, concluindo que o recurso deve improceder, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica.

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Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 36º, nº 2, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma do erro de julgamento de direito que lhe vem apontado, ao considerar que não vem invocada qualquer das ilegalidades da penhora previstas no artigo 278º, nº 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 713º do Código de Processo Civil e que a ilegitimidade passiva do sujeito passivo do imposto constitui fundamento de oposição que, por isso, não pode ser apreciado na reclamação prevista no artigo 276º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

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3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
A sentença recorrida não autonomizou a factualidade que relevou para a decisão, pelo que passamos a transcrever a respetiva fundamentação:
«(…)
Constata-se da petição inicial da presente reclamação judicial que esta foi apresentada na sequência de um acto de penhora. Sucede que, não obstante o ora reclamante ter vindo na sequência da concretização da penhora de valores mobiliários e contas bancárias, deduzir a presente reclamação judicial, requerendo o cancelamento dessa penhora e a anulação do acto [de penhora] reclamado, sobressai evidente que não foi assacada qualquer ilegalidade ao acto de penhora.
Com efeito, são fundamentos de ilegalidade do acto de penhora os que se encontram expressamente referidos nos artigos 784.º, n.º 1 do Código de Processo Civil2 e 278.º, n.º 3 do CPPT, a saber: 1) a inadmissibilidade dos bens concretamente penhorados [cfr. artigo 278.º, n.º 3, alínea a), 1.ª parte do CPPT e artigo 784.º, n.º 1, alínea a), 1.ª parte do CPC]; 2) a indevida extensão da penhora [prevista no artigo 278.º, n.º 3, alínea a), 2.ª parte do CPPT e artigo 784.º, n.º 1, alínea a), 2.ª parte do CPC]; 3) a imediata penhora de bens que só subsidiariamente responderiam pela dívida exequenda [cfr. estipulado no artigo 278.º, n.º 2 do CPPT e artigo 784.º, n.º 1, alínea b) do CPC] e 4) a incidência da penhora sobre bens que não deveriam ter sido abrangidos pela diligência, por não responderem nos termos do direito substantivo [cfr. artigo 278.º, n.º 3, alínea c) do CPPT e artigo 784.º, n.º 1, alínea c) do CPC].
Ora, do teor da petição inicial e das suas conclusões constata-se que o reclamante vem sustentar a sua pretensão, alicerçada, em suma, na alegação de que a dívida exequenda é proveniente de mais-valias geradas pela alienação de um imóvel que integra a massa insolvente, sendo, por isso, uma dívida da responsabilidade da Massa Insolvente e não imputável ao ora reclamante.
Perante esta alegação constata-se que vem invocado, como fundamento da presente reclamação judicial, a ilegitimidade substantiva do reclamante para a presente execução fiscal, por não ser responsável pelo pagamento da dívida exequenda, mas sim a sua Massa Insolvente.
Ora, a sustentação de que o reclamante não é parte legítima na execução fiscal em causa [que parte legítima é a Massa Insolvente] constitui fundamento de oposição judicial, ao abrigo do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT e não fundamento da presente reclamação judicial.
Nesta conformidade, não sendo a ilegitimidade substantiva do reclamante para a execução fiscal em causa fundamento da reclamação judicial prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT e não sendo assacada qualquer ilegalidade das supramencionadas ao acto de penhora, terá que se concluir que a presente acção se encontra destituída de fundamento, o que conduz, inelutavelmente, ao indeferimento liminar da petição inicial da presente reclamação judicial, o que se determinará a final.».

3.2. DE DIREITO
Se bem percebemos, o Recorrente sustenta neste recurso, em resumida síntese, que a reclamação prevista e regulada pelo artigo 276º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário pode ter qualquer fundamento, designadamente a sua ilegitimidade para a execução fiscal, uma vez que já não está em prazo para deduzir oposição.
Nos termos do disposto no artigo 103°, nº 2, da Lei Geral Tributária (LGT) e 276º do CPPT, a intervenção dos órgãos da administração tributária no processo de execução fiscal está sujeita a um apertado controle de legalidade, reconhecendo a lei aos interessados o direito de solicitarem a intervenção do titular judicial do processo (o juiz, pois que se trata de um processo judicial, no qual os órgãos da administração intervém na realização de atos sem natureza jurisdicional), através da reclamação prevista no artigo 276° do CPPT, relativamente a todos os atos que tenham potencialidade lesiva, ou seja, que tenham capacidade de afetar a esfera jurídica do executado ou de terceiros.
Mas é de salientar que este controlo judicial é dirigido às «decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária» no âmbito do processo de execução fiscal.
Ora, desde logo, o ato que o Recorrente pretende sindicar nesta reclamação é o ato de liquidação, com fundamento no facto de a dívida exequenda ser da responsabilidade da sua massa insolvente.
Com efeito, não é contestado que o Recorrente figura no título executivo, que a liquidação exequenda foi emitida em seu nome e que a execução fiscal foi contra si originalmente instaurada. Daí que, como se refere no acórdão deste TCAN de 07/12/2005, rec. 00364/04, disponível para consulta em http://www.gde.mj.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/ece00941af7c1747802570dc0036287c?OpenDocument:
«1. Quando o oponente figura no título executivo como devedor só pode, eventualmente, discutir o 3º tipo de ilegitimidade previsto na alínea b) do art. 204º do CPPT, não lhe sendo permitido servir-se da oposição para demonstrar a sua ilegitimidade por falta de responsabilidade pela dívida exequenda.
2. Porém, reconduzindo-se esse 3º tipo de legitimidade à falta de posse dos bens que originaram a dívida exequenda, ela só poderá verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o rendimento e fruição dos respectivos bens, nas quais o sujeito passivo é o possuidor dos bens móveis ou imóveis sobre os quais incide o imposto, (…).», o que não é o caso do IRS.
No entanto, a reclamação contra o ato de penhora apenas pode ter por fundamento vícios próprios desse ato, elencados, como bem se refere na sentença recorrida, nos artigos 278º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 784º do CPC, pelo que os vícios do ato de liquidação não podem ser apreciados em sede da reclamação prevista do artigo 276º do CPPT, nem, de resto, qualquer fundamento que seja próprio do processo de oposição.
Tal é o que decorre do artigo 97º, nº 2, da LGT que, em sintonia com o artigo 2º, nº 2, do Código de Processo Civil, estatui que «A todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo.», frisando a ideia que não está na disponibilidade da parte interessada/contribuinte escolher o meio processual ou o momento para fazer valer os seus direitos. Aliás, a garantia da tutela jurisdicional efetiva (que implica o direito de acesso aos tribunais para defesa de direitos individuais, não podendo as normas que modelam este acesso obstaculizá-lo ao ponto de o tornar impossível ou dificultá-lo de forma não objetivamente exigível) não é incompatível com a definição de meios processuais, prazos para exercício de direitos e restrições ao recurso jurisdicional.
Em suma, a reclamação prevista no artigo 276º do CPPT apenas pode ter como objeto atos materialmente administrativos praticados no âmbito do processo de execução fiscal pelos órgãos da AT, sendo que os atos de penhora apenas são passíveis de reclamação com um dos fundamentos previstos no artigo 278º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 784º do Código de Processo Civil. Ademais, não é possível conhecer nesta reclamação quaisquer vícios da liquidação exequenda ou qualquer fundamento que seja próprio do processo de oposição.
Na impossibilidade de aqui ser apreciado o fundamento invocado na p.i., por ser próprio de outro meio processual, resulta manifesta a improcedência da presente reclamação, donde que importa confirmar a sentença recorrida, no sentido do seu indeferimento liminar.
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Assim, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I – A reclamação prevista no artigo 276º do CPPT apenas pode ter como objeto atos materialmente administrativos praticados no âmbito do processo de execução fiscal, pelos órgãos da AT, sendo que os atos de penhora apenas são passíveis de reclamação com um dos fundamentos previstos no artigo 278º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 784º do Código de Processo Civil.

II - Não é possível conhecer nesta reclamação quaisquer vícios da liquidação exequenda ou qualquer fundamento que seja próprio do processo de oposição.

4. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do Recorrente que aqui sai vencido, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2 do Código de Processo Civil.

Porto, 12 de junho de 2024

Maria do Rosário Pais – Relatora
Cristina Paula Travassos de Almeida Bento Duarte – 1ª Adjunta
Ana Gomes Marques Goinhas Patrocínio – 2ª Adjunta