Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00473/19.8BEVIS |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
Data do Acordão: | 09/18/2020 |
Tribunal: | TAF de Viseu |
Relator: | Frederico Macedo Branco |
Descritores: | PRÉ-CONTRATUAL; OBRIGAÇÃO DE ADJUDICAÇÃO/NÃO ADJUDICAÇÃO; “UTILE PER INUTILE NON VITIATUR” |
Sumário: | 1 – Refere o artigo 76.º, n.º 1, do CCP, que “Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 79.º, o órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de adjudicação e notificá-la aos concorrentes até ao termo do prazo da obrigação de manutenção das propostas”. Em qualquer caso, resulta do referido normativo que se é certo que a entidade administrativa promotora do Concurso não tem o poder de, discricionariamente, optar por adjudicar ou não, ainda assim, nos termos do n.º 1 do artigo 79.º do CCP, tem o dever de não adjudicar. Nas restantes situações tem o dever de adjudicar. 2 – Com efeito, para além dos casos de não adjudicação previstos no Programa de Encargos de um dado concurso público, o artigo 79º do CCP permite à Administração, por razões de interesse público, desistir legitimamente de um concurso público. 3 - O princípio geral de direito que se exprime pela fórmula latina “utile per inutile non vitiatur”, princípio que também tem merecido outras formulações e designações (como a de princípio da inoperância dos vícios, a de princípio anti formalista, a de princípio da economia dos atos públicos e a de princípio do aproveitamento do ato administrativo), vem sendo reconhecido quanto à sua existência e valia/relevância pela doutrina e pela jurisprudência nacionais, admitindo-se que opere em certas circunstâncias. Tal princípio habilita o julgador, mormente, o juiz administrativo a poder negar relevância anulatória ao erro da Administração [seja por ilegalidades formais ou materiais], mesmo no domínio dos atos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do ato e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar, com inteira segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa, nomeadamente, ou porque não afetou as ponderações ou as opções compreendidas (efetuadas ou potenciais) nesse espaço discricionário, ou porque subsistem fundamentos exatos bastantes para suportar a validade do ato [v.g., derivados da natureza vinculada dos atos praticados conforme à lei], ou seja ainda porque inexiste em concreto utilidade prática e efetiva para o impugnante do operar daquela anulação visto os vícios existentes não inquinarem a substância do conteúdo da decisão administrativa em questão não possuindo a anulação qualquer sentido ou alcance. 4 - Não há lugar a adjudicação quando alguma circunstância superveniente ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, relativa aos pressupostos da decisão de contratar, o justifique, sendo que, em concreto, a decisão de não adjudicação resultou de constrangimentos de ordem técnica e financeira devidamente justificados e fundamentados. * * Sumário elaborado pelo relator |
Recorrente: | C., Lda. e Outra |
Recorrido 1: | Município de (...) |
Votação: | Unanimidade |
Meio Processual: | Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento aos recursos. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A C., Lda., intentou Processo de Contencioso Pré-Contratual, contra o Município de (...), tendo peticionado a impugnação dos atos de não adjudicação e de revogação do procedimento, praticados no âmbito do concurso público nº 21/2016, adotado para a formação do contrato de “Empreitada de requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”. Foi indicado como contrainteressada a T., Lda. Foi decidido em 1ª instância julgar a ação parcialmente procedente e, consequentemente: a) Julgar improcedente o pedido de anulação das decisões impugnadas nos presentes autos, que se mantêm válidas na ordem jurídica; b) Julgar improcedente o pedido de condenação do Réu à prática de ato devido; c) Julgar procedente o pedido de condenação do Réu a pagar à Autora montante indemnizatório, nos termos do previsto no nº 4 do artigo 79º do CCP, e cujo cálculo se relega para incidente de liquidação; e, d) Julgar procedente o pedido de condenação do Réu a extinguir de imediato a garantia bancária prestada pela Autora no âmbito do referido contrato de empreitada. Inconformada com a Sentença proferida no TAF de Viseu em 25/06/2020, veio a C., Lda., apresentar Recurso para esta instância, no qual concluiu: “(1) O presente recurso é interposto do douto despacho saneador-sentença de fls., datado de 25 de Junho de 2020, que, além do mais, julga improcedente o pedido de anulação das decisões impugnadas nos presentes autos – a saber, as decisões de não adjudicação de qualquer proposta e de revogação do concurso público (nº 21/2016) adotado pelo Recorrido para a formação do contrato de “Empreitada de requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”. (2) Salvo o devido respeito, pensa-se que o Tribunal a quo não fez boa interpretação e aplicação dos factos e do direito; (3) Concretamente, as decisões impugnadas nestes autos são manifestamente ilegais porquanto (4) Por um lado, o Recorrido as tomou sem conceder (nomeadamente, à Recorrente) a necessária oportunidade de participação prévia (artigo 121º/1 do CPA), e sem justificar qualquer conjeturada razão de dispensa dessa formalidade (artigo 124º/2 do CPA); e (5) Por outro lado, padecem (aliás, de forma que se crê ostensiva) de fundamentação insuficiente, o que equivale à sua falta (artigo 153º/2do CPA). (6) Neste enquadramento, ao contrário do entendimento perfilhado pelo douto despacho saneador sentença recorrido, as decisões sindicadas nestes autos são inválidas e devem ser anuladas – artigos 163º/1 e 168º do CPA –, o que se requer. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com o que, V. Excelências, Senhores Desembargadores, farão Justiça! Correspondentemente veio o Município de (...) apresentar Contra-alegações, nas quais concluiu: “A) A Recorrente questiona a legalidade das decisões dos autos com fundamento em duas ordens de razões: (i) preterição do direito de audiência prévia e (ii) falta de fundamentação; Ora, saldo o devido respeito por opinião diversa, entende o Município recorrido que não se verificam in casu nenhum dos dois invocados vícios; B) O artigo 76.º, n.º 1, do CCP, prescreve o seguinte “Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 79.º, o órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de adjudicação e notificá-la aos concorrentes até ao termo do prazo da obrigação de manutenção das propostas”. C) É assim de conceber a ideia de um dever de não adjudicação no caso de verificação de um dos fundamentos legais, situação em que não só o princípio da legalidade, como o princípio da competência, previstos nos artigos 266º, nº 2 da Constituição e 3º do CPA, o impõe, como a finalidade do procedimento pré-contratual o deve ditar, isto é, numa lógica de correta prossecução do interesse público, fora do domínio da autonomia da vontade. D) No caso em apreço não só existe uma situação de interesse público devidamente fundamentado que justifica aquela alteração da decisão de contratar, como a desistência de contratar se deveu a causas supervenientes àquela decisão. E) Encontram-se assim preenchidos os requisitos legais para aplicação do disposto no artigo 79 n.º 1 alínea d) do CCP pelo que o Recorrido tinha não só o poder mas, sobretudo, o dever de proferir decisão de não adjudicação; F) Assim, face ao quadro factual e normativos pertinentes sendo a decisão tomada, a única possível, independentemente da argumentação que viesse a ser utilizada pela Recorrente em sede de audiência prévia, deve considerar-se que se operou a degradação em não essencial da formalidade cuja essencialidade conduziria, em regra, à anulação do ato. G) Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do ato a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las; H) Na realidade, afigurar-se-ia de inútil a participação prévia dos interessados, porquanto as razões de interesse público que motivaram a decisão impugnada em nada sairiam alteradas, fosse qual fosse o teor da participação daqueles, concretamente, da Recorrente. I) Efetivamente, e apesar de estar o ato sob sindicância imbuído de margem de discricionariedade, as razões que o sustentam não se prendem diretamente com questões atinentes aos participantes no concurso, mas sim às referidas circunstâncias supervenientes, exteriores às partes, e que alteraram os pressupostos que estiveram na base da decisão de contratar. J) Consequentemente, será de afastar o efeito invalidante do vício de preterição de audiência prévia, aplicando-se o princípio do aproveitamento do ato administrativo (neste sentido, e numa situação em tudo semelhante, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 19/01/2012, P. 08222/11, disponível em www.dgsi.pt); K) Ademais, e salvo o devido respeito por opinião distinta, não faz qualquer sentido que, após a tomada de decisão de não adjudicação ao abrigo do disposto na alínea d) do nº1 do artigo 79º do C.C.P., a Administração venha a proceder à audiência prévia dos candidatos. L) A decisão ora sindicada apenas se pronuncia sobre questões externas ao procedimento concursal e supervenientes à decisão de contratar e que se prendem com questões financeiras e técnicas da entidade adjudicante, logo, não estamos perante matérias sobre que a interessada pudesse ou devesse pronunciar em sede de audiência prévia. M) Acresce que, independentemente da intervenção da interessada em sede de audiência prévia a decisão do recorrido município sempre só poderia ser aquela que acabou por ser tomada, ou seja, uma decisão de não adjudicação no âmbito do procedimento concursal aqui em causa, pelo que, andou bem o tribunal ad quo, não devendo a decisão judicial sofrer qualquer alteração nesta parte; N) Depois, e quanto à alegada falta de fundamentação da decisão administrativa de não adjudicação, entende o recorrido que, salvo o devido respeito, também uma vez mais andou bem o douto tribunal ao ter decidido como decidiu dado que, ao contrário do sustentado pela recorrente, a decisão encontra-se devidamente fundamentada e até amplamente concretizados os fundamentos que motivaram a entidade adjudicante a proferir decisão de não adjudicação – decisão cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; O) De facto, analisando o teor da decisão não podemos deixar de concluir que o recorrido Município não deixou de concretizar e descrever, de forma abundante e detalhada, as razões de facto que levaram o Município a considerar preenchidos os pressupostos previstos na alínea d) do nº 1 do artigo 79º do CCP, isto é, as circunstâncias supervenientes que, no seu entender, alteram em absoluto os pressupostos que aquele tomou em consideração aquando da decisão de contratar. P) Nos casos com aquele que se discute nos autos, não deixa de ser concedida uma ampla margem de liberdade à entidade adjudicante para poder decidir pela não adjudicação, atenta a redação das alíneas c), d) e f), do nº 1, do artigo 79º, em que utilizando-se cláusulas abertas e conceitos indeterminados, se permite o seu preenchimento, em cada momento, pela entidade adjudicante. Q) Assim, e em face disso, o escrutínio que é feito à fundamentação não deve ser muito apertado, concedendo-se margem à Administração, conquanto essa decisão se apresente suficientemente fundamentada. R) Ora, no caso concreto, a decisão de não adjudicação derivou de constrangimentos de ordem técnica e financeira, devidamente concretizados e ilustrados na decisão, que colocam em causa o interesse público, que vieram a impedir a adjudicação, e que relevam de valorações próprias do poder discricionário, que, salvo o devido respeito por opinião contrária, nem a interessada nem o tribunal poderão sindicar. S) Considerando tudo quanto se alegou nos autos bem como o teor da decisão administrativa propriamente dita, dúvida não restam que o ato impugnado é absolutamente válido, respeitando todas as normas legais e regulamentares aplicáveis a procedimentos concursais, maxime o disposto no CCP, mostrando-se ademais devida e abundantemente fundamentado; Assim, e nos melhores termos de Direito que V/ Exa. doutamente suprirão, bem como pelos fundamentos constantes das alegações e conclusões, deverá ser julgado totalmente improcedente o Recurso a que ora se responde, por infundado, mantendo-se, na íntegra, a douta decisão judicial sindicada.” Veio ainda a Contrainteressada T., Lda. apresentar Recurso, no qual concluiu: “a) O recurso fundamenta-se em erro de julgamento do Despacho de indeferimento da intervenção, a título de oposição espontânea, da contrainteressada e da Sentença que lhe sucede; b) Face aos termos da ação instaurada pela primeira Recorrida e ao conteúdo do ato praticado pelo segundo Recorrido, só restava à Recorrente opor-se nos termos em que o fez, deduzindo o respetivo incidente; c) É a existência de um conflito de direitos que justifica a oposição e esse conflito foi exaustivamente circunscrito pela Recorrente; d) Uma vez reconhecido o direito à execução da sentença (rectius: Acórdão) proferida no processo nº 19/17.2BEVIS, deverá a segunda Recorrida reinstruir o procedimento a partir do vício determinante da anulação do ato, vício referente à omissão do segundo Recorrido em pedir esclarecimentos à proposta concursal da ora Recorrente. e) Tal reinstrução é incompatível com a presente ação que, por pedir a prática do ato devido de adjudicação ou, mediante fundamentação conforme à lei e nesses estritos parâmetros vinculados de legalidade, não adjudicação, impede que a Recorrente obtenha, no plano dos factos, o que já lhe foi reconhecido no plano jurídico; f) É por isso que o Despacho erra no julgamento da matéria de direito (artigo 639.º n.º 2) quando interpreta o artigo 333.º n.º 1 do CPC e conclui pela inexistência de incompatibilidade entre o direito à execução de sentença, na esfera jurídica da Recorrente, o direito à impugnação do ato, na esfera jurídica da primeira Recorrida e o interesse legítimo na validade do ato praticado, na esfera jurídica do segundo Recorrido; g) A Sentença discrimina como provado o facto K) mas não os demais, alegados pela Recorrente como concretizadores do mesmo e constitutivos do seu direito à execução, errando, por via disso, no julgamento da matéria de facto, devendo dar-se como provados, porque assentes, e por se referirem ao direito de execução da Recorrente, os seguintes factos com origem, respetivamente, nos artigos 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 46.º, 52.º da contestação, os quais não foram objeto de impugnação especificada, a saber: - Aos 4 dias do mês de janeiro de 2019, o júri emitiu um relatório preliminar com proposta de exclusão da proposta da ora contrainteressada, com fundamento na apresentação de um preço anormalmente baixo (demonstrado através do DOC.3 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - Na resposta apresentada em sede de audiência prévia, a ora contrainteressada alegou que o ato do júri não dava execução ao Acórdão do STA (demonstrado através do DOC.4 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - Na sequência, foi a ora contrainteressada notificada para justificar o preço fixado na sua proposta, por notificação do presidente do júri, de 23 de janeiro de 2019 (demonstrado através do DOC.5 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - Essa mesma notificação foi dirigida, igualmente, aos concorrentes V., Lda. e E. Lda., cujas propostas continham notas justificativas dos preços apresentados (demonstrado através do DOC.6 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - Na sua resposta, a ora contrainteressada observou que o Acórdão continuava a não ser executado (demonstrado através do DOC.6 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - Isto porque «a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga e o caso julgado abrange todas as entidades demandadas no processo principal e apenas essas […]» (demonstrado através do DOC.6 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - E que «a ação foi instaurada contra o Município e o contrainteressado ordenado em primeiro lugar no concurso. A ora exponente não demandou qualquer outro dos concorrentes, nem tinha de o fazer, pelo que o caso julgado não lhes pode ser oposto […]» (demonstrado através do DOC.6 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada); - A contrainteressada impugnou no processo de execução o mesmo ato impugnado pela Autora na presente ação (demonstrado através do DOC.7 da contestação da Recorrente, cujo teor e genuinidade não foi impugnada). h) O ato de não adjudicação e impugnado por via da ação é um ato nulo, devendo a Sentença tê-lo declarado como tal, nos termos dos artigos 95.º n.º 3, 158.º n.º 2 e 179.º n.º 2 do CPTA. Não o fazendo, errou no julgamento da matéria de direito por violação daquelas normas; i) Isto porque: i) o segundo Recorrido, através do júri, propôs a exclusão da proposta da contrainteressada; ii) depois, o segundo Recorrido notifica a contrainteressada, ora Recorrente, para esclarecer o seu preço, conjuntamente com outros dois concorrentes que apresentaram um preço anormalmente baixo, não tendo este aspeto sido objeto de decisão no Acórdão dado à execução; iii) por último, pratica um ato cujo conteúdo é contrário aos possíveis conteúdos determinados pela decisão exequenda; j) A Sentença desconsiderou que os atos impugnados na ação que deu origem ao presente recurso foram impugnados na ação executiva 19/17.2BEVIS-B, que corre os seus termos no mesmo Tribunal. Ao não suspender a instância violou o previsto no artigo 269.º n.º 1 al. c) do CPC, quando conjugado com o artigo 7.º A n.º 1 do CPTA. Requer: - a admissão do documento 1, cuja junção se torna necessária em virtude do julgamento realizado em 1.ª instância e; - a revogação do Despacho que indeferiu o requerimento de oposição espontânea, com a anulação dos termos subsequentes que daquele Despacho dependam absolutamente, onde se inclui a Sentença e, em substituição, admitir-se a Recorrente como opoente espontânea e declarar-se nula a deliberação de 30.10.2019, de não adjudicação do contrato designado de «Empreitada de Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)», da autoria da segunda Recorrida; - alternativamente, a revogação do Despacho que indeferiu o requerimento de oposição espontânea, com a anulação dos termos subsequentes que daquele Despacho dependam absolutamente, onde se inclui a Sentença e, em substituição, admitir-se a Recorrente como opoente espontânea, suspender-se a instância declarativa até à prolação da sentença na ação executiva que corre termos no Tribunal a quo sob o nº 19/17.2BEVIS-B.” Correspondentemente veio o Município de (...) igualmente apresentar Contra-alegações face ao precedente Recurso, nas quais concluiu: “A) Entende a recorrente que tendo-lhe sido reconhecido por decisão judicial o direito à execução da sentença (rectius: Acórdão) proferida no processo nº 19/17.2BEVIS, deverá o recorrido Município reinstruir o procedimento concursal a partir do vício determinante da anulação do ato, vício referente à omissão do segundo Recorrido em pedir esclarecimentos à proposta concursal da ora Recorrente. B) Ou seja, o direito próprio da recorrente, conforme resulta da sua peça processual a fls. dos autos, é tão-somente ver o réu município reinstruir o procedimento concursal a partir do vício determinante da anulação do ato que ditou a exclusão do procedimento da proposta da recorrente; C) Da documentação junta a estes autos pelo município, designadamente a documentação que compõe o Processo Administrativo, resulta de forma clara que, após a prolação da referida decisão do STA, e em cumprimento da mesma, foi efetivamente anulado o procedimento e proferido um novo Relatório Preliminar e um novo Relatório Final pelo Júri do Procedimento concursal, isto após terem sido pedidos esclarecimentos à recorrente T.; D) Para lá disso, após prolação de tal relatório final, e nos termos da lei, o executivo municipal deliberou, por maioria, proferir uma nova decisão final para o procedimento concursal, in casu uma decisão de não adjudicação invocando para tanto a causa de não adjudicação prevista nos termos do artigo 79 n.º 1 alínea d) do CCP e com os fundamentos que melhor constam de fls.- dos presentes autos; E) Inexiste qualquer direito próprio da contrainteressada T. totalmente incompatível com a decisão administrativa aqui em causa nem a decisão a ser proferida nestes autos contende com qualquer direito da contrainteressada ou afeta irremediavelmente o aludido processo executivo que corre termos sob o Processo n.º 19/17.3BEVIS-B dado que em momento algum existiu uma decisão judicial que tenha obrigado o réu município a graduar a proposta da recorrente teaga em primeiro lugar e muito menos existe qualquer decisão judicial que tenha determinado que o município estava obrigado a proferir decisão de adjudicação; F) Quer o novo relatório Final proferido pelo Júri do Procedimento concursal, quer a decisão de não adjudicação emanada pelo executivo camarário foram notificadas, via eletrónica, a todas as empresas concorrentes no âmbito do procedimento concursal, tal como à recorrente T., que delas tomaram pleno conhecimento, no entanto, apenas a Autora C. impugnou a decisão de não adjudicação, a recorrente T. não impugnou qualquer ato; G) Tendo decorrido tal prazo sem que tenha a recorrente T. vindo deduzir impugnação, precludiu tal direito, sendo ilegítimo recorrer ao incidente da oposição espontânea, previsto no artigo 333º do CPC, para fazer renascer tal direito (também à luz do prescrito no nº 2 do artigo 38º do CPTA). H) Assim, e salvo melhor opinião a partir do momento em que o Réu Município deu cumprimento ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo os autos executivos a que alude a recorrente deixaram de ter qualquer objeto útil dado que não pode o Município ser condenado a executar uma decisão judicial que já executou anteriormente, sendo certo que, tendo sido entretanto proferida decisão de não adjudicação o que importa é aferir se esta decisão é ou não válida e legal dado que consolidando-se tal decisão de não adjudicação a mesma colocará um ponto final no procedimento concursal aqui em causa; I) Aliás, é por isso que o objeto do presente dissídio se prende com a sindicância da validade da identificada decisão, de revogação da decisão de contratar, por vícios próprios, não cabendo ao Tribunal ad quo apurar da compatibilidade, ou não, de tal decisão com o julgado anulatório proferido nos autos que correram termos sob o nº 19/17.2BEVIS (matéria que está a ser discutida em sede de processo de execução, que corre termos sob o nº 19/17.2BEVIS-B). J) O direito próprio que caberia à recorrente seria, na presente sede, o da impugnação da referida decisão, também por vícios próprios, o que esta não fez; K) Inexiste assim qualquer direito próprio e incompatível da recorrente T. com a decisão judicial proferida nestes autos, pelo que, e não se encontrando preenchido o pressuposto da incompatibilidade entre qualquer direito próprio que a recorrente pretenda fazer valer com a pretensão formulada pela Autora, impunha-se indeferir o incidente de oposição espontânea, previsto no artigo 333º do CPC; L) Depois, sempre se dirá em todo o caso que a decisão de não adjudicação mostra-se devidamente fundamentada, encontrando-se preenchidos os requisitos legais para aplicação do disposto no artigo 79 n.º 1 alínea d) do CCP pelo que o Réu Município tinha não só o poder mas, sobretudo, o dever de proferir uma decisão de não adjudicação; M) Em suma, não padecem as decisões judiciais aqui em causa dos vícios apontados pela recorrente T., motivo pelo qual não poderá o referido recurso deixar de ser julgado improcedente. Assim, e nos melhores termos de Direito que V/ Exa. doutamente suprirão, bem como pelos fundamentos constantes das alegações e conclusões, deverá ser julgado totalmente improcedente o Recurso a que ora se responde, por infundado, mantendo-se, na íntegra, a douta decisão judicial sindicada.” Em 19 de agosto de 2020 é proferido no tribunal a quo, Despacho de admissão do Recurso, e subida dos Autos a este Tribunal. O Ministério Público junto deste Tribunal, devidamente notificado, veio a emitir pronuncia em 21 de agosto de 2020, onde se refere, designadamente, que “(...) não resulta que esteja em causa prima facie, na presente ação, a defesa legalmente cometida a seu cargo de algum dos valores fundamentais previstos na parte final do referido artigo e no artigo 9º nº 2 do mesmo Código, razão pela qual não será emitido o parecer aí previsto de forma especial para aquelas situações, e consequentemente prescinde do prazo previsto para a respetiva elaboração.” Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento. II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir individualmente as questões colocadas em ambos os Recursos, como infra se discriminará, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA. III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada: “A) A 13/10/2016, o Réu deliberou instaurar um procedimento de concurso público tendente à adjudicação de uma empreitada designada de “Reabilitação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”, ao qual foi atribuído o nº 21/2016 (cf. pasta designada “Informação Abertura” do PA); B) Da referida deliberação constava a seguinte justificação da necessidade de contratar: “(…) Necessidade de substituir ou reforçar recursos existentes ou atender a nova exigência. Considerando, - Que o edifício onde funcionam a maioria dos serviços municipais necessita de um conjunto de obras que lhe permitam servir melhor os munícipes do concelho de (...); - Que as atuais instalações se tornaram um pouco desadequadas para comportarem os serviços que lé se desenvolvem; - Que é necessário também requalificar o espaço que ficará devoluto aquando da inauguração da nova biblioteca; - Que acresce a isso a necessidade de adaptar o edifício quer às novas exigências de acessibilidade quer às condições de trabalho dos colaboradores da autarquia; (…)” (cf. idem); C) A 29/12/2016, e decorrido que foi o procedimento concursal, o Réu deliberou adjudicar o contrato identificado em A) à Autora (cf. pasta designada “Adjudicação C.” do PA); D) A 12/01/2017, entre a Autora e o Réu foi celebrado o contrato designado de “Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”, pelo preço de € 1.274.763,59, e que aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. pasta designada “Contratos” do PA); E) O contrato identificado em D) foi objeto de visto pelo Tribunal de Contas, tendo a Autora suportado a quantia de € 1.274,76, a título de emolumentos (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 5); F) A Autora deu início à execução dos trabalhos (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 20); G) A 13/01/2017, a CI intentou neste Tribunal uma ação de contencioso pré-contratual, e pela qual impugnou o ato administrativo que determinou a exclusão da sua proposta do procedimento concursal identificado em A), o ato de adjudicação do contrato à Autora, bem como o respetivo contrato, entretanto celebrado, mais peticionando a condenação do Réu a adjudicar o indicado contrato à sua proposta (cf. petição inicial do processo nº 19/17.2BEVIS, por consulta ao sistema SITAF); H) A 06/10/2017, por este Tribunal foi proferida sentença no âmbito do processo nº 19/17.2BEVIS, que julgou improcedente a referida ação e absolveu o Réu dos pedidos formulados (cf. idem); I) A 16/02/2018, em sede de recurso interposto pela CI, o Tribunal Central Administrativo do Norte proferiu Acórdão, o qual julgou o recurso procedente, revogando a sentença proferida a 06/10/2017, e julgando procedentes os pedidos formulados pela CI (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 2); J) A 13/09/2018, em sede de recurso de revista interposto pela Autora, o Supremo Tribunal Administrativo proferiu Acórdão a conceder provimento parcial ao recurso, mantendo a anulação do ato de exclusão da proposta apresentada pela CI, nos seguintes termos: “(…) Tem, pois, o ato de exclusão da proposta que ser anulado (o que acarreta obviamente a anulação da adjudicação e do contrato de empreitada se já celebrado – pedidos i) e ii), alínea b) – art. 145º da petição inicial) para que o júri dê cumprimento ao citado art. 71º, nº 3 do CCP, pedindo os esclarecimentos que considere relevantes face à «nota justificativa do preço proposto» apresentada, avaliando a proposta face aos mesmos, admitindo ou excluindo a proposta conforme a consideração que fizer desses esclarecimentos (cfr. art. 70, nº 2, al. e), 2ª parte do CCP), seguindo-se os ulteriores termos do procedimento de acordo com as regras do concurso e do CCP aplicáveis.(…)” (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 4); K) A 03/09/2019, a CI apresentou junto deste Tribunal um requerimento a peticionar a execução de sentença de anulação, consubstanciado no Acórdão proferido pelo STA a 13/09/2018, peticionando, a final, a condenação da Executada, ora Réu, a ordenar a proposta por si apresentada em primeiro lugar, bem como a adjudicar-lhe o contrato; ou, subsidiariamente, ser o Réu condenado a praticar os atos necessários a executar a referida decisão (cf. processo que corre termos neste Tribunal sob o nº 19/17.2BEVIS-B, por consulta ao sistema SITAF); L) A 30/10/2019, e sob proposta do Presidente da Câmara Municipal datada de 18/10/2019, a Câmara Municipal do Réu deliberou não adjudicar o contrato designado de “Empreitada de Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”, nos termos e com os seguintes fundamentos: “(…) Presentes uma informação do Técnico Superior, V., com o assunto: «Concurso Público n.º 21/2016 - Empreitada: Reabilitação do Edifício da Câmara Municipal de (...). Procedimento de concurso público nos termos da alínea b) do art.º 19º, do C.C.P., aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro e ulteriores alterações»; o relatório final de análise de propostas e o relatório preliminar de análise de propostas. Presente a proposta de Invocação de Causa de não adjudicação – Empreitada de Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...). Relatório final do júri do procedimento, a qual se transcreve: «Na sequência do relatório final do Júri do Procedimento do Concurso Público da Empreitada de Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...), proponho a não adjudicação, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 79º do Código dos Contratos Públicos, referente a circunstâncias supervenientes aos pressupostos da decisão de contratar, nos termos e com os seguintes fundamentos: No decurso do ano de 2016, ainda com o anterior executivo, o Município de (...) lançou o concurso público para a empreitada de Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...) (aberto por deliberação do executivo camarário de 13/10/2016 e publicado no DR, II Série, n.º 198, de 14/10/2016, sob o n.º 6507/2016, com o preço base de 1.593.454,47 euros) tendo feito a adjudicação, em 29-12-2016, à C. - , Lda., empresa ordenada em primeiro lugar no referido concurso e celebrado o respetivo contrato em 12/01/2017 que mereceu o visto do Tribunal de Contas. Todavia, a sociedade comercial T., Lda., concorrente nesse concurso, veio intentar contra o Município de (...) um processo de contencioso pré-contratual tendo por objeto o referido procedimento concursal. Para fundamentar a sua pretensão, a referida sociedade comercial alegou a existência de vários vícios que determinariam, na sua ótica, a nulidade quer da decisão do Júri que a excluiu do concurso, quer do próprio concurso público. Em sede de primeira instância, foi proferida decisão judicial que absolveu o Município e em segunda instância, o TCAN condenou o Município a anular a decisão de exclusão da proposta da Autora, T., Lda., condenando-o ainda, a adjudicar a obra em causa a esta concorrente. Porém, após recurso da C. para o STA, este julgou o mesmo parcialmente procedente, tendo condenado o Município a anular o ato de exclusão da proposta (da T., Lda.) o que acarretaria, segundo o aresto: "...a anulação da adjudicação e do contrato de empreitada...para que o júri dê cumprimento ao citado art. 71º, n.º 3 do CCP, pedindo os esclarecimentos que considere relevantes face à nota justificativa do preço proposto apresentada, avaliando a proposta face aos mesmos, admitindo ou excluindo a proposta conforme a consideração que fizer desses esclarecimentos...seguindo-se os ulteriores termos do procedimento, de acordo com as regras do concurso e do CCP aplicáveis...". No cumprimento de tal decisão, o júri elaborou o relatório preliminar de análise das propostas e em sede de audiência prévia, foram apresentadas novas reclamações e efetuados pedidos de esclarecimentos a três concorrentes cujas propostas apresentavam notas justificativas de preços anormalmente baixos, dando origem ao relatório final. Saliente-se que esta nova análise do júri só teve desfecho no dia 13 do passado mês de setembro, com a apresentação da sua proposta, ínsita no Relatório Final de Análise de Propostas. Malogradamente, o decurso do tempo tem sido inimigo da execução da empreitada e as circunstâncias, necessidades e contenções que hoje, orientam e conformam a estratégia municipal alteraram-se substancialmente. Atente-se, por exemplo, ao nível das especialidades, aos projetos de telecomunicações, eletricidade e de AVAC (instalação do sistema de ar condicionado) para além dos materiais a aplicar estarem sobredimensionados para as atuais necessidades, já desatualizados na sua tecnologia, com alguns de elevado valor em face dos atuais e mais baratos preços de mercado, outros estão na eminência de ficarem descontinuados no mercado, visto tratar-se de um projeto concebido no ano de 2016. Por outro lado, o acréscimo de competências e atribuições municipais que a curto prazo se concretizarão por recente imposição legal, no âmbito da descentralização administrativa, obriga a uma nova reestruturação dos serviços que colide com as opções do anterior executivo ao nível da requalificação do Edifício dos Paços do Concelho, ou seja, o projeto de requalificação está, hoje, desajustado ao futuro quadro de necessidades de pessoal e de serviços que terão que passar a ser prestados pelo Município. A título de exemplo, é intenção deste executivo criar uma nova estrutura orgânica municipal pensada nas novas competências que o Município irá abarcar em janeiro de 2021. Desde a Saúde à Educação, o Município verá alargada a sua estrutura orgânica o que implica uma nova e adequada reestruturação física do espaço afeto às novas atribuições municipais e que não estava prevista no projeto aqui em causa. E ainda, a contenção financeira imprimida pela atual gestão municipal, face ao peso da despesa nas contas públicos e em especial, aos constrangimentos causados pelo atraso de execução da obra, obriga a repensar a intervenção prevista. Saliente-se que a morosidade de todo este processo, nomeadamente, a ultrapassagem dos prazos de execução da obra, implicou a caducidade do financiamento que estava contemplado ao abrigo da medida de apoio do “Portugal Centro 2020 - Aviso Centro 03-2016/10” , referente à eficiência energética nas infraestruturas públicas da Administração Local, bem como, a caducidade do prazo de utilização do empréstimo contraído para a Requalificação do Edifício dos Paços do Concelho. Acresce, ainda, referir que em Outubro de 2017, o concelho de (...) foi fustigado por um forte incêndio que afetou grande parte do seu território e que destruiu a sua zona industrial. Em face de tão grave acontecimento, o Município viu-se forçado a alterar as suas prioridades políticas, passando, desde logo, a direcionar os seus recursos humanos e meios económicos para a recuperação do concelho e para o apoio a pessoas e empresas. Diga-se também, que esta situação veio acentuar os constrangimentos financeiros, não tendo, hoje, o Município condições financeiras para assumir o pagamento de tão elevado custo da obra de requalificação prevista no procedimento concursal aqui em apreço, não tendo, por isso, o Município outra escolha que não seja optar por diligenciar pela execução de um novo projeto de requalificação, com posterior e novo procedimento concursal, com um valor de execução de obra bastante inferior e sobretudo, mais adequado às suas atuais e reais necessidades, nos termos acima já expostos. Ora, quer ao nível da concretização do próprio projeto, com soluções sobredimensionadas, com alguns materiais de elevado valor e outros na eminência de ficarem descontinuados no mercado, quer ao nível da adaptação física a uma nova estrutura orgânica do município, cada vez mais abrangente e complexa, acrescido dos constrangimentos financeiros, afigura-se-nos, irremediável um cenário de reformulação do projeto e por conseguinte, a não adjudicação. Trata-se, pois, da tutela do interesse público, através de uma correta racionalização dos dinheiros públicos, face aos princípios subjacentes que orientam, nesta matéria, as entidades públicas, nomeadamente o princípio da economia e o da boa gestão da coisa pública. Nesta conformidade, de acordo com o artigo 79.º, n.º1, alínea d) do CCP, “ ...Não há lugar a adjudicação, extinguindo-se o procedimento, quando: (...) d) Circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar o justifiquem." Em anotação a este artigo, in Código dos Contratos Públicas, Anotado e Comentado, página 284, Jorge Andrade da Silva refere que: "... como sugere o texto legal com a expressão "não há lugar à adjudicação", não é de excluir a possibilidade de, excecionalmente, ser decidida a não adjudicação mesmo após ter sido proferida decisão de adjudicação, afastando esta, particularmente no caso dela se fundar em factos supervenientes (ou de conhecimento superveniente) à decisão de adjudicação, com que a entidade adjudicante não contou ou não podia contar e que objetivamente, sem margem para dúvida, implicam uma alteração relevante de aspetos fundamentais das peças do procedimento ou representam uma adulteração grave dos pressupostos da decisão de contratar, fazendo com que o contrato a celebrar se tornasse inútil ou contrário, nas suas linhas essenciais, aos interesses atuais da entidade adjudicante (ou, então, houver entretanto uma alteração sensível da orientação político-administrativa da entidade adjudicante, publicamente conhecida e prosseguida, com idênticas consequências sobre a utilidade ou adequação do contrato)." Assim, em virtude dos ponderosos motivos de interesse público suprarreferidos, proponho ao órgão competente (Câmara Municipal) que lance mão da prerrogativa prevista na alínea d) do n.º1 do artigo 79º do CCP, proferindo uma decisão de não adjudicação». Todos estes documentos, após rubricados pelo órgão executivo, ficarão apensos aos documentos do referido processo. O Senhor Presidente informou das diligências efetuadas no sentido de solucionar este problema, tendo as mesmas sido infrutíferas. Referiu que com este relatório do júri do procedimento do concurso este processo poder-se-á arrastar por mais alguns anos. Assim, dada a urgência de intervir neste edifício, pelo facto de este ter dois pisos inutilizados (devido ao início da obra), pela necessidade de intervenção (dadas as condições de trabalho dos colaboradores), pelo possível prolongar da questão judicial deste processo, pelo próprio arrastar do processo sem fim à vista e pelo facto do próprio projeto já estar desajustado ao futuro quadro de necessidades de pessoal e serviços, apresenta a presente proposta. Congratulou o Gabinete Jurídico e os advogados do Município que elaboraram o documento apresentado, dando assim, conforto à não adjudicação. Disse, ainda, haver a ambição de enquadrar o edifício numa possível candidatura, não sendo a sua requalificação tão dispendiosa ao orçamento municipal. O Senhor Vereador A. fez um breve resumo do historial deste processo, lembrando que havia uma candidatura no âmbito da eficiência energética. Referiu a necessidade de requalificar o edifício, no entanto, pelo facto de não dominar bem esta matéria, bem como, de não saber se a proposta apresentada será a melhor solução, disse que se iria abster. A Câmara deliberou, por maioria com duas abstenções dos Senhores Vereadores A. e J., concordar com a proposta apresentada pelo Senhor Presidente e, com base nos fundamentos constantes da mesma, invocar a causa de não adjudicação prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP, não adjudicando por isso a referida empreitada.” (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 1); M) A 14/11/2019, a decisão identificada em L) foi comunicada a todos os concorrentes do referido contrato de empreitada de requalificação do edifício da Câmara Municipal de (...), através de publicação na plataforma eletrónica designada “acinGov” (cf. idem); N) A 07/03/2017, a Autora suportou a quantia de € 1.274,76 a título de emolumentos pagos ao Tribunal de Contas, no âmbito do processo de visto do contrato para a requalificação do edifício da Câmara Municipal de (...) (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 5); O) A 04/01/2017, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 1.189,27 para a emissão de garantia bancária a favor do Réu (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 6); P) A 04/04/2017, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 7); Q) A 04/07/2017, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 8); R) A 04/10/2017, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 9); S) A 04/01/2018, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 10); T) A 04/04/2018, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 11); U) A 04/07/2018, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 12); V) A 04/10/2018, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 13); W) A 04/01/2019, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 14); X) A 04/04/2019, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 15); Y) A 04/07/2019, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 16); Z) A 04/10/2019, e em virtude da adjudicação do referido contrato de empreitada, a Autora suportou a quantia de € 396,41 relativamente à cobrança trimestral de manutenção da garantia bancária (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 17); AA) A 06/03/2018, no âmbito do processo nº 19/17.2BEVIS, e em virtude da impugnação, pela CI, do ato de adjudicação, a Autora suportou a quantia de € 816,00 a título de taxa de justiça (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 18); BB) A 27/06/2019, no âmbito do processo nº 19/17.2BEVIS, e em virtude da impugnação, pela CI, do ato de adjudicação, a Autora suportou a quantia de € 6.120,00 a título de conta final de custas (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 19); CC) Até à data da propositura da presente ação, a Autora suportou a quantia de € 1.068,15 a título de custos com a manutenção do estaleiro da obra (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 20); DD) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 16/12/2019 (cf. fls. 1 e seguintes dos presentes autos). IV – Do Direito No que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª Instância: “(...) Da (in)validade do ato administrativo impugnado: No seu petitório, veio a Autora arguir a anulabilidade da decisão impugnada, de não adjudicação da empreitada designada de “Requalificação do Edifício da Câmara Municipal de (...)”, imputando-lhe os vícios de preterição do direito de audiência prévia e de falta de fundamentação. Também aqui por razões de ordem lógica, cuidará o Tribunal de apreciar cada um dos vícios imputados aos atos postos em crise. Começa a Autora por alegar que padecem os atos impugnados de vício de violação de lei, atenta a manifesta insuficiência da respetiva fundamentação e, em tal contexto, da utilização ilícita da causa de não adjudicação invocada e da violação do dever de adjudicar. Reputa de evidente que não bastará ao Réu, para se escusar a consumar o contrato cujo procedimento de formação tomou a iniciativa de adotar, socorrer-se de argumentos vazios de qualquer conteúdo factual concreto e demonstrado, adequado a fazer operar as circunstâncias excecionais que, nos termos da lei, justificam o decaimento do dever de adjudicação. Mais sublinha que os supostos fundamentos das decisões se afiguram vazios de conteúdo e a sua relevância para o caso ininteligível. Pugna, a final, pela anulação das decisões impugnadas e pela sua substituição por novo ato de adjudicação, ou de não adjudicação, caso esta seja justificada, nos termos da lei. (...) Vejamos. Desde já se comece por afirmar que assiste razão à Autora quando alega que impende sobre a Administração Pública, aqui o Réu, um autêntico dever de adjudicar. É claro o artigo 76º do CCP quando dispõe que: “1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 79.º, o órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de adjudicação e notificá-la aos concorrentes até ao termo do prazo da obrigação de manutenção das propostas. 2 - Por motivo devidamente justificado, a decisão de adjudicação pode ser tomada e notificada aos concorrentes após o termo do prazo referido no número anterior, sem prejuízo do direito de recusa da adjudicação pelo concorrente cuja proposta foi a escolhida. 3 - Quando a decisão de adjudicação seja tomada e notificada aos concorrentes após o termo do prazo referido no n.º 1, a entidade adjudicante deve indemnizar o concorrente que recuse a adjudicação pelos encargos em que comprovadamente incorreu com a elaboração da respetiva proposta.” Reconhecendo a interpretação partilhada pela maioria da jurisprudência dos tribunais superiores, bem como pela doutrina, que a lei indicia a existência do referido dever de adjudicação, podem verificar-se situações nas quais as entidades adjudicantes dispõem de um direito de não adjudicar. O artigo 79º do CCP (na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 111-B/2017, de 31 de Agosto) prevê algumas dessas situações, especificando que: “1 - Não há lugar a adjudicação, extinguindo-se o procedimento, quando: (...) d) Circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar o justifiquem; (...) 2 - A decisão de não adjudicação, bem como os respetivos fundamentos, deve ser notificada a todos os concorrentes. (...) 4 - Quando o órgão competente para a decisão de contratar decida não adjudicar com fundamento no disposto nas alíneas c) e d) do n.º 1, a entidade adjudicante deve indemnizar os concorrentes, cujas propostas não tenham sido excluídas, pelos encargos em que comprovadamente incorreram com a elaboração das respetivas propostas.” Atento o probatório coligido, concretamente o respetivo ponto L), desde logo se verifica que a decisão de não adjudicação se baseou no fundamento previsto na alínea d) do nº 1 do artigo 79º do CCP, isto é, a verificação de circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar, e que justificam, na ótica do Réu, a decisão de não dar sequência ao procedimento concursal. (...) Como se torna lógico, impõe-se, nestas situações em que goza a entidade adjudicante de uma larga margem de discricionariedade, um especial dever de fundamentação das decisões adotadas. Quanto à fundamentação, dispõe o CPA, no seu artigo 152º, nº 1, que “Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: a) Neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; b) Decidam reclamação ou recurso; c) Decidam em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado, ou de parecer, informação ou proposta oficial; d) Decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais; e) Impliquem declaração de nulidade, anulação, revogação, modificação ou suspensão de ato administrativo anterior.” Quanto aos requisitos de fundamentação, dispõe o nº 1 do artigo 153º do CPA que “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato.” (...) Nestes termos, a fundamentação exerce, no ato resultante do exercício de poderes, o mesmo papel que na sentença: mostra como os factos provados justificam a aplicação de certa norma e a dedução de determinada conclusão, esclarecendo o objeto e o porquê do ato, com aquele conteúdo (neste sentido, Marcello Caetano, Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 3ª Reimpressão, 2010, pág. 124 e seguintes). O dever de fundamentação é, assim, um pilar fulcral da legalidade da ação administrativa e um instrumento fundamental da respetiva garantia contenciosa, merecendo tutela constitucional. Na verdade, prevê o nº 3 do artigo 268º da Constituição da República Portuguesa que “Os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.” O objetivo último deste dever de fundamentação é o de garantir, ao destinatário normal do ato administrativo, colocado na situação concreta, a compreensibilidade das razões de facto e de direito que determinaram o autor do ato a agir ou a escolher a medida adotada. Serve também o dever de fundamentação a garantia de controlo, por parte deste destinatário, da legalidade do ato praticado, bem como de assegurar a este a tutela jurisdicional efetiva, conforme prevista no nº 4 daquele artigo 268º da CRP, após a aferição daquela legalidade (neste sentido, e a título de mero exemplo, Acórdão do STA de 27/05/2009, P. 0308/08, e doutrina e jurisprudência mencionadas neste aresto, disponível em www.dgsi.pt). (...) No caso vertente, apreciando o probatório coligido, especificamente, no ponto L), e analisando o conteúdo do ato, desde logo se verifica que cuidou o Réu de concretizar e descrever o porquê, em sede de facto e de direito, da sua prática. Na verdade, procede a decisão final, tendo por base a informação prestada pelo Presidente do órgão do executivo, à descrição abundante e detalhada das razões de facto que levaram o Réu a considerar preenchidos os pressupostos previstos na alínea d) do nº 1 do artigo 79º do CCP, isto é, as circunstâncias supervenientes que, no seu entender, alteram em absoluto os pressupostos que aquele tomou em consideração aquando da decisão de contratar. Escalpelizando os motivos indicados pelo Réu, impõe-se a este Tribunal considerar como atendível e classificável como circunstância superveniente suscetível de alterar os pressupostos nos quais se fundou a decisão de contratar, a designada “alteração da estratégia municipal” causada não só pela necessidade de uma diferente alocação dos seus recursos financeiros, atentos os graves incêndios florestais que afetaram o município no ano de 2017, bem como a ulterior alteração legal das competências autárquicas, em virtude da aprovação da Lei nº 50/2018, de 16 de Agosto, e que se revelam profundas, e ainda a indisponibilidade de recursos financeiros, uma vez que, atento o decurso do tempo, caducaram financiamentos comunitários de que o Réu poderia dispor para a concretização da referida obra. (...) É certo que, conforme afirma a Autora na sua petição inicial, não especificou o Réu, na decisão ora sob escrutínio, quais os concretos materiais previstos no projeto inicial que, na sua perspetiva, embarateceram ou se tornaram obsoletos. Todavia, no entender deste Tribunal não exigia à Administração, na veste de Entidade Adjudicante, que apresentasse um tão profundo grau de concretização das referidas circunstâncias supervenientes que alteraram os pressupostos da sua decisão de contratar (sendo que bastaria, para reputar de preenchido tal pressuposto, a ulterior alteração de competências das autarquias, aprovada por lei ulterior, bem como os incêndios florestais que atingiram o concelho de 2017 e que, de um dia para o outro, obrigou a edilidade a rever todas as suas prioridades de alocação dos recursos financeiros). Para além do mais, resulta da experiência comum que o decurso de um prazo superior a 4 anos, como sucedeu no caso presente, é suficiente, na atualidade, para tornar certas soluções de construção e de tecnologia totalmente obsoletas, atenta a velocidade vertiginosa em que novas soluções são descobertas e implementadas, bem como para causar severas alterações nos respetivos preços dos materiais, ou para que alguns deles sejam paulatinamente abandonados. Assim, não se exigiria ao Réu que, para indicar as razões de facto que motivaram a sua decisão de revogar o concurso, chegasse a tal nível de concretização (detalhando, por exemplo, qual o preço de alguns materiais em 2016, e qual o seu preço de 2020), sendo que a fundamentação de que lançou mão é francamente suficiente para que se logre perceber o que motivou aquela entidade. Por fim, sublinhe-se que as razões, de facto e de direito, constantes do ato impugnado se revelaram suficientes para que pudesse o seu destinatário médio compreender o porquê da sua prática, sindicando-a, se assim o entendesse. Consequentemente, improcede em toda a linha o arguido vício de falta de fundamentação, o que desde já se declara. Continuando, veio ainda a Autora alegar que a decisão sindicada incide sobre uma situação individual e concreta, que a afeta diretamente e, em abstrato, os demais concorrentes. Considera que, ao consubstanciar uma autêntica decisão administrativa, estava o Réu obrigado a observar as disposições previstas nos artigos 121º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, o que não sucedeu no caso em apreço. Sublinha que tampouco justificou o Réu qualquer razão de dispensa de tal formalidade, à luz do constante no nº 2 do artigo 124º do mesmo código. Por fim, afirma que não se poderá considerar que seria inútil conceder aos interessados tal oportunidade de participação na formação da decisão administrativa, porquanto tal conjeturada inutilidade representaria “um salto no escuro” que não poderia ser dado; que, atualmente, a dispensa de audiência prévia apenas pode suceder nas expressas situações previstas no referido artigo 124º, nº 2, do CPA; e, por fim, que caso tivesse sido dada à Autora oportunidade de se pronunciar quanto à intenção de não adjudicar o contrato, teria esta suscitado a ponderação de argumentos diversos, não constantes das decisões notificadas, quais sejam e designadamente, os concretos factos que densificariam as invocadas razões de interesse pública. (...) Cumpre apreciar e decidir. O designado direito de audiência prévia, previsto nos artigos 121º e 122º do CPA insere-se, e é um dos reflexos, no âmbito mais vasto do direito à informação dos particulares, nas suas relações com a Administração, encontrando-se constitucionalmente consagrado. Na verdade, determina o nº 1 do artigo 268º da CRP que “Os cidadãos têm o direito a ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas”. (...) Dispõe o nº 1 do artigo 121º do CPA o seguinte: “Sem prejuízo do disposto no artigo 124º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.” Já o artigo 124º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Dispensa de audiência dos interessados”, prescreve o seguinte: “1 – O responsável pela direção do procedimento pode não proceder à audiência dos interessados quando: a) A decisão seja urgente; b) Os interessados tenham solicitado o adiamento a que se refere o nº 2 do artigo anterior e, por facto imputável a eles, não tenha sido possível fixar-se nova data nos termos do nº 3 do mesmo artigo; c) Seja razoavelmente de prever que a diligência possa comprometer a execução ou a utilidade da decisão; d) O número de interessados a ouvir seja de tal forma elevado que a audiência se torne impraticável, devendo nesse caso proceder-se a consulta pública, quando possível, pela forma mais adequada; e) Os interessados já se tiverem pronunciado no procedimento sobre as questões que importem à decisão e sobre as provas produzidas; f) Os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão inteiramente favorável aos interessados. 2 – Nas situações previstas no número anterior, a decisão final deve indicar as razões da não realização da audiência.” Nestes termos, retira-se que a lei só está disposta a sacrificar este direito constitucionalmente tutelado quando, face a razões ponderosas e específicas, se justifique que o interesse público prevaleça sobre o referido direito privado, ou quando a decisão seja inteiramente favorável ao particular. No caso presente, e como decorre do probatório coligido, resulta claramente que, em momento anterior à tomada de decisão de não adjudicação, não cuidou o Réu de ouvir os respetivos interessados, isto é, os concorrentes do procedimento concursal de empreitada. Não obstante o afirmado pelo Réu na sua contestação, foram aqueles concorrentes, inclusive a Autora, ouvidos por várias vezes, mas em sede do normal desenvolvimento do procedimento concursal tendente à decisão de adjudicação, que já não quanto à decisão ora sob escrutínio, isto é, a decisão de não adjudicação, à luz do previsto no artigo 79º do CCP. No caso presente, dúvidas não existem que não se verifica qualquer uma das situações elencadas no indicado artigo 124º do CPA. Não só não teve a Autora qualquer oportunidade anterior para se pronunciar quanto às questões que importam à decisão como, contrariamente ao propugnado pelo Réu, como as decisões lhe são inteiramente desfavoráveis. Consequentemente, sempre se exigiria ao Réu que respeitasse a formalidade legal constante do artigo 121º, o que não sucedeu, ao arrepio da lei aplicável. Tal vício seria gerador da anulabilidade dos atos, nos termos do previsto no nº 1 do artigo 163º do CPA. Não obstante o que vem dito, a jurisprudência dos tribunais superiores portugueses vinha considerado, mesmo em data anterior à aprovação do novo CPA, que a audição dos interessados não se justifica nos casos em que fosse insuscetível de acrescentar algo de novo e útil à posição anteriormente manifestada. No que esta matéria respeita, sumariou-se no acórdão do STA, de 22/01/2014, Proc. nº 441/13 (disponível em www.dgsi.pt): “(…) III- Destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito, contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão, a menos que seja manifesto que esta só podia, em abstrato, ter o conteúdo que teve em concreto e que, por isso se impunha, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo. IV - Todavia, a possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato exige sempre um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela audição da requerente”. (...) Atualmente, tal princípio tem pleno acolhimento legal, especificando o nº5 do artigo 163º do CPA que “Não se produz o efeito anulatório quando: a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível; b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via; c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.” No caso sob escrutínio, atenta a especificidade da decisão impugnada, bem como os motivos que sustentaram a sua adoção por parte do Réu, está o Tribunal em condições de afirmar, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria o mesmo conteúdo. Na realidade, afigurar-se-ia de inútil a participação prévia dos interessados, porquanto as razões de interesse público que motivaram a decisão impugnada em nada sairiam alteradas, fosse qual fosse o teor da participação daqueles, concretamente, da Autora. Efetivamente, e apesar de estar o ato sob sindicância imbuído de margem de discricionariedade, as razões que o sustentam não se prendem diretamente com questões atinentes aos participantes no concurso, mas sim às referidas circunstâncias supervenientes, exteriores às partes, e que alteraram os pressupostos que estiveram na base da decisão de contratar. Consequentemente, será de afastar o efeito invalidante do vício de preterição de audiência prévia, aplicando-se o princípio do aproveitamento do ato administrativo (neste sentido, e numa situação em tudo semelhante, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 19/01/2012, P. 08222/11, disponível em www.dgsi.pt)., o que desde já de declara. (...)” Resulta da presente Ação, a necessidade de verificar desde logo, se o controvertido ato de não adjudicação padece dos vícios invocados pelas Recorrentes. Analisemos em separado cada um Recursos apresentados. Recurso da C.: Questiona a referida Recorrente predominantemente a legalidade das decisões proferidas, em função da invocada preterição do direito de audiência prévia e falta de fundamentação. Sem prejuízo da relevância evidenciada pelo referido instituto, é comumente reconhecido que a referida formalidade se pode degradar em formalidade não essencial, insuscetível de determinar a anulação do ato objeto de impugnação. A referida degradação não tem plena e universal aplicabilidade, sob pena de desvirtuar o próprio instituto da audiência prévia, antes merecendo ser aplicável, designadamente quando a intervenção do interessado se mostrar inútil, em virtude de se entender que independentemente do que pudesse ser dito, sempre o ato a proferir teria de ter o mesmo sentido decisório. Na situação em apreciação, mostra-se que a aqui Recorrente, independentemente do que pudesse vir a afirmar em sede de audiência prévia, não teria a virtualidade de alterar o sentido da decisão proferida. Acresce que ao longo de todo o procedimento, sempre foi dada à Recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre todas as matérias em apreciação, sendo que amiúde foi emitindo pronuncia, mormente relativamente às decisões que foram sendo adotadas pelo júri. A decisão adotada e aqui recorrida, não pressupôs uma qualquer apreciação de mérito face às propostas apresentadas, antes tendo assentado em questões de natureza exógena ao procedimento, pelo que sempre a reclamada audiência dos interessados, nada de relevante traria para o procedimento. Como se sumariou já no acórdão do TCAS nº 08222/11, de 19-01-2012, “A decisão de não adjudicação prevista no artigo 80º do CCP determina a revogação da decisão de contratar. Para além dos casos de não adjudicação previstos no Programa de Encargos de um dado concurso público, o artigo 79º do CCP permite à Administração, por razões de interesse público, desistir legitimamente de um concurso público. Operada essa desistência, não faz qualquer sentido proceder à audiência prévia dos concorrentes interessados. A decisão de não adjudicar pode ser ditada por constrangimentos de ordem técnica e financeira”. Acresce que o artigo 76.º, n.º 1, do CCP, refere que “Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 79.º, o órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de adjudicação e notificá-la aos concorrentes até ao termo do prazo da obrigação de manutenção das propostas”. Correspondentemente, entende Jorge Andrade e Silva, in anotação ao “Código dos Contratos Públicos”, 2013, 4.ª edição, Almedina, a pág. 264, que “Resulta do preceito e mesmo da respetiva epígrafe, que a entidade competente para a decisão de contratar não tem o poder de, discricionariamente, optar por adjudicar ou não: nos casos apontados n.º 1 do artigo 79.º, tem o dever de não adjudicar, em todos os outros casos, tem o dever de adjudicar. Isto é: num e noutro caso são poderes de exercício obrigatório”. Na situação em apreciação, a desistência da adjudicação resultou das invocadas causas supervenientes à originária decisão de adjudicação, em face do que se mostra preenchido o pressuposto constante do artigo 79 n.º 1 alínea d) do CCP. Se é certo que a falta de realização de audiência prévia é potencialmente geradora de mera anulabilidade, e estando justificada a impossibilidade de ter sido proferida decisão diversa, atento, designadamente, o decurso do tempo entretanto ocorrido, é manifesto que mesmo que se entendesse que teria ocorrido um vício procedimental, em qualquer caso, o mesmo ter-se-ia degradado em mera irregularidade, insuscetível de determinar a anulação do ato. Como discorreu já, inclusivamente o STA no seu Acórdão 25.06.2015, proferido no Procº n.º 1391/14, “A doutrina e a jurisprudência têm vindo a acolher o princípio do aproveitamento do ato – princípio que não tem suporte direto em disposição legal alguma, mas que assenta no entendimento de que não se justifica a anulação de um ato administrativo que foi praticado no exercício de poderes vinculados e está de acordo com os pressupostos fixados na lei –, nos termos do qual se admite que a falta de audiência dos interessados, quando obrigatória, possa não conduzir à anulação do ato final do procedimento (in casu a liquidação adicional de IS), anulação que é a sua consequência, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 163.º do Código do Procedimento Administrativo («São anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção».). Essa omissão nem sempre conduzirá à anulação, «designadamente não a justificando nos casos em que se apure no processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem deixou de pronunciar-se sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final, ou acabou por ter oportunidade de pronunciar-se, em procedimento de segundo grau (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiência no procedimento de primeiro grau» (Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 15 ao artigo 60.º, págs. 515 e segs.).” Como se sumariou ainda no acórdão deste TCAN nº 2171/09BEPRT, de 05.12.2014 “O princípio geral de direito que se exprime pela fórmula latina “utile per inutile non vitiatur”, princípio que também tem merecido outras formulações e designações (como a de princípio da inoperância dos vícios, a de princípio anti formalista, a de princípio da economia dos atos públicos e a de princípio do aproveitamento do ato administrativo), vem sendo reconhecido quanto à sua existência e valia/relevância pela doutrina e pela jurisprudência nacionais, admitindo-se o seu operar em certas e determinadas circunstâncias. Tal princípio habilita o julgador, mormente, o juiz administrativo a poder negar relevância anulatória ao erro da Administração [seja por ilegalidades formais ou materiais], mesmo no domínio dos atos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do ato e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar, com inteira segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa, nomeadamente, ou porque não afetou as ponderações ou as opções compreendidas (efetuadas ou potenciais) nesse espaço discricionário, ou porque subsistem fundamentos exatos bastantes para suportar a validade do ato [v.g., derivados da natureza vinculada dos atos praticados conforme à lei], ou seja ainda porque inexiste em concreto utilidade prática e efetiva para o impugnante do operar daquela anulação visto os vícios existentes não inquinarem a substância do conteúdo da decisão administrativa em questão não possuindo a anulação qualquer sentido ou alcance. Na situação em apreciação, uma vez que a decisão a proferir sempre seria a mesma, será de afastar o efeito invalidante do vício de preterição de audiência prévia, aplicando-se o princípio do aproveitamento do ato administrativo, em função, designadamente, do entendimento adotado pela jurisprudência referenciada supra. Em face do que precede, entende-se que no aspeto em apreciação, não merece censura a decisão recorrida. Já no que respeita à invocada Falta de Fundamentação do ato de não adjudicação, refira-se desde já que se não vislumbra a verificação do referido vicio, tanto mais que a própria Recorrente manifesta plena perceção do que está em causa, limitando-se a não concordar com o sentido do decidido, o que, sendo legítimo, não se pode confundir com falta de fundamentação. Como se disse, se é legítimo que a Recorrente possa não concordar com a fundamentação aduzida, o que é facto é que deu mostras de que percecionou perfeitamente o objeto e objetivo do controvertido ato. Em qualquer caso, refira-se que em princípio, apenas no campo decisório pertinente aos atos administrativos lesivos, se coloca a exigência de fundamentação (neste sentido aponta claramente o elenco enunciado no artigo 124º/1 do CPA). Diz-se “em princípio” com o intuito de salvaguardar uma margem de exceção para casos marginais e atípicos. Em qualquer caso, é do senso comum que a lei não impõe nem poderia impor a fundamentação da fundamentação (e assim sucessivamente) sob pena de o autor do ato administrativo se ver condenado, como um Sísifo moderno, a rolar o rochedo da fundamentação até à consumação do Tempo. (Cfr. Acórdão do TCAS nº 2303/99 de 09/01/2003). Nas palavras de Marcello Caetano (Manual, I, nº 197): “Não interessa ao jurista conhecer quaisquer motivos da vontade administrativa, mas tão-somente os motivos determinantes, aquelas razões de direito ou considerações de facto objetivamente consideradas, sem cuja influência a vontade do órgão administrativo não se teria manifestado no sentido em que se manifestou”. Como resulta, entre muitos outros, do Acórdão do STA nº 032352 de 28/04/94 “A fundamentação do ato administrativo deve ser expressa, o que implica que só é válida a fundamentação contextual, ou seja, a que se integra no próprio ato e dele é contemporânea”. A fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal do ato administrativo, exigindo-se que, perante o itinerário cognoscitivo e valorativo constante daquele ato, um destinatário normal possa ficar a saber por que se decidiu em determinado sentido. Como ficou dito no Acórdão do Colendo STA nº 762/02, de 19 de Fevereiro de 2003, “…a fundamentação dos atos administrativos visa, por um lado, dar a conhecer aos seus destinatários o iter cognoscitivo e valorativo seguido pela Administração, de molde a permitir-lhes uma opção consciente entre a aceitação do ato e a sua impugnação contenciosa, e, por outro, que a Administração, ao ter de dizer a forma com agiu, porque decidiu desse modo e não de outro, tenha de ponderar aceitavelmente a sua decisão.” É, por isso, um conceito relativo, que depende de vários fatores, designadamente do tipo legal de ato, dos seus antecedentes e de tudo aquilo que possibilite aos seus destinatários ficar a saber a razão de ser dessa decisão. Na realidade, e em concreto, é patente que o Município não deixou de concretizar de forma suficientemente detalhada, as razões subjacentes ao facto de considerar preenchidos os pressupostos previstos na alínea d) do nº 1 do artigo 79º do CCP, enquanto circunstâncias supervenientes, determinantes da prática do ato objeto de impugnação. Efetivamente, afirmou-se na decisão recorrida, que, “Escalpelizando os motivos indicados pelo Recorrido, impõe-se a este Tribunal considerar como atendível e classificável como circunstância superveniente suscetível de alterar os pressupostos nos quais se fundou a decisão de contratar, a designada “alteração da estratégia municipal” causada não só pela necessidade de uma diferente alocação dos seus recursos financeiros, atentos os graves incêndios florestais que afetaram o município no ano de 2017, bem como a ulterior alteração legal das competências autárquicas, em virtude da aprovação da Lei nº 50/2018, de 16 de Agosto, e que se revelam profundas, e ainda a indisponibilidade de recursos financeiros, uma vez que, atento o decurso do tempo, caducaram financiamentos comunitários de que o Recorrido poderia dispor para a concretização da referida obra. É certo que, conforme afirma a Autora na sua petição inicial, não especificou o Recorrido, na decisão ora sob escrutínio, quais os concretos materiais previstos no projeto inicial que, na sua perspetiva, embarateceram ou se tornaram obsoletos. Todavia, no entender deste Tribunal não exigia à Administração, na veste de Entidade Adjudicante, que apresentasse um tão profundo grau de concretização das referidas circunstâncias supervenientes que alteraram os pressupostos da sua decisão de contratar (sendo que bastaria, para reputar de preenchido tal pressuposto, a ulterior alteração de competências das autarquias, aprovada por lei ulterior, bem como os incêndios florestais que atingiram o concelho de 2017 e que, de um dia para o outro, obrigou a edilidade a rever todas as suas prioridades de alocação dos recursos financeiros). Para além do mais, resulta da experiência comum que o decurso de um prazo superior a 4 anos, como sucedeu no caso presente, é suficiente, na atualidade, para tornar certas soluções de construção e de tecnologia totalmente obsoletas, atenta a velocidade vertiginosa em que novas soluções são descobertas e implementadas, bem como para causar severas alterações nos respetivos preços dos materiais, ou para que alguns deles sejam paulatinamente abandonados. Assim, não se exigiria ao Recorrido que, para indicar as razões de facto que motivaram a sua decisão de revogar o concurso, chegasse a tal nível de concretização (detalhando, por exemplo, qual o preço de alguns materiais em 2016, e qual o seu preço de 2020), sendo que a fundamentação de que lançou mão é francamente suficiente para que se logre perceber o que motivou aquela entidade. Por fim, sublinhe-se que as razões, de facto e de direito, constantes do ato impugnado se revelaram suficientes para que pudesse o seu destinatário médio compreender o porquê da sua prática, sindicando-a, se assim o entendesse. Consequentemente, improcede em toda a linha o arguido vício de falta de fundamentação, o que desde já se declara.” Como se sumariou ainda no Acórdão do STA nº 1898/13, de 20.03.2014, “Não há lugar a adjudicação quando alguma circunstância superveniente ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, relativa aos pressupostos da decisão de contratar, o justifique”, o que corresponde à situação em apreciação, uma vez que a decisão de não adjudicação resultou de constrangimentos de ordem técnica e financeira, através de uma descrição suficientemente fundamentada, assente em princípios de legalidade, que impediram a adjudicação. Em face do que precede, não se reconhece igualmente a imputada falta de fundamentação da decisão recorrida, bem como o correspondentemente invocado erro de direito. RECURSO DA T. Vem a Contrainteressada T. recorrer do Despacho que lhe indeferiu o incidente de oposição espontânea e do segmento decisório que julgou parcialmente procedente a presente ação de contencioso pré-contratual. Entende a Recorrente que, em função dos termos da ação intentada e considerando o teor do ato objeto de impugnação, só lhe restava opor-se nos termos em que o fez, deduzindo o respetivo incidente de intervenção. Com efeito, alega a Recorrente T. que se verificará um conflito de direitos que justifica a oposição e esse conflito pela via exercida. O alegado resultará do facto de ter sido reconhecido o direito à execução da decisão proferida no processo nº 19/17.2BEVIS, no âmbito do qual, foi determinado que o Município procedesse à renovação do procedimento concursal a partir do vício determinante da sua anulação. Conclui a recorrente que a renovação do procedimento é incompatível com a presente ação, por, designadamente, vir peticionada a prática de ato devido de adjudicação. Assim, entende a aqui Recorrente que o Despacho de que recorre, erra no julgamento da matéria de direito (artigo 639.º n.º 2) quando interpretando o artigo 333.º n.º 1 do CPC, conclui pela inexistência de incompatibilidade entre o direito à execução de sentença, na esfera jurídica da Recorrente, o direito à impugnação do ato, na esfera jurídica da Autora e o interesse legítimo na validade do ato praticado, na esfera jurídica do recorrido Município. Em qualquer caso, tal como decidido em 1ª Instância, e aqui se ratificará, não se reconhece que o facto da aqui Recorrente pretender exercer um direito próprio, se mostre incompatível com o direito que a Autora pretende fazer valer nestes autos. Se é certo que entende a aqui Recorrente que em resultado do direito à execução da decisão proferida no processo nº 19/17.2BEVIS, deverá o recorrido Município renovar o procedimento concursal a partir do vício determinante da anulação do ato, não se vislumbra que tal se mostre incompatível, designadamente com o decidido na presente Ação relativamente à C. O direito da recorrente, obtido em Ação diversa, cinge-se à imposição de que o Município renove o procedimento concursal, a partir do vício que determinou a anulação do ato que ditou a exclusão do procedimento da sua proposta, o que se não mostra incompatível com o aqui decidido. Com efeito, o município não só já procedeu a tal determinada renovação procedimental, como proferiu novos atos (relatório preliminar, relatório final e decisão final de não adjudicação) que a aqui recorrente T. nem sequer impugnou. A T. tem manifestamente um interesse contrário ao da C., daí vir indicada no presente Processo como contrainteressada, em resultado de terem sido serem concorrentes à mesma adjudicação, o que não significa que os direitos de ambas sejam necessariamente incompatíveis do ponto de vista procedimental. A T. não ganha nem perde nada com a decisão proferida na presente Ação, sendo que a mesma não colide com aquilo que havia já sido decidido no indicado Processo n.º 19/17.3BEVIS, tanto mais que em momento algum existiu uma decisão judicial que tenha obrigado o município a graduar a proposta da T. em primeiro lugar e a proferir decisão de adjudicação a qualquer dos candidatos. Atente-se no seguinte: No âmbito do procedimento concursal aqui controvertido, após o município ter deliberado originariamente excluir a proposta da T. e ter deliberado adjudicar o contrato de empreitada à C., discorreu e decidiu lapidarmente o STA no âmbito do Processo n.º 19/17.3BEVIS-B, o seguinte: “Tem, pois, o ato de exclusão da proposta que ser anulado (o que acarreta obviamente a anulação da adjudicação e do contrato de empreitada se já celebrado -pedidos i) e ii), alínea b) - art. 145° da petição inicial) para que o júri dê cumprimento ao citado art. 71°, n° 3 do CCP, pedindo os esclarecimentos que considere relevantes face á “nota justificativa do preço proposto” apresentada, avaliando a proposta face aos mesmos, admitindo ou excluindo a proposta conforme a consideração que fizer desses esclarecimentos (cfr. ad. 70, n° 2, ai. e), 2ª parte do CCP), seguindo-se os ulteriores termos do procedimento, de acordo com as regras do concurso e do CCP aplicáveis. O que significa que, contrariamente ao que decidiu o acórdão recorrido, não é possível julgar procedentes os pedidos formulados pela autora na petição inicial, pelos fundamentos indicados, apenas sendo de anular o ato de exclusão da proposta, pelos fundamentos e com os efeitos sobreditos. Termos em que, é de conceder parcial provimento ao recurso, mantendo-se apenas o segmento decisório que anulou o ato de exclusão impugnado. Pelo exposto, acordam em conceder parcial provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido apenas quanto à exclusão da proposta da autora. Correspondentemente com a referida decisão do STA, o Município, após ter sido anulado o ato de exclusão da proposta da recorrente T., estava obrigado a pedir os esclarecimentos que considerasse relevantes, seguindo-se os ulteriores termos do procedimento, de acordo com as regras do concurso e do CCP. Em qualquer caso, resulta dos elementos documentais disponíveis que o procedimento concursal foi renovado, de onde resultou, novamente, a decisão de não adjudicação, a qual não foi impugnada pela T., em face do que se não mostrava adequado e aceitável que a mesma sociedade viesse na presente Ação recorrer ao incidente da oposição espontânea, previsto no artigo 333º do CPC, para fazer renascer o seu direito, o que não foi, naturalmente, impeditivo de intervir enquanto contrainteressado. A partir do momento em que o Município deu cumprimento ao acórdão do STA nos autos de Execução, através de atos não impugnados pela T., não pode o Município na presente Ação, com objeto e Autor diverso, ser condenado a executar uma decisão judicial que, bem ou mal, já executou anteriormente. Já a presente Ação tem por objeto singelamente a verificação da validade da revogação da decisão de contratar, por vícios próprios, não cabendo ao Tribunal apurar da compatibilidade de tal decisão com o julgado anulatório proferido nos autos que correram termos sob o nº 19/17.2BEVIS e que está a ser discutida em sede de processo de execução, que corre termos sob o nº 19/17.2BEVIS-B. É, pois, manifesto inexistir qualquer direito próprio da contrainteressada T. incompatível com a decisão proferida ou a proferir nos presentes autos. Em face do que precede, não se vislumbram razões para censurar a decisão proferida na presente Ação de indeferir o incidente de oposição espontânea, previsto no artigo 333º do CPC. Por outro lado, a decisão de não adjudicação é legítima e devidamente justificada, não se reconhecendo a invocada nulidade da mesma. Como bastamente supra evidenciado e resultando igualmente da decisão de 1ª instância, é patente que se verificou uma situação superveniente justificativa para a alteração da decisão de contratar, encontram-se assim preenchidos os requisitos legais para aplicação do disposto no artigo 79 n.º 1 alínea d) do CCP. Em face de tudo quanto precedentemente se expendeu, não padecem as decisões judiciais aqui recorridas dos vícios que lhes foram imputados, em face do que julgarão improcedentes os analisados Recursos. * * * Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento aos Recursos, mantendo-se as decisões recorridas.Custas pelos Recorrentes Porto, 18 de setembro de 2020 Frederico de Frias Macedo Branco Nuno Coutinho Ricardo de Oliveira e Sousa |