Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01721/13.3BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 10/03/2024 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES |
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Descritores: | JUNÇÃO DE DOCUMENTO;CASO JULGADO; IMPUGNAÇÃO DO JULGAMENTO DE FACTO; ÓNUS DE ALEGAÇÃO; |
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Sumário: | I. A excepção do caso julgado exige identidade de sujeitos, de pedidos e de causa de pedir em ambas as acções. II. Há́ identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica; há́ identidade do pedido quando em ambas as acções se pretende o mesmo efeito jurídico; há identidade da causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico – simples ou complexo. III. Na impugnação da decisão da matéria de facto apurada de 1ª. Instância a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, devendo, nas alegações de recurso, especificar, obrigatoriamente não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. IV. O direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente mal julgados, para tanto sendo necessário que se enunciem os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões de direito, as quais lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. «AA»., (Recorrente), notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 30-05-2015, que julgou improcedente a impugnação judicial, por si intentada, contra obrigação de pagamento da coima fiscal bem como as liquidações adicionais de IVA do ano de 2005, 2006 e 2007 imputadas à devedora originária [SCom01...], SA, inconformado vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «(…) 1. A douta Sentença ignora completamente os factos alegados pelo Recorrente em sede de Impugnação, não merecendo qualquer resposta (no sentido de se considerarem provados ou não provados), antes incluídos de forma vaga e imprecisa no âmbito do ERRO NA FORMA DO PROCESSO. 2. O Recorrente poderia ter lançado mão de outra forma de processo, nomeadamente, a Oposição Judicial. 3. Todavia, o Recorrente entendeu que o ato de liquidação do imposto estaria ferido de legalidade porque, ao longo do seu processo de formação, foram violadas disposições legais que, em definitivo, afetaram e o invalidaram. 4. O Recorrente não pretendeu atacar o despacho de reversão ou pôr em causa a sua qualidade de Administrador (de direito e de facto). 5. A forma como foi obtida a liquidação do imposto, embora formalmente legal, se encontra ferida de uma ilegalidade material. 6. Tal ilegalidade, consubstancia-se na preterição dos mais elementares direitos dos cidadãos, nomeadamente, aquando da Audição escrita, a Administração fiscal ter ignorado olimpicamente quer os argumentos apresentados pelo aqui Recorrente e, acima de tudo, ignorado a sua prova testemunhal. 7. O ato de liquidação ficou igualmente ferido quando, não obstante o conhecimento, por parte da Administração Fiscal, que a devedora principal ([SCom01...]) se encontrava insolvente imputou, ao aqui Recorrente, a responsabilidade pela não apresentação dos extratos contabilísticos. 8. Ora, como é do conhecimento da AT aquela declaração de insolvência importou a apreensão imediata dos elementos de contabilidade e a entrega da mesma ao Administrador de Insolvência, conforme exposto no ponto 7º da Sentença junta com Impugnação. 9. O Recorrente não conseguia, mesmo que quisesse, exibir os livros de escrituração e os registos contabilísticos, porque quem detinha a sua posse e acesso, à data da inspeção, era o Administrador de Insolvência e, aquando a saída do impugnante da Administração, os livros de contabilidade encontravam-se organizados e em boa ordem nas instalações da sociedade. 10. A partir da sua saída como Administrador em 04 de Março de 2008, a sua vontade esgotou-se, perdendo aí todo o domínio do facto. 11. É absurdo imputar ao aqui requerente culpa (no sentido jurídico) por "omissão de dever de diligência exigível" quando tal dever, à data dos factos (ou seja, do ato inspetivo), se impunha, única e exclusivamente, ao Administrador Judicial. 12. A AT reconhece que os prejuízos fiscais declarados são "justificáveis pela situação de insolvência que constituiu o culminar da acumulação de resultados de exploração negativos” (Página 16 do Relatório de Inspeção Tributária) não se compreendendo, perante tal reconhecimento, o porquê da quantificação das correções à matéria coletável. 13. A impugnação judicial é o meio jurisdicional mais adequado para, junto dos tribunais tributários, o contribuinte requerer a apreciação da legalidade de um ato de liquidação, como por exemplo, o ato de indeferimento de uma reclamação graciosa ou de um recurso hierárquico, com vista à sua anulação. 14. Nos termos do Artigo 66º do CPPT " os atos tributários praticados por autoridade fiscal competente em razão da matéria são definitivos quanto à fixação dos direitos dos contribuintes, sem prejuízo da sua eventual revisão ou impugnação nos termos da lei" 15. O CPPT, no seu artigo 99º enumera uma lista meramente numerativa e não taxativa dos fundamentos de impugnação, pelo que, qualquer ilegalidade abstrata ou concreta, mesmo não prevista na referida norma, é impugnável. 16. Isto porque, a atuação da Administração Fiscal, que num Estado de direito, se presume de boa-fé, foi com este ato decorrente de outros, no mínimo pouco razoável. 17. Nos termos do artigo 266º da CRP, a Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, e os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. 18. Constitui, com efeito, princípio inerente ao Estado de direito o da subordinação da Administração à lei e aos princípios nela consignados. 19. O princípio da legalidade desenvolve-se, fundamentalmente, em duas vertentes: a negativa, expressa no princípio da prevalência da lei, e a positiva, consubstanciada no princípio da precedência da lei. 20. Da primeira das referidas vertentes decorre que os atos da Administração devem conformar-se com as leis, sob pena de ilegalidade, e, da segunda, que a Administração só pode atuar com base na ou mediante autorização da lei. 21. O princípio da legalidade está necessariamente conexionado com os princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça e imparcialidade, também previstos no n o 2 do artigo 266º da CRP, e aponta para o princípio mais abrangente da juridicidade da Administração - todo o direito é fundamento e pressuposto da sua atividade -, do que deriva o acréscimo de limites internos aos seus poderes discricionários. 22. O princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, vincula a Administração Pública a adotar igual tratamento em relação às pessoas em geral, proíbe tratamento preferencial e tratar identicamente situações não iguais 23. Corolário deste princípio é o da autovinculação da Administração, por seu turno associado ao princípio da imparcialidade, que implica que os seus poderes discricionários devam ser concretizados segundo os mesmos critérios, medidas e condições relativamente a todos os particulares em idêntica situação. 24. Ademais, a propósito do procedimento administrativo, as decisões da Administração proferidas no seu âmbito não são inadequadas ou desproporcionadas em virtude de os meios procedimentais usados serem inadequados ou desproporcionados, mas porque. em razão disso. não foram considerados alguns pressupostos que o deviam ter sido. ou foram qualificados erroneamente. com a consequente ilegalidade decisória 25. Pelo que, deveria o Tribunal "a quo" ter apreciado e valorado os factos alegados pelo Recorrente. Não o fazendo, violou a mui douta sentença "a quo", por erro de interpretação. o artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário TERMOS EM QUE, DEVERÁ A DOUTA DECISÃO DO MERITÍSSIMO TRIBUNAL A QUO SER REVOGADA E, EM CONSEQUÊNCIA SER ACÇÃO JULGADA PROCEDENTE E DECLARADA ILEGAL A LIQUIDAÇÃO DO IMPOSTO E EXTINTA A EXECUÇÃO REVERTIDA CONTRA O AQUI RECORRENTE, COM O QUE SE FARÁ JUSTIÇA.» 1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 207 do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso, do qual se extraí: “(...) O recorrente não apresentou, pois, factos ou elementos capazes de contrariar a factualidade apurada. Tendo em conta as disposições legais, aplicáveis em matéria fiscal, sobre rendimentos das sociedades de que fazem parte, nomeadamente o RCPIT, CIRC, LCT, e CIRS, as correcções efetuadas não enfermam, de qualquer ilegalidade, pelo que bem andou a douta sentença assim decidindo Assim, bem foram efetuadas correcções técnico-aritméticas no cálculo da matéria coletável. Não se verifica pois erro de julgamento de facto e de direito. -Violação do principio de audição O recorrente alega que a AT violou o direito de audição, por não ter atendido a sua argumentação e a inquirição de testemunhas Resulta do RIT que a inspecionada, apesar de notificada, não exerceu o direito de audição. Foi ouvido em auto o administrador da insolvência e o aqui recorrente pronunciou-se como resulta de fls 47. A sentença a nosso ver ponderou devidamente as questões que lhe foram submetidas e a prova apresentada Da mesma consta devidamente os meios de prova a que o Tribunal recorreu para dar como provada e não provada a matéria factual, a qual se se mostrou suficiente e adequada, especificando correctamente os meios de prova atendidos e o direito aplicável. Pelo exposto, emitimos parecer no sentido da improcedência do recurso com manutenção da sentença recorrida.” 1.4. Pelo Recorrente em 21.03.2024 foi apresentado articulado superveniente, ao abrigo do artigo 651º, do CPC por remissão do artigo 2º, alínea e) do CPPT, com os seguintes fundamentos: A – O processo n.º 554/13.1BEPRT, já findo, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, corresponde à oposição que a outra responsável subsidiária da sociedade “[SCom01...], SA” apresentou contra o despacho de reversão; B- O recorrente só recentemente teve conhecimento que já tinha sido proferida decisão no supra aludido processo, em 9 de dezembro de 2022, e que tinha sido favorável à Oponente; C- A sentença proferida pelo Tribunal à quo baseou-se no facto de quer no projeto quer no próprio despacho de reversão, igual para os dois revertidos, existir a preterição de formalidades legais fundamentais. D – Considerou a douta sentença que a AT no despacho de reversão não alegou, não comprovou nem fez qualquer diligência para demonstrar que por culpa da gestão negligente ou até pela prática de factos ilícitos dos administradores da devedora originária encontrava-se esta, por tais motivos, impossibilitada de efetuar o pagamento das dividas tributárias; E- Uma vez que se trata de uma questão de falta de fundamentação no despacho de reversão, entendemos que se materializou para ambos os responsáveis subsidiários. F- Por tal razão, aqui se invoca a verificação da autoridade do caso julgado na sua vertente positiva, a qual impede que seja proferida uma nova decisão relativamente à matéria controvertida que já foi objeto de apreciação e decisão de mérito; G – Assim, se requer que seja julgada procedente a exceção da autoridade do caso julgado, uma vez que estamos perante autores que têm a mesma qualidade, têm o mesmo pedido e causa de pedir (extinguir a execução contra eles); H- O PEF n.º ................360 e apensos instaurado contra a devedora originária tinha como objeto a cobrança do Imposto sobre o Valor Acrescentado relativo aos anos de 2005, 2006 e 2007, no montante de €2.413,008,87, que corresponde com os anos em que os responsáveis subsidiários foram administradores. I – Contudo a data de vencimento das liquidações do IVA foram apresentadas em 28/02/2007, data muito posterior à renúncia dos dois administradores, que ocorreu para ela em dezembro de 2007 e para ele em fevereiro de 2008; J- Esta questão obrigava a que a Autoridade Tributária, nos projetos e despachos de reversão alegassem e provassem a atuação omissiva, negligente ou danosa dos administradores e que sido a razão pela qual a devedora originária não tinha possibilidade para a satisfação das dividas tributárias. L- Esta obrigação que impendia sobre a Autoridade Tributária de demonstrar a culpa dos administradores na falta de património da devedora originaria, de acordo com a sentença já transitada em julgado torna, naquele caso a revertida parte ilegítima na execução. M- Sendo a motivação para esta decisão uma omissão do despacho de reversão, que ambos receberam igual, entendemos que o Recorrente deve aproveitar essa mesma decisão, atenta a verificação da autoridade do caso julgado. N- Se assim não se entender ofende-se o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado no art. 13.º Assim decidindo fará V. Exa a acostumada justiça! 1.5. Notificada a Recorrida AT, a mesma, veio responder afastando a verificação da dita excepção de caso julgado. 1.6. Dada vista ao Ministério Público nos autos, subscreveu a posição da Recorrida, pugnando pelo indeferimento do requerimento. 1.7. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito e, a título de questão prévia, do articulado superveniente apresentado em que o Recorrente invoca a excepção do caso julgado. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 De facto 2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «FACTOS PROVADOS 1. A sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, com domicílio fiscal na Rua ..., em ..., tendo como objecto a construção de edifícios (CAE 41200), foi sujeita a acção inspectiva, credenciada pela Ordem de Serviço nº OI20.....68, que decorreu entre 22/6/2009 e 11/11/2009, e abrangeu os exercícios de 2005, 2006 e 2007, uma vez que esta sociedade apresentou prejuízos fiscais em 2004, 2005 e 2006. 2. Na acção inspectiva identificada em 1 a Administração Tributária concluiu pela impossibilidade de acesso aos elementos de escrita e documentos fiscalmente relevantes, e pelo preenchimento da contra-ordenação correspondente à falta de exibição de escrita, conduta prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 29º e 44º do CIVA, 115º do CIRC, e 113º do RGIT, bem como pela falta de entrega da declaração Modelo 22 de IRC, relativa ao exercício de 2008, e declaração de informação contabilística e fiscal do ano de 2008, nos termos do artigo 29º, nº 1, alínea d), e 109º, nº 1, alínea c), ambos do CIRC. 3. No decurso da acção inspectiva identificada em 1, a Administração Tributária procedeu à notificação do Administrador de Insolvência, Dr. «BB», nomeado no Processo de Insolvência nº ..6/0...TYVNG, instaurado contra a sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, que correu termos no ... Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, nos termos exarados no documento de fls. 182 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido, para “no prazo de 28 dias, apresentar os seguintes elementos: a) Registos da contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal e respectivos documentos de suporte, conforme previsto nos artigos 115.º do Código do IRC e 29.º e 44.º ambos do Código do IVA, desde 2005-01-01 até à data; b) Livros de escrituração obrigatórios nos termos das leis comercial e fiscal do exercício de 2005.”, e que a falta de apresentação dos elementos de escrita na data fixada seria considerada recusa de exibição, prevista e punida nos termos do artigo 113º do Regime Geral das Infracções Tributárias, e poderia implicar a determinação da matéria colectável por métodos indirectos, nos termos dos artigos 87º a 89º da Lei Geral Tributária, artigo 52º do Código do IRC, e artigo 90º do Código do IVA, e a não exibição poderia ainda implicar como a dedução indevida do IVA incluído nas declarações apresentadas nos períodos constantes da acção inspectiva. 4. Em resposta ao solicitado em 3 o Sr. Administrador de Insolvência, em conformidade com a documentação de fls. 183/189 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzida, justificou as razões da impossibilidade dessa exibição pelo facto de que “a insolvente não possui acesso à contabilidade histórica desde Julho de 2008, razão pela qual se mencionou o facto no Relatório produzido no âmbito do art.º 155.º do CIRE”, e que foi solicitada a intervenção da sociedade comercial “[SCom02...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...11, para a promoção das devidas soluções quanto ao acesso contabilístico, a qual apresentou um orçamento no valor de € 3.000,00 para a prestação do serviço de recuperação e reparação da base de dados existente. Esclareceu que manifestou posição desfavorável ao pagamento desse orçamento por parte da massa insolvente, e promoveu, em 29/4/2009, um requerimento ao Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia com o objectivo de requerer notificação da sociedade “[SCom02...], S.A.” para repor as bases de dados e promover à disposição do Administrador da Insolvência os acessos devidos à contabilidade, requerimento que não obteve resposta. O Administrador da Insolvência reiterou “a total disponibilidade para o acesso à informação contabilística, promovendo posição de que a sua eventual indisponibilidade temporária em nada deverá a Massa insolvente e os responsáveis pela insolvente serem responsabilizados, considerando as diligências efectuadas e que aguardam conclusão.”. 5. No decurso da acção inspectiva identificada em 1, «CC», Contribuinte Fiscal nº ...31, prestou declarações à Administração Tributária, na qualidade de Administrador da sociedade comercial “[SCom02...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...11, nos termos exarados na documentação de fls. 191/193 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzida, da qual se retira que entre esta sociedade e a sociedade comercial “[SCom01...], S.A.” existia um contrato de prestação de serviços com a sociedade comercial “[SCom03...], S.A.”, por intermédio do Dr. «AA» (seu cunhado), e como no mesmo espaço funcionavam outras sociedades comerciais como a [SCom01...] e a [SCom04...]. A “[SCom02...]” prestava os serviços a todas estas entidades apesar de facturar tudo à sociedade “[SCom03...]” que depois facturava os serviços às respectivas empresas do grupo. A “[SCom02...]” prestava todo o tipo de serviços de informática desde hardware a software, e quanto ao software de contabilidade, a “[SCom02...]” alugava o software ao grupo “[SCom03...]”, o que incluía o acesso ao software, que estava instalado no servidor propriedade do grupo “[SCom03...]”, onde se encontrava igualmente a base de dados, igualmente propriedade do grupo “[SCom03...]”. A “[SCom02...]” tinha apenas um acesso remoto ao servidor, acesso este que foi cortado, sem autorização da “[SCom02...]”, pelo grupo “[SCom03...]”, pelo que a “[SCom02...]” deixou de ter acesso à “[SCom01...]” (e restante grupo [SCom03...]) a partir dessa altura. No entanto, a “[SCom01...]” continuava a ter o acesso ao software de contabilidade e às bases de dados até porque cortaram o acesso à “[SCom02...]” antes que esta pudesse cortar o acesso ao software da contabilidade, ao abrigo da cessão do contrato de aluguer. Esclareceu que, tem conhecimento, porque ouviu falar, que o Administrador de Insolvência recorreu a outras pessoas para tentar aceder ao programa, e após solicitações por parte da “[SCom01...]”, na pessoa do Administrador de Insolvência, foi um comercial da “[SCom02...]” («DD») à “[SCom01...]” para verificar a situação das bases de dados, e o técnico que lá foi consultou o servidor na presença de uma colaboradora da “[SCom01...]” (Dra. «EE») e constatou que a base de dados estava lá num disco de backup e que algumas das pastas do software não estavam nos locais certos, o que os leva a crer que alguém na “[SCom01...]” tenha mexido no servidor. Tendo sido solicitado pelo Administrador de Insolvência da “[SCom01...]” que fosse reposto o acesso à contabilidade, a “[SCom02...]” apresentou uma proposta para os serviços a prestar, no valor de € 3.000,00 mas não obtiveram qualquer resposta ou contacto por parte da “[SCom01...]” ou do seu Administrador da Insolvência. 6. O Sr. Administrador de Insolvência, Dr. «BB», nomeado no Processo nº ..6/0...TYVNG, instaurado contra a sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, que correu termos no ... Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, prestou declarações perante a Administração Tributária, em 22/9/2009, nos termos exarados no documento de fls. 195/197 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido, documento do qual se retira que se mantém a indisponibilidade do acesso aos registos contabilísticos. Os documentos de suporte da contabilidade dos anos de 2005, 2006 e 2007 encontram-se nas instalações da [SCom01...], e dos elementos da contabilidade em suporte de papel, apenas constam os que estão nas capas de encerramento dos anos de 2005 e 2006, e destas capas não constam extractos das contas nem o balancete final que esteve na origem das demonstrações financeiras apresentadas. Que quando chegou à “[SCom01...]” e pediu balancetes, não lhe foram fornecidos com o argumento de que não tinham acesso à contabilidade e que as pessoas que estavam agora na “[SCom01...]” não eram as mesmas que à data dos factos. Em relação à capa do fecho de 2007, não chegou a vê-la mas, de acordo com o que lhe transmitiram, esta capa terá desaparecido num alegado roubo que ocorreu há cerca de um ano às instalações da “[SCom01...]” onde, para além da pasta, terão também desaparecido um computador portátil e outros documentos em papel. No que respeita ao acesso informático à contabilidade, supõe que as bases de dados estarão no servidor da “[SCom01...]” mas necessita do acesso ao software necessário para aceder às bases de dados, que de acordo com as informações que lhe foram transmitidas, era controlado pela empresa informática designada “[SCom02...]”, acesso que permitiria a utilização do software necessário para a contabilidade mas que terá sido cortado em Junho de 2008, antes de ter chegado à “[SCom01...]”, em Julho de 2008. E, uma vez que não tinha acesso à contabilidade, transmitiu à Assembleia de Credores este impedimento, disponibilizando-se a “[SCom02...]” para participar numa solução, pelo que, após visita de um técnico da “[SCom02...]” à “[SCom01...]”, a empresa de software apresentou um orçamento de € 3.000,00 para que fosse reposto o acesso informático à contabilidade. Como tal, por entender que o acesso à informação é prioridade vital para o processo de insolvência, promoveu esse requerimento ao Tribunal que aguarda despacho. No que respeita aos motivos da insolvência, apesar de não ter tido acesso aos registos contabilísticos que permitissem aferir dos motivos ocorridos em anos anteriores, o que constatou nas obras em que aquela participou foi que os orçamentos eram apresentados com margens negativas, com o intuito de existirem trabalhos a mais, o que permitiria que no fecho da obra a mesma fosse concluída com lucros, mas tal não se verificou nas obras que acompanhou o que, aliado à conjuntura macro-económica, conduziu a [SCom01...] à situação actual. 7. A Administração Tributária, com base na não exibição dos livros de escrituração e registos contabilísticos da sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, verificada na acção inspectiva identificada em 1, que impossibilitou a fiscalização e comprovação do IVA mencionado nas declarações apresentadas por aquela sociedade, relativas aos exercícios de 2005 a 2007, identificadas no quadro de fls. 123/125 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido, procedeu a correcções em sede de IVA, e em 12/12/2009 emitiu as correspondentes liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios identificadas nos documentos de fls. 6/29, 59/60 do processo administrativo de reclamação graciosa, que admitiam pagamento até 28/2/2010, documentos que se dão por reproduzidos. 8. O Impugnante foi notificado, em 31/5/2012, no Processo de Execução Fiscal nº ................360 e apensos, instaurados para cobrança das liquidações de IVA identificadas em 7 e coimas fiscais, na qualidade de responsável subsidiário da sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 23º, nº 4, da Lei Geral Tributária, conforme informação de fls. 30 do processo administrativo de reclamação graciosa, documento que se dá por reproduzido. 9. Em 11/6/2012, o Impugnante exerceu o direito de audição prévia em relação ao projecto de reversão aludido em 8, no qual alegou não ser responsável pelas dívidas de IVA, relativas a 2005 a 2007, por terem sido entregues as declarações e pago o imposto devido, nem pelas dívidas de IRS de Fevereiro a Junho de 2008 porque à data já tinha cessado funções de administrador, conforme informação de fls. 30 do processo administrativo de reclamação graciosa, documento que se dá por reproduzido. 10. No Processo de Execução fiscal nº ................360 e apensos, em 18/11/2012, foram lavradas a informação e despacho que constam a fls. 30/35 do processo administrativo de reclamação graciosa, documentos que se dão por reproduzidos, dos quais se extracta, “O responsável subsidiário vem alegar que as declarações periódicas de IVA referentes aos anos de 2005 e 2007 foram enviadas dentro do prazo e efectuados os pagamentos devidos. O IVA, em dívida nos presentes autos, não resultou do valor apurado pela devedora originária nas declarações periódicas de IVA (…) O que está aqui em causa é o IVA apurado pela Inspecção Tributária originada “pelo facto do sujeito passivo ter apresentado prejuízos fiscais nos anos de 2004, 2005 e 2006” e na sequência da “análise externa do pedido de reembolso de IVA do período 04-12, se ter constatado que o sujeito passivo se encontrava permanente em crédito de IVA e apresentar resultados negativos significativos no exercício de 2006, com elevados valores na rubrica Subcontratos” (…) À data dos factos tributários, aqui em causa, era administrador da devedora originária «AA», nif ...58..., cfr. informação da Conservatória do Registo Comercial. (…) Apesar das diligências desencadeadas pela inspecção, junto dos administradores à data dos factos constitutivos, no caso em apreço do administrador «AA», e ainda do administrador da insolvência não permitiram à Administração Fiscal fiscalizar e comprovar o IVA mencionado nas declarações periódicas dos anos de 2005 a 2007, por não terem sido exibidos os livros de escrituração e os registos contabilísticos, pelo que os valores apurados pela Administração se tornaram definitivos nos termos do artº 90º do CIVA.”. 11. Em 19/11/2012 foi lavrado o “DESPACHO (REVERSÃO)” que se encontra a fls. 36 do processo administrativo de reclamação graciosa, documento que se dá por reproduzido, com vista à reversão da execução, pelo montante de € 2.414.796,14, relativamente às dívidas identificadas na documentação de fls. 37/38. 12. A Administração Tributária remeteu ao Impugnante, mediante registo postal com aviso de recepção, o ofício que se encontra a fls. 51 do processo administrativo de reclamação graciosa, documento que se dá por reproduzido, com vista à citação do mesmo enquanto revertido, no processo de execução fiscal e apensos identificados em 11. 13. O aviso de recepção relativo ao ofício aludido em 12 foi assinado em 30/11/2012, por «FF». 14. A Administração Tributária remeteu ao Impugnante, mediante registo postal com aviso de recepção, o ofício que se encontra a fls. 55 do processo administrativo de reclamação graciosa, documento que se dá por reproduzido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 241º do Código de Processo Civil. 15. O Impugnante, em 1/3/2013, deduziu reclamação graciosa relativamente à citação como revertido, nos termos e com os fundamentos exarados do documento de fls. 4/12 do processo administrativo de reclamação graciosa apenso, documento que se dá por reproduzido. 16. A reclamação graciosa aludida em 15 foi indeferida por despacho de 24/5/2013, nos termos e com os fundamentos exarados na documentação de fls. 64/75 do processo administrativo de reclamação graciosa apenso, documentação que se dá por reproduzida. 17. O despacho identificado em 16 foi notificado à Impugnante pelo ofício nº ...03, de 27/5/2013, que consta a fls. 76 do processo administrativo de reclamação graciosa apenso e se dá por reproduzido. 18. A presente impugnação judicial foi apresentada em 17/6/2013, acompanhada de um requerimento de protecção jurídica apresentado em 14/5/2013. 19. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 231/232 do processo administrativo apenso que consubstancia cópia de uma acta da sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, datada de 4/3/2008, da qual se extracta, “Ponto 2 - Mediante a recepção da carta de demissão do Administrador «AA», discutir e deliberar a eleição do Administrador «GG» (…) que assumirá a Presidência do Conselho de Administração”. 20. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 16/17 que consubstancia cópia da acta de Assembleia de Credores, que teve lugar no Processo nº ...5/1...TBCVD, que correu termos no ... Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila do Conde, sendo insolvente «HH», ora Impugnante, da qual consta que os credores presentes votaram contra a exoneração do passivo restante. 21. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 19 que consubstancia cópia do anúncio do Processo nº ...5/1...TBCVD, que correu termos no ... Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila do Conde, do qual constam as obrigações do insolvente, nos 5 anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência. 22. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 22/31 que consubstancia cópia da sentença proferida em 11/7/2008, no Processo de Insolvência nº ..6/0...TYVNG, que correu termos no ... Juízo Cível do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, que declarou a insolvência da sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45, e nomeou Administrador da Insolvência o Sr. Dr. «BB». 23. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 33/38 que consubstancia cópia da acta de Assembleia de Credores que teve lugar em 6/1/2009, no Processo de Insolvência nº ..6/0...TYVNG, que correu termos no ... Juízo Cível do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, relativo à insolvência da sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ...45. FACTOS NÃO PROVADOS Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir, nomeadamente não se provou que foi deferido o pedido de exoneração do passivo restante no Processo de Insolvência instaurado contra o Impugnante, nem que a contabilidade da sociedade devedora originária foi apreendida e entregue ao Administrador de Insolvência. * A convicção do Tribunal estribou-se na análise crítica da documentação junta aos autos, referida no probatório em relação a cada um dos factos aí enunciados, bem como na factualidade alegada e não impugnada, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º Código de Processo Civil. A factualidade não provada resultou da total ausência de prova documental relativa à alegada exoneração do passivo, contra a qual se pronunciaram os credores, e na existência de prova do contrário em relação à não apreensão e entrega da contabilidade ao Administrador de Insolvência.» 2.1.2. Aditamento oficioso Ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662.º do novo CPC adita-se à matéria de facto o seguinte: 24. Em complemento dos itens 2. a 6. da matéria de facto provada, discorre do RIT sob o ponto “III.3 – Justificação para a Sucessão dos Prejuízos Fiscais declarados nos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007” que: “III.3.2 - Notificação Efectuada ao Administrador à Data dos Factos - «AA» Em 2009-07-27 foi enviado ofício para o Administrador da [SCom01...] à data dos factos, «AA», NIF: ...58 para a apresentação junto desta Direcção de Finanças dos elementos justificativos para a sucessão dos prejuízos declarados pela [SCom01...] nos exercícios de 2004 a 2007. A resposta a este pedido de elementos foi efectuada por fax, recebido nestes Serviços em 200908-05, com a informação de que "os resultados negativos nos anos referidos se deveram às graves dificuldades económicas que a empresa ultrapassou devido à difícil conjuntura do mercado da construção civil, extremamente competitivo, tendo culminado em 11-07-2008, data da insolvência da sociedade [SCom01...]".” [cf. fls. 121 do Processo Administrativo apenso e fls. 12 do RIT ali incorporado] 2.2. De direito 2.2.1. Da questão prévia – da exceção do caso julgado In casu, o Recorrente apesar de erroneamente qualificar a sua intervenção enquanto articulado superveniente, efectivamente o que pretende, assente nas disposições legais que cita, é a junção aos autos da sentença proferida no processo 554/13.1BEPRT, transitada em julgado, onde foi decidido dar razão a uma revertida em processo de execução fiscal quanto à ilegalidade da reversão operada na execução fiscal instaurada contra a [SCom01...], S.A., cuja dívida resultou das liquidações adicionais de IVA de 2005 a 2007 (devedora originária). Ao abrigo do disposto no artigo 651º do CPC, admitimos o documento junto aos autos pelo Recorrente, vide fls. 252 a 2574 do processo SITAF, sentença proferido no âmbito do processo de oposição n.º 554/13.1BEPRT, deduzida por «II», no âmbito da execução fiscal n.º ................360 e apensos instaurada contra a devedora originária, a sociedade comercial “[SCom01...], S.A.”, tendo por objecto a cobrança de divida de IVA dos anos de 2005, 2006 e 2007, no montante global de € 2.413.008,87, e contra ela autora revertida. Cumpre, assim, aferir a título de questão prévia, se efectivamente aquela decisão proferida em 09.12.2022 forma caso julgado extensível aos presentes autos, ou seja, da ocorrência da exceção do caso julgado em conformidade com o alegado pelo Recorrente no seu requerimento. Vejamos então se entre a decisão recorrida, objecto do presente recurso, ocorre violação de caso julgado formado por via da sentença proferido no processo n.º 554/13.1.BEPRT transitada em julgado. Vejamos. Conforme decorre do artigo 628.º do CPC, ocorre o trânsito em julgado, quando uma decisão é já insusceptível de impugnação por meio de reclamação ou através de recurso ordinário. Verificada tal insusceptibilidade, forma-se caso julgado, que se traduz, portanto, na impossibilidade da decisão proferida ser substituída ou modificada por qualquer tribunal, incluindo aquele que a proferiu. De acordo com o critério da eficácia, distingue-se entre o caso julgado formal, que só é vinculativo no processo em que foi proferida a decisão (cf. artigo 620.º, n.º 1, do CPC) e o caso julgado material, que vincula no processo em que a decisão foi proferida e também fora dele, consoante estabelece o art.º 619.º do CPC. “Do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais, a saber: a impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida - efeito negativo - e a vinculação do mesmo tribunal e eventualmente de outros, estando em causa o caso julgado material, à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado. Todavia, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar (art.º 625.º n.º 1 do CPC), critério operativo ainda quando estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta (vide n.º 2 do preceito) (…). Nos termos do art.º 613.º agora em vigor (que reproduziu o artigo 666.º do diploma cessante), proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, ressalvando-se os casos de rectificação de erros materiais, que era lícito suprir (vide n.ºs 1 e 2 do preceitos). Tal regime é aplicável aos despachos por força do n.º 3 do preceito” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20.10.2015, no âmbito do processo n.º 231514/11.3YIPRT.C1). A exceção dilatória de caso julgado, regulada em especial nos artigos 577.º, al. i), segunda parte, 580.º e 581.º do CPC, expressa legalmente o efeito negativo do caso julgado, cujo fundamento constitucional assenta no princípio da segurança jurídica, ínsito ao Estado de Direito, derivando do artigo 2.º da Constituição Portuguesa, à semelhança do que sucede com o trânsito em julgado. A ocorrência da exceção de caso julgado supõe uma particular relação entre ações judiciais: uma relação de identidade entre os sujeitos e os objetos de duas causas. Em termos lógicos, pressupõe-se, então, a “repetição de uma causa”, conforme enuncia o artigo 580.º, n.º 1, do CPC. A repetição de uma causa ocorre “quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir” (cfr. n.º 1 do artigo 581.º do CPC). Tal situação pode ocorrer em termos intraprocessuais, quando se verifique que já foi proferida decisão entre as partes, relativamente a causas de pedir e a pretensões idênticas. Rui Pinto, in “Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias”, in Julgar, online, novembro 2018, p. 13 e ss, ensaia uma linha de atuação para a aferição, na prática, da relação de identidade entre causas, concluindo que, primeiro, “apura-se a consideração dos efeitos que uma eventual segunda decisão de mérito terá sobre a primeira decisão de mérito”, importando que, a primeira decisão haja transitado em julgado, nos termos do artigo 628.º CPC; “Depois, para efeitos da exceção de caso julgado há que comparar o teor da parte dispositiva da decisão já transitada com o perímetro potencial da decisão a proferir no segundo processo, segundo as soluções plausíveis da questão de direito, para o que relevam o objeto e os sujeitos determinados pelo autor na petição. Em suma: comparar uma decisão passada com uma potencial decisão futura”. E, conforme explica Lebre de Freitas, in “Um polvo chamado autoridade do caso julgado”, in ROA, Ano 79.º, Jul.-Dez. 2019, pp. 694-695, “[a] definição dos conceitos de identidade de parte, de pedido e de causa de pedir tem sido objeto do estudo de extensa doutrina jurídica que, ao longo de mais de um século, os foi consolidando, sem que algumas inevitáveis divergências tenham impedido a formação de um núcleo central de convergência que tem permanecido estável. (…) Na definição da identidade das partes há que atender, como diz o n.º 2 do art. 581.º, CPC, à qualidade jurídica em que autor e réu atuam. Daí deriva que, havendo representação, a parte é o representado e não o representante. Daí deriva também que, transmitida a terceiro a situação substantiva da parte, depois de transitada a sentença de mérito, se deva considerar que o adquirente tem a mesma qualidade jurídica do transmitente (cf. art. 54.º-1, CPC), pelo que há identidade de parte na nova ação em que o primeiro apareça no lugar que o segundo ocupou na primeira ação. Igualmente há que atender, na definição de identidade das partes, à extensão subjetiva da eficácia da sentença, pois a identidade de sujeitos estende-se, além das partes: aos terceiros juridicamente indiferentes (o credor comum, ou outro titular de direito relativo, perante a sentença que declare que o seu devedor, ou outra contraparte, não é titular de certo direito absoluto, cuja titularidade é de quem com ele litigou — sem prejuízo do recurso de revisão fundado na simulação do litígio); aos titulares de situação jurídica concorrente com a que a sentença reconheceu (credor ou devedor solidário; credor de obrigação indivisível; contraente beneficiário da nulidade de cláusula contratual geral; comproprietário, co-herdeiro na fase da comunhão hereditária ou contitular de outro património comum (…); aos titulares de situação jurídica cuja conservação (subcontrato) ou constituição (direito de preferência; contrato a favor de terceiro) dependa do exercício da vontade negocial duma das partes no processo; ao sócio que não impugne a deliberação social; ao chamado a intervir como parte principal ou acessória que não intervenha; ao adquirente do direito litigioso ou do direito já reconhecido ou constituído pela sentença e aos outros substituídos processuais(…). Todos os casos de extensão a terceiros da eficácia da sentença são equiparados aos da estrita identidade de partes, para o efeito dos arts. 577.º-e e 581.º do CPC.”. Não poderá olvidar-se que o efeito negativo do caso implica, que transitada em julgado uma decisão judicial, o mesmo tribunal (caso julgado formal, do artigo 620.º do CPC) ou todos os tribunais (caso julgado material, do artigo 619.º do CPC) ficarão sujeitos tanto a uma “proibição de contradição da decisão transitada”, como a “uma proibição de repetição daquela decisão” (cf. Teixeira de Sousa; Estudos sobre o novo processo civil, Lex, Lisboa, 1997, p. 574). Cumpre, ainda, referir que o próprio ordenamento jurídico tem uma salvaguarda para a possibilidade de ocorrência de casos julgados contraditórios, valendo (na expressão legal: “cumprindo-se”) a decisão primeiramente transitada – cfr. artigo 625.º, n.º 1, do CPC. Este princípio é aplicável à contradição que exista entre duas decisões que, “dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual” (cfr. n.º 2 do artigo 625.º do CPC). Em suma, a figura da exceção do caso julgado material e a sua força vinculativa supõe a verificação de uma situação de identidade do objeto do processo em ambas as ações concorrentes, triplicidade de identidade que decorre da identidade de sujeitos, de causa de pedir e do pedido formulado. Munido deste considerados, cabe analisar se entre o presente processo e a decisão nele proferida ora objecto de recurso em 31.05.2015 e, aquela outra proferida no âmbito do processo n.º 554/13.1BEPRT em 09.12.2022, transitada em julgado, se verifica a tríplice identidade exigida por força do disposto no artigo 581.º do CPC. E, desde já avancemos, que no caso em apreço, não ocorre, a nosso ver, manifestamente, a aludida identidade. Com efeito, mostra-se indiscutido não só que a as partes em ambas as ações não são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, como, ainda, que a causa de pedir e os pedidos formulados na sobredita ação não são idênticos à causa de pedir e aos pedidos formulados nestes outros autos. Vejamos. Com efeito, como se alcança da cópia da sentença proferida no processo n.º 554/13.1BEPRT, junto aos autos, e por nós confirmada por via da consulta ao SITAF, a autora, o meio processual, o pedido e a causa de pedir ali invocada reportou-se ao seguinte: estamos no âmbito de um processo de oposição à execução fiscal feita por uma revertida («II»), sendo a causa de pedir a ilegalidade do despacho de reversão e o pedido a extinção do processo de execução ao abrigo do artigo 204º, n.º 1 do CPPT. Mais: aquela acção por ilegitimidade da Oponente na execução julgou esta extinta. Ora, a única identidade que existe e se reconhece em sede de identidade, é a de que ambos foram administradores de uma sociedade “[SCom01...], S.A.”, a devedora originária no âmbito de uma execução fiscal que tem por objecto a cobrança de dividas de Imposto Sobre o Valor Acrescentado dos anos de 2005, 2006 e 2007, no montante global de 2.413.008,87, e ambos foram citados na qualidade de responsáveis subsidiários. Ocorre, que os mesmos após citação, no âmbito dos direitos que lhe assistem, optaram livremente por caminhos judicias distintos, um atacou o despacho de reversão, alegando da sua ilegalidade e ilegitimidade, outro, o nosso Recorrente, optou por atacar as próprias liquidações adicionais, deduzindo impugnação judicial contra as mesmas e assacando vícios próprios das mesmas. Em suma, no caso dos autos, para além de ser patente que as partes não são as mesmas, como já antes salientado, também a causa de pedir e a pretensão jurídica não assumem qualquer identidade com a aludida ação que correu termos com o nº 554/13. Nesta conformidade, tem de concluir-se que as ações em confronto, para além da falta de identidade, visam realizar formas de tutela material diferentes, obtidas através de pedidos prática e juridicamente diferenciados - que se não podem consequentemente reconduzir à realização do mesmo e específico efeito prático jurídico – ocorrendo assim, no plano objetivo, uma diferenciação material da causa de pedir (despacho de reversão versus liquidações de IVA) e dos pedidos formulados (extinção da instância executiva versus anulação de acto tributário). Ou seja, as pretensões materiais formuladas nas duas ações, para além de representarem vias jurídicas alternativas e estruturalmente diferenciadas, assentes em pressupostos legais autónomos, implicam a formulação de pedidos estruturalmente diferentes. Assim, somos de concluir que, no caso em apreço, não se verifica a exceção do caso julgado, uma vez que não ocorre a tríplice identidade a que alude o artigo 581º, do Código de Processo Civil. 2.2.2. Do erro de julgamento In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial que havia formulado contra a obrigação de pagamento da coima fiscal bem como as liquidações adicionais de IVA do ano de 2005, 2006 e 2007 imputadas à devedora originária “[SCom01...], SA”, peticionando a anulação das liquidações. Antes de enunciar o objecto do recurso e as questões a merecerem a nossa apreciação e decisão, cumpre evidenciar, que os presentes autos são reflexo da posição do responsável subsidiário em não atacar o despacho de reversão proferido nos autos de execução e/ou pôr em causa a sua qualidade de administrador da devedora originária, mas sim de assacar ilegalidades ao processo inerente às liquidações de imposto, à luz do que o próprio Recorrente repisa nas suas alegações e conclusões de recurso sendo exemplo o aí afirmado de que “O Recorrente não pretendeu atacar o despacho de reversão ou pôr em causa a sua qualidade de Administrador (de direito e de facto)” Efectivamente, sustenta na acção que o acto de indeferimento da Direcção de Finanças ... está “totalmente viciado de ilegalidade afectando a validade do mesmo” e efectuou “errónea interpretação da lei”, situação que se enquadra na previsão da alínea a) do artigo 99º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Sustentando, para tal, que a falta de exibição dos elementos de contabilidade e dos respectivos documentos de suporte da sociedade em causa não lhe pode ser imputada uma vez que a mesma foi declarada insolvente em 11/07/2008, e a sua contabilidade foi apreendida e entregue ao Administrador de Insolvência, pelo que, a partir de 04/03/2008, data da sua saída como Administrador, a “sua vontade esgotou-se” e perdeu “todo o domínio do facto”. Mais, invocou, que os prejuízos fiscais declarados são justificáveis pela situação de insolvência pelo que não se compreende a quantificação das correcções à matéria colectável, e que aquela sociedade foi inspeccionada em finais de 2007, pelo que a inspectora podia ter verificado a organização contabilística de 2005, 2006 e 2007. O Tribunal a quo, em sede de conhecimento, considerou em síntese que: «Na verdade, a alegada declaração de insolvência do Impugnante, e deferimento do pedido de exoneração do passivo restante, que nem sequer emergiu provado, tal como a insolvência da sociedade devedora originária, além de não contenderem com a legalidade da liquidação, não obstam ao prosseguimento da execução fiscal. Como ensina o Ac. do STA de 7/11/2012, Proc. nº 375/12, e Ac. do STA de 31/10/2102, Proc. nº 374/12, “Após a declaração de insolvência, pode prosseguir contra o insolvente uma execução fiscal por crédito vencido anteriormente, ainda que apenas relativamente a bens adquiridos posteriormente à declaração de insolvência e sem prejuízo das obrigações contraídas pela Fazenda Pública no âmbito do processo de insolvência e da prescrição.”. Por outro lado, é manifesto que não ocorre a alegada violação do direito de audição uma vez que, como decorre da transcrição efectuada em 10 do probatório, a Administração Tributária apreciou os argumentos expendidos pelo Impugnante em sede de audição prévia. Acresce que este fundamento, bem como a alegada inconstitucionalidade da obrigação de pagamento a cargo do revertido por violação dos princípios constitucionais da intransmissibilidade das penas e da presunção de inocência, constituem fundamentos típicos de oposição, que não respeitam à legalidade da liquidação, e como tal não constituem fundamentos de impugnação judicial, sendo manifesto que não ocorrem. (...) afigura-se que a Administração Tributária não podia adoptar qualquer outra conduta, e no estrito cumprimento da lei procedeu a correcções técnicas por não poder comprovar a existência e conformidade legal das operações que a sociedade em causa terá efectuado, e reflectiu nas declarações apresentadas. Destarte, não merece censura a quantificação das correcções à matéria tributável uma vez que não foram apresentados os necessários elementos para comprovação daquelas operações, designadamente elementos justificativos dos prejuízos alegadamente sofridos nos exercícios de 2005, 2006 e 2007. Assim sendo, a inexistência/não apresentação dos extractos das contas do IVA dedutível em cada um dos mencionados exercícios, por forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto, como exigido pelo artigo 115º do CIRC, e artigos 29º, nº 1, alínea g), e artigo 44º, ambos do CIVA, obsta à dedução do IVA mencionado pela sociedade nas declarações periódicas relativas aos exercícios em questão, que tem de se considerar indevidamente deduzido, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 19º e 44º do CIVA. Consequentemente, carece de sentido a alegação de que o acto de indeferimento da Direcção de Finanças ... está “viciado de ilegalidade afectando a validade do mesmo” e efectuou “errónea interpretação da lei”.» E, no que tange, à falta de compreensão da quantificação das correpções à matéria colectável, de que: «(...) Porém, a verificação de prejuízos fiscais em três anos consecutivos despoletou a acção inspectiva em causa, no estrito cumprimento da lei, sendo certo que a sociedade não exibiu os comprovativos contabilísticos nem forneceu qualquer explicação com vista a justificar aqueles prejuízos. Outrossim, apesar do Administrador de Insolvência não ter tido acesso aos registos contabilísticos que permitissem aferir dos motivos ocorridos em anos anteriores, constatou que nas obras em que a sociedade participou os orçamentos eram apresentados com margens negativas, com o intuito de existirem trabalhos a mais, o que permitiria que a empreitada fosse concluída com lucros, hipóteses que porém não se verificaram naquelas obras o que, aliado à conjuntura macro-económica, conduziu à insolvência da sociedade. Esta forma de gerir a sociedade não abona em relação à alegada ausência de culpa do Impugnante. A talhe de foice importa ainda referir que o facto de a sociedade em causa ter sido objecto de uma inspecção anterior, na qual alegadamente foram apresentados todos os elementos, também não afasta a culpa do Impugnante. Desde logo, trata-se de procedimentos necessariamente diferentes, com incidência em diferentes períodos de tributação, uma vez que não podiam ser desencadeadas duas acções inspectivas relativamente aos mesmos períodos, e desconhece-se qual o âmbito da referida inspecção anterior, sendo certo que o Impugnante nada demonstrou a esse propósito, e nem sequer identificou os elementos que teriam sido apresentados nessa anterior inspecção.» Não se conformando, com o assim decidido, o Recorrente sustenta que a sentença enferma de erro na apreciação e valoração dos factos alegados na petição inicial e erro na interpretação do artigo 99º, alínea a) do CPPT. Vejamos. Tal como foi já referido supra, o objeto do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, impondo o legislador ao Recorrente um ónus muito particular no que diz respeito à fundamentação do recurso no que se refere à impugnação da decisão relativa à matéria de facto (cf. artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT), que encontra a sua razão de ser na necessidade imperiosa de garantir o direito ao contraditório, por um lado, e por outro, na salvaguarda da “(…) rigorosa delimitação do objeto do recurso, até porque o sistema consagrado não permite recursos genéricos contra a matéria de facto” (cf. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, ..., in Código de Processo Civil Anotado. Vol. I. 2.ª edição, reimpressão, Coimbra, Almedina, 2020, págs. 797-798). Assim sendo, sempre que seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o apelante obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (cf. n.º 1 do artigo 640.º CPC), os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados [cf. alínea a)], os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cf. alínea b)]; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cf. alínea c)]. Por outro lado, se bem que sem aplicação aos autos, tal como resulta do n.º 2 do citado artigo, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes [cf. alínea a)]. Rememorando a noção de erro de julgamento de facto, o mesmo poderá reconduzir-se a um erro de apreciação das provas, ou seja, um “erro de avaliação de um concreto meio de prova, i. e., um erro sobre que factos estão representados por um dado meio de prova”, ou a um erro na fixação dos factos materiais da causa, que se reconduz ao “erro de julgamento dos factos controvertidos, i.e., de subsunção da factualidade dada como representada nos meios de prova a um juízo de realidade ou não realidade da factualidade, trazida para o processo nos termos do artigo 5.º, e tida previamente como controvertida (…)” (cf. Rui Pinto, in Manual do Recurso Civil. Volume I, Lisboa, AAFDL editora, 2020, pág. 31). Ora, a Recorrente entende, em síntese, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento por errada valoração da prova argumentando que o Tribunal a quo não apreciou ou valorou os factos que alegou em sede de petição inicial e, que no seu entender, em conformidade com a tese sustentada atestam a ilegalidade das liquidações. Sustenta, a ilegalidade das liquidações de IVA, argumentando que, “(...) aquando da Audição escrita, a Administração fiscal ter ignorado olimpicamente quer os argumentos apresentados pelo aqui Recorrente e, acima de tudo, ignorado a sua prova testemunhal.” preterindo um dos mais elementares direitos dos cidadãos, direito de audição. Mais alvitra a Recorrente que “(...) não conseguia, mesmo que quisesse, exibir os livros de escrituração e os registos contabilísticos, porque quem detinha a sua posse e acesso, à data da inspeção, era o Administrador de Insolvência e, aquando a saída do impugnante da Administração, os livros de contabilidade encontravam-se organizados e em boa ordem nas instalações da sociedade. 10. A partir da sua saída como Administrador em 04 de Março de 2008, a sua vontade esgotou-se, perdendo aí todo o domínio do facto. 11. É absurdo imputar ao aqui requerente culpa (no sentido jurídico) por "omissão de dever de diligência exigível" quando tal dever, à data dos factos (ou seja, do ato inspetivo), se impunha, única e exclusivamente, ao Administrador Judicial.” Prosseguindo refere que, “A AT reconhece que os prejuízos fiscais declarados são "justificáveis pela situação de insolvência que constituiu o culminar da acumulação de resultados de exploração negativos” (Página 16 do Relatório de Inspeção Tributária) não se compreendendo, perante tal reconhecimento, o porquê da quantificação das correções à matéria coletável.”. No mais, alude a princípios que devem nortear a actuação da AT, princípios da boa fé, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da legalidade e da imparcialidade (vide conclusões 16. a 22. das alegações de recurso), aventando que “(...) a propósito do procedimento administrativo, as decisões da Administração proferidas no seu âmbito não são inadequadas ou desproporcionadas em virtude de os meios procedimentais usados serem inadequados ou desproporcionados, mas porque. em razão disso. não foram considerados alguns pressupostos que o deviam ter sido. ou foram qualificados erroneamente. com a consequente ilegalidade decisória.” Remata aludindo que “(...) deveria o Tribunal "a quo" ter apreciado e valorado os factos alegados pelo Recorrente. Não o fazendo, violou a mui douta sentença "a quo", por erro de interpretação. o artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário.” Do que se deixa dito e da leitura que se faz do salvatério pode afirmar-se que os fundamentos aduzidos são, manifestamente insuficientes, porque dispersos e pouco precisos, para os fins visados pelo Recorrente, para lograr a concretização de um ataque quer ao julgamento da matéria de facto, quer ao julgamento de direito. A impugnação da matéria de facto, como já referimos, encontra-se, em primeira linha, balizada pelo disposto no artigo 640º do CPC e obedece a regras que não podem deixar de ser observadas, impondo-se, nomeadamente, ao recorrente a obrigatoriedade de especificar, nas alegações de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida, sendo que o não cumprimento do ónus fixado o recurso quanto à matéria de facto estará condenado ao insucesso. Daí que sobre o recorrente impende um especial ónus de alegação quando pretenda efetuar impugnação com este âmbito, impondo-se-lhe, por conseguinte, respeito pela plena satisfação das regras ali previstas. Por seu lado ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo desde que ocorram os pressupostos vertidos no artigo 662.º do CPC, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objeto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre as questões controvertidas. A alteração da matéria de facto pressupõe assim a existência de nítida disparidade entre erro na sua apreciação e a divergência do sentido em que se formou a convicção do julgador, sendo que a respetiva reapreciação por parte do tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorreu erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo, sendo certo que na situação em análise, pese embora venha alegado erro de julgamento, não vem enunciada qualquer situação em que se conteste a matéria de facto fixada no probatório ou a sua valoração. Efectivamente, volvendo aos autos, o primeiro aspecto que cumpre salientar, é que, em momento algum das suas alegações o Recorrente menciona a incorrecção na fixação de factos, ou seja, não descortinamos numa análise atenta a indicação de qualquer erroneidade imputada à fixação dos factos, bem como a menção de qualquer facto omisso, bem como a menção de qualquer meio de prova que não tenha sido levado em linha de conta pelo Tribunal a quo. Com efeito, lidos e relidos os itens do probatório e as conclusões de recurso, concluímos que, o que o Recorrente alvitra, é a incorreção pelo Tribunal a quo na ponderação e apreciação, ou seja, que o mesmo não concorda com as ilações e subsunção jurídica que a sentença espelha sobre os mesmos. O que nos reconduz para o erro de julgamento ( error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual [nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma] ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma [cf., entre outros, acórdãos STJ, de 17.10.2017, Proc.º nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1. e 10.9.2019, Proc.º nº 800/10.3TBOLH-8. E1. S2.]. Como ensinava o Prof. José Alberto Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1981, Vol. V, págs. 124, 125, o magistrado comete erro de juízo ou de julgamento quando decide mal a questão que lhe é submetida, ou porque interpreta e aplica erradamente a lei, ou porque aprecia erradamente os factos; comete um erro de actividade quando, na elaboração da sentença, infringe as regras que disciplinam o exercício do seu poder jurisdicional. Os erros da primeira categoria são de carácter substancial: afectam o fundo ou o efeito da decisão; os segundos são de carácter formal: respeitam à forma ou ao modo como o juiz exerceu a sua actividade. Em suma, se bem interpretamos as conclusões e alegações de recurso, o Recorrente não põe em causa a matéria de facto apurada no texto decisório, o que diz é que, deveria ter sido considerado com aquele acervo fáctico a procedência da tese de ilegalidade das liquidações sustentada na petição, (i) quer por violação do seu direito de audiência, (i) quer por face ao reconhecimento pela AT que os prejuízos fiscais declarados são "justificáveis pela situação de insolvência que constituiu o culminar da acumulação de resultados de exploração negativos” (Página 16 do Relatório de Inspeção Tributária) não se compreendendo, perante tal reconhecimento, o porquê da quantificação das correções à matéria coletável [nos exactos termos que o fez em sede de petição, vide artigos 14º a 31º desse articulado]. Ora, sendo certo que o Tribunal a quo conheceu daquelas ilegalidades imputadas às liquidações, cujo conhecimento lhe estava acometido, e não sendo à decisão assacada qualquer omissão de pronúncia, vero é também, que o Recorrente não procede, em concreto, a qualquer critica ou ataque à valoração e apreciação efectuada ou logra adiantar outra que, ao invés daquela, pudesse conduzir a uma decisão diferente daquela a que chegou o Tribunal a quo. Atentemos que , o Recorrente avoca o artigo 99º, al. a) do CPPT [dos fundamentos da impugnação] e o artigo 266º da CRP ao aludir aos princípios da legalidade, da igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e juridicidade da administração sem, contudo, lograr especificar, como, e em que medida, esse escopo legal e princípios, conjugados com a materialidade fixada lograriam um sentido diferente, uma solução diferente da que foi encontrada no texto decisório e a menção ao artigo 99º do CPPT sustenta o fundamento da impugnação a qual foi conhecida, e o mesmo não nega. Em suma, as conclusões recursivas limitam-se a repisar a tese peregrina da petição, contestando vaga e genericamente que a apreciação e a valoração da prova realizada pelo Tribunal a quo é errada, mas sem força capaz de evidenciar um qualquer erro quer no julgamento de facto, quer de direito em que tenha incorrido o decisor ao fixar o acervo probatório, bem como ao apreciar as questões que lhe estavam acometidas. Cumpre não olvidar que o direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente e/ou mal julgados, para tanto sendo necessário que se enunciem os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões de direito, as quais lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida. Para o efeito, o recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua discordância, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este tribunal se debruce sobre elas e decida se procedem ou não. Neste sentido, veja-se o Acórdão da Relação do Porto de 17.01.2022, proferido no âmbito do processo n.º 2157/17.2, em cujo sumário se afirma: «III - Impende sobre o recorrente, em sede de recurso, o ónus de invocar, também no domínio da aplicação da lei, os argumentos (jurídicos) que na sua ótica justificam o afastamento dos fundamentos constantes da decisão recorrida para sustentar o modo como interpretou e/ou aplicou a lei, de tal modo que o tribunal superior os possa apreciar, no sentido de lhes dar ou não sustentação – versando o recurso sobre matéria de direito, deve o Recorrente, para além de indicar nas conclusões as normas jurídicas violadas, referir também o sentido que, no seu entender, as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas (artigo 639.º, n.º 2, do CPC)”.». Sintetizando, impende sobre o recorrente o ónus de expor ao Tribunal ad quem as razões da sua discordância com o decidido, sustentadas em argumentos jurídicos, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este tribunal se debruce sobre elas e decida se procedem ou não, sendo insuficiente a simples menção de errada valoração e apreciação sem substracto. Ora, como resulta de todo o exposto e ressalta à evidência das conclusões, o Recorrente, como já se aludiu, insiste nesta sede nas ilegalidades que em sede de petição havia apresentado contra as liquidações de IVA, limitando-se a reproduzir as alegações aduzidas em sede de petição na impugnação judicial, para, posteriormente, concluir com o pedido de revogação da sentença, às quais foram objecto de análise pelo tribunal a quo, a cuja fundamentação integralmente aderimos por não vislumbrarmos razão válida para dela divergir. Mais se diga, para que dúvidas não pairem para o Recorrente, que alegação de que a sentença omitiu os factos, sendo que os mesmos apenas terão sido atendidos em sede de apreciação da excepção de erro na forma do processo, ao aludir ao vicio atinente à audiência prévia, falece por completo. A sentença tem que ser vista e entendida como um todo, mas mesmo que assim não fosse, sempre diríamos que afirmação do Recorrente é inexacta atento o julgado. Senão, vejamos. Sobre a questão da falta de audição decorrente da não atendibilidade da mesma, ali se discorreu que: «(...) não ocorre a alegada violação do direito de audição uma vez que, como decorre da transcrição efectuada em 10 do probatório, a Administração Tributária apreciou os argumentos expendidos pelo Impugnante em sede de audição prévia.» o, qual se deve ter por devidamente complementado com o referido no item 9. do probatório. O seu conhecimento efectivamente foi atendido em sede de erro na forma do processo e eventual convolação, por aquela audição (do Impugnante, audição prévia à prolacção do despacho de reversão) ter sido produzida no âmbito do processo de execução fiscal. Mas o alvitrado em sede de recurso, leva-nos a questionarmos, será que a ilegalidade decorrente de audição que o Impugnante se referia, se situa a jusante, ou seja, na fase de procedimento inspectivo? Se, assim era, a mesma estava devidamente identificada nos autos? Teria ocorrido, a justificar a pronúncia expressa pelo Tribunal a quo? A resposta é não. É que, em momento algum dos autos o Recorrente menciona a data do exercício de audição, em que momento a mesma ocorreu, no âmbito de que procedimento, e por último, não junta ao identifica qualquer documento de prova de que exerceu o seu direito de resposta em sede de audiência e que a mesma não foi atendida, e o mesmo se diga da aclamada indicação de testemunhas que pugna ter sido preterida. Ainda assim, este Tribunal ad quem numa tentativa de alcançar perceber o alcance do alegado pelo Recorrente, percorreu o RIT e todos os seus elementos, e do mesmo constatou o que consta do facto aditado nesta sede no item 24., o que de todo não se encaixa no alcance que o Recorrente pretende dar, a saber, de que “(...) aquando da Audição escrita, a Administração fiscal ter ignorado olimpicamente quer os argumentos apresentados pelo aqui Recorrente e, acima de tudo, ignorado a sua prova testemunhal.”. Por todo o exposto, não se descortina um qualquer argumento jurídico para procurar evidenciar o eventual erro de facto ou de direito, por conseguinte, sem necessidade de mais considerações, resta concluir pela improcedência in totum do recurso, mantendo-se a sentença recorrida. 3. Da dispensa do remanescente Estabelece o nº7 do artigo 6º do RCP, que «nas causas de valor superior a € 275.000 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Conforme entendimento expresso no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13, a que aderimos, «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes),iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.» In casu, considerando que o valor da presente acção ultrapassa o valor de 275.000€ (recorde-se que o valor da causa se fixou em 2.414.796,14 €) e que a mesma não assumiu especial complexidade, nem a conduta assumida pelas partes, em sede de recurso, se pode considerar reprovável, entende-se ser de dispensar o remanescente da taxa de justiça. Nestes termos e pelos fundamentos apontados, dispensa-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n. º7, do RCP. 4. Conclusões I. A excepção do caso julgado exige identidade de sujeitos, de pedidos e de causa de pedir em ambas as acções. II. Há́ identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica; há́ identidade do pedido quando em ambas as acções se pretende o mesmo efeito jurídico; há identidade da causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico – simples ou complexo. III. Na impugnação da decisão da matéria de facto apurada de 1ª. Instância a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, devendo, nas alegações de recurso, especificar, obrigatoriamente não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. IV. O direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente mal julgados, para tanto sendo necessário que se enunciem os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões de direito, as quais lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida. 5. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas a cargo do Recorrente, sem prejuízo da dispensa do remanescente determinada. Porto, 03 de outubro de 2024 Irene Isabel das Neves Graça Valga Martins Paulo Moura |