Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00114/24.1BEPNF-A |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
Data do Acordão: | 09/13/2024 |
Tribunal: | TAF de Penafiel |
Relator: | LUÍS MIGUEIS GARCIA |
Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA; PERICULUM IN MORA; |
Sumário: | I) – Impende sobre o requerente cautelar o ónus de alegação e prova da matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida, nomeadamente o relativo ao periculum in mora.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
Votação: | Unanimidade |
Meio Processual: | Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: [SCom01...], S.A. (Rua ..., ..., ... ...), intentou, sem êxito, no TAF de Penafiel, processo cautelar contra o Ministério da Coesão Territorial (Rua ..., ..., ..., ...) [e a Comissão Diretiva da Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional Norte (Rua ..., ... ...), absolvida da instância], indicando como contra-interessada a Agência para a Competitividade e Inovação, I.P. (IPMEI, I.P.) (Rua ..., ... ...), com vista à suspensão de eficácia do ato proferido em 30.11.2023 (pela dita Comissão), que determinou a revogação da decisão de concessão de apoio no âmbito do Projeto nº 45357 e a consequente devolução do montante de € 76.646,15. A recorrente estende sob conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, a 21.06.2024, fls. 562 do SITAF, a qual não decretou a procedência cautelar, e em consequência, absolveu os Recorridos do pedido contra eles formulados. B. C. No entendimento da Recorrente, a sentença recorrida padece de erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 120.º do CPTA, devendo, em virtude disso, ser o presente recurso de apelação julgado totalmente procedente, por provado, com todas as devidas e legais consequências daí decorrentes. DA ALEGADA FALTA DE VERIFICAÇÃO DO PERICULUM IN MORA D. Estipula o n.º 1 do artigo 112.º, do CPTA, que “quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adoção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”. E. Cabe assim ao julgador da lide cautelar, através do recurso a regras de causalidade adequada e de um juízo de prognose acerca dos factos apresentados pelo Requerente [17 Recorde-se que o artigo 114º, nº 3, alínea g), do CPTA exige que no requerimento cautelar, deve o requerente “especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da sua existência”.], a difícil tarefa de prevenir a efetivação dos prejuízos resultantes da ação ou da omissão da Administração, mantendo assim a utilidade da decisão judicial a proferir no processo principal. F. A vexata quaestio do presente recurso prende-se em saber se a Recorrente logrou alegar factos suscetíveis de preencher o requisito do periculum in mora. G. Na verdade, previamente, não se poderá deixar de notar que a sentença recorrida configura uma surpresa para a aqui Recorrente. De facto, já após se ter iniciado a diligência de produção de prova, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo alertou as partes que a pertinência daquela diligência se reportava, apenas, à questão do fumus boni Iuri (que, como se sabe, é aferido de uma forma perfunctória). H. Por tal motivo, solicitou aos Ilustres Mandatários da Recorrente que não se estendessem em questões relativas ao periculum in mora uma vez que a aferição do preenchimento de tal requisito cautelar bastava-se com a prova documental junta aos autos pela aqui Recorrente. I. Os fundamentos em que se alicerça a decisão ora sindicada já eram do conhecimento do Tribunal a quo antes do período de produção de prova testemunhal. Não se compreendo, como tal, o pedido do Tribunal a quo e que, irremediavelmente, condicionou as perguntas que foram realizadas às testemunhas arroladas pela Recorrente. J. In casu, a Recorrente alegou, no que concerne ao periculum in mora, que, no caso de não ser decretada a providência cautelar, a sentença a proferir em sede de ação principal ficaria completamente esvaziada de utilidade face à verificação de uma situação de facto consumado – consubstancia na declaração de insolvência da Recorrente – bem como a produção de danos e prejuízos de difícil reparação. K. Sendo que o Tribunal a quo, na fundamentação da sentença recorrida entendeu, brevitatis causa, que “Atendendo a que a Requerente apresenta valores positivos em conta, que tem possibilidade de se financiar dando como garante os bens, nomeadamente, o imóvel que possui, que pode utilizar os ativos fixos para obter liquidez, e ainda que não tem custos fixos elevados, ou pelo menos não os demonstrou nos autos, não se vê em que medida o pagamento mensal de €2.129,05 gera prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado que a eventual reposição da legalidade não sane”. L. Ora, com o devido respeito, não pode a Recorrente conformar-se com tal entendimento uma por se revelar inaceitavelmente exigente, no que importa à verificação da existência de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação. Porquanto, M. Saliente-se, desde logo, que Tribunal a quo deveria ter ponderado os factos em crise tendo por base as regras de causalidade adequada e da experiência comum. N. Assim, deveria ter ponderado a sua decisão à luz do contexto social-económico atualmente vivido que ainda se ressente das consequências provocadas pela pandemia da doença Covid-19, nomeadamente, à recessão económica que atingiu a economia mundial, e que, inclusive, implicou a adoção de diversas medidas por parte do Governo. O. Como foi aliás alegado em sede de requerimento inicial, por força da pandemia, foi a Recorrente obrigada a contrair uma série de empréstimos bancários de forma a fazer face às suas obrigações perante a banca, fornecedores e trabalhadores. P. Veja-se neste sentido o entendimento do Tribunal Central Administrativo do Norte [18 Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 11.12.2008, processo n.º 00228/08.5BECBR-A, disponível para consulta em www.dgsi.pt.], ao referir que, num “momento e situação em que no mundo, sem precedentes temporais e circunstanciais próximos, se vive uma crise/recessão financeira e económica mundial e mesmo nacional, com uma grande instabilidade e incerteza quanto ao futuro próximo em termos do comportamento das economias (mundial e nacional) e quanto às consequências do forte abrandamento na chamada economia real, com as mesmas incertezas e dúvidas quanto ao desempenho do sistema bancário/financeiro ou dos mercados de bens, serviços e capitais, etc., em que se registam já ou se preveem aumentos generalizados, mormente, à escala da UE, das taxas de desemprego e mesmo dos níveis de pobreza [cfr., entre outros, para além das notícias, artigos e estudos publicitados nos órgãos de informação, os dados, os índices de confiança, os indicadores de conjuntura e as previsões de várias instituições nacionais, supranacionais e internacionais, como, por exemplo, do «Banco de Portugal», do «BCE», da «EU», da «OCDE», do «Banco Mundial», do «FMI», etc., consultáveis facilmente nos respetivos endereços eletrónicos], temos para nós que o … recorrente irá ser confrontado com um agravamento da sua condição de vida, nomeadamente, em termos socioeconómicos, e chamado a mais esforços no e para o equilíbrio da sua economia e orçamento mensal”. Q. Para além disso, foi o Tribunal a quo excessivo e inaceitavelmente exigente no que se refere à decisão sobre a concretização dos prejuízos que a Recorrente poderá sofrer. R. In casu, a Recorrente em novembro de 2023 apresentava cerca de € 100.000,00 (cem mil euros) em conta – conta n.º 11 a 14 – entendendo o Tribunal a quo que tal significa que a Recorrente dispunha de liquidez que permitisse proceder ao pagamento da quantia requerida pelo Contrainteressado. S. Tal raciocínio é equivocado, e procedendo à análise da prova carreada aos autos pela Recorrente é possível aferir que apesar do valor em conta, bem como o valor dos ativos tangíveis - mormente, o imóvel do qual é proprietária - esta não apresenta capacidade económico-financeira para fazer face aos seus compromissos/obrigações. T. O acréscimo mensal da quantia de € 2.129,05 (dois mil, cento e vinte e nove euros e cinco cêntimos) às despesas da Recorrente seria absolutamente incomportável. E isto porque, U. A Recorrente apresenta desde o ano de 2020 resultados líquidos negativos, o que implicou socorrer-se de empréstimos para fazer face às suas despesas, tendo por isso celebrado três contratos de empréstimos, num total de um milhão de euros mutuados. V. Tal como alegado e demonstrado, a Recorrente encontra-se em incumprimento dos contratos de empréstimos outorgados, sendo devedora da quantia de €535.793,72 (quinhentos e trinta e cinco mil, setecentos e noventa e três euros e setenta e dois cêntimos), tal como consta do facto n.º 49 dos factos provados. W. Incumprimento este que determinou ao preenchimento de duas livranças prestadas pela Recorrente. X. Sempre se refira que tal como ficou provado no facto provado n.º 50 da sentença recorrida, o imóvel executado como garantia no âmbito do empréstimo celebrado com o Banco 1... foi libertado mediante a prestação de nova garantia pela Recorrente. Y. Recorde-se que não obstante o reforço de garantia prestada pela Recorrente, que permitiu que o imóvel desta não fosse executado, por conta do incumprimento verificado, certo é que os incumprimentos se mantêm quanto aos restantes contratos de empréstimo celebrados pela Recorrente. Z. Da análise do Balancete de 2023 é possível ainda determinar que a Recorrente apresenta igualmente dívidas a fornecedores no valor de €278.962,06 (duzentos e setenta e oito mil, novecentos e sessenta e dois euros e seis cêntimos). AA. A somar aos montantes de qual a Recorrente é devedora, são os gastos fixos inerentes ao desenvolvimento da sua atividade, que procedendo a uma comparação entre os valores da conta n.º 62 a 69 (gastos) e n.º 71 a 78 (rendimentos) é manifesto que os gastos são superiores aos seus rendimentos. BB. Logicamente, face ao exposto, considerando o facto de a Recorrente apresentar um elevado valor de dívida, ao qual não consegue fazer face, não obstante o valor em conta, o acréscimo da prestação mensal supra mencionada levaria inevitavelmente à declaração de insolvência da Recorrente. CC. Em suma, a Recorrente é devedora de € 2.951.883,08 (dois milhões, novecentos e cinquenta e um mil e oitocentos e oitenta e três euros e oito cêntimos), tal como dado como provado no facto n.º 46 da sentença recorrida. Sopesa ainda que, DD. O Tribunal a quo sufragou ainda que “Pese embora esteja em causa a devolução da quantia integral de de €76.646,15, a Requerente não está legalmente obrigada a fazer o reembolso integral da mesma. Importando, pois, na análise do periculum in mora ter em conta, a possibilidade que a Requerente tem de cumprir, mediante um menor esforço patrimonial, é de equacionar o impacto do pagamento a prestações na “saúde” financeira da Requerente. (…) não se vê em que medida o pagamento mensal de €2.129,05, gera prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado que a eventual reposição da legalidade não sane”. EE. Procedendo a uma análise extensa, cuidada e ponderada, segundo a normalidade do acontecer, de todas as despesas e responsabilidades mensais que impendem sobre a Recorrente, a devolução do montante a que se reporta os presentes autos, mesmo que em prestações mensais, representariam um esforço económico colossal que, a final, determinariam consequências gravíssimas na saúde financeira da Recorrente, mormente, a sua declaração de insolvência Assim, FF. Cabia ao Tribunal a quo, face aos elementos probatórios juntos aos autos efetuar uma análise mais ponderada dos prejuízos invocados e demonstrados pela Recorrente, não sendo percetível como pode o Tribunal a quo considerar que a Recorrente tem capacidade financeira para suportar o pagamento do montante de € 76.646,00 (setenta e seis mil, seiscentos e quarenta e seis euros), na medida em que deu julgados como provados os factos n.º 26 a 34 e 42 a 49. GG. A análise realizada mostra-se, para além de excessiva, parca e superficial, desconsiderando que os prejuízos invocados e demonstrados serão de difícil reparação, bem como a não suspensão do ato administrativo sub judice tornará inútil a decisão a proferir no âmbito da ação principal. HH. Tudo visto, andou mal o Tribunal a quo ao determinar que não se verificava o fundado receio da constituição de um facto consumado nem a verificação de prejuízo, a produzir-se durante a pendência da ação principal, não integralmente reparável com uma eventual procedência desta. Devendo, em virtude disso, a sentença recorrida revogada e substituída por um Acórdão que decida pela verificação do periculum in mora, com todas as devidas e legais consequências daí decorrentes. Sem prescindir, II. Determina o artigo 149.º, n.º 2, do CPTA, que “se o tribunal recorrido tiver julgado do mérito da causa, mas deixado de conhecer de certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, o tribunal superior, se entender que o recurso procede e que nada obsta à apreciação daquelas questões, conhece delas no mesmo acórdão em que revoga a decisão recorrida”. JJ. Deste modo, determinando este douto Tribunal a procedência do presente recurso, o poderá conhecer das questões que viram o seu conhecimento prejudicado em virtude de o Tribunal a quo ter, erroneamente, decidido que o requisito periculum in mora não se mostrava verificado. KK. Destarte, deverá o Tribunal ad quem apurar se os demais requisitos constantes no artigo 120.º do CPTA se encontram preenchidos. DO FUMUS BONI IURIS LL. Como resulta do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, “O fumus boni juris tem uma formulação positiva e uma formulação negativa. Na formulação positiva é preciso acreditar na probabilidade de êxito na ação principal. Tem de se verificar uma aparência de que o requerente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela actuação administrativa; na formulação negativa basta que a ação principal não apareça à primeira vista desprovido de fundamento”. MM. De facto, fazendo uma breve incursão, sobre o requisito fumus boni iuris, o ato administrativo sub judice encontra-se ferido de vários vícios, sendo, assim, apodítico a probabilidade de sucesso da ação principal. Efetivamente, NN. O ato administrativo prolatado pela Recorrida Comissão Diretiva evidencia um flagrante erro nos pressupostos de factos, uma vez que resulta dos vários documentos do projeto que foram cumpridos os vários objetivos do projeto e obrigações da Recorrente. OO. Um dos fundamentos usados pela Recorrida Comissão Diretiva para revogar a decisão de concessão do apoio é a pretensa falta de apresentação de pedidos de pagamento pela Recorrente desde o ano de 2020 e, de igual modo, a alegada falta de submissão do Pedido de Reembolso Final (PTRF) pela Recorrente. PP. Ora, no que respeita com a falta de submissão dos pedidos de pagamento (entre os quais, o Pedido de Reembolso Final), a mesma nunca poderá ser imputada à aqui Recorrente, na medida em que a não submissão destes pedidos resultou do facto de a plataforma eletrónica não permitir a submissão de qualquer pedido de pagamento, visto que o pagamento do PTRI acabou por nunca ser efetivado. QQ. O facto de não ter sido transferida à Recorrente a quantia aprovada em sede de PTRI levou a que, informaticamente, não fosse possível proceder à submissão de um novo pedido de pagamento, pois o mesmo se encontrava informaticamente vedado, não sendo possível aceder a essa opção. RR. Verificou-se uma contínua recusa no pagamento dos montantes devidos à Recorrente por se considerar que a mesma se encontrava em situação de incumprimento (não se especificando que incumprimento, ainda assim). SS. Sucede, porém, que por via da Deliberação n.º 8/202019 [19 Disponível para consulta em deliberacao_cic_covid19_24mar20_vsf_assin-1.pdf (portugal2020.pt).] da CIC – a qual regulamentou as medidas excecionais relativas à situação epidemiológica do COVID-19, criadas pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 10-A/2020, de 13 de março, nomeadamente quanto ao incumprimento dos beneficiários – foi determinado que ficariam suspensas “as notificações relativas a processos de recuperação dos apoios, previstos no Decreto-Lei n.º 159/2014, na sua redação atual”. TT. Assim, em virtude da referida Deliberação, qualquer processo em curso relativo à devolução de apoios estaria suspenso, porquanto as entidades administrativas encontravam-se impedidas de considerar que os projetos estavam numa situação de incumprimento. UU. Assim, em virtude da referida Deliberação, qualquer processo em curso relativo à devolução de apoios estaria suspenso, porquanto as entidades administrativas encontravam-se impedidas de considerar que os projetos estavam numa situação de incumprimento. VV. Resultando assim que a impossibilidade de apresentação destes documentos derivou de circunstâncias alheias à Recorrente e em tudo imputáveis às entidades competentes no âmbito deste projeto, pelo que a falta de apresentação da documentação não pode ser imputada àquela primeira como se travestindo de um desrespeito das suas obrigações. Também, WW. A transferência de montantes para os beneficiários não ocorre apenas quando se verifique uma das hipóteses elencadas nas alíneas do citado n.º 3 do artigo 7.º do Despacho n.º 10172-A/2015, de 10 de setembro, o que in casu não se verificou. XX. De facto, a Recorrente não obteve conhecimento de que a falta de pagamento do valor de € 28.380,69 (vinte e oito mil, trezentos e oitenta euros e sessenta e nove cêntimos) se ancorava em alguma daquelas alíneas do n.º 3 do artigo 7.º do Despacho n.º 10172-A/2015, de 10 de setembro. YY. Ora, à data da decisão de pagamento intercalar a Recorrente encontrava-se a cumprir escrupulosamente o plano de pagamentos acordado, algo que inclusive o Contrainteressado admitiu na sua decisão. Sopesa ainda que, ZZ. Um outro argumento utilizado pela entidade Recorrida prende-se com o facto de a Recorrente ter cumprido com apenas 40% da totalidade do projeto a que se havia candidatado, o que, adiante-se, não corresponde à verdade. AAA. A Recorrente quer em sede de PTRI, quer na própria audiência prévia, demonstrou os vários investimentos realizados no âmbito do projeto, mediante a junção de faturas, onde se alcança que a Recorrente cumpriu com 70% dos objetivos da candidatura aprovada. Acresce que, BBB. A decisão da Recorrida fundou-se igualmente na alegada falta de demonstração da Recorrente de capacidade de desenvolvimento do projeto e seus objetivos, por conta da não apresentou Pedido de Reembolso Final, do Relatório Técnico-Científico Final e da documentação comprovativa do envolvimento contínuo de Entidade Externa e do Pessoal Técnico do Beneficiário. CCC. A ser verdade que a apresentação do Relatório Técnico-Científico Final se encontra em falta, tal falta é imputável à Recorrida Comissão Diretiva e ao Organismo Intermédio responsável pelo projeto DDD. Visto que, até ter sido notificada do projeto de decisão de 22.12.2022, a Recorrente não sabia se estaria na fase final de execução do projeto, porquanto nada lhe foi respondido ao pedido de prorrogação submetido a 11.10.2021. EEE. Não podendo a Recorrida Comissão Diretiva concluir que, por causa da falta deste documento – falta a qual é também da sua responsabilidade! – a Recorrente não terá executado o seu projeto. FFF. Relativamente à alegada falta de envolvimento contínuo de Entidade Externa e do Pessoal Técnico da Recorrente, compulsados os elementos constantes do projeto da Recorrente, é possível verificar o envolvimento do INESC TEC – Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Técnologia e Ciência20 [20 Doravante, INESC TEC.], enquanto entidade externa, na execução do projeto. Portanto, é manifestamente claro e evidente, não sendo suscetível de quaisquer dúvidas, que a Recorrente efetivamente comprovou o envolvimento contínuo de uma Entidade Externa (INESC TEC) na execução do projeto. GGG. Por sua vez, no que concerne com o Pessoal Técnico do Beneficiário, em sede de PTRI a Recorrente procedeu à junção, ao seu projeto, de documentação que demonstra o envolvimento do Pessoal técnico, bem como os custos que lhes são inerentes. HHH. Devidamente escrutinado o teor do PTRI, constata-se a existência de várias despesas com Pessoal Técnico a exercer funções na sociedade comercial Recorrente, no âmbito deste projeto. III. Ora, o ato administrativo prolatado pela Recorrida Comissão Diretiva enferma de mais vícios, nomeadamente, a violação do direito à audiência prévia, a violação do princípio da colaboração com os particulares e da decisão, e a violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da razoabilidade. JJJ. Primo, do acervo factual exposto resulta que em 31.05.2021 foi deferido o PTRI requerido pela Recorrente, tendo sido proferida ordem de pagamento do montante de € 28.380,69 (vinte e oito mil, trezentos e oitenta euros e sessenta e nove cêntimos) a 01.06.2021. KKK. Todavia, este montante nunca foi transferido para a Recorrente, sem que para tal tivesse recebido qualquer tipo de notificação e/ou justificação, não obstante às várias interpelações dirigidas ao Contrainteressado para aquilatar as razões pelas quais o referido montante não era pago. LLL. Do exposto resulta manifesto que a Recorrente se viu completamente arredada da possibilidade de se pronunciar, no âmbito do projeto n.º 45357, dos motivos que pretensamente justificaram a recusa de pagamento da quantia de € 28.380,69 (vinte e oito mil, trezentos e oitenta euros e sessenta e nove cêntimos). MMM. Porquanto verificou-se uma clara violação do direito à audiência prévia, previsto no n.º 1 do artigo 121.º do CPA. NNN. Secundo, em 11-10-2021, a empresa submeteu um pedido de alteração de calendário, e em nenhum momento a Recorrente foi notificada de qualquer decisão ou projeto de decisão quanto pedido de prorrogação da execução do projeto. OOO. Bem como ao longo da execução do projeto a Recorrente viu várias das missivas dirigidas ao Contrainteressado serem ignoradas. PPP. Ora, tais condutas da Recorrida Comissão Diretiva e do Contrainteressado21 [21 Que se encontra vinculado a estes princípios por via da alínea d) do n.º 4 do artigo 2.º do CPA.] são evidentemente violadoras dos princípios estipulados nos artigos 11.º e 13.º do CPA, isto é, do princípio da colaboração com os particulares e da decisão. QQQ. Tertio, compulsado o teor da regulamentação aplicável ao caso presente, bem assim, o Termo de Aceitação, dos mesmos pode-se concluir que, ao invés de revogar a decisão de concessão de apoio, a existir algum fundamento para decidir deste modo (o que só por benefício expositivo se equaciona) dever-se-ia ter reduzido o incentivo cedido). RRR. No caso concreto, a existir algum incumprimento da Recorrente (o que não se equaciona!), o mesmo, por nunca ser total, mas, outrossim, parcial, justificaria a redução do incentivo pago, e não a revogação da decisão que concedeu o apoio à Recorrente. SSS. Violando, assim, a conduta da Recorrida Comissão Diretiva o princípio da proporcionalidade (artigo 7.º do CPA) e da justiça e razoabilidade (artigo 8.º do CPA). DA PONDERAÇÃO DE INTERESSES TTT. Nesta sede “avaliam-se, num juízo de prognose, os resultados de cada uma das alternativas, e não se concede a providência, mesmo que se verifiquem os requisitos, quando os prejuízos da concessão sejam superiores aos prejuízos que resultariam da não concessão. (...) O que está em causa não é ponderar valores ou interesses em si, mas danos ou prejuízos e, portanto, os prejuízos reais, que numa prognose relativa ao tempo previsível de duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam da recusa ou dá concessão (plena ou limitada) da providência cautelar”. UUU. In casu, de facto, caso a pretensão da Recorrente venha a ser julgada improcedente (em sede de ação administrativa principal, o que não se concede, mas por benefício expositivo se equaciona), o interesse público assumido na devolução da quantia pela Recorrente sempre será salvaguardado. VVV. Contrariamente, se a Recorrente tiver que devolver a quantia de € 76.646,15 (setenta e seis mil, seiscentos e quarenta e seis euros e quinze cêntimos), o desfecho favorável da ação administrativa principal não terá qualquer utilidade para a Recorrente porque, ao momento em que lhe for devolvida a quantia entretanto paga, esta já se encontrará certamente insolvente, atenta a espiral recessiva em que a mesma se encontra e encontrará fruto do pagamento de tão avultada quantia. WWW. Tudo visto, é apodítico que os prejuízos para a Recorrente resultantes do não decretamento da providência cautelar são, por larga margem, superiores aos resultantes do decretamento desta medida cautelar. XXX. Aqui chegados, pelas razões supra aduzidas, enfermando a sentença recorrida de erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, deverá o Tribunal ad quem revogar a sentença recorrida, datada de 21.06.2024, e, em virtude disso, decretar a providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo datado de 30.11.2023, com todas as devidas e legais consequências daí decorrentes. Contra-alegou o recorrido, concluindo: I. A decisão recorrida não merece qualquer reparo quanto à apreciação da matéria de direito. II. Como bem entendeu o Tribunal a quo, desde logo, a recorrente dispõe de ativos fixos tangíveis de valores consideráveis que igualam ou até suplantam os valores em divida, assim como de alguma liquidez e inexistência de despesas fixas elevadas. III. A situação financeira da recorrente não parece conduzir a uma efetiva situação de insolvência, uma vez que tal implicaria que o passivo fosse efetivamente superior ao ativo e que houvesse incumprimento para com os credores. IV. A recorrente poderia sempre requerer o reembolso faseado da quantia devida nos termos do n.º6 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º159/2024, de 27 de outubro. V. Neste contexto, é forçoso concluir que os danos que a recorrente invoca, associados ao pagamento mensal de 2.129,05€, não irá gerar prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado. VI. Não se vislumbra assim, qualquer erro de julgamento de direito a respeito do periculum in mora, porquanto não será o reembolso da quantia mensal de 2.129,05€ que irá colocar a recorrente em situação de insolvência. VII. O Tribunal a quo decidiu, e bem “Improcede assim, in totum, a providência requerida, ficando prejudicada a análise quer do fumus boni iuris, quer a ponderação de interesses, a que aludem os nºs 1 e 2, do art.º 120º do CPTA, pois que tais requisitos são de verificação cumulativa”. VIII. A recorrente simplesmente não se conforma com a posição do Tribunal no que respeita à improcedência da providência requerida, por não verificação do requisito do periculum in mora e, consequente ausência de análise do fumus boni iuris e da ponderação de interesses, a que aludem os n. º1 e 2 do art.120.º do CPTA. IX. Pelo que, opta por simplesmente reiterar os argumentos utilizados em sede de requerimento inicial, para fundamentar a verificação do requisito do fumus boni iuris. X. Quanto a este pressuposto, a Recorrente começa por imputar ao ato administrativo um erro nos pressupostos de facto, alegando que não submeteu os pedidos de pagamento uma vez que a plataforma eletrónica “não permitiu a submissão de qualquer pedido”. XI. No dia 2 de abril de 2022, recorrente, foi notificada para apresentar o pedido de pagamento final, e, embora notificada expressamente, não efetuou, posteriormente, qualquer contacto, nem tendo enviado algum email ou comunicação alegando dificuldades na submissão do pedido, contrariamente ao que agora sustenta, em sede judicial. XII. Se tais dificuldades existissem, essa teria sido uma altura apropriada para suscitar a questão, pelo que a falta de resposta da Recorrente apenas evidencia que as alegações agora apresentadas não têm qualquer sustentação nem fundamento. XIII. Conforme o entendimento do Tribunal a quo, a recorrente não submeteu o pedido de reembolso final por não ter conseguido cumprir o projeto na totalidade. XIV. Como se provou, a recorrente estava e está totalmente ciente da situação de incumprimento no âmbito do Plano de Reembolso dos projetos nº 548 e 22676. XV. Não pode, portanto, olvidar todo o procedimento de recuperação dos valores que corre no âmbito daqueles projetos, fazendo tábua rasa da dívida que tem para com a Administração Pública, em virtude de ilegalidades cometidas na execução de projetos cofinanciados por Fundos Europeus, e imputar ao IAPMEI e à Autoridade de Gestão uma responsabilidade que é única e exclusivamente da própria Recorrente. XVI. Nos termos do artigo 25.º, n.º 10, do Decreto-Lei n.º 159/2014, e o Despacho n.º 10172-A/2015, de 10 de setembro (publicado no Diário da República n.º 177/2015, 1º Suplemento, Série II), que aprova o "Regulamento que define os procedimentos relativos a pagamentos aos beneficiários do Sistema de Incentivos no domínio da Competitividade e Internacionalização", a Recorrente não tinha a situação regularizada perante o IAPMEI, XVII. e não podia, por isso, receber pagamentos enquanto não procedesse a tal regularização, o que era do seu pleno conhecimento. XVIII. Importa ainda afastar a invocação pela Recorrente da Deliberação n.º 8/2020 da Comissão Interministerial de Coordenação. XIX. Para além de estarem em causa normas provisórias, cuja invocação em 2023 ou agora, em 2024, já não se justifica, é manifesto que as mesmas não têm o significado que a Recorrente lhes procura dar. XX. A recorrente tinha incumprimentos desde 2019, pelo que essa situação se mantinha e impossibilitava a realização de novos pagamentos até regularização por aquela. XXI. Não existiu qualquer violação do direito de audiência prévia da Recorrente, contrariamente ao alegado. XXII. No que respeita concretamente aos fundamentos que conduziram à decisão que foi proferida, foram estes comunicados para pronúncia em audiência prévia da Recorrente, que assim se pronunciou nessa sede, sem que tenha, por isso, ocorrido qualquer violação dos seus direitos. XXIII. A Recorrente omitiu um dos elementos basilares de todo o procedimento, que diz respeito à dívida que possui noutros projetos e cujo pagamento não está a cumprir e que, por conseguinte, teve consequências sobre a mesma. XXIV. A falta de realização do projeto por parte da Recorrente e demais factos que foram apurados implicam a necessidade de revogação do apoio, nos termos que foram decididos, não existindo qualquer violação dos princípios que vêm invocados. XXV. Pelo que, ainda que tivesse existido a necessidade de avaliar este pressuposto, apenas se poderia concluir, que o ato impugnado não padece de qualquer uma das ilegalidades que invocadas. XXVI. Deverá sempre considerar-se como não comprovado, in casu, o requisito do fumus boni iuris previsto na parte final do citado n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, por não ser provável, e muito menos aparente, que a pretensão impugnatória da Recorrente venha a ser julgada procedente. XXVII. Versando sobre a ponderação de interesses, apenas cumpre aqui referir que a não recuperação de fundos públicos concedidos a operações que afinal não preenchem os requisitos legais a que estão obrigadas, consubstancia uma irregularidade com graves danos para o interesse público ao qual, sob pena de ilegalidade, não se devem sobrepor os interesses privados. XXVIII. Em causa está a salvaguarda do interesse público em que as verbas dos FEEI sejam efetivamente aplicadas dentro do período em que o podem ser, isto é, dentro do período de execução da programação, sob pena de os fundos ficarem perdidos para a República Portuguesa e seus operadores económicos. XXIX. Pois em matéria de elegibilidade temporal das despesas no âmbito dos sistemas de incentivos, a regra era o pagamento aos beneficiários até 31.12.2023, consagrada no n.º 5 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 159/2014, conjugado com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo. XXX. Simultaneamente, a atribuição de fundos públicos a operações que não preenchem os requisitos legais distorce a concorrência entre a Recorrente e os demais operadores de mercado que atuem na mesma área, constituindo um benefício público a um operador económico em detrimento dos seus concorrentes. XXXI. Pondo os diversos interesses “na balança”, não resultam dúvidas que a missão e metas prosseguidos pela Autoridade de Gestão do POR Norte 2020 são de interesse público e manifestamente mais relevantes que os da Recorrente, XXXII. pelo apenas se poderia concluir pela não verificação deste requisito. XXXIII. O Tribunal a quo não incorreu em qualquer erro de na aplicação ou interpretação do direito, devendo a sentença manter-se nos seus precisos termos. * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto não emitiu parecer (art.º 146º, nº 1, do CPTA). Com legal dispensa de vistos, cumpre decidir. * Factos, que o tribunal “a quo” assentou na decisão recorrida como indiciariamente provados: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] * A apelação. Com a presente lide a Requerente/recorrente pretende obter a suspensão de eficácia da decisão proferida em 30.11.2023, pela Comissão Diretiva da Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional Norte 2020, que determinou a revogação da decisão de concessão do apoio financeiro à Requerente, no âmbito do projeto nº 45357, e a consequente devolução da quantia de €76.646,15, recebida a título de incentivo financeiro. Importa começar por atentar que se está no âmbito de uma providência cautelar, que não se destina a decidir a questão de fundo sobre que versa o litígio, mas apenas a assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal mediante o estabelecimento de uma regulação que só vigora durante a pendência desse processo e onde, por isso, não se procede a juízos definitivos mas a uma apreciação meramente perfunctória baseada em juízos sumários. O critério geral de decisão é-nos dado pelo disposto no art.º 120º do CPTA. Cfr. Ac. do STA, de 19-10-2023, proc. n.º 0118/23.1BALSB: - “o artº 120.º do CPTA faz depender o deferimento das providências cautelares da existência cumulativa dos dois requisitos positivos enunciados no seu n.º 1, o “periculum in mora” e o “fumus boni iuris”, exigindo ainda, no seu n.º 2, que da adopção da providência não resultem danos superiores aos que possam resultar da sua não adopção, face a um juízo de ponderação “dos interesses públicos e privados em presença” (…) Como se salienta no Acórdão do STA de 16.09.2016 (revista nº 0979/16), “a aferição da bondade desta providência deve metodologicamente começar pela análise dos requisitos ínsitos no n.º 1 do art. 120º do CPTA – sendo indiferente principiar por qualquer deles; e só no caso de ambos se verificarem passaremos ao cotejo imposto no n.º 2 do artigo”. Na decisão recorrida julgou-se a pretensão improcedente, por claudicar o requisito do “periculum in mora”, requisito sobre o qual, depois de enquadramento geral, recaiu o seguinte juízo: «(…) A Requerente configura o periculum in mora, quer na vertente de prejuízos de difícil reparação, quer na vertente de facto consumado, atendendo à situação de insolvência que a imediata devolução da quantia em causa lhe causará. Da análise da matéria de facto assente, suportada essencialmente nos documentos juntos aos autos pela Requerente, resulta que, de facto, nos anos de 2020 até aos dias de hoje, a Requerente tem vindo a demonstrar uma situação económica frágil. No entanto, olhando para os dados mais atuais, resulta que, pese embora, em finais de 2023 a empresa apresente dívida, a verdade é que demonstra um saldo positivo na conta, cerca de €104.000,00, assim como dispõe de ativos fixos com valores superiores a €2.000.000,00. Atualmente, do que foi demonstrado nos autos, a Requerente apenas tem despesas fixas com água, luz e seguros, desconhecendo-se, os efetivos valores que paga à Banca, ou que concretamente deve à Banca. Veja-se que no ano de 2020, a Requerente contratou três empréstimos com a Banca para conseguir ter solvabilidade para se manter no ativo e continuar com os projetos. Entretanto, no início do corrente ano (janeiro de 2024), era devedora à Banca de um total superior a €500.000.000,00. Contudo, o gerente em declarações de parte, assim como a contabilista em sede de prova testemunhal, referiram que muito recentemente, a situação com o Banco 1..., nomeadamente quanto ao bem que se encontrava penhorado foi resolvida. Face ao exposto, desconhece-se os concretos valores que deve à Banca, se, existem incumprimentos verificados que impeçam que a Requerente contraia novos empréstimos, tal como alega. E isto releva, na medida em que a Requerente dispõe de ativos fixos tangíveis de valores consideráveis que igualam ou até suplantam os valores em divida. De igual modo, a Requerente sustenta ter de devolver quantias noutros projetos financiados pelo IAPMEI, nos quais foram proferidas decisões de reembolso. Quanto a estes desconhece-se a totalidade dos valores em divida, se se encontram em plano de pagamento, ou se eventualmente a devolução está suspensa por via de algum mecanismo legal (providência cautelar, mecanismo no âmbito da execução). Do que se apurou, a Requerente dispõe de alguma liquidez, ainda que muito residual atenta atividade que prossegue e não tem despesas fixas elevadas. Para a análise do critério aqui em causa, importa, pois, saber se a devolução do valor peticionado pela Entidade Requerida, causa prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado. Cremos que não. O que a Requerente alega, é que é que a imediata devolução de €76.646,15 conduzirá a uma situação de insolvência. Desde já diga-se que a devolução deste valor, atenta a atual situação da Requerente, não parece conduzir a uma efetiva situação de insolvência, que implica que o passivo seja efetivamente superior ao ativo e que haja incumprimento para com os credores, apesar de ser de admitir que c0locará a empresa numa situação de alguma dificuldade financeira. Contudo, a devolução deste montante, tal como alega a Entidade Requerida, não tem de ser imediata. O legislador previu a eventualidade de os beneficiários dos apoios terem dificuldades no reembolso das quantias pagas, e nessa medida estipulou no nº 6 do art.º 26º do Decreto-lei nº 159/2014, de 27 de outubro, a possibilidade daqueles requererem o pagamento a prestações dos montantes em divida. Escreve o preceito: “Na falta de pagamento voluntário da divida, a entidade competente para a recuperação por reposição pode, a requerimento fundamentado do devedor, autorizar que a mesma seja efetuada em prestações, nas seguintes condições cumulativas: a) Até ao máximo de 36 prestações mensais; b) Sujeição ao pagamento de juros á taxa fixada nos termos do nº 1 do artigo 559º do Código Civil.” Na mesma medida, a cláusula décima segunda do Termo de Aceitação assinado pela Requerente, prevê que “Os montantes indevidamente recebidos pelo beneficiário, nomeadamente por incumprimento das obrigações legais ou contratuais, pela ocorrência de qualquer irregularidade, bem como pela inexistência ou perda de qualquer requisito de concessão do incentivo, constituem-se como divida, sendo recuperados nos termos previstos no artigo 26º do Decreto-Lei nº 159/2014, de 27 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei nº 215/2015, de 6 de outubro.” Pese embora esteja em causa a devolução da quantia integral de €76.646,15, a Requerente não está legalmente obrigada a fazer o reembolso integral da mesma. Importando, pois, na análise do periculum in mora ter em conta, a possibilidade que a Requerente tem de cumprir, mediante um menor esforço patrimonial, é de equacionar o impacto do pagamento a prestações na “saúde” financeira da Requerente. Considerando a possibilidade da Requerente pedir o pagamento a prestações num máximo de 36 vezes, resultaria num montante mensal a pagar de cerca de €2.129,05 (€76.646,00 /36). Atendendo a que a Requerente apresenta valores positivos em conta, que tem a possibilidade de se financiar dando como garante os bens, nomeadamente, o imóvel que possui, que pode utilizar os ativos fixos para obter liquidez, e ainda que não tem custos fixos elevados, ou pelo menos não os demonstrou nos autos, não se vê em que medida o pagamento mensal de €2.129,05, gera prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado que a eventual reposição da legalidade não sane. Tudo compulsado, resulta que não está preenchido o requisito do periculum in mora, quer na vertente de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, quer na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação. Dúvidas inexistem que a execução do ato suspendendo causará prejuízos económicos à Requerente, que se poderão repercutir na atividade, mas não é possível concluir que tais prejuízos sejam de difícil reparação e/ou causem uma situação de facto consumado. Perante o exposto, conclui-se pela não verificação do requisito do periculum in mora, necessário à adoção de uma tutela cautelar. (…)». Como resulta do disposto no artº 120º nº 1 do CPTA e tem sido sublinhado pela jurisprudência, nomeadamente no acórdão do STA, de 14/06/2018, proc. n.º 0435/18: “I - O periculum in mora constitui verdadeiro leitmotiv da tutela cautelar, pois é o fundado receio de que a demora, na obtenção de decisão no processo principal, cause uma situação de facto consumado ou prejuízos de difícil ou impossível reparação aos interesses perseguidos nesse processo que justifica este tipo de tutela urgente; II - Se o fundado receio de a decisão da acção principal não vir a tempo de dar resposta às pretensões jurídicas envolvidas no litígio porque a evolução da situação, entretanto, a tornou totalmente inútil, verifica-se o periculum in mora na vertente do facto consumado; III - Se o fundado receio de que durante a pendência da acção principal surjam danos dificilmente reparáveis, porque a reintegração da legalidade não é capaz de os reparar, ou pelo menos de os reparar integralmente, verifica-se periculum in mora na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação (…)”. É também pacífico que “Impende sobre o requerente cautelar o ónus geral de alegação da matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida, nomeadamente, o relativo ao periculum in mora [cfr. arts. 342.º do CC, 114.º, n.º 3, al. g), 118.º e 120.º do CPTA/2015, 365.º, n.º 1, do CPC/2013].” (Ac. do STA, de 17-12-2019, proc. n.º 0620/18.7BEBJA). Não parece que tenha sido “o Tribunal a quo excessivo e inaceitavelmente exigente”; «Os requisitos exigidos para a concessão de uma providência cautelar são apreciados de forma sumária e perfunctória, sendo que a aferição dos critérios a atender na apreciação do periculum in mora devem obedecer a um maior rigor na apreciação dos factos integradores de tal requisito visto que a qualificação legal do receio como fundado visa restringir as medidas cautelares, evitando a concessão indiscriminada de proteção meramente cautelar com o risco inerente de obtenção de efeitos que só podem ser obtidos com a segurança e ponderação garantidas pelas ações principais.» (Ac. do STA, de 02-05-2024, proc. n.º 059/24.5BALSB); como também tem dado nota a jurisprudência deste TCAN [«Não bastam simples dúvidas, conjecturas ou receios meramente subjectivos ou precipitados assentes numa apreciação ligeira da realidade, embora, de acordo com as circunstâncias, nada obste a que a providência seja decretada quando se esteja face a simples ameaças advindas do requerido, ainda não materializadas, mas que permitam razoavelmente supor a sua evolução para efectivas lesões. De notar ainda que, se é certo que em relação ao juízo de probabilidade da existência do direito invocado, o legislador se contenta com que o mesmo possa ser de mera verosimilhança, já quanto aos critérios a atender na apreciação do periculum in mora os mesmos devem obedecer a um maior rigor na apreciação dos factos integradores de tal requisito, por forma a evitar a concessão indiscriminada de proteção cautelar. No que tange à prova do “fundado receio” a que a lei faz referência, a mesma deverá ser feita pelo requerente, o qual terá que invocar e provar factos que levem o tribunal a concluir que será provável a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação, justificando-se, por isso, a concessão da providência solicitada, não sendo lícito ao tribunal que se substitua ao mesmo nessa incumbência, e bem assim, de oferecer prova sumária dos fundamentos em se sustenta a existência desse requisito - v. os Acórdãos do STA de 14/07/2008, proc. 0381/08 e de 22/01/2009, proc. 06/09.» (Ac. de 13-09-2023, proc. n.º 0119/23.0BECBR)]. Guiados por estes considerandos, entende-se que bem se concluiu pela improcedência da providência, ausente um dos cumulativos requisitos de concessão. Perante o que se encontra indiciariamente e factualmente apurado, legitima-se afirmação de que «olhando para os dados mais atuais, resulta que, pese embora, em finais de 2023 a empresa apresente dívida, a verdade é que demonstra um saldo positivo na conta, cerca de €104.000,00, assim como dispõe de ativos fixos com valores superiores a €2.000.000,00. Atualmente, do que foi demonstrado nos autos, a Requerente apenas tem despesas fixas com água, luz e seguros, desconhecendo-se, os efetivos valores que paga à Banca, ou que concretamente deve à Banca. Veja-se que no ano de 2020, a Requerente contratou três empréstimos com a Banca para conseguir ter solvabilidade para se manter no ativo e continuar com os projetos. Entretanto, no início do corrente ano (janeiro de 2024), era devedora à Banca de um total superior a €500.000.000,00. Contudo, o gerente em declarações de parte, assim como a contabilista em sede de prova testemunhal, referiram que muito recentemente, a situação com o Banco 1..., nomeadamente quanto ao bem que se encontrava penhorado foi resolvida. Face ao exposto, desconhece-se os concretos valores que deve à Banca, se, existem incumprimentos verificados que impeçam que a Requerente contraia novos empréstimos, tal como alega. E isto releva, na medida em que a Requerente dispõe de ativos fixos tangíveis de valores consideráveis que igualam ou até suplantam os valores em divida. De igual modo, a Requerente sustenta ter de devolver quantias noutros projetos financiados pelo IAPMEI, nos quais foram proferidas decisões de reembolso. Quanto a estes desconhece-se a totalidade dos valores em divida, se se encontram em plano de pagamento, ou se eventualmente a devolução está suspensa por via de algum mecanismo legal (providência cautelar, mecanismo no âmbito da execução). Do que se apurou, a Requerente dispõe de alguma liquidez, ainda que muito residual atenta atividade que prossegue e não tem despesas fixas elevadas.». Este juízo é aceitável e o recurso com censura ancorada em factualidade ausente não tem virtude à sua modificação. Que, aliás, a ser demonstrada, também não a tanto não conduziria. Como na decisão recorrida se situa “O que a Requerente alega, é que é que a imediata devolução de €76.646,15 conduzirá a uma situação de insolvência.”. Ora, a avultar toda a realidade a que a recorrente faz apelo no sustento demonstrativo de que, como afirma, “não apresenta capacidade económico-financeira para fazer face aos seus compromissos/obrigações”, então o que se poderá ter de princípio é que não esconjura brandido risco - já efectivamente incurso - o protelar da imediata execução do acto suspendendo, ou que pelo menos, com a suspensão, ele se veja dissipado ou sensivelmente diminuído; numa palavra, que a execução seja causalmente determinante. E “só a presença de um prejuízo atual, concreto e real, reconhecido como efetivamente grave, iminente e irreparável, resultante da demora da sentença definitiva de mérito, pode justificar o acolhimento do pedido apresentado pela via da urgência” (cfr. Marco Carvalho Gonçalves, Providências Cautelares, 2015, Almedina, pp. 206-213, citado no Ac. deste TCAN, de 15-03-2024, proc. n.º 1670/22.4BEBRG). * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso. Custas: pela recorrente (sem prejuízo de eventual apoio judiciário). Porto, 13 de Setembro de 2024. Luís Migueis Garcia Alexandra Alendouro Celestina Caeiro Castanheira |