Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03532/10.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/15/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Tiago Miranda
Descritores:RECLAMAÇÃO
Sumário:I – Se, no seguimento do convite a que alude o artigo 634º nº 3 do CPC o Recorrente apresenta uma reformulação das assim chamadas conclusões da alegação de recurso em que o trabalho de síntese continua por fazer, mantendo-se redundâncias e extensas transcrições apontadas à primeira versão, o Recurso é rejeitado.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Julgar a reclamação improcedente.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte

AA, NIF ..., residente em Rua ..., ..., Porto, executado por reversão na execução fiscal nº ...82 e apensos, em curso no 1º Serviço de Finanças ..., para pagamento coercivo de dívidas de IVA do ano de 2007 mais IRC dos anos de 2007 e 2008 e ainda de uma coima, no valor global de 6 512,93 €, interpôs RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA relativamente ao despacho do Juiz Relator que rejeitou o recurso de apelação por aquele interposto relativamente à sentença proferida em 30 de Setembro de 2014 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou a oposição apenas parcialmente procedente – designadamente na parte relativa à dívida de coima aplicada em processo e contra-ordenação, no valor de 1 129,49 €.


Em abono da reclamação, alega, desta feita o seguinte:
1. O cumprimento do dever de síntese nas conclusões não deve ser aferido por mera comparação quantitativa entre o número de pontos das alegações e o número de conclusão formuladas (até porque as alegações podem não ser especialmente extensas face à matéria que tratam e, por isso, a síntese a formular nas conclusões pode verificar-se, independentemente da proporção verificada entre umas e outras),
2. porque, ainda que se entenda que o dever de síntese poderia ter tido melhor cumprido, as conclusões como estão formuladas não padeceriam nunca de vício que impedisse simplesmente o conhecimento de todo o recurso, mas apenas da parte afectada (como se prevê expressamente na parte final do disposto no art. 639.º n.º 3 do CPC), e
3. manifestamente, nenhum vício se verifica na parte do recurso que se reconduz às
conclusões ii., iii. e iv. | vi., vii., viii. e xi. | xiii, e xxxii. | xiii., xxvii., xxx. e xxxi. | xxxiv. e xxxv. |xli., xlii. e xliii. | xlvii. e xlviii. | l., li. e lii. | lv., lvi. e lvii. | lix., lx., lxi. | lxiii., lxix. e lxv. | lxvi. A lxviv. | lxxvii. | lxxix., lxxx., lxxxi., lxxxii. e lxxxiii. – pelo que, ao menos nessas partes, o recurso não pode deixar de ser conhecido.
4. A análise quanto ao cumprimento do dever de síntese nas conclusões, no caso concreto, não pode perder de vista a extensão do objecto do recurso que abrange (i) matéria de direito em mais de um vício e também a (ii) decisão factual, sejam as alterações que se lhe impõem, sejam as consequências dessas alterações – com o que isso significa de especiais exigências formais no modo de dar cumprimento ao ónus de alegações e conclusões previsto no art. 639.º n.º 2, a) a c) do CPC e, ainda, no art. 640.º n.º 1 a) a c) e n.º 2 a) do CPC, que justificam a extensão das conclusões formuladas.
5. Tendo em conta a extensão do objecto de recurso, é razoável aceitar que as conclusões, como estão formuladas, são admissíveis, de modo a garantir-se que se dá cumprimento àquelas normas quanto ao ónus de alegações, conclusões e impugnação da decisão factual – e isto mesmo que se entendesse que pudessem ter sido mais sintéticas.”

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

II - Questão a decidir
Cumpre apreciar se o despacho reclamado enferma de ilegalidade, em face das razões invocadas pelo reclamante no requerimento supra transcrito.

III – Apreciação da reclamação
Os factos relevantes para a decisão estão provados plenamente e são os seguintes:
1
Em 1/10/2014 foi proferida nestes autos sentença julgando parcialmente improcedente a oposição deles objecto.
2
Em 27 de Outubro de 2014 o Recorrente apresentou o seu requerimento de recurso.
3
Admitido o recurso na 1ª Instância por despacho de 9.12.2014, o Recorrente apresentou a alegação cujo teor, incluindo o das conclusões, aqui se dá por reproduzido.
4
Em cumprimento de despacho de 26/372015, cujo teor nos autos aqui se dá por reproduzido, foi o Recorrente notificado, via carta de 7/4/2015, para em cinco dias “apresentar as conclusões que constituam, nos termos da lei, formulação sintética das alegações do recurso que interpôs, sob a cominação legal”.
5
Em 15 seguinte o recorrente apresentou requerimento contendo novas conclusões, cujo teor aqui se da por reproduzido.
6
Em 7 de Novembro último foi emitida, pelo juiz relator, a decisão reclamada.

O teor do despacho reclamado é redutível ao seguinte excerto:
O despacho reclamado é redutível à transcrição que segue:
«A alegação de recurso que apresentou era constituída, inicialmente, por 153 segmentos, numerados, de alegações, mais 95, assim denominadas, conclusões.
Estas, porém, não só não operavam qualquer síntese relativamente ao extenso corpo das alegações, não sendo mais do que transcrições de também extensos segmentos das mesmas, como, por isso mesmo, substancialmente não eram mais do que uma redundância relativamente as alegações, enfim, não tinham natureza lógica de conclusões e não a tinham tão pouco jurídica, em face do disposto no nº 1 do artigo 639º nº 1 do CPC, segundo o qual o Recorrente “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”.
Procedendo promoção do Digno Procurador-geral Adjunto e em cumprimento de despacho do Relator de então, de 26/03/2015, o Recorrente foi notificado, nos termos e com a cominação dos artigos 639º nº 3 e 652º nº 1 alª a) do CPC, para, no prazo de 5 dias, vir apresentar conclusões que constituíssem, “nos termos da lei, formulações sintéticas das alegações do recurso que interpôs”.
No prazo cominado, o Recorrente vem juntar uma versão semelhante do segmento da alegação que intitulara como “conclusões”, desta feita já não com 95 mas com 84 assim chamadas conclusões.
Lida esta, verifica-se que, tal como o número de conclusões já indiciava, o trabalho de síntese queda todo por fazer e as ditas conclusões continuam a consistir nas redundâncias e extensas transcrições apontadas à primeira versão, com diferenças formais de pormenor que, substancialmente, não envolvem qualquer síntese do antes alegado.
Enfim, nem com a maior das “boas vontades” se pode considerar que o Recorrente tenha cumprido com o notificado.
Acresce considerar que a ausência substancial de conclusões com que, assim, este Tribunal se depara não se confina a determinada matéria das alegações, antes se mostra transversal a todas estas, pois deve-se não a um defeito pontual, mas sim a um defeito inerente à natureza e ao conteúdo de todo o discurso.
Como assim, em conformidade com a cominação legal oportunamente notificada e no uso da competência atribuída ao Juiz Relator pelo artigo 652º nº 1 alª b) do CPC ex vi artigo 281º do CPPT, verifico que este Tribunal não pode conhecer do Recurso, pelo que o mesmo vai rejeitado.
Notifique.”

Postos estes dados de facto e as fundamentações do despacho reclamado e do requerimento de reclamação, apreciemos esta:
Não resulta do discurso do despacho reclamado que o mesmo se fundou apenas num confronto quantitativo entre o número de artigos e ou palavras das alegações e os das ditas conclusões.
Sem embargo, convém notar que raia o absurdo, aquilo que nos artigos 1 e 2 do requerimento de reclamação parece vir sustentado em tese geral, isto é, uma determinada matéria poder ser tão complexa que a exposição da sua síntese não possa ser sensivelmente menos extensa do que a sua exposição analítica.
No parágrafo 3 o Reclamante sustenta que parte do recurso não estava inquinado pela natureza prolixa das conclusões, designadamente a supostamente condensada nas conclusões que ali indica, em numero de quarenta e cinco [descontando a repetição de uma (xiii) e presumindo que em vez de “lxvi a lxviv” se queria dizer “lxvi a lxvix”, pois a numeração lxviv não existe, o que obriga a descontar outra repetição: a da conc. lxix; e presumindo, também, que em vez de “lxiii., lxix. e lxv” se queria dizer lxiii., lxiv. e lxv].
De algum modo, o Reclamante como que aproveita o ensejo da Reclamação para a conferência para, finalmente, reduzir as conclusões em número e extensão significativos. Tarde o faz, pois o objecto da reclamação é a legalidade da decisão do relator em face do modo como as conclusões da alegação foram enunciadas após o convite previsto no artigo 639º nº 3 do CPC apresentadas. A versão reduzida que agora se pretende apresentar é irrelevante para a reclamação.
Depois, e de qualquer modo, o Reclamante não especifica e demonstra de que parte do recurso, destacável e julgável autonomamente, são estas “conclusões” a síntese; e não esclarece por que entende que estas obedecem, quanto a essa parte, aos requisitos lógicos e legais cujo incumprimento determinou o despacho reclamado.
Debalde o procuraria fazer, pois os segmentos do texto denominado “Conclusões” desta feita seleccionados versam indiscriminada sobre todo o objecto da sentença recorrida. Aliás, trata-se de “conclusões”, algumas delas, tão extensas como as agora “prescindidas”, designadamente as nºs 8, 48, 57 e 68; e mostram-se, desta feita, desconexas entre si, em consequência da sua retirada do que era o contexto original. Enfim, de modo nenhum as conclusões destacadas, desta feita, pela Recorrente desempenham a função de síntese e conclusão do alegado quanto a uma destacável parte do recurso.
Quanto à invocação da supostamente necessária prolixidade e extensão das conclusões em virtude de se recorrer em matéria de facto, julgamos o seguinte:
O cumprimento do ónus decorrente do artigo 641º do CPC para o recorrente em matéria de facto não pode ser pretexto para este, em vez de enunciar conclusões, repetir as alegações nessa matéria, como sucede no caso presente. Ao artigo 641º nºs 1 e 2 do CPC subjaz precisamente o desígnio de impor ao recorrente a menção enxuta e positiva dos elementos ali mencionados, não lhe estando vedado, antes tendo todo o sentido, remeter o leitor para a discussão e ou descrição dos meios de prova no corpo das alegações.

Em conclusão:
Com esta fundamentação e com a já exposta na decisão reclamada, a Reclamação há-de improceder.

IV – Custas
A decisão quanto a custas na decisão recorrida, confirmado, que vai, o seu dispositivo, permanece intacta.
Quanto à presente reclamação as custas ficam a cargo da Recorrente conforme decorre do artigo 527º do CPC.

V- Dispositivo
Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em julgar a Reclamação improcedente e em manter o dispositivo da decisão reclamada.

Porto, 15 de Dezembro de 2022


Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina da Nova
Cristina Travassos Bento