Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00629/05.0BEVIS-A |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 05/23/2024 |
Tribunal: | TAF de Viseu |
Relator: | VIRGÍNIA ANDRADE |
Descritores: | EXECUÇÃO DE JULGADOS; INDEMNIZAÇÃO ARTIGO 53.º DA LGT DEPÓSITO-CAUÇÃO – INDEMNIZAÇÃO; VALOR SUCUMBÊNCIA; |
Sumário: | I. Embora o depósito-caução consubstancie uma garantia capaz de suspender a execução fiscal, não é uma garantia equivalente à garantia bancária, para os efeitos tidos no artigo 53.º da Lei Geral Tributária. II. A execução de julgados segue o regime previsto no Código do Procedimento e de Processo nos Tribunais Administrativos. III. A admissibilidade do recurso depende da verificação cumulativa de dois requisitos: i) o valor do processo tem de ser superior à alçada do Tribunal, (€5.000,00), ii) a decisão impugnada tem de ser desfavorável para o Recorrente em valor superior a metade da alçada do Tribunal que proferiu a decisão e de que se recorre (€2.500,00). IV. O valor da sucumbência não é ”o montante global em que a decisão impugnada se mostra desfavorável, mas aquela em relação ao qual o recorrente se não conforma e pretende que seja apreciado em sede de recurso”.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
Votação: | Unanimidade |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO Inconformados, interpuseram recurso a Exequente e a Executada da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em 21.03.2019 e rectificada por despacho de 10.07.2019 no processo de execução de julgados de sentença já transitada e proferida no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos naquele Tribunal sob o nº 629/05.0BEVIS, que decidiu pela improcedência parcial da execução onde foi peticionada i) a restituição do montante total de €16.380,82 e do depósito caução no montante de €4.173,03, ii) o pagamento dos juros indemnizatórios ainda em dívida e devidos, iii) o pagamento de juros de mora, iv) o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento da referida decisão judicial, v) o pagamento à exequente de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e honorários. A Recorrente «AA» terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: A – QUESTÃO PRÉVIA - RECTIFICAÇÃO DE ERROS MATERIAIS 1ª. A douta sentença recorrida enferma dos seguintes erros materiais ou lapsos machinae, que deverão ser rectificados, ao abrigo do disposto nos arts. 613º e 614º do NCPC (v. art. 2º/e) do CPPT e art. 249º do Cód. Civil; cfr. Ac. STA de 2004.07.08, Proc. 417/03, in www.dgsi.pt): a) No nº. 18 dos Factos Provados (doravante FP), onde consta que “da compensação nº ...11, de 26/7/2004, resultou, após dedução do valor de € 1.474,25, proveniente da liquidação nº ...96 (…)”, deverá constar que o referido valor é “proveniente da liquidação nº ...86 (…)”, como resulta claramente do nº. 6 dos FP e dos Docs. de fls. 38, 39, 42 e 76 dos autos; b) No nº. 26 dos FP, onde se refere a “compensação nº ...05, de 8/11/7/2004” deverá referir-se a “compensação nº ...05, de 8/11/2004”, como consta dos Docs. de fls. 44 e 46 dos autos; c) No nº. 28 dos FP, onde se afirma: “28. Por falta de notícia do pagamento da quantia referida no ponto anterior e atendendo aos pagamentos aludidos em 6, 18 e 27 supra (€ 1.474,25 + €1.283,58 + € 3.879,16), a AT emitiu certidão (…)”, deverá constar apenas “28. Atendendo aos pagamentos aludidos em 6, 18 e 27 supra (€ 1.474,25 + €1.283,58 + € 3.879,16), a AT emitiu certidão (…)”, pois é manifestamente incongruente e contraditório afirmar que a AT desconhecia o pagamento referido no nº. 27 dos FP, para emitir a certidão de dívida em causa, quando teve em conta o referido pagamento de € 3.879,16 para proceder à respectiva emissão; d) No nº. 35 dos FP, onde se refere que, “em 16/4/2018, a AT emitiu o aviso de transferência eletrónica interbancária para crédito da conta de «BB», no montante de € 627,26”, deverá constar que o referido aviso de transferência foi emitido “para crédito da conta de «AA»”, que é a exequente e ora recorrente; e) No nº. 37 dos FP, onde se afirma que a AT, “em 11/7/2018, emitiu precatório cheque, no montante de € 4.173,03, para devolução da caução aludida em 29 supra”, deverá constar que se trata da “caução aludida em 30 supra”, como resulta claramente do nº. 30 dos FP – cfr. texto nºs.1 a 3; B – DAS NULIDADES DA SENTENÇA RECORRIDA 2ª. A sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia (v. art. 125º/1 do CPPT; cfr. art. 615º/1/d) do NCPC), pois não apreciou, nem decidiu as questões do pagamento à ora recorrente (i) da indemnização devida pela garantia que a ora recorrente foi forçada a prestar, desde 2005.11.10, através do depósito-caução de €4.173,03 (v. art. 53º da LGT), e (ii) de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e honorários que esta despendeu e despenderá com os processos judiciais que foi forçada a instaurar, conforme expressamente se peticionou nas alíneas b) e) do art. 50º e no petitório do r.e., cujo conhecimento é legalmente imposto e não estava, nem está prejudicado pela decisão das questões que foram objecto de apreciação (v. art. 608º/2 do NCPC; cfr. art. 286º do Cód. Civil) – cfr. texto nºs.4 e 5; 3ª. A sentença recorrida é ainda nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão (v. art. 125º/1 do CPPT), pois, apesar de ter considerado que “a liquidação impugnada é a liquidação nº ...53, no montante global de € 14.431,23” (v. fls. 19 da sentença), decidiu que “a sentença que anula a liquidação não se reporta exclusivamente ao valor sob execução fiscal (€ 7.794,34), mas ao valor global da liquidação, € 11.673,50” (v. fls. 20 da sentença; cfr. art. 615º/1/c) do NCPC e art. 2º/e) do CPPT) – cfr. texto nºs.6 e 7; C – DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO 4ª. A decisão sobre matéria de facto enferma de manifestos erros de julgamento (v. arts. 640º/1 e 2/a) e 662º/1 do NCPC; cfr. arts. 2º/e) e 279º e segs. do CPPT), devendo ser dado como provado que: a) Em 2004.11.04, a AT emitiu nova liquidação de IRS da ora recorrente, com o n.º ...83, referente ao ano de 2000, com o “valor final previsto (de) €8.343,91”, como resulta do Doc. 9, junto com o r.e. e do Doc. 1, junto com a contestação, que não foram objecto de qualquer impugnação (v. arts. 362º e segs. do C. Civil e art. 444º e segs. do NCPC); b) A ora recorrente pagou à AT o montante de € 9.743,93, correspondente a €8.343,91 da liquidação de IRS n.º ...83, do ano de 2000, e € 1.400,02 de juros, como resulta dos Docs. 10 e 13, juntos com o r.e. (v. arts. 362º e segs. Do C. Civil e art. 444º e segs. do NCPC); c) A ora recorrente pagou à AT o valor total que lhe foi exigido, de € 16.380,82 (€1.474,25 + € 1.283,48 + € 3.879,16 + € 9.743,93) relativamente ao seu IRS do ano 2000, como resulta do nº. 27 dos FP, dos Docs. de fls. 38, 39, 42 e 76 dos autos e dos Docs. 10 e 13, juntos com o r.e. (v. arts. 362º e segs. do C. Civil e art. 444º e segs. do NCPC) – cfr. texto nºs. 8 a 10; D – DA EXECUÇÃO DA SENTENÇA DO TAF AVEIRO, DE 2017.10.19 5ª. A execução de decisão judicial anulatória compreende a prática de todos os actos e operações materiais necessárias à reintegração da ordem jurídica violada, de modo a restabelecer-se a situação que o particular teria se o acto ilegal não tivesse sido praticado (v. art. 205º/2 da CRP, arts. 173º e segs. do NCPTA e art. 146º/1 do CPPT; cfr. Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, 6ª ed., II/520 e segs.), sob pena de serem claramente postergados o princípio do Estado de Direito, a garantia da tutela jurisdicional efectiva e o direito de acesso aos Tribunais e (v. arts. 20º, 22º e 268º/4 da CRP) – cfr. texto nºs. 11 a 13; 6ª. A sentença recorrida, de 2019.03.15, decidiu “julga(r) a presente execução parcialmente procedente quanto ao pedido de juros sobre o montante de € 3.879,16 e improcedente na parte restante” – cfr. texto nºs. 11 a 13; 7ª. Estando em causa a anulação da liquidação de quantias ilegalmente exigidas e mantidas na posse da Administração, durante cerca de dezoito anos, é manifesto que, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a execução da decisão judicial anulatória compreende, além do mais: a) A restituição à ora recorrente das quantias pagas relativamente a IRS do ano de 2000, no montante total de € 16.380,82 (€ 1.474,25 + € 1.283,48 + € 3.879,16 + €9.743,93), o que foi requerido à AT, em 2018.07.11, mas ainda não ocorreu; b) O pagamento à ora recorrente dos juros indemnizatórios devidos, desde a data da cobrança das quantias em causa e da realização do depósito-caução, até à respectiva restituição e emissão da correspondente nota de crédito – o que ainda não sucedeu -, os quais, deduzidos do pagamento de € 838,92 realizado pela AT (v. art. 785º do Cód. Civil), totalizam, em 2019.05.02, o montante total de € 10.975,80 (v. art. 22º da CRP, arts. 43º, 53º e 100º da LGT e art. 61º/5 do CPPT); c) O pagamento à ora recorrente de juros de mora devidos sobre a totalidade das quantias em dívida a partir do termo do prazo de execução espontânea da referida decisão judicial – 2018.06.25 – até à emissão da respectiva nota de crédito, que perfazem, em 2019.05.02, o montante de € 1.355,82 (v. art. 22º da CRP, art. 173º do CPTA e arts. 43º/5 e 102º/2 da LGT; cfr. Aviso nº. 235/2018, DR, II Série, de 2018.01.04); d) O pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento da referida decisão judicial, em valor diário não inferior a 10% do salário mínimo nacional mais elevado em vigor à data da decisão condenatória que vier a ser proferida (v. arts. 3º/2, 169º e 176º/4 do NCPTA e art. 146º do CPPT; cfr. art. 829º-A do C. Civil); e) O pagamento à ora recorrente de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e honorários que esta despendeu e despenderá com os processos judiciais que foi forçada a Instaurar, e que deverá ser equitativamente determinado por este douto Tribunal, ex vi dos arts. 40 e 566°/3 do Cód. Civil - cfr. texto n°s. 14 à 29; 8°. A entender-se - como consta da sentença recorrida - que os arts. 43°, 53° e 100° da LGT impediriam a fixação de Juros indemnizatórios a favor da ora recorrente, sobre todas as quantias pagas relativamente a IRS do ano 2000 e sobre a caução prestada, sempre se teria de concluir pela sua manifesta inconstitucionalidade e inaplicabilidade in casu (v. art. 204° da CRP), pois violariam frontalmente o princípio do Estado de Direito, o disposto nos arts. 2°, 9°/b), 20°, 22°, 205° e segs. E 26894 da CRP e a garantia da tutela jurisdicional efectiva, na medida em que não permitiriam efectivar o direito à indemnização dos danos e encargos causados aos contribuintes pelas actuações ilícitas da Administração - cfr. texto n°s. 22 à 29; NESTES TERMOS, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e condenando-se a AT a executar a sentença do TAF Aveiro, de 2017.10.19, nos termos expostos e com as legais consequências. SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA.” A Recorrente Executada formulou as seguintes conclusões: “I. Vem o presente recurso jurisdicional interposto do despacho proferido nos autos em 15-03-2019, que declarou “… o Tribunal julga a presente execução parcialmente procedente quanto ao pedido de juros sobre o montante de € 3.879,16…”, por entender que o mesmo enferma de erro, não só de facto, mas igualmente de direito. II. Fundado o despacho aqui recorrido no previsto no artigo 100º e 102.º da LGT, que impõe que “a AT deve executar os julgados de forma a recompor a situação fiscal existente imediatamente antes da liquidação impugnada e agora anulada”, esquecendo-se da existência de outros rendimentos que não foram contestados e, por isso, não poderia a anulação da liquidação resultar pela anulação total da colecta apurada. III. Temos por presente e dado por verificado que, efectivamente, o sujeito passivo e Exequente nos autos de Execução de Julgado, pagou o valor de € 6.636,89, a título de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, respeitante ao ano fiscal de 2000. IV. Para execução do decidido na impugnação judicial foi apurado imposto inferior ao liquidado e pago, resultando em imposto a reembolsar de € 838,92, que beneficia do previsto no artigo 43.º da LGT. V. Concluiu, no entanto, o Tribunal a quo que deveria ser calculado e pago ao Exequente juros indemnizatórios e de mora sobre o valor de € 3.879,16, pagos no âmbito da liquidação contestada na impugnação judicial. VI. Esta conclusão é inaceitável violando os fins específicos da tributação consagrado no artigo 5.º da LGT porquanto, ao determinar como base de cálculo um valor superior ao real resultando num valor igualmente superior ao devido, a título de juros indemnizatórios e moratórios, com o consequente pagamento pela AT ao Exequente, não promove a justiça social, desrespeitando os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material. VII. Afigura-se que, por lapso do tribunal a quo ocorrido no momento da prolação deste despacho, aquele tribunal deveria ter promovido a execução dos juros devidos e referentes ao valor pago a mais de € 838,92 que não foi contemplado na declaração de correcção que anulou a liquidação impugnada. Termos em que, deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, com as legais consequências.” Notificada do recurso formulado pela Executada, a Exequente contra-alegou, invocando a inadmissibilidade do recurso interposto pela Executada, assim como a sua improcedência. O Tribunal a quo, por despacho de 3.07.2019 procedeu à rectificação dos erros materiais invocados pela Exequente e sanou as nulidades invocadas, tendo-se pronunciado sobre a indemnização pela prestação do depósito-caução, assim como sobre o pagamento das despesas judiciais, extra-judiciais e honorários que esta despendeu com os processos judiciais. Notificada do sobredito despacho, a Recorrente Exequente veio apresentar requerimento de alargamento do recurso interposto, peticionando o seguinte: “a) Admitir o alargamento do âmbito do recurso jurisdicional interposto pela ora requerente, em 2019.04.29, ao despacho deste douto Tribunal, de 2019.07.03, Que tem "natureza complementar da sentença recorrida", de 2019.03.15 (v. art. 617º/3 do NCPC, arts. 1° e 140° do NCPTA e arts. 2º/c). 146º/1 e 281º do CPPT), revogando-se, em sede de recurso, ambas as decisões judiciais; e, em consequência, b) Declarar a nulidade da liquidação de IRS do ano 2000 da ora requerente n.° ...19, de 2018.03.07, por desrespeito do caso julgado da sentença exequenda, de 2017.10.19, que, tendo "anulado a liquidação impugnada", determina a restituição da totalidade dos valores pagos, acrescida de juros (v. art. 176º/5 do NCPTA e art. 146º/1 do CPPT; cfr. Ac. STA de 2007.10.31, Proc. 0660/07, in www.dgsi.pt); e c) Condenar a AT a executar a sentença do TAF Aveiro, de 2017.10.19, nos termos expostos no texto e conclusões das alegações de recurso da ora requerente, de 2:019.04.29, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, e com as legais consequências.” Por despacho de 5.9.2019, o Tribunal a quo determinou a subida dos presentes autos. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal não emitiu parecer. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. ** Objecto do recurso O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos Recorrentes, como resulta do disposto no artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil. Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas em ambos os recursos e ainda à ampliação de recurso apresentada pela Recorrente Exequente, importa apreciar e decidir i) da nulidade da sentença ii) do erro de julgamento quanto à matéria de facto iv) do erro de julgamento de direito v) da nulidade da liquidação de IRS n.° ...19 de 07.03.2018 do ano 2000 vi) da indemnização pela prestação da garantia indevida vi) da admissibilidade do recurso da Executada vi) do erro de julgamento quanto ao valor sobre que recaem os juros indemnizatórios e de mora. ** 2 - Fundamentação 2.1. Matéria de Facto O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma, que aqui se reproduz: “3. Fundamentação 3.1 Matéria de facto dada como provada. Com base nos documentos junto aos autos e nos apensos tendo em conta a posição das partes, considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão: 1. Em 1998 a Impugnante e seu irmão, «CC», adquiriram, por herança, o direito de propriedade dos seguintes prédios: - prédio rústico situado no lugar ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo artigo ...33 e descrito na Conservatória sob o n.º ...16 da freguesia ...; e, - prédio rústico situado no lugar ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória sob o n.º ...17, da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo rústico nº ...36 – facto 1 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 2. A certa altura, os referidos proprietários detetaram que a sociedade de construções “[SCom01...], Lda.” tinha iniciado obras de edificação no terreno correspondente ao ...36 sem autorização sua, tendo iniciado negociações com vista à venda dos terrenos acima identificados e acabando por chegarem a acordo quanto aos respetivos preços, que fixaram globalmente em 27.000.000$00 (ou € 134.675,43), sem prejuízo de correções relativas a eventuais divergências (para menos) quanto à área do artigo artigo ...33, a pagar faseadamente à medida que a sociedade construtora fosse alienando as frações em construção – facto 2 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 3. Em 27/06/2000 foi celebrada uma escritura de compra e venda da qual consta que a Impugnante e a irmã venderam à sociedade "[SCom01...], Lda."...pelo preço de dez mil contos, já recebidos, ... um terreno de pastagem, com a área de seiscentos metros quadrados, situado no lugar ..., freguesia ..., do concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo artigo ...33, ...e descrito na competente Conservatória sob o número mil quinhentos e dezasseis, da freguesia ......" - facto 3 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 4. Em 20/07/2000 foi celebrada uma escritura de compra e venda da qual consta que a Impugnante e o irmão venderam à sociedade "[SCom01...], Lda." "...pelo preço de quinze milhões de escudos, que já receberam, Terreno destinado a construção urbana, no lugar ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...17 de ... e aí inscrito a favor dos vendedores sob o número G-um, omisso na matriz respectiva tendo sido participada a sua inscrição na Segunda repartição de Finanças ..., em 27 de Junho deste ano..., anteriormente inscrito na matriz rústica ...36..." – facto 4 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 5. A "[SCom01...], Lda" emitiu uma missiva datada de 20/07/2000, dirigida a «CC», com o seguinte teor: "Assunto: Contrato promessa parcela terreno — ...36 de ... Exmo. Senhor, Junto entregamos a V. Exa. o cheque n.º ...24, no montante de dois milhões de escudos sacado sobre o Banco 1..., agência de ..., com vencimento em 6 de Agosto próximo, em virtude de haver divergências quanto à área do prédio sito no lugar ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ..17/190597 da Freguesia ... e inscrito na matriz sob o ...36 da referida freguesia. No caso de se confirmar que o terreno em causa tem apenas a área de 1.200m2 deverão V. Exa. devolvera referida quantia sem quaisquer juras..." - facto 5 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 6. Em 10/8/2001 a AT efetuou a liquidação nº ...86 de IRS do ano 2000, no valor de € 1.474,25, que o sujeito passivo pagou em 28/9/2001 – fls. 38, 39 e 76 do processo físico e acordo; 7. A "[SCom01...], Lda" emitiu uma declaração datada de 23/08/2001, com o seguinte teor: "...declara que por escrituras de 20 e 27 de Junho de 2000, ...comprou...os seguintes imóveis... (...36 e artigo ...33) Mais declara que se encontram saldadas todas as contas entre a compradora e os vendedores, nada tendo a haver destes seja a que título for, nomeada mas não exclusivamente, no que respeita a divergências de áreas dos referidos imóveis..." - facto 6 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 8. A declaração referida na alínea anterior foi subscrita apenas pela gerência da dita sociedade («DD» e «EE») - facto 7 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 9. Pela venda dos dois prédios acima referidos a sociedade "[SCom01...], Lda" pagou à Impugnante e irmão o valor global de 27.000.000$00 (ou € 134.675,43) - facto 8 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 10. A sociedade [SCom01...] registou na sua contabilidade que pagou, pelo negócio dos dois terrenos referidos, a quantia de € 67.337,72 (ou 13.500.000$00) à Impugnante, e outro tanto ao irmão «CC» - facto 9 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 11. A empresa "[SCom02...], Lda" ou [SCom02...] presta habitualmente serviços de intermediação imobiliária à sociedade [SCom01...] Lda. – facto 10 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 12. No decurso de ação de inspeção efetuada à empresa "[SCom02...], Lda" a A.T. apreendeu um CD do qual consta um ficheiro eletrónico com o seguinte teor: "CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA ENTRE: -PRIMEIROS OUTORGANTES: a) «AA»... b) «CC»...casado com «FF»..., na qualidade de promitentes vendedores, E SEGUNDA OUTORGANTE: [SCom01...], Lda, ...na qualidade de promitentes compradores, É celebrado e reciprocamente aceite o presente contrato promessa de compra e venda nos termos e cláusulas seguintes: PRIMEIRA Os Primeiros Outorgantes são donos legítimos proprietários em comum e partes iguais, de um terreno a pastagem, rústico, sito no lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o nº ...16/190597, e inscrito na matriz artigo ...33 da Freguesia .... SEGUNDA Os Primeiros Outorgantes prometem vender ao representante da Segunda Outorgante e estes prometem comprar para ela ou para quem indicarem, o terreno atrás identificado, pelo preço de Esc. 27.500.000$00... TERCEIRA O pagamento do referido montante será efectuado pela Segunda aos Primeiros Outorgantes, nas seguintes condições: a) Esc. 5.500.000$00... como sinal e princípio de pagamento até 31/10/1999; b) Esc. 8.000.000$00... como reforço de sinal e continuação de pagamento até 31/01/2000; c) Esc. 8.000.000$00...como reforço de sinal e continuação de pagamento até 31/04/2000; d) Esc. 3.000.000$00... como reforço de sinal e continuação de pagamento até 31/07/2000; e) Esc. 3.000.000$00… como último pagamento até 31/10/2000. ..., 29 de Outubro de 1999", sem qualquer autenticação - facto 11 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 13. A Impugnante ou o irmão e a gerência da "[SCom01...], Lda" tiveram conhecimento da minuta do contrato promessa referido na alínea anterior - facto 12 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 14. A sociedade "[SCom02...], Lda" efetuava a intermediação das vendas das construções realizadas pela "[SCom01...], Lda."- facto 13 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 15. - Por ofício n.º ...27, de 04/02/2004, os Impugnantes foram notificados pela A.T. para prestar esclarecimentos relativos à seguinte situação: "(...) Encontra-se, neste momento, a decorrer uma acção inspectiva externa à empresa [SCom01...]...no decurso da qual se constatou que aquela procedeu, em 2000, à aquisição de dois artigos a Vª Ex.ª e a que se referem as seguintes escrituras de compra e venda:
Para além disso, consultado o anexo G da declaração de IRS, de V.ª Ex.ª, referente ao ano em questão, verificou-se que V.ª Ex.ª apenas declarou a venda de um dos imóveis atrás indicados, a saber:
a) Queira proceder ao envio de cópia dos contratos promessa celebrados... b) Queira procederá identificação dos meios de pagamento emitidos pela [SCom01...]... c) Queira justificar o valor de realização declarado...(18.704,92 €)... d) Queira justificar a razão pela qual...não declarou no anexo G, a venda a que se refere a escritura de compra e venda celebrada em 27-06-2000...” – facto 14 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 16. Por carta de 13/2/2004 a agora impugnante respondeu que não dispõe da documentação solicitada, não podendo satisfazer o pedido – facto 15 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 17. Em 5/7/2004 a AT efetuou a liquidação adicional nº ...97, de IRS do ano 2000, apurando valor global a pagar de € 2.757,73 (sendo € 2.524,61 de imposto e € 233,12 de juros compensatórios) – fls. 40 e 41 do processo físico; 18. Da compensação nº ...11, de 26/7/2004, resultou, após dedução do valor de €1.474,25, proveniente da liquidação nº ...86, o saldo a pagar de € 1.283,48, que o sujeito passivo pagou em 24/11/2004 – fls. 42 do processo físico e estampilha colada no seu canto inferior esquerdo; - Facto rectificado por despacho de 10.07.2019 do Tribunal a quo. 19. Em 12/07/2004 a Impugnante apresentou declaração de substituição de I.R.S. modelo 3 referente ao ano de 2000, incluindo o "anexo G - Mais-valias", declarando a venda dos terrenos pelos seguintes valores de realização - Art.° artigo ...33 -8.313,30€ - Art° ...36 - 37.409.84 € Total 45.723,14€ - facto 16 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 e 76 do processo físico; 20. Em 15/09/2004 foi elaborado, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., "Projecto de Conclusões do Relatório de Inspecção" com o seguinte teor: "1-INTRODUÇÃO 1.1 - Origem dos factos relatados Os factos relatados no presente documento resultam das seguintes acções levadas a cabo pelos serviços de Inspecção tributaria da Direcção de Finanças ...: • busca ocorrida, no dia 25-06-2002, na sede social da empresa [SCom02...], Lda, NIPC ...33, - doravante designada por [SCom02...] - a coberto de um mandado de busca emitido pelo Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira; • acção inspectiva externa, levada a efeito, à empresa [SCom01...], Lda. 1.2 - Documentos apreendidos na [SCom02...] No decurso da acção ocorrida nas instalações da [SCom02...], foram analisados e a apreendidos diversos elementos, querem suporte de papel quer em suporte de registo informático, designadamente: a) contratos de mediação imobiliária: b) "Mapas de Vendas" - mapas de periodicidade mensal nos quais são registadas as vendas acordadas (a que corresponde geralmente, a outorga de um contrato promessa de compra e venda) e respectivos valores; c) "Mapas de Escrituras" - mapas também de periodicidade mensal, mas desta feita organizados por data da escritura, nos quais constam todos os elementos referidos na alínea anterior e ainda, em alguns casos, a identificação e valor do empréstimo bancário contraído, quando foi o caso; d) CDs com cópias de segurança de vários contratos promessa de compra e venda; e) CDs com cópias dos computadores em serviço na empresa: 1.3 - Documentos analisados na [SCom01...], Lda Na acção inspectiva efectuada, foram analisados os registos contabilísticos referentes aos meios de pagamento. 2- DESCRIÇÃO DOS FACTOS APURADOS 2.1 – Através da análise da contabilidade da [SCom01...], bem como em consequência da busca efectuada na sede da empresa [SCom02...] Através de escritura pública de compra e venda lavrada, no dia 27-06-2000, ... «CC» e Esposa e «AA» e marido venderam à [SCom01...], o artigo ...33 da Freguesia ..., pelo valor de 10.000.000$00.... Conforme consta da escritura em questão, por escritura de 27-10-1998 ... foram «AA» e «CC» habilitados como únicos herdeiros por falecimento de «GG»., ... (conforme escritura de habilitação de herdeiros...). Quanto ao modo de pagamento, verificou-se que os cheques emitidos para pagar o terreno em causa, foram imputados à conta "22905 - «CC»", conforme consta dos respectivos extractos de conta (em anexos, 8. 8), a saber:
Analisando, cada um dos pagamentos:
que quando foi criada, em 1998, a conta "22905 - «CC»' também foi criada a conta "22904 - «AA»" que, como vimos, é outra das alienantes. Analisando a conta "22904 - «AA»" (em anexos, tis. 12):
• o valor de 10.000.000$00 resulta de uma reclassificação de lançamento contabilístico. Contudo, analisado o lançamento que foi objecto de reclassificação, verifica-se que se trata do cheque n.º ...00 sobre o Banco 3..., de 2-12-1997, emitido a favor de «AA» (em anexos, fis. 13): • como apenas foram imputados pagamentos a esta conta - recorde-se que a venda foi imputada à conta 26905 que, por si só, é superior ao valor da escritura - esta ficou devedora e assim permanece. - Para além destes elementos - que por si só provam que o valor efectivo da venda é superior ao declarado na escritura - teve-se acesso a outro documento. De facto, aquando da busca efectuada à [SCom02...] foi detectado, e apreendido, um CD com cópias de segurança de diversos contratos promessa de compra e venda. Ora um dos ficheiros constantes desse CD (print do conteúdo do CD: anexo 14), refere-se a um contrato promessa de compra e venda (anexos, fls. 15 e 16 - o meio de prova é o CD apreendido e não o print que se anexa) celebrado entre: • «AA», casada com «HH» e • «CC», casado com «FF», na qualidade de promitentes vendedores, e • [SCom01...], Lda, na qualidade de promitente comprador, através da qual os promitentes vendedores prometiam vender ao promitente comprador "um terreno a pastagem, rústico, silo no lugar ... (...) inscrito na matriz artigo ...33 da Freguesia ..., pelo valor de 27.500.000$00, superior, portanto, ao valor declarado pelos outorgantes na respectiva escritura pública de compra e venda e muito próximo do somatório dos cheques registados na contabilidade da [SCom01...] a que atrás fizemos referência. Contudo, esclareça-se que nem todos os pagamentos Indicados - que ascenderam a 27.000.000$00 - se referem à compra do artigo ...33 da Freguesia .... Na verdade, apurou-se que em 20-07-2000 através de escritura pública de compra e venda lavrada, ..., «CC» e Esposa e «AA» e marido venderam à [SCom01...], um prédio omisso, participado como prédio destinado a construção, ..., anteriormente inscrito sob o ...36 da Freguesia ..., pelo valor de 15.000.000$00. (anexos, fis. 17 a 19), não tendo, contudo, a [SCom01...], Lda procedido à contabilização desta aquisição. De facto, a [SCom01...], Lda apenas registou na sua contabilidade o pagamento da respectiva SISA (…) . 3 – Conclusão Assim, fica provado que ocorreu simulação de preço na escritura referente à aquisição do artigo ...33 da Freguesia ..., (quanto ao outro imóvel transacionado em 20-07-2000, não se mostrou possível reunir elementos de prova que possam por em causa o valor declarado na escritura) ao ter sido declarado na respectiva escritura pública de compra e venda que o imóvel foi de 10.000.000$00, quando este foi de 27.500.000$00. 4 Correções (…)” – facto 17 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 21. Por ofício n.º ...51, de 15/09/2004, os Impugnantes foram notificados do Projeto referido na alínea anterior e para exerceram o direito de audição – facto 18 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 22. Em 11/10/2004, a Impugnante e o irmão apresentaram direito de audição onde consta que "(...) 4. O preço global das vendas dos dois referidos imóveis foi de Esc. 25.000.000$00. A diferença de valores dos pagamentos registados na contabilidade da [SCom01...], LDA. Em nome dos ora exponentes, no montante total de Esc. 27.000.000$00, em relação ao valor constante das escrituras dos dois terrenos — 25.000.000$00 — resulta da circunstância de o valor do terreno a que corresponde o artigo matricial n.º ...36 ter sido reduzido em Esc. 2.000.000$00, em virtude de se ter verificado que a área efectiva do terreno era inferior à área indicada pelos vendedores. (...) 6. Os ora exponentes declaram desde já e para todos os efeitos legais que desconhecem e não tem obrigação de conhecer o conteúdo de um CD alegadamente apreendido na sede da [SCom01...], LDA. Os exponentes impugnam assim expressamente a genuinidade do documento — reprodução mecânica — nos termos e para os efeitos do art.º 115.º/4 do CPPT e do art.º 368.º do Cód. Civil. 7. Saliente-se ainda que o suporte informático — CD — não tem qualquer certificação digital nem o seu suporte em papel se encontra assinado. Deste modo, o referido suporte informático e quaisquer cópias que do seu conteúdo tenham sido ou venham a ser feitas não têm qualquer valor probatório (v. art. 373.º do Cód. Civil e art. 76.º da LGT). Face ao exposto é manifesto que o suporte informático em causa não tendo qualquer valor probatório, não pode fundamentar a conclusão do relatório de inspecção em apreço.... " – facto 19 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 23. Em 15/10/2004 foi elaborado, pela Inspeção Tributária, "Relatório" de Inspeção com o mesmo teor do Projeto constante do nº 7 supra, tendo sido acrescentado o seguinte: "6 - Direito de Audição - fundamentação A fim de dar cumprimento ao disposto nos artigos 60.º da LGT e 60.º do RCPIT relativamente ao "Projecto de Conclusões do Relatório" procedeu-se ao envio deste para a morada fiscal dos Sujeitos Passivos através do ofício ... (...) No dia 11-10-2004, foi apresentado o direito de audição do sujeito passivo ..., refira-se que foi apresentado um único direito de audição em comum pelos sujeitos passivos «AA» e «CC» e Esposa -. (cópia do direito de audição em anexos, fl. 40 e 41). Da sua análise verifica-se que os signatários manifestam o seu desacordo com o teor das conclusões constantes do projecto de relatório. Os exponentes invocam os seguintes factos para justificar o seu desacordo; - facto 20 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 24. Por ofício n.º ...00 de 19/10/2004, recebido em 21/10/2004, a Impugnante foi notificada do teor do relatório final e da fixação da matéria tributável resultante das correções acima referidas - facto 21 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 25. Em 22/10/2004 a AT efetuou, com base na declaração de substituição de 12/7/2004, a liquidação adicional nº ...53 de IRS do ano 2000 de que resultou valor a pagar de € 14.431,23 (sendo € 12.343,89 de imposto e € 2.087,34 de juros compensatórios) – fls. 43 e 44 do processo físico; 26. Da compensação nº ...05, de 8/11/7/2004, resultou, após dedução do valor de € 2.757,73, proveniente da liquidação nº ...97, o saldo a pagar de € 11.673,50, com data limite de pagamento até 15/12/2004 – fls. 44 e 46 do processo físico; 27. Dentro do referido prazo de pagamento voluntário, a agora Exequente pagou a quantia de €3.879,16 referente à liquidação aludida nos pontos anteriores – acordo, artigo 7º do articulado de fls. 81 e al. a) do articulado de fls. 92 do processo físico; 28. Atendendo aos pagamentos aludidos em 6, 18 e 27 supra (€ 1.474,25 + €1.283,58 + € 3.879,16) a AT emitiu certidão de dívida nº ...09, de 21/12/2004, com base na qual autuou, em 28/12/2004, o processo de execução fiscal nº ...43, para cobrança coerciva de IRS e juros compensatórios do ano 2000 no valor global de € 7.794,34, sendo € 6.556,28 de imposto e € 1.238,06 de juros – fls. 49 do processo físico; - Facto rectificado por despacho de 10.07.2019 do Tribunal a quo. 29. Em 20/4/2005 foi apresentada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a petição inicial da referida impugnação – facto 23 dado como provado na Impugnação nº 629/05.0BEVIS, cf. fls. 19 do processo físico; 30. Em 10/11/2005 a agora exequente juntou ao processo executivo referido em 28 supra o comprovativo do depósito-caução, no valor de € 4.173,03 – acordo, artigo 22º da p.i. e 8º da contestação; 31. Em 19/10/2017 foi proferida a sentença que julgou totalmente procedente a impugnação acima referida, ordenou a anulação da liquidação na parte impugnada, com as demais consequências legais, fixou o valor da causa em € 7.794,34 e condenou a Fazenda Pública no pagamento das custas processuais – fls. 18 a 37 do processo físico; 32. Em 24/11/2017 a AT efetuou liquidação corretiva nº ...19, de IRS do ano 2000, na qual se apurou valor a pagar de € 5.797,97, tendo por base o rendimento global de € 41.571,62, correspondente à soma de rendimentos de trabalho dependente no montante de € 754,03, pensões no montante de € 2.394,23, rendas no montante de € 15.561,81 e mais-valias (50%) no montante de € 22.861,55 – fls. 50, 92, 93 e 94 do processo físico; 33. Da compensação nº ...45, de 7/3/2018, resultou, após a dedução do valor de € 9.743,93, proveniente da liquidação nº ...83, e a regularização da nota nº ...30, no valor de € 3.107,04, o saldo a reembolsar de € 838,92 – fls. 51, 64 e 93vº do processo físico; 34. Em março de 2018 a AT efetuou o reembolso da quantia de € 838,92, aludida no ponto anterior – admissão, artigo 2º, a), da réplica de fls. 80 do processo físico; 35. Em 16/4/2018 a AT emitiu o aviso de transferência eletrónica interbancária para crédito da conta de «AA», no montante de € 627,26, relativo ao pagamento das custas de parte – fls. 101 do processo físico - Facto rectificado por despacho de 10.07.2019 do Tribunal a quo. 36. Em 11/7/2018 foi apresentada a reclamação graciosa contra a liquidação aludida em 32 supra, encontrando-se ainda sem decisão administrativa – fls. 52 e ss, 96 a 101 do processo físico; 37. A AT anulou a dívida e extinguiu a execução fiscal aludida em 28 supra e, em 11/7/2018, emitiu precatório cheque, no montante de € 4.173,03, para devolução da caução aludida em 30 supra, que foi levantado em mão em 13/7/2018 – artigo 8º da contestação e 2º, b), da réplica de fls. 80 e 95 do processo físico; - Facto rectificado por despacho de 10.07.2019 do Tribunal a quo. 38. Em 29/11/2018 foi apresentada a petição inicial da presente execução – fls. 1 e seguintes do processo físico; 3.2 – Matéria de facto dada como não provada: O Tribunal detetou a alegação dos seguintes factos com relevo para a decisão, a dar como não provados: A. Relativamente às referidas liquidações de IRS do ano 2000 a Exequente pagou o montante global de € 16.380,82 – artigos 50º da p.i. e 7º e 8º do articulado de fls. 81 do processo físico;” 2.1.1. Aditamento oficioso à fundamentação de facto: Dispondo os autos dos elementos probatórios para o efeito indispensáveis, e ao abrigo do disposto no artigo 662.º n.º 1 do CPC, afigura-se-nos ser de alterar a decisão sobre a matéria de facto assente proferida em 1ª instância. Nesta medida, é aditado o ponto 27.º-A. à matéria de facto assente, com o seguinte teor: 27.º-A – Foi emitida em 4.11.2004 a liquidação de IRS n.º ...83, com o valor final previsto de €8.343,91 – cfr. fls. 47 do processo físico. *** 2.2 – O direito Constitui objecto do presente recurso a sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou parcialmente procedente a execução de julgados deduzida pela Exequente da sentença de parcial procedência, proferida no âmbito do processo de impugnação judicial que aí correu termos sob o n.º 629/05.0BEVIS. Do recurso da Exequente Inconformada com a decisão, a Exequente interpôs o presente recurso, invocando i) a nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por oposição entre os fundamentos e a decisão ii) o erro de julgamento na decisão sobre a matéria de facto iii) o erro de julgamento de direito. 2.2.1. Da nulidade da sentença Invoca a Recorrente Exequente que a sentença recorrida é nula por oposição entre os fundamentos e a decisão pois, apesar de ter considerado que “a liquidação impugnada é a liquidação nº ...53, no montante global de €14.431,23” (v. fls. 19 da sentença), decidiu que “a sentença que anula a liquidação não se reporta exclusivamente ao valor sob execução fiscal (€7.794,34), mas ao valor global da liquidação, €11.673,50”. Vejamos. Decorre do disposto no artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que “1 - Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer. (…)”. Acresce que, dispõe o artigo 615.º nº 1 alínea c) do Código de Processo Civil que “é nula a sentença quando (…) os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…)”. “É pacífico na doutrina e jurisprudência o entendimento segundo o qual a nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão aí contemplada pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la: a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente (cf. nesse sentido, na doutrina Professor Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, , Vol. V, pág. 141, Coimbra Editora, 1981, Amâncio Ferreira, Manual de Recursos no Processo Civil, 9ª edição, pág. 56 e Lebre de Freitas e Isabel Alexandra, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª edição, pág. 736-737, e na jurisprudência, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Secção Social, de 28.10.2010, Procº nº 2375/18.6T8VFX.L1.S3, 21.3.2018, Procº nº 471/10.7TTCSC.L1.S2, e 9.2.2017, Procº nº 2913/14.3TTLSB.L1-S1).” – cfr. Acórdão do STJ de 14.04.2021, proc. n.º 3167/17.5T8LSB.L1.S1 No caso presente, a Recorrente Exequente defende a nulidade da decisão por contradição entre os fundamentos e a decisão por esta ter reconhecido, a pág. 19, que “a liquidação impugnada é a liquidação nº ...53, no montante global de €14.431,23” mas concluiu, a pág. 20, que “a sentença que anula a liquidação não se reporta exclusivamente ao valor sob execução fiscal (€7.794,34), mas ao valor global da liquidação, €11.673,50”. Ora, o alegado não consubstancia qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão recorrida, mas tão só a circunscrição do montante em questão a que respeitou a impugnação judicial intentada, uma vez que, foi considerado que, não obstante, a liquidação impugnada respeitar ao montante total de €14.431,23, o valor anulado que contende com a questão decidida ascende somente ao remanescente que não foi pago, no montante de €7.794,34. Nesta senda, como defendido no despacho de sustentação proferido pelo Juiz do Tribunal a quo, sem prejuízo de eventual erro de julgamento, não se verifica a apontada nulidade por contradição, improcedendo nesta parte a alegação de recurso. 2.2.2 – Do erro de julgamento quanto à decisão sobre a matéria de facto A Recorrente Exequente vem recorrer da decisão da matéria de facto, como decorre da conclusão C - 4ª, considerando que face aos documentos juntos aos autos sob o n.º 1, 9, 10 e 13, deveriam ter sido considerados provados certos factos, contrariando de igual modo o facto não assente. Ora, como decorre do disposto no artigo 662.º n.º 1 do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.” Com efeito, parafraseando António Abrantes Geraldes (in Recursos em processo civil, 7ª Edição actualizada, Almedina, pag. 333) “quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência” Nesta medida, verificados os pressupostos que decorrem do disposto no artigo 662.º do Código do Processo Civil, assiste ao TCA o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, competindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de recurso, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre as questões controvertidas. Vejamos. Alega a Recorrente Exequente que se impunha que tivesse sido dado como provado o seguinte facto: “a) Em 2004.11.04, a AT emitiu nova liquidação de IRS da ora recorrente, com o n.º ...83, referente ao ano de 2000, com o “valor final previsto (de) €8.343,91”, Para tal, considera que tal facto decorre dos doc. 9 e 1 juntos com a contestação, que não foram objecto de qualquer impugnação. Com efeito, o doc. a fls. 47 do processo físico respeita à liquidação de IRS n.º ...83, emitida em 4.11.2004, no montante de €8.343,91. Assim, é aditado à matéria de facto assente o facto pretendido pela Recorrente Exequente, logrando obter provimento a alegação do recurso no que a esta parte concerne. Discorda de igual forma a Recorrente que não deveria ter sido dado como não provado que: “A. Relativamente às referidas liquidações de IRS do ano 2000 a Exequente pagou o montante global de € 16.380,82 – artigos 50º da p.i. e 7º e 8º do articulado de fls. 81 do processo físico;”, pretendendo, de igual forma que sejam aditados os seguintes factos: “b) A ora recorrente pagou à AT o montante de €9.743,93, correspondente a €8.343,91 da liquidação de IRS n.º ...83, do ano de 2000, e € 1.400,02 de juros. c) A ora recorrente pagou à AT o valor total que lhe foi exigido, de €16.380,82 (€1.474,25 + €1.283,48 + €3.879,16 + €9.743,93) relativamente ao seu IRS do ano 2000.” Para fundamentar tal pretensão, sustenta a Recorrente que os valores pagos decorrem dos doc. 10 e 13 juntos aos autos, assim como do facto 27), dado como assente. Previamente a qualquer outra apreciação, impõe-se esclarecer o seguinte. Em sede da petição inicial do processo de impugnação que seguiu termos no TAF de Viseu e que deu origem ao processo de execução de julgado, é identificado como acto impugnado a nota de cobrança n.º ...43 a que corresponde o facto que consta do ponto 28) da matéria de facto assente. No entanto, tal número corresponde ao nº do processo de execução fiscal instaurado pelo Serviço de Finanças ... sob o n.º ...43, correspondente ao IRS do ano de 2000, no montante de €6.556,28 e a juros de mora no montante de €1.238,06. Assim, tal como é explicado na sentença recorrida, e que aqui passamos a reproduzir: “Sucede que a AT, na sequência da declaração de substituição apresentada pela Exequente em 12/07/2004 (facto 19 de 3.1 supra), adicionando rendimentos de mais-valias, a AT efetuou nova liquidação (nº ...53, de 22/10/2004) na qual apurou valor a pagar de € 14.431,23 (facto 25 de 3.1 supra). Da demonstração do acerto de contas relativa a essa liquidação a AT deduziu o valor de € 2.757,73 apurado na última liquidação anterior, e apurou o saldo a pagar de € 11.673,50 (facto 26 de 3.1), de que a agora Exequente apenas pagou € 3.879,16 (facto 27 de 3.1). Assim, não havendo notícia do pagamento da dívida restante, a AT emitiu documentos para a autuação do processo de execução fiscal nº ...43, pelo valor da diferença em falta, sendo € 6.556,28 de IRS e € 1.238,06 de juros compensatórios (facto 28 de 3.1 supra).” Assim, o montante impugnado no processo principal respeita a parte do valor que a Recorrente Exequente teria que pagar em resultado da emissão em 22.10.2004 da liquidação de IRS nº ...53 do ano 2000, de que resultou valor a pagar no montante de €14.431,23. Por outro lado, a liquidação de IRS n.º ...83 do ano de 2000, no montante de €8.343,91, referenciada no ponto 27.º-A) , supra aditado ao probatório assente, foi emitida em 4.11.2004, ou seja, em data posterior à liquidação impugnada, assim como anterior à data em que a sentença no âmbito da impugnação judicial foi proferida, isto é, em 19.10.2017 (cfr. ponto 31) da matéria de facto assente). Nesta medida, a sua legalidade não foi objeto da decisão proferida em 19.10.2017 no processo nº 629/05.0BEVIS, pois esta limitou-se a apreciar a legalidade da liquidação de IRS nº ...53 do ano de 2000 e que foi objeto da impugnação cujo julgado está agora em execução. Acresce que, dos documentos juntos aos autos somente resulta o pagamento dos seguintes montantes: i) €1.474,25 pago em 28.09.2001 – cfr. doc. de fls. 39 do processo físico e dado conta no ponto 6) da matéria de facto assente; ii) €1.283,48 pago em 24.11.2004 - cfr. selo de pagamento que consta do doc. de fls. 42 do processo físico e dado conta no ponto 18) da matéria de facto assente; iii) €3.879,16 pago em 2.12.2004 – cfr. menção de valor regularizado que consta do doc. de fls. 46 do processo físico e dado conta no ponto 27) da matéria de facto assente; Estes pagamentos perfazem o montante total pago na ordem dos €6.636,89 não ascendendo a €9.743,93. Ademais, do documento 10., a fls. 48 do processo físico não resulta o pagamento de que a Recorrente se arroga. Com efeito, e, como decorre da sentença ora recorrida relativamente a outra liquidação, mas que espelha a nossa apreciação “A dedução correspondente ao valor da liquidação anterior não significa que esta se encontra paga (podendo estar), mas apenas que, independentemente desse valor, a última liquidação efetuada não se encontra afetada pelo valor da anterior. Se as liquidações anteriores já se encontrarem pagas, significa que o devedor só mantém a obrigação de pagar a última e, no caso contrário, mantém a obrigação de pagar todas as que não se encontrem pagas, sem que exista perigo de cumulação de obrigações.” Assim o é, na medida em que a demonstração de acerto de contas, com a consequente emissão de movimentos de compensação não prova o pagamento de qualquer montante. Impunha-se que a Recorrente exequente lograsse demonstrar por qualquer meio de prova ao seu dispor de que efectivamente procedeu ao pagamento daquele montante, o que, in casu, não se verificou. Nesta senda, para além da liquidação que a Recorrente alega ter procedido ao pagamento total de €9.743,93 não ter influenciado a decisão proferida em sede da impugnação judicial, a Recorrente também não logrou comprovar o pagamento desse montante. Consequentemente, impõe-se negar provimento à alteração da matéria de facto assente e não assente pretendida pela Recorrente. 2.2.3 - Do erro de julgamento de direito Em causa no presente recurso está a execução da sentença proferida em 21.03.2019 e rectificada por despacho de 10.07.2019 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, no processo de execução de julgados de sentença já transitada e proferida no âmbito do processo de impugnação judicial em 19.10.2017 que correu termos naquele Tribunal sob o nº 629/05.0BEVIS, que decidiu pela improcedência parcial da execução. Invoca a Recorrente Exequente que face à procedência da impugnação judicial intentada e já transitada, a AT deverá ser condenada a restituir-lhe a totalidade dos montantes pagos, relativamente ao IRS do ano 2000, bem como a pagar-lhe juros indemnizatórios, juros de mora, sanção pecuniária compulsória e despesas judiciais, extrajudiciais e honorários, de modo a restabelecer-se a situação que teria se o acto ilegal não tivesse sido praticado. Vejamos. Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa “As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades” Dando acolhimento a tal princípio constitucional o n.º 1 do artigo 100.º da Lei Geral Tributária estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei” Como dispõem os artigos 102.º n.º 1 da Lei Geral Tributária e 146.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a execução de julgados segue o regime previsto no Código do Procedimento e de Processo nos Tribunais Administrativos, isto é, segue o regime previsto nos artigos 173.º e seguintes do Código do Procedimento e de Processo nos Tribunais Administrativos. Como tal, na execução do julgado anulatório a administração deve reintegrar totalmente a ordem jurídica violada por forma a reconstituir a situação actual hipotética que “existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado” como determina o artigo 173.º nº 1 do Código do Procedimento e de Processo nos Tribunais Administrativos. Resulta assim deste preceito legal que “os deveres em que a Administração pode ficar constituída por efeito da anulação de um acto administrativo podem situar-se em três planos: (a) reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, mediante a execução do efeito repristinatório da anulação; (b) cumprimento tardia dos deveres que a Administração não cumpriu durante a vigência do acto ilegal, porque este acto disso a dispensava; (c) eventual substituição do acto ilegal, sem reincidir nas ilegalidades anteriormente cometidas” – cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha (in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª edição revista, 2010, pág. 1117). Como referido pelo STA no Acórdão de 12.04.2007, rec, 030897A “A execução do acórdão anulatório de acto administrativo consiste na prática pela Administração dos actos e operações materiais necessários à reintegração da ordem jurídica violada, por forma a restabelecer a situação do interessado à data do acto e reconstituí-la, no presente, como se o acto ilegal não tivesse sido praticado”. Assim, a AT encontra-se obrigada a repor a situação, como se não tivesse existido a ilegalidade. No caso presente, o Tribunal a quo decidiu que “(…) competia à AT proceder à anulação da liquidação nº ...53 (em cobrança coerciva no PEF nº ...43) de IRS de 2000, no montante de € 7.794,34, nos termos que constam da sentença. Ora, a AT anulou essa liquidação e extinguiu a execução fiscal (facto 37 de 3.1 supra). Dos valores pagos, cuja comprovação foi feita nos autos, a AT apenas tem de considerar a obrigação de restituir o montante de € 3.879,16, aludido em 27 de 3.1 supra, por só esse estar relacionado com a liquidação impugnada. No entanto, resulta dos autos que a AT efetuou outra liquidação posterior, designadamente a liquidação nº ...19, de 24/11/2017, na qual já levou em conta o julgado agora sob execução (facto 32 de 3.1 supra). A discussão acerca da legalidade dessa liquidação não poderá ser efetuada nos presentes autos, até porque se sabe que tal liquidação foi objeto de reclamação graciosa, que se encontra sob apreciação pela AT (facto 36 de 3.1 supra). Neste sentido, o Tribunal considera que a AT já executou a sentença agora sob execução de julgados, que, por isso, se julga improcedente nesta parte (valor: € 16.380,82).”, tendo assim considerado que o julgado já se encontrava cumprido. No entanto, a Recorrente Exequente discorda do assim decidido, defendendo a restituição das quantias pagas no montante total de €16.380,82. Ora, o peticionado não pode lograr provimento, senão vejamos. Por um lado, não nos podemos esquecer que as liquidações de IRS da aqui Recorrente respeitam ao conjunto de rendimentos que a mesma auferiu no ano de 2000, como sejam i) rendimentos de trabalho dependente no montante de €754,03, ii) pensões no montante de €2.394,23, iii) rendas no montante de €15.561,81 e iv) mais-valias (50%) no montante de €22.861,55 – cfr. ponto 32) da matéria de facto assente. Nesta medida, as diversas liquidações emitidas, nomeadamente a que está aqui sob discussão engloba a totalidade dos rendimentos respeitantes ao ano de 2000, não podendo desassociar-se a questão sob apreciação dos demais rendimentos auferidos pela Recorrente Exequente. Assim, o cumprimento do julgado teve de ter em consideração a globalidade de rendimentos auferidos assim como os respectivos encontros de contas no que a esses rendimentos respeitam. Por outro lado, não obstante, ter vindo impugnada a matéria de facto assente provada e não provada, relevante para a questão a decidir, esta manteve-se na ordem jurídica, por não alterada. Nesta medida, não tendo resultado comprovado que a Recorrente relativamente às liquidações de IRS do ano 2000 pagou o montante global de €16.380,82, impõe-se negar provimento ao presente recurso no que a esta questão respeita. Quanto ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios e de juros de mora, estes terão necessariamente que recair sobre o montante pago indevidamente, montante esse estabelecido pelo Tribunal a quo, face à confirmação por este Tribunal de tal decisão, como resulta supra. Sustenta também a Recorrente que “a entender-se – como consta da sentença recorrida - que os arts. 43º, 53º e 100º da LGT impediriam a fixação de juros indemnizatórios a favor da ora recorrente, sobre todas as quantias pagas relativamente a IRS do ano 2000 e sobre a caução prestada, sempre se teria de concluir pela sua manifesta inconstitucionalidade e inaplicabilidade in casu (v. art. 204º da CRP), pois violariam frontalmente o disposto nos arts. 2º, 9º/b), 20º, 22º, 205º e segs. e 268º/4 da CRP, e a garantia da tutela jurisdicional efectiva, na medida em que não permitiriam efectivar o direito à indemnização dos danos e encargos causados aos contribuintes pelas actuações ilícitas da Administração.” Ora, não tendo a Recorrente logrado comprovar o pagamento do montante de €16.380,82, não pode pretender que os juros recaiam sobre tal valor, recaindo estes, necessariamente sobre o valor que logrou comprovar o pagamento. Nesta medida, não se afigurando, por não demonstrado, o sobredito pagamento, não se verifica violada a tutela jurisdicional efectiva, pois, os encargos suportados vão ser restituídos, negando-se também provimento no que a esta alegação respeita. De igual forma, por maioria de razão também se impõe negar provimento ao recurso relativamente ao pagamento de juros indemnizatórios e de mora, para além dos que são estipuladas na decisão recorrida. Por último, a Recorrente vem peticionar o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento da referida decisão judicial, em valor diário não inferior a 10% do salário mínimo nacional mais elevado em vigor à data da decisão condenatória que vier a ser proferida. Ora, nos termos do disposto no artigo 169.º do CPTA “A imposição de sanção pecuniária compulsória consiste na condenação dos titulares dos órgãos incumbidos da execução, que para o efeito devem ser individualmente identificados, ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso que, para além do prazo limite estabelecido, se possa vir a verificar na execução da sentença.” Assim, prevê-se a aplicação de sanção pecuniária compulsória quando tal se justifique. In casu, tendo sido cumprido o julgado e, não se antevendo qualquer razão para que a presente decisão não seja cumprida atempadamente, considera o Tribunal que não se justifica, no imediato, a aplicação de sanção pecuniária compulsória, negando-se provimento também nesta parte ao peticionado. 2.2.4. Da ampliação do recurso face ao despacho que sanou as nulidades invocadas Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 617.º do Código de processo Civil “Se o juiz suprir a nulidade ou reformar a sentença, considera-se o despacho proferido como complemento e parte integrante desta, ficando o recurso interposto a ter como objeto a nova decisão”, estatuindo ainda o seu n.º 3 que: “No caso previsto no número anterior, pode o recorrente, no prazo de 10 dias, desistir do recurso interposto, alargar ou restringir o respetivo âmbito, em conformidade com a alteração sofrida pela sentença, podendo o recorrido responder a tal alteração, no mesmo prazo. Assim, cumpre apreciar a questão que passou a fazer parte integrante da decisão recorrida na sequência do despacho proferido em 3.07.2019, que logrou sanar as nulidades invocadas relativamente à omissão de pronúncia e que in casu respeita à indemnização pela prestação da garantia indevida. O Tribunal a quo decidiu pela improcedência do pedido de pagamento a título de indemnização pela prestação da garantia indevida. A Recorrente Exequente, insurge-se contra o assim decidido, sustentando o seu direito a indemnização pelos encargos incorridos pela prestação de depósito-caução ao abrigo do disposto no artigo 53.º da Lei Geral Tributária. Vejamos. No âmbito do contencioso tributário, a Lei Geral Tributária veio consagrar no seu artigo 53.° o instituto jurídico da ressarcibilidade ao contribuinte dos prejuízos emergentes da prestação de garantia bancária, respeitando o seu n.º 1 ao direito à indemnização caso o processo se tenha mantido sem decisão por mais de 3 anos, e no seu n.º 2, o direito à indemnização quando o erro for imputável aos serviços, neste caso independentemente do decurso do tempo. O Código de Procedimento e de Processo Tributário, por sua vez, regulamenta no artigo 171.º tal indemnização ao determinar no seu n.º 1 que “a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda”, estatuindo ainda no n.º 2 que “a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência” Da combinação destes normativos resulta que o direito à indemnização pela garantia indevida apenas é concedido quando se conclui pela invalidade do acto de liquidação, fundada em erro imputável aos serviços, situação em que, o prazo previsto no n.º 1 não releva. O direito à indemnização por prestação de garantia indevida fundamenta-se na responsabilidade civil da Administração pela prática de actos ilícitos ao abrigo do disposto no artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa. “Ora, são três os elementos constitutivos do direito à indemnização por garantia indevida: a. Em primeiro lugar, ter sido prestada garantia bancária ou equivalente em execução fiscal; b. em segundo lugar, ter o sujeito passivo suportado custos com a prestação ou a manutenção da garantia. O objectivo desta norma é exactamente a devolução ao contribuinte de todos os custos suportados com a prestação ou manutenção da garantia que se veio a mostrar indevida, pelo que é essencial à constituição do direito que esses custos tenham sido efectivamente suportados. C. Em terceiro lugar, ter-se apurado ser indevido o imposto que deu origem à divida, por ter sido anulada total ou parcialmente a liquidação que lhe deu origem. (…) – cfr. José Maria Fernandes Pires e outros (in Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 2015, Almedina, fls. 550). Nesta senda, nem todas as garantias efectivamente prestadas podem gerar o direito à indemnização em causa, na medida em que, se mostra necessário que estas impliquem a existência de custos financeiros efectivos para o executado, exactamente quantificados e documentados, gerados pela sua prestação. Neste sentido vide o decidido pelo Pleno da Secção do CT no Acórdão de 4.11.2020, rec. 018/20.7BALSB “(…) é inequívoco, perante o teor do art.º 53º da LGT e do art.º 171º do CPPT, que para os efeitos indemnizatórios aí previstos apenas são consideradas as "garantias bancárias ou equivalentes". O que se compreende, na medida em que nas garantias bancárias e equivalentes (como é o seguro-caução) o contribuinte suporta forçosamente uma despesa, cujo montante vai aumentando em função do período de tempo durante o qual é mantida, e, portanto, a presença de prejuízos é certa e infalível, porque inerente a este tipo de garantia. E porque a sua quantificação é fácil de fazer, o legislador quis dar ao lesado a possibilidade de obter, de forma imediata e praticamente automática, o reconhecimento do direito indemnizatório, ainda que limitado ao montante máximo previsto no nº 3 do art.º 53º da LGT. Como refere A. LIMA GUERREIRO, em anotação ao art.º 53º na sua "Lei Geral Tributária Anotada", «o presente preceito compreende apenas o prejuízo sofrido pela prestação de garantia bancária ou equivalente (como o seguro-caução). Não abrange o prejuízo sofrido pela prestação de outro tipo de garantia (ver, por exemplo, a constituição de penhor ou hipoteca legal), o que resulta da muito maior dificuldade em se configurar então a existência de um prejuízo efectivo sofrido pelo executado nesse tipo de circunstâncias, o que não significa que tal não possa ocorrer, devendo, então, o ressarcimento do lesado fazer-se pelos meios indemnizatórios gerais» - pág.245. Também JORGE LOPES DE SOUSA, na obra "Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por actos ilegais - Notas Práticas", refere que equivalente à garantia bancária «serão todas as formas de garantia que impliquem para o interessado suportar uma despesa cujo montante vai aumentando em função do período de tempo durante o qual aquela é mantida. Dos meios de garantia expressamente previstos no art.º 199º do CPPT, será o caso do seguro-caução, cujo regime está previsto nos arts 6º e 7º do DL nº 183/88, de 24 de Maio». E, como adianta no seu "Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado", voI. III, 6ª ed., pág. 346, a restrição do dever de indemnização aos casos de prestação de garantia bancária e garantias equivalentes, como o seguro-caução, vale, tão-somente, quanto a esta indemnização automática, derivada da mera verificação dos pressupostos previstos no artigo 53º nºs 1 e 2 da LGT, independentemente da verificação dos pressupostos gerais da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos, regulada pela Lei nº 67/2007. E daí que a garantia prestada sob a forma de fiança não se encontre abrangida por estes preceitos legais que atribuem e fixam um direito indemnizatório de forma praticamente automática num procedimento simplificado, o que se justifica por a fiança ser, por regra, prestada gratuitamente, isto é, sem qualquer contraprestação especial destinada a retribuir a obrigação assumida pelo fiador, ainda que nada impeça que seja remunerada (Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in "Código Civil Anotado", vol. I, pág.617.). O que não significa que o lesado nos seus direitos patrimoniais pela prestação desta garantia (ou de outras, como a hipoteca e penhor), não possa exigir a reparação dos prejuízos que efectivamente sofreu, por se tratar de direito que lhe é assegurado não só pelo art.º 22º da Constituição como pela Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas (Lei nº 67/2007, de 31.12). Terá, porém, de intentar para o efeito acção judicial para efectivar essa responsabilidade civil da administração tributária, onde terá de invocar e provar todos os danos que sofreu, tal como se deixou, aliás, frisado na sentença recorrida.” No caso presente, e como decorre do acervo probatório fixado, ponto 30), a Recorrente Exequente prestou junto do processo executivo depósito-caução no valor de €4.173,03, com o objectivo de suspender a execução até à decisão da impugnação, tendo nessa acção obtido ganho de causa, como resulta da sentença sob execução. É consabido que o depósito-caução é uma garantia financeira exigida em diversas situações, in casu, para garantir o pagamento de quantia cobrada em sede de execução fiscal, por forma a suspende-la ao abrigo do disposto no artigo 169.º e 199.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário. No entanto, entendemos que não se encontram preenchidos os pressupostos necessários à atribuição da indemnização por prestação indevida de garantia, constantes no artigo 53.º da Lei Geral Tributária. Senão vejamos. Embora o depósito-caução consubstancie uma garantia capaz de suspender a execução fiscal, não é uma garantia equivalente à garantia bancária, para os efeitos tidos no artigo 53.º da Lei Geral Tributária. Isto porque, o depósito-caução não gera custos efectivos, uma vez que consiste numa mera caução, em dinheiro, que o devedor entrega ao credor como garantia do pagamento da divida com a condição de este devolver integralmente esse valor no caso de não se mostrar necessário mobilizar essa quantia para o sobredito pagamento. Ora, “O valor da indemnização a pagar ao contribuinte depende dos custos por si efectivamente suportados, devendo estes ser devidamente documentados pelo contribuinte. O nº 3 do artigo 53.º da LGT estabelece um limite máximo para a indemnização, medido pela taxa de juros indemnizatórios aplicável ao valor da garantia indevidamente prestada, pelo período de tempo em que esteve vigente.” – cfr. José Maria Fernandes Pires e outros (in Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 2015, Almedina, fls. 555). No entanto, apesar da Exequente invocar que incorreu em despesas com a prestação do depósito-caução em sede da execução fiscal, não logrou especificar quais os custos referidos, nem muito menos os quantificou, não se vislumbrando quais terão sido. Assim, sabendo-se que o objectivo último dos normativos que aqui demos conta é o pagamento dos custos suportados com a prestação ou manutenção da garantia e não se tendo verificado que a Exequente incorreu em custos com a prestação do depósito-caução, não lhe assiste qualquer direito a indemnização ao abrigo do disposto no artigo 53.º da Lei Geral Tributária, nada obstando, no entanto, que esta deduza acção judicial para efectivar essa responsabilidade civil da Autoridade Tributária e Aduaneira ao abrigo do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas. Pele exposto, impõe-se negar procedência ao invocado. 2.2.5. Da nulidade da liquidação de IRS n.° ...19 de 07.03.2018 do ano 2000 Em sede de requerimento de ampliação do presente recurso vem a Recorrente Exequente peticionar a declaração de nulidade da liquidação de IRS n.º ...19, do ano 2000, emitida em 07.03.2018. Vejamos. Como decorre do disposto no n.º 3 do artigo 635.º do CPC, sob a epígrafe “Delimitação subjetiva e objetiva do recurso”, “Na falta de especificação, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente” Assim, “a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas. Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estes sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. (…) A assunção desta regra encontra na jurisprudência numerosos exemplos: a) As questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, pois estes destinam.se a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição.. Ac. do STJ, de 1-10-02, CJ, t. III, p.65”- cfr. António Santos Abrantes Geraldes (in Recursos em processo Civil, 7ª Edição atualizada, Almedina, pag. 139 a 141). No mesmo sentido vide Acórdão do STA de 29.10.2014, proc. 0833/14. No caso presente, e como se infere da petição inicial da execução de julgados intentada e aqui em questão, a Exequente Recorrente não peticionou a nulidade da liquidação de IRS n.º ...19 do ano 2000 emitida em 07.03.2018, não tendo o Tribunal a quo apreciado e decidido da sua legalidade. Como tal, a nulidade de tal liquidação consubstancia uma questão nova a apreciar por este Tribunal. Nesta senda, vindo invocada questão nova que não é de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal apreciar e decidir da anulação da sobredita liquidação. Do recurso da Executada 2.2.6. Da admissibilidade do recurso da Recorrente Executada A Recorrente Executada veio interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Aveiro, na parte em que decaiu, invocando o erro de julgamento quanto ao valor sobre que recaem os juros indemnizatórios e de mora. No entanto, a Exequente veio, em sede contra-alegações, invocar a inadmissibilidade do recurso interposto, sustentando que o recurso é inadmissível face às regras que decorrem do disposto no artigo 142.º n.º 1 do CPTA. A Executada, notificada para se pronunciar, veio defender que estando o litígio circunscrito entre o valor de €3.879,16 (valor sobre que recaem os juros) e o valor de €838,92 (valor a devolver à Exequente), o decaimento da AT resulta em €3.040,24 e, nessa medida, desfavorável em valor superior à metade da alçada do Tribunal. Vejamos. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 146.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário a execução de julgados é meio processual acessório, e, nessa medida é regulado pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos. Acresce que, “Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos” – cfr. n.º 2 do artigo 279.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Neste sentido vide Acórdão do STA de 18.11.2015, proc. 01502/14 e Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pag. 544) . Assim, determina o n.º 1 do artigo 142.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que “O recurso das decisões que, em primeiro grau de jurisdição, tenham conhecido do mérito da causa é admitido nos processos de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, quando a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.” O Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (Lei nº 13/2002, de 19.02), refere no n.º 1 do seu artigo 6.º que “Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal têm alçada”, estabelecendo ainda no seu n.º 3 que “A alçada dos tribunais administrativos de círculo e dos tribunais tributários corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância”. Por sua vez, a alçada dos tribunais de primeira instância é de €5.000,00 ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 44.º da Lei nº 62/2013, de 26.08 (Lei de Organização do Sistema Judiciário). Nesta medida, a admissibilidade do recurso depende da verificação cumulativa de dois requisitos i) o valor do processo tem de ser superior à alçada do Tribunal, isto é, superior a €5.000,00 ii) a decisão impugnada tem de ser desfavorável para o Recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão e de que se recorre, isto é, superior a €2.500,00. Neste sentido vide Acórdão do TCA Sul de 28.06.2018, processo n.º 337/14.1BEBJA. No caso presente, o valor fixado à causa - €32.262,08 - é superior à alçada do Tribunal Tributário (€5.000,00), restando aferir se o decaimento da sua pretensão é superior a metade do valor da alçada do Tribunal recorrido. Relativamente ao valor da sucumbência, tem considerado a Jurisprudência que para efeito da admissibilidade do recurso, este tem de respeitar à diferença entre o montante condenatório fixado na decisão recorrida e o que se pretende que seja fixado na decisão do recurso. Neste sentido e entre outros vide Acórdão do STJ de 26.09.2007, proc. 06S4612 e Acórdão daquele mesmo Tribunal de 27.10.2010, proc. 4483/07.0TTLSB.L1.S1. Com efeito, parafraseando Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha (in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, 4ª Edição, Almedina, pag. 1088), o valor da sucumbência não é ”o montante global em que a decisão impugnada se mostra desfavorável, mas aquela em relação ao qual o recorrente se não conforma e pretende que seja apreciado em sede de recurso”. No caso sob apreciação, a decisão recorrida decidiu que os juros indemnizatórios e de mora recairiam sobre a quantia de €3.879,16, vindo, no entanto a Recorrente Executada sustentar que os juros deveriam recair sobre o montante de €838,92 (valor a devolver à Exequente). Nesta medida, o valor da sucumbência da Executada respeita à diferença do montante que decorre da aplicação dos juros ao montante de €3.879,16 e a aplicação de juros sobre o montante de €838,92. Ora, nos termos do disposto no artigo 43.º n.º da Lei Geral Tributária “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” O n.º 5 do artigo 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário determina que “Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos” Por sua vez, o n.º 10 do artigo 35.º da LGT dispõe que “A taxa dos juros compensatórios é equivalente à taxa dos juros legais fixados nos termos do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil”, que estabelece no seu n.º 1 que “Os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do Plano” Por último, fixou a Portaria n.º 291/2003, de 8.04, no seu n.º 1.º que “a taxa anual dos juros legais e dos estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo é fixada em 4%.” Assim, considerando o supra exposto e relativamente aos juros indemnizatórios, os cálculos do valor decidido na sentença recorrida e os cálculos com base no montante que a Executada defende são os seguintes:
Nesta senda, a diferença entre os juros calculados sobre o montante defendido pela Exequente (€2.211,12) e o montante sustentando pela Executada (€478,18), ascende a €1.732,94. Relativamente aos juros de mora, decorre do n.º 5 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária que “No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.”, estatuindo ainda o n.º 2 do artigo 10.º do mesmo diploma legal que “Em caso de a sentença implicar a restituição de tributo já pago, são devidos juros de mora a partir do termo do prazo da sua execução espontânea” Por último, o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 73/99 de 16.03 veio fixar a taxa dos juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado e outras entidades públicas, fixando-se em 2018 na ordem dos 4,857% e para 2019 na ordem dos 4,825%. Ora, mesmo contabilizando os juros de mora devidos nos dois anos em questão pela taxa mais alta (4,857%), respeitando assim a taxa aqui aplicável ao seu dobro, estes ascenderiam a 9,71%. Nesta medida, os juros calculados face ao defendido pela Exequente e pela Executada e calculados pela taxa mais alta ascenderiam aos seguintes montantes:
Nesta medida, o deferencial entre o sustentado pela Exequente (€271,41) e pela Executada (€58,70), ascende a €212,71. Pelo exposto, mesmo que o valor da taxa de juro de mora se tivesse mantido nos dois anos nos 4,857%, o valor da sucumbência da Executada ascenderia a €1.945,65 (€1.732,94 + €212,71). Assim, o presente recurso não é admissível, porquanto, a decisão impugnada não foi desfavorável à Executada em valor superior a metade da alçada desse tribunal (€2.500,00). Deste modo, decide-se pela não admissibilidade do Recurso interposto pela Executada, por a decisão não ser recorrível, à luz do disposto no n.º 1 do artigo 142.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Não sendo de admitir o recurso interposto pela Executada, por não admissível, fica prejudicado o invocado erro de julgamento quanto ao valor sobre que recaem os juros indemnizatórios e de mora. Nos termos do disposto no artigo 663.º nº 7 do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte SUMÀRIO: I. Embora o depósito-caução consubstancie uma garantia capaz de suspender a execução fiscal, não é uma garantia equivalente à garantia bancária, para os efeitos tidos no artigo 53.º da Lei Geral Tributária. II. A execução de julgados segue o regime previsto no Código do Procedimento e de Processo nos Tribunais Administrativos. III. A admissibilidade do recurso depende da verificação cumulativa de dois requisitos: i) o valor do processo tem de ser superior à alçada do Tribunal, (€5.000,00), ii) a decisão impugnada tem de ser desfavorável para o Recorrente em valor superior a metade da alçada do Tribunal que proferiu a decisão e de que se recorre (€2.500,00). IV. O valor da sucumbência não é ”o montante global em que a decisão impugnada se mostra desfavorável, mas aquela em relação ao qual o recorrente se não conforma e pretende que seja apreciado em sede de recurso”. *** 3 – Decisão Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em: a) Negar provimento ao recurso interposto pela Exequente, e, em consequência manter-se a decisão recorrida; b) Não admitir o recurso interposto pela Executada, por irrecorribilidade da decisão impugnada. Custas do recurso interposto pela Recorrente Exequente a cargo da Exequente, e, custas do recurso interposto pela Recorrente Executada a cargo da Executada. Porto, 23 de Maio de 2024 Virgínia Andrade Paula Maria Dias de Moura Teixeira Paulo Moura |