Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00813/13.3BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 01/12/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
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Descritores: | CIVA ARTIGO 20º, N.º 1 AL. A); DIREITO À DEDUÇÃO; |
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Sumário: | I. No que respeita ao direito de dedução a Jurisprudência do TJUE vem afirmando que «o direito à dedução previsto nos artigos 17.º e 20 da Sexta Directiva faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. (…) Para que o IVA seja dedutível, as operações efectuadas a montante devem ter uma relação directa e imediata com as operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução.» II. Vem admitindo também um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo directo e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo. III- O sujeito passivo tem direito à dedução do IVA suportado a montante com as denominadas “operações acessórias, inerente as obras de requalificação urbana, inserção urbana, uma vez que constituem operações realizadas pela mesma tendo em vista o exercício directo da sua actividade económica consistente no sistema de transporte por Metro, ou seja, tais custos e o IVA com eles suportados têm um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto datada de 10.05.2016, pela qual foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pela "A...., SA" contra a liquidação adicional de IVA e respetivos juros compensatórios, referente ao período de dezembro de 2021, no valor global de € 54.320,68, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: 1.1.1. Alegou a Recorrente XXX, formulando as seguintes conclusões: «A. Vêm impugnadas a liquidação adicional de IVA relativa ao período de tributação de dezembro de 2011 e dos respetivos juros compensatórios, no valor a pagar de € 53.836,89 de imposto e de € 483,79, respetivamente, B. com fundamento na alegação pela impugnante que, no exercício das suas atribuições, realizou o que designa por obras de reposição e de reconstrução e por obras de inserção ou de compatibilização urbana que não revestem uma natureza essencialmente distinta das obras de construção da infraestrutura básica do sistema de metro ligeiro do ... e têm uma ligação direta com a atividade da impugnante que é tributada em IVA, C. e de que é irrelevante para o reconhecimento do direito à dedução do IVA suportado na realização das referidas obras o modo de financiamento dessas obras, mediante a contribuição com ativos por parte das autarquias detentoras do capital social da impugnante para que esta realizasse o seu objeto social, pois não importa quem financia as obras, mas quem as faz e para quê as faz. D. A douta sentença recorrida julgou procedente a impugnação considerando que “atenta a descrição dos trabalhos e o objecto social da impugnante, facilmente se conclui que aqueles tiveram como fim último a salvaguarda das condições de circulação, operacionalidade e segurança do sistema de metro, estando intimamente relacionados com a respectiva concretização, a qual surge como incumbência especial da impugnante no âmbito da concessão em apreço”, E. e que “Tais trabalhos são necessários – porque pressuposto e condição – à execução da linha de metro, inserindo-se mesmo no âmbito da actividade económica da impugnante que gera operações tributáveis, traduzida na exploração do sistema de metro ligeiro, pelo que a Administração Tributária claramente labora em erro ao afirmar que tais operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público que não se destinam à produção de bens e serviços tributados”. F. Salvo o devido respeito, e sem prejuízo de melhor opinião, a Fazenda Pública não se conforma com o decidido existindo erro sobre os pressupostos de facto e de direito da decisão, já que a douta sentença selecionou de modo insuficiente e valorou erroneamente a factualidade evidenciada da prova produzida no processo, da qual cumpria fazer a adequada qualificação jurídica, em termos que afetam irremediavelmente a validade substancial da sentença. G. A Fazenda Pública dá aqui por reproduzida a factualidade que, no desenvolvimento destas alegações, entende que deve ser dada como provada, de conformidade com os poderes que são concedidos ao Tribunal ad quem pelo art. 662º, nº 1, do CPC, aplicável por via da al. e) do art. 2º do CPPT, por se encontrarem comprovados nos autos e se reputar essenciais à boa decisão da causa. H. Com base nessa factualidade, a Fazenda Pública entende que, conforme o princípio que presidiu às correções aritméticas promovidas à matéria tributável em IVA dos períodos de tributação a que respeitam as liquidações impugnadas, o modo de financiamento das obras de requalificação determina a existência ou não do direito à dedução do IVA pago a montante inerente aos encargos suportados com essas obras. I. A jurisprudência comunitária tem repetidamente afirmado que, para que seja reconhecido ao sujeito passivo o direito à dedução do IVA pago a montante, é necessário que o montante dos encargos a que corresponde o IVA a deduzir tenha diretamente onerado o custo dos diversos elementos constitutivos do preço das operações a jusante sujeitas a imposto, de acordo com o princípio fundamental do sistema do IVA consagrado nos art.s 2º da Primeira e Sexta Diretivas e no art. 1º, nº2, 2º parág.º da Diretiva 2006/112/CE. J. No acórdão SKF, proferido no proc. C-29/98, o TJUE, significativamente, observa (nº 60) que há sempre que examinar se a relação direta e imediata com uma ou várias operações a jusante que conferem direito à dedução ou com as despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade económica do sujeito passivo traduz-se na incorporação do preço das prestações a montante, respetivamente, nos preços das operações particulares a jusante ou nos preços dos bens ou serviços fornecidos pelo sujeito passivo no âmbito das suas atividades económicas. K. Ora, enquanto que os serviços de inspeção tributária, em face do modo de financiamento das obras a que respeitam os encargos cujo correspondente IVA pretende deduzir e do seu registo contabilístico, pôs em causa, fundadamente, o direito a essa dedução, entre outros motivos, porque o custo das obras de requalificação urbana não era financiado pela impugnante, mas era, designadamente, responsabilidade dos municípios seus acionistas, L. a impugnante, por seu turno, nunca provou no processo sub judice que os encargos daquelas obras cujo correspondente IVA pretende deduzir são, ou por terem uma relação direta e imediata com as operações a jusante, ou como despesas gerais da sua atividade económica, elementos constitutivos do preço destas operações. M. O relatório de inspeção tributária salienta que, segundo a base XIII da concessão, as obras de requalificação urbana são asseguradas pelos municípios da área metropolitana do ... acionistas da impugnante através de prestações acessórias de capital, N. modo de financiamento que a alteração da redação da base XIII e do art. 10º dos estatutos pelo DL 192/2008, de 01.10, não alterou, porquanto a própria impugnante regista obras de requalificação urbana e de inserção urbana em conjunto e usa ambas as expressões em sinonímia, como se constata da mera leitura da PI. O. Esta indiferenciação, evidenciada não só no registo mas na própria natureza das obras, implica que a impugnante pode eventualmente imputar a maior parte dos seus encargos ao financiamento a que os municípios da área metropolitana do ... seus acionistas estão obrigados, P. ou seja, a impugnante tem a faculdade de submeter os encargos com essas obras, e o correspondente IVA, ao financiamento obtido ou a obter desses acionistas, corrigindo os efeitos da livre operação da impugnante no mercado dos transportes, e sem que fique constituída na obrigação de reembolso, retirando-lhes a qualificação de custos da sua atividade económica. Q. A forma como o preço dos serviços prestados pela impugnante aos seus clientes é formado, segundo a base XIV, em que o valor das tarifas a cobrar aos clientes do sistema de metro ligeiro é fixado atendendo ao índice de preços dos vários serviços de transporte coletivo praticados na área metropolitana do ..., dependendo de prévia homologação pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestre, IP, põe em evidência que o preço cobrado não é, a priori, formado pelos encargos a montante com relação direta e imediata com uma ou várias operações a jusante que conferem direito à dedução, nem pelas despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade. R. Era exigível à impugnante que, nos termos do art. 44º do CIVA, mantivesse a contabilidade organizada de forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto e a permitir o seu controle, S. no caso, diante dos diferentes modos de financiamento dos encargos e de ligação dos inputs com a atividade da impugnante, o registo segregado dos encargos com obras de requalificação urbana e obras de inserção urbana ou, como agora vem denominar, com obras de reposição/reconstrução e obras de inserção/compatibilização. T. Assim sendo, reconhecer o direito à dedução do IVA relativo a encargos das obras de requalificação urbana ou de inserção urbana que não fazem parte dos elementos constitutivos do preço, que não são repassados aos destinatários das operações a jusante e não contribuem para a formação da base tributável do IVA liquidado pela impugnante, U. seria pôr em causa o mecanismo do direito à dedução e, desse modo, o princípio da neutralidade do IVA, porque permitir-se-ia a quem não atuou como sujeito passivo, mas como consumidor final (na medida em que não repercutiu os correspondentes encargos a destinatários da sua atividade económica, a jusante), que se desonerasse da carga fiscal acumulada no circuito económico antecedente. Termos em que, e nos melhores de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e, consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com o que se fará inteira Justiça.» 1.2. A Recorrida "A...., SA", notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 59 SITAF, no sentido da improcedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto (insuficiência da fixação de factos), errada valoração da matéria de facto e erro de julgamento de direito. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «É a seguinte a matéria de facto assente com relevância para a decisão da causa, para além da que antecede, por ordem lógica e cronológica: A. Ao longo do mês de Dezembro de 2011, a impugnante emitiu facturas relativas às seguintes operações – facto alegado em 42º da p.i. e não posto em causa pela Fazenda Pública e docs. 4 a 17 juntos com a p.i.: i. Trabalhos de acompanhamento arqueológico de obras integradas na inserção urbana da linha ... em ..., em cumprimento da Declaração de Impacte Ambiental e do Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução; ii. Trabalhos de construção e reposição de vias para circulação de pessoas e viaturas, com vista a assegurar a adequada inserção do canal de metro no tecido urbano envolvente na Zona Industrial ..., salvaguardando a correcta operacionalidade do sistema naquela zona; iii. Fiscalização dos trabalhos de eliminação de diversas passagens de nível que confrontavam com o canal de metro no concelho de ..., salvaguardando as condições de segurança e operacionalidade do sistema; iv. Trabalhos para eliminação de diversas passagens de nível que confrontavam com o canal de metro no concelho de ..., com vista a salvaguardar a segurança e operacionalidade do sistema; v. Trabalhos para implementação do sistema de metro (construção do canal e da estação) e integração urbanística do canal na Avenida ..., em ..., com vista a salvaguardar a segurança e operacionalidade do sistema; vi. Trabalhos de arquitectura e construção de via (canal ferroviário), arruamento e inerentes infra-estruturas, com vista à integração do canal na zona urbana que o mesmo passou a atravessar. B. Em 02.05.2012 pela Divisão de Inspecção Tributária II da Direcção de Finanças do ... foi emitido “Relatório de inspecção tributária” relativamente à impugnante com o seguinte teor – cfr. fls. 26 e ss. do PA apenso: “(...) III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL (...) Os factos apurados relacionavam-se com as designadas obras de requalificação urbana, as quais ficou firmado quanto à possibilidade do sujeito passivo deduzir o IVA suportado com as mesmas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 20.º do CIVA. (...) 1. IVA indevidamente deduzido – “obras de requalificação urbana” 1.1 Factos apurados (...) Enquadramento fiscal em IVA Relativamente às obras de requalificação urbana versus inserção urbana, importa relevar os seguintes factos. a) As obras de requalificação urbana corresponderão às intervenções efectuadas, de natureza complementar às infra-estruturas base do sistema do metro, em áreas e espaços públicos (vias rodoviárias, passeios, jardins) cujos direitos associados são propriedade dos municípios. b) As obras de inserção urbana corresponderão às intervenções necessárias para a salvaguarda das condições de segurança e de operacionalidade do sistema, bem como as necessárias para o restabelecimento dos serviços, onde se inclui a circulação viária e pedonal das zonas afectadas pela plataforma, paragens e interfaces do metro e para a reposição das condições anteriormente existentes nas zonas adjacentes à plataforma de metro afectadas directamente pela sua construção; c) As prestações acessórias de capital a realizar por cada um dos municípios abrangidos pelo sistema do metro, embora possam traduzir uma contraprestação do serviços prestado pela "A...., SA", que se materializa na realização das obras de requalificação urbana, de que cada um dos municípios vai beneficiar, verifica-se, no entanto, que as mesmas permanecem no activo imobilizado da "A...., SA", como sua propriedade, não contribuindo no entanto para a realização das operações tributáveis, consagradas no âmbito do seu objecto social. d) O facto da "A...., SA", ter procedido às obras de requalificação urbana, mediante autorização tácita dos municípios beneficiários – nunca estas intervenções foram objecto de aprovação por acto legislativo (Assembleia Municipal) -, poderia consubstanciar a prestação de serviços gratuita, se as mesmas não se mantivessem no activo da "A...., SA", como sua propriedade, como se verifica estarem. Ou seja, conforme disposto na alínea a) do parágrafo 49 da Estrutura Conceptual do Sistema de Normalização Contabilística, “Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de acontecimentos passados e do qual se esperam que fluam para a entidade benefícios económicos futuros”. e) Dado que as obras de requalificação urbana continuam a ser registadas contabilisticamente como ativo da empresa "A...., SA" (conta 454 – Ativo Intangível em Curso), não podem as mesmas consubstanciar uma prestação de serviços gratuita. f) Se as obras de requalificação urbana fossem directamente asseguradas/realizadas por cada um dos municípios, que deles beneficiam, nunca estes poderiam deduzir o IVA associado ás mesmas, nos termos do nº 1 do art.º 20º do CIVA, tendo em consideração que o n.º 2 do art.º 2º do CIVA refere que “O Estado e demais pessoas colectivas de direito público não são, no entanto, sujeito passivo do imposto quando realizem operações no exercício dos seus poderes de autoridade,...” g) Cada um dos municípios, beneficiários do sistema de metro (..., ..., ..., ..., ..., ... e ...), e consequentemente beneficiários das obras de requalificação urbana, constitui-se como titular do capital da "A...., SA", por via da sua participação com sete acções (uma acção cada município), que corresponde a 0,0005% do capital. (...) (...) em sede de IVA, concluiu-se que as designadas obras de requalificação urbana e considerando o seu destino económico, não possibilitam ao sujeito passivo deduzir o IVA suportado com as mesmas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 20º do CIVA. Estas operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público, que são (bens) propriedade dos municípios e, não se destinam à produção de bens e serviços tributados, pelo que não cumprem os requisitos da referida norma. A não ser assim, permitir-se-ia que bens ou serviços não destinados a operações tributáveis ficassem desonerados de qualquer imposto ficando prejudicada a característica de neutralidade do IVA. (...) Pelo exposto, conclui-se que o imposto suportado com os encargos associados às obras de requalificação urbana, executadas em bens do domínio público, efectuadas pela "A...., SA", não confere direito à dedução de acordo com o estabelecido no art. 20º do CIVA. (...).” C. Em nome da impugnante foram emitidas a liquidação adicional de IVA n.º ...04 e a liquidação dos correspondentes juros compensatórios n.º ...06, relativas ao período de Dezembro de 2011, no montante global de € 54.320,68 – cfr. docs. 1 a 3 juntos com a p.i.. D. Em 07.03.2013, a impugnante procedeu ao pagamento da quantia de € 53.836,89 por conta das liquidações ora impugnadas – cfr. fls. 43 do processo físico. E. Em 26.03.2013, foi remetida a este Tribunal a p.i. que deu origem aos presentes autos – cfr. fls. 3 do processo físico. Motivação O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos dados como assentes tendo por base os documentos juntos aos autos, os quais não foram objecto de impugnação, bem como o posicionamento das partes, assumido nos respectivos articulados.» 2.1.2. Aditamento oficioso Pela pertinência para a decisão da causa e atendendo ao disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, nomeadamente em complemento e densificação do item B. do probatório, procede-se ao aditamento da seguinte matéria: F. Consta do Relatório de Inspecção Tributária constante do Processo Administrativo de fls. 38 a 41 (págs. 3 a 10 do RIT) a seguinte fundamentação: «III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL No decurso de procedimento inspetivo externo anterior, foram detetadas situações, com possíveis repercussões fiscais, em sede de IVA, cuja relevância e impacto na atividade do sujeito passivo é tal, que das mesmas foram prestadas informações, no sentido de que a sua colocação á consideração superior, permitisse posteriormente agir em conformidade. Os factos apurados relacionam-se com as designadas obras de requalificação urbana, as quais ficou firmado quanto à possibilidade do sujeito passivo deduzir o IVA suportado com as mesmas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 20º do CIVA. Este artigo condiciona a dedução do imposto a operações necessárias para que o sujeito passivo realize operações – prestação de serviços – sujeitas a imposto e dele não isentas, ou/e por outro lado da necessidade em sujeitar essas operações à subsequente liquidação de IVA, nos termos da alínea b) da n.º 2 do art. 4º do CIVA. Este entendimento foi corroborado pela Direção de Serviços do IVA (DSIVA), que apreciou todos os, factos que suportaram o nosso procedimento. Neste contexto, foi produzida a informação superiormente sancionada pela Direção de Serviços do IVA – Divisão de Conceção, a qual foi de parecer desfavorável aos atos praticados pelo sujeito passivo, pelo que se torna necessário proceder às devidas correções de natureza meramente aritméticas. 1. IVA indevidamente deduzido – “obras de requalificação urbana” 1.1. Factos apurados 1.1.1 Enquadramento no projeto de concessão O conceito de “obras de requalificação urbana” não se encontrava previsto no Decreto-Lei n.º 394-A/98 de 15 de dezembro, apenas tendo sido introduzido com as alterações produzidas pelo Decreto-Lei n.º 261/2001 de 26 de setembro. Este conceito apenas foi consagrado na base da concessão, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 261/2001 de 26 de setembro, e pelo Decreto-Lei nº 192/2008 de 1 de outubro, que no seu art. 1º relativo às alterações ás bases de concessão, estipula para os n.os 2 e 3 da base XIII a seguinte redação: “n.º 2 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o financiamento das atividades respeitantes á construção dos acessos ao sistema de interfaces e das obras de requalificação urbana será assegurado pelos municípios da Área Metropolitana do ...”. “n.º 3 – A concessionária deve suportar os custos relativos às obras de inserção urbana necessárias para a salvaguarda das condições de segurança e de operacionalidade do sistema, bera como as necessárias para o restabelecimento dos serviços, onde se inclui e circulação viária e pedonal das zonas afectadas pela plataforma, paragens e interfaces do metro e para a reposição das condições anteriormente existentes nas zonas adjacentes à plataforma de metro afectadas directamente pela sua construção.” Assim corno no seu art. 3º, relativo às alterações introduzidas no art. 3º do acordo parassocial, o Decreto-Lei n.º 261/2001 de 26 de setembro apresenta a seguinte redação: “n.º 3 – A AM... assegura perante os restantes sócios da "A...., SA", atendendo ao disposto no art. 11.º, que os municípios abrangidos pelo sistema realizarão prestações acessórias de capital, constituídas pelos bens e valores correspondentes aos direitos referidos na alíneas c) do n.º 1 e também pelos imóveis necessários à construção dos acessos ao sistema, dos interfaces e das obras de requalificação urbana decorrentes nos termos e condições seguintes: a) O valor das prestações acessórias de capital de cada município corresponderá aos valores dos imóveis e direitos a que se referem as alíneas ci) e cri) do n.º 1 e aos valores dos imóveis necessários à construção dos acessos ao sistema, dos interfaces e das obras de requalificação urbana, a que se refere o corpo deste n.º 3, que cada um tenha transferido para a MP; b) ... c) ... n.º 4 – O Estado poderá, todavia, e em substituição da obrigação dos municípios referida no n.º 3, realizar segundo o seu critário prestações acessórias de capital, em dinheiro ou em espécie, independentemente de chamada ou do consentimento dos outros acionistas, para cobertura dos custos de construção dos acessos, dos interfaces e das obras de requalificação urbana.”. Finalmente no seu ed. 2º, relativo às alterações introduzidas no art. 10º dos estatutos, o Decreto-Lei n.º 192/2008 de 1 de outubro apresenta a seguinte redação: “Os acionistas realizarão prestações acessórias de capital, em dinheiro ou em espécie, nos termos seguintes: a) Os municípios abrangidos pelo sistema realizam prestações acessórias de capital, por entradas em espécie, constituídas pelos bens imóveis municipais, pelos direitos de cobrança de taxas, emolumentos e licenças pelas construções imobiliárias, ocupação de vias públicas, do subsolo e do espaço aéreo, pelos loteamentos e pela colocação de estaleiros de obra, bem como outros direitos semelhantes que seriam devidos nos termos dos regulamentos municipais em vigor, e pelos imóveis necessários é construção dos acessos ao sistema, dos interfaces e das obras de requalificação urbana decorrentes, nas seguintes condições:...”. Importa desde logo registar que este conceito foi enquadrado na base XIII da concessão, que se íntegra na Secção III – Regime financeiro, e que regula o financiamento das atividades da concessionária, não tendo sido efetuada qualquer alteração, quer nas bases da concessão, quer nos estatutos da empresa, dos artigos que definem o objeto da concessão (base I da concessão e art. 3º dos estatutos) e as atividades acessórias (base II da concessão e art. 4º dos estatutos). A base XIII da concessão, regula as fontes de financiamento das diversas atividades contempladas no contrato de concessão, que nos termos do Decreto-Lei n.º 192/2008 de 1 de outubro, são as seguintes: 1. O seu n.º 1 prevê que as atividades de conceção e realização do projeto, de realização das obras de construção, de fornecimento e montagem do material circulante, dos demais equipamentos que constituem o sistema de metro, dos custos inerentes à condução dos processos expropriativos, incluindo o pagamento das respetivas indemnizações, dos custos decorrentes da aquisição por via do direito privado dos bens imóveis e direitos a adquirir a particulares, bem corno de eventuais indemnizações a concessões de transporte rodoviário afetados pelo sistema do metro, serão asseguradas através das dotações do orçamento do Estado, de fundos de origem comunitária e de garantias a empréstimos contraídos pela concessionária. 2. O seu n.º 2 prevê que as atividades respeitantes à construção dos acessos ao sistema e das interfaces com outros sistemas de transporte e das obras de requalificação urbana, serão asseguradas pelos municípios da área metropolitana do ..., através da realização de prestações acessórias de capital. Finalmente registe-se o disposto no n.º 8 do art. 3º cio acordo parassocial, que relativamente às prestações acessórias de capital e qualquer que seja a natureza da sua entrada ou o seu regime, prevê que as mesmas sejam sempre realizadas a título gratuito. Esta disposição indicia que as mesmas não terão a natureza de contraprestação, porquanto os ativos que foram sendo contabilizados pela "A...., SA", associados às obras de requalificação urbana, não serão transferidos para os municípios beneficiários com a realização das prestações acessórias de capital. A. Considerações do Tribunal de Contas Relativamente a este elemento da ação – obras de requalificação urbana – da "A...., SA", pronunciou-se o Tribunal de Contas (Relatório de Auditoria na 33/06 da 2º Secção), no âmbito do qual proferiu as seguintes considerações: a) As obras de requalificação urbana realizadas pela "A...., SA", foram realizadas, sem que os seus custos tivessem sido contabilizados por contrapartida das respetivas prestações acessórias a efetuar pelos municípios beneficiários e como tal qualificou-as de ilegais. b) Impossibilidade da "A...., SA" realizar as obras de requalificação urbana, por conta própria, em virtude de ser condição necessária para tal, que aquelas constassem ou do objeto da concessão, ou do fim social da empresa, ou do seu objeto acessório, situação que se não verifica. c) Não estando estas obras a ser financiadas pelos respetivos beneficiários (municípios), face à inexistência das respetivas prestações acessórias de capital, coloca-se ainda a ingerência de tais ações consubstanciam em matarias da exclusiva competência dos municípios beneficiários. Estas obras apenas por ato legislativo e em determinadas condições – não cumpridas – poderiam ser levadas a cabo por entidades terceiras. O art. 10º dos estatutos, expressamente refere que as prestações acessórias de capital serão realizadas em momento anterior ao início dos trabalhos a que a utilização careta respeita. d) As obras de requalificação urbana são complementares e que se não confundem com as intervenções infraestruturais necessárias ã construção do sistema do metro, como o demonstra a sua não inclusão no projeto inicial. A sua ilegalidade deriva contudo, não da execução das mesmas pela "A...., SA", mas antes pela falta de pagamento das mesmas por parte dos municípios beneficiários, inerente ao incumprimento da condição prévia de realização das prestações acessórias de capital. e) O Decreto-Lei n.º 261/2001 de 26 de setembro não reformulou o objeto social da empresa, com a introdução de tais obras no seu âmbito, tendo apenas previsto a possibilidade desta as realizar em determinadas condições. Estas obras não contrariam o objeto social da "A...., SA", desde que destas resulte uma contrapartida para a empresa, A inexistência de contrapartidas consubstancia a realização de operações gratuitas, que são naturalmente contrárias aos fins da sociedade (lucro). B. Enquadramento fiscal em IVA Relativamente ao conceito de obras de requalificação urbana versus inserção urbana, importa relevar os seguintes factos: a) As obras de requalificação urbana corresponderão às intervenções efetuadas, de natureza complementar às infraestruturas base do sistema do metro, em áreas e espaços públicos (vias rodoviárias, passeios, jardins) cujos direitos associados são propriedade dos municípios. b) As obras de inserção urbana corresponderão às intervenções necessárias para a salvaguarda das condições de segurança e de operacionalidade do sistema, bem como as necessárias para o restabelecimento dos serviços, onde se inclui a circulação viária e pedonal das zonas afectadas pela plataforma, paragens e interfaces do metro e para a reposição das condições anteriormente existentes nas zonas adjacentes à plataforma de metro afectadas directamente pela sua construção. c) As prestações acessórias de capital a realizar por cada um dos municípios abrangidos pelo sistema do metro, embora possam traduzir urna contraprestação do serviço prestado pela "A...., SA", que se materializa na realização das obras de requalificação urbana, de que cada um dos municípios vai beneficiar, verifica-se, no entanto, que as mesmas permanecem no ativo intangível em curso da "A...., SA", como sua propriedade, não contribuindo no entanto para a realização das operações tributáveis, consagradas no âmbito do seu objeto social. d) O facto da "A...., SA", ter procedido às obras de requalificação urbana, mediante autorização tácita dos municípios beneficiários – nunca estas intervenções foram objeto de aprovação por ato legislativo (Assembleia Municipal) –, poderia consubstanciar a prestação de serviços gratuita, se as mesmas não se mantivessem no ativo da "A...., SA", como sua propriedade, como se verifica estarem. Ou seja, conforme disposto na alínea a) do parágrafo 49 da Estrutura conceptual do Sistema de Normalização Contabilística, “Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de acontecimentos passados e do qual se esperam que fluam para a entidade benefícios económicos futuros”. e) Dado que as obras de requalificação urbana continuam a ser registadas contabilisticamente como ativo da empresa "A...., SA" (conta 454 – Ativo intangível em Curso), não podem as mesmas consubstanciar uma prestação de serviços gratuita. f) Se as obras de requalificação urbana fossem diretamente asseguradas / realizadas por cada um dos municípios, que delas beneficiam, nunca estes poderiam deduzir o IVA associado ás mesmas, nos termos do nº 1 do art. 20º do CIVA, tendo em consideração que o n.º 2 do art.2º do CIVA, refere que “O Estado e demais pessoas coletivas de direito público não são, no entanto, sujeito passivo do imposto quando realizem operações no exercido dos seus poderes de autoridade, ...”. g) Cada um dos municípios, beneficiários do sistema de metro (..., ..., ..., ..., ..., ... e ...), e consequentemente beneficiários das obras de requalificação urbana, constitui-se como titular do capital da "A...., SA", por via da sua participação com sete ações (uma ação cada município), que corresponde a 0,0005% do capital. C. Prestações acessórias de capital Até à presente data, apenas foi contabilizada em 2001 uma prestação acessória de capital, ainda não realizada, pelo município ..., mediante a contabilização a crédito da conta 531 – Prestações acessórias de capitai: ..., por contrapartida a débito da conta 26418 – Subscritores de capital: ..., pelo valor de 179,033,43 euros. Segundo esclarecimentos prestados pela "A...., SA", ainda não foi aprovada em Assembleia Geral a realização desta prestação acessória, a qual depende de deliberação favorável daquele órgão (n.º 6 do art. 3º do acordo parassocial e alínea d) do art. 10º dos estatutos) e o valor da mesma correspondera aos direitos de cobranças de taxas, emolumentos e licenças que seriam devidos, nos termos dos regulamentos do município ..., embora ainda não tenha sido emitido qualquer documento definitivo por parte deste município, o que leva a que a prestação acessória de capital ainda não tenha sido realizada, mantendo-se o valor da mesma na conta 26418. Face ao descrito, esta prestação acessória de capital será realizada em espécie (taxas, emolumentos e licenças), compreendendo a cedência (tácita) de áreas pertencentes ao domínio público, que foram e que irão ser sujeitas às referidas obras de requalificação urbana sem que a "A...., SA" proceda ao pagamento das taxas, emolumentos e licenças que seriam normalmente devidas pela ocupação daqueles espaços. 1.2. Conclusão As disposições relacionadas com os requisitos do direito à dedução, estão previstas, a nível comunitário, nos artigos 17º a 20º da Sexta Diretiva (atualmente artigos 167º a 192º da Diretiva 2006/12/CE do Concelho de 28 de novembro, e a nível nacional nos artigos 19º a 25º do CIVA. O n.º 1 do art. 19º do CIVA, define o âmbito do direito à dedução – direito creditório de natureza pessoal -, que em termos gerais corresponde à totalidade do imposto suportado nas operações tributáveis realizadas a montante da sua atividade. O art. 20º do CIVA, acrescenta porém que só pode ser deduzido o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços por si adquiridos e que sejam utilizados para efeitos das próprias operações tributáveis, ou de certas operações que ainda que isentas de imposto se encontram expressamente elencadas nas subalíneas i) a iv) da alínea b) do seu n.º 1. A interpretação conjugada destas duas normas, permite afirmar que em termos legislativos, se estabelece de facto uma causalidade entre operações “a montante” e as operações “a jusante” realizadas pelo sujeito passivo e que só pode ser deduzido imposto suportado para a realização das operações nas quais liquida imposto ou nas que sem liquidação de imposto, estão expressamente excetuadas na alínea b) do n.º 1 do art. 20º do CIVA, e por remissão, no n.º 2 do art. 19º do RITI. Face ao exposto, em sede de IVA, concluiu-se que as designadas obras de requalificação urbana e considerando o seu destino económico, não possibilitam ao sujeito passivo, deduzir o IVA suportado com as mesmas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 20º do CIVA. Estas operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público, que são (bens) propriedade dos municípios e, não se destinam à produção de bens e serviços tributados, pelo que não cumprem os requisitos da referida norma. A não ser assim, permitir-se-ia que bens ou serviços não destinados a operações tributáveis ficassem desonerados de qualquer imposto ficando prejudicada a característica de neutralidade do IVA. A Jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades permite, concluir que a dedução do imposto suportado “a montante”, está diretamente relacionado com as operações que sejam tributadas “a jusante”, e que sendo caso disso, a entrega de bens de investimento durante o período de ajustamento pode dar lugar ao ajustamento da dedução nas condições previstas no n.º 3 do art. 20º da Sexta Diretiva (atualmente § 1º do art. 188º da Diretiva 2006/12/CE de 28 de novembro). Esta norma encontra-se transposta para o ordenamento jurídico interno, no art. 24º do CIVA. O desrespeito peio exposto, permitiria defraudar o mecanismo de funcionamento do imposto, bastando para isso que se adquirisse o bem destinado a uma atividade tributada, com a consequente dedução sendo de seguida afeto a uma atividade não tributada, que não confere direito à dedução. Apesar da alteração legislativa produzida ao nível das bases de concessão do Sistema de Metro Ligeiro da Área Metropolitana do ... pelo Decreto-Lei n.º 192/2008 de 1 de outubro nos 2 e 3 da Base XIII – diferenciando os conceitos de requalificação urbana (nº 2) e inserção urbana (ri'' 3), a sociedade "A...., SA" continuou a registar contabilisticamente todas os documentos com o descritivo “Inserção Urbana”, após Outubro de 2008, nas subcontas do ativo fixo (classe 4) com a mesma designação, mantendo o mesmo procedimento contabilístico que vinha a ser praticado nos períodos de imposto anteriores à referida alteração legislativa. Este procedimento por parte da empresa "A...., SA", revela que, apesar da alteração legislativa produzida pelo nº 2 e nº 3 da Base XIII das bases de concessão, a mesma não alterou o seu procedimento contabilísticos relativamente aos documentos (faturas) com o descritivo “Inserção Urbana”, continuando a associar a designação “Inserção Urbana” a obras de Requalificação Urbana, único conceito utilizado em termos legislativos ao nível da Base XIII das bases de concessão na redação dada pelo Decreto-Lei nº 261/2001 de 26 de setembro. Verifica-se assim, que os custos associados às obras indispensáveis à operacionalidade do Sistema Metro Ligeiro da Área Metropolitana do ..., tal como eram contabilizados até à entrada em vigor Decreto-Lei na 192/2008 de 1 de outubro, continuaram após aquela data a ser registados contabilisticamente na subconta do ativo fixo com a designação 'Sistema'. Desta forma, relativamente aos custos suportados pela empresa "A...., SA" no âmbito da construção do Sistema de Metro Ligeiro, a Autoridade Tributária apenas desconsiderou o IVA dedutível associado às obras de requalificação urbana, não pondo em causa a dedutibilidade do restante IVA suportada com as obras indispensáveis à operacionalidade do Sistema de Metro Ligeiro (Construção da Via, Estações, Semaforizaçâo da Linha, Iluminação da Linha, Catenárias, Sistema de Deteção de Incêndio, outras), as quais assumem o peso mais significativo no total da obra, e que traduzem o conceito de “Inserção Urbana” referido no nº 3 da Base XIII das Bases de Concessão de acordo com redação do Decreto-Lei nº 192/2008 de 1 de outubro. No período em apreço (2011.12), e no que respeita à obra “Construção do Prolongamento da Linha ... a ..., incluindo o Interface na ...” com o custo registado neste perlado de € 1,706.341,33, suportado em faturas emitidas pelas empresas “L...., SA” (50%) e “P...., SA” (50%), e à obra “Construção da Linha de ... Troço Estádio ... – ...”, com o custo registado neste período de € 1.851,830,39 suportado com base em faturas emitidas pela entidade "G...", "E...", apenas 0,9% (€ 14.554,31) na primeira obra e 7,4% (€ 136.403,48) na segunda obra estão relacionados com obras de requalificação urbana (designação documental “inserção urbana”), tendo sido aceite pela Autoridade Tributária dedutibilidade do IVA dos restantes 99,1% (€ 1.691.787,02) e 92,6% (€ 1.715.426,91), respetivamente das referidas obras: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Pelo exposto conclui-se que o imposto suportado com os encargos associados às obras de requalificação urbana, executadas em bens de domínio público, efetuadas pela "A...., SA", não confere direito ã dedução de acordo com o estabelecido no art. 20º do CIVA. 1.3. Correções propostas Nestes termos e relativamente aos valores de imposto indevidamente deduzido, num total de € 53,836,89 (dezembro de 2011), conforme documento que se junta e que constitui o anexo 1, em que são identificados os documentos emitidos em nome do sujeito passivo, que associados a obras de requalificação/inserção urbana geram correções (IVA indevidamente deduzido – campos 20 e 24 da declaração periódica de IVA do período 11.12 e IVA indevidamente liquidado – campo 41 da declaração periódica de IVA do período 11.12). Após visualização dos registos efetuados nas contas de investimentos em curso (454 – Ativos Intangíveis em Curso) e dos respetivos documentos de suporte, associados às obras de requalificação urbana, foram identificados os documentos e respetivos lançamentos que geraram imposto dedutível. Através da identificação dos registos contabilísticos dos lançamentos efetuados, foram os mesmos identificados nas respetivas contas de IVA dedutível (2432), o que permitiu o apuramento dos valores de imposto deduzido e liquidado nos documentos associados a obras de requalificação urbana, e incluídos nos campos 20/24 (período 11.12) e 41 (período 11.12) da respetiva declaração periódica de IVA. O controlo efetuado permitiu uma identificação adicional de outros documentos, que não tendo sido contabilizados na conta 454 – Ativos Intangíveis em Curso, se verificou estarem igualmente associados a obras de requalificação urbana. Os valores de imposto mencionados nestes documentos foram incluídos no campo 24 da declaração periódica de IVA do período 11.12. [Imagem que aqui se dá por reproduzida]» 2.2. De direito O Tribunal a quo julgou procedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IVA, referente ao período de tributação de 2011, acrescida de juros compensatório, no montante global de €54.320,68, determinando, a restituição do indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios. Para tanto, considerou, em síntese, que o IVA dedutível, inscrito na contabilidade, decorre de despesas que estão directamente conexionadas com a actividade da Impugnante, necessárias à sua actividade de prestadora de serviço de transporte público gerador de imposto e não isento e, como tal o IVA liquidado nessas facturas é dedutível, pelo que as correções em apreço não se mostram justificadas. Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Ab initio, importa referir que não tendo a Recorrente dirigido impugnação quanto ao decidido sobre os juros indemnizatório determinados pelo Tribunal a quo, a manter-se a decisão no mais, os mesmos encontram-se firmados na ordem jurídica, constituindo caso julgado, fora do objecto do presente recurso. Assim, face ao supra aludido, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença padece de erro de julgamento de facto, errónea valoração dos facto e subsequente aplicação do direito, competindo, para o efeito, analisar se, in casu, o Tribunal a quo fez errada aplicação do direito, maxime do regime legal do direito à dedução do IVA dos sujeitos passivos, estatuído no artigo 20. º, n.º 1 al. a) do CIVA. 2.2.1. Da impugnação da matéria de facto Prevendo acerca da modificabilidade da decisão de facto, consagra o artigo 662º do CPC os poderes vinculados deste Tribunal ad quem, estatuindo que: “1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. 2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento; b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova; c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta; d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”. Para que tal conhecimento se consuma, deve previamente o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus a seu cargo plasmado no artigo 640º do mesmo diploma, o qual dispõe que: “1 -Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”. Vem a Recorrente alegar que a douta sentença selecionou de modo insuficiente a factualidade evidenciada da prova produzida, pelo que em complemento da factualidade assente, por se encontrarem comprovados nos autos e se reputar essenciais à boa decisão da causa ao abrigo do artigo 662º do CPC, devem ser dados como provados os factos seguintes (vide corpo das alegações pontos 9. a 11 e conclusões E, F e G): «A.1. A base tributável em IVA das facturas a que se referem as operações aludidas nos pontos A.i. a A.vi. da factualidade supra descrita que se refere a “obras de requalificação urbana” foi inscrita em contas de investimentos em activos tangíveis fixos em curso (454) da impugnante, e o correspondente IVA considerado dedutível inscrito nas respetivas contas de IVA dedutível (2432) – cfr. identificação constante de pág.s 7 a 9 do Relatório de Inspeção Tributária dos documentos relativos às operações indicadas nos pontos A.i. a A.vi. da factualidade supra descrita que mencionam o IIVA cuja dedução foi corrigida; facto não contrariado pela impugnante; A.2. As obras a que se referem os pontos A.i. a A.vi. da factualidade supra descrita foram tratadas e registadas pela impugnante sem distinguir se de “obras de requalificação urbana” ou se de “obras de inserção urbana” se tratavam, e com indiferença em relação à redação dada à base XIII das bases da concessão e ao art. 10º dos estatutos pelo DL 192/2008, de 01.10, após a qual continuou a usar ambas as expressões em sinonímia – cfr. pág.s 7 do Relatório de Inspeção Tributárias relativo a cada período, corroborado e pontos 39., 41. da PI; A.3 O financiamento das obras a que se referem os pontos A.i. a A.vi. da factualidade supra descrita, indiferenciadamente tratadas pela impugnante como obras de “requalificação”, “inserção” ou “compatibilização” urbanas, estava atribuída, por força da base XIII das bases da concessão do art. 10º dos estatutos, mesmo após a redação dada pelo DL 192/2008, de 01.10, aos municípios da área metropolitana do ... associados na impugnante – cfr. base XIII das bases da concessão, na redação dada pelo DL 192/2008, de 01.10; A.4 O valor das tarifas a cobrar aos clientes do sistema de metro ligeiro é fixado atendendo ao índice de preços dos vários serviços de transporte coletivo praticados na área metropolitana do ..., dependendo de prévia homologação pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestre, IP - base XIV das bases da concessão e art. 10º dos estatutos, na redação dada pelo DL 192/2008, de 01.10.» No caso sub judice, a Recorrente (ATA) deu cumprimento ao preceituado no supra referido artigo 640º, nº. 2, alínea a) e b), do CPC, indicando os “factos” que pretende ver aditados e indicando os respectivos meios probatórios (menção expressa no fim de cada texto que pretende ver aditado), pelo que nada obsta a que o presente Tribunal proceda à reapreciação da matéria factual fixada, realizando a devida ponderação e reapreciação da indicada prova (RIT e PI), bem como análise substancial e pertinência dos aditamentos peticionado à luz dos factos que integram a decisão sob recurso e as questões resolvidas objecto do recurso sindicadas. Antecipe-se que carece de razão a Recorrente ao avocar erro de julgamento da matéria de facto fixada por insuficiência, pois consideramos que parte do pretendido sob o ponto A.1 e A.2 se mostra sanado por via do aditamento oficioso operado (densificação do excerto parcial do RIT) e, no demais estamos notoriamente perante factos conclusivos ou de direito e que como tal, os mesmos, não podem ser reconduzidos ao probatório. Vejamos: Como é pacífico, além das afirmações de direito, também as conclusões (ou juízos conclusivos) não são factos: trata-se de matéria equiparável a matéria de direito, pelo que também se trata de alegações que são insusceptíveis de constar na decisão que venha a ser proferida sobre a matéria de facto em discussão numa determinada acção. “Os factos conclusivos são aqueles que encerram um juízo ou conclusão, contendo, desde logo em si mesmos a decisão da própria causa ou, visto de outro modo, se tais factos forem considerados provados ou não provados, toda a acção seria resolvida (em termos de procedência ou improcedência), com base nessa única resposta”. Por outro lado, “quando se fala em matéria de direito, estamos a referirmo-nos aos conceitos estritamente jurídicos que não têm qualquer sentido corrente… tem sido entendido que podem ser consideradas matéria de facto expressões que são utilizadas simultaneamente em sentido corrente e jurídico, a não ser que face à natureza da acção, seja precisamente esse o objecto da disputa ou controvérsia entre as partes e dele dependa a resolução das questões jurídicas que no processo de discutem, constituindo nessa medida o objecto da própria decisão final da causa” [Helena Cabrita, in “A fundamentação de facto e de direito da decisão cível”, págs. 106, 110 e 111]. É certo que hoje não existe já nenhum normativo correspondente ao vetusto artigo 646º, n.º 4 do CPC que determinava terem-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito, a que se aplicava, por analogia, à matéria conclusiva. Com efeito, como se retirava interpretativamente daquele preceito (“têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”) o direito aplicar-se-á a um conjunto de factos (confessados, aceites, documentados ou resultado das respostas à base instrutória) que não tenham a natureza de questões de direito e que sejam realidades demonstráveis e não juízos valorativos. Tal preceito foi eliminado com o novo Código de Processo Civil. No entanto, o princípio subjacente ao preceito não desapareceu, continuando hoje a vincar-se que, na fundamentação (de facto) da sentença, só os factos interessam. Veja-se, nesse sentido, o artigo 607º, nº 4 do CPC que continua a referir que “Na fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que foram admitidos por acordo, provados por documento ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou pelas regras de experiência”. Ou seja, antes como agora, a fundamentação (de facto) da decisão (sentença ou acórdão) só pode ser integrada por factos. “Pode afirmar-se, em sentido muito simplificador, que uma conclusão implica um juízo sobre factos e estes, quando em si mesmos considerados, revelam uma realidade, compreensível e detectável sem necessidade de qualquer acréscimo dedutivo” – cf. acórdão da Relação do Porto de 07.10.2013, proferido nos autos 488/08.1TBVPA. No mesmo sentido, refere o acórdão da Relação de Guimarães de 11.10.2018, proferido no âmbito do processo n.º 616/16.3T8VNF-D: “De resto, ainda que o actual CPC não inclua uma disposição legal com o conteúdo do artº 646º n.º 4 do pretérito CPC (o qual considerava não escritas as respostas sobre matéria de direito), é todavia nossa convicção que tal não permite concluir que pode agora o juiz incluir no elenco dos factos provados meros conceitos de direito e/ou conclusões normativas, e as quais, a priori e antecipada e comodamente, acabem por condicionar e traçar desde logo o desfecho da acção ou incidente, resolvendo de imediato o “thema decidendum”. Ou seja, continua para nós a ser válido o entendimento de que o que importa é que a decisão de direito venha a ser resolvida no momento adequado, e tendo ela por base e objecto a realidade concreta apurada - factos concretos - e revelada nos autos por via da instrução, sendo então e de seguida - após aquela fixada - os subjacentes factos concretos objecto de valoração jurídica”. No apelo ao defendido por Castanheira Neves [in Matéria de Facto-Matéria de Direito», RLJ, Ano 129, pp.162-165], “existe, contudo, um continuum entre matéria de facto e matéria de direito e não uma oposição absoluta entre ambos os conceitos, pois na concreta aplicação do direito acaba por verificar-se uma correlatividade entre ambos os elementos”, mais acrescenta que urge partir “da unidade do caso jurídico decidendo e dos problemas jurídicos por si colocados, devendo distinguir-se dois tipos de questões: uma que se refere aos dados pressupostos pelo problema concreto – questão de facto – e outra que tem a ver com o fundamento e o critério do juízo e com o próprio e concreto juízo decisório – questão de direito. Na matéria de facto concorrem não apenas dados empíricos, mas todos os pressupostos objectivos do problema colocado, por exemplo, elementos sócio-culturais e até jurídicos” [idem, pág. 166 e 167]. Prossegue o distinto mestre, que “a tradição do nosso pensamento jurídico, no seguimento de Alberto dos Reis, considera que a actividade do juiz se circunscreve ao apuramento dos factos materiais, devendo evitar que no questionário entrem noções, fórmulas, categorias ou conceitos jurídicos, inserindo, apenas, nos quesitos e na matéria de facto assente, factos materiais e concretos”, afirmando que “tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é actividade estranha e superior à simples actividade instrutória” [idem, pág.212] ; Para Teixeira de Sousa [in Estudos sobre o Processo Civil, 2.ª edição, Lex, Lisboa, 1997, p. 312], “a selecção da matéria de facto não pode conter qualquer apreciação de direito, isto é, qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica”. Defendendo Abrantes Geraldes [in Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, 2.ª edição, 1999, p. 147] deverem “ser erradicadas da condensação as alegações com conteúdo técnico-jurídico de cariz normativo ou conclusivo, a não ser que, porventura, tenham simultaneamente uma significação corrente e da qual não dependa a resolução das questões jurídicas que no processo se discutem”. Por fim, citando Lebre de Freitas [in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pp. 637-638], e convocando o entendimento doutrinário e jurisprudencial, “as respostas do julgador de facto sobre matéria qualificada como de direito consideram-se não escritas e que se equiparam às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados”. Ora, temos por líquido que a matéria de facto só deve integrar factos concretos e não formulações genéricas, de direito ou conclusivas, mormente quando, como iremos ver o caso, preencham, só por si, a hipótese legal, dispensando qualquer subsunção jurídica ou, dito de outro modo, traduzam uma afirmação ou uma valoração de facto que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objecto da acção, comportando uma resposta ou componente de resposta àquelas questões. Aqui chegados, importa, pois, reverter para o caso concreto e verificar se o aditamento que nos é proposto é constituído por matéria conclusiva ou que possa ser considerada como sendo matéria de direito, o que a ocorrer impede a sua recondução ao probatório. E, desde logo, quanto aos itens identificados pela Recorrente como A.3 e A.4, a inferência só pode ser de que estamos manifestamente perante “não factos”, se assim lhe podemos apelar, pois que a sua composição assenta em matéria de direito, e para tal asserção, basta atentarmos ao meio de prova identificado pela Recorrente para lograr a sua pretensão “... base XIII das bases da concessão, na redacção dada pelo DL 192/2008, 01.10.”. Tais “factos”, e como tais, são insusceptíveis de serem reconduzidos ao probatório, in casu, pois que as conclusões ali expressas de “O financiamento das obras.... estava atribuída, por força ... art. 10º dos estatutos, mesmo após a redacção dada pelo DL 192/2008, de 01.10, aos municípios” e “O valor das tarifas a cobrar aos clientes ... é fixado.... art.10º....”, decorrem directamente das bases da concessão, na redacção dada pelo DL 192/2008, 01.10., e a sua inserção contém em si questões jurídicas que definem a posição da Recorrente em sede de recurso. Pelo que, resta tão só o conteúdo dos pontos identificados pela Recorrente sob o item A.1 e A.2, sendo que ambos se reconduzem ao tratamento contabilístico dado pela Recorrida às facturas em questão, nomeadamente do seu tratamento indiferenciado como obras de requalificação, inserção ou compatibilização urbanas, nos termos em que foi relevado em sede de RIT, perante o aditamento oficioso por nós operado, para melhor compreensão da posição da ATA, dá-se por prejudicado o aditamento dos mesmos. Assim sendo, dá-se por prejudicado o aditamento do peticionado sob os itens A.1 e A.2 e, no mais, A.3 e A.4 improcedente o aditamento por extravasar o conceito de facto, o que se decide e consigna, dando-se por estabilizada a matéria de facto. 2.2.2. Do erro de julgamento de direito A "A...., SA" (Impugnante, ora recorrida) foi objecto de uma acção inspectiva em resultado da qual a ATA perante facturas emitidas relativas a diversas operações considerou não ser dedutível o IVA suportado por aquela, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA, uma vez que tais operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público que não se destinam à produção de bens e serviços tributados. Na sequência das liquidações emitidas, contra tal entendimento da ATA, a Recorrida apresentou a presente impugnação invocando estarem em causa “operações necessárias para que o sujeito passivo realize operações – prestação de serviços – sujeitas a imposto e dele não isentas”. Em relação ao objecto dos autos, foi a seguinte a decisão proferida pela 1.ª Instância, que aqui transcrevemos nos seus segmentos decisórios: «(...) Volvendo ao caso em apreço, importa apurar se existe uma relação directa e imediata entre as despesas correspondentes aos trabalhos de acompanhamento, concepção, construção e fiscalização acima elencados e as operações realizadas no exercício da actividade tributária da impugnante. Para o efeito, impõe-se atentar, antes de mais, nos estatutos da "A...., SA", aprovados pelo Decreto-Lei n.º 394 -A/98, de 15 de Dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 192/2008, de 01 de Outubro, cujo artigo 3.º dispõe que a sociedade tem como objecto principal a exploração, em regime de concessão atribuída pelo Estado, de um sistema de metro ligeiro, na área metropolitana do ..., para a prossecução do qual lhe incumbe especialmente a realização dos estudos, concepção, planeamento, projectos e construção das infra-estruturas necessárias à concretização do empreendimento, bem como o fornecimento de equipamentos e material circulante. Estão em causa despesas com os seguintes trabalhos realizados pela impugnante: i. Acompanhamento arqueológico de obras integradas na inserção urbana de linha de metro; ii. Construção e reposição de vias para circulação de pessoas e viaturas; iii. Eliminação de diversas passagens de nível que confrontavam com canal de metro e fiscalização desses trabalhos; iv. Implementação do sistema de metro (construção do canal e da estação) e integração urbanística do canal; v. Trabalhos de arquitectura e construção de via (canal ferroviário), arruamento e inerentes infra-estruturas. Atenta a descrição dos trabalhos e o objecto social da impugnante, facilmente se conclui que aqueles tiveram como fim último a salvaguarda das condições de circulação, operacionalidade e segurança do sistema de metro, estando intimamente relacionados com a respectiva concretização, a qual surge como incumbência especial da impugnante no âmbito da concessão em apreço. Na verdade, todos os trabalhos se relacionam com a execução do sistema de metro, seja ao nível da concepção e/ou construção (de arruamentos, vias rodoviárias, passagens pedonais superiores aos canais de metro), da protecção e segurança da circulação viária e pedonal ou da fiscalização da execução de todos estes trabalhos. Tais trabalhos são necessários – porque pressuposto e condição - à execução da linha de metro, inserindo-se mesmo no âmbito da actividade económica da impugnante que gera operações tributáveis, traduzida na exploração do sistema de metro ligeiro, pelo que a Administração Tributária claramente labora em erro ao afirmar que tais operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público que não se destinam à produção de bens e serviços tributados. Atento o exposto, o IVA suportado a montante com os trabalhos em causa pode ser deduzido a jusante no imposto liquidado nas operações económicas resultantes do exercício da actividade económica da impugnante (operações activas), com o que se impõe a anulação das liquidações de IVA impugnadas. Uma vez que se concluiu pela ilegalidade da liquidação de IVA, estamos perante erro gerador do pagamento de juros indemnizatórios. Assim, procede este pedido e, em consequência, reconhece-se o seu direito ao pagamento de juros indemnizatórios sobre a quantia paga correspondente às liquidações impugnadas, desde a data do pagamento do valor das liquidações em causa – ocorrido em 07.03.2013 – e até à emissão da respectiva nota de crédito, sendo a Fazenda Pública condenada no respectivo pagamento, à taxa legal, nos termos do disposto nos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT.» (fim de transcrição) A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, esgrimindo que a douta sentença valorou erroneamente a factualidade evidenciada da prova produzida no processo, da qual cumpria fazer a adequada qualificação jurídica, em termos que afectam irremediavelmente a validade substancial da sentença. Para tanto, argumenta que “... conforme o princípio que presidiu às correções aritméticas promovidas à matéria tributável em IVA dos períodos de tributação a que respeitam as liquidações impugnadas, o modo de financiamento das obras de requalificação determina a existência ou não do direito à dedução do IVA pago a montante inerente os encargos suportados com essas obras” sendo que “(A) jurisprudência comunitária tem repetidamente afirmado que, para que seja reconhecido ao sujeito passivo o direito à dedução do IVA pago a montante, é necessário que o montante dos encargos a que corresponde o IVA a deduzir tenha diretamente onerado o custo dos diversos elementos constitutivos do preço das operações a jusante sujeitas a imposto, de acordo com o princípio fundamental do sistema do IVA consagrado nos art.s 2º da Primeira e Sexta Diretivas e no art. 1º, nº2, 2º parág.º da Diretiva 2006/112/CE”, mais defende que “... em face do modo de financiamento das obras a que respeitam os encargos cujo correspondente IVA pretende deduzir e do seu registo contabilístico, pôs em causa, fundadamente, o direito a essa dedução, entre outros motivos, porque o custo das obras de requalificação urbana não era financiado pela impugnante, mas era, designadamente, responsabilidade dos municípios seus acionistas, a impugnante, por seu turno, nunca provou no processo sub judice que os encargos daquelas obras cujo correspondente IVA pretende deduzir são, ou por terem uma relação direta e imediata com as operações a jusante, ou como despesas gerais da sua atividade económica, elementos constitutivos do preço destas operações” e cumpre atentar que “... segundo a base XIII da concessão, as obras de requalificação urbana são asseguradas pelos municípios da área metropolitana do ... acionistas da impugnante através de prestações acessórias de capital” concluindo que “... a impugnante tem a faculdade de submeter os encargos com essas obras, e o correspondente IVA, ao financiamento obtido ou a obter desses acionistas, corrigindo os efeitos da livre operação da impugnante no mercado dos transportes, e sem que fique constituída na obrigação de reembolso, retirando-lhes a qualificação de custos da sua atividade económica” a que acresce que “o preço dos serviços prestados pela impugnante aos seus clientes é formado, segundo a base XIV, em que o valor das tarifas a cobrar aos clientes do sistema de metro ligeiro é fixado atendendo ao índice de preços dos vários serviços de transporte coletivo praticados na área metropolitana do ..., dependendo de prévia homologação pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestre, IP, põe em evidência que o preço cobrado não é, a priori, formado pelos encargos a montante com relação direta e imediata com uma ou várias operações a jusante que conferem direito à dedução, nem pelas despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade.” Em suma, se bem percecionamos as alegações e conclusões da Recorrente, resolvida a insuficiência de selecção da matéria de facto sanada, podemos sintetizar o erro de julgamento em três segmentos, a saber, (i) da negação da influência do modo de financiamento das obras sobre o direito à dedução do IVA, (ii) reconhecer o direito à dedução do IVA relativo a encargos das obras de requalificação urbana ou de inserção urbana que não fazem parte dos elementos constitutivos do preço, que não são repassados aos destinatários das operações a jusante e não contribuem para a formação da base tributável do IVA liquidado pela impugnante, o que coloca em causa o princípio da neutralidade inerente aquele imposto e (iii) da falta de prova pela impugnante de que os encargos daquelas obras têm uma relação directa e imediata com as operações a jusante ou que são despesas gerais da sua actividade económica, pois não se repercutem no preço dos serviços que presta. Vejamos. De acordo com o relatório de inspeção tributária que esteve na base das liquidações impugnadas “... em sede de IVA, concluiu-se que as designadas obras de requalificação urbana e considerando o seu destino económico, não possibilitam ao sujeito passivo deduzir o IVA suportado com as mesmas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 20º do CIVA. Estas operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público, que são (bens) propriedade dos municípios e, não se destinam à produção de bens e serviços tributados, pelo que não cumprem os requisitos da referida norma. A não ser assim, permitir-se-ia que bens ou serviços não destinados a operações tributáveis ficassem desonerados de qualquer imposto ficando prejudicada a característica de neutralidade do IVA. (...) Pelo exposto, conclui-se que o imposto suportado com os encargos associados às obras de requalificação urbana, executadas em bens do domínio público, efectuadas pela "A...., SA", não confere direito à dedução de acordo com o estabelecido no art. 20º do CIVA.”. Cumpre, antes do mais, um breve enquadramento legal, enunciando as normas legais aplicáveis, doutrinais, e com mais impacto à jurisprudência do TJUE. O Código do IVA resulta da transposição, para a ordem jurídica interna, de diversas Directivas Comunitárias relativas à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devendo a interpretação da lei interna ser, neste domínio, convergente com os princípios e regras postulados na respectiva disciplina comunitária (cf., entre outras, a Directiva 2005/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, então em vigor). Sendo que a Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, dispõe, no n.º 2 do seu artigo 1.º, o seguinte: “O princípio do sistema comum do IVA consiste em aplicar aos bens e serviços um imposto geral sobre o consumo exactamente proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação. Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” Estamos perante um imposto plurifásico que onera as operações que se realizam ao longo da cadeia económica apenas na medida do valor que cada operador acrescenta aos bens e serviços, pelo que cada operador tem a faculdade de deduzir ao imposto que liquida nas suas vendas o imposto incorrido nas suas compras, entregando ao Estado apenas a diferença, quando o saldo seja positivo. Assim, o mecanismo do crédito de imposto e o encadeamento da liquidação-dedução visam assegurar a neutralidade típica do IVA, prevenindo o efeito cumulativo e garantindo que o imposto é suportado em definitivo pelo consumidor final. No essencial, a Directiva reconhece aos sujeitos passivos o direito de deduzir ao imposto liquidado num estado-membro o imposto que nesse mesmo estado tenham incorrido na aquisição de bens ou serviços, desde que estes se destinem à realização de operações tributadas ou de operações com isenção completa (neste sentido cfr. Sérgio Vasques, in “O Imposto Sobre o Valor Acrescentado”, Coimbra, Almedina, 2015, pág. 333 e ss.). Dispõe o artigo 1º, nº 1, do Código do IVA que estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado as transmissões de bens e as prestações de serviços, efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal, as operações intracomunitárias e as importações de bens. E, prescreve o artigo 19º, nº 1, do mesmo diploma, que “Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram: a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos; (...)”. E, com especial destaque in casu dispõe o art. 20.º, nº1 do CIVA, na redacção aplicável à data dos factos, que “Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes: a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas; (...)” Cumpre salientar que o direito à dedução do imposto consubstancia uma das principais características deste tributo, como resulta do principio fundamental inerente ao IVA constante do art.º 2.º da Primeira Directiva (67/227/CEE), que estabelece que “Em cada transacção, o imposto sobre o valor acrescentado, calculado sobre o preço do bem ou do serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto sobre o valor acrescentado que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” O regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA, devido ou pago, no âmbito de todas as suas actividades económicas. Assim o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado garante a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas actividades, na condição de as referidas actividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA (v., neste sentido, acórdãos de 26.05.2005, Kretztechnik, C 465/03, de 22.02.2001, processo C-408/98, de 14 de Fevereiro de 1985, Rompelman, 268/83, Recueil, p. 655, n.º 19; de 15 de Janeiro de 1998, Ghent Coal Terminal, C-37/95, Colect., p. I-1, n.º 15, e de 21 de Março de 2000, Gabalfrisa e o., C-110/98 a C-147/98, Colect., p. I-1577, n.º 44, assim como de 8 de Junho de 2000, Midlank Bank, C-98/98, Colect., p. I-4177, n.º 19). No que respeita ao direito de dedução a Jurisprudência do TJCE vem afirmando que “o direito à dedução previsto nos artigos 17. º e 20.º da Sexta Directiva faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. (…) Para que o IVA seja dedutível, as operações efectuadas a montante devem ter uma relação directa e imediata com as operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução.” –cf. Acórdão Kretztechnik (2005) – C.465/03 e Acórdão do TJUE, 2º secção de 08.06.2000, processo C-98/98. Advém deste princípio, bem como da regra nos termos da qual para dar direito à dedução os bens ou serviços adquiridos devem ter uma relação directa e imediata com as operações tributadas, que o direito à dedução do IVA, que onerou estes bens ou serviços, pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição devem ter feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas. Portanto, as referidas despesas devem fazer parte dos custos dessas operações a jusante que utilizam os bens e serviços adquiridos. Para efeito de dedução do imposto suportado a montante os bens e serviços adquiridos terão que estar directamente relacionados com o exercício da actividade tributária do sujeito passivo (cfr. neste sentido, Clotilde Celorico de Basto, in “Introdução ao IVA”, pág. 159 e Valente Torrão, in “CIVA anotado”, pág.126). E disso, nos dá nota o já referenciado Acórdão Kretztechnik, do TJCE no qual se considerou que o artigo 17.º, n.ºs 1 e 2, da Sexta Directiva confere “o direito à dedução da totalidade do IVA que onerou as despesas efectuadas por um sujeito passivo em relação às diferentes prestações que adquiriu no âmbito de uma emissão de acções, na medida em que a totalidade das operações efectuadas por esse sujeito passivo no âmbito da sua actividade económica seja constituído por operações tributadas”. Este Acórdão revela a importância do direito à dedução no sistema do IVA e como o TJUE interpreta essa importância, levando ao extremo a ideia de que a neutralidade do sistema exige que se liberte o empresário do ónus do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas actividades. O Tribunal, nesta e noutras decisões, mostra‐se hostil a limitações ao direito a deduzir o IVA a montante, que muitas vezes os Estados são tentados a introduzir, como bem sublinham José Xavier de Basto e Maria Odete Oliveira in “O direito à dedução do IVA nas sociedades holding”, em Fiscalidade n.º 6, página 8. Posição essa que sai reforçada, com os Acórdão do TJUE de 06.09.2012, proferido no processo n.º C-496/11 e o de 29.10.2009, AB SKF, proferido no processo n.º C-29/08, em que citando jurisprudência anterior do TJCE adoptada nos acórdãos Kretztechnik, n.º 36, Investrand, n.º24, vem admitindo também «um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo directo e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo». Recorrendo aos assertivos ensinamentos Mariana Gouveia de Oliveira (in “A dedutibilidade de IVA e a aquisição de participações sociais por sociedades operacionais”, em Fiscalidade, 46, pag.107.), que de modo analítico alude à coerência da jurisprudência do TJUE firma que a mesma assenta em algumas ideias fundamentais: «A primeira será que, o direito à dedução “faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante (v., designadamente, acórdãos de 6 de Julho de 1995, BP Soupergaz, C-62/93, C’olect., p. 1-1883, n.º 18, e de 2] de Março de 2000, Gabaifrisa e o., C’-]10/98 a C-147/98, Colect., p. 1-15 77, n.º 43).” A segunda ideia reporta-se à ligação necessária entre o IVA suportado e a realização de operações tributáveis: “Para que o IVA seja dedutível, as operações efectuadas a montante devem ter uma relação directa e imediata com as operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução (v. acórdãos já referidos Midland Bank, n. 030, e Abbey National, n.º 28, assim como de 27 de Setembro de 2001, Cibo Participations, C-16/00, Colect.. 1-6663, n.º 31).” Estamos assim aptos a afirmar, em conformidade com a jurisprudência do TJUE, que «as despesas gerais da actividade dos sujeitos passivos, enquanto elementos constitutivos do preço dos produtos, se encontram numa relação directa e imediata com o conjunto da actividade do sujeito passivo, sendo por isso, dedutível o IVA nelas suportado». Complementarmente, acresce uma breve referência à mais recente jurisprudência do TJUE, a qual mantém a linha do até aqui dissertado, de que «Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito à dedução do IVA, conforme previsto nos artigos 167.º e seguintes da Diretiva IVA, constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que oneraram as operações efetuadas a montante» (Acórdão do TJUE de 5 de julho de 2018, Marle Participations, C 320/17, n.º 24). E de que, «O regime das deduções visa desonerar inteiramente o empresário do encargo do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, consequentemente, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem elas próprias, em princípio, sujeitas ao IVA» (acórdão citado n.º 35). «Todavia, resulta do artigo 168.º, alínea a), da Diretiva IVA que, para poder beneficiar do direito à dedução, é necessário, por um lado, que o interessado seja um «sujeito passivo», na aceção desta diretiva, e, por outro, que os bens ou os serviços invocados para fundamentar esse direito sejam utilizados a jusante pelo sujeito passivo para os fins das suas próprias operações tributadas e que, a montante, esses bens sejam entregues ou esses serviços sejam prestados por outro sujeito passivo» (Acórdão (citado) n.º 26 e Acórdão de 19 de outubro de 2017, Paper Consult, C 101/16, n.º 39). Por sua vez, no âmbito do caso Portugal /Telecom Portugal, Processo n.º C-496/11, considerou também o TJUE que “36 Para o IVA ser dedutível, as operações efetuadas a montante devem apresentar um nexo direto e imediato com operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito a dedução do IVA que incide sobre a aquisição de bens ou de serviços a montante pressupõe que as despesas efetuadas com a sua aquisição façam parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução ((v. acórdão Cibo Participations, já referido, n. o 31; acórdãos de 26 de maio de 2005, Kretztechnik, C-465/03, Colet., p. I-4357, n. o 35, de 8 de fevereiro de 2007, Investrand, C-435/05, Colet., p. I-1315, n. o 23; e acórdãos, já referidos, Securenta, n. o 27, e SKF, n. o 57))”. Acrescentando que, “37 Porém, admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo (…) para conferir o direito a dedução previsto no artigo 17.o, n.o 2, da Sexta Diretiva, os bens ou os serviços devem apresentar um nexo direto e imediato com as operações a jusante com direito a dedução. A este respeito, é indiferente o objetivo último prosseguido pelo sujeito passivo (v. acórdãos de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C-98/98, Colet., p. I-4177, n. o 20, e de 22 de fevereiro de 2001, Abbey National, C-408/98, Colet., p. I-1361, n. o 25; e acórdão Cibo Participations, já referido, n. o 28).”. Muita e mais ampla jurisprudência do TJUE e, da ordem nacional que a aplica, podia aqui ser citada e parcialmente transcrita, mas cremos que o enquadramento efectuado já vai longo, pelo que aqui chegados importa apurar da 1ª questão colocada, se no caso em apreço, existe uma relação directa e imediata entre despesas com as prestações de serviços inerentes às facturas identificadas nos autos cuja dedução não foi aceite pela ATA. E, a resposta, é afirmativa, já que entendemos que neste ponto não assiste razão à Recorrente quando invoca que a Metro do ... não fez prova dessa relação. Vejamos: Temos por adquirido que a dedução do IVA correspondente às obras, estudos e projectos em questão obriga a que esse imposto conste de factura, documento equivalente ou de recibo do pagamento do IVA, processados sob a forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo, e o imposto tem que incidir sobre bens adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo com vista à realização das operações referidas no artigo 20º, nº 1 do CIVA, ou seja, operações que conferem o direito à dedução. Por outro lado, que a Administração Tributária não colocou em causa que toda a documentação relativa às obras colocadas em causa foi emitida em nome da Impugnante, encontra-se na sua posse, observou a forma legal, e não ocorre a exclusão estatuída no artigo 21º do CIVA, pelo que o que importa apurar é se as obras colocadas em causa podem qualificar-se como necessárias à actividade desenvolvida pela Impugnante, actividade relacionada com a prestação de serviço público de transporte, sujeita a imposto e não isenta. Para o efeito, impõe-se atentar, antes de mais, que o sistema de metro ligeiro na área metropolitano do ... foi instituído pelo Decreto-Lei nº 71/93, de 10 de março, e a exploração desse sistema foi atribuído á Impugnante, constituída sob a forma de uma sociedade anónima de capitais públicos pelo Decreto-Lei nº 394-A/98, de 15 de dezembro, que aprovou as bases da concessão de exploração, em regime de serviço público e de exclusividade. Refere-se no artigo 3º desse diploma que “A realização dos trabalhos e prestações relativas à concepção e realização do projecto, à realização das obras de construção, ao fornecimento e montagem do material circulante e dos demais equipamentos que constituem o sistema de metro, assim como à operação do mesmo por um período inicial, será regulada por um contrato a celebrar entre a "A...., SA", e uma entidade escolhida no âmbito de um concurso internacional realizado para o efeito.”. E, nas Bases de Concessão do Sistema de Metro concretiza-se, na Base I, nº 1, que “A concessão tem por objecto a exploração de um sistema de metro ligeiro na área metropolitana do ...”, e a Base II refere que a “concessionária tem como objecto e actividade principal a realização das prestações inerentes à concessão”, e pode ainda “exercer as seguintes actividades autónomas: a) Exploração comercial, directa ou indirecta, de estabelecimentos comerciais, escritórios, salas de exposições, máquinas de venda de produtos e serviços de publicidade aposta nas instalações ou no material circulante; (...).” Acresce ainda, que no artigo 3º dos estatutos da Impugnante consta que “a sociedade tem por objecto a exploração, em regime de concessão atribuída pelo Estado, de um sistema de metro ligeiro na área metropolitana do ..., nos termos do respectivo instrumento normativo” e “para a prossecução do seu objecto incumbe especialmente à sociedade a realização dos estudos, concepção, planeamento, projectos e construção das infra-estruturas necessárias à concretização do empreendimento, bem como o fornecimento de equipamentos e material circulante”, e para o desenvolvimento do seu objecto acessório pode “constituir empresas ou tomar participações noutras sociedades.”. Para tal a Impugnante celebrou um contrato para o projecto, construção, financiamento e operação inicial com o Agrupamento Complementar de Empresas designado N..., cuja minuta foi aprovada por Resolução do Conselho de Ministros nº 142-A/98, de 25 de Novembro, tendo-se procedido a alterações ao projecto inicial, em cumprimento de obrigações legais, no que respeita a segurança, acessibilidades, e para uma melhor inserção urbanística e compatibilização com outros modos de transporte (Decreto-Lei nº 261/2001, de 26 de Setembro). Assim sendo, para a concretização do seu objecto social a Impugnante está obrigada a realizar estudos, concepção, planeamento, projectos e construção das infra-estruturas necessárias ao bom funcionamento do sistema de metro, à melhoria da segurança do sistema e das acessibilidades, e a diligenciar pela sua inserção urbanística e compatibilização com outros modos de transporte, obrigações que decorrem directamente dos seus estatutos e das Bases de Concessão da Exploração do Metro e do cumprimento de legislação nacional e comunitária. É, do senso comum e do conhecimento dos utilizadores e cidadãos da zona Metropolitana do ..., que para levar cabo a prestação de serviço público de transporte pela Impugnante, e a expansão das suas linhas de metro, o mesmo exige diversos e múltiplos trabalhos de implementação conexos com a construção principal levada a cabo, estações áreas e/ou subterrâneas, colocação de linhas à superfície ou em tuneis previamente construídos para o efeito, falamos de obras de elevada envergadura com implicações profundas na reorganização de espaços à superfície ou ao longo das linhas e seus acessos. Paralelamente a estas cumpre atentar aos demais equipamentos urbanos, as necessidades e anseios das populações, pela melhoria das acessibilidades por pessoas e viaturas e segurança do sistema. O sistema de metro urbano, como o decorre do mesmo insere-se em zonas populacionais e nevrálgicas da cidade, a qual já se encontrava dotada de determinadas infra-estruturas (passeios, ruas, praças, jardins, , redes de água, gás, saneamento e electricidade) que durante a construção do sistema vão sofrendo vicissitudes várias, que passam mesmo pela sua destruição muitas da vezes, que determinam a sua construção, reconstrução, requalificação, pelo que a Impugnante foi forçada prever os danos e a reparar os mesmos com as inerentes obras de reposição e reconstrução, necessariamente ligadas à sua actividade de transporte de passageiros. Sendo que algumas obras, que estão na base da contenda se justificam por razões de reposição da situação, salvaguarda de património existente e por razões de segurança, directamente determinadas pela lei, ou têm em vista garantir a competitividade do transporte de metro e assegurar a sua compatibilização com os demais meios de transporte. Ciente destes considerandos, cumpre atentar às obras e projectos constantes das facturas colocadas em causa pela Administração Tributária. Ora da descrição dos trabalhos é manifesto que os mesmos se integram no objecto social da Recorrida, encontram-se previstos nos pertinentes preceitos estatutários e nas Bases da Concessão mencionados, e mais do que necessárias têm de ser qualificadas como imprescindíveis à concretização da actividade da "A...., SA"., sendo que a maioria decorre do estrito cumprimento do preceituado ou surgem como uma actividade prévia ao transporte de passageiros e imprescindível a essa actividade, como ocorre com os trabalhos de acompanhamento arqueológico de obras integradas na inserção urbana de linha de metro; construção e reposição de vias para circulação de pessoas e viaturas; eliminação de diversas passagens de nível que confrontavam com canal de metro e fiscalização desses trabalhos; implementação do sistema de metro (construção do canal e da estação) e integração urbanística do canal; trabalhos de arquitectura e construção de via (canal ferroviário), arruamento e inerentes infra-estruturas, aludidas e identificadas no item A. do probatório. Como bem refere o tribunal a quo «(...) facilmente se conclui que aqueles tiveram como fim último a salvaguarda das condições de circulação, operacionalidade e segurança do sistema de metro, estando intimamente relacionados com a respectiva concretização, a qual surge como incumbência especial da impugnante no âmbito da concessão em apreço. Na verdade, todos os trabalhos se relacionam com a execução do sistema de metro, seja ao nível da concepção e/ou construção (de arruamentos, vias rodoviárias, passagens pedonais superiores aos canais de metro), da protecção e segurança da circulação viária e pedonal ou da fiscalização da execução de todos estes trabalhos. Tais trabalhos são necessários – porque pressuposto e condição - à execução da linha de metro, inserindo-se mesmo no âmbito da actividade económica da impugnante que gera operações tributáveis, traduzida na exploração do sistema de metro ligeiro, pelo que a Administração Tributária claramente labora em erro ao afirmar que tais operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público que não se destinam à produção de bens e serviços tributados.» Posto isto, atenhamo-nos ao alegado pela Recorrente, de que por errónea apreciação da prova, o tribunal a quo errou no seu julgamento, pois segundo ele “a impugnante, por seu turno, nunca provou no processo sub judice que os encargos daquelas obras cujo correspondente IVA pretende deduzir são, ou por terem uma relação direta e imediata com as operações a jusante, ou como despesas gerais da sua atividade económica, elementos constitutivos do preço destas operações.” (vide conclusão L.) Falece tal argumento, conscientes de que a factualidade apurada não sofreu alterações em sede recursória, não alcançamos nesta sede qualquer errónea apreciação da prova, pois como bem refere a Recorrente nas suas Conclusões I. e J. ao citar jurisprudência comunitária, nomeadamente o Acórdão SKF, proferido no processo C-29/98, do TJUE “... há sempre que examinar se a relação direta e imediata com uma ou várias operações a jusante que conferem direito à dedução ou com as despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade económica do sujeito passivo traduz-se na incorporação do preço das prestações a montante, respetivamente, nos preços das operações particulares a jusante ou nos preços dos bens ou serviços fornecidos pelo sujeito passivo no âmbito das suas atividades económicas.”. Ora, foi precisamente no âmbito dessa incumbência que lhe está adstrita, que o tribunal de 1ª instância levou a cabo de modo eficiente, que torna as asserções a que o mesmo chegou incólumes. Assim, aqui, como ali, atento o supra exposto, somos convictos em afirmar que a aquisição de serviços destinados a realização daquelas obras, dos inerentes projectos, reconstrução e requalificação decorrentes da obrigação de preservação arqueológica e arquitectónica de espaços e sua reposição aptos ao funcionamento do sistema de metro, é que a construção do sistema de metro obrigou ao “esventramento de solos e destruição de equipamentos urbanos”, que teve de reconstruir: (i) com a qualidade ambiental e dignidade arquitectónica compatíveis com a infra-estrutura do metro e ligado à sua envolvente urbana (obras de inserção ou de compatibilização urbana e preservação arqueológica), (ii) a fim de garantir a adequada acessibilidade e segurança aos seus utilizadores e aos outros meios de transporte, e (iii) adequar as funcionalidades urbanas à superfície, aéreas e subterrâneas (saneamento básico, redes de energia eléctrica, gás e telecomunicações, arruamentos), são necessários – porque pressuposto e condição - à execução das linhas de metro, inserindo-se mesmo no âmbito da actividade económica da impugnante que gera operações tributáveis, traduzidas na exploração do sistema de metro ligeiro. Consequentemente, todos os trabalhos identificados se relacionam com a execução do sistema de metro do ..., seja ao nível da concepção e/ou construção, da protecção e segurança da circulação viária e pedonal ou da fiscalização e execução de todos estes trabalhos. Só pode concluir-se que as obras em causa estão directamente conexionadas com a actividade da Impugnante, são necessárias à sua actividade de prestadora de serviço de transporte público geradora de imposto e não isenta. Ora, como decorre da jurisprudência do TJUE supra citada, deverá ser admitida a dedutibilidade do IVA suportado nos inputs sempre que estes se encontrem numa relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo e sejam elementos constitutivos dos preços dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Improcede assim a tese da Administração Tributária, no sentido de que tais operações estão associadas a obras realizadas em bens do domínio público que não se destinam à produção de bens e serviços tributados existindo entre tais custos e o IVA com eles suportados, uma relação directa e imediata com o conjunto daquela sua actividade económica, na acepção da jurisprudência do TJUE por nós mencionada. Mas, a ATA assenta, como delimitamos supra, o seu inconformismo na relevância de dois vectores, um quanto ao financiamento de tais obras e a possibilidade que decorre para a Recorrida de lograr o pagamento dos mesmos por parte dos Municípios e, um outro, que se centra no modo legalmente previsto para fixação dos preços dos serviços que presta o qual por si destrói o princípio da neutralidade inerente ao IVA. Perscrutada a sentença recorrida constata-se que a mesma não se pronunciou sobre a questão do financiamento da obra, assim sendo, e não tendo sido suscitada a nulidade da mesma por omissão de pronúncia não cumpre a este tribunal ad quem apreciar e decidir. No entanto sempre as mesmas teriam a mesma sorte que avançamos em recente acórdão deste colectivo (em que figuramos como relatora) de 15.12.2022, proferido no processo n. º 3570/11.4BEPRT, que por razões de economia limitamos aqui a referência ao ponto do sumário sobre tal questão: IV. Não são pertinentes para a determinação do direito a dedução do IVA pelo sujeito passivo as operações em questão terem sido realizadas em domínio público e possam ter sido alvo de financiamento pelos Municípios que dessas operações possam ter beneficiado. Quanto ao preço, o mesmo surge nesta sede recursória como “questão nova” não levada em linha de conta na sentença sob recurso. Perscrutada por nós a contestação da ATA verificamos que a sua defesa se estribou em duas vertentes, a saber, que as obras em causa foram realizadas em bens do domínio público, propriedade dos Municípios, e, portanto, não se destinam à produção de bens e serviços tributados pois revestem uma natureza distinta das obras de construção da infra-estrutura básica do metro, se aquelas obras fossem realizadas pelos Municípios não estariam sujeitas a IVA, dada a isenção de que os mesmos beneficiam, pelo aquele IVA não poderia ser deduzido, e a permitir-se que bens não destinados a operações tributáveis fiquem desonerados de qualquer imposto fica prejudicada a característica da neutralidade do IVA. Acresce que, que o modum e o quatum dos preços dos serviços que o "A...., SA" presta ao consumidor final não foram a par do financiamento alvo de objecto da decisão aqui posta em crise. Assim sendo, sobre este Tribunal ad quem, não recai a obrigação de pronúncia sobre tal questão que aqui se apresenta como questão nova. No entanto, em jeito de foice, veiculamos que em recente Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso tributário de 04.11.2020, proferido em sede de oposição de acórdãos, [em que no acórdão recorrido, que contrapunha a N - Concessionária para a Travessia do ..., S.A. e a ATA, fora determinado que a recorrente não tinha direito a dedução do IVA suportado a montante com as “operações acessórias - acessos indirectos” à Ponte ..., uma vez que não constituem operações realizadas pela N tendo em vista o exercício directo da sua actividade económica consistente na cobrança de portagens pela passagem de veículos na Ponte ..., antes correspondem ao cumprimento de obrigações resultantes do contrato de concessão, não apresentando qualquer nexo de indispensabilidade com a mencionada actividade] se decidiu: «(a)través da concessão, o Estado português não se limitava a querer um atravessamento de um rio, feito de qualquer maneira, queria antes um projecto integrado, que preservasse o ambiente, que se integrasse na paisagem, que respeitasse, em suma, valores que ao Estado compete defender, impondo, por isso ao concessionário, a realização de um conjunto de obras na zona envolvente da Ponte, para além da construção do tabuleiro da Ponte e dos seus acessos principais, o que significa que, afinal, as tais obras ditas acessórias são tão indispensáveis afinal à realização do projecto como as obras de construção do tabuleiro da ponte e seus acessos principais, por serem encargos obrigatórios, previstos no contrato de concessão, sendo impensável que o custo das referidas obras não será repercutido no preço das prestações de serviços, ou seja, nas portagens cobradas na Ponte, ou seja, se as obras em causa não tivessem sido exigidas à concessionária, seguramente que os custos de construção teriam sido mais baixos e mais baixas seriam as portagens. Nesta sequência, diga-se que para que se verifique o direito à dedução do IVA não se exige uma correspondência estrita entre inputs e outputs, mas sim que as despesas a montante tenham uma relação directa com as despesas gerais da empresa, sendo que a agora Recorrente tem como objecto social a concessão da concepção, construção, financiamento e operação e manutenção da Ponte .... (...) Este é o critério a que o TJUE atende para estabelecer o nexo directo entre as operações efectuadas a montante e as operações a jusante com direito à dedução, tal como emerge do Acórdão Kretztechnik (Proc. C-465/03, de 26 de Maio de 2005, § 35) onde se pode ler: “ ... para que o IVA seja dedutível, as operações efectuadas a montante devem ter uma relação directa e imediata com as operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução”. No caso em apreciação inexiste actividade isenta de IVA ou fora do campo de aplicação do imposto e verifica-se um nexo directo entre os custos das obras acessórias - acessos indirectos e as operações tributáveis da recorrente, o que significa que a agora Recorrente tem direito à dedução do IVA suportado com as operações acessórias - acessos indirectos. Aliás, não é por acaso, tal como a agora Recorrente dá nota, que a própria AT decidiu em sentido favorável à N o recurso hierárquico apresentado em 2003, pelo que toca ao seu direito a deduzir o IVA suportado nas despesas que a administração havia antes considerado como não dedutível, louvando-se, entre outras considerações, em um parecer de Centro de Estudos Fiscais e Aduaneiros, proferido em caso em tudo semelhante, concluiu que o imposto suportado com a construção das obras acessórias é dedutível, porque as despesas em causa foram incorridas no âmbito da sua actividade económica, inteiramente sujeita ao imposto, tendo determinado a anulação das liquidações adicionais referentes aos anos de 1996, 1997 e 1998. No aludido parecer, refere-se, além do mais, que: “… - A “reversão para o domínio público” de “ramais” de ligação de determinadas infraestruturas à “rede pública” não constitui, em si mesma, por falta de “autonomia económica ou jurídica”, uma operação a jusante da atividade das empresas, suscetível de tributação em IVA, mas antes uma condição gratuita e inseparável das operações que tais empresas se propõem realizar. - Assim, os respetivos custos de construção dos “ramais”, bom como os demais gastos incorridos nesse âmbito, concorrem para a formação do preço final dos bens e serviços comercializados, não se verificando uma “afectação permanente de bens da empresa, ... a fins alheios à mesma”, nem qualquer outra forma de “transmissão gratuita” suscetível de enquadramento na alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do IVA; Por outro lado, sendo esses gastos suportados, indispensáveis à realização das operações tributáveis das empresas, constituem um consumo intermédio que concorre para a formação do preço final dos bens e serviços comercializados, pelo que o IVA suportado com esses gastos é. dedutível, nos termos do artigo 19.º e 20.º do Código do IVA. … No presente caso, os trabalhos, bem como as expropriações, que estão em causa foram realizados, pela Recorrente, no exercício da sua atividade sujeita a IVA e dele não isenta, que se consubstanciava, exclusivamente, na execução do contrato de concessão da conceção, construção, financiamento, operação e manutenção da Ponte ..., incluindo a gestão e manutenção da Ponte 25 de Abril. Uma vez que a Recorrente não exercia, nem podia exercer, outra atividade económica, que pudesse ser não sujeita ou isenta de IVA, para além da exploração das Travessias sobre o rio ..., é forçoso concluir que os gastos com a construção acessória das referidas obras foram incorridos no âmbito dessa atividade económica. Por outro lado, não resulta dos factos apurados pelos SIT que se tratou de uma prática abusiva, com vista à recuperação de IVA que, de outro modo, não teria lugar, para que se possa pôr em causa o direito à dedução do IVA. …”. A partir daqui, resta concluir que a Recorrente tem direito à dedução do IVA suportado a montante com as denominadas “operações acessórias - acessos indirectos” à Ponte ..., uma vez que constituem operações realizadas pela N tendo em vista o exercício directo da sua actividade económica consistente na cobrança de portagens pela passagem de veículos na Ponte ..., ou seja, tais custos têm um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo. O Acórdão do TCA Sul que assim o não entendeu não pode, pois, manter-se, sendo de revogar o Acórdão recorrido em função do provimento do presente recurso.» Em face de tudo o exposto, com suporte na jurisprudência do TJUE referenciada, somos de concluir, em concordância com a sentença sob recurso, no sentido de que o IVA suportado a montante nas operações descritas no probatório, como indispensáveis ao desenvolvimento da actividade de transporte de passageiros numa eficiente exploração do sistema do metro por parte da Recorrida, inseridas naquilo que podemos contextualizar de infra-estruturas que vão para além do básico necessário à circulação do metro mas que se inserem na qualidade e exigências acessórias da circulação do mesmo e de passageiros, pode ser deduzido a jusante no imposto liquidado nas operações económicas resultantes do exercício da actividade económica da recorrida (operações activas). Improcedem, pois, as alegações de recurso, pelo que a sentença recorrida, que assim entendeu, é de ser mantida na ordem jurídica. 2.3. Conclusões I. No que respeita ao direito de dedução a Jurisprudência do TJUE vem afirmando que «o direito à dedução previsto nos artigos 17.º e 20 da Sexta Directiva faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. (…) Para que o IVA seja dedutível, as operações efectuadas a montante devem ter uma relação directa e imediata com as operações a jusante com direito a dedução. Assim, o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução.» II. Vem admitindo também um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo directo e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo. III. O sujeito passivo tem direito à dedução do IVA suportado a montante com as denominadas “operações acessórias, inerente as obras de requalificação urbana, inserção urbana, uma vez que constituem operações realizadas pela mesma tendo em vista o exercício directo da sua actividade económica consistente no sistema de transporte por Metro, ou seja, tais custos e o IVA com eles suportados têm um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo. 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. Porto, 12 de janeiro de 2023 Irene Isabel das Neves Ana Paula Santos Margarida Reis |