Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00590/11.2BECBR |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 01/12/2023 |
Tribunal: | TAF de Coimbra |
Relator: | Tiago Miranda |
Descritores: | IVA DEDUTÍVEL; FACTURAS FALSAS; ÓNUS DA PROVA; |
Sumário: | I – Por força dos princípios da oralidade e da imediação (cf. artigos 590º a 606º do CPC) e da livre apreciação da prova (artigo 607º nº 5 do CPC) norteadores de toda a instrução no nosso Processo Civil e, por via dos artigos 2º e 281º do CPPT, também do Tributário, a apreciação, em recurso de apelação, do mérito da decisão recorrida quanto às provas verbais não pode consistir num novo julgamento da matéria de facto, antes deve ficar-se pela detecção do erros revelados pelas “regras da experiência comum” ou logicamente demonstráveis. II – O artigo 640º nºs 1 e 2 do CPC faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente o que em seu entender são factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, a decisão que devia ter sido tomada e os meios de prova determinantes, sob pena de rejeição do recurso. III - Feita a prova, pela AT, de factos que suscitem fundados indícios, isto é, razões objectivas para se suspeitar fortemente de que determinada factura, devidamente contabilizada e emitidas de um ponto de vista formal, não corresponde à realidade, passa a ser do sujeito passivo de IVA, conforme os artigos 74º nº 1 e 75º nº 2 alª a) da LGT, o ónus de provar a realidade do negócio facturado, não sendo o IVA dedutível nos termos do artigo 19º do CIVA, no caso de não ser feita essa prova. IV – Ante esta inversão, contra o Sujeito passivo, do ónus da prova, fica logicamente prejudicada a aplicabilidade do artigo 100º nº 1 do CPPT.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
Votação: | Unanimidade |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório "A..., LDA.", pessoa colectiva n.º ..., com sede no Parque Industrial ..., n.º 22, ..., ..., apresentou o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, quanto à parte em que foi julgada parcialmente improcedente a sua impugnação das liquidações oficiosas de IVA do período mensal de 12/2008 e respectivos juros compensatórios no valor total de 6 917,42 € As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: «CONCLUSÕES: 1. O juiz está obrigado a julgar a matéria de facto de livre apreciação segundo o princípio da objectividade das provas traduzido nas regras de experiência comum, da racionalidade, bom senso, da normalidade da vida, etc. e era por esse critério que haveria de ter julgado a matéria de facto em causa. 2. A AT tem o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a considerar determinada operação como simulada, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente. 3. É certo que como é aceite pela jurisprudência, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12 (processo nº 00964/06.0 BEPRT). Ou seja, a Administração Tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Processo 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – art.º 75º, n.º 1 da LGT. 4. Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - citado por Saldanha Sanches, in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311. 5. Não estamos perante indícios que traduzam uma probabilidade elevada de a factura em causa não titular operações reais, ou seja, de que o emitente não tenha prestado os serviços nelas mencionados. 6. O facto do sócio gerente da “"V..., Lda."”, AA, ter prestado declarações no âmbito do procedimento inspectivo, no sentido de que o cheque foi por si “endossado e entregue” ao sócio da Impugnante BB para pagamento de uma dívida pessoal contraída em 2002, traduz a confissão da existência de uma dívida, devendo aliás o ponto 2) da matéria de facto dada como não provada ser corrigida passando-se a dar como assente que: o cheque no valor de 7.400,00 euros identificado no documento a que se alude em L) dos factos provados, entregue pela Impugnante à “"V..., Lda."” e posteriormente endossado ao BB, se destinou a solver dívida do AA para com o primeiro. 7. Depois o facto do quadro de pessoal ao serviço da “"V..., Lda."”, “para além dos gerentes, motoristas e encarregados, apenas dispor de profissionais com as categorias de Moldureiro, Montador de vidros, Lapidador de vidros e aprendiz 1º ano, não constitui qualquer factor decisivo para que não tivessem condições e aptidões para levar a cabo os trabalhos em causa. Quantos de nós não sendo electricistas, carpinteiros, etc…, conseguimos fazer tarefas e trabalhos de electricidade e de carpintaria, uns mais técnicos e outros não? 8. Analisados os elementos factuais, não podemos deixar de afirmar que são muito pouco ou mesmo nada 9. Resulta por explicar a razão pela qual tais trabalhadores não conseguiriam efectuar remoção e colocação de aros, portas e janelas de alumínio, afinação e substituição de vedantes e rolamentos em portas e janelas de correr em alumínio, envernizamento e pinturas de portas interiores, arranjos de estores, substituição de painéis de vidro fosco por painéis de madeira, levantamento e reposição de piso flutuante e envernizamento do mesmo e remoção de películas reflectoras dos vidros. 10. Encontra-se erradamente julgado o ponto 3 da matéria dada como não provada, sendo que na apreciação da provas de livre apreciação, o juiz está vinculado, pela própria natureza da função jurisdicional e os princípios da independência e da imparcialidade (mesmo que do outro lado esteja a Administração), enquanto poder ontologicamente subordinado a dirimir os conflitos de acordo apenas com regras objectivas – e onde não cabe qualquer mundividência pessoal da realidade ou dos valores – às designadas por leges artis que neste campo são as regras de racionalidade humana, da experiência comum, da lógica, das regras técnicas e científicas, da normalidade dos comportamentos nos diversos domínios da realidade económica, social ou da vida em que os factos ajuizandos acontecem, do senso comum, da prudência, da normal previsibilidade, etc. 11. No mínimo está criada uma dúvida fundada sobre a existência e a quantificação dos factos tributários relevados pelo Fisco, que não pode deixar de ser valorada contra a AT, face ao disposto no art.º 100º do CPPT. 12. Mostram-se assim violados, entre outros, os artigos 74º, n.º 1 e 75º, da LGT, 100º, n.º 1 do CPPT e bem assim o art.º 23º do CIRC. Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogada a douta sentença recorrida, proferindo-se douto acórdão que julgue a impugnação totalmente procedente com todas as legais consequências.» Notificada, a Recorrida não respondeu à alegação. O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, redutível aos seguintes excertos: «(…) PARECER I - OBJETO Em 29.09.2021, "A..., LDA.", portadora do NIPC nº ... e domicílio fiscal no Parque Industrial ..., 22, ..., ... veio, ao abrigo do artigo 280º, nº 1 e ss. do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), no âmbito do processo de impugnação, interpor recurso jurisdicional contra a decisão a quo proferida pela Meritíssima Juiz de Direito do TAF de Coimbra, em 02.09.2021,1 que julgou improcedente parcialmente a presente impugnação, na parte em que, “…não resulta que os serviços descritos na factura a que se alude em L) dos factos provados foram efectivamente prestados à Impugnante pela “"V..., Lda."”, e pelo valor dela constante, pelo que, não tendo a Impugnante feito prova, conforme se lhe impunha, da materialidade das operações, improcede a sua pretensão nesta parte” e em consequência, absolveu, nesta parte, a Autoridade Tributária (AT) do(s) pedido(s) formulado(s) pela recorrente/impugnante. Para esse efeito, alegou a recorrente/impugnante, em síntese, erro sobre os pressupostos de facto e de direito, o que determinou a violação dos artigos 74º, n.º 1 e 75º, da LGT, 100º, n.º 1 do CPPT e bem assim o art.º 23º do CIRC. Conclui a recorrente/impugnante pelo provimento ao presente recurso, devendo em consequência revogar-se a decisão recorrida e a liquidação adicional do IVA referente ao período de 08/2012 e juros compensatórios. Em 15.10.2021, foi a recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) notificada para, querendo, apresentar contra-alegações, o que pese embora, não o fez (cf. fls. 276 do SITAF). Subidos os autos a este Venerando Tribunal, cumpre, por ora, ao MP, ao abrigo do artigo 282º, nº 3 do CPPT, emitir parecer, em defesa da legalidade democrática. É o que faremos de imediato. II – DO RECURSO PROPRIAMENTE DITO a) Erro de julgamento Para esse efeito, a recorrente apresentou as seguintes conclusões: “(…)” Refira-se que nos termos dos artigos 608.º n.º 2, 635.º n.º 4 e 5 e 639.º n.º 1 e 2 do CPC aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões (cf. artigo 282º, n.º 2 do CPPT), não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as que sejam de conhecimento oficioso. Compulsada a decisão a quo, damos por assente a matéria de facto provada, transcrevendo a parte que nos interessa: “(…)” No que concerne à motivação dos factos provados e não provados, com interesse para dissecar o recurso, importa transcrever as seguintes passagens da decisão a quo ora posta em crise: “(…)” Voltemos ao caso concreto. Vejamos. Analisemos agora as considerações de direito vertidas na douta decisão a quo: “(…)” No mesmo sentido e em caso semelhante, veja-se o Acórdão do TCA Norte, de 11.11.2021, Processo nº 736/16.4 BECBR (Relator: Carlos Fernandes), ainda inédito: “(…)” Assim, compulsada a decisão a quo constam dela, as razões de facto e de direito, em que esta assentou, bem como a fundamentação de direito adequada ao caso concreto, pelo que bem andou a Meritíssima Juiz de Direito a quo na análise da prova e na fundamentação da decisão, de modo que em nosso entender, é tal decisão da 1ª instância merecedora de ser confirmada, não se verificando os invocados vícios deduzidos pela recorrente. No mais, com a devida vénia e por uma questão de economia processual fazemos nossos os doutos argumentos de facto e fundamentação de direito insertos na douta decisão a quo, ora posta em crise, pelo que deve improceder totalmente o recurso interposto pela recorrente. III – CONCLUSÃO Em conclusão, somos do parecer que o recurso interposto deve ser considerado improcedente, por não provado, mantendo-se na Ordem Jurídica a liquidação adicional de IVA de 08/2012, com custas processuais pela recorrente, "A..., LDA." É este, em suma, s.m.o., o sentido do nosso parecer.» Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir. II - Âmbito do recurso e questão a decidir Conforme jurisprudência pacífica, extraída dos artigos 608º, 635º nº 4 e 639º do CPC, aqui aplicáveis ex vi artigo 281º do CPPT, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações. Assim, as questões suscitadas no recurso são, pela ordem, em que emergem das conclusões do recurso, as seguintes: 1ª questão A Sentença Recorrida padece de erro no julgamento da matéria de facto ao julgar não provado (cf. nº 2 da discriminação dos factos não provados) que “Que o cheque no valor de 7.400,00 euros identificado no documento a que se alude em L) dos factos provados, entregue pela Impugnante à “"V..., Lda."” e posteriormente endossado ao BB, se destinou a solver dívida do AA para com o primeiro e mulher”? 2ª questão A sentença recorrida padece de erro de julgamento em matéria de facto ao julgar não provado o facto 3 como tal discriminado, a saber, que a “"V..., Lda."” prestou à Impugnante todos os serviços identificados no documento a que se alude em L) dos factos provados, e pelo valor identificado no mesmo? 3ª Questão A sentença recorrida errou, de todo o modo, no julgamento de direito, violando os artigos 74º nº 1 e 75º da LGT, ao julgar que a AT reuniu “indícios que traduz(i)am uma probabilidade elevada de a factura em causa (da "V..., Lda.") não titular operações reais, ou seja, de que o emitente não tenha prestado os serviços nelas mencionados? 4ª Questão A sentença recorrida errou, de todo o modo, no julgamento de Direito, violando o artigo 100º nº 1 do CPPT, ao confirmar na ordem jurídica as liquidações impugnadas, apesar de remanescer “uma dúvida fundada sobre a existência e a quantificação dos factos tributários relevados pelo Fisco” III – Apreciação do Recurso A decisão recorrida em matéria de facto é a seguinte: « III. FUNDAMENTAÇÃO III.1.FACTOS PROVADOS COM RELEVO PARA A DECISÃO DA CAUSA: A) Os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ..., realizaram uma acção inspectiva à Impugnante relativa ao ano de 2008 – conforme documentos a folhas 120 a 126 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; B) Em 04.10.2010 foi prestada, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), informação da Divisão de Inspecção Tributária I – Equipa D, da Direcção de Finanças ..., da qual consta conforme segue: “A visita foi iniciada em 06/05/2010, e atendendo a que falta cerca de um mês para que decorram os 6 meses desde o início da visita e porque: □ existe necessidade de obtenção de informações e elementos junto de entidades com relações com o sujeito passivo; □ pela necessidade de esclarecer conjuntamente com as inspecções já solicitadas a outras entidades, conforme informação interna por nós prestada em 16/09/2010. Solicita-se face à situação descrita, nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do n° 3 do art° 36° do mesmo diploma, o alargamento do prazo do procedimento de Inspecção por mais 3 meses. Sendo previsível a sua conclusão até 06 de Fevereiro de 2015 (…)” (...)» - conforme documento a folhas 113 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; C) Sobre a informação a que se alude em B) foi exarado despacho do chefe da Divisão de Inspecção Tributária, datado de 11.10.2010, do qual consta conforme segue: “«Nos termos e fundamentos descritos nesta informação, autorizo a prorrogação do prazo de duração do procedimento inspectivo por mais 3 meses. Notifique-se o sujeito passivo em conformidade. (...)” - c conforme documento a folhas 113 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; D) A Direcção de Finanças ... dirigiu ao mandatário da Impugnante, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), ofício datado de 11.10.2010, do qual consta conforme segue: “ASSUNTO: Prorrogação do prazo para a conclusão da Inspecção Tributária (Art.° 36 n.° 3 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovado pelo D.L n.° 413/98 de 31/12, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 50/2005 de 30/8) Exm.°s Srs. Fica, por este meio notificada a firma "EDIREDE SISTEMAS INTELIGENTES LDA., na pessoa de V. Ex.a, na qualidade de mandatário, de que por despacho do Chefe de Divisão da DIT- I, de 2010-10-11, foi ampliado por mais 3 meses, nos termos das alínea a) e b) do n.° 3 do Art. 36. do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), o prazo para a conclusão do procedimento de inspecção tributário que se encontra em curso à referida Firma, pelo que se prevê que o términus da mesma venha a ocorrer até 06 de Fevereiro de 2011. Anexa-se fotocópia da informação e respectivo despacho que fundamenta a prorrogação em causa.” (...)» - conforme documentos a folhas 112 a 114 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; E) No âmbito da acção inspectiva a que se alude em A) foi elaborado Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, datado de 05.01.2011 - conforme documentos a folhas 52 a 110 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; F) Os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ... dirigiram à Impugnante, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), ofício datado de 07.01.2011, sob o assunto "Notificação (Art.° 60° da Lei Geral Tributária e Art.° 60 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária) - Art.° 40.° do CPPT" - conforme documentos a folhas 127 e 129 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; G) No âmbito da acção inspectiva a que se alude em A) foi elaborado "Relatório de Inspecção Tributária" (RIT), datado de 24.01.2011, do qual consta conforme segue: «(...) 3.1.1.2.2 - Facturação emitida pela firma "C..., Lda.". O SP regista encargos (conta ... 6223614) no montante de € 17.300,00, suportada pela factura n° ...08, da entidade relacionada, "C..., Lda."., NIF: ..., cujo descritivo constante da mesma, refere "elaboração de estudo técnico para implementação de cursos de técnicos instaladores painéis solares e térmicos de refrigeração/climatização": A empresa "C..., Lda.", declara ter iniciado a actividade em 18/04/2008, e é detida maioritariamente, por outra empresa com sócios e gestão comuns, "E..., Lda,", que de acordo com os elementos declarados pela "C..., Lda." constantes da BD da DGCI, é também responsável pela sua gestão. A "A..., LDA." não declara a existência, no período de 2008, de prestação de quaisquer acções de formação, naquelas ou noutras áreas. Procedeu-se por isso, em 06/09/2010, á notificação do SP na pessoa do seu Técnico Oficial de Contas (TOC), sr. CC, na qual se solicita nos fossem apresentados elementos comprovativos da implementação dos cursos a que se refere o alegado estudo e que nos fossem indicadas as acções de formação promovidas pela "A..., LDA." nos anos de 2008 e seguintes, bem como a indicação dos locais e dias em que decorreram e indicação de formadores e formandos que neles tenham participado. Em 17/09/2010, deu entrada nesta Direcção de Finanças, informação relacionada com a notificação antes referida (ver Anexo II), sendo invocado no ponto 5, a existência de alegados cursos naquelas áreas em parceria com outras entidades, não indicando quais, não sendo, igualmente, referido quais os formadores e formandos que neles participaram nem dias em que decorreram. Procedeu-se por isso, novamente, em 18/10/2010, á notificação do SP na pessoa do seu mandatário (advogado DD) para que nos fossem apresentados os elementos, já anteriormente solicitados, que comprovem a implementação dos cursos a que se refere o alegado estudo, indicando as formações promovidas pela "A..., LDA." no ano de 2008 e seguintes, nas áreas indicadas, de formação de "técnicos instaladores de painéis solares e térmicos de refrigeração/ climatização", e igualmente, nos fossem, indicados os dias em que decorreram tais acções. formadores utilizados e formandos que neles tenham participado, bem como, as entidades a quem a "A..., LDA." facturou tais serviços. Posteriormente (28/10/2010) deu entrada nesta Direcção de Finanças pedido do referido mandatário a solicitar prorrogação, em mais 10 dias, do prazo da notificação referida, alegando “estar a aguardar informações de terceiros", no entanto, tais esclarecimentos não foram prestados até á presente data. No decurso da acção de inspecção, foi por diversas vezes solicitado aos responsáveis pela "A..., LDA." justificação para o registo da referida factura emitida pela "C..., Lda.", de que não se obtiveram os esclarecimentos necessários, tendo-se posteriormente, procedido, em 06/09/2010 e 18/10/2010 á notificação para o efeito, sem que nos tenham sido apresentados os elementos que comprovem que a "A..., LDA.", alguma vez tenha promovido quaisquer acções de formação naquelas áreas, não dispondo, sequer de meios humanos para o efeito, dado que, no ano 2008 apenas dispunha de um funcionário com a finalidade de prestar serviços de apoio administrativo ás entidades utilizadoras das instalações propriedade da "A..., LDA.", e em 2009 não declara a existência de quaisquer encargos com pessoal. Conforme se pode comprovar, também pelos elementos disponibilizados no sítio da empresa fwww.A......pt). cf. ANEXO VII, não existe qualquer referência à existência de quaisquer acções de formação, nesta ou noutra área, no entanto, constatamos pelo conteúdo dos sítio da empresa relacionada, "G..., Lda.", cuja sede funciona nas instalações propriedade da "A..., LDA." (lote ...2 Parque Industrial ...), que é esta empresa que presta formação nas áreas "técnicos instaladores de painéis solares e térmicos de refrigeração/ climatização", cf. se pode constatar pela página da empresa no sitio www.G....pt. cf. ANEXO VIII. Da análise dos elementos de contabilidade, ano 2008, da "A..., LDA.", não existem quaisquer elementos e/ou indícios de que possa ter efectuado quaisquer tipo de formações e quando notificada para fazer prova da sua existência, mesmo que nos anos posteriores, esta não logrou fazê-lo, no entanto, a sociedade relacionada (com sócios e gerência comum) "G..., Lda." promove cursos nessas áreas e outras, utilizando inclusive, em permanência parte das instalações do pavilhão propriedade da "A..., LDA." sito no lote ...2 do Parque Industrial .... Nos termos do artigo 23° do CIRC, apenas se consideram '“custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora", não de vislumbrando qualquer utilização dos serviços em causa na actividade operacional da "A..., LDA." Assim, impõe-se que o montante de €17.360,00 seja acrescido aos resultados declarados pelo sujeito passivo na declaração periódica de rendimentos modelo 22 de IRC do ano de 2008. (…) 3,1.1.3 - Encargos não comprovados - registo facturas de favor 3.1.1.3.1 - Constatámos igualmente o registo em Dezembro de 2008, da factura n. ...87 datada de 31/12/2008, no montante global de € 8.880,00, emitida pela firma "V..., Lda.", NIF: ..., cuja execução dos serviços nela invocados nos mereceu as maiores reservas. Tendo em conta as reservas suscitadas relativamente á factura emitida peia firma "V..., Lda.", procedemos à visita desta empresa, Despacho n° Dl ...63, tendo-se constatado que no final do ano de 2008, para além da factura referida emitida para a "A..., LDA.", também havia procedido á emissão de facturas de trabalhos da mesma natureza para várias outras entidades, cujos sócios e/ou gestão são comuns á "A..., LDA." (sr. BB e/ou a esposa EE do Bem). Da análise efectuada, esclarecimentos e elementos recolhidos na empresa emitente ("V..., Lda."), concluímos que: A actividade desenvolvida pela "V..., Lda.", está relacionada com: . Venda e colocação vidros, espelhos e acrílicos; • Fabrico de molduras de madeira para quadros; ■ Aquisição e colocação vidros rochedo; • Venda de roupeiros para quartos e móveis casa banho adquiridos a terceiros para o efeito; • O quadro de pessoal ao serviço da empresa para além dos gerentes, motoristas e encarregados, apenas dispunha de profissionais com as categorias de Moldureiro, Montador de vidros, Lapidador de vidros e aprendiz 1º ano. Os trabalhos constantes das facturas emitidas para a "A..., LDA." e outras entidades relacionadas com a mesma, de acordo com o descritivo das mesmas, corroborado pelas declarações prestadas, pelo sócio gerente da "V..., Lda.", sr. AA, consistem genericamente, na remoção e colocação de aros, portas e janelas em alumínio, afinação e substituição de vedantes e rolamentos em portas e janelas de correr em alumínio, envernizamento e pinturas de portas interiores, arranjos de estores, substituição de painéis em vidro fosco por painéis de madeira, levantamento e reposição de piso flutuante e envernizamento do mesmo, retirar películas reflectoras dos vidros, etc.,, cujos trabalhos não fazem parte da actividade desenvolvida pela empresa, apesar disso, no conjunto as facturas emitidas para a "A..., LDA." e empresas com ele relacionadas corresponderem a 29 % do volume anual de negócios declarado (com inclusão do valor daquelas facturas) pela "V..., Lda." no ano de 2008 e 78% do volume de negócios declarado no 4° trimestre, com inclusão do valor daquelas facturas. Quando solicitámos ao sócio gerente sr. AA, a apresentação de elementos, folhas de obra, orçamentos, identificação de materiais para a execução de tais trabalhos, ou outros que comprovem a sua execução, alegou não poder apresentá-los com o argumento que teria de os procurar, tendo posteriormente, apresentado os seguintes elementos: ■ Orçamentos alegadamente emitidos relativamente aos serviços constantes daquelas facturas; ■ Documento manuscrito com indicação de dias em que os trabalhos foram alegadamente efectuados; Sobre os elementos apresentados, concluímos que; ■ Os orçamentos apresentados, com excepção do relativo aos serviços para uma das empresas, encontram-se datados dos últimos meses do ano de 2008, 25/09/2008, 2/10/2008, 13/10/2008 e 12/11/2008. Constatamos igualmente, que da recolha efectuadas de orçamentos emitidos para outros clientes, que ao contrario dos que nos foram apresentados para justificar os alegados trabalhos para a "A..., LDA." e empresas relacionadas com esta, aqueles, ao contrário destes, são pormenorizados, e com preços estabelecidas para cada uma das rubricas do orçamento, constando também da generalidade deles desenhos manuscritos com as medidas respectivas; ■ Dos documentos relacionados com o pessoal e tempos afectos a tais serviços, não existem quaisquer evidências de que correspondam á realidade, não identificando o trabalhador ou trabalhadores envolvidos, nem elementos que demonstrem que tais deslocações foram efectuadas, sendo que grande parte dos serviços referidos constam como efectuados em localidade que implicavam deslocações, tais como, ..., ..., ..., ..., ..., ..., .... ■ Quanto à identificação dos materiais supostamente aplicados na execução dos serviços invocados, o sócio gerente sr. AA, apresentou-nos cópias de documentos de aquisição de alguns bens em montantes insignificantes que não se comprova destinarem-se á execução de trabalhos da natureza dos invocados, tendo inclusive invocado para o justificar, ferramentas, tais como, discos de corte para Inox, rebarbadora, tupia, etc. De referir ainda, que quando questionado o sócio gerente sobre a necessidade da compra da referida ferramenta designada de “tupia”, este referiu que teve necessidade de adquirir esta ferramenta para utilização em madeiras e que teve como única finalidade a execução dos trabalhos relacionados com intervenção efectuada de levantamento e reposição do piso flutuante. No entanto, constatamos que aquela ferramenta foi adquirida em 10/12/2008, quando o documento manuscrito apresentado sob o título de “folha de obra que nos foi apresentado para justificar o período em que os serviços relacionados com a execução daqueles trabalhos, alegadamente, foram efectuados, indica datas anteriores à aquisição daquela ferramenta (dias 28, 29, 30 de Outubro e dias 20, 21 e 24 de Novembro). De referir ainda, que apesar de na maioria dos trabalhos invocados, ser referida a substituição de rolamentos em portas e janelas de alumínio de correr, não nos foram apresentados elementos que comprovem a aquisição dos rolamentos em causa. Da análise destes documentos constata-se que os orçamentos correspondentes aos trabalhos alegadamente efectuados pela "V..., Lda.", são em tudo idênticos e por outro lado não deixa de ser curioso o facto de quase todas as instalações das entidades para quem foram emitidas terem sofrido em simultâneo as mesmas anomalias, que obrigassem a intervenções da mesma natureza. Quanto ao recebimento das facturas em causa na "V..., Lda.", constam todas registadas como recebidas, através da emissão, por parte daquela empresa, dos correspondentes documentos de quitação (recibos), alguns deles registados no mês de Dezembro de 2008 e os restantes registados até meados de Janeiro de 2009, todos, como recebidas em numerário, ou seja, foram creditadas as contas dos clientes por contrapartida da conta de “caixa”, não existindo qualquer registo ou elementos que comprovem que tais valores deram entrada (depósitos) em contas bancárias conhecidas da "V..., Lda." 3.1.1.3.2 - Na contabilidade da "A..., LDA.", verificámos que o pagamento da factura n° ...87 datada de 31/12/2008, se encontra registada em Dezembro de 2008, constando ter sido, para o efeito, emitido dois cheques sobre o Banco 1..., nos montantes de € 1.480,00 (valor do IVA) e parte restante de € 7.400,00, cujos valores foram descontados, respectivamente, em 07/01/2009 e 07/05/2009. Em 01/07/2010, procedemos á notificação da "A..., LDA." para que nos fosse apresentado cópia frente e verso dos referidos cheques, o que veio a acontecer em finais de Agosto, tendo-se concluído da análise dos mesmos, que o cheque correspondente ao valor do IVA (€ 1.480,00) foi levantado ao balcão pela sócia da "V..., Lda.", D. FF, e o cheque no montante de € 7.400,00 sido depositado numa conta no Banco 2... que não corresponde a nenhuma conta conhecida pertencente ás entidades intervenientes. Perante isto, procedemos em 03/09/2010, á notificação da "V..., Lda.", na pessoa do seu sócio-gerente, sr. AA, para que nos fosse identificado o(s) titular(es) da referida conta e no caso de não pertencer à "V..., Lda.", ou seus responsáveis, nos indicasse a pessoa ou entidade a que foi entregue o cheque, bem como, apresentar os elementos que justifiquem o motivo de tal entrega/endosso a terceiros. No dia 09/09/2010, foi-nos apresentado para cumprimento daquela notificação, uma declaração, cf. ANEXO IX, em que é referido desconhecer os titulares da referida conta no Banco 2... e que aquele cheque no montante de € 7.400,00, foi endossado e entregue, pelo sócio gerente da "V..., Lda.", sr. AA, ao sr. eng. BB (sócio da "A..., LDA."), para pagamento de uma divida pessoal contraída em 2002. Quando solicitei ao sr. AA a apresentação de elementos e/ou esclarecimentos comprovativos da divida que vem alegar, foi-me referido, na presença do inspector em serviço nesta Direcção de Finanças, GG, que não pretendia prestar mais quaisquer esclarecimentos, para além dos constantes da declaração escrita que nos foi apresentada. O procedimento constatado não permite, verificar ou validar a alegada existência de qualquer divida particular, quer porque não nos foram apresentados quaisquer elementos que permitam tal validação, quer porque a pessoa que o invoca (sr. AA) declaradamente, referiu não pretender apresentar ou prestar quaisquer outros esclarecimentos para além do que constam na referida declaração que nos foi entregue, no entanto, quanto ao destino do cheque em causa, todos os indícios apontam no sentido da conta onde foi depositado no Banco 2... poder corresponder a uma conta particular do Sr. BB. 3.1.1.3.3 - Em consequência da situação descrita foi despoletada inspecção á firma "V..., Lda.", OS n° ...19, efectuada pelo Inspector Tributário HH, que relativamente à factura n° ...87 datada de 31/12/2008, que concluiu pela existência de fortes indícios da facturação emitida pela "V..., Lda." para a "A..., LDA." e empresas relacionadas, não corresponderem a efectivos serviços realizados, ou seja, trata-se de emissão de facturação de favor. Perante o exposto, conclui-se pela existência de fortes indícios de simulação de negócios, não correspondendo a factura n° ...87 datada de 31/12/2008, emitida pela "V..., Lda.", a operações reais, pelo que, no caso da "A..., LDA.", estaremos perante a “utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes”. Ora, de acordo com o n.° 1 do artigo 23° do CIRC, apenas se consideram “custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”, pelo que os valores relativos à factura n° ...87 emitida pela "V..., Lda." serão desconsideradas para efeitos de apuramento do lucro tributável do sujeito passivo. Assim, relativamente ao exercício de 2008, tendo em conta que a "A..., LDA.", procedeu ao registo do valor da referida factura no imobilizado, cujo valor amortizou através da aplicação da taxa de amortização e reintegração de 10%, importa acrescer ao quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC o montante desse valor, ou seja € 740,00 (7.400,00x10%). (…) 3.2 - Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) 3.2.1. - 1VA Liquidado - Responsabilidade solidária do adquirente de acordo com o disposto nos n° 4 e 5 do artigo 79° do CIVA: ✓ quando o imposto resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante de factura ou documento equivalente, o adquirente dos bens ou serviços que seja um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.° 1 do artigo 2°, agindo como tal, e ainda que isento do imposto, é solidariamente responsável, pelo pagamento do imposto, com o sujeito passivo que, na factura ou documento equivalente, figura como fornecedor dos bens ou prestador dos serviços; ✓ A responsabilidade solidária prevista no número anterior é aplicável ainda que o adquirente dos bens ou serviços prove ter pago a totalidade ou parte do imposto ao sujeito passivo que na factura ou documento equivalente figura como fornecedor dos bens ou prestador dos serviços. Ora, de acordo com o referido ao longo do ponto 3.1.1.3, a factura n° ...87 datada de 31/12/2008, emitida pela "V..., Lda.", não corresponde a operações reais, pelo que, estaremos perante a "utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes", constatando-se ainda, que o sujeito passivo emitente, "V..., Lda.", não procedeu à entrega, nos cofres do Estado, do imposto liquidado na factura referida. Por força no disposto nos n°s 4 e 5 do artigo 79° do CIVA, a "A..., LDA.", é solidariamente responsável pela divida do imposto liquidado pela "V..., Lda.", naquela factura, no montante de € 1.480,00, devido no período de imposto 0812t. 3.2.2 - IVA Dedutível 3.2.2.1 - Imposto indevidamente deduzido 3.2.2.1.1 - De acordo com o Código do IVA "só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações "previstas no n.° 1 do artigo 20° do CIVA. Ora, aquando do registo da factura n° ...08, emitida pela firma "C..., Lda."., NIF: ..., cf. registo n° 28 do diário de op. diversas efectuado no mês de Dezembro, o sujeito passivo procedeu à dedução do IVA no valor de € 3.460,00. Conforme se expôs no ponto 3.1.1.2.2 supra, a alegada prestação de serviços não terá qualquer aplicação na actividade operacional da "A..., LDA.", pelo que tal como o seu custo não foi aceite fiscalmente, também em sede de IVA e nos termos do artigo 20° do CIVA a dedução se revela indevida, pelo que importa regularizar a dedução em causa, o montante de € 3.460,00, respeitante ao período de imposto 0812t. 3.2.2.1.2 - Dedução relacionada com factura "V..., Lda." Perante o disposto no ponto 3.1.1.3, conclui-se, com base nos elementos e esclarecimentos obtidos junto das firmas "A..., LDA." e "V..., Lda.", pela existência de fortes indícios de simulação de negócios, não correspondendo a factura n° ...87 emitida pela "V..., Lda." a quaisquer operações reais, pelo que, no caso da "A..., LDA.", estaremos perante a "utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes". Ora, segundo o n.° 3 do artigo 19° do Código do IVA (CIVA), "não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente’’. Deste modo, o IVA deduzido pela "A..., LDA.", no montante de € 1.480,00 aquando do registo contabilístico daquela factura emitida pela "V..., Lda." não é legítimo, pelo que importa que seja regularizada tal dedução, efectuada pela "A..., LDA.", no período de imposto 0812t. “(…)” - (...)» - conforme documento a folhas 130 a 154 do P.A. cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; H) A Direcção de Finanças ... remeteu ao mandatário da Impugnante, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), ofício datado de 26.01.2011, sob o assunto "Notificação do Relatório de Inspecção Tributária” do qual consta conforme segue: «(...) Fica por este meio notificada a firma "A..., LDA.", NIPC ..., na pessoa de V.a Ex.a, na qualidade de mandatário, nos termos do art° 77° da LGT e do art.° 61° do RCPIT, do Relatório de Inspecção Tributária e do teor do(s) despacho(s) que sobre ele recaiu(iram), que se anexa(m) como parte integrante da presente notificação, relativamente às situações abaixo indicadas: Das correcções meramente aritméticas efectuadas à matéria tributável e/ou imposto, sem recurso a métodos indirectos, cujos fundamentos constam do Relatório da Inspecção Tributária, que se anexa, como parte integrante da presente notificação, será a breve prazo, notificado da liquidação pelos serviços da DGCI. Desta notificação constará indicação dos prazos e meios de defesa contra a liquidação. Da presente notificação das correcções efectuadas e dos fundamentos, não cabe qualquer reclamação ou impugnação. A(s) decisão(ões) tomada(s) referida(s) no(s) ponto(s) anterior(ores) tem(têm) por base os factos, motivos e fundamentos e, bem assim como, os critérios e cálculos que originaram os valores acima referidos, expressamente desenvolvidos no Relatório da inspecção Tributária, que faz parte integrante da presente notificação. Junta-se relatório e anexos, num total de treze folhas. (...)» - conforme documentos a folhas 155 a 157 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; I) A Autoridade Tributária emitiu em nome da Impugnante, liquidações de IVA e juros compensatórios relativas ao período 0812T, no valor global de 6.917,42 euros, com data limite de pagamento ocorrida em 30.04.2011 - conforme documentos a folhas 13 e 14 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; J) A "C..., Lda." emitiu em nome da Impugnante documento denominado "Factura ...08", datado de 31.12.2008, do qual consta conforme segue: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)» - conforme documento a folhas 64 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; K) A “"V..., Lda."” dirigiu à Impugnante, documento datado de 12.11.2008, sob o assunto “Orçamento”, do qual consta conforme segue: «(…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] “(…)” - conforme documento a folhas 30 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; L) A “"V..., Lda."” emitiu em nome da Impugnante, documento denominado “Factura n.º ...87”, datado de 30.12.2008, do qual consta conforme segue: «(…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)» - conforme documento a folhas 62 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; M) Entre os sócios da Impugnante e a representante da "V..., Lda.", FF, existe um convívio de longa data; N) Os sócios da Impugnante BB e EE do Bem figuram como executados em acção executiva intentada por “B..., SA”, de cujo requerimento executivo consta conforme segue: «(…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)» - conforme documento a folhas 31 a 36 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; O) A petição inicial da impugnação foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra em 01.09.2011 – conforme registo aposto no sobrescrito a folhas 46 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido. III.2. FACTOS NÃO PROVADOS Considera este Tribunal não se ter logrado provar a factualidade seguinte: 1 - Que os sócios da Impugnante procederam ao pagamento de parte de dívida do AA - representante legal da "V..., Lda." - após terem sido accionados judicialmente na qualidade de "avalistas"; 2 - Que o cheque no valor de 7.400,00 euros identificado no documento a que se alude em L) dos factos provados, entregue pela Impugnante à "V..., Lda." e posteriormente endossado ao BB, se destinou a solver dívida do AA para com o primeiro e mulher; 3 - Que a "V..., Lda." prestou à Impugnante todos os serviços identificados no documento a que se alude em L) dos factos provados, e pelo valor identificado no mesmo. * III.3. MOTIVAÇÃO O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, com base nos documentos constantes dos autos, acima identificados, os quais não foram impugnados. Quanto à factualidade sob a alínea M) dos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se no depoimento da testemunha II Bem, a qual depôs com segurança e coerência, merecendo por isso, e atenta, ainda, a respectiva razão de ciência, a credibilidade do Tribunal. * No que respeita à factualidade não provada, a convicção do Tribunal resulta de nenhuma testemunha ter procedido à respectiva confirmação com a certeza e segurança exigíveis, nem a mesma resultar de forma inequívoca dos documentos juntos aos autos. Acresce que, do teor do documento a que se alude em N) do probatório apenas se extrai ter sido intentada acção executiva, já no ano de 2010 [cfr. se retira da expressão contida no requerimento executivo "... desde a data de incumprimento, até esta data (01-02-2010) ..."], contra os sócios da Impugnante, relativamente a obrigações assumidas pela FF e marido, JJ e não, portanto, por parte do AA. Por outro lado, a única testemunha que identificou a "V..., Lda." como prestadora de serviços à Impugnante foi II Bem - irmã da sócia da Impugnante EE Bem - de cujo depoimento, ainda assim, não resultou a referência a todos os serviços identificados no documento a que se alude em L) do probatório, nem qualquer referência ao valor dos mesmos.» Visto o decidido em matéria de facto, há condições para nos debruçarmos sobre as questões acima enunciadas. 1ª questão A Sentença Recorrida padece de erro no julgamento da matéria de facto ao julgar não provado (cf. nº 2 da discriminação dos factos não provados) que “Que o cheque no valor de 7.400,00 euros identificado no documento a que se alude em L) dos factos provados, entregue pela Impugnante à “"V..., Lda."” e posteriormente endossado ao BB, se destinou a solver dívida do AA para com o primeiro e mulher”? Como tem sido uniformemente julgado neste Tribunal, os princípios da oralidade e imediação e da livre apreciação da prova (artigos 590º a 606º e 607º nº 5 do CPC) implicam que o julgamento do recurso em matéria de facto, quanto à apreciação de provas que não sejam prova legal, não é um julgamento, ex novo, em que se possa fazer tábua rasa do julgamento do juiz da 1ª instância que, esse sim viu, ouviu e apreciou com imediação o depoimento de testemunhas e declarantes, antes deve ficar-se pela detecção do erros de julgamento revelados pelas “regras da experiência comum” ou logicamente demonstráveis. Em coerência com este entendimento e para obviar à perplexidade de não haver um objecto concreto e definido para a crítica da decisão de facto, o artigo 640º do CPC, aqui aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, decisão que devia ter sido tomada e meios de prova determinantes, impondo-lhe inclusivamente, no caso da prova verbal gravada (com é o caso) sob pena de “imediata rejeição (…) do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a). Percorridas as alegações e as conclusões do recurso verifica-se que o Recorrente não procede, nem numas nem noutras, a tais especificações ou discriminações. Na verdade, limita-se a especificar a alegação de facto que em seu entender devia ter sido julgada provada em vez de não provada, fundando tal entendimento apenas em proposições gerais sobre aquilo em que deve consistir o juízo probatória do Juiz. Assim sendo, isto é, porque o Recorrente não cumpre com ónus decorrente do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 640º d CPC, o recurso vai rejeitado na parte concernente à presente questão, que, portanto, não será apreciada. 2ª questão A sentença recorrida padece de erro de julgamento em matéria de facto ao julgar não provado o facto 3 como tal discriminado, a saber, que a “"V..., Lda."” prestou à Impugnante todos os serviços identificados no documento a que se alude em L) dos factos provados, e pelo valor identificado no mesmo? Tão pouco relativamente ao decidido pelo Mº Juiz a quo quanto à não prova deste facto, cumpre, o Recorrente, com o ónus decorrente do disposto no citado artigo 640º nºs 1 e 2. Como assim, pelas mesmas razões aduzidas a propósito da primeira questão, o Recurso fica, nesta parte, igualmente rejeitado. 3ª Questão A sentença recorrida errou, de todo o modo, no julgamento de direito, violando os artigos 74º nº 1 e 75º da LGT, ao julgar que a AT reuniu “indícios que traduz(i)am uma probabilidade elevada de a factura em causa (da "V..., Lda.") não titular operações reais, ou seja, de que o emitente não tenha prestado os serviços nelas mencionados”? O discurso da sentença recorrida, na parte relevante para esta questão, é redutível aos seguintes excertos: «(ii) DA FATURA EMITIDA PELA "V..., Lda." Neste âmbito, refere o RIT a que se alude em G) do probatório conforme segue: «3.1.1.3 - Encargos não comprovados - registo facturas de favor “(…)” Neste contexto, cabe apreciar e decidir. Conforme decidiu o Tribunal Central Administrativo Norte, entre outros, no seu acórdão de 14 de Março de 2012: "I - No caso de facturas falsas à administração tributária compete fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, e caso a faça, passa a competir ao contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de contabilização como saída para pagamento. Acresce que, a Administração Tributária não tem de fazer a prova directa da simulação, isto é, a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil para que se verifique a simulação, sendo suficiente a prova indirecta a "factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras da experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova". Feita essa prova (indirecta), cabe ao contribuinte o ónus da prova de que as operações económicas subjacentes à contabilização como custo/dedução do imposto se realizaram efectivamente. No entanto, não lhe basta criar a dúvida sobre a sua veracidade, pois neste caso o artigo 100.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) não tem aplicação; na verdade, o ónus consagrado no artigo 100.°, n.° 1 do CPPT contra a Administração Tributária (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a Administração Tributária: "in dubio contra Fisco") apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como no caso sujeito, é ao contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos factos tributários em que se funda a dedução do imposto. Isto posto, vejamos então se no caso em apreço a Administração Tributária se fundou, com vista à correcção posta em crise, na existência de indícios sérios e objectivos, susceptíveis de permitirem a conclusão de que à factura em causa não correspondem operações reais. Conforme vimos, resulta do RIT a que se alude em G) do probatório que o cheque emitido pela Impugnante a favor da "V..., Lda.", no valor de 7.400,00 euros, foi "depositado numa conta no Banco 2... que não corresponde a nenhuma conta conhecida pertencente às entidades intervenientes", sendo que, o sócio gerente da "V..., Lda.", AA, prestou declarações no âmbito do procedimento inspectivo, no sentido de que tal cheque foi por si "endossado e entregue" ao sócio da Impugnante BB para pagamento de uma dívida pessoal contraída em 2002 sem que, todavia, tenham sido prestados mais esclarecimentos ou apresentados quaisquer elementos quanto à existência da aludida dívida. Mais resulta do RIT na parte acima transcrita, que o quadro de pessoal ao serviço da "V..., Lda.", "para além dos gerentes, motoristas e encarregados, apenas dispunha de profissionais com as categorias de Moldureiro, Montador de vidros, Lapidador de vidros e aprendiz 1° ano", sendo que, os serviços identificados na factura a que se alude em L) do probatório se referem, entre outros, a serviços de carpintaria, pintura e envernizamento. Ora, considera este Tribunal que as situações acabadas de aludir constituem indícios minimamente consistentes de que os serviços mencionados na factura em causa não correspondem a reais prestações de serviços. Nestes termos, passou a incumbir à Impugnante o ónus de provar que os serviços mencionados na factura sob análise se realizaram efectivamente e que tiveram a expressão pecuniária que consta da mesma, não lhe bastando criar a dúvida a esse propósito. Ora, compulsada a factualidade provada nestes autos, não resulta que os serviços descritos na factura a que se alude em L) dos factos provados foram efectivamente prestados à Impugnante pela "V..., Lda.", e pelo valor dela constante, pelo que, não tendo a Impugnante feito prova, conforme se lhe impunha, da materialidade das operações, improcede a sua pretensão nesta parte.» Não acompanhamos a sentença recorrida nas premissas gerais que enuncia sobre o que é o objecto do ónus da autoridade tributária em face do disposto no artigo 75º nº 2 a) da LGT. Com efeito, em face da conjugação dos artigos 74º nº 1 e 75º nº 2 alª a) da LGT, a AT, para legitimamente alterar a matéria colectável resultante da contabilidade apresentada pelo Contribuinte, não tem de fazer prova indirecta da simulação do negócio subjacente à factura ou documentado por outro meio na contabilidade do Sujeito Passivo, mas sim e apenas de provar efectivamente factos de que resultem indícios fundados disso mesmo, isto é, razões objectivas para, ao menos, se dever suspeitar fortemente de que o negócio subjacente à factura ou outros documento ou registo contabilísticos não ocorreu ou não ocorreu nos termos que nelas estão documentados. Mas já acompanhamos a sentença recorrida no juízo concreto que faz, dos indícios – assim entendidos – obtidos pela Inspecção tributária, de à factura da "V..., Lda." não corresponder negócio algum com os termos e objecto nela traduzidos. E consequentemente também a secundamos, na invocação da inversão, daí resultante, contra o contribuinte, do ónus da prova, no sentido de que, obtidos esses “indícios fundados” da simulação, é da Impugnante, tanto no procedimento como no processo, o ónus de provar a veracidade dos termos e do objecto daquele negócio. Para a validade de tal juízo julgamos especialmente relevante a circunstância da proximidade pessoal entre os gerentes da emissora e da tomadora da factura e os factos de não haver vestígios sindicáveis do meio de pagamento da mesma, designadamente por, na contabilidade de uma empresa o pagamento figurar como a dinheiro e na da "V..., Lda." figurar como cheque mas não depositado em conta conhecida da emissora – tudo numa altura em que já vigorava o artigo 63º-C) da LGT (na redacção da lei nº 55-B/2004 de 30/12) – de tão pouco haver vestígios, na contabilidade da emissora, das aquisições de meios humanos e materiais para as obras facturada, sendo certo que os meios próprios, atentos a actividade objecto da "V..., Lda." e o seu quadro de pessoal, não se prestavam ao fornecimento de trabalhos quejandos com meios próprios. Enfim, atenta a prova feita, no procedimento inspectivo, dos sobreditos circunstância e factos subjacentes a estes juízos, havia boas razões para se suspeitar de que a factura em causa da "V..., Lda." não correspondia a trabalhos por esta prestados ou prestados com os objecto e preço nela mencionados. Como assim, nos termos do artigo 75º nº 2º alª a) da LGT era efectivamente da recorrente o ónus de provar, no procedimento como no processo, que essas fortes suspeitas eram infundadas por ser verdadeiro o teor da factura. Não o logrou, como se viu na decisão sobre a matéria de facto, pelo que a resposta a esta questão é negativa. 4ª Questão A sentença recorrida errou, de todo o modo, no julgamento de Direito, violando o artigo 100º nº 1 do CPPT, ao confirmar na ordem jurídica as liquidações impugnadas, apesar de remanescer “uma dúvida fundada sobre a existência e a quantificação dos factos tributários relevados pelo Fisco” Desta feita acompanhamos sem reserva ou ressalva, o que expôs o Mª Juiz a quo a propósito da alegação de violação do invocado artigo 100º nº 1. Este artigo do CPPT – com qualquer outra norma jurídica – não pode ler-se isolado, mas no contexto do sistema que integra. Designadamente tem de conjugar-se com as regras do ónus da prova de cujas consequências in casu estivemos a tratar na abordagem da anterior questão. Assim, se a conjugação dos artigos 74º nº 1 75º nº 2 alª a) da LGT impõe a inversão do ónus da prova contra o contribuinte, uma vez provados pela AT os factos geradores de indícios fundados de que o facto documentado na contabilidade não ocorreu, fica logicamente prejudicado o sentido de uma qualquer aplicação do artigo 100º do CPPT relativamente a esse facto que era ónus do contribuinte provar. Como assim, é negativa, também, a resposta a esta última questão. Conclusão: Da rejeição do recurso quanto ao objecto das 1ª e segunda questões e do que julgámos ser o direito quanto às 3ª e 4ª questões resulta que o recurso improcede, indo a sentença recorrida totalmente confirmada. IV – Custas As custas do presente recurso ficam a cargo de Recorrente (artigo 527º do CPC). V- Dispositivo Tudo visto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso. Custas, pela Recorrente. Porto, 12/1/2023 Tiago Afonso Lopes de Miranda, Cristina da Nova Cristina Travassos Bento |