Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00282/13.8BEPNF |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/30/2025 |
| Tribunal: | TAF de Penafiel |
| Relator: | IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES |
| Descritores: | ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO; IMPUGNAÇÃO; 412º DO CPC; FACTO NOTÓRIO; QUESTÃO NOVA; |
| Sumário: | I. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto. II. O Recorrente não satisfaz o ónus impugnatório que sobe si recai quando omite a especificação dos pontos de facto que entende terem sido incorretamente julgados, uma vez que é essa indicação que delimita o objeto do recurso (artigo 640º CPC). III. Os factos notórios não carecem de prova nem de alegação, com base na máxima, notória non agent probatione, por serem já de conhecimento geral, são como que factos já provados, já esclarecidos. IV. O facto elencado na conclusão 7. das alegações de recurso não pode ser havido como notório, visto que o cálculo dos custos a atender para efeitos de cálculo da matéria tributável por referência aos “custos de controlados de construção”, atentas as características próprias destes últimos não é por conseguinte, percebido pela generalidade da população. V. Os recursos destinam-se a apreciar as decisões recorridas e não a conhecer “questões novas” não apreciadas nas decisões recorridas – arts. 627º nº 1, 635º nºs 2 e 3 e 639º nº 1 do CPC. VI. Assim, tal questão nova – que não é de conhecimento oficioso - é insusceptível de ser conhecida por este Tribunal ad quem enquanto tribunal de recurso de apelação.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A [SCom01...], Lda., (Recorrente), notificados da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Penafiel, datada de 19.05.2017, que julgou improcedente a impugnação, por si intentada, contra a liquidação de IRC do ano de 2009, no valor de €76.580,62, inconformada vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «(…) 1. A liquidação realizada pela administração fiscal apoiou-se exclusivamente nos valores que extraiu da escritura pública de constituição da propriedade horizontal do prédio dos autos. 2. Valores que, como é notório, e consequentemente, do conhecimento geral, não correspondem aos custos reais de construção do citado prédio. 3. Tendo presente as portarias em vigor no ano de construção do citado prédio, ou seja, em 2009, é de € 587,22 o custo do metro quadrado, de onde resulta que, se o prédio tivesse sido construído no âmbito do citado programa de custos controlados as 11 frações teriam custado a construir € 523.412,67. 4. Tendo a administração fiscal aceite o preço de transmissão dessas 11 frações em € 526.857,91, o lucro da recorrente apenas poderia ter sido liquidado um rendimento tributável de € 3.445,24. 5. O custo de construção em atividade normal é, no entanto, de € 650,00 a € 700,00 o m2, como também é do conhecimento geral, a determinar a inexistência de qualquer lucro da recorrente. 6. Tais factos não tinham de ser alegados nem comprovados como se extrai do disposto no artº 412º do C. P. Civil. 7. Assim, na douta sentença recorrida dever-se-ia ter dado como provado que o custo das 11 frações, sendo 10 entregues em dação em cumprimento e 1 vendida a terceiro, se situa entre os € 579.371,00 e os 623.938,00, em valores normais de mercado. Com o esclarecimento de que se tratasse de prédio construído no âmbito do programa de habitação de custos controlados, esse custo se situaria em € 523.412,67. 8. A administração fiscal fez, em consequência, uma errónea quantificação dos rendimentos da recorrente uma vez que se arrimou no valor de custo que a administração fiscal retirou da escritura de propriedade horizontal do citado prédio. Daí que segundo o carreado para os autos pela administração fiscal o custo das 10 frações da dação em cumprimento e de 1 fração vendida a terceiro é de € 255.625,54. Ora, tendo essas 11 frações 891,31 m2, o valor de custo que se extrai da escritura da propriedade horizontal é de € 286,78 por m2. Ainda segundo o alegado pela administração fiscal o preço declarado na escritura de dação em cumprimento (10 frações) e na venda de 1 fração, é de € 526.857,91. Consequentemente, foi através destes valores que a administração fiscal atribuiu um lucro à recorrente de € 271.232,37. 9. Dá-se aqui por reproduzido o teor dos depoimentos das testemunhas que se transcreve na parte dispositiva destas alegações. 10.. Desses depoimentos resulta que se devem dar como provados os seguintes factos: a) A liquidação impugnada respaldou-se na declaração apresentada pela ora impugnante. b) Declaração essa que o TOC da impugnante apresentou a conselho do técnico tributário que realizou a referida inspecção. c) TOC que acabou por ser substituído por se encontrar em estado de saúde que não lhe permitiu verificar antecipadamente o erro em que estava a laborar. d) Erro que, para além daquela influência do Técnico Tributário também se deveu ao facto de ser um serviço que lhe tinha sido apresentado recentemente, provindo de um colega que não apresentou as respectivas declarações. e) Confrontado com o erro, após se inteirar correctamente da situação junto da impugnante, e verificando a enormidade do resultado que causaria, esse TOC apresentou declaração rectificativa. f) Essa declaração rectificativa corresponde à verdade e à justiça fiscal. g) Desde 2006 a impugnante não têm qualquer lucro. 11. Na douta sentença recorrida além do consignado no art. 412º do C. P. Civil violou-se o disposto na alínea a) do art. 99º do CPPT. Termos em que deve merecer provimento o presente recurso e, por via disso, revogar-se a douta sentença recorrida e declarar-se a procedência total da impugnação, ou, subsidiariamente, a procedência parcial sendo o rendimento tributável reduzido à quantia de € 3.445,24, com todas as necessárias e legais consequências, em preito à JUSTIÇA» 1.2. A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 335 e ss. do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, cumpre aferir se a sentença sob recurso enferma de erro de julgamento de facto e, subsequente, erro de julgamento de direito, assente este na violação do disposto no artigo 412º do CPC e alínea a) do artigo 99º do CPPT. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 De facto 2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «A) Em 22/09/2009, a impugnante vendeu ao Fundo de Gestão de Património Imobiliário – FUNDO 1..., pessoa coletiva n.º ...44, 10 frações autónomas do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... ..., concelho ..., sob o artigo ...77, pelo valor global de €462.857,91 (relatório de inspeção tributária de fls. 11 verso a 16 verso do PA (RIT) e fls. 17 a 21 do PA). B) Em 07/09/2009, a impugnante vendeu a «AA», contribuinte fiscal n.º ...30, e «BB», contribuinte fiscal n.º ...45, a fração V do mesmo prédio, pelo valor de €64.000,00 (RIT e fls. 22 a 25 do PA). C) A impugnante não apresentou a declaração modelo 22 de IRC do ano de 2009 (relatório de inspeção tributária de fls. 11 verso a 16 verso do PA (RIT)). D) A impugnante foi sujeita a procedimento de inspeção ao IRC de 2009, por a administração tributária ter verificado que a impugnante não entregou a declaração a declaração modelo 22 de IRC do ano de 2009 e que realizou vendas de imóveis nesse ano no montante global de €526.857,91 (RIT). E) O procedimento de inspeção foi concluído com o relatório de inspeção tributária de fls. 51 a 55 verso do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido. F) Em 06/08/2012, no decurso do procedimento de inspeção, a impugnante entregou a declaração modelo 22 de IRC de 2009 que consta de fls. 33 a 34 verso do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido, em que declarou um resultado líquido do exercício, com um lucro tributável, de €271.232,37. G) Os valores declarados foram apurados nos termos referidos no RIT (RIT e fls. 26 a 34 do PA). H) Esta declaração deu origem à liquidação impugnada que apurou um imposto a pagar no valor de €70.314,08, da qual resultou um valor a pagar de €76.580,62 (fls. 34 a 41 do procedimento de reclamação graciosa apenso (PRG)). I) Em 23/08/2012, a impugnante apresentou a declaração modelo 22 de IRC de 2009, de substituição, que consta de fls. 19 a 22 do PRG, cujo teor aqui se dá por reproduzido, em que declarou um resultado líquido do exercício de €-114.182,66, com um prejuízo fiscal desse montante. J) Posteriormente ao procedimento de inspeção para o exercício de 2009, a impugnante foi sujeita a dois procedimentos de inspeção aos exercícios de 2008 e 2011 que procederam à correção à matéria tributável do IRC, por métodos indiretos, no valor de €8.678,60 e €5.514,69 (fls. 23 a 32 do PRG). Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga não provado: 1 – A declaração modelo 22 de IRC de 2009, referida em F), foi apresentada pelo técnico oficial de contas da impugnante a conselho do inspetor tributário que realizou o procedimento de inspeção. 2 – A declaração modelo 22 de IRC de 2009, de substituição, apresentada em 23/08/2012, referida em I), corresponde à verdade e à justiça fiscal. 3 – Em 2009 a impugnante não teve atividade. 3.1.1 – Motivação. O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos e pelos depoimentos das testemunhas e das declarações de parte. A matéria de facto julgada não provada resultou da insuficiência da prova e da prova do contrário. A matéria de facto julgada não provada no ponto 1 resultou da insuficiência da prova e da prova do contrário. A impugnante alegou que a declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2009 foi apresentada pelo seu técnico oficial de contas a conselho e sob a influência do Senhor inspetor tributário que o terá induzido a apresentar a declaração e a redigir a declaração junta ao relatório de inspeção tributária e que consta de fls. 56 do PRG. Porém, no seu depoimento, «CC», explicou de forma coerente, verosímil e credível as vicissitudes do procedimento de inspeção que estão relatados no respetivo relatório de inspeção tributária, reiterando e explicando o seu conteúdo. Do seu depoimento resulta que na realidade a declaração de fls. 56 do PRG subscrita pelo técnico oficial de contas da impugnante foi elaborada pelo técnico oficial de contas da impugnante para documentar os lançamentos contabilísticos realizados no ano de 2009, perante a falta de documentos de suporte dos custos de construção dos prédios vendidos. A testemunha esclareceu de forma cabal que a ideia da elaboração da referida declaração foi sua, mas que o teor do texto foi da autoria do técnico oficial de contas da impugnante e que relata fielmente, em síntese, as vicissitudes da ação inspetiva. Quais sejam: no procedimento de inspeção a impugnante e o seu técnico oficial de contas não apresentaram aos serviços de inspeção tributária quaisquer custos de construção dos prédios vendidos, nem a sua contabilização, porquanto por informação do técnico oficial de contas a impugnante não tinha a contabilidade organizada, nem qualquer documento de suporte dos custos de construção dos prédios vendidos. A única informação que havia era quanto aos proveitos o valor de venda das escrituras e quanto aos custos do exercício, para além das pequenas despesas consideradas no relatório de inspeção tributária e na declaração apresentada em 06/08/2012, não havia qualquer documento de suporte comprovativo dos custos de construção, nem qualquer contabilização desses custos. A única informação coerente que existia era o valor da construção constante da escritura de constituição da propriedade horizontal que tinha sido declarado pelos gerentes da impugnante e que na ausência de qualquer outra informação foi aceite pelos serviços de inspeção tributária e pelo técnico oficial de contas da impugnante, por ser um valor declarado pelos próprios gerentes da impugnante na referida escritura. Porém, os serviços de inspeção tributária e o Senhor inspetor tributário responsável pelo procedimento de inspeção não insistiram ou influenciaram o técnico oficial de contas a aceitar esse valor. Esse valor foi livremente aceite pelo técnico oficial de contas por não haver qualquer outro documento dos custos de construção. Com base nesse valor o custo de construção das frações vendidas foi apurado por mera operação aritmética de aplicação da permilagem de cada fração ao custo de construção do edifício declarado pelos gerentes da impugnante. Perante estas operações que ocorreram no decurso do procedimento de inspeção, o Senhor inspetor tributário sugeriu que o técnico oficial de contas fizesse uma declaração que comprovasse essas vicissitudes e procedimentos para comprovar como é que se chegou aos custos de construção e o motivo de se ter chegado por essa via. Todavia, a redação da declaração e a sua subscrição pelo técnico oficial de contas da impugnante não foi imposta ou sugerida pelos serviços de inspeção tributária ou pelo seu inspetor. Ele teve apenas a iniciativa e a ideia de fazer essa declaração, que o técnico oficial de contas aceitou livremente, para documentar a contabilização dos custos e proveitos do exercício de 2009 que serviram de base à declaração de rendimentos desse exercício que a impugnante decidiu livremente apresentar em 06/08/2012 e regularizar dessa forma a sua situação tributária do exercício. Em síntese, a declaração em causa limita-se a fazer uma súmula da informação da não contabilização dos custos de construção dos prédios vendidos, da inexistência de documento de suporte dos custos de construção, a razão dessa inexistência (por não ter sido entregue pela impugnante), a origem e o motivo do único valor de construção conhecido (por o valor do custo de construção constante da escritura da propriedade horizontal, ser o único documento com o valor da construção, valor declarado pelos gerentes da impugnante e como tal com o mínimo de credibilidade) e a forma de cálculo dos custos de construção (a multiplicação da permilagem de cada fração vendida ao custo de construção do respetivo edifício), apresentados à inspeção tributária e considerados para efeitos registo na contabilidade e para apuramento dos valores declarados na declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2009 apresentada em 06/08/2012. Conjugado este depoimento coma restante prova documental e testemunhal junta aos autos, o Tribunal ficou convencido que a declaração em causa é um relato das informações prestadas pela impugnante e seu técnico oficial de contas aos serviços de inspeção tributária, que foi livremente aceite pelos serviços de inspeção tributária e pela impugnante, não tendo sido por qualquer forma imposto ou induzido pelos serviços de inspeção tributária ou pelo Senhor inspetor responsável pelo procedimento de inspeção, motivo pelo qual se julgou não provada essa matéria de facto, por ter sido feita prova do contrário. Para além disso, sendo um facto constitutivo da ilegalidade da liquidação invocado pela impugnante, recaía sobre si o respetivo ónus da prova (art. 74.º, n.º 1, da LGT). Perante a insuficiência da prova produzida esse facto têm de ser julgado contra si, isto é, tem de ser julgado não provado (art. 414.º do CPC), à semelhança do que sucede também com a matéria de facto do ponto 2. No caso da matéria de facto julgada não provada no ponto 2 resulta da insuficiência da prova. A impugnante alega que a declaração de substituição apresentada em 23/08/2012, em que declara um prejuízo fiscal de €114.0182,66, corresponde à realidade e à verdade fiscal, porquanto teve em consideração o custo de construção efetivo dos prédios vendidos no ano de 2009. Para prova de tais factos a impugnante apresentou o documento junto aos autos na audiência contraditória, as declarações de parte e o depoimento da testemunha «DD». Porém, esta prova não foi suficientemente consistente e credível para convencer o Tribunal que a declaração de substituição de 23/08/2012 continha os valores reais da situação fiscal da impugnante e que considerou os verdadeiros custos de construção dos prédios vendidos em 2009. Vejamos. Do relatório de inspeção tributária e dos documentos juntos aos autos resulta que a impugnante não tinha a contabilidade organizada, nem documentos comprovativos dos custos de construção, factos que foram corroborados pelo técnico oficial de contas que acompanhou a realização do procedimento de inspeção e em reunião acordada com ele e com os gerentes da impugnante nas suas instalações. Dos documentos juntos aos autos e ao relatório de inspeção tributária resulta que a impugnante não tinha quaisquer documentos dos custos de construção para além de pequenas despesas e dos custos de construção declarados na escritura de constituição da propriedade horizontal, únicos elementos e documentos apresentados pelo seu técnico oficial de contas e que foram considerados no apuramento dos valores constantes da declaração modelo 22 de IRC de 2009 apresentada pela impugnante em 06/08/2012 e que coincidem com os valores apurados no relatório de inspeção tributária. Depois disso, a impugnante alega que encontrou os custos de construção que constam do documento junto à ata da audiência contraditória e que deram origem à declaração de substituição e aos valores nela declarados, alegadamente os valores reais dos custos de construção. Todavia, o documento apresentado pela impugnante não atesta o custo efetivo da construção dos prédios vendidos em 2009. O documento apresentado pela impugnante é um mero mapa com valores nele transcritos desconhecendo-se a sua origem e a comprovação dos mesmos. Isto é, perante esse documento, elaborado pela própria impugnante e/ou por pessoas a ela afetas, o Tribunal não sabe se os mesmos correspondem ou não à realidade e qual é a origem efetivos dos mesmos. O documento só pro si não atesta os custos efetivos de construção. Por outro lado, esse documento não tem validade contabilística. Acresce ainda que o Tribunal não pode valorar acriticamente o mesmo, quando estão juntos aos autos documentos que atestam que nessa época a impugnante informou os serviços de inspeção tributária que não tinha documentos dos custos de construção, nem os mesmos estavam contabilizados, apesar dos serviços de inspeção tributária terem notificado a impugnante para regularizar e apresentar a contabilidade. Na realidade não se compreende como é que a impugnante apresenta em 06/08/2012 uma declaração modelo 22 de IRC do ano de 2009 em que declara os valores que tem conhecimento e prova, por não ter quaisquer outros, e no dia 23/08/2012 apresenta uma declaração de substituição com base em alegados valores de custos de construção que apurou. Esta falta de verosimilhança é ainda reforçada pelo depoimento da testemunha «DD», que declarou ter ajudado a elaborar a declaração de substituição, quando afirma que a fez com base nas informações e valores apresentados pela impugnante que constam do documento junto aos autos com a ata da audiência contraditória, que os tomou como bons, mas que não sabe se esses valores eram ou não os valores efetivos/reais, tanto mais que não há ou não foram apresentados quaisquer documentos de suporte para esses custos. Ou seja, esta testemunha confirma que não sabe a origem dos valores apurados na declaração de substituição, nem se esses eram ou não os valores reais, até porque não fez a reconstituição da contabilidade da impugnante, sustentando-se nos saldos finais de 2008 que lhe foram apresentados, desconhecendo se estavam feitas as regularizações e os apuramentos. A testemunha reconhece até que os valores do mapa que lhe apresentaram podiam não ser reais, se não forem do inventário permanente ou se não revelarem as regularizações e os apuramentos. Acresce ainda que o referido mapa contém o valor dos custos de construção de todos os prédios da impugnante e não faz qualquer distinção e discriminação dos custos de construção de cada edifício (o mapa tem um valor do custo de construção para os edifícios de ..., ..., Duas ..., denominado Edifício 1... e para o denominado Edifício 2...), nem de cada prédio em particular, isto é, de cada fração autónoma vendida. Estas insuficiências e incoerências da prova documental abalam a credibilidade do depoimento da testemunha «DD» e das declarações de parte quando pretendem fazer crer que os valores constantes das declarações de substituição apresentada em 23/08/2012, são os valores reais da impugnante. No que respeita aos custos de construção, as declarações de parte da impugnante e da testemunha «DD» também são insuficientes para comprovar que os custos de construção são superiores aos contantes da declaração da escritura de constituição da propriedade horizontal, não só por serem abalados pelas referidas incongruências, como por não estarem acompanhadas de qualquer prova que revele, ainda que indiciariamente, os custos efetivos da construção dos prédios vendidos. Com efeito, a impugnante não só não apresentou aos serviços de inspeção tributária, como não apresentou neste Tribunal os documentos comprovativos dos custos de construção, nem a sua contabilização. Aqui sublinha-se mais uma vez o depoimento da testemunha «DD» que declara que não sabe se o técnico oficial de contas da impugnante tinha os custos da contabilidade de 2008, quando o técnico oficial de contas afirmou aos serviços de inspeção tributária que não possuía nenhuma informação dos custos de construção para além dos apresentados e considerados no relatório de inspeção tributária e nos valores apurados na declaração modelo 22 de IRC de 2009 apresentada em 06/08/2012. “As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos” (art. 341.º do Código Civil (CC)). No caso dos autos, a prova produzida pela impugnante não foi suficientemente consistente, coerente e credível para julgar provados os factos alegados por si, relevantes para a decisão da causa, que foram julgados não provados. Sendo factos alegados pela impugnante e constitutivos do seu direito, competia à impugnante alegar e provar tais factos (art. 74.º, n.º 1, da LGT), enquanto factos constitutivos do seu direito, ou seja, da ilegalidade das liquidações impugnadas. Todavia, apesar de ter alegado tais factos, a impugnante não logrou comprová-los, porquanto a prova por declarações de parte e testemunhal carreada para os autos não revelou consistência e assertividade bastante para convencer o Tribunal desses factos, pelas incongruências e inconsistências supra referidas. Perante a insuficiência da prova produzida pela impugnante os factos relevantes para a decisão da causa têm de ser julgado contra si, isto é, tem de ser julgados não provados (art. 414.º do CPC). Por isso o Tribunal julgou não provada a matéria de facto constante dos pontos 1 e 2. A matéria de facto julgada não provada no ponto 3 resultou da prova do contrário. A prova carreada para os autos pela administração tributária no relatório de inspeção tributária e pela própria impugnante revela que no exercício de 2009 a impugnante teve atividade. A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa, designadamente no que respeita à alegada permuta invocada na petição inicial, porquanto resulta das próprias declarações de parte da impugnante e do depoimento das testemunhas, que os prédios em causa nestes autos não foram objeto de permuta.» 2.2. De direito A recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Penafiel que, no âmbito de impugnação judicial do despacho de indeferimento de reclamação graciosa deduzida contra a liquidação de IRC do ano de 2009 e juros compensatórios, a julgou improcedente. In casu, [SCom01...], Ld.ª foi objecto de uma inspecção tributária por não ter entregue a declaração de modelo 22 para o ano de 2009 e, no decurso desse procedimento veio a entregar a referida declaração de IRC em falta, no âmbito da qual declarou um resultado líquido do exercício, com um lucro tributável declarado de €271.232,37, a qual deu origem à liquidação impugnada em que os SIT apuraram imposto devido de €70.314,08, e o valor a pagar acrescido de juros compensatórios de €76.580,62. Impugnou-a alegando, em síntese, que a declaração que apresentou está errada e a que a declaração rectificativa que entregou posteriormente em que declara prejuízo fiscal, é que corresponde à verdade fiscal, pelo que, nada há a liquidar no ano de 2009, que não teve qualquer actividade no exercício de 2009, a que acresce um aclamado erro de quantificação, porquanto o valor apurado de imposto para 2009 não podia ser superior aos apurado pela AT para os exercícios de 2008 e 2001, também estes alvos de inspecção. O Tribunal a quo conhecendo considerou que “(...) da matéria de facto julgada provada, não provada e da respetiva motivação resulta que a impugnante teve atividade no exercício de 2009 e que não apresentou as respetivas declarações fiscais, motivo pelo qual a administração tributária instaurou o respetivo procedimento de inspeção tendente a apurar a matéria tributável com vista à liquidação do respetivo IRC” de que “(...) a liquidação impugnada não padece de qualquer ilegalidade porquanto resultou da própria declaração da impugnante.” e, bem assim, que “(...)a impugnante não logrou demonstrar que os valores declarados na declaração de substituição apresentada em 23/08/2012 correspondem efetivamente à realidade.”. Por último, de que “(...) não tem razão, porquanto a tributação de 2008 e 2011 resultou de ações inspetivas diferentes da do ano de 2009, que acabou por dar origem à liquidação impugnada, que apurou a matéria tributável da impugnante por métodos indiretos, ao passo que no caso do exercício de 2009 a matéria tributável foi apurada pela própria declaração da impugnante”. O exposto, permite com clarividência constatar as questões tratadas na presente impugnação judicial e que foram identificadas e conhecidas em sede de decisão. Atentemos, de que cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, cujo objeto do recurso se encontra delimitado pelas conclusões das respetivas alegações - cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), e que se centram em saber, em suma, se a sentença incorre em erro de julgamento da matéria de facto e, bem assim, no subsequente erro de julgamento de direito circunscrito à violação do disposto no artigo 412º do CPC e alínea a) do artigo 99º do CPPT. Nas conclusões 9. a 10. da minuta do recurso, o Recorrente assaca à sentença recorrida o erro de julgamento de facto, concretamente quanto à apreciação da prova testemunhal produzida, pugnando pelo aditamento do seguinte acervo probatório: “a) A liquidação impugnada respaldou-se na declaração apresentada pela ora impugnante. b) Declaração essa que o TOC da impugnante apresentou a conselho do técnico tributário que realizou a referida inspecção. c) TOC que acabou por ser substituído por se encontrar em estado de saúde que não lhe permitiu verificar antecipadamente o erro em que estava a laborar. d) Erro que, para além daquela influência do Técnico Tributário também se deveu ao facto de ser um serviço que lhe tinha sido apresentado recentemente, provindo de um colega que não apresentou as respectivas declarações. e) Confrontado com o erro, após se inteirar correctamente da situação junto da impugnante, e verificando a enormidade do resultado que causaria, esse TOC apresentou declaração rectificativa. f) Essa declaração rectificativa corresponde à verdade e à justiça fiscal. g) Desde 2006 a impugnante não têm qualquer lucro.” Vejamos. Preceitua o disposto no nº 1 do artigo 627.º do CPC que “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos”. O recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é convocado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos. Nesta senda, quer a alteração da matéria de facto ou errada apreciação e valoração da prova, pressupõe o erro do julgamento de facto, o qual ocorre quando, da confrontação dos meios de prova produzidos e dos factos dados por provados ou não provados, resulta que o julgamento efectuado é desconforme com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto. O artigo 607º, n.º 5 do CPC, ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova estabelece como princípio orientador que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova. No entanto, a actividade de valoração da prova não é arbitrária, estando vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e pelas restrições legais. Com efeito, o princípio da livre apreciação da prova concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração da prova produzida que deverá encontrar justificação na fundamentação lógica e racional, na sentença permitindo seu escrutínio quer pelas partes quer pelo tribunal de recurso. Segundo este princípio, e por força do artigo 655.º do CPC o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350.º, nº 1, 358.º, 371.º e 376.º, todos do Código Civil, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais. Razão pela qual se sufraga que o princípio da livre apreciação da prova e o princípio da imediação de algum modo limitam o reexame da matéria de facto fixada no Tribunal a quo, pelo que o controle por parte do Tribunal ad quem se restringe aos casos de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais apontarem inequivocamente em sentido diverso. O erro deve ser demonstrado pelo recorrente, delimitando o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera incorrer em erro e fundamentar as razões da sua discordância, especificando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida. Impondo, o artigo 640.º do CPC, de que, para que o TCA possa proceder alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. No caso de se tratar de prova testemunhal, tal imposição cumpre-se através da indicação exacta das passagens da gravação bem como as concretas questões de facto controvertidas, com indicação, no seu entender, de qual a decisão alternativa deve ser proferida pelo tribunal de recurso, em sede de reapreciação dos meios de prova, relevantes, não sendo permitidos recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto. Aqui chegados estamos aptos a delinear que decorrente do ónus de alegar e formular conclusões, in casu impostas pelo artigo 282º do CPPT e 640º do CPC, nos casos em que a recorrente ovacione a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, está implícito o triplo ónus previsto em cada uma das três alíneas do n.º 1 do art. 640.º do CPC e que consiste na obrigação de i) circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento, ii) fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa e iii) enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas [vide acórdão do STA de 13.09.2023, proferido no âmbito do processo n.º 501/08.2BEVIS]. Estamos cientes de que a observância do triplo ónus previsto no artigo 640º do CPC deve ser analisado pelo Tribunal de recurso à luz de um critério de proporcionalidade e de razoabilidade [vide acórdão do STA de 03.11.2022, proferido no processo com o n.º 118/10.1BEPNF]. No entanto, não podemos deixar de evidenciar que a recorrente não respeitou o ónus previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 640º do CPC, concretizando não indicou quais os concretos pontos da matéria de facto (positiva ou negativa) que considera incorrectamente julgados, sendo certo que os factos que pretende ver reconduzidos ao probatório, foram abrangidos pelo julgamento de facto realizado pelo Tribunal a quo e prolixa motivação que o acompanha. São disso exemplo os itens F), G) e I) da matéria de facto dada como provada e a matéria de facto dada como não provada sob os itens 1. a 3.. Mais se diga que a recorrente expressa que do teor dos depoimentos reproduzidos no corpo das alegações, resulta dos mesmos como provados os factos que elenca, sendo estes factos recalcados daqueles que elencou em sede de alegações pré-sentenciais, olvida é um qualquer ataque critico, juízo de valoração sobre a motivação subjacente ao julgamento de facto. Perscrutados os depoimentos, e cientes do seu teor, atentemos à motivação supra, que tão bem exprime a apreciação e justificação lógica que presidiu ao julgamento de facto, que aqui reproduzimos por extracto: «A impugnante alegou que a declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2009 foi apresentada pelo seu técnico oficial de contas a conselho e sob a influência do Senhor inspetor tributário que o terá induzido a apresentar a declaração e a redigir a declaração junta ao relatório de inspeção tributária e que consta de fls. 56 do PRG. Porém, no seu depoimento, «CC», explicou de forma coerente, verosímil e credível as vicissitudes do procedimento de inspeção que estão relatados no respetivo relatório de inspeção tributária, reiterando e explicando o seu conteúdo. Do seu depoimento resulta que na realidade a declaração de fls. 56 do PRG subscrita pelo técnico oficial de contas da impugnante foi elaborada pelo técnico oficial de contas da impugnante para documentar os lançamentos contabilísticos realizados no ano de 2009, perante a falta de documentos de suporte dos custos de construção dos prédios vendidos. A testemunha esclareceu de forma cabal que a ideia da elaboração da referida declaração foi sua, mas que o teor do texto foi da autoria do técnico oficial de contas da impugnante e que relata fielmente, em síntese, as vicissitudes da ação inspetiva. Quais sejam: no procedimento de inspeção a impugnante e o seu técnico oficial de contas não apresentaram aos serviços de inspeção tributária quaisquer custos de construção dos prédios vendidos, nem a sua contabilização, porquanto por informação do técnico oficial de contas a impugnante não tinha a contabilidade organizada, nem qualquer documento de suporte dos custos de construção dos prédios vendidos. A única informação que havia era quanto aos proveitos o valor de venda das escrituras e quanto aos custos do exercício, para além das pequenas despesas consideradas no relatório de inspeção tributária e na declaração apresentada em 06/08/2012, não havia qualquer documento de suporte comprovativo dos custos de construção, nem qualquer contabilização desses custos. A única informação coerente que existia era o valor da construção constante da escritura de constituição da propriedade horizontal que tinha sido declarado pelos gerentes da impugnante e que na ausência de qualquer outra informação foi aceite pelos serviços de inspeção tributária e pelo técnico oficial de contas da impugnante, por ser um valor declarado pelos próprios gerentes da impugnante na referida escritura. Porém, os serviços de inspeção tributária e o Senhor inspetor tributário responsável pelo procedimento de inspeção não insistiram ou influenciaram o técnico oficial de contas a aceitar esse valor. Esse valor foi livremente aceite pelo técnico oficial de contas por não haver qualquer outro documento dos custos de construção. Com base nesse valor o custo de construção das frações vendidas foi apurado por mera operação aritmética de aplicação da permilagem de cada fração ao custo de construção do edifício declarado pelos gerentes da impugnante. Perante estas operações que ocorreram no decurso do procedimento de inspeção, o Senhor inspetor tributário sugeriu que o técnico oficial de contas fizesse uma declaração que comprovasse essas vicissitudes e procedimentos para comprovar como é que se chegou aos custos de construção e o motivo de se ter chegado por essa via. Todavia, a redação da declaração e a sua subscrição pelo técnico oficial de contas da impugnante não foi imposta ou sugerida pelos serviços de inspeção tributária ou pelo seu inspetor. Ele teve apenas a iniciativa e a ideia de fazer essa declaração, que o técnico oficial de contas aceitou livremente, para documentar a contabilização dos custos e proveitos do exercício de 2009 que serviram de base à declaração de rendimentos desse exercício que a impugnante decidiu livremente apresentar em 06/08/2012 e regularizar dessa forma a sua situação tributária do exercício. Em síntese, a declaração em causa limita-se a fazer uma súmula da informação da não contabilização dos custos de construção dos prédios vendidos, da inexistência de documento de suporte dos custos de construção, a razão dessa inexistência (por não ter sido entregue pela impugnante), a origem e o motivo do único valor de construção conhecido (por o valor do custo de construção constante da escritura da propriedade horizontal, ser o único documento com o valor da construção, valor declarado pelos gerentes da impugnante e como tal com o mínimo de credibilidade) e a forma de cálculo dos custos de construção (a multiplicação da permilagem de cada fração vendida ao custo de construção do respetivo edifício), apresentados à inspeção tributária e considerados para efeitos registo na contabilidade e para apuramento dos valores declarados na declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2009 apresentada em 06/08/2012. Conjugado este depoimento com a restante prova documental e testemunhal junta aos autos, o Tribunal ficou convencido que a declaração em causa é um relato das informações prestadas pela impugnante e seu técnico oficial de contas aos serviços de inspeção tributária, que foi livremente aceite pelos serviços de inspeção tributária e pela impugnante, não tendo sido por qualquer forma imposto ou induzido pelos serviços de inspeção tributária ou pelo Senhor inspetor responsável pelo procedimento de inspeção, motivo pelo qual se julgou não provada essa matéria de facto, por ter sido feita prova do contrário. Quanto à prova que decorre dos contornos que mediaram a apresentação da declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2009 apresentada pelo técnico oficial de contas da recorrente, do transcrito é patente a valoração fundamentada e devidamente pormenorizada das razões que levaram o julgador a fixar a factualidade constante do probatório, o que permitiria por parte da recorrente sindicar as razões que fundaram o seu iter cognoscitivo, o que de todo não logra. E, o mesmo se diga, quanto à pretensão de que a declaração rectificativa, da qual discorre prejuízo fiscal, é a que corresponde à verdade e à justiça fiscal, em que a motivação discorre sobre a falta de prova documental verossímil da declaração, a que acresce o patenteado do teor do depoimento da testemunha «DD». Por último, e quanto à falta de actividade pela recorrente, é manifesto atento o acervo probatório constante do RIT, carreado para os autos e da posição manifestada pela recorrente no decurso do mesmo revela a existência de actividade no exercício de 2009, mormente pela realização da venda dos imóveis. Dir-se-á, por último, que a modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada e aprendida pela 1ª instância, só se justificaria se, feita a reapreciação por este tribunal, fosse evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada na instância recorrida, o que, efectivamente não sucedeu. Face ao exposto, rejeita-se o recurso nesta parte. Estando decidida a questão relativa ao invocado erro no julgamento da matéria de facto, importa agora apurar em que termos é exigido a este Tribunal ad quem a apreciação do pretenso erro de julgamento de direito. Conforme é sabido o recurso visa a reponderação do que ficou decidido na sentença, pelo que compete ao recorrente explicar em que segmento da sentença é necessária essa reponderação, devendo apresentar a sua motivação contra o que ficou fundamentado na sentença e não limitar-se a repetir a ilegalidade do acto impugnado. É que os recursos jurisdicionais visam a sindicância das decisões recorridas, pelo que o que neles releva é o conteúdo real destas decisões e o ataque que é efetuado a tal conteúdo. Os recursos jurisdicionais visam modificar as decisões de que se recorre e não criar decisões sobre matéria nova, não sendo lícito às partes suscitar questões que se não contenham dentro desses limites. O recurso jurisdicional destina-se a rever as decisões recorridas, dentro dos fundamentos por que se recorreu, face ao princípio do dispositivo das partes, que opõem ao julgado as razões, de facto e de direito, da sua dissidência, sintetizando-as nas conclusões da alegação e assim determinando o objeto de cognição do tribunal ad quem. É assim o recurso jurisdicional um pedido de reapreciação do julgamento a quo e não um pedido de reapreciação da legalidade do acto liquidação impugnado â luz de novos argumentos [neste sentido, cfr. Acs. STA (Pleno da Secção Administrativa) de 15/11/2012 (0159/11), de 16/2/2012 (0304/09), de 7/2/2001 (035820) e de 18/2/2000 (036594)]. Assim, o recorrente deve explicar porque é que o raciocínio efectuado na sentença está incorreto, em relação àquele caso concreto, não bastando a formulação genérica de que andou mal, sem qualquer respaldo no julgado. É que a sentença conheceu exactamente das questões que lhe tinham sido colocadas, dando resposta a cada uma delas, como aludimos supra, portanto, o recurso tinha de ir um a um dos fundamentos da sentença e rebatê-los, explicando onde se encontrava fundamento diferente para que a decisão fosse outra. Ora, à excepção das conclusões 9. a 10., em que se alcança a imputação de erro de julgamento de facto, supra apreciado, nas restantes conclusões não descortinamos um qualquer ataque ao julgado e decidido. Efectivamente o presente recurso não realiza tal labor, pelo que o Tribunal de recurso fica sem saber afinal onde é que a sentença terá errado, pois nunca lhe é indicada a alternativa concreta contrária ao que a sentença explanou no seu discurso fundamentador. Atentemos ao discorrido nas conclusões 1. a 8., se bem que possamos reconhecer nas mesmas um raciocínio lógico e plausível, o mesmo surge como questão nova, sendo manifesto que não pode a recorrente pretender nesta sede a apreciação ex novo de um fundamento não articulado por si em sede própria (vide petição). Vejamos. Sustenta a recorrente que “A liquidação realizada pela administração fiscal apoiou-se exclusivamente nos valores que extraiu da escritura pública de constituição da propriedade horizontal do prédio dos autos. / Valores que, como é notório, e consequentemente, do conhecimento geral, não correspondem aos custos reais de construção do citado prédio/ Tendo presente as portarias em vigor no ano de construção do citado prédio, ou seja, em 2009, é de € 587,22 o custo do metro quadrado, de onde resulta que, se o prédio tivesse sido construído no âmbito do citado programa de custos controlados as 11 frações a construir teriam custado € 523.412,67. / Tendo a administração fiscal aceite o preço de transmissão dessas 11 frações em € 526.857,91, o lucro da recorrente apenas poderia ter sido liquidado um rendimento tributável de € 3.445,24. / O custo de construção em atividade normal é, no entanto, de € 650,00 a € 700,00 o m2, como também é do conhecimento geral, a determinar a inexistência de qualquer lucro da recorrente.” razão pela qual, o Tribunal a quo deveria oficiosamente ter dado como provado que “(...) o custo das 11 frações, sendo 10 entregues em dação em cumprimento e 1 vendida a terceiro, se situa entre os € 579.371,00 e os 623.938,00, em valores normais de mercado. Com o esclarecimento de que se tratasse de prédio construído no âmbito do programa de habitação de custos controlados, esse custo se situaria em € 523.412,67.” e, que perante o mesmo é patente a errónea quantificação da liquidação [artigo 99º alínea a) do CPPT]. E, dizemos nós oficiosamente, porque é a própria recorrente que reconhecendo estar perante uma tese peregrina nos autos aclama que “Tais factos não tinham de ser alegados nem comprovados como se extrai do disposto no artº 412º do C. P. Civil”. Dispõem o artigo 412º do COC que: “1 – Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral. 2 – Também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções; quando o tribunal se socorra destes factos, deve fazer juntar ao processo documento que os comprove.” Assim, factos notórios são aqueles que são do conhecimento geral da população, que não necessitam de alegação nem mesmo de qualquer prova para que possam ser considerados, cabendo ao juiz considerá-los por sua iniciativa (motu proprio), ou do conhecimento do tribunal mediante o exercício das suas funções (por ex., através do exercício funcional em processo pendente), com o complemento da junção de documento comprovativo para o efeito. Segundo Alberto dos Reis que acompanhamos, «os factos notórios podem classificar-se em duas grandes categorias: a) Acontecimentos de que todos se aperceberam directamente (uma guerra, um ciclone, um eclipse total, um terramoto, etc.); b) Factos que adquirem o caracter de notórios por via indirecta, isto é, mediante raciocínios formados sobre factos observados pela generalidade dos cidadãos (De Stefano, Il notório, pag. 59). Quanto aos primeiros não pode haver dúvidas. Quanto aos segundos, o juiz só deve considerá-los notórios se adquirir a convicção de que o facto originário foi percebido pela generalidade dos portugueses e de que o raciocínio necessário para chegar ao facto derivado estava ao alcance do homem de cultura média» (Código de Processo Civil Anotado, Volume III, em anotação ao então artigo 518º, página 262), Pode, pois, afirmar-se, que os factos notórios dispensam a prova, porque já gozam do conhecimento geral no lugar e no tempo em que o processo se desenrola, contendo em si mesmos, uma prova pré constituída, formada anteriormente ao processo e munida de maiores garantias externas do que as que o processo poderia dar. Na verdade, os factos notórios não carecem de prova nem de alegação, com base na máxima, notória non agent probatione, por serem já de conhecimento geral, são como que factos já provados, já esclarecidos. À luz deste ensinamento, o facto cuja pretensão se arroga a recorrente a inscrever ex novo na materialidade provada, não pode ser havido como notório, visto que em momento algum do procedimento inspectivo, reclamação graciosa ou no âmbito do processo em 1ª instância a questão e/ou o argumento do recurso “aos custos controlados” de construção, por referência aos programas de habitação então em curso em 2009, para alcançar um valor de custo de construção foi abordado por qualquer um dos intervenientes, por outro os valores de “custos controlados de construção” em vigor no âmbito de programas de habitação, não são, percebidos pela generalidade da população. É que, os custos controlados de construção referem-se a habitações construídas ou reabilitadas com apoio do Estado, que devem obedecer a limites de área e preços de venda ou renda, ou para arrendamento acessível. Estes projetos visam garantir preços acessíveis e contribuir para a resolução da crise habitacional, com benefícios fiscais e financeiros para os promotores e adquirentes. A habitação a custos controlados (HCC) é um mecanismo para tornar a habitação mais acessível, especialmente para famílias com rendimentos mais baixos. O Estado intervém através de apoios financeiros, fiscais e regulamentares, para que os imóveis sejam construídos ou reabilitados a preços controlados. Portanto, o facto que se pretende ver aditado à matéria dos factos provados não é do conhecimento do comum das pessoas - não é facto notório- daí que improcede, nesta parte, o recurso, bem como a discussão que pretendia mover com o aditamento, qual fosse apreciação da errónea quantificação à luz de um novo argumento, o que manifestamente está vedado a este Tribunal ad quem. Em termos gerais, as questões suscitadas pela recorrente nas suas conclusões 1. a 8. alavancam-se numa pretendida reapreciação da errónea quantificação, mormente dos custos de construção relevados para alcançar o lucro tributável, e porque o Tribunal a quo sobre ela não se pronunciou, nem tinha, e sobre aquelas que se pronunciou em conformidade com as questões que lhe haviam sido colocadas pela recorrente, para além do aditamento de facto supra conhecido, não deduz qualquer pretensão recursiva a invocar a apreciação de mérito por este TCA Norte, improcede in totum o recurso. 2.3. Conclusões I. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto. II. O Recorrente não satisfaz o ónus impugnatório que sobe si recai quando omite a especificação dos pontos de facto que entende terem sido incorretamente julgados, uma vez que é essa indicação que delimita o objeto do recurso (artigo 640º CPC). III. Os factos notórios não carecem de prova nem de alegação, com base na máxima, notória non agent probatione, por serem já de conhecimento geral, são como que factos já provados, já esclarecidos. IV. O facto elencado na conclusão 7. das alegações de recurso não pode ser havido como notório, visto que o cálculo dos custos a atender para efeitos de cálculo da matéria tributável por referência aos “custos de controlados de construção”, atentas as características próprias destes últimos não é por conseguinte, percebido pela generalidade da população. V. Os recursos destinam-se a apreciar as decisões recorridas e não a conhecer “questões novas” não apreciadas nas decisões recorridas – arts. 627º nº 1, 635º nºs 2 e 3 e 639º nº 1 do CPC. VI. Assim, tal questão nova – que não é de conhecimento oficioso - é insusceptível de ser conhecida por este Tribunal ad quem enquanto tribunal de recurso de apelação, 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas a cargo da recorrente. Porto, 30 de abril de 2025 Irene Isabel das Neves (Relatora) Cristina da Nova (1.ª Adjunta) Carlos de Castro Fernandes (2.º Adjunto) |