Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00804/20.8BEBRG-S1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/12/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:MARIA CLARA ALVES AMBROSIO
Descritores:DISPENSA DE REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA;
TRÂNSITO EM JULGADO; PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO JURISDICIONAL;
PRAZO SUPLEMENTAR; PRAZO DE CONDESCENDÊNCIA;
Sumário:
I. A dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem lugar, de acordo com o nº 7 do artº 6º do RCP, com o trânsito em julgado da decisão final do processo.

II. O alargamento de prazo de recurso, pelo prazo suplementar de 10 dias, como decorre desde logo do texto da norma aplicável (artigo 144, nº4 do CPTA), depende da efectiva interposição de recurso para reapreciação da prova gravada com objecto dirigido à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, sustentada na reapreciação de prova produzida e gravada em audiência final.


III. Na contagem do prazo de interposição de recurso e que releva para efeito de apurar qual o momento em que ocorre o trânsito em julgado e, por consequência, da tempestividade da apresentação de requerimento de dispensa/redução de pagamento do remanescente da taxa de justiça, só será contabilizado o prazo de condescendência de três dias úteis previsto no artigo 139.º, n.º 5, do CPC ex vi artº 1º do CPTA, se tiver sido interposto recurso da sentença proferida bem assim como se tiver sido paga a respectiva multa.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção Administrativa, Subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Norte,

I. RELATÓRIO
Na presente ação em que figura como A., [SCom01...], S.A. e R., MUNICÍPIO ..., foi proferida sentença em 16/1/2024 (notificada às partes por ofício datado de 17/1/2024) que julgou a acção totalmente improcedente, condenando a A. nas custas do processo ao abrigo do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do CPTA, artigo 6.º, n.º 1 e tabela I-A do RCP.
A A. através de requerimento que apresentou nos autos em 22/2/2024, veio, nos termos do disposto no artigo 6º, n.º 7, do RCP, requerer a dispensa ou a redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
O MP junto do Tribunal de 1ª instância emitiu parecer em 20/3/2024, do seguinte teor: Constata-se agora que o requerimento da Autora com vista à dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça é posterior ao trânsito em julgado da sentença. Na verdade, a sentença proferida nos autos transitou em julgado em 21 de fevereiro de 2024 e o requerimento da Autora deu entrada no processo no dia seguinte, 22 de fevereiro. Ora, nos termos do Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ n.º 1/2022, de 3 de janeiro, “A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo”. Assim, o requerimento da Autora é extemporâneo, os termos da jurisprudência fixada no citado acórdão, porquanto o poder jurisdicional do juiz fica esgotado após prolação da sentença, nomeadamente quanto à interferência de movos que justifiquem uma determinada quantia de taxa de justiça. A este entendimento não obsta, parece-nos, o facto do requerimento da Autora para dispensa do remanescente ter dado entrada no dia seguinte ao do trânsito em julgado da sentença, porquanto a jurisprudência tem sido consensual no sendo de que não relevam, para o efeito da data do trânsito em julgado, os 3 dias úteis durante os quais o ato ainda pode ser pracado com o pagamento de uma multa (ao abrigo do art. 139.º, n.º 5, do CPC), pois, como refere esta norma, trata-se dos “três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo”. Conclui-se, salvo melhor opinião, que, tendo a sentença proferida nos autos transitado em julgado em 21 de fevereiro de 2024, precludiu nesta data o direito da Autora de requerera dispensa do pagamento da taxa de justiça”.
Em 21/3/2024 foi proferido despacho que indeferiu o requerido, com o fundamento na sua extemporaneidade e que é do seguinte teor:
Em 16-01-2024 foi proferida sentença nos presentes autos que julgou a ação totalmente improcedente e condenou a Autora em custas, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do CPTA, artigo 6.º, n.º 1 e tabela I-Ado RCP.
Por ofícios de 17-01-2024 foram as partes notificadas da mencionada sentença, conforme se extrai de fls. 1608 e 1609 do Sitaf.
Em22-02-2024, a Autora apresentou requerimento de dispensa do pagamento do remanescente de taxa de justiça. Ora, a Lei n.º 7/2012, de 13.01, introduziu, no RCP, o n.º 7 do artigo 6.º, onde estabelece que: “Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.” A primeira questão que se coloca neste caso é saber qual o prazo de que dispõe o interessado para formular a pretensão de dispensa e se o requerimento em apreço foi apresentado dentro desse prazo. E tal como evidencia a DMMP no seu parecer, a questão da oportunidade do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, foi já objeto de uniformização de jurisprudência, através do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 1/2022, de 10.11.2021, publicado no DR Série I, de 03.01.2022, no qual se decidiu que a “preclusão do direito de requerera dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo”. O que significa que o direito de as partes requererem a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, se extingue com o trânsito em julgado da decisão final do processo (no caso, operada pela sentença proferidaem16-01-2024). Sucede que, no caso, o requerimento apresentado pela Autora não é tempestivo. A notificação da sentença proferida nos autos (que ocorreu em 17-01-2024) presume-se efetuada no dia 22-01-2024 (segunda-feira, 1.º dia útil seguinte), e contado o prazo de 30 dias para interposição de recurso (cf. artigo 141.º, n.º 1 do CPTA, na medida em que só com a efetiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias - artigo 144.º, n.º 4 do CPTA; como também o prazo de três dias úteis conferidos pelo artigo 139.º apenas releva para o efeito de determinação do trânsito em julgado, se for exercido o direito conferido por tal norma), o seu termo situa-se, pois, no dia 21-02- 2024. Não tendo sido objeto de recurso, a sentença transitou em julgado no dia 21-02- 2024. Donde, tal como conclui a DMMP no seu parecer de fls. 1643 do Sitaf, em22- 02-2024, data em que a Autora apresentou o requerimento de dispensa, mostra-se precludido o direito que pretendia fazer valer. Nestes termos, indefere-se a requerida dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas. Custas do incidente a cargo da Requerente, que se fixa no mínimo legal”.
Inconformada com tal decisão, dela recorre a A., pugnado pela procedência do recurso, com a revogação do despacho recorrido, que entende deve ser substituído por outro que, declarando a tempestividade do pedido de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6º, n.º 7, do RCP, emita pronúncia sobre o mesmo, ou, em via subsidiária, para o caso de se considerar ter o mesmo sido apresentado no 1º dia útil subsequente ao termo do prazo, ordene o cumprimento pela secretaria do disposto no artigo 139º, n.º 6, do CPC, seguindo-se os ulteriores termos da lei.
Termina a sua motivação com as seguintes conclusões:
“I. O recurso vem interposto do douto despacho de 21.03.2024, que indeferiu o pedido formulado pela aqui Recorrente de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça e a condenou nas custas do incidente, no mínimo legal.
II. A questão a decidir passa por determinar se, estando a definição do prazo para a prática de um ato processual (o pedido de dispensa/redução do remanescente da taxa de justiça) dependente da fixação da data do trânsito em julgado da douta sentença, esta deve considerar ou não o prazo adicional de 10 dias referido no artigo 144º, n.º 4, do CPTA.
III. A douta sentença proferida nos autos era passível de recurso no prazo de 30 dias, a que acresciam mais 10, caso o mesmo tivesse por objeto a reapreciação da prova gravada, pelo que a mesma não podia ter-se por transitada no 30º dia subsequente à data da sua notificação às partes.
IV. O entendimento perfilhado pelo douto despacho em crise, se fosse válido, iria fazer precludir o direito consignado no artigo 6º, n.º 7, in fine, do RCP, a quem tenha desistido de interpor recurso no período que mediou entre o 30º e o 40º dia subsequente ao da notificação da sentença.
V. Nesse caso, o interessado, ou interpunha recurso da sentença só para evitar o seu trânsito em julgado – ato inútil e dilatório e, como tal, proibido por lei –, ou conformava-se com o pagamento da totalidade do remanescente da taxa de justiça, sem qualquer dispensa ou desconto – em prejuízo do direito fundamental da tutela jurisdicional efetiva do seu direito –, o que é juridicamente intolerável.
VI. É lógico e coerente que o prazo para requerer a dispensa ou a redução do pagamento da taxa de justiça remanescente apenas se tenha por consumado quando a parte tem conhecimento de todos os elementos necessários para exercitar esse seu direito e, como tal, quando a sentença se torna definitiva.
VII. Essa definitividade não pode ter-se por verificada no 30º dia posterior ao da notificação da sentença, porque, nesse dia, o pretenso recorrente sabe que ainda tem mais 10 dias para exercer o seu direito ao recurso.
VIII. Contrariaria toda a lógica e as regras da razoabilidade ficcionar como data do trânsito da sentença a do termo do prazo de exercício de um direito (o fixado no artigo 144º, n.º 1, do CPTA), quando a lei confere à parte um prazo adicional para exercitar o mesmo direito (o previsto no n.º 4 do mesmo artigo), ainda que opte, depois, por não o fazer.
IX. Donde, o termo do prazo para apresentar o pedido de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem, no caso, de coincidir com o decurso do prazo de interposição do recurso da sentença, com a dilação dos 10 dias, prevista no artigo 144º, n.º 4, do CPTA.
X. Esse prazo terminou em 4.03.2024, pelo que o pedido de dispensa ou redução, apresentado em 22.02.2024, foi tempestivamente deduzido.
XI. Sem prescindir, o douto despacho a quo, na fixação da data do trânsito em julgado da douta sentença, não considerou o prazo adicional de três dias úteis, com pagamento da respetiva multa processual, fixado no artigo 139º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA.
XII. Para tanto, “ato processual” era o pedido de dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, previsto no artigo 6º, n.º 7, do RCP, e o “termo do prazo” para a prática desse ato fixava-se em 21.02.2024.
XIII. Pelo que, o ato processual podia ser praticado nos três dias úteis subsequentes ao termo desse prazo, até 26.02.2024, mediante o pagamento da multa.
XIV. A Recorrente, intempestivamente ou não, praticou esse ato, conforme flui do requerimento que juntou aos autos em 22.02.2024 (fls. 1612 do SITAF).
XV. Seguindo o entendimento do douto acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ de 23.06.2022 (Proc. 191/17.1JELSB.L1-A.S1: dgsi.pt), o trânsito em julgado da douta sentença ocorreu, não em 21.02.2024, como diz o tribunal a quo, mas em 26.02.2024, com o decurso do prazo adicional de três dias úteis fixado no citado artigo 139º, n.º 5, do CPC.
XVI. A tal conclusão não obsta o facto de o ato processual ter sido praticado sem que a Recorrente tivesse comprovado o pagamento da multa processual, face ao que dispõe a esse respeito o artigo 139º, n.º 6, do CPC.
VII. Donde, mesmo que se considerasse que a Recorrente, para o cômputo da data do trânsito em julgado da douta sentença, não beneficiava do prazo adicional de 10 dias do artigo 144º, n.º 4, do CPTA, sempre beneficiaria do prazo adicional que o artigo 139º, n.º 5, do CPC lhe conferia para o mesmo efeito.
XVIII. Pelo que, tendo o ato sido praticado, no limite, no primeiro dia útil subsequente ao termo do prazo, o requerimento é tempestivo, ao contrário do decidido.
XIX. O douto despacho em crise, ao decidir como decidiu, violou, por errada ou má interpretação, o disposto nos artigos 6º, n.º 7, do RCP e 139º, n.ºs 5 e 6, do CPC, merecendo, por isso, ser revogado da ordem jurídica”.
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O R. não se pronunciou.
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Foi proferido despacho de admissão do recurso e remetidos os autos a este Tribunal Central Administrativo Norte.
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Notificado o Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, nos termos e para os efeitos do artigo 146º do CPTA, não foi emitido parecer.
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II. ÂMBITO DO RECURSO
Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do CPC, é pelas conclusões do recorrente que se define o objeto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Assim, perante as conclusões da alegação da recorrente, a única questão que se coloca neste recurso consiste em saber se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue o requerimento apresentado como não extemporâneo.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
II.1- DE FACTO
A factualidade relevante para a decisão do recurso é a constante do relatório.
II. 2. DE DIREITO
O despacho recorrido seguiu o parecer emitido pelo MP e bem assim como o acórdão uniformador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 1/2022, de 10.11.2021, publicado no DR Série I, de 03.01.2022, no qual se decidiu que a “preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo”, pelo que, o direito de as partes requererem a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, se extinguiu com o trânsito em julgado da decisão final do processo (no caso, operada pela sentença proferida em 16-01-2024).
Mais decidiu que o requerimento apresentado pela Autora não é tempestivo, porquanto, a notificação da sentença proferida nos autos (que ocorreu em 17-01-2024) se presume efetuada no dia 22-01-2024 (segunda-feira, 1.º dia útil seguinte) e, contado o prazo de 30 dias para interposição de recurso (cf. artigo 141.º, n.º 1 do CPTA), na medida em que só com a efetiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias - artigo 144.º, n.º 4 do CPTA; como também o prazo de três dias úteis conferidos pelo artigo 139.º apenas releva para o efeito de determinação do trânsito em julgado, se for exercido o direito conferido por tal norma), o seu termo situa-se no dia 21-02- 2024. Não tendo sido objeto de recurso, a sentença transitou em julgado no dia 21-02- 2024.
Posição oposta tem a recorrente que refere que, ao contrário do que foi decidido, a sentença proferida nos autos era passível de recurso no prazo de 30 dias, a que acresciam mais 10 dias, caso o mesmo tivesse por objeto a reapreciação da prova gravada –artigos 144º, nºs 1 e 4 do CPTA. Donde, aquela sentença não podia ter-se por transitada no trigésimo dia subsequente à data da sua notificação às partes, porquanto o recurso podia ser, ainda, apresentado nos 10 dias seguintes a esse, sem prejuízo do disposto no artigo 139º, n.º 5, do CPC. Considerando que esse prazo, seguindo o raciocínio expresso pelo tribunal a quo, que considera a sentença notificada em 22.01.2024 e situa o 30º dia subsequente a esse em 21.02.2024, terminou em 4.03.2024 (dado que o dia 2.03.2024 foi um sábado), por um lado, e que o pedido de dispensa/redução foi apresentado em 22.02.2024, por outro, dúvidas não restam que esse pedido foi tempestivamente deduzido, ao contrário do que foi decidido.
E, se se entender que a sentença em apreço transitou, de facto, no dia em que o despacho recorrido diz que transitou (21.02.2024), então, o pedido de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, previsto no artigo 6º, n.º 7, do RCP podia ser, ainda, praticado nos três dias úteis subsequentes ao termo desse prazo, ou seja, até ao dia 26.02.2024, mediante o pagamento da correspetiva multa, ainda que sem comprovar o pagamento da multa processual aplicável, o que determinava penas a notificação pela secretaria para pagar a multa, com a penalização de 25% do valor da mesma, o que, no caso, foi omitido. Conclui que, ainda que se considerasse que a Recorrente, no cômputo do trânsito em julgado da sentença, não beneficiava do prazo adicional de 10 dias do artigo 144º, n.º 4, do CPTA, sempre beneficiaria do prazo adicional que o artigo 139º, n.º 5, do CPC lhe conferia para o mesmo efeito.
Vejamos.
O Regulamento de Custas Processuais (RCP) prevê no n.º 7 do seu artigo 6.º que “nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”.
O citado normativo consagra, pois, uma exceção à regra geral de que a taxa de justiça é fixada “em função do valor e complexidade da causa” (artigos 6.º, n.º 1 e 11º, do RCP e 529º do atual CPC), permitindo ao juiz dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, em função da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), norteada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade – cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-05-2017.
Conforme se refere no Acórdão do STA de 1-02-2017, proferido no Processo n.º 0891/16, “justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida em 1.ª instância, quer na totalidade, quer numa fracção ou percentagem, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se, não obstante a questão aí decidida não se afigurar de complexidade inferior à comum, o montante da taxa de justiça devida se afigurar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.”
Quanto ao momento temporal para solicitar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, o STJ em Acórdão Uniformador de jurisprudência nº 1/2022 publicado no DR, 1ª Série de 03.01.2022 decidiu STJ em AUJ nº 1/2022 publicado no DR, 1ª Série de 03.01.2022 decidiu que: “A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem lugar, de acordo com o nº 7 do artº 6º do RCP, com o trânsito em julgado da decisão final do processo”.
Estabelece o artigo 628.º do CPC que “a decisão se considera transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação”.
Assim, sendo a decisão suscetível de recurso ordinário, o trânsito em julgado da sentença depende do decurso do prazo para o efeito.
Importa, pois, saber qual a data do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos, que configura decisão suscetível de recurso ordinário, trânsito em julgado que depende do decurso do prazo de recurso aplicável ao caso para, em consequência, decidir se é intempestivo o requerimento da dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, como decidiu o tribunal a quo ou se, como defende o recorrente, ao prazo de interposição de recurso deve ser adicionado o prazo de 10 dias referido no artigo 144º, n.º 4, do CPTA ou, subsidiariamente, o prazo adicional de três dias úteis, com pagamento da respetiva multa processual, fixado no artigo 139º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA, para concluir que é tempestivo o requerimento apresentado.
A sentença que julgou a acção improcedente foi proferida em 15.01.2024 e foi notificada as partes por ofício de 17.01.2024, presumindo-se efectuada no terceiro dia posterior à elaboração da notificação na plataforma electrónica ou no primeiro dia útil a ela subsequente - (artº 248º CPC), isto é, no dia 22/1/2024 (o que não vem posto em causa no recurso interposto), tendo a ora recorrente apresentado o pedido de dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça em 22.02.2024
Tendo presente os momentos temporais referidos, a decisão seria recorrível, de acordo com o regime prescrito no artº 144º nº1 do CPTA dentro do prazo de 30 dias, isto é, até ao dia 21/2/2024.
A dúvida coloca-se quanto à aplicação ao caso concreto, em que teve lugar a produção de prova (gravada) em sede de audiência final do prazo adicional de 10 dias estabelecido no artº 144, nº4 do CPTA (e artº 638º, nº 7 do CPC) de acordo com o qual “Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias”.
Quanto às razões que estão subjacentes a este alargamento de prazo de recurso, veja-se o Acórdão do STJ de 22-02-2017 processo nº 638/13.6TBLRA.C1.S1: “Pressupõe o legislador que o aditamento de 10 dias ao prazo ordinário para apelar (30 dias) - n.º 7 do art.º 638.º do C.P.Civil - é tempo bastante para que o recorrente possa, convenientemente, averiguar a prova gravada, verificar os pontos essenciais dela e tomar as devidas notas de modo a, sem inquietações, as expor pelo modo exigido pelo art.º 640.º, n.º 1, als. b) e c), do C.P.Civil. A concessão daquele prolongamento do prazo (10 dias) só não é de deferir quando o recorrente omite a alegação e prova, por quaisquer sinais descritivos ou outros, de que se alheou de examinar a concernente “gravação da prova”, pressuposto daquela regalia recursória.
Também o Acórdão do STJ de 09-02-2017 processo nº 471/10.7TTCSC.L1.S1, sobre essas mesmas razões se pode ler o seguinte “A justificação para esta extensão, ou alongamento, do prazo consiste na necessidade do recorrente ter que instruir as suas alegações com as especificações dos meios de prova cuja reapreciação, na sua opinião, determinam a modificação da decisão da matéria de facto. Ao impor um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância, daí que o prazo acrescido de 10 dias só seja aplicável quando o recorrente o use efetivamente para impugnar a matéria de facto. Para que o recorrente/apelante possa usufruir desse acréscimo de 10 dias, a impugnação da matéria de facto efetuada deve refletir efetivamente essa reapreciação. Se nas conclusões não existir, concreta ou implicitamente, qualquer referência à prova gravada e nem se fizer alusão a qualquer depoimento, não beneficia o recorrente daquele acréscimo”.
Sucede que, o alargamento de prazo de recurso, como decorre desde logo do texto da norma aplicável (artºs 144, nº4 do CPTA) depende da efectiva interposição de recurso para reapreciação da prova gravada com objecto dirigido à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, sustentada na reapreciação de prova produzida e gravada em audiência final, tendo vindo a ser essa a posição assumida pelos tribunais superiores.
Assim sendo, o alargamento de prazo de recurso pelo prazo adicional de 10 dias, não se aplica independentemente de ter sido ou não interposto recurso para a reapreciação da prova gravada, como defende a recorrente.
Veja-se neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 6/10/2015 processo 1466/14.7T8CBR-E.C1, de cujo sumário se extrai o seguinte: “3 - Só com a efetiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias previsto no nº 7 do art. 638º do Código Processo Civil. 4- Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto, o que não acontece
Extrai-se do seu discurso fundamentador: “Como resulta claro da letra da lei, o legislador ao escrever “se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada”, tal significa que tem de haver manifestação de recorrer e de recorrer para reapreciação da prova gravada, a fim de se preencher este concreto objeto de recurso previsto na norma, pois que, só ele permite beneficiar de um prazo adicional de 10 dias. Não se basta a norma com a possibilidade de haver recurso de prova gravada, sem exercício do mesmo, pois que, se assim fosse, o prazo do recurso seria sempre acrescido de 10 dias, uma vez que a audiência final, na lei processual atual, é sempre gravada (art. 155 nº 1 do CPC). Intenção que não foi a do legislador e que inequivocamente não se colhe da letra da lei. Se o legislador tivesse querido estender o prazo adicional de 10 dias a todos os julgamentos gravados, tê-lo-ia dito. Mas não foi o caso. A mesma exigência de que o prazo adicional de 10 dias só poderia ser concedido se tivesse sido, efetivamente, interposto recurso sobre o julgamento de facto resultava da lei anterior (art.685 nº 7 do anterior CPC) que também previa a gravação da audiência, ainda que a mesma estivesse dependente de requerimento de uma das partes, e não fosse automática (art.522-B do anterior CPC). Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto.”
Veja-se ainda o decidido em Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23 Setembro 2014, processo 913/09.4TBCBR.C1 de cujo sumário se extrai o seguinte: “1.- Só com a efectiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias previsto no nº 7 do art. 638º do Código Processo Civil. 2.- Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto”.
Nesta medida, atentos os fundamentos expostos, nenhum reparo há a fazer ao despacho recorrido que decidiu em conformidade com a melhor interpretação do artº 144º, nº4 do CPTA, razão pela qual, tem que improceder o recurso interposto no que tange a esse segmento do despacho recorrido.
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Vejamos, agora, se é de aplicar ao caso, o prazo adicional de três dias úteis, com pagamento da respectiva multa, previsto no artigo 139º, n.º 5, do CPC, como defende a recorrente, que considera que essa possibilidade ocorre quer se esteja em presença de situação em que o recurso é apresentado nesse prazo adicional quer na situação em causa nos autos, isto é, quando se trata da apresentação de pedido de dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ainda que desacompanhado do pagamento da multa processual aplicável.
Estabelece o nº 5 do artº 139º do CPC: “ Independentemente de justo impedimento, pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa, fixada nos seguintes termos: a) Se o ato for praticado no 1.º dia, a multa é fixada em 10 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 1/2 UC; b) Se o ato for praticado no 2.º dia, a multa é fixada em 25 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 3 UC; c) Se o ato for praticado no 3.º dia, a multa é fixada em 40 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 7 UC”.
Resulta dos autos que a sentença que julgou a acção improcedente foi proferida em 15.01.2024 e foi notificada as partes por ofício de 17.01.2024, presumindo-se efectuada essa notificação no terceiro dia posterior à elaboração da notificação na plataforma electrónica ou no primeiro dia útil a ela subsequente (artº 248º CPC), isto é, no dia 22/1/2024, pelo que, a ser aplicado o prazo de interposição de recurso de 30 dias (sem qualquer prazo adicional), a decisão seria recorrível até ao dia 21/2/2024, pelo que na data em que a A. apresentou o requerimento de dispensa/redução do remanescente da taxa de justiça, isto é, em 22/2/2024 já a sentença tinha transitado em julgado, pelo que, esse requerimento era intempestivo.
Na verdade, no cômputo do prazo de interposição de recurso e que releva para efeito de apurar qual o momento em que ocorre o trânsito e, por consequência, da tempestividade do requerimento de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, temos que o recorrente só podia beneficiar do prazo adicional de três dias úteis ainda que destinado à peticionada dispensa, se efetivamente tivesse interposto recurso e pagasse a respectiva multa, o que in casu não sucedeu.
Nesse sentido, veja-se o Acórdão do STJ de 10/2/2004, processo 03A4156 que se reporta a norma do CPC anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho mas que tem absoluta pertinência dada a similitude da redação do actual 139º, nº5 e que decidiu que : "VI - O prazo suplementar de três dias a que se refere o art.º 145, n.º 5, do CPC, não se soma ao prazo de interposição de recurso ou de reclamação para efeito de determinação da data do trânsito em julgado da decisão judicial, apenas destruindo os efeitos do caso julgado já produzido se no decurso desses três dias for praticado algum acto processual nos termos referidos em tal dispositivo."
No mesmo sentido, também o Acórdão do STJ de 15/11/2006, processo 06S1732:“1. O prazo máximo de condescendência para a prática de acto processual com o pagamento de multa, fixado no n.º 5 do artigo 145.º do Código de Processo Civil, não constitui um alargamento do prazo peremptório de que a parte legalmente dispõe para a prática do acto, antes configura um prazo suplementar, o aditamento de um novo prazo dentro do qual as partes têm ainda o direito de praticar o acto. 2. Nesta conformidade, aquele prazo suplementar só poderá contar para efeitos de determinação do trânsito em julgado da decisão se o direito de praticar o acto dentro desse prazo for efectivamente exercido ou, dito de outra forma, só o exercício do direito de praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo peremptório obsta à ocorrência do trânsito em julgado da decisão após o termo deste prazo.”
Nesse sentido e abarcando os prazos adicionais de 10 dias ( prazo suplementar) e de 3 dias (prazo de condescendência) em discussão no recurso aqui interposto, decidiu o Tribunal da Relação de Évora em recente Acórdão de 12/10/2023 processo nº 478/21.9T8FAR-A.E1: “I. O prazo de 10 dias para interposição do recurso com impugnação da matéria de facto, concedido pelo número 7 do artigo 638.º do CPC, e o prazo de complacência de 3 dias previsto no artigo 139.º, n.º 5, do CPC, não entram no cálculo da data a atender para o trânsito em julgado da decisão, porque a sua contabilização pressupõe sempre que tenha havido efetiva interposição de recurso com a necessidade de utilização de tais prazos.”
E, muito recentemente, na minha linha jurisprudencial, o Tribunal da Relação de Lisboa, em Acórdão de 7/3/2024, processo 33943/06.8YYLSB-L.L1-6 decidiu que “II. O prazo máximo de condescendência para a prática de acto processual com o pagamento de multa apenas conta para efeitos de determinação do trânsito em julgado da decisão se o direito de praticar o acto dentro desse prazo for efectivamente exercido”.
Face a tudo quanto foi exposto, também no que tange à não aplicação ao caso, do prazo adicional de 3 dias, não vemos razão alguma para alterar o despacho recorrido.
Assim, impõe-se negar provimento ao recurso, mantendo integralmente o despacho recorrido.
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III. DECISÃO
Nesta medida, acordam os Juízes da Secção Administrativa, Subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao presente recurso.
Custas pelo Recorrente (artº 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
Notifique.

Porto, 12 de Julho de 2024.

Maria Clara Ambrósio
Ricardo de Oliveira e Sousa
Tiago Afonso Lopes de Miranda