Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02408/16.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/12/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:JUROS INDEMNIZATÓRIOS;
ERRO IMPUTÁVEL AOS SERVIÇOS;
Sumário:I. O direito a ser indemnizado pelo pagamento de juros indemnizatórios quando se determine em reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços de que resultou pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (art.º 43º/1 LGT), reflete o princípio da igualdade dos sujeitos da relação.

II. O conceito de erro imputável aos serviços deve ser contraposto ao conceito de vício. O “Erro”, restringe-se às situações de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, traduzindo-se numa inadequada aplicação do quadro legal à factualidade sujeita a imposto.Apenas os “erros” são suscetíveis de reparação pelo pagamento de juros indemnizatórios ao contribuinte.

III. Ainda que a liquidação tenha sido efectuada correctamente de acordo com os elementos de facto declarados pelo contribuinte, se este pediu a anulação da mesma mediante impugnação administrativa com fundamento em erro nos pressupostos de facto e a AT, indevidamente, lha recusa ou não cumpre os prazos de decisão, deve considerar-se que desde esse momento da decisão de indeferimento, efectiva ou presumida, a imputabilidade do erro se transferiu para a AT desde (passando a constitui um erro dos serviços), a determinar o pagamento por esta ao sujeito passivo de juros indemnizatórios sobre o montante pago [cfr. art. 43.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), da LGT].*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por AA contra a liquidação adicional de IRS, referente ao ano 2014, no valor de € 6.927,26, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
1.1.1. Alegou a Recorrente Fazenda Pública, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por AA, NIF ..., contra a liquidação de IRS n.º ...49, relativa ao ano de 2014, no montante de €17.307,26 (que após o acerto de contas com a liquidação de IRS n.º ...65, relativa ao mesmo ano, resultou no montante a pagar de €6.927,26), na parte em que condenou a Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de juros indemnizatórios.
B. Julgou o Tribunal a quo no sentido da procedência da presente impugnação judicial considerando “que a indemnização de €35.000,00 paga pelo Impugnante ao arrendatário BB, para desocupação do imóvel alienado em 31/10/2014, constitui um verdadeiro encargo com a valorização do referido imóvel, que deve ser atendido para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, acrescendo ao valor de aquisição, nos termos do art.º 51º, n.º 1, alínea a), do CIRS”, pelo que, neste seguimento, anulou parcialmente a liquidação de IRS impugnada e condenou a Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito, porquanto entendeu que a liquidação impugnada resulta de um erro imputável aos serviços.
C. Com a ressalva do sempre devido respeito, discorda a Fazenda Pública da condenação no pagamento de juros indemnizatórios, porquanto entende que, in casu, não constam dos autos quaisquer elementos que permitam concluir pelo preenchimento dos pressupostos consagrados no artigo 43.º da LGT para a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de juros indemnizatórios, designadamente a existência de um erro imputável aos serviços.
D. Conforme resulta dos factos provados, a liquidação impugnada teve origem na declaração de rendimentos de substituição entregue pelo impugnante, pelo que aquela foi emitida de acordo com os elementos nesta declarados.
E. Da fundamentação de facto da sentença recorrida não consta qualquer facto que permita concluir que o erro da liquidação, consubstanciado na ilegalidade decidida pelo Tribunal a quo, é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira.
F. Em sede de fundamentação de direito, o Tribunal a quo limita-se a referir que o imposto foi pago e que a liquidação em crise deve ser anulada, por vício de violação lei, concluindo, sem mais, “que a liquidação impugnada resulta de um erro imputável à Autoridade Tributária, que originou o pagamento de um imposto que não era devido, o que confere ao Impugnante o direito a ser compensado mediante o recebimento de juros indemnizatórios”, pelo que não se vislumbra em que medida é que aquele erro da liquidação, resultante da declaração de rendimentos entregue pelo impugnante, é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira. Ademais,
G. Atento o disposto no n.º 2 do art.º. 43.º da LGT, considera-se existir erro imputável aos serviços e não ao contribuinte, nos casos em que, apesar de a liquidação ter sido efetuada com base na declaração do sujeito passivo, este tenha seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da Administração Tributária, devidamente publicadas.
H. Contudo, não existe nos autos qualquer elemento de prova que demonstre que, no preenchimento da declaração, o impugnante tenha seguido orientações genéricas devidamente publicadas ou mesmo instruções incorretas da administração tributária, e que tenha dado origem ao decidido erro na liquidação impugnada, nem tal foi alegado, pelo que não se vislumbra qualquer erro imputável aos serviços que pudesse originar o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do art.º 43º (n.º 1 e n.º 2) da LGT.
I. Por outro lado, também não se pode sequer considerar que o erro passou a ser imputável à Administração Tributária após o indeferimento (tácito) da pretensão apresentada pelo contribuinte em sede de reclamação graciosa, porquanto a Autoridade Tributária e Aduaneira também não dispunha dos elementos necessários para proferir uma decisão com os pressupostos corretos, porquanto tais elementos apenas foram juntos em sede de impugnação judicial (requerimento apresentado pelo aqui recorrido em 2018/06/21). Pelo que, não lhe pode ser imputada a responsabilidade pela manutenção do erro e pagamento indevido na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa. Sem prescindir,
J. Ainda que assim não se entenda, e se considere que a Autoridade Tributária e Aduaneira tinha na sua posse todos os elementos que lhe permitiam anular parcialmente a liquidação de IRS aqui impugnada em sede de reclamação graciosa, permitindo, assim, imputar-lhe a responsabilidade objetiva pela subsistência do erro e do pagamento indevido, responsabilidade essa geradora da obrigação de indemnizar nos termos do disposto no art.º 43º da LGT, o direito a esses juros apenas se poderia considerar constituído na esfera jurídica do Impugnante na data em que se considerou indeferida tacitamente a reclamação, em 02/07/2016 (art.º 57º n.º 1 e n.º 5 da LGT e 106º do CPPT) e não na data do pagamento indevido do imposto, fixada na sentença (neste sentido, o Acórdão do STA, de 03/05/2018, proc. 0634/15).
K. Nestes termos, salvo o respeito devido e sem prejuízo de melhor opinião, entende a Fazenda Pública que sentença recorrida padece de erro de julgamento na parte em que condenou a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios, porquanto fez uma errada valoração da prova produzida nos presentes autos, bem como efetuou uma errada interpretação e aplicação dos preceitos legais referidos ao longo desta peça processual.
Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, assim se fazendo
JUSTIÇA.»

1.2. O Recorrido AA, notificado da apresentação do presente recurso, apresentou contra-alegações, nos seguintes termos:
«Vem o Impugnante recorrido responder nos termos do art.º 617.º, n.º 3, parte final, do CPC, nos seguintes termos e fundamentos:
1. A Recorrida, considerando que apenas suscita um “erro de julgamento no que concerne à condenação no pagamento de juros indemnizatórios”, aceitou a condenação da Sentença proferida em 22-03-2021 e do Despacho que antecede de 02-07-2021 no demais.
2. Pelo que apenas está em causa neste recurso da Recorrente o suposto “erro de julgamento no que concerne à condenação no pagamento de juros indemnizatórios”,
3. No introito da petição inicial de impugnação do Autor consta o seguinte:
AA, contribuinte fiscal n.º ..., com domicílio fiscal na Rua ..., ..., ..., ...,
Vem, porque é admissível, está em tempo e tem legitimidade, ao abrigo dos art.º s 99.º e 102.º e ss., todos do CPPT, todos do Código de Procedimento e Processo Tributário (doravante apenas CPPT), apresentar a sua IMPUGNAÇÃO JUDICIAL,
Visando a revogação e anulação da Liquidação/Compensação n.º ...32, de 08-09-2015 (documento n.º ...41), no valor de 6.927,26€, com liquidação de 01¬11-2015, referente à declaração de IRS de 2014
4. De resto, tendo a Recorrente aceite a condenação (não recorreu da mesma):
“Estamos, então, em condições de concluir que enferma de ilegalidade a liquidação adicional de IRS de 2014 – que não atendeu, na determinação das mais-valias sujeitas a imposto, à indemnização de € 35 000,00 comprovadamente paga pelo Impugnante, em 2014, ao arrendatário do imóvel vendido –, por violação do disposto no art.º 51º, n.º 1, alínea a), do CIRS, o que determina a anulação parcial da referida liquidação, com a consequente obrigação de restituição do imposto indevidamente pago.”
5. Não se entende e não aceita que a Recorrente recorra da condenação em juros indemnizatórios.
6. Isto porque a Sentença a esse respeito limitou-se a aplicar o que está previsto na lei, ou seja, respeitou o princípio da Legalidade.
7. O art.º 43.º da Lei Geral Tributária assim prevê que:
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
8. E, basta estarmos atentos aos factos dados como provados na Sentença, para chegarmos à conclusão que os juros indemnizatórios são devidos nos termos da lei. (cfr. factos provados I), J e L) da Sentença e respectivo processo administrativo da reclamação graciosa nestes autos).
9. A Recorrente omite deliberadamente que ocorreu erro imputável aos serviços durante a tramitação da reclamação graciosa, quando nesse procedimento foi junta a mesma alegação e prova que depois foi apresentada novamente nestes autos.
10. A Autoridade Tributária e Aduaneira tinha na sua posse todos os elementos que lhe permitiam anular parcialmente a liquidação de IRS aqui impugnada em sede de reclamação graciosa,
11. Nos termos do art.º 100.º, da LGT, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a Recorrente Impugnada está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios.
12. Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética.
13. A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios (cfr. art.º 100.º da LGT e art.º 61.º, n.º 3, do CPPT).
14. Com efeito, no art.º 22.º da CRP estabelece-se que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
15. Nesse sentido a jurisprudência:
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22-05-2019, processo n.º 1770/12.9BELRS, disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/2c25941da6a2c50f802584020053f92a?OpenDocument;
16. Pelo que não assiste qualquer razão à Recorrente, nos termos do art.º 43.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, devendo o recurso ser julgado improcedente.
17. Devendo manter-se a Sentença e posterior Despachos nos referidos termos ali decididos.
Nestes termos e nos melhores de Direito aplicável requer a V. Exas. se digne, por carecer de fundamento, ser o recurso julgado improcedente e a Sentença e Despacho posterior mantidos/confirmados nos precisos termos.»

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 300 SITAF, no sentido da procedência do recurso.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes:
Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios, porquanto assenta à mesma numa errada valoração da prova produzida nos autos e errada interpretação e aplicação de preceitos legais aplicáveis, nomeadamente do artigo 43º n.º 1, da Lei Geral Tributária quer de facto quer de direito.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) Em 04/07/2014, foi outorgado um contrato de compra e venda, através do qual CC e DD, casados, venderam ao aqui Impugnante os prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, sitos na Rua ..., pelo preço de € 37 000,00 e € 23 000,00, prédios esses que tinham um valor patrimonial tributário de € 37 250,00 e € 26 420,00, respetivamente, tendo os vendedores declarado que os referidos prédios eram vendidos livres de ónus ou encargos – cfr. fls. 20 a 25 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
B) Com data de 08/10/2014, foi emitida uma declaração subscrita por BB a declarar que, nessa data, recebeu do Impugnante a quantia de € 17 500,00 correspondente a metade da compensação acordada para a desocupação / entrega do prédio urbano sito na Rua ..., concelho ..., que perfaz o montante global de € 35 000,00, declarando ainda que se obrigava a proceder à entrega do referido imóvel ao Impugnante até ao dia 31/10/2014, livre de pessoas e bens, mediante o pagamento do remanescente da referida compensação (€ 17 500,00), renunciando expressamente a qualquer direito de preferência – cfr. fls. 28 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
C) Em 09/10/2014, foi debitada da conta bancária do Impugnante a quantia de € 17 500,00, respeitante ao cheque n.º ...87 – cfr. fls. 120 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
D) Com data de 31/10/2014, foi emitida uma declaração subscrita por BB a declarar que recebeu do Impugnante a segunda e última parcela, no valor de € 17 500,00, relativa à desocupação / entrega do prédio urbano sito na Rua ..., concelho ..., perfazendo € 35 000,00 – cfr. fls. 29 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
E) Em 31/10/2014, o Impugnante emitiu o cheque n.º ...84,, no valor de € 17 500,00, em nome de BB, tendo a referida quantia sido debitada da conta bancária do Impugnante em 18/11/2014 – cfr. fls. 117 e 121 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
F) Em 31/10/2014, foi outorgada uma escritura de compra e venda, através da qual o Impugnante declarou vender a EE, representada pela procuradora FF, livre de ónus e encargos, os prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, sitos na Rua ..., pelo preço de € 65 000,00 e € 100 000,00, respetivamente – cfr. fls. 30 a 34 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
G) Em 29/05/2015, o Impugnante apresentou a declaração de rendimentos do ano 2014, declarando, no campo 4 do seu anexo G, a alienação onerosa dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, indicando como valor de realização € 100 000,00 e € 65 000,00, como valor de aquisição € 37 000,00 e € 23 000,00 e como despesas e encargos € 18 445,00 e 18 445,00, respetivamente – cfr. fls. 60 a 64 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
H) Em 31/08/2015, o Impugnante apresentou uma declaração de rendimentos de substituição para o ano 2014, alterando, no campo 4 do seu anexo G, o valor de aquisição dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, para € 37 250,00 e € 26 420,00 e as despesas e encargos para € 1 683,03 e € 1 683,03, respetivamente – cfr. fls. 66 a 70 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
I) Na sequência da declaração mencionada na alínea antecedente, foi emitida em nome do Impugnante a liquidação de IRS n.º ...49, referente ao ano 2014, onde foi apurado, após acerto de contas, um valor a pagar, até 05/11/2015, de € 6 927,26, que foi pago em 01/11/2015 – cfr. fls. 32 a 35 do processo administrativo (PA) apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
J) Em 02/03/2016, o Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação mencionada na alínea antecedente, pedindo a sua anulação – cfr. fls. 3 a 13 do procedimento de reclamação graciosa (PRG) apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
L) A presente impugnação foi deduzida em 30/09/2016 – cfr. fls. 6 a 17 e 49 do suporte físico do processo.
Mais se provou que,
M) Nos meses de janeiro de 2013 a julho de 2014, CC emitiu recibos de renda a declarar que recebeu de BB rendas mensais no valor de € 250,00 pelo arrendamento do ... andar do prédio sito na Rua ..., no ... – cfr. fls. 95 a 113 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
2. FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem, com relevância para a decisão da causa.
MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos, não impugnados, juntos aos autos.
2.2. De direito
A Recorrente (Autoridade Tributária e Aduaneira) insurge-se contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto no âmbito da impugnação judicial deduzida por AA contra a liquidação adicional de IRS, referente ao ano 2014, no valor de € 6.927,26, a julgou procedente, e condenou a Autoridade Tributária e Aduaneira a restituir ao Impugnante o imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal.
Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objecto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.
Ab initio, importa referir que não tendo a Recorrente dirigido impugnação quanto ao demais decidido pelo Tribunal a quo, o mesmo encontra-se firmado na ordem jurídica, constituindo caso julgado, fora do objecto do presente recurso limitado à condenação em juros indemnizatórios.
Efectivamente, alega a Recorrente que a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios, porquanto assenta à mesma numa errada valoração da prova produzida nos autos e errada interpretação e aplicação de preceitos legais aplicáveis, nomeadamente do artigo 43º n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT).
Sustenta para infirmar o sentenciado que dos autos não constam quaisquer elementos que permitam concluir pelo preenchimento dos pressupostos consagrados no artigo 43.º da LGT, para efeitos de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de juros indemnizatórios, designadamente o da existência de um erro imputável aos serviços, do qual resultou o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Mais avoca, apelando ao conteúdo dos factos provados, itens G, H e I: [“G) – Em 29/05/2015, o Impugnante apresentou a declaração de rendimentos do ano 2014, declarando, no campo 4 do seu anexo G, a alienação onerosa dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, indicando como valor de realização € 100 000,00 e C 65 000,00, como valor de aquisição C 37 000,00 e € 23 000,00 e como despesas e encargos €18 445,00 e 18 445,00, respetivamente — cfr. fls. 60 a 64 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
H) – Em 31/08/2015, o Impugnante apresentou uma declaração de rendimentos de substituição para o ano 2014, alterando, no campo 4 do seu anexo G, o valor de aquisição dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da União das freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ... sob os artigos ...2 e ...1, para C 37 250,00 e C 26 420,00 e as despesas e encargos para €1 683,03 e €1 683,03, respetivamente – cfr. fls. 66 a 70 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido. I) – Na sequência da declaração mencionada na alínea antecedente, foi emitida em nome do Impugnante a liquidação de IRS n....49, referente ao ano 2014, onde foi apurado, após acerto de contas, um valor a pagar, até 05/11/2015, de € 6 927,26, que foi pago em 01/11/2015 – cfr. fls. 32 a 35 do processo administrativo (PA) apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido”.], para extrair que dos mesmos (factos) decorre tão só que a liquidação impugnada teve origem na declaração de rendimentos de substituição entregue pelo próprio impugnante, pelo que aquela foi emitida de acordo com os elementos por ele declarados.
Porquanto, inexiste nos autos qualquer prova que demonstre que, no preenchimento da declaração de rendimentos de substituição, o Impugnante tenha seguido orientações genéricas devidamente publicadas ou instruções incorretas da administração tributária, que hajam estado na origem do decidido erro na liquidação impugnada, pelo que inexiste qualquer erro imputável aos serviços que pudesse originar o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do art.º 43º (n.º 1 e n.º 2) da LGT.
Adianta a Recorrente que também não se pode sequer considerar que o erro passou a ser imputável à Administração Tributária após o indeferimento (tácito) da pretensão apresentada pelo contribuinte em sede de reclamação graciosa, porquanto a Autoridade Tributária e Aduaneira não dispunha dos elementos necessários para proferir uma decisão com os pressupostos corretos, porquanto tais elementos apenas foram juntos em sede de impugnação judicial (requerimento apresentado pelo aqui recorrido em 2018/06/21), pelo que não lhe pode ser imputada a responsabilidade pela manutenção do erro e pagamento indevido na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa.
Acrescenta, ainda, que em sede de fundamentação de direito, o Tribunal a quo limitou-se a referir que o imposto foi pago e que a liquidação em crise deve ser anulada, por vício de violação lei, concluindo, sem mais, “que a liquidação impugnada resulta de um erro imputável à Autoridade Tributária, que originou o pagamento de um imposto que não era devido, o que confere ao Impugnante o direito a ser compensado mediante o recebimento de juros indemnizatórios”.
Em sede de contra-alegações o Recorrido pugna pela manutenção da condenação nos juros indemnizatórios, referindo expressamente que Autoridade Tributária estava na posse de todos os elementos necessários aquando da decisão emitida em sede de reclamação graciosa, contrariamente ao que alega.
Cumpre apreciar e decidir.
Nesta matéria, temos que a Recorrente insurge-se contra a condenação da AT em juros indemnizatórios, por no seu entendimento ter sido o contribuinte que deu causa à liquidação por via da declaração de rendimentos de substituição, e que só em sede de impugnação foram apresentados os elementos necessários que permitiriam à AT proferir decisão com os pressupostos correctos.
Em suma está em causa, tão só, saber se a liquidação foi anulada por erro imputável aos serviços, ou se pelo contrário, tal erro não existiu e a ilegalidade da liquidação decorre de comportamento imputável ao contribuinte
Paralelamente, decorre da sentença recorrida que o Tribunal a quo conclui que “(...) enferma de ilegalidade a liquidação adicional de IRS de 2014 – que não atendeu, na determinação das mais-valias sujeitas a imposto, à indemnização de € 35 000,00 comprovadamente paga pelo Impugnante, em 2014, ao arrendatário do imóvel vendido –, por violação do disposto no art.º 51º, n.º 1, alínea a), do CIRS, o que determina a anulação parcial da referida liquidação, com a consequente obrigação de restituição do imposto indevidamente pago.” e, quanto ao juros peticionados considerando “(...) que a liquidação impugnada resulta de um erro imputável à Autoridade Tributária, que originou o pagamento de um imposto que não era devido, o que confere ao Impugnante o direito a ser compensado mediante o recebimento de juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito (cfr. art.os 43º, n.º 4 e 35º, n.º 10, da LGT e 61º, n.º 5, do CPPT). “.
Vejamos:
A consagração do direito a juros na LGT reflete o princípio da igualdade dos sujeitos da relação tributária, assumindo, neste caso, o contribuinte o papel de sujeito activo. A obrigação tributária principal é sempre de natureza pecuniária e o seu pagamento indevido envolve sempre um custo para o contribuinte, que os juros se destinam a reparar. Quando ocorre atraso no recebimento do valor a pagar pelos contribuintes, o prejuízo correspondente do credor tributário é reparado com o pagamento dos juros compensatórios e juros moratórios (cfr. artigos 35º e 44º LGT).
Já quando o sujeito passivo efetua o pagamento de um tributo indevido, ou a AT procede tardiamente à sua restituição, o prejuízo do sujeito passivo é reparado com o pagamento de juros indemnizatórios. Por outras palavras, o pagamento dos juros indemnizatórios visa reparar a privação indevida de meios financeiros dos contribuintes por razões imputáveis à AT.
O n.º 1 do artigo 43.º da LGT estatui que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Temos, assim, que o direito a juros indemnizatórios depende da verificação dos seguintes requisitos: (i) a existência de erro imputável aos serviços; e (ii) o pagamento de prestação tributária em montante superior ao legalmente devido.
A propósito do primeiro dos enunciados requisitos, coloca-se a questão de saber se o legislador, ao utilizar a expressão erro e não vício no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pretendeu restringir o direito a juros indemnizatórios aos vícios do acto anulado relativamente aos quais é adequada essa designação, ou seja, o erro sobre os pressupostos de facto e o erro sobre os pressupostos de direito, excluindo os vícios de forma como a incompetência ou a violação de direitos procedimentais.
Assim tem entendido o STA, como decorre do acórdão de 02.12.2009, proferido no âmbito do processo n.º 0892/09: É que, como tem sido afirmado por este Tribunal, o facto de o n.º 1 do artigo 43.º da LGT utilizar a expressão “erro” e não “vício” ou “ilegalidade”, para aludir aos factos que podem servir de base à atribuição de juros, revela que se teve em mente apenas os vícios do acto anulado a que é adequada essa designação (…) sendo de concluir que o uso daquela expressão “erro” tem um alcance restritivo do tipo de vícios que podem servir de base ao direito a juros indemnizatórios (cfr., entre outros, o Acórdão de 9 de Setembro de 2009, rec. 369/09)”.
E, em acórdão mais recente, de 12.02.2015, proferido no âmbito do processo n.º 01610/13, na senda desse entendimento, considera que o “direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do art. 43.º da LGT, derivado de anulação judicial de um acto de liquidação, depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à AT”.
Sinteticamente, dir-se-á que o “vício” corresponde a uma ilegalidade formal no procedimento e ou erro; o “erro” apenas consiste numa ilegalidade decorrente da aplicação das normas de incidência.
A jurisprudência entende que apenas os “erros” (errada aplicação das normas de incidência) são suscetíveis de reparação pelo pagamento de juros indemnizatórios.
Os “vícios”, decorrentes da inobservância de normas de procedimento (falta de fundamentação ou preterição do direito de audição prévia) não conferem o direito ao pagamento de tais juros (sem prejuízo de o contribuinte lesado pedir indemnização em processo próprio), o que se justifica pelo facto de o acto de liquidação poder ser repetido com o mesmo conteúdo, apenas se suprimindo o vício.
Também não existe erro da administração nos casos em que a ilegalidade da liquidação resulta de um comportamento activo ou omissivo do contribuinte, designadamente disponibilizando informações incorrectas ou ocultando elementos relevantes para apuramento da sua situação tributária.
Como salienta Jorge Lopes de Sousa, da verificação de um vício de forma não resulta uma lesão da situação jurídica substantiva e que, por sua vez, da anulação do acto não decorre necessariamente um prejuízo para o sujeito passivo. Deste modo, não se verificando um prejuízo que mereça reparação, apenas deve ser restituído ao contribuinte aquilo que foi recebido pela Administração Tributária, não lhe sendo atribuídos juros indemnizatórios. [Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, Volume I, Lisboa, Áreas, 2011, pp. 532 e 533
Assim, quando um acto de liquidação é anulado exclusivamente por vícios formais, a situação tributária substantiva não é posta em causa, ou seja, deste acto de liquidação inválido não resultou o pagamento pelo contribuinte de um tributo em montante superior ao legalmente ”materialmente” devido. “São de afastar quaisquer dúvidas relativas à constitucionalidade desta solução. Tudo porque apesar do artigo 103.º, n.º 3 da CRP determinar que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja liquidação não se tenha efectuado nos termos da lei, a não atribuição de juros indemnizatórios ao sujeito passivo não constitui uma aceitação da legalidade de actos de liquidação que padecem de vícios formais, ou seja, a aceitação de que os contribuintes sejam obrigados a pagar os impostos independentemente da legalidade formal da liquidação. Estes actos são anulados, afirmando-se a sua ilegalidade, e o tributo pago é restituído ao contribuinte, não existindo qualquer direito de retenção da Administração” (Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, Volume I, Coimbra, Almedina, 2017, pp. 218 a 221)
No caso concreto não estamos perante qualquer “vício” do acto, no sentido formal, nos termos que acima enunciámos, nem perante qualquer erro resultante de ação ou omissão do contribuinte.
Não se pode olvidar o facto de o sujeito passivo (Recorrido) ter apresentado documentos em sede de reclamação graciosa e esta ter sido indeferida (tacitamente), ou seja, ocorreu oportunidade de esclarecer a situação tributária em sede de reclamação graciosa, nomeadamente de requerer apresentação de prova suplementar perante o requerimento apresentado, a AT não se pronunciou sobre a posição apresentada pelo sujeito passivo (em tudo similar à assumida nos presentes autos em sede de Impugnação), como era seu dever, originando a formação de indeferimento tácito e se não houve uma pronúncia expressa da Administração Tributária sobre a situação, tal como sustenta Jorge Lopes de Sousa (in CPPT Anotado, vol I, pág. 537), «À prática de acto expresso deverá ser equiparado, para este efeito, o indeferimento tácito, formado pelo decurso do prazo legal de decisão da impugnação administrativa (art.º 57º, nº4, da LGT), pois é este o momento em que a Administração Tributária deveria ter proferido um acto legal e, com a sua omissão, manteve a situação de ilegalidade, o que permite imputar-lhe a responsabilidade pela manutenção da situação de erro e pagamento indevido».
Ora, como se no acórdão do STA de 03.05.2018, proferido no Proc. nº 0634/15, “… Não o fez, contudo, a Administração Fiscal, que indeferiu a reclamação graciosa em 5/03/2010, bem como o subsequente recurso hierárquico. Ao assim actuar, a Administração manteve a situação de ilegalidade originada pelo questionado acto de liquidação do IRS, o que permite imputar-lhe a responsabilidade objectiva pela subsistência do erro e do pagamento indevido, responsabilidade essa geradora da obrigação de indemnizar nos termos do disposto no art.º 43º da LGT, embora o direito a esses juros apenas se constitua na esfera jurídica do Impugnante na data em que foi indeferida a reclamação (5/03/2010), e não na data fixada na sentença, isto é, no dia em que a reclamação foi apresentada.
No mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, no "Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado", 6ª edição, pág. 537, onde deixa frisado o seguinte: «Nas situações em que a prática do acto que define a dívida tributária cabe ao contribuinte (...), bem como naqueles em que o acto é praticado pela Administração Tributária com base em informações erradas prestadas pelo contribuinte e há lugar a impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), o erro passará a ser imputável à Administração Tributária após o eventual indeferimento da pretensão apresentada pelo contribuinte, isto é, a partir do momento em que, pela primeira vez, a Administração Tributária toma posição sobre a situação do contribuinte, dispondo dos elementos necessários para proferir uma decisão com pressupostos correctos.
Será indiferente, para este efeito de imputabilidade do erro, gerador de dívida de juros indemnizatórios, que se trate de caso de impugnação administrativa necessária ou de facultativa, pois, em qualquer dos casos, a decisão da impugnação (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) é um acto da autoria da Administração Tributária, pelo que o eventual erro ser-lhe-á imputável, a partir do momento em que o praticou. À prática de acto expresso deverá ser equiparado, para este efeito, o indeferimento tácito, formado pelo decurso do prazo legal de decisão da impugnação administrativa (art.º 57º, nº 4º, da LGT), pois é este o momento em que a Administração Tributária deveria ter proferido um acto legal e, com a sua omissão, manteve a situação de ilegalidade, o que permite imputar-lhe a responsabilidade pela manutenção da situação de erro e pagamento indevido.»”.
Acresce ainda, que mesmo numa leitura mais redutora da situação em apreço, nem assim a pretensão da Recorrente poderia obter acolhimento, pois que, como se refere no acórdão do STA de 03.05.2018, proferido no âmbito do Proc. nº 0250/17, “... se a condenação em juros indemnizatórios não pode encontrar apoio no n.º 1 do art. 43.º, já o encontra no n.º 3, alínea c), da LGT.
É que, a atribuição de uma indemnização ao contribuinte, quando se detecta um vício respeitante à relação jurídica tributária, radica no facto de esse vício implicar a lesão de uma situação jurídica subjectiva, consubstanciada na imposição ao contribuinte da efectivação de uma prestação patrimonial contrária ao direito e decorre da imposição constitucional de o Estado reparar os danos causados pelos seus actos ilegais (cfr. art. 22.º da Constituição da República Portuguesa). Assim, os juros indemnizatórios a favor do contribuinte destinam-se a compensá-lo do prejuízo provocado pelo pagamento de uma quantia indevida.
No caso, a ilicitude que determina o dever de indemnizar se não reside no erro dos serviços aquando da liquidação, ocorre na demora na decisão da reclamação graciosa. Sendo que, o art. 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT consagra a obrigação de pagamento de juros indemnizatórios ao contribuinte quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à AT.
Esse regime, como diz Jorge Lopes de Sousa, «embora previsto especificamente para a revisão do acto tributário, deve aplicar-se também aos casos em que há erro imputável ao contribuinte e foi apresentada reclamação graciosa» (Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por actos ilegais, Áreas Editora, 2010, pág. 65).
Ora, como diz Jorge Lopes de Sousa, «nas situações em que a prática do acto que define a dívida tributária cabe ao contribuinte [...], bem como naqueles em que o acto é praticado pela Administração Tributária com base em informações erradas prestadas pelo contribuinte e há lugar a impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), o erro passará a ser imputável à Administração Tributária após o eventual indeferimento da pretensão apresentada pelo contribuinte, isto é, a partir do momento em que, pela primeira vez a Administração Tributária toma posição sobre a situação do contribuinte, dispondo dos elementos necessários para proferir uma decisão com pressupostos correctos». À prática de acto expresso, continua o mesmo autor, «deverá ser equiparado para esse efeito, o indeferimento tácito, formado pelo decurso do prazo legal de decisão da impugnação administrativa (art. 57., n.º 5, da LGT), pois é este o momento em que a Administração Tributária deveria ter proferido um acto legal e, com a sua omissão, manteve a situação de ilegalidade, o que permite imputar-lhe a responsabilidade pela manutenção da situação de erro e pagamento indevido» (Ob. cit., pág. 52.
Ou seja, o indeferimento tácito da reclamação graciosa do acto de liquidação (a reclamação graciosa deveria ter sido decidida em seis meses, como prescrevia o n.º 1 do art. 57.º da LGT, na redacção em vigor à data e, não o tendo sido dentro desse prazo, presume-se o seu indeferimento, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo) determinou a alteração da imputabilidade do erro, não relevando, assim, a argumentação da Recorrente no sentido de não aplicação do disposto no art. 43.º da LGT e de que não estava na posse de todos os elementos necessários, se não estava é porque contrariamente à posição do tribunal a quo, que os solicitou, não usou das prerrogativas e deveres de inquisitório e de busca da verdade que sobre si recaíam.
Com este pano de fundo, na situação dos autos, em qualquer dos enquadramentos descritos, temos que é irrecusável a conclusão de que são devidos juros indemnizatórios, até porque as alegações da Recorrente não têm a virtualidade de colocar em crise o que ficou dito na doutrina e jurisprudência citada, o que significa que a decisão recorrida que julgou ilegal a liquidação de IRS na parte respeitante à determinação das mais-valias (categoria G), por não ter atendido aos encargos com a valorização dos bens e às despesas necessárias e praticadas com a sua aquisição e alienação por erro nos pressupostos e condenou ATA em juros indemnizatórios, não nos merece qualquer censura.
Ou seja, assim se mostram preenchidos os pressupostos legais que conferem ao Recorrido o direito ao recebimento de juros indemnizatórios, como bem decidiu a sentença recorrida.
2.3. Conclusões
I. O direito a ser indemnizado pelo pagamento de juros indemnizatórios quando se determine em reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços de que resultou pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (art.º 43º/1 LGT), reflete o princípio da igualdade dos sujeitos da relação.
II. O conceito de erro imputável aos serviços deve ser contraposto ao conceito de vício. O “Erro”, restringe-se às situações de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, traduzindo-se numa inadequada aplicação do quadro legal à factualidade sujeita a imposto.Apenas os “erros” são suscetíveis de reparação pelo pagamento de juros indemnizatórios ao contribuinte.
III. Ainda que a liquidação tenha sido efectuada correctamente de acordo com os elementos de facto declarados pelo contribuinte, se este pediu a anulação da mesma mediante impugnação administrativa com fundamento em erro nos pressupostos de facto e a AT, indevidamente, lha recusa ou não cumpre os prazos de decisão, deve considerar-se que desde esse momento da decisão de indeferimento, efectiva ou presumida, a imputabilidade do erro se transferiu para a AT desde (passando a constitui um erro dos serviços), a determinar o pagamento por esta ao sujeito passivo de juros indemnizatórios sobre o montante pago [cfr. art. 43.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), da LGT].

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Porto, 12 de janeiro de 2023

Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos
Margarida Reis