Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01797/10.5BEBRG-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:09/13/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:ROGÉRIO PAULO DA COSTA MARTINS
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO ANULATÓRIO;
TEORIA DA INDEMNIZAÇÃO;
TEORIA DO VENCIMENTO;
Sumário:
1. A adopção do critério consubstanciado na "teoria da indemnização", segundo o qual a eliminação do efeito negativo do não pagamento dos vencimentos relativos ao período de afastamento do interessado do exercício do cargo opera-se pela indemnização dos prejuízos concretamente sofridos em consequência do acto culposo da Administração, não traduz um princípio geral de direito administrativo, a aplicar em todos os casos, dependendo da solução mais adequada à conciliação dos interesses em causa, em cada situação a resolver, impondo-se restringir a sua aplicação em benefício da "teoria do vencimento" sempre que a especificidade da situação em análise assim o dite (do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1992, no recurso 4928ª).

2. No caso concreto os danos que resultam do facto de o acórdão proferido nos autos principais não poder ser executado coincidem com os danos causados pelo acto administrativo anulado.

3. O exequente receberia, se não fosse a prática do acto anulado, o valor líquido do vencimento, ou seja, o valor bruto com dedução dos descontos legais.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução de Sentença
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

«AA» veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 28.02.2024, proferida nos autos de execução de sentença que intentou contra o Ministério das Finanças e da Administração Pública para execução do acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.12.2019, transitado em julgado, pelo qual o Executado foi condenado a “adoptar os actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado e dar cumprimento aos deveres que não cumpriu com fundamento no acto impugnado”.

O Recorrido contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*
Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

*
I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1) A factualidade articulada e provada nos autos permite considerar que a decisão indemnizatória proferida pelo Tribunal recorrido não cumpre com todas as exigências legais. Entende o recorrente que a, aliás, douta sentença recorrida padece de erro de julgamento, de facto e de direito. Com efeito,

2) A questão que ao Tribunal a quo cumpria solucionar era a de fixar o montante da indemnização devida pelo facto da inexecução, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 178.° e 166.°, n° 2 do CPTA, tal como, de resto, foi fixada pelo próprio Tribunal.

3) Porém, o Tribunal a quo não fixou qualquer valor indemnizatório, tendo decidido nos seguintes termos: “[...] condenar a Entidade Executada ao pagamento de indemnização ao Exequente, em consequência de causa legítima de inexecução do julgado, traduzida nas diferenças remuneratórias e de carreira, calculadas com referência ao período compreendido entre 01-05-2010 a 29-10.2013, acrescidas de juros de mora incidentes sobre as diferenças percecionadas, à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma até 29.04.2021, deduzida dos descontos legais devidos, incluindo os devidos à Caixa Geral de Aposentações, para reflexo na pensão de aposentação do Exequente [...]”. Cfr págs. 14 da douta sentença recorrida. Quid Iuris?

4) Para o recorrente ide est luce claribus (isto é claro, salta aos olhos). Vejamos. Como decorre claramente do disposto no artigo 166.º, nº 2 do CPTA, na falta de acordo entre as partes sobre o montante indemnizatório - como é o caso - cabe ao Tribunal fixar esse montante. Ora Como se constata pela simples leitura da douta sentença recorrida, o Tribunal a quo não fixou qualquer montante indemnizatório. E tinha de fixar.

5) Na verdade, a douta sentença recorrida, em vez de fixar um montante indemnizatório emergente da inexecução do acórdão exequendo, determinou o pagamento de remunerações cuja falta emergiu da ilegalidade do despacho anulado pelo acórdão exequendo.

6) Quer isto dizer que o Tribunal a quo incorreu num vício de raciocínio em que raciocina bem sobre dados falsos, ou seja, incorreu num paralogismo na modalidade de “salto à causa”. porque toma por causa aquilo que não é causa, na justa medida em que lhe competia fixar a sua atenção nos danos emergentes da inexequibilidade do acórdão exequendo e acabou por fixar a sua atenção nos danos emergentes da ilegalidade do acto administrativo anulado pelo acórdão exequendo.

7) De facto, a indemnização que o Tribunal tinha de fixar visava o ressarcimento dos danos emergentes da inexecução do acórdão exequendo e não das perdas salarias emergentes do acto ilegal - só indemnizáveis através de acção de indemnização nos termos gerais, que o recorrente intentou oportunamente [Cfr Processo nº 234/23.0BEBRG-U.O.1]

8) Este erro de raciocínio levou o Tribunal a quo a decretar uma verdadeira execução parcial do acórdão exequendo cuja inexecução havia sido anteriormente justificada na totalidade no saneador-sentença. Portanto, se o acórdão exequendo foi declarado como inexequível, na sua totalidade, por decisão deste Tribunal, não pode o mesmo Tribunal determinar agora a sua execução parcial.

9) Conclui-se, por conseguinte, que este Tribunal estava legalmente incumbido de fixar o montante indemnizatório devido pela inexecução do acórdão exequendo e não o fez, pelo que, não o tendo feito, incorreu em erro de direito, resultante de uma errada interpretação e aplicação da lei. Acresce que,

10) O erro de julgamento em que este Tribunal incorreu afecta gravemente os legítimos direitos e interesses em matéria fiscal/tributária do recorrente.

11) Na verdade, não é indiferente, do ponto de vista fiscal ou tributário, que o Tribunal fixe um montante indemnizatório ou mande ressarcir salários que não foram pagos quando devidos (salários retroactivos).

12) No primeiro caso, está-se perante uma indemnização fixada pelo Tribunal que o Código do IRS exclui da sujeição a imposto, como decorre do disposto no artigo 9.°, n° 1 - alínea b) daquele Código.

13) Por outro lado, como decorre do disposto no artigo 6.°, n° 1 do Estatuto de Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n° 498/72, de 9 de Dezembro (e alterações subsequentes) apenas os ordenados, salários, gratificações, emolumentos, subsídios de férias e Natal e outras remunerações certas ou acidentais, fixas ou variáveis, correspondentes ao cargo ou cargos exercidos e não isentas de quota nos termos do disposto no n° 2, estão sujeitos ao desconto para a Caixa Geral de Aposentações, não estando aí previstas, por conseguinte, as indemnizações fixadas ou homologadas pelos tribunais.

14) Por conseguinte, neste caso, carece de suporte legal o facto de o Tribunal a quo ter determinado a sujeição daquilo que considera ser uma indemnização, aos descontos legais - IRS e CGA.

15) Já no segundo caso, está-se perante remunerações do trabalho, que o artigo 2.°, n° 1 - alínea a) do Código do IRS qualifica como rendimentos da categoria “A”, sujeitos a imposto nos termos gerais, o mesmo acontecendo com os descontos para a Caixa Geral de Aposentações, como vimos acima.

16) Por outro lado, o segmento da douta sentença recorrida que manda proceder aos descontos legais, incluindo os devidos à Caixa Geral de Aposentações, para reflexo na pensão de aposentação do Exequente, redundaria apenas em mais um prejuízo para o recorrente, porquanto, a Caixa Geral de Aposentações não iria proceder a qualquer revisão da pensão de aposentação do recorrente, porquanto, de acordo com o disposto nos n°s 1- alínea b) e 4 do artigo 43.° do Estatuto de Aposentação [que estabelece o regime de aposentação voluntária] “: É irrelevante qualquer alteração de remunerações ocorrida posteriormente à data a que se refere o nº 2 [contagem do tempo de serviço].

17) Ou seja, se a douta sentença recorrida fosse cumprida pela executada, o recorrente seria desapossado do valor dos descontos para a Caixa Geral de Aposentações sem que daí lhe adviesse qualquer vantagem, dado que a alteração de remunerações iria ocorrer em momento posterior à data de atribuição da pensão de aposentação (data em que se fez a contagem do tempo de serviço), sendo, por esse motivo, irrelevante para o cálculo da pensão, como decorre da lei, para além de que a Caixa Geral de Aposentações, não estando vinculada a esta sentença, porque não é parte no processo, certamente a não iria cumprir. Acresce que,

18) O segmento da douta sentença recorrida que manda proceder ao pagamento de juros moratórios também não faz uma correcta interpretação e aplicação da lei e do direito. Com efeito, se o que está em causa é a fixação de uma indemnização devida pelo facto da inexecução do acórdão exequendo e não o pagamento atrasado de remunerações, não faz qualquer sentido colocar como questão decidenda o direito a juros moratórios - que não existe qua tale.

19) Isso não quer dizer que o valor hipotético dos juros moratórios não possa ser tido em conta - como um referencial - na fixação do montante indemnizatório devido pela inexecução do acórdão exequendo. Tendo sido isso que o recorrente pretendeu ao incluí-los na sua proposta de montante indemnizatório junta aos autos.

20) Neste caso, os juros de mora hipotéticos devem ser calculados sem as limitações impostas neste segmento da douta sentença recorrida, porquanto, não está em causa o pagamento retractivo de quaisquer remunerações

21) Em todo o caso, se este colendo Tribunal entender o contrário - o que se admite como mera hipótese de raciocínio - sempre os juros moratórios deveriam ter sido calculados sem a limitação imposta na douta sentença recorrida. Vejamos porquê.

22) Como decorre da matéria de facto dada como provada - Cfr item 9. [aditado/novo] do probatório, o recorrente forneceu o seu IBAN a este Tribunal em 28.05.2021, juntamente com a réplica, para que o mesmo fosse comunicado pelo Tribunal à executada, a fim de esta proceder ao pagamento da verba que, em seu entendimento, era devida ao recorrente.

23) Portanto, se a executada não efectuou o referido pagamento, essa falta não pode ser imputada a mora do credor - o recorrente.

24) Por outro lado, o não fornecimento do IBAN pelo recorrente à primeira solicitação da executada foi devidamente justificado, como decorre da matéria de facto dada como provada - Cfr item 8. [aditado/novo] do probatório.

25) Daqui resulta que o segmento da douta sentença recorrida que manda pagar juros moratórios sobre aquela verba limitados a 29.04.2021 com fundamento em mora do credor incorre em erro de julgamento da matéria de facto.

26) Como vem reconhecido na pág. 6 da douta sentença recorrida - “Pretende o Exequente que a indemnização em questão deve contemplar os danos que decorrem do facto de o acórdão exequendo não poder ser executado, que se traduzem nas diferenças salariais e no prejuízo causado no valor da sua pensão de aposentação”. (Sic)

27) No que diz respeito às diferenças salariais a ter em consideração na fixação da indemnização devida, o recorrente já se pronunciou acima, faltando pronunciar-se sobre o prejuízo causado no valor da sua pensão de aposentação, o que fará de seguida.

28) Como vem referido a págs. 10/11 da douta sentença recorrida - na perspectiva do recorrente: “se o acórdão condenatório tivesse sido executado, ainda estaria ao serviço, ou seja, não estaria aposentado, por não ter tido a necessidade de se aposentar antecipadamente, o que se traduz numa afectação negativa do seu valor pensão e numa redução de 12% respeitante ao fator de sustentabilidade. (...)
Em contraposição, o Executado sustenta que não existe qualquer nexo de causalidade entre o facto de o Exequente ter decidido pedir a reforma antecipada em 2013, com as inerentes implicações, e o despacho que veio a ser anulado no âmbito do presente processo (...)
Adiante-se que somos do entendimento assistir razão ao Executado.
Independentemente da discussão que possa ser tida em sede de responsabilidade civil, cremos que esta não é a sede própria para o Exequente reclamar tais montantes (...)
Em síntese, não serão consideradas na indemnização arbitrada as perdas no valor da pensão de Aposentação, passadas e futuras, conforme reclamado pelo Exequente.” Quid Iuris?

29) O excerto da douta sentença recorrida acima transcrito revela à saciedade que o Tribunal a quo incorre num vício de raciocínio que inquina toda a decisão. Vejamos. Como decorre claramente do disposto no artigo 166.º, nº 2 do CPTA, na falta de acordo entre as partes sobre o montante indemnizatório - como é o caso - cabe ao Tribunal fixar esse montante. - Questão já ventilada acima.
30) Ora, o montante indemnizatório em questão visa ressarcir os danos emergentes da inexecução do acórdão exequendo e não os danos emergentes da ilegalidade do acto administrativo anulado pelo acórdão exequendo. - Questão igualmente ventilada acima.

31) Assim, não faz qualquer sentido dizer que: “não existe qualquer nexo de causalidade entre o facto de o Exequente ter decidido pedir a reforma antecipada em 2013, com as inerentes implicações, e o despacho que veio a ser anulado no âmbito do presente processo” Claro que não existe, nem tal nexo de causalidade é necessário para se fixar a indemnização devida pela inexecução do acórdão exequendo.

32) Com efeito, o nexo de causalidade exigível para efeitos desta específica indemnização reside na não execução do acórdão exequendo e não na ilegalidade do despacho que veio a ser anulado pelo acórdão exequendo.

33) Aliás, o nexo de causalidade a que a douta sentença recorrida se refere está á ser discutido na acção de indemnização nos termos gerais oportunamente deduzida pelo recorrente - [Cfr Processo nº 234/23.0BEBRG-U.O.1 pendente neste tribunal]

34) Na verdade, os danos emergentes da ilegalidade do despacho anulado pelo acórdão exequendo não estão a ser objecto dos presentes autos, que têm em vista tão só e apenas a fixação de uma indemnização devida pela inexecução do referido acórdão.

35) Por conseguinte, deveria o Tribunal a quo ter analisado da existência, ou não, do nexo de causalidade entre o pedido de reforma antecipada e inexecução do acórdão exequendo e não, como fez, do nexo de causalidade entre o pedido de reforma antecipada e a ilegalidade do despacho anulado pelo referido acórdão. - Questão já ventilada acima.

36) Ao ter dirigido a sua atenção para o nexo de causalidade entre o pedido de reforma antecipada e a ilegalidade do despacho anulado pelo acórdão exequendo, o Tribunal a quo falhou o alvo!

37) O recorrente entende que existe o nexo de causalidade entre o pedido de reforma antecipada e a inexecução do acórdão exequendo, daí resultando uma diminuição no valor da pensão de aposentação do recorrente geradora de prejuízos sofridos na sequência da inexecução do acórdão exequendo, desde esse momento e com reflexo nas pensões futuras.

38) No que tange ao nexo de causalidade, aplica-se aqui, assim como nos demais casos de responsabilidade do Estado por factos ilícitos, a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, tal como vem definida no art° 563.° do Código Civil, segundo a qual “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão - Cfr Ac. TCAS de 28.06.2018 - Proc° n° 1941/15.6BELSB, disponível em www.dgsi.pt

39) Segundo Costa, Almeida, in Direito das Obrigações, Almedina, pág. 780, entende-se que o art° 563.° do Código Civil ao fazer apelo à ideia de probabilidade do dano, consagra a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, segundo a qual é necessário, não só que “o facto tenha sido, em concreto, condição sine qua non do dano, mas também que constitua, em abstrato, segundo o curso normal das coisas, causa adequada à sua produção”.

40) No caso concreto, o facto deu origem ao dano. Na verdade, a inexecução do acórdão exequendo causou um dano que não teria ocorrido se aquele acórdão tivesse sido executado normalmente, e foi este facto concreto que constitui, em abstrato, causa idónea dos danos patrimoniais, segundo o curso normal das coisas, que o recorrente reclama.

41) Por outro lado, também não é correcto dizer-se que a diminuição na pensão de aposentação do recorrente resulte apenas do factor de sustentabilidade (12%) porquanto, na proposta de montante indemnizatório apresentado nos autos pelo ora recorrente, também contabilizou a perda pela antecipação da aposentação (0,5% por cada ano de antecipação) bem como o valor que deixará de receber por referência à esperança média de vida para os homens, publicada pelo INE (Instituto Nacional de Estatística)

42) Deste modo, pode dizer-se que os danos sofridos pelo recorrente no que à sua pensão de aposentação diz respeito, apresentam um duplo nexo de casualidade: entre o pedido de reforma antecipada e o despacho anulado pelo acórdão exequendo, num primeiro momento, e entre o pedido de reforma antecipada e a inexecução do acórdão exequendo, num segundo momento.

43) Quer isto dizer que se este dano for ressarcido nestes autos, daí resultará uma inutilidade superveniente da lide a impedir que esse mesmo dano venha a ser ressarcido novamente, agora na acção de indemnização nos termos gerais acima identificada.

44) Por conseguinte, entende o recorrente que, a questão decidenda, tal como foi fixada pelo Tribunal a quo foi por este, incorrectamente decidida, padecendo a douta decisão recorrida de erro de julgamento, de facto e de direito, devendo, por isso, ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, ser aquela decisão revogada e substituída por outra que fixe o montante indemnizatório dentro dos parâmetros propostos pelo recorrente, porque devidamente justificados.

45) Violou a douta sentença recorrida as seguintes normas legais: artigos 94.°, n° 1 e 166.°, n° 2 do CPTA e artigo 563.° do Código Civil.

NESTES TERMOS, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGANDO-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA COM BASE NOS FUNDAMENTOS INVOCADOS NO PROCESSO E PROFERINDO-SE DECISÃO QUE FIXE UMA INDEMNIZAÇÃO DENTRO DOS PARÂMETROS PROPOSTOS PELO RECORRENTE

*

II –Matéria de facto.

O Recorrente entende que devem ser aditados factos relevantes e não controvertidos:

. O acórdão indicado no item antecedente transitou em julgado em 05.02.2020.- Facto não controvertido.
. O acórdão indicado no item antecedente não foi executado espontaneamente no prazo legalmente estabelecido para esse efeito, que terminou em 15.10.2020. - Facto não controvertido.

.O exequente não forneceu o seu IBAN no seguimento do pedido mencionado no item antecedente, justificando a sua recusa com o facto de já ter expirado o prazo para a execução espontânea, tendo já pendente um pedido de execução de julgados e que o fornecimento do seu IBAN poderia ser interpretado como concordância com os termos da execução que a executada pretendia levar a cabo, com os quais não concordava. – Cfr troca de e-mails, transcrita no ponto 11.º da oposição da executada.

. O exequente forneceu o seu IBAN a este Tribunal em 28.05.2021, juntamente com a réplica, na sequência da notificação para se pronunciar sobre a oposição da executada, onde era pedido, novamente, o fornecimento do IBAN do exequente. – Cfr peça processual n° 445904.

. O pedido de execução de julgados a que se alude no item 8., deduzido pelo exequente, refere-se aos presentes autos, tendo este Tribunal julgado procedente a invocação de causa legítima e inexecução por parte da executada no saneador-sentença proferido em 07-12-.2023. - Facto não controvertido

. Na sequência do saneador-sentença vieram as partes informar o Tribunal do facto de não ter sido possível acordar no montante da indemnização devida pela inexecução do acórdão exequendo, apresentando as mesmas uma proposta sobre o montante indemnizatório a fixar pelo Tribunal - Facto não controvertido

. A proposta de indemnização apresentada pelo exequente identifica como danos emergentes da inexecução do acórdão exequendo perdas salariais e perdas no valor da sua pensão de aposentação, que quantificou em 24.021,78€ (a que acrescem juros de mora) e 298.666,52€, respectivamente. Cfr peça processual n°.

. A proposta de indemnização apresentada pela executada visa a reconstituição da situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, o que implica o ressarcimento de remunerações não recebidas que quantifica em 24.021,78€ (a que acrescem juros de mora contados até Abril de 2021), assim discriminadas: ordenados:3.279,52€; FET:11.490,43€ e despesas de representação: 9.251,83€. – Cfr peça processual n° 521404 .

Dado que efetivamente estes factos são relevantes, se encontram documentados e não estão controvertidos, deverão ser aditados.

Reproduzindo-se, para melhor esclarecimento, as propostas mencionadas nos dois últimos itens.

Deveremos assim dar como provados os seguintes factos, constantes da decisão recorrida:

1) No ano de 2010, o Exequente intentou acção administrativa especial contra o Ministério das Finanças, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que correu termos sob o n.º de processo 1797/10.5BEBRG - Cfr. autos da acção principal.

2) Os pedidos formulados na acção identificada no ponto precedente eram os seguintes:

“Termos em que
1. Deve ser declarada a procedência da presente acção administrativa e, a final, ser anulado o despacho impugnado.
2. Deve ser condenada a Administração à adopção dos actos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado e dar cumprimento aos deveres que ela não tenha cumprido com fundamento no acto impugnado”

- Cfr. sentença constante dos autos principais - P.º 1797/10.5BEBRG.

3) A acção referida nos pontos antecedentes tinha como objeto o despacho n.º 35/2010, de 20-05-2010, proferido pelo então Director-Geral dos Impostos, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 107, de 02.06.2010, o qual procedeu à nomeação, em regime de substituição, com efeitos a 01-05-2010, do Contrainteressado, «BB», para o cargo de Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças ... - cf. autos da ação principal.

4) A acção identificada nos pontos precedentes findou com acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 20-12-2019, nos seguintes termos:

“DECISÃO
Termos em que se acorda:
a) negar provimento ao recurso do Réu/Ministério das Finanças;
b) conceder provimento ao recurso do Autor e, consequentemente, revoga-se a sentença quanto ao segmento acima mencionado, condenando-se a Administração a adoptar os actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado e a dar cumprimento aos deveres que não cumpriu com fundamento no acto impugnado. (...)”

- cf. acórdão junto como documento n.° 1 com a PI.

5) Em 29.04.2021, a Executada contactou o Exequente, pedindo-lhe o seu IBAN, para pagamento das quantias que entendia devidas em consequência do acórdão identificado no ponto antecedente - Cfr. troca de e-mails, transcrita no ponto 11.° da oposição da Executada.

6) O Exequente aposentou-se em 29.10.2013 - cfr. cálculo da Caixa Geral de Aposentações, junto como documento n.° 3 com a réplica, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

7) O acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.12.2019, transitou em julgado em 05.02.2020 - facto não controvertido.

8) Este acórdão não foi executado espontaneamente no prazo legalmente estabelecido para esse efeito, que terminou em 15.10.2020 - facto não controvertido.

9) O exequente não forneceu o seu IBAN, no seguimento do pedido da Executada de 29.04.2021, justificando a sua recusa com o facto de já ter expirado o prazo para a execução espontânea, tendo já pendente um pedido de execução de julgados e que o fornecimento do seu IBAN poderia ser interpretado como concordância com os termos da execução que a executada pretendia levar a cabo, com os quais não concordava – cf. troca de e-mails, transcrita no ponto 11.º da oposição da executada.

10) O exequente forneceu o seu IBAN a este Tribunal em 28.05.2021, juntamente com a réplica, na sequência da notificação para se pronunciar sobre a oposição da executada, onde era pedido, novamente, o fornecimento do IBAN do exequente – cf. peça processual n° 445904.

11) O pedido de execução de julgados deduzido pelo Exequente, refere-se aos presentes autos, tendo este Tribunal julgado procedente a invocação de causa legítima e inexecução por parte da Executada no saneador-sentença proferido em 07.12.2023 - facto não controvertido.

12) Na sequência do saneador-sentença vieram as partes informar o Tribunal do facto de não ter sido possível acordar no montante da indemnização devida pela inexecução do acórdão exequendo, apresentando as mesmas uma proposta sobre o montante indemnizatório a fixar pelo Tribunal - facto não controvertido.

13) A Exequente apresentou a seguinte proposta de indemnização (cf. requerimento de 13.01.2024 no SITAF):

“(…)
CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS

1. Considerando que no acórdão proferido no processo acima mencionado se decidiu: “condenar a Administração a adoptar os actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado e a dar cumprimento aos deveres que não cumpriu com fundamento no acto impugnado”

2. Considerando que estava em causa no referido processo o afastamento ilegal do, ora exequente, do cargo de chefe de divisão da Justiça Tributária da Direcção de Finanças ..., em regime de substituição.

3. Considerando que este acórdão transitou em julgado em 05.02.2020.

4. Considerando que na pendência do processo em causa o ora exequente se viu na necessidade de pedir a reforma antecipada, tendo passado à condição de aposentado em 29.10.2013. – Cfr Doc nº 2 c/ 4 fls em anexo

5. Considerando que a Administração não procedeu à execução espontânea do acórdão condenatório no prazo legal, tendo o ora exequente pedido a respectiva execução de julgados em tribunal.

6. Considerando que a Administração invocou no processo executivo a existência de causa legítima de inexecução, tendo o TAF de Braga julgado procedente essa invocação e remetendo as partes para acordarem sobre o montante da indemnização devida pela inexecução do referido acórdão condenatório.

7. Considerando que se as partes não chegarem a acordo, a indemnização devida será fixada pelo tribunal.

8. Considerando que o ora exequente pretende propor o montante da indemnização a que se acha com direito, com vista à compensação dos danos causados pela impossibilidade de executar o acórdão condenatório.

9. Considerando que o valor da indemnização pretendida pelo ora exequente deverá permitir o ressarcimento da vantagem económica que o exequente poderia ter obtido caso o acórdão condenatório tivesse sido executado, ou seja, a perda da possibilidade da reconstituição natural.

10. Considerando que o montante indemnizatório deve contemplar os danos que decorrem do facto de o acórdão exequendo não poder ser executado e de, por esse motivo, o exequente não poder ser colocado na situação que teria não fora a ilegalidade que determinou a anulação do acto que o preteriu na nomeação para um cargo dirigente.

11. Considerando que o valor da indemnização deverá ser estabelecido tomando por referência o valor dos danos causados pelo acto administrativo anulado, que poderiam ter sido reparados se o acórdão exequendo tivesse sido executado.

12. Considerando que esses danos correspondem a diferenças salariais e ao prejuízo causado no valor da pensão de aposentação do ora exequente, segue-se a

JUSTIFICAÇÃO E CÁLCULO DO VALOR INDEMNIZATÓRIO

13. Portanto, se o acórdão condenatório tivesse sido executado, o ora exequente teria sido nomeado para o cargo de Chefe de Divisão da Justiça Tributária de ..., do qual fora preterido ilegalmente, com efeitos retroagidos à data de produção de efeitos do acto impugnado e posteriormente anulado, ou seja, a 01.05.2010 e enquanto se mantivesse, ou devesse manter, nesse cargo.

14. Consequentemente, o ora exequente teria tido direito às diferenças salarias devidas, que, de acordo com a informação remetida ao TAF de Braga pela AT, no passado mês de Outubro, ascenderiam a 24.021,78€, a que deverão acrescer os juros legais à taxa de 4%, contados de 01.05.2010 até ao trânsito em julgado do acórdão condenatório, que ocorreu a 05.02.2020.

15. Para calcular os juros legais, neste caso, há que ter em conta uma mora de 3.559 dias, que à taxa de 4%/ano aplicada ao capital no valor de 24.021,78€ redunda no valor de 9.369,15€ assim apurado: [24.021,78€ x 4% x 3.559 / 365 =] e que devem acrescer ao capital.

16. Por outro lado, se o acórdão condenatório tivesse sido executado, isso quereria dizer que o ora exequente ainda estaria ao serviço, ou seja, não estaria aposentado, por não ter tido a necessidade de se aposentar antecipadamente – o que ocorreu na pendência da acção donde emergiu a condenação da Administração (por se sentir afectado na sua saúde mental e, por via dela, da sua capacidade de trabalho, na sequência do “litígio” que o opunha à Administração – Cfr Doc. nº 1 c/ 6 fls em anexo) .

17. A antecipação da reforma do ora exequente afectou negativamente o valor da sua pensão, na medida em que se baseou numa remuneração de referência baseada em menos anos de serviço (portanto, menor), num biénio calculado com base em remunerações acessórias (FET) inferiores e sofreu a redução de 12% respeitante ao factor de sustentabilidade.
– Cfr Doc nº 2 c/ 4 fls em anexo.

18. Com efeito, o valor da pensão atribuído ao ora exequente foi determinado de acordo com as condições vigentes em 29.10.2013 quando, em condições normais esse valor seria determinado de acordo com as condições vigentes (pelo menos) em 31.12.2019.

19. A pensão atribuída ao ora exequente, de acordo com as condições vigentes em 29.10.2013, foi de 2.660,71€, sendo composta por duas parcelas - P1 e P2.

20. A parcela P1 reporta-se ao ano de 2005 e é fixa (actualizável através do factor de revalorização), enquanto a parcela P2 é variável e depende do tempo de serviço prestado posteriormente a 2005 e respectivas remunerações.

21. Na verdade, se o ora exequente se tivesse aposentado depois do trânsito em julgado do acórdão exequendo, a sua aposentação não teria quaisquer cortes porquanto, nessa data já detinha a idade legal de acesso à reforma integral, porquanto, tendo nascido a ../../1953, a sua idade era superior à idade da reforma estabelecida pela Portaria nº 50/2019 (66 anos e 5 meses).

22. Deste modo, para se apurar o prejuízo resultante da antecipação forçada da aposentação, os cálculos efectuados pela CGA devem ser reformulados levando-se em conta as remunerações base até Dezembro de 2019 [prescindindo-se das remunerações de 2020, para simplificar as contas], o valor médio do biénio calculado com base no FET de 2018 e 2019 e os coeficientes de actualização aprovados pela Portª nº 179/2020, de 3 de Agosto, sem cortes (antecipação e factor de sustentabilidade).

23. Assim, procede-se, de seguida, ao recálculo da remuneração de referência para efeitos da P2, uma vez que a PI é fixa:
RECÁLCULO DA PENSÃO – DL Nº 60/2005 - (Cfr Doc nº 3)

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

24. Bem como ao recálculo da média do biénio com base nos valores hipotéticos de 2018 e 2019 [4.286,68/4x12 (em cada ano)] - Cfr Doc nº 3 em anexo:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

25. E, ainda, do recálculo da contagem de tempo reportado a 31.12.2019 - Cfr Doc nº 2 em anexo:

• Tempo contado pela CGA reportado a 29.10.2013: 39a 10m 25d
• Recálculo do tempo de serviço reportado a 31.12.2019: 46a 0m 25d

26. E, também, ao recálculo da pensão geral (reformulação do mapa de cálculo – Cfr Doc nº 2 em anexo:

• Percentagem de redução: 0
• Factor de sustentabilidade: 0
• Remuneração de referência: 4.008,26€

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]


27. E, finalmente, ao recálculo da pensão ideal:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

28. Temos, assim, uma diferença de 1.222,54€ mensais entre o valor da pensão auferida (2.660,71€) e o valor da pensão que auferiria (3.883,25€) se a aposentação tivesse ocorrido em 31.12.2019 [prescindindo-se do tempo relativo a 2020], representando um prejuízo anual com subsídios de férias e Natal de 17.115,56€.

29. Ora, tomando por referência a esperança média de vida em Portugal, para os homens, relativamente ao ano de 2019, divulgada pelo SNS em 2020 [Cfr Doc. nº 4 em anexo] que era de 77,95 anos e que o ora exequente tinha em 29.10.2013 (data da aposentação) 60,5 anos, (nascido a ../../1953) podemos concluir que o ora exequente sofrerá uma perda na sua pensão no montante de 298.666,52€, assim calculados [(77,95 – 60,5) = 17,45 x 17.115,56€. = 298.666,52)] .

30. Portanto, os danos provocados pela inexecução do julgado, danos que deveriam ser ressarcidos e evitados se o julgado exequendo tivesse sido executado, consistem no seguinte: • Diferenças salarias não recebidas no montante de: 24.021,78€, • Juros legais sobre o valor das diferenças salinarias, não recebidos: 9.369,15€ • Perdas no valor da pensão de aposentação, passadas e futuras, no montante de: 298.666,52€ 31. Danos perfeitamente quantificados, no valor global de 332.057,45€ 32. Razão pela qual, deverá este valor servir de base à determinação do valor indemnizatório, não sendo necessário recorrer à equidade, reservada para os casos difíceis ou impossíveis de quantificar.

(…)”.

14) A Executada, por seu turno, apresentou a seguinte proposta de indemnização (cf. requerimento de 22.01.2024 no SITAF):

“(…)

1 - Da decisão cuja execução constitui objeto da presente ação resultou a anulação do despacho nº 35/2010, indicado como despacho nº 9363/2010, de 20.05.2010, de acordo com a publicação efetuada no Diário da República, 2ª série, nº 107, de 02.06.2010, que procedeu à nomeação em regime de substituição, do Contrainteressado «BB», no cargo de Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... e que, dessa nomeação, implicou o afastamento do Autor desse cargo, que lhe cabia, como substituto legal (artigo 14º, nº 1 do Decreto-lei nº 557/99, de 17/12).

Tal como decorre do despacho saneador/sentença do TAF de Braga, em síntese, que a) o Autor era interessado no procedimento e que foi lesado pelo ato impugnado, pois que, não tivesse sido praticado o mesmo, em princípio, para o cargo em causa seria designado o Autor ao abrigo do artigo 14º, nº 1, alínea e), do Decreto-Lei nº 557/99, de 17/12; e b) a decisão administrativa, consubstanciada no despacho impugnado, dizia respeito ao Autor, pelo que devia a Administração ter possibilitado a participação do mesmo na sua formação (…).

Por sua vez, o Acórdão do TCA Norte confirmou o segmento da sentença recorrida e considerou que “(…) o Autor é interessado no procedimento e que foi lesado pelo ato em crise; não tivesse sido praticado o ato e, em princípio, o cargo em causa nos autos seria desempenhado pelo Autor, ao abrigo do artigo 14º, nº 1, al. e), do Decreto-lei nº 557/99, de 17/12”.

De referir que o Contrainteressado, «BB», exerceu o cargo de Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ..., em regime de substituição, de 01.05.2010 a 03.11.2010.

E que, o lugar naquele cargo manteve-se vago até 30.10.2016, o qual passou a estar ocupado com a designação do então chefe de divisão, em comissão de serviço, a partir de 01.11.2016, após conclusão do procedimento concursal aberto em 09.09.2016, o que, em princípio, seria expetável que o cargo em causa tivesse sido exercido pelo Autor até à sua aposentação em 30.11.2013.

2 - A reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, implica que se considere para todos os efeitos, designadamente remuneratórios com reflexo na pensão de aposentação, que o trabalhador em causa «AA», desempenhou, em regime de substituição, o cargo de Chefe de Divisão de Justiça Tributária, da Direção de Finanças ..., no período temporal de 01.05.2010 até 30.11.2013, data da sua aposentação (sublinhado nosso).

E, contrariamente ao peticionado, visando a indemnização por causa legitima de inexecução compensar a perda da situação jurídica cujo restabelecimento a execução da sentença anulatória seria suscetível de lhe proporcionar devendo ser calculada em função do prejuízo decorrente da perda de uma situação vantajosa do ponto de vista patrimonial.

Essa perda traduz-se nas diferenças remuneratórias entre os valores que foram pagos e os devidos pelo exercício do cargo de chefe de divisão.

3 - E não, como se pretende, um acréscimo para compensação da aposentação antecipada porquanto não existe qualquer nexo de causalidade ente o facto de o A. ter decidido pedir a reforma antecipada em 2013, com as inerentes implicações, e o despacho que veio a ser anulado no âmbito do presente processo.

Eventuais danos não patrimoniais emergentes da situação deverão ser discutidos em sede de açção de responsabilidade civil e não no âmbito do presente processo.

Assim sendo, no cálculo da indeminização devida ao Exequente deverão ser desconsiderados os valores peticionados sob os nºs 16 a 29 por se mostrarem irrelevantes nesta sede.

4 - Além disso, importa insistir na cronologia dos fatos pós o trânsito em julgado da decisão cuja execução está em causa.

O acórdão do TCA Norte cuja execução se discute nestes autos transitou em Fevereiro de 2020 sendo certo que desde Abril de 2021 a AT está disponível para a sua execução tendo contactado o interessado no sentido de obter o seu IBAN de forma a proceder ao pagamento das quantias devidas.

Conforme foi relatado em sede de oposição o Exequente, apesar de instado, nunca forneceu os dados para a concretização dos procedimentos de execução o que deverá ser levado em consideração na fixação da indemnização, nomeadamente na análise da mora do devedor para efeito de juros de mora. Nesta sede importa, tão só, proceder á reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, o que implica que se considere para todos os efeitos, designadamente remuneratórios com reflexo na pensão de aposentação, que o trabalhador em causa «AA», desempenhou, em regime de substituição, o cargo de Chefe de Divisão de Justiça Tributária, da Direção de Finanças ..., no período temporal de 01.05.2010 até 30.11.2013, data da sua aposentação.

Neste sentido, a AT está disponível para pagar a quantia de 24.184,08€ corresponde às diferenças remuneratórias entre o que foi pago e o que deveria ter sido a título de vencimentos, Fundo de Estabilização Tributária e despesas de representação. Aliás, já em Abril de 2021 a AT manifestou a sua disponibilidade para o pagamento que o Exequente recusou.

Face a essa recusa cessou a mora do devedor e, por esse motivo, os juros de mora são devidos apenas até Abril de 2021.

Conclusão

a) A AT, em termos de indemnização, está disponível para pagar a quantia de 24.184,08€ e os respetivos juros desde 1 de Maio de 2010 até Abril de 2021.

b) As quantias peticionadas a título de indemnização por reforma antecipada mostram-se irrelevantes nesta sede, motivo porque deverão ser desconsideradas.

(…)”.


*
III - Enquadramento jurídico.

Este é o teor da decisão recorrida, na parte relevante:

“(…)

Vieram as partes informar os autos não ter sido possível lograr um acordo.

Pretende o Exequente que a indemnização em questão deve contemplar os danos que decorrem do facto de o acórdão exequendo não poder ser executado, que se traduzem nas diferenças salariais e no prejuízo causado no valor da sua pensão de aposentação. Mais aduz que se o acórdão condenatório tivesse sido executado, ainda estaria ao serviço, ou seja, não estaria aposentado, por não ter tido a necessidade de se aposentar antecipadamente, o que se traduz numa afetação negativa do seu valor de pensão e numa redução de 12% respeitante ao fator de sustentabilidade. Computa o montante final em 332.057,45€, decomposto em diferenças salarias não recebidas no montante de 24.021,78€, juros legais sobre o valor das diferenças de 9.369,15€ e perdas no valor da pensão de aposentação, passadas e futuras, no montante de 298.666,52€.

Por seu turno, o Executado defende que a reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, implica que se considere para todos os efeitos, designadamente remuneratórios com reflexo na pensão de aposentação, que o trabalhador em causa «AA», desempenhou, em regime de substituição, o cargo de Chefe de Divisão de Justiça Tributária, da Direção de Finanças ..., no período temporal de 01.05.2010 até 30.11.2013, data da sua aposentação. No que concerne ao acréscimo para compensação da aposentação antecipada, não existe qualquer nexo de causalidade ente o facto de o Exequente ter decidido pedir a reforma antecipada em 2013, com as inerentes implicações, e o despacho que veio a ser anulado no âmbito do presente processo, sendo que eventuais danos não patrimoniais emergentes da situação deverão ser discutidos em sede de ação de responsabilidade civil e não no âmbito do presente processo. Mais refere que em abril de 2021 manifestou a sua disponibilidade para o pagamento, que o Exequente recusou, pelo que aí cessou a mora do devedor e, por esse motivo, os juros de mora são devidos apenas até abril de 2021.

Cumpre apreciar e decidir.

O artigo 178.º, n.º 1 do CPTA preceitua que quando julgue procedente a invocação da existência de causa legítima de inexecução, o tribunal ordena a notificação da Administração e do requerente para, no prazo de 20 dias, acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução, podendo o prazo ser prorrogado quando seja previsível que o acordo se possa vir a concretizar em momento próximo.

O n.º 2 do mesmo normativo legal acrescenta que na falta de acordo, se seguem os trâmites previstos no artigo 166.º.

O n.º 2 do artigo 166.º do CPTA determina que na falta de acordo, o tribunal ordena as diligências instrutórias que considere necessárias, fixando o tribunal o montante da indemnização devida.

Importa aqui trazer à colação o disposto no artigo 566.º do Código Civil, que institui o seguinte:
Artigo 566.º
(Indemnização em dinheiro)
1. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
2. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
3. Se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.”.
Daqui decorre que, primeiramente, a indemnização deverá ter como referência as diferenças na situação patrimonial do lesado. Ante impossibilidade nesse sentido, será lícito o recurso à equidade.

Pois bem, tendo este ponto de partida, sempre se dirá que, em nosso entendimento, a indemnização deverá ser fixada com base quer nas diferenças remuneratórias, quer na reconstituição da carreira do Exequente.

Debruçando sobre o caso em apreciação, temos que informa o probatório que o objeto dos autos em questão era despacho n.º 35/2010, de 20-05-2010, proferido pelo então Diretor-Geral dos Impostos, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 107, de 02­06-2010, o qual procedeu à nomeação, em regime de substituição, com efeitos a 01-05­2010, do Contrainteressado, «BB», para o cargo de Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... – cfr. ponto 3) dos factos provados.

Mais decorre que o Exequente se aposentou em 29-10-2013 – cfr. ponto 6) do probatório.

Adiante-se que é posição deste Tribunal dever ser este o período de referência compreendido - 01-05-2010 a 29-10-2013, portanto data do início de funções de «BB» e a data de aposentação do Exequente.

E as diferenças remuneratórias e de carreira em questão decorrem dos elementos em posse da Executada, compreendendo as diferenças de vencimento, as diferenças de FET e de despesas de representação, calculadas com referência ao período compreendido entre 01­05-2010 a 29-10-2013.

Peticiona também o Exequente o pagamento de juros de mora por parte do Executado.
.
A Lei n.º 3/2010, de 27 de abril veio estabelecer a obrigatoriedade de pagamento de juros de mora pelo Estado pelo atraso no cumprimento de qualquer obrigação pecuniária.

Nos termos do seu artigo 1.º, n.º 1, o Estado e demais entidades públicas, incluindo as Regiões Autónomas e as autarquias locais, estão obrigados ao pagamento de juros moratórios pelo atraso no cumprimento de qualquer obrigação pecuniária, independentemente da sua fonte.

O n.º 2 acrescenta que quando outra disposição legal não determinar a aplicação de taxa diversa, aplica-se a taxa de juro referida no n.º 2 do artigo 806.º do Código Civil.

Instituindo o artigo 806.º, n.º 2 do Código Civil que os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal.

Como tal, a indemnização em questão deveria também compreender o pagamento dos juros de mora incidentes sobre as diferenças percecionadas, contados desde a data do vencimento de cada uma até ao seu pagamento, à taxa legal aplicável.

Todavia, o Executado refere que em abril de 2021 manifestou a sua disponibilidade para o pagamento, que o Exequente recusou, pelo que aí cessou a mora do devedor e, por esse motivo, os juros de mora são devidos apenas até abril de 2021.

Tal alegação é, a nosso ver, suscetível de ser enquadrada como mora do credor.

A este propósito, preceitua o artigo 813.º do Código Civil que o credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os atos necessários ao cumprimento da obrigação.

Informa o probatório que, em 29-04-2021, a Executada contactou o Exequente, pedindo-lhe o seu IBAN, para pagamento das quantias que entendia devidas em consequência do acórdão em questão nos presentes autos – cfr. ponto 5) dos factos provados.

Sobre o tema, escreveu-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 27-10-2022 (Processo n.º 2903/20.7T8VLG.P1, in: www.dgsi.pt):

“(...) Como referem Pires de Lima e Antunes Varela, há mora do credor se este não pratica os atos necessários ao cumprimento da obrigação (Código Civil Anotado, Vol. II, Coimbra, 4ª Ed., p. 85).

A jurisprudência tem salientado que para haver mora do credor – artigo 813º do Código Civil – não basta qualquer recusa de colaboração deste, quando exigível, para que o devedor execute proficientemente a sua prestação, sendo antes de exigir que essa recusa se relacione com atos de cooperação essenciais, omitidos ou recusados pelo credor que impeçam a realização da prestação pelo devedor (vd. por exemplo. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 14/01/2014, proc. nº 511/11.2TBPVL.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt). (...)”.

Ora, a recusa do Exequente em não fornecer o seu IBAN ao Executado encontrou respaldo no facto de já ter intentado a presente ação e na expiração do prazo para cumprimento por parte do devedor, não assentindo a tal cumprimento.

Atendendo às circunstâncias do caso, temos para nós que a recusa de fornecimento do IBAN por parte do Exequente consiste num ato de cooperação essencial para o cumprimento da obrigação por parte do Executado, visto este pretender dar cumprimento espontâneo (ainda que intempestivo) à sua obrigação.

No que diz respeito à justificação alegada pelo Exequente, o fornecimento do seu IBAN não contenderia com o prosseguimento dos presentes autos, caso entendesse que o montante transferido pelo Executado não preenchia o cumprimento do acórdão a ser executado, matéria que poderia ser discutida posteriormente.

Pelo que, em relação às diferenças remuneratórias e de carreira em questão, cessou a mora do devedor, ora Executado, em 29-04-2021, devendo ser esse o período de referência para efeitos de cálculo e pagamento dos juros moratórios em dívida.

Prosseguindo.

Ao montante indemnizatório terão que ser efetuados os descontos legais devidos.

Nestes se abrange os descontos e reflexos na pensão de aposentação do Exequente.

Em consequência, da indemnização em questão terão que ser deduzidos os montantes respetivos a entregar à Caixa Geral de Aposentações, de forma a permitir um eventual recálculo/revisão da pensão do Exequente, que reflita as diferenças remuneratórias percecionadas, traduzindo o reflexo na sua carreira contributiva.

Atentemos agora na pretensão do Exequente, no sentido de a indemnização em questão abranger as perdas no valor da pensão de aposentação, passadas e futuras.

Recorde-se que, na sua perspetiva, se o acórdão condenatório tivesse sido executado, ainda estaria ao serviço, ou seja, não estaria aposentado, por não ter tido a necessidade de se aposentar antecipadamente, o que se traduz numa afetação negativa do seu valor de pensão e numa redução de 12% respeitante ao fator de sustentabilidade.

Em contraposição, o Executado sustenta que não existe qualquer nexo de causalidade ente o facto de o Exequente ter decidido pedir a reforma antecipada em 2013, com as inerentes implicações, e o despacho que veio a ser anulado no âmbito do presente processo, sendo que eventuais danos não patrimoniais emergentes da situação deverão ser discutidos em sede de ação de responsabilidade civil e não no âmbito do presente processo
.
Adiante-se que somos do entendimento assistir razão ao Executado.

Independentemente da discussão que possa ser tida em sede de responsabilidade civil, cremos que esta não é a sede própria para o Exequente reclamar tais montantes, respeitantes à por si designada perda de chance.

Tanto mais que o estabelecimento do nexo de causalidade entre o ato impugnado e tal aposentação aposentada é matéria a ser discutida em sede de responsabilidade civil.

Na senda do por nós preconizado, vide o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 26-10-2023 (Processo n.º 047693/01.8BALSB-A, in: www.dgsi.pt), escrevendo-se no seu sumário:

“(...) VII - A execução do acórdão anulatório impõe à Administração a obrigação de repor a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão anulatória, tanto na vertente de respeitar o julgado, conformando-se com as limitações que dele resultam para o eventual exercício dos seus poderes (efeito preclusivo), como no dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato anulado (efeito conformativo), nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 173º do CPTA.
VIII - Em consequência da verificação de causa legítima de inexecução de sentença anulatória de ato administrativo, fica o Executado obrigado ao pagamento de uma indemnização compensatória ao titular do direito à execução, segundo o disposto nos artigos 163.º, 166.º, 177.º e 178.º do CPTA, que consiste na “indemnização devida pelo facto da inexecução”, nos termos do n.º 1, do artigo 166.º, aplicável por força do n.º 3, do artigo 177.º, do CPTA.
IX - Trata-se de uma indemnização que se destina a compensar o Exequente pelo facto de não ser possível executar a sentença a que teria direito, por não ser possível executar no plano dos factos a situação jurídica violada e de a finalidade do processo executivo se ter frustrado, não obtendo os efeitos jurídicos da execução do julgado.
X - Esta indemnização cujo fundamento consiste numa inexecução lícita de um julgado, distingue-se quer da indemnização por inexecução ilícita, segundo o disposto no artigo 159.º do CPTA, quer da indemnização atribuída no âmbito da ação de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais poderes públicos, prevista para o ressarcimento dos danos causados por uma atuação ilícita da Administração, nos termos da atual Lei n.º 67/2007, de 31/12.
XI - Estando em causa a fixação o quantum indemnizatório em consequência da ocorrência de causa legítima de inexecução, não está em causa um processo de ressarcimento integral de todos os danos produzidos, como se de uma ação de responsabilidade civil extracontratual se tratasse.
XII - O Exequente é ressarcido pela inexecução do julgado, por não conseguir obter o reconhecimento jurisdicional da sua pretensão judicial e em função da perda de oportunidade de poder obter um resultado favorável e não em virtude dos danos causados pela atuação administrativa ilegal do Executado, pelo que, a indemnização devida em consequência da inexecução do julgado não visa apurar todos os danos, nem ressarcir a perda sofrida pelo Exequente em resultado da prática do ato anulado. (...)” (sublinhado nosso).

Na mesma senda apontam os arestos do Supremo Tribunal Administrativo, de 16-12­2021 (Processo n.º 069/04.9BELSB-A) e do Tribunal Central Administrativo Norte, de 05-12-2014 (Processo n.º 00322/08.2BEPRT-A) ambos in: www.dgsi.pt.

Em síntese, não serão consideradas na indemnização arbitrada as perdas no valor da pensão de aposentação, passadas e futuras, conforme reclamado pelo Exequente.

Por fim, quanto à fixação do prazo para cumprimento do pagamento, o artigo 166.º, n.º 3 do CPTA elucida que se a Administração não ordenar o pagamento devido no prazo de 30 dias contado da notificação da decisão judicial que tenha fixado a indemnização devida, seguem-se os termos do processo executivo para pagamento de quantia certa.
Pelo que este é o prazo de cumprimento do pagamento da indemnização.

No que respeita ao pedido de condenação da Executada em sanção pecuniária compulsória, o artigo 169.º, n.º 1 do CPTA esclarece que a imposição de sanção pecuniária compulsória consiste na condenação dos titulares dos órgãos incumbidos da execução, que para o efeito devem ser individualmente identificados, ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso que, para além do prazo limite estabelecido, se possa vir a verificar na execução da sentença.

A questão é se tal sanção pode ser aplicada no presente momento.
A resposta é negativa.


Sobre este ponto, consagra a anotação ao artigo 108.º do CPTA, de Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha - «Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos», Almedina, 2017, p. 880 e 881, entendimento que subscrevemos: “(...) 2. O poder de impor sanções pecuniárias compulsórias encontra-se genericamente previsto no artigo 3.º, n.º 2. Constitui um dos poderes de pronúncia que são atribuídos ao juiz administrativo para assegurar a efetividade da jurisdição administrativa, mormente nos casos em que esteja em causa o cumprimento de obrigações infungíveis (...) Neste caso, o poder de aplicar sanções compulsórias só opera quando haja um primeiro incumprimento da intimação «sem justificação aceitável». A medida compulsória não poderá, pois, ser aplicada sem uma prévia averiguação, destinada a determinar se o incumprimento é ou não desculpável, assim se compreendendo a inclusão, no preceito, do inciso «sem justificação aceitável». O modo de aplicação da medida, bem como os critérios de fixação do respetivo montante e o destino a dar às importâncias devidas são estabelecidos no artigo 169.º (...)” (negrito e sublinhado nossos).

No mesmo sentido tem seguido a jurisprudência - cfr. acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 24-01-2008 – P.º 01346/06.0BEPRT, de 17-09-2019 – P.º 01129/15.6BELRS-S1 e do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16-12-2015 – P.º 12695/15, todos disponíveis em dgsi.pt.

Pelo que improcede, por ora, este pedido do Exequente, sem prejuízo da sua apreciação ulterior, em caso de incumprimento injustificado da Entidade Executada.

Pelo que se fixa a indemnização nos termos ante expostos.
*
(…)

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DECISÃO

Face ao exposto, tudo ponderado de facto e de Direito, decide-se condenar a Entidade Executada ao pagamento de indemnização ao Exequente, em consequência de causa legítima de inexecução do julgado, traduzida nas diferenças remuneratórias e de carreira, calculadas com referência ao período compreendido entre 01-05-2010 a 29-10-2013, acrescidas de juros de mora incidentes sobre as diferenças percecionadas, à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma até 29-04-2021, deduzida dos descontos legais devidos, incluindo os devidos à Caixa Geral de Aposentações, para reflexo na pensão de aposentação do Exequente, a ser paga no prazo de 30 dias contado da notificação da presente decisão judicial.
(…)”

Mostra-se acertada esta decisão no que tem de essencial, não logrando o Recorrente convencer do contrário.

Quanto à indemnização:

Não se percebe as alegações do Recorrente a este propósito sendo certo que foi o mesmo a pedir a indemnização nos termos que vieram a ser fixados na decisão recorrida, no recente requerimento de 13.01.2024, tudo resumido no ponto 14 desse requerimento:

“14. Consequentemente, o ora exequente teria tido direito às diferenças salarias devidas, que, de acordo com a informação remetida ao TAF de Braga pela AT, no passado mês de Outubro, ascenderiam a 24.021,78€, a que deverão acrescer os juros legais à taxa de 4%, contados de 01.05.2010 até ao trânsito em julgado do acórdão condenatório, que ocorreu a 05.02.2020”.

Pretensão que justificou deste modo:

“9. Considerando que o valor da indemnização pretendida pelo ora exequente deverá permitir o ressarcimento da vantagem económica que o exequente poderia ter obtido caso o acórdão condenatório tivesse sido executado, ou seja, a perda da possibilidade da reconstituição natural.

10. Considerando que o montante indemnizatório deve contemplar os danos que decorrem do facto de o acórdão exequendo não poder ser executado e de, por esse motivo, o exequente não poder ser colocado na situação que teria não fora a ilegalidade que determinou a anulação do acto que o preteriu na nomeação para um cargo dirigente.

11. Considerando que o valor da indemnização deverá ser estabelecido tomando por referência o valor dos danos causados pelo acto administrativo anulado, que poderiam ter sido reparados se o acórdão exequendo tivesse sido executado.

12. Considerando que esses danos correspondem a diferenças salariais e ao prejuízo causado no valor da pensão de aposentação do ora exequente, segue-se a

JUSTIFICAÇÃO E CÁLCULO DO VALOR INDEMNIZATÓRIO”.

De resto como já se decidiu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1992, no recurso 4928A (sumário):

“I - A fase propriamente executiva do meio processual acessório de execução de julgados serve para especificar os actos e operações em que a pretendida execução deverá consistir. Ponto é que haja actos e operações a especificar.

II - Se a Administração não praticou os actos necessários para cumprimento do julgado anulatório, designadamente no que toca ao abono de vencimentos não recebidos, correspondendo ao afastamento ilegal do exercício de funções, por efeito de pena disciplinar expulsa, há que fixar os actos necessários ao pagamento de tais vencimentos.

III - A adopção do critério consubstanciado na "teoria da indemnização", segundo o qual a eliminação do efeito negativo do não pagamento dos vencimentos relativos ao período de afastamento do interessado do exercício do cargo opera-se pela indemnização dos prejuízos concretamente sofridos em consequência do acto culposo da Administração, não traduz um princípio geral de direito administrativo, a aplicar em todos os casos, dependendo da solução mais adequada à conciliação dos interesses em causa, em cada situação a resolver, impondo-se restringir a sua aplicação em benefício da "teoria do vencimento" sempre que a especificidade da situação em análise assim o dite.”

Resumindo:

No caso concreto os danos que resultam do facto de o acórdão proferido nos autos principais não poder ser executado coincidem com os danos causados pelo acto administrativo anulado.

E o Exequente receberia, se não fosse a prática do acto anulado, o valor líquido do vencimento, ou seja, o valor bruto com dedução dos descontos legais.

Como decidido, nada havendo a alterar neste ponto.

Quanto à fixação de uma quantia certa:

Ao Tribunal cabe fixar os factos e aplicar o direito aos factos fixados – n.º3 do artigo 607º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto nos artigos 1º e 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Não cabe ao Tribunal fazer contas, cálculos aritméticos, mas às partes e, eventualmente, aos serviços administrativos do Tribunal – n.º 2 do artigo 56º, n.º 6 do artigo 704º, n. º4 do artigo 716º e 854º do Código de Processo Civil (“a contrario”).

Daí que, à partida, se mostre suficientemente liquidada a indemnização devida na sentença recorrida:

“…traduzida nas diferenças remuneratórias e de carreira, calculadas com referência ao período compreendido entre 01-05-2010 a 29-10-2013, acrescidas de juros de mora incidentes sobre as diferenças percecionadas, à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma até 29-04-2021, deduzida dos descontos legais devidos, incluindo os devidos à Caixa Geral de Aposentações”.

Como, no entanto, a Executada aceita pagar a este título um valor superior ao pretendido pelo Exequente (24.021€78), não se vê razão para não fixar nessa importância certa o valor da indemnização: 24.184€08.

No que respeita aos juros moratórios:

Embora o Exequente tenha justificado o facto de não ter indicado o seu IBAN ao Executado, num primeiro momento, com fundamento na facto de já ter expirado o prazo para a execução espontânea, tendo já pendente um pedido de execução de julgados e que o fornecimento do seu IBAN poderia ser interpretado como concordância com os termos da execução que a executada pretendia levar a cabo, com os quais não concordava , tal justificação não colhe.

Poderia ter indicado o IBAN com a ressalva de que discordava do valor aceite pagar pelo Executado, pretendendo receber mais.

E a não indicação do IBAN obstou a que a Executada pagasse o valor que era, como vimos, devido, e, em todo o caso, pelo menos quanto a esse valor sempre seria de considerar cessada a mora por parte do devedor dado que a partir desse momento passou a ser, objectivamente, imputável ao devedor.

Foi, portanto, bem fixado na decisão recorrida o dia 29.04.2021 como data em que cessou a dívida de juros por ter sido essa a data em que a Executada solicitou ao Exequente que lhe indicasse o IBAN para proceder ao pagamento do que estava em dívida.

Finalmente, no que tange ao pedido de indemnização pela de diminuição no valor da pensão de aposentação:

Também aqui carece de razão.

O pagamento de valores relativos à pensão de aposentação é uma obrigação da Caixa Geral de Aposentações que não foi chamada nem ao processo principal nem à presente execução.

Em todo caso, ainda que fosse, em abstracto, uma obrigação do Executado pagar, como indemnização, a diferença de valores da pensão de aposentação, sempre faltaria o nexo de causalidade entre essas diferenças e o acto anulado ou a impossibilidade de executar o julgado anulatório.

O valor que o Exequente acabou por receber de aposentação resultou, tão só, de este ter optado pela aposentação antecipada. O Exequente fala em “aposentação forçada”, mas nada alega de que resulte a falta de liberdade na decisão de requerer a aposentação. Falta de liberdade resultante do acto anulado ou da impossibilidade de executar o julgado.

Termos em que se impõe também nesta parte julgar improcedente o recurso.

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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, pelo que:

1. Condenam o Executado a pagar ao Exequente a importância de 24.184€08 (vinte e quatro mil, cento e oitenta e quatro euros e oito cêntimos), a título de indemnização devida pela impossibilidade de execução do julgado anulatório.

2. Mantêm no resto a decisão recorrida.

Custas em exclusivo pelo Recorrente, sendo certo que a quantia certa agora fixada como indemnização foi a indicada pelo Recorrido.

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Porto, 13.09.2024


Rogério Martins
Paulo Ferreira de Magalhães
Isabel Costa