Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00629/23.9BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/23/2024
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:IRS;
PLANO PRESTACIONAL;
Sumário:
I - Tendo ocorrido a citação do executado/recorrente e não tendo havido pagamento da quantia exequenda ou o seu pagamento em prestações e nem prestação de garantia ou a sua isenção ou, então, dação em pagamento [arts. 189.º, 196.º, 199.º e 201.º, todos do CPPT], não existem razões para o processo de execução fiscal deixar de prosseguir os seus termos com vista à cobrança coerciva da quantia exequenda, nomeadamente, através de penhora [art. 215.º do mesmo diploma legal];

II – Dispõe o art. 590.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, que «[n]os casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente (…).»;

III - É propósito do art. 590.º, do CPC, aferir, em sede liminar, da viabilidade do prosseguimento dos autos, tendo em conta a causa de pedir e o pedido formulados, sob pena de ser determinada a prática de atos inúteis, igualmente proibidos por lei, em situações como a presente em que dos autos constam todos os elementos necessários à decisão da questão identificada.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:




Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO:
«AA», contribuinte fiscal n.º ...57, com os demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que indeferiu liminarmente a Reclamação de Atos do Órgão de Execução Fiscal [instaurada contra a penhora de pensão efetuada no processo de execução fiscal n.º ...........636, instaurado no Serviço de Finanças de ... para cobrança de dívidas de IRS do ano de 2022, pela quantia exequenda de €48.294,96], por manifesta improcedência.
O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
i. O Recorrente não se conforma com a sentença do Meritíssimo Tribunal a quo, proferida a 01.03.2024, que julgou improcedente a Reclamação deduzida pela ora Recorrente, nos termos do disposto no artigo 276.º do CPPT, contra a legalidade do ato de penhora de pensão efetuada pelo Serviço de Finanças de ... para cobrança de dívidas de IRS de 2022, pela quantia exequenda de € 48.294,96, sendo que havia sido apresentado, previamente à execução fiscal e no prazo legalmente concedido, pedido de pagamento em prestações com dispensa de prestação de garantia nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30/12;
ii. Nos termos da douta sentença, considerou-se que o “(…) o ato de indeferimento do pedido de pagamento em prestações efetuado ao abrigo do Dec. Lei n.º 125/2021, de 30/12, sendo um ato praticado em fase pré-executiva, não é sindicável judicialmente através da reclamação nos termos do art.º 276º do CPPT, pelo que o Reclamante dela não se pode valer para, agora, impugnando o ato de penhora, vir, na prática, impugnar o indeferimento do pedido de pagamento em prestações que efetuou em fase pré-executiva (…)”;
iii. Entende o Recorrente que a sentença recorrida fez uma errada aplicação da lei aos factos, porquanto, não só desconsiderou o cerne da questão – ie, que a penhora é ilegal!, devendo ser anulada de imediato –, como também desconsiderou o facto de a execução fiscal padecer, igualmente, de vício de ilegalidade, pois nunca poderia ter sido instaurada, face à apresentação tempestiva de pedido de plano prestacional com dispensa de garantia;
iv. O Recorrente fez prova da ilegalidade da instauração e consequente falta de suspensão do processo de execução fiscal subjacente, por força da apresentação tempestiva do pedido de pagamento em prestações apresentado, em 15.09.2023, junto do Serviço de Finanças de ..., ao abrigo do Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30/12, motivo pelo qual os atos subsequentes, incluindo o ato de penhora em apreço, se afiguram ilegais, podendo ser reclamados via artigo 276.º do CPPT, que é o meio processual adequado para impugnar os atos materialmente administrativos no âmbito da execução fiscal;
v. Devendo concluir-se pela anulação do ato de penhora e reembolso da quantia retida indevidamente, porquanto o processo de execução fiscal teria que ser suspenso, por manifesta violação do artigo 6.º, n.º 5, alínea b), do Decreto-Lei em apreço;
vi. Resulta cristalino da prova documental junta aos autos que o Recorrente apresentou tempestivamente pedido de pagamento em 12 prestações com dispensa de garantia, pelo que a penhora em apreço se afigura ilegal, não podendo manter-se na ordem jurídica;
vii. Devendo concluir-se pelo reembolso dos valores indevidamente penhorados, tal como pela suspensão do processo de execução fiscal subjacente;
viii. Salvo o devido respeito, não entende o Recorrente a decisão do Tribunal a quo, porquanto dispõe o artigo 276º do CPPT que “As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são suscetíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1ª instância”;
ix. Ora: se a Lei permite que se defendam meros interesses legalmente protegidos, do executado ou de terceiro, que sejam postos em causa pela administração tributária, afigura-se indiferente se, na base de tal interesse legalmente protegido, se encontra um ato praticado em fase pré-executiva, em cumprimento do artigo 268.º, n.º 4 da CRP e como corolário do princípio da tutela jurisdicional efetiva dos direitos e interesses legítimos;
x. A interpretação que fez a sentença do Tribunal a quo consubstanciaria num esvaziamento total da utilidade da reclamação dos artigos 276.º e ss do CPPT;
xi. Nesse sentido, pugna Jorge Lopes de Sousa, aliás –“(…) tem de concluir-se que é reconhecido um direito global de os particulares solicitarem a «intervenção do juiz no processo», através da reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT, relativamente a quaisquer atos praticados no processo de execução fiscal pela administração tributária que tenham potencialidade lesiva” – ,ie, independentemente do ato que este na génese do ato ora reclamado;
xii. Em face do exposto impõe-se a revogação da Sentença recorrida, concluindo-se pela procedência integral da presente ação e consequente anulação do ato de penhora com reembolso das quantias indevidamente penhoradas;
Termos em que deve o presente Recurso ser jugado totalmente procedente, e, em consequência ser revogada a Sentença recorrida, assim se fazendo no que é de Lei e de Justiça!»
*
Não foram apresentadas contra alegações.

O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer concluindo pelo não provimento do recurso.
*
Com dispensa dos vistos legais, dada a natureza urgente do processo [cfr. artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento por ter julgado indeferido liminarmente a presente Reclamação de Atos do Órgão de Execução Fiscal por manifesta improcedência.
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III – FUNDAMENTAÇÃO:
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida não foram fixados quaisquer factos, no entanto, para melhor clarificação e conhecimento do objeto do presente recurso, fixa-se a seguinte factualidade:
1. A 16.09.2023, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º ...........636, contra «AA», que corre termos no Serviço de Finanças de ... para cobrança de dívidas de IRS do ano de 2022, pela quantia exequenda de €48.294,96 [cfr. fls. 38 a 40 da paginação eletrónica];
2. O imposto em falta tinha como data limite de pagamento o dia 31.08.2023 [cfr. fls. 40 da paginação eletrónica];
3. A 16.09.2023, foi emitido ofício de citação [cfr. fls. 41 da paginação eletrónica];
4. O ora Reclamante e mulher, por via postal registada no dia 18.09.2023, através de mandatária constituída, dirigem um requerimento ao Chefe de Finanças do ... formulando pedido nos seguintes termos:
«(…), requer-se a V. Exº se digne admitir o pagamento em prestações da liquidação de IRS de 2022 n.º ...13, em 12 prestações mensais, iguais e sucessivas, bem como conceder a dispensa de prestação de garantia, nos termos e com os efeitos no artigo 5.º e 6.º, n.º 5, alínea b) do Decreto-Lei n.º 125/2001 de 30 de dezembro» [cfr. doc. 2 junto com a PI];
5. A 20.09.2023, a Chefe de Finanças Adjunta da Secção Tributária de Rendimento e Despesa, indefere o requerido com a seguinte fundamentação:
«Indeferido o pedido por extemporâneo.
De acordo com o n.º 1 do artigo 5.º do 12572021, de 30 de dezembro, o pedido p. prestações é apresentado até 15 dias após o termo do prazo par pagamento voluntário.» [cfr. fls. 33 da paginação eletrónica];
6. Por carta registada a 02.10.2023, foi notificada a mandatária dos requerentes do despacho de indeferimento, constando, ainda, da notificação o seguinte:
«(…).
Informa-se que caso pretenda, poderá solicitar o pagamento em prestações (…), conforme o previsto no artigo 196º do CPPT» [cfr. fls. 34 e 35 da paginação eletrónica];
7. A 20.10.2023, a mandatária dos requerentes envia um email dirigido ao Serviço de Finanças do ..., com o seguinte teor:
«(…).
O requerimento em anexo (…) foi apresentado em nome dos N/Constituintes (…), no dia 15 de setembro de 2023, isto é, no 15.º dia do termo do prazo para pagamento voluntário, a 31 de agosto, pelo que se requer que se dê sem efeito o V/Despacho com a Ref. à margem referenciado, e se defira o pedido de pagamento prestacional, nos termos do disposto no DL n.º 125/2001 de 30 de dezembro, nos termos solicitados infra. (…).» [cfr. doc. 2 junto com a PI];
8. Com o requerimento referido no ponto precedente, a mandatária do recorrente juntou o comprovativo do envio por email a 15.09.2023, às 16.06, do pedido de prestação em pagamento referido em 4. [cfr. doc. 2 junto com a PI];
9. A Gestora Tributária e Aduaneira, por email enviado a 08.11.2023, responde ao requerido no ponto 7, com conhecimento ao serviço de finanças, nos seguintes termos.
«(…).
Em resposta ao email infra informa-se que o meio de reação contra a decisão antes notificada seria interpor recurso hierárquico, no prazo de 30 dias, nos termos do n.º 2 do artigo 66.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (…)» [cfr. doc. 2 junto com a PI];
10. A 21.10.2023, foi emitido o despacho de penhora, com o seguinte teor:
«Encontrando-se o executado citado há mais de 30 dias, sem que tenha sido efetuado o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, deduzida oposição, requerida a dação em pagamento ou pedido o pagamento em prestações, determino a prossecução da execução com a penhora de bens pertencentes ao(à) executado(a), para cobrança dos montantes em dívida, nos termos do artigo 215.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Em conformidade com o disposto no artigo 219.º do CPPT, a penhora deve começar pelos bens cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização e se mostrem adequados ao montante em dívida, e revelando-se estes insuficientes, nos termos previstos do artigo 217.º do CPPT, deverá prosseguir sobre outros bens pertencentes ao executado.» [cfr. fls. 42 da paginação eletrónica];
11. Nesse seguimento foi notificado o Instituto da Segurança Social, IP para proceder à penhora da importância mensal líquida de 1/6 do montante da pensão/reforma do executado até ao montante de € 49.226,41 [cfr. fls. 43 da paginação eletrónica];
12. Por ofício de 22.11.2023, o Instituto da Segurança Social informa o Recorrente «(…), que em cumprimento do determinado pelo(a) DGCI – NÚMERO DE PEDIDO DE PENHORA: ...26
P. EXECUTIVO ...........636
(…).
Este Centro vai proceder à dedução mensal de Eur. 368,44 , no valor da sua pensão com início no mês de DEZEMBRO / 2023 , até perfazer o total de Eur. 49222,50
(…).» [cfr. doc. 1 junto com a PI e fls. 44 a 46 da paginação eletrónica].

*
IV – DE DIREITO:
O objeto do presente recurso é a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que indeferiu liminarmente a Reclamação de Atos do Órgão de Execução fiscal, apresentada pelo Recorrente, por manifesta improcedência, nos termos do art. 590.º, n.º 1 do CPC..
Para aferirmos do eventual erro de julgamento, conforme vem alegado, importa, antes de mais, reproduzir o teor da decisão recorrida.
«Atento ao disposto no artigo 276º do CPPT, as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são suscetíveis de reclamação para o tribunal tributário de l.ª instância.
Como tal, este é o meio processual próprio para sindicar determinado ato praticado no âmbito do processo de execução fiscal, pelo que a pretensão aí deduzida visará, em regra, a anulação de um determinado ato em concreto (o ato reclamado) que, no caso dos presentes autos, o Reclamante identifica claramente como sendo a decisão de que determinou a penhora da sua pensão, pedindo expressamente a sua anulação.
Contudo, o vício imputado ao ato reclamado é a não suspensão do processo de execução fiscal em função da decisão de indeferimento do pedido de pagamento em prestações efetuado pelo aqui Reclamante ao abrigo do Dec.-Lei 125/2021, de 30/12, pedido esse efetuado em fase préexecutiva e decidido fora do âmbito do processo de execução fiscal, e cuja decisão seria sindicável por meios graciosos, como aliás o Serviço de Finanças indicou ao aqui Reclamante, tendo-o informado que poderia recorrer hierarquicamente da decisão de indeferimento, tal como também poderia, também, recorrido à impugnação judicialmente.
Não o tendo feito, a decisão tornou-se definitiva.
Mais se refira que não consta nos autos, nem é alegado pelo Reclamante, que tenha sido efetuado no âmbito do processo de execução fiscal qualquer outro requerimento de pagamento em prestações e suspensão dos autos, com prestação de garantia ou com pedido de dispensa da sua prestação, cuja eventual decisão de indeferimento total ou parcial pudesse ser sindicada por este tribunal.
Ainda que possua a virtualidade de produzir efeitos no processo de execução fiscal, o ato de indeferimento de pedido de pagamento em prestações efetuado ao abrigo do Dec.-Lei n.º 125/2021, de 30/12, sendo um ato praticado em fase pré-executiva, não é sindicável judicialmente através da reclamação nos termos do art.º 276º do CPPT, pelo que o Reclamante dela não se pode valer para, agora, impugnando o ato de penhora, vir, na prática, impugnar o indeferimento do pedido de pagamento em prestações que efetuou em fase pré-executiva, impugnação essa que não fez em tempo nem em sede própria..
Contudo, o Reclamante faz vários pedidos, pelo que se impõe, face ao preceituado nos números 2 e 3 do art.º 97.º da LGT [de acordo com os quais “… a todo o direito corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo” (2) e “...ordenar-se-á a correção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei” (3)], no n.º 4 do art.º 98.ºdo CPPT (“...em caso de erro na forma do processo, este será convolado na forma do processo adequada…”), bem como no n.º 3 do art.º 193ª do CPC ex vi art.º 2.º, al. e) do CPPT (O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados.), equacionar se é possível a convolação para o meio processual adequado, verificados que estejam os condicionalismos para o efeito.
No presente caso, o Reclamante peticiona a anulação do despacho de penhora, a subida imediata da reclamação e a revogação do ato ora reclamado e substituição por despacho no sentido da suspensão do processo de execução fiscal.
Ou seja, o Reclamante formula três pedidos, dois dos quais são próprios da reclamação nos termos do art.º 276º do CPPT, sem prejuízo do que acima se disse quanto à causa de pedir, o que inviabiliza a convolação dos autos.
Aqui chegados, da conjugação do pedido formulado na petição inicial com as causas de pedir aí invocadas, afigura-se-nos que apesar de o Reclamante identificar a penhora como ato reclamado, não lhe imputa qualquer outro vício que não o decorrente da não suspensão dos autos decorrente do indeferimento do requerimento efetuado ao abrigo do Dec.-Lei 125/2021, de 30/12, relativamente ao qual não pode, nesta sede, pronunciar-se este tribunal.
O juiz encontra-se vinculado pelo pedido formulado na ação, já que este delimita as questões que o tribunal deve apreciar nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do CPC, não obstante o poder de interpretar, determinando o real sentido da pretensão formulada.
Não sendo questionado qualquer ato praticado pelo órgão de execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal, coloca-se em causa a viabilidade do pedido, uma vez que, quanto ao ato reclamado propriamente dito (a decisão de penhora de pensão) não foram alegadas nem se vislumbram quaisquer questões sobre as quais este tribunal possa ou deva pronunciar-se no âmbito dos presentes autos.
Pelo exposto, afigura-se que a presente reclamação é manifestamente improcedente, por falta de fundamento de reclamação e por erro na forma do processo, insuscetível de convolação, impondo-se o seu indeferimento liminar. (art.º 590.º, n.º 1 do CPC, e 276.º, n.º 1, do CPPT).»
Extratada a fundamentação da decisão em crise, importa aferir se existem motivos para dele divergir.
Das conclusões firmadas na petição da Reclamação, que condensam o teor das alegações ali desenvolvidas, extrai-se o seguinte:
«i. O pedido de pagamento em prestações com dispensa de garantia em apreço foi apresentado dentro do prazo;
ii. Pelo que se afigurou meio próprio, tempestivo e de acordo com os limites legais;
iii. Tudo nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro, que veio alterar o regime de pagamento em prestações de tributos nas fases pré-executiva e executiva, e aprovar regimes excecionais de pagamento, e dos artigos 196.º e 198.º do CPPT;
iv. Devendo, consequentemente, ser deferido;
v. Requer-se a subida imediata da presente reclamação;
vi. Declarando-se, a final, a ilegalidade subjacente ao despacho de penhora.»
Conforme resulta do teor das conclusões da petição da Reclamação, em conjugação com tudo o que nela se encontra vertido [maxime, arts. 1.º a 24.º], não obstante o Reclamante ter apresentado a reclamação na sequência da penhora e pretender a anulação do despacho que a determinou, a verdade é que não invoca nenhum vício próprio do despacho reclamado e consequentemente do ato de penhora, designadamente, por ter sido praticado por quem não tinha competência para o efeito, por impenhorabilidade da pensão ou excesso de penhora. Ao invés, pretende que, por força da reclamação apresentada, seja deferido o pedido de prestações por si formulado, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro, requerendo, a final, que o tribunal anule o despacho de penhora, «por violação do disposto no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro, que veio alterar o regime de pagamento em prestações de tributos nas fases pré-executiva e executiva, e aprovar regimes excecionais de pagamento, e dos artigos 196.º e 198.º do CPPT» e revogue o ato reclamado e que o substitua «por um despacho no sentido da suspensão dos processos de execução fiscal, até conclusão dos autos».
Vejamos, pois, se lhe assiste razão.
Convocando a matéria de facto elencada oficiosamente nesta instância resultam as seguintes evidências: O Recorrente, por carta registada no dia 18.09.2023, através de mandatária constituída, requereu «o pagamento em prestações da liquidação de IRS de 2022 n.º ...13, em 12 prestações mensais, iguais e sucessivas» e bem como a concessão da dispensa de prestação de garantia, nos termos e com os efeitos no artigo 5.º e 6.º, n.º 5, alínea b) do Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro» [cfr. ponto 4 do elenco dos factos provados]. O requerimento veio a ser indeferido pela Chefe de Finanças Adjunta da Secção Tributária de Rendimento e Despesa, por decisão proferida a 20.09.2023, por extemporaneidade e notificada ao ora Recorrente, na pessoa da sua mandatária, por ofício enviado a 02.10.2023 [pontos 5 e 6, ibidem]. Na sequência da notificação de indeferimento, a mandatária do Recorrente enviou email a 10.10.2023, alegando que o requerimento foi apresentado em nome dos seus constituintes no dia 15.09.2023, ou seja, «no 15.º dia do termo do prazo para pagamento voluntário, a 31 de agosto, pelo que se requer que se dê sem efeito o V/Despacho com a Ref. à margem referenciado, e se defira o pedido de pagamento prestacional, nos termos do disposto no DL n.º 125/2001 de 30 de dezembro, nos termos solicitados infra. (…).» [pontos 7 e 8, ibidem]. Em resposta ao assim solicitado, a Gestora Tributária e Aduaneira informou que o meio de reação à decisão de indeferimento seria a interposição de recurso hierárquico, no prazo de 30 dias, nos termos do art. 66.º, n.º 2 do CPPT [ponto 9, ibidem].
Destarte, do acervo factual assinalado resulta que o Recorrente solicitou o pagamento da dívida (em prestações) que está na origem da instauração da execução fiscal, nos termos dos arts. 5.º e 6.º, n.º 5, alínea b) do Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro que alterou o regime de pagamento em prestações de tributos nas fases pré-executiva [e executiva e aprovou regimes excecionais de pagamento em prestações no ano de 2022].
Prescrevem os aludidos preceitos o seguinte:
Art. 5.º:
«1 - Os pedidos de pagamento em prestações são apresentados por via eletrónica até 15 dias após o termo do prazo para o pagamento voluntário e devem conter a identificação do requerente, a natureza da dívida e o número de prestações pretendido.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o devedor pode requerer à AT a instauração imediata do processo de execução fiscal após o termo do prazo para o pagamento voluntário.»

E o art. 6.º, n.º 5:
«A prestação de garantia é dispensada nas seguintes situações:
(…).
b) Quando o número de prestações pretendido seja igual ou inferior a 12.»
Por sua vez, estabelece o n.º 3 do art. 7.º que «[e]m caso de indeferimento do pedido, é o devedor notificado nos termos do n.º 1 e extraída certidão de dívida pelos serviços competentes.»
Ora, a verdade é que, como espelham os autos, o Recorrente solicitou o pagamento em prestações do tributo, nos termos dos arts. 5.º e 6.º, n.º 5, alínea b) do mencionado Decreto-Lei, à margem da execução fiscal, todavia, notificado da decisão de indeferimento, na pessoa da sua mandatária, num primeiro momento, o Recorrente limitou-se a alegar, junto da Autoridade Tributária, que solicitou o pagamento em prestações dentro dos 15 dias após o termo do prazo para o pagamento voluntário, requerendo que fosse dado sem efeito esse despacho e deferido o pedido de pagamento prestacional, e, num segundo momento, perante a comunicação da forma adequada para reagir à decisão do indeferimento, nada fez [nem pela via indicada nem por qualquer outra]. Não sendo despiciendo referir que aquando da notificação do indeferimento foi informado de que poderia, querendo, «solicitar o pagamento em prestações (…), conforme o previsto no artigo 196º do CPPT» [ponto 6].
Nesta conformidade, perante a inércia verificada (e não podemos deixar de assinalar que o Recorrente sempre esteve representado por mandatária), mal ou bem, a decisão de indeferimento tornou-se caso decidido. Para além do mais, o procedimento de concessão do pedido de pagamento em prestações nos termos requeridos pelo Recorrente, com base nos artigos 5.º e 6.º, n.º 5, alínea b) do DL. n.º 125/2001, de 30.12, ocorrendo na fase pré-executiva, ou seja, fora do âmbito da execução fiscal, não pode ser objeto de conhecimento na reclamação de atos do órgão de execução fiscal.
Na verdade, a reclamação da decisão do órgão de execução fiscal encontra-se regulada no CPPT (art. 276.° e ss. do CPPT), e é o modo de reação contra atuações lesivas, que sob o ponto de vista material, afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiros, praticadas por um órgão da administração, no âmbito do processo de execução fiscal, garantindo-se aos interessados, em execução do disposto artigo 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, a tutela jurisdicional efetiva mediante o recurso a um tribunal para defesa desses direitos, na esteira da previsão legal do artigo 103.º, n.º 2, da LGT. Ou seja, constitui o objeto das reclamações, apresentadas ao abrigo do art. 276º do CPPT, os atos (concretos) proferidos pelo órgão da execução fiscal, no âmbito da execução fiscal, o que não é claramente o caso do despacho que indeferiu o mencionado pedido de pagamento em prestações [para além do mais, sempre estaria excedido o prazo de 10 dias, conforme previsto no art. 277, n.º 1 do CPPT.].
E, assim sendo, tendo ocorrido a citação do executado/recorrente e não tendo havido pagamento da quantia exequenda ou o seu pagamento em prestações e nem prestação de garantia ou a sua isenção ou, então, dação em pagamento [arts. 189.º, 196.º, 199.º e 201.º, todos do CPPT], não havia razões para o processo de execução fiscal deixar de prosseguir os seus termos com vista à cobrança coerciva da quantia exequenda, nomeadamente, através de penhora, nos termos do art. 215.º do mesmo diploma legal, como se verificou no caso em exegese.
Ora, dispõe o art. 590.º do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2.º, alínea e) do CPPT, que «[n]os casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente (…).»
É propósito do art. 590.º, do CPC aferir, em sede liminar, da viabilidade do prosseguimento dos autos, tendo em conta a causa de pedir e o pedido formulados, sob pena de ser determinada a prática de atos inúteis, igualmente proibidos por lei, em situações como a presente em que dos autos constam todos os elementos necessários à decisão da questão identificada.
Neste conspeto, nenhuma censura a sentença recorrida que indeferiu liminarmente a presente reclamação de atos do órgão de execução fiscal, por ser manifesta a sua improcedência.
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Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida no ordenamento jurídico.

*
Nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I - Tendo ocorrido a citação do executado/recorrente e não tendo havido pagamento da quantia exequenda ou o seu pagamento em prestações e nem prestação de garantia ou a sua isenção ou, então, dação em pagamento [arts. 189.º, 196.º, 199.º e 201.º, todos do CPPT], não existem razões para o processo de execução fiscal deixar de prosseguir os seus termos com vista à cobrança coerciva da quantia exequenda, nomeadamente, através de penhora [art. 215.º do mesmo diploma legal];
II – Dispõe o art. 590.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, que «[n]os casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente (…).»;
III - É propósito do art. 590.º, do CPC, aferir, em sede liminar, da viabilidade do prosseguimento dos autos, tendo em conta a causa de pedir e o pedido formulados, sob pena de ser determinada a prática de atos inúteis, igualmente proibidos por lei, em situações como a presente em que dos autos constam todos os elementos necessários à decisão da questão identificada.
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V – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida no ordenamento jurídico.

Custas pelo recorrente.

Porto, 23 de maio de 2024

Vítor Salazar Unas
Cristina Travassos Bento
Ana Patrocínio