Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00052/20.7BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/09/2025
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA CONTRA A UNIVERSIDADE (...);
EXCEPÇÃO DILATÓRIA DE INTEMPESTIVIDADE DA PRÁTICA DO ACTO PROCESSUAL;
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA DA ENTIDADE DEMANDADA;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte - Subsecção Social -:

RELATÓRIO
«AA» propôs acção administrativa contra a Universidade ... («Universidade ...»), ambas melhor identificadas nos autos, tendo em vista a impugnação dos seguintes actos:
(i) Exclusão da candidatura da Autora para a posição de Leitora Convidada a 100%, na Área Científica das Ciências da Linguagem/Linguística aplicada às Línguas estrangeiras/Inglês, Referência BRCDC/UTAD/4/2019, em deliberação final do Júri datada de 5 de Agosto de 2019, e cuja acta foi aprovada pelo Conselho Científico da Escola de Ciências Humanas Sociais da Universidade ..., e que culminou na homologação final da deliberação pela Universidade ... e correspectiva decisão de contratar;
(ii) Exclusão da candidatura da Autora para a posição de Leitora Convidada a 100%, na Área Científica das Ciências da Linguagem/Linguística aplicada às Línguas estrangeiras/Inglês, Referência BRCDC/UTAD/7/2019, em deliberação final do Júri datada de 5 de Agosto de 2019, e cuja acta foi aprovada pelo Conselho Científico da Escola de Ciências Humanas Sociais da Universidade ..., e que culminou na homologação final da deliberação pela Universidade ... e correspectiva decisão de contratar;
(iii) Exclusão da candidatura da Autora para a posição de Leitora Convidada a 100%, na Área Científica das Ciências da Linguagem/Linguística aplicada às Línguas estrangeiras/Inglês, Referência BRCDC/UTAD/8/2019, em deliberação final do Júri datada de 5 de Agosto de 2019, e cuja acta foi aprovada pelo Conselho Científico da Escola de Ciências Humanas Sociais da Universidade ..., e que culminou na homologação final da deliberação pela Universidade ... e correspectiva decisão de contratar.
- E a condenação da Entidade Demandada a praticar os actos administrativos devidos de admissão das candidaturas da Autora, naqueles procedimentos concursais.
Por decisão proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada procedente a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual e absolvida a Entidade Demandada da instância.
Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
1ª A recorrente não se conforma com a decisão do tribunal a quo em julgar como procedente a exceção de caducidade do direito invocada pelo R., determinando a absolvição da instância do R., mais condenando a A. nas custas processuais, porquanto se considera que o Tribunal recorrido procedeu a uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

2ª Por despacho datado em 2023.10.30, o Exmo. Juiz a quo notificou as partes de que os autos ficariam a aguardar a decisão que venha a ser proferida no processo n.° 36/18.5BEMDL, relativa ao pedido de apensação dos presentes autos ao mesmo.

3.ª Sucede que, até ao momento presente, ainda não há decisão relativamente ao pedido de apensação que foi feito no âmbito do processo 36/18.5BEMDL, assim como também não há ainda qualquer decisão, ou sentença, relativamente aos processos 36/18.5BEMDL e 243/19.3BEMDL. Por outro lado, o tribunal a quo não reponderou a suspensão da instância, após o período de 90 dias, designadamente apreciando se ainda se justificava a sua prossecução ou a eventual renovação da referida suspensão.

4.ª Pelo que, a decisão recorrida, constitui uma decisão surpresa, já que o tribunal recorrido havia indicado no despacho datado em 2023.30.10, a sua linha de atuação futura.

5.ª É incompreensível, aliás, que o tribunal tenha a consciência de estarem em causa procedimentos concursais anteriores, e que a procedência dos processos mais antigos poderá ter influência no presente processo, e ter ainda referido que os autos deste processo deveriam aguardar a decisão a ser proferida no processo 36/18.5BEMDL, para depois vir julgar procedente uma exceção dilatória...quando continua pendente o pedido de apensação referido.

6.ª Nos termos do artigo 28.° do CPTA, a apensação de processos pode ser ordenada com fundamento, alternativamente, no facto de os respetivos pedidos: terem a mesma e única causa de pedir; tendo causas de pedir diferentes, devam ser apreciados em função dos mesmos factos ou da aplicação dos mesmos princípios ou normas jurídicas; ou estarem, entre si, numa relação de prejudicialidade ou dependência jurídica.

7.ª Sendo que a apensação terá, necessariamente, de ser feita sob requerimento ao juiz do processo apensante, o qual, conforme dimana do n° 2 deve ser entendido enquanto tal, o de numeração inferior, ressalvada a situação de dependência. Procedimentos que a aqui recorrente empreendeu.

8.ª Face às presentes alegações e ao recorte fático traçado anteriormente, não há dúvidas que o processo apensante é o processo n.° 36/18.5BEMDL, e o processo apensável é o presente processo, por o primeiro ter, inequivocamente, a numeração inferior, o que significa que o Juiz a quo ao prolatar a sentença a quo mais não estará a fazer do que a intervir no incidente da apensação, quando ele próprio, já em momento anterior, admitiu que essa apensação se justificava e era relevante.

9.ª Ora, face a todo o expendido, ao atuar do modo descrito, o tribunal a quo comete uma Nulidade, por estarem em causa atos que a lei não admite, já que a decisão recorrida influí diretamente no incidente de apensação ainda pendente, conforme art.° 195°, n.° 1, do CPC, ex vi 1.° do CPTA, nulidade que se invoca para as devidas e legais consequências.

Sem prescindir,

10.ª Quando o Tribunal recorrido afirma que no caso concreto “...o prazo de decisão do recurso hierárquico – considerando a presença de contrainteressados e, portanto, o prazo mais lato – era de 60 dias úteis, nos termos conjugados dos artigos 195º, n.º 2, e 198º, n.º 2, do CPA, pelo que o mesmo terminava em 28.11.2019”, comete um erro que alterará inelutavelmente o decidido pelo Tribunal a quo, pois que o prazo para a decisão do recurso hierárquico não é de 60 dias úteis, e sim de 90 dias úteis, pois que a versão da lei aplicável é da do n.° 2, do artigo 198° do CPA, prevista para os procedimentos administrativos anteriores a 1/12/2020, conforme preceituado no artigo 11° da Lei 72/2020.

11.ª Por outro lado, e salvo algum lapso, considerando que o processo administrativo não se demonstra junto aos autos na sua totalidade, a verdade é que não se pode afirmar com segurança de que interposto o recurso hierárquico não houve lugar a diligências instrutórias nos termos previstos no artigo 115° e seguintes do CPA.

12.ª Portanto, havendo instrução, existindo a realização de diligências complementares, inelutavelmente o prazo para a decisão do Recurso Hierárquico é de 90 dias úteis. E não de 60 dias úteis.

13.ª Em consequência, a contagem do prazo de caducidade efetuada pela Exma. Juiz a quo está inquinada, e isto porque parte do pressuposto de que o prazo legal de que a Administração dispunha para decidir o Recurso Hierárquico apresentado em 05.09.2019 terminou 60 dias úteis após a apresentação do recurso, ou seja, em 29.11.2019.

14.ª Contudo, a verdade é que o prazo legal de que a Administração dispunha para decidir o Recurso Hierárquico apresentado em 05.09.2019 terminou muito depois de 29.11.2019. Pois se o tribunal a quo considerou com o dia final do prazo o dia 27.01.2020, fê-lo sem considerar esses 90 dias úteis (desses 90 só contabilizou 60). Ou seja, à data de 27.01.2020 tinham de acrescer ainda mais 30 dias úteis.


15.ª Portanto, sem necessidades de muitas considerações adicionais, surge nítido que se a ação deu entrada a 06.02.2020 estava mais do que em prazo, não tendo caducado qualquer direito da A., pois ainda vigorava a suspensão operada pela interposição de um meio gracioso.

16.ª O tribunal a quo aplicou e interpretou erradamente os seguintes artigos: Artigos 91.°, 97.°, 115°, número, 116°, números 1 e 3, 117°, 125°, 190.°, números 1, 3 e 4, 198°, números 1 e 2, todos do C.P.A.; Artigos 59°, números 1, 2, 3, 4 e 5, 69.°, n.° 1, al. a), e 69°, n.° 2, todos do CPTA; Artigo 342° do Código Civil e Artigo 11° da Lei n.° 72/2020

Sem prescindir, mesmo que assim não se entenda, mais se invoca o seguinte:

17.ª Não subsistem dúvidas que foi interposto um recurso hierárquico. Tal Recurso deu entrada nos autos no respetivo prazo legal, porquanto dispõe o artigo 193°, n.° 2, do CPA que “quando a lei não estabeleça prazo diferente, o recurso hierárquico necessário dos atos administrativos deve ser interposto no prazo de 30 dias e o recurso hierárquico facultativo, no prazo de impugnação contenciosa do ato em causa”.

18.ª Ora, dispõe o artigo 194°, n.° 1, do CPA que “O recurso é dirigido ao mais elevado superior hierárquico do autor do ato ou da omissão, salvo se a competência para a decisão se encontrar delegada ou subdelegada”.

19.ª O requerimento de interposição do recurso é apresentado ao autor do ato ou da omissão ou à autoridade a quem seja dirigido, que, neste caso, o remete ao primeiro, no prazo de três dias. – Art.° 194°, n.° 2, do CPA. Este prazo de 3 dias úteis não foi contabilizado pelo Tribunal a quo.

20.ª No caso, a recorrente interpôs o seu recurso junto do Exmo. Reitor, cumprindo os deveres impostos pelo artigo 194° do CPA.

21.ª Por sua vez, o 195°, n.° 1, do CPA dita que “Recebido o requerimento, o autor do ato ou da omissão deve notificar aqueles que possam ser prejudicados pela sua procedência para alegarem, no prazo de 15 dias, o que tiverem por conveniente sobre o pedido e os seus fundamentos”.

22.ª No caso, o requerimento de recurso foi recebido em 05.09.2019. Pelo que, recebido o requerimento, na contagem do prazo de caducidade devem ser contabilizados esses 15 dias úteis. (acrescidos dos 3 dias úteis referidos anteriormente). Tal contabilização também não sucedeu na sentença recorrida.

23.ª Acrescenta o n.° 2, do artigo 195° do CPA: “No mesmo prazo referido no número anterior, ou no prazo de 30 dias, quando houver contrainteressados, deve o autor do ato ou da omissão pronunciar-se sobre o recurso e remetê-lo ao órgão competente para dele conhecer, notificando o recorrente da remessa do processo administrativo”.

24.ª No caso concreto, não se apurou qualquer notificação da remessa do processo administrativo. Pelo que também esse prazo deve ser contabilizado no seu máximo.

25.ª Portanto, mesmo que se entenda que o prazo para a decisão do RH era de 30 ou 60 dias úteis e não de 90 dias úteis, a verdade é que a contagem do prazo para a decisão do RH só se conta a partir da data da remessa do processo ao órgão competente para dele conhecer. Isto mesmo preceitua o artigo 198°, n.° 1, do CPA, cit. “Quando a lei não fixe prazo diferente, o recurso hierárquico deve ser decidido no prazo de 30 dias, a contar da data da remessa do processo ao órgão competente para dele conhecer”.

26.ª Ora, não se apurou a data da remessa do processo, nem sequer se foi remetido, pelo que, nesse caso, deve ser contabilizado o prazo máximo.

27.ª Ou seja, se o requerimento de recurso foi recebido pelo Exmo. Reitor a 05.09.2019, aquela entidade remeteu tal requerimento ao autor do ato impugnado, no prazo de 3 dias úteis, o que significa que esse prazo terminou no dia 09/09/2019. A partir de 09/09/2019, a Recorrida tinha 15 dias úteis para notificar os contrainteressados, terminando tal prazo no dia 30/09/2019. Ao que se seguia o prazo de 30 dias úteis previsto no artigo 195°, n.° 2, do CPA, para a Recorrida se pronunciar e remeter o processo para a entidade competente decidir, terminando tal prazo no dia 11/11/2019.

28.ª Finalmente, nos termos do artigo 198°, n.° 1, do CPA, a entidade competente para decidir tinha o prazo de 30 dias úteis para o fazer (a contar de 11/11/2024), prazo que terminou em 23/12/2019. Destarte, o prazo de 30 dias úteis para decidir, conforme o disposto no artigo 198°, n.° 1 do CPA, terminou no dia 23 de Dezembro de 2019.

29.ª Como não foi prolatada a decisão, por atenção ao prazo de 3 meses aludido no artigo 58°, n.° 1, al. b) do CPTA, a A. intentou a ação no prazo legal para o efeito (e mesmo que se considere inaplicável o n.° 2 do artigo 198° do CPA).

30.ª Assim, mesmo se considerarmos que a A. só tinha 60 dias de prazo para a propositura da ação, a verdade é que, retomando a contagem a partir do dia 23.12.2019, inclusive, o prazo de 60 dias que a A. dispunha para recorrer do despacho em crise nos autos terminava no dia 20/02/2020, e não em 27.01.2020 como consta da Sentença.
31.ª Pelo que violou o tribunal recorrido as seguintes normas: Artigos 194, ns.° 1, 2, 195°, números 1 e 2, e 198°, n.° 1, todos do C.P.A.; Artigos 59°, números 1, 2, 3, 4 e 5, 69.°, n.° 1, al. a), e 69°, n.° 2, todos do CPTA;

Sem prejuízo de tudo o alegado, a recorrente defende ainda o seguinte:

32.ª A circunstância do n° 4 do artigo 59° CPTA dispor que a “utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal” não significa a revogação dos regimes especiais que consagrem a impugnação administrativa, seja qual for a tipologia - reclamação, recurso hierárquico ou recurso tutelar necessários.

33.ª Na circunstância de impugnação graciosa facultativa o efeito é o mesmo no tocante à aplicação do regime estatuído no citado art.° 59° n° 4 CPTA.

34.ª No domínio contencioso e para efeitos de tutela judicial efetiva, consagrada no artigo 268° n° 4 CRP, a tónica reside na eficácia externa dos atos desde que lesiva dos particulares – cfr. artigos 2° n° 2 e 51° n° 1 CPTA - o que não impede que a impugnação graciosa, ainda que facultativa, tenha exatamente o mesmo efeito que a impugnação graciosa necessária, efeito este que é previsto no artigo 59°, n.° 4 do CPTA, ou seja o da suspensão do prazo da impugnação contenciosa do ato administrativo.

35.ª Suspensão esta que, in casu só caducaria com a notificação da decisão final do Recurso Hierárquico, o que significa que no caso dos autos a ação foi tempestivamente intentada pela Recorrente, violando o tribunal a quo o disposto no artigo 59°, n.° 4, do CPTA.

Sem prescindir,

36.ª Na sua petição inicial, a recorrente invocou a Nulidade Absoluta do ato impugnado, prevista na al. d), do n.° 2, do artigo 161° do CPA.

37.ª No entanto. o tribunal recorrido nem se pronunciou relativamente ao vício de nulidade invocado pela recorrente, o que constitui o vício de nulidade por omissão de pronúncia, o qual se invoca para os devidos e legais efeitos.

38.ª Pois que, para existir pronúncia, o tribunal recorrido teria de fundamentar a sua posição, designadamente sentenciando que o vício de nulidade expressamente invocado pela A. não se reconduz à nulidade, mas à anulabilidade, e justificando o porquê, o que não fez.

39.ª Pois bem, a recorrente consubstanciou a sua pretensão jurisdicional também por ofensa ao conteúdo essencial dos direitos fundamentais da A., como sejam os que estão previstos nos artigos 13°, da CRP.

40.ª Destarte, atento o que se expôs, é apodítico que, a ser inválido o ato impugnado, será o mesmo nulo, por ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, não estando a respetiva impugnação sujeita a prazo – artigos 161°, n.° 2, alínea d) do Código de Procedimento Administrativo.

41.ª Perante a evidência da manifesta tempestividade da interposição da ação em juízo, o tribunal a quo errou ao interpretar e aplicar as seguintes normas: artigos 13°, e 18°, n.° 2, da CRP; 161°, n.° 2, al. d), do CPA, e artigo 58°, n.° 1, do CPTA.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve a decisão recorrida ser revogada, substituindo-a por outra que determine a procedência do presente recurso, tudo conforme alegado e concluído, seguindo-se os demais termos legais, assim se fazendo a costumada e boa JUSTIÇA.
A Ré juntou contra-alegações, concluindo:
A) O objecto do recurso consubstancia-se na decisão proferida pelo Tribunal a quo que julgou verificada a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual e, em consequência, absolve[u] a entidade Ré.
Contudo, não assiste qualquer razão à Recorrente, tendo o Tribunal a quo feito uma correta aplicação e subsunção da legislação aplicável. Senão vejamos:
B) Como primeiro fundamento, a Recorrente invoca o facto de o Tribunal ao não ter decidido o pedido de apensação formulado no processo n.º 36/18.5BEMDL e não ter reponderado a suspensão da instância, comete uma nulidade [cfr. conclusão 9.ª]. PORÉM:
B.1) Nos presentes autos não ocorre qualquer causa para suspensão da instância ou apensação de processos, uma vez que o objecto dos outros processos judicias [a apensar ou como causa da suspensão da instância] dizem respeito a outros procedimentos concursais que nada acrescentam ou importam às questões suscitadas nos presentes autos, atento os respectivos requisitos de admissão e parâmetros de avaliação e seriação [e alvo de diferentes processos judiciais] não serem os mesmos.
B.2) Por sua vez, não deverá nem poderá acolher a tese de que o Juiz de determinado processo não poderá decidir sobre a uma exceção / caducidade nesse mesmo processo porque existe um pedido de apensação noutro processo ou uma suspensão de instância [aliás, já terminada]... estaria descoberta a maneira de adiar decisões e protelar os processos quase indefinidamente [e, diga-se, como é óbvio, injustificadamente]. De facto, bastaria requerer a apensação a determinado processo para este ficar “preso” a esse pedido, o que, manifestamente, não é admissível, não faz qualquer sentido, legal e factual, e contraria, entre outros, os princípios da celeridade e decisão.
B.3) Assim, afigura-se, de forma clara, que a douta sentença fez uma correcta interpretação e aplicação do previsto no artigos em causa e ao caso aplicáveis, pelo que, face ao tudo in supra exposto, deve o recurso a que aqui se responde improceder, mantendo-se a sentença em causa, o que se requer.
SEM PRESCINDIR:
C) Como segundo fundamento para sustentar o recurso em apreço, a Recorrente entende que o prazo da decisão do recurso hierárquico seria de 90 dias, e não 60 ou 30, justificando tal com o facto de considerar ser aplicável o artigo 11.°/2 da Lei n.° 72/2020, de 16 de Novembro. PORÉM:
C.1) Olvida aquela que, em quaisquer das versões do CPA, o prazo para decisão de recurso hierárquico é de 30 dias, não havendo qualquer outro prazo em apreço ou aplicável ao caso subjudice, sendo certo que no procedimento em causa não houve lugar [nem tal consta da matéria de facto assente, de qualquer documento carreado para os autos ou do PA], à realização de nova instrução ou de diligências complementares, sendo que só assim é que o prazo geral de 30 dias poderia ser elevado [a 60 ou 90 dias, consoante se entenda qual a versão do CPA aplicável – cfr. seu artigo 198.°/2].
C.2) A Recorrente não logrou, assim, provar os pressupostos e circunstâncias factuais necessárias àquilo que aparentemente agora vem defender [reitere-se (i) que neste processo houve lugar realização de nova instrução ou de diligências complementares e que (ii) por força de tal, o prazo para decisão de recurso hierárquico teria sido elevado para 60 ou 90 dias.
C.3) Com efeito e considerando a matéria de facto provada [aliás, não posta em causa nem impugnada pela Recorrente], são as seguintes datas relevantes:
· 05/Agosto/2019 [data da notificação dos atos impugnados – cfr. facto assente 7];
· 05/Set/2019 [data da apresentação do recurso hierárquico – cfr. facto assente 8];
· 05/Set/2019 + 30 dias úteis [prazo de decisão do recurso hierárquico] = 17/Out/2019;
· 17/Out/2019 + 90 dias [cfr. artigo 58.° do CPTA | onde se inclui os 31 dias entre 05/Agosto/2019 e 05/Set/2019] = 03/Nov/2020;
· 06/Fev/2020 [data da entrada da presente acção – cfr. facto assente 9].
C.4) Concluindo: a Autora/Recorrente propos a acção manifestamente fora do prazo, designadamente no prazo de 143 dias quando o devia ter feito em 90 dias, de acordo com o artigo 58.° do CPTA [ou seja, até 03/Nov/2019], pelo que e salvo o devido respeito, deve o recurso improceder e manter-se a decisão em causa, o que aqui expressamente se volta a requer.
SEM PRESCINDIR:
D) Como terceiro argumento, a Recorrente tenta defender-se com o disposto no artigo 194.°/2 do CPA e demais prazos relativos à tramitação do recurso hierárquico. PORÉM:
D.1) Mesmo considerando os prazos e regras que a Recorrente invoca, ainda assim se conclui que a acção foi instaurada intempestivamente, pois que:
· 05/Agosto/2019 [data da notificação dos atos impugnados – cfr. Facto assente 7];
· 05/Set/2019 + 3 dias úteis [remessa para o superior hierárquico | conclusão 19.ª] + 15 dias úteis [notificação aos contra-interessados | conclusão 21.ª] + 30 dias [prazo para pronúncia do autor do acto | conclusão 23.ª] + 30 dias [prazo para decisão do recurso hierárquico | conclusão 25.ª] = 11/Nov/2019 [conclusão 27.ª];
· De 11/Nov/2019 + 90 dias [cfr. artigo 58.° do CPTA | onde se inclui os 31 dias entre 05/Agosto/2019 e 05/Set/2019] = 09/Jan/2020;
· Sucede que a presente acção foi instaurada em 06//Fev/2020, ou seja, cerca de um mês após o prazo limite de 90 dias consagrado no artigo 58.° do CPTA.
D.2) Concluindo: mesmo seguindo a tese da Recorrente [sobre os prazos máximos da tramitação de um recurso hierárquico], a mesma desfalece, pelo que, confirmando-se a exceção de caducidade, requer-se também por esta ordem de razões a improcedência do recurso em causa e a manutenção do decido pelo Tribunal a quo.
SEM PRESCINDIR:
E) Como quarta tese para sustentar o seu recurso, a Recorrente alega que a suspensão operada pelo recurso hierárquico só caducaria com a notificação da decisão final do mesmo [conclusão 35.ª]. PORÉM:
E.1) Basta a leitura do artigo 59.°/4 do CPTA para dissipar quaisquer dúvidas sobre quando cessa a suspensão pela apresentação do recurso hierárquico, pois que é tal disposição clara e expressa, pois que, como se transcreve com carregado nosso: A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar]. Neste sentido, igualmente, artigo 190.°/3 do CPA.
E.2) São, pois, claras e óbvias as disposições acima transcritas, não havendo quaisquer dúvidas de interpretação [jurisprudenciais ou doutrinais] sobre o seu sentido, pelo que, improcede, deste modo e igualmente, a tese da Recorrente, devendo, em consequência, seguir igual caminho o recurso interposto por aquela, o que novamente aqui se requer.
AINDA SEM PRESCINDIR:
F) Como último e quinto fundamento, a Recorrente alega uma omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo, ao não se debruçado sobre a nulidade que invocou na sua PI, nomeadamente de ofensa a conteúdo essencial de um direito fundamental. PORÉM:
F.1) É falso que o Tribunal a quo não se tenha pronunciado sobre esta questão, pois que da sentença decorre que “(...) todos os vícios invocados pela a Autora se reconduzem ao desvalor da anulabilidade (...), pelo que, para efeitos de aferição da tempestividade da presente acção, há que tomar em linha de conta o prazo de três meses (...).
F.2) Em todo o caso, mesmo que assim não se entendesse, a verdade é que é manifesto que os atos impugnados não contêm qualquer nulidade [ou ilegalidade], sendo que, por um lado, da leitura dos editais em causa não se retira qualquer redução excessiva às eventuais candidaturas e, por outro, parece olvidar a Recorrente que a decisão de abertura de concurso, das necessidades de determinado curso / Escola, de qual as competências para aquela “vaga”, está atribuída à Universidade ... e não, como é óbvio, à mera opinião [cfr. artigos 214.° e 216.° da PI] dos candidatos que querem ocupar essas vagas... O que seria?!!
F.3) Pelo que, também por esta ordem de razões, deve improceder a tese da Recorrente, tal como o seu recurso, o que se volta a requerer.
POR FIM, CASO ESTE TRIBUNAL ASSIM NÃO O ENTENDA [OU SEJA, CASO CONSIDERE QUE A PRESENTE ACÇÃO FOI TEMPESTIVAMENTE PROPOSTA]:
G) Nos termos e de acordo com o artigo 149.°/2 do CPTA e dos princípios da utilidade, aproveitamento e celeridade, pode e deve este Tribunal Central conhecer do pedido de extinção de instância por inutilidade superveniente da lide, apresentado pela Ré em 31/Maio/2023 e 16/Junho/2023.
G.1) De facto, considerando que:
· a presente acção tem como objecto a impugnação de três actos administrativos [de exclusão da Autora] relativos a três procedimentos de recrutamento diferentes [artigo 1.º da PI] e, cumulativamente, a condenação da Ré à admissão da sua candidatura aos três sobreditos procedimentos de recrutamento;
· a utilidade que a Autora pretende retirar com os presentes autos é, assim, a admissão àqueles concursos e, a final, o seu provimento a Leitora Convidada;
· entretanto e no seguimento do procedimento concursal aberto pelo aviso n.º OE202207/0788 da Bolsa de Emprego Público, a Autora – Prof. «AA» – foi classificada e graduada em 1.º lugar e, em consequência, provida a Professora Auxiliar, tendo em 22/Fev/2023 celebrado com a Ré o respectivo contrato – cfr. documentos n.ºs 1e 2 junto com os aludidos requerimentos,
por um lado, não é, material e formalmente, possível – ou sequer lógico – poder reposicioná-la em diferente e inferior “categoria”,
e, por outro, sequer pode a Ré assinar com a Autora outro contrato de Professora ou de Leitora Convidada, ainda que em categorias diferentes e com origem em diverso procedimento concursal ou decisão.
G.2) E, na verdade, não faz qualquer sentido, factual e legal, que o Tribunal julgue procedente a acção / recurso e, por força deste (i) se invalide as decisões de exclusão / actos impugnados; (ii) se nomeie novo Júri; (iii) se admita a Autora a concurso; (iv) se homologue essa decisão de admissão; (v) se avalie a mesma em mérito relativo [com os demais concorrentes]; (vi) seja, nessa avaliação e eventualmente, ordenada / graduada em 1.º lugar; (vii) se homologue essa decisão de ordenação final ... tudo para, a final e no fim, não poder assinar qualquer contrato de trabalho com a Ré uma vez que, note-se, a mesma já assinou anteriormente, em Fev/2023, um contrato de trabalho com a Ré como Professora Auxiliar [através do procedimento OE202207/0788 da Bolsa de Emprego Público]...
G.3) Ora, o efeito jurídico pretendido através dos presentes autos – posicionar-se como Leitora Convidada – tornou-se lógica e juridicamente irrealizável – e por isso inútil – durante a presente instância dado tal pretensão já se ter realizado e até superado [ainda que por outros motivos e origem], sendo que a extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide ocorre quando, por facto durante a pendência da mesma, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude de encontrar satisfação fora do esquema da pretensão deduzida, o que manifestamente sucede in casu.
G.4) Assim, face ao exposto e caso este Tribunal entenda revogar a decisão recorrida, requer-se a extinção da presente instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos e de acordo com a alínea e) do artigo 277.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, devendo a responsabilidade das custas processuais ser totalmente a cargo da Autora – cfr. artigo 536.º/3 do CPC, que consagra a regra geral –, o que aqui também expressamente se requer, pois que a inutilidade requerida não é, de todo, imputável à Ré, até porque:
· por um lado, foi a própria Autora a dar origem aos presentes autos e a situação em apreço não se subsume ao elenco taxativo do artigo 536.º/2 do CPC [e apenas nestas situações é que a regra geral da responsabilidade das custas ficar a cargo da Autora é derrogada], e
· por outro, sem prescindir, por a Autora ter optado por assim fazer bem sabendo que:
. já tinha impugnado outros procedimentos concursais onde peticiona o seu provimento como Leitora Convidada ou Professora Auxiliar e/ou àqueles se candidatado;
. quer a impugnação sucessiva e simultânea de tais concursos que se candidatou, quer a sua candidatura a procedimentos em curso e/ou repetidos, poderia dar origem ao resultado que aqui se assiste: vínculo laboral com a Universidade ..., seja na categoria ou carreira de Prof. Auxiliar, seja na de Leitora Convidada, na pendência de processos judiciais onde se peticiona precisamente isso: vinculo laboral com a Ré Universidade ..., no caso dos presentes autos como Leitora Convidada.
COM EFEITO,
H) face ao tudo in supra exposto, afigura-se que não assiste razão à Recorrente, não merecendo qualquer censura o doutamente decidido e devendo, por conseguinte, tal sentença ser mantida e o recurso improceder.
PELO QUE, NÃO DANDO PROVIMENTO AO RECURSO EM CAUSA E MANTENDO A DOUTA DECISÃO EM CRISE, FAR-SE-Á A HABITUAL JUSTIÇA!
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO -
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1) Pelo Edital de referência BRCDC/UTAD/4/2019, a Entidade Demandada tornou pública a abertura de “processo de recrutamento e seriação com vista à constituição de uma base de recrutamento” para a categoria de Leitor, a 100%, para o primeiro e segundo semestres do ano lectivo de 2019/2020, e tendo em vista a lecionação das seguintes unidades curriculares e cursos: Língua estrangeira AI (Inglês A2.1) (ACC); Inglês B 1.1 (Turismo); Inglês B2 1.1 (Turismo); Teorias e Técnicas de Tradução (LRE); Inglês C 1.1 (LRE); Inglês C 1.2 (LRE); Inglês B 2.2 (CC) – cfr. documento n.º 13, junto com a petição inicial, a fls. 83 a 84 do SITAF;

2) Pelo Edital de referência BRCDC/UTAD/7/2019, a Entidade Demandada tornou pública a abertura de “processo de recrutamento e seriação com vista à constituição de uma base de recrutamento” para a categoria de Leitor, a 100%, para o primeiro e segundo semestres do ano lectivo de 2019/2020, e tendo em vista a lecionação das seguintes unidades curriculares e cursos: Língua estrangeira AII (Inglês A2.2) (ACC); Inglês B 1.2 (Turismo); Inglês B 1.2 (LLC); Inglês B 1.1 (LRE); Inglês B 2.1 (LRE); Inglês B 2.2 (LRE); Inglês B 2.2 (Turismo) – cfr. documento n.º 14, junto com a petição inicial, a fls. 85 a 88 do SITAF;

3) Pelo Edital de referência BRCDC/UTAD/8/2019, a Entidade Demandada tornou pública a abertura de “processo de recrutamento e seriação com vista à constituição de uma base de recrutamento” para a categoria de Leitor, a 100%, para o primeiro e segundo semestres do ano lectivo de 2019/2020, e tendo em vista a lecionação das seguintes unidades curriculares e cursos: Inglês B 2.1 (LLC); Inglês B 1.2 (LLC); Inglês B 1.1 (LLC); Culturas Pós-Coloniais de Língua Inglesa (LLC); Inglês C 1.1 (LRE); Inglês C 1.2 (LRE); – cfr. documento n.º 15, junto com a petição inicial, a fls. 89 a 92 do SITAF;

4) Em 15.07.2019, o Júri dos procedimentos concursais, referidos nos pontos 1), 2) e 3), deliberou excluir a candidatura da Autora, “por não cumprir o(s) requisito(s): Doutoramento ou mestrado (ou equivalente legal) em Ciências da Linguagem - Linguística Inglesa ou em Filologia Inglesa” - cfr. documento n.º 17, junto com a petição inicial, a fls. 94 a 109 do SITAF;

5) Em 26.07.2019, a Autora apresentou reclamação - cfr. documento n.º 18, junto com a petição inicial, a fls. 110 a 123 do SITAF;

6) Em 05.08.2019, o Júri dos procedimentos concursais, referidos nos pontos 1), 2) e 3), indeferiu as reclamações apresentadas pela Autora, uma vez que “a Doutora «AA» não cumpre os Requisitos habilitacionais de Admissibilidade: Doutoramento ou mestrado (ou equivalente legal) em Ciências da Linguagem Linguística Inglesa ou em Filologia Inglesa” – cfr. documento n.º 1, junto com a petição inicial, a fls. 59 a 70 do SITAF;

7) Em 05.08.2019, a Autora tomou conhecimento das decisões plasmadas no ponto anterior – admitido por acordo;


8) Em 05.09.2019, a Autora interpôs recurso hierárquico das decisões, constantes do ponto 6), junto do Reitor da Universidade ... - cfr. documento n.º 19, junto com a petição inicial, a fls. 124 a 163 do SITAF; admitido por acordo;

9) Em 06.02.2020, foi proposta a presente acção – cfr. fls. 1 a 4 do SITAF.
DE DIREITO -
É objecto de recurso o saneador-sentença que julgou verificada a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual e absolveu a Entidade Demandada da instância.
Retira-se da fundamentação da decisão:
· “(...) todos os vícios invocados pela a Autora se reconduzem ao desvalor da anulabilidade (...), pelo que, para efeitos de aferição da tempestividade da presente acção, há que tomar em linha de conta o prazo de três meses (...);
· “Em 05.08.2019, a Autora tomou conhecimento dos actos impugnados (cfr. pontos 6) e 7) dos factos provados). Em 05.09.2019, a Autora interpôs recurso hierárquico (cfr. ponto 8 dos factos provados). Em 06.02.2020, deu entrada a presente acção (cfr. ponto 9) dos factos provados)”;
· “Ou seja, na data de entrada da presente acção, em 06.02.2020, já havia decorrido prazo de 90 dias, (...) previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, pelo que a presente acção é intempestiva”;
· “Ademais, sempre se referira que os acto impugnáveis eram as decisões de exclusão das candidaturas da Autora, proferidas em 15.07.2019 (cfr. ponto 4) dos factos provados) - por se tratarem de actos finais dos procedimentos concursais relativamente à Autora (...)”.
A Recorrente discorda do assim decidido, invocando, em síntese, que:
a) a decisão recorrida constituiu uma decisão surpresa dado ainda não ter havido decisão relativamente ao pedido de apensação que foi feito no âmbito do processo 36/18.5BEMDL [cfr. conclusões n.°s 4 e 3];
b) a versão aplicável é a do n.º 2 do artigo 198.º do CPA, conforme preceituado no artigo 11.º da Lei 72/2020, pelo que o prazo para a decisão do recurso hierárquico não é de 60 dias úteis, e sim de 90 dias úteis (...) havendo instrução, existindo a realização de diligências complementares, inelutavelmente o prazo para a decisão do recurso hierárquico é de 90 dias úteis [cfr. conclusões n.°s 10 e 12];
c) mesmo que se entenda que o prazo para a decisão do recurso hierárquico era de 30 ou 60 dias, e não de 90 dias úteis, a verdade é que a contagem do prazo para a decisão do recurso hierárquico só se conta a partir da data da remessa do órgão competente para dele conhecer. Ora, não se apurou a data da remessa do processo, nem sequer se foi remetido, pelo que, nesse caso, deve ser contabilizado o prazo máximo [cfr. conclusão n.° 25];
d) a suspensão [do prazo de impugnação], in casu, só caducaria com a notificação da decisão final do recurso hierárquico, o que significa que no caso dos autos a ação foi tempestivamente intentada pela Recorrente [cfr. conclusão n.° 35];
e) na sua petição inicial, a recorrente invocou a nulidade absoluta do ato impugnado [cfr. conclusão n.° 36].
Não vemos que assim seja.
Como se retira do saneador-sentença e resulta do probatório - que não foi posto em causa -, a decisão impugnada foi notificada à Autora em 05/agosto/2019 [cfr. facto assente n.° 7] e a presente acção foi intentada a 06/fev/2020 [cfr. facto n.° 9], sendo que:
· por um lado, não foi invocada qualquer nulidade;
· por outro, o prazo para impugnação do acto em causa sempre seria, de acordo com os artigos 58.° e 59.° do CPTA, de 3 meses, pelo que é manifesta a intempestividade da prática do acto processual em causa [inclusive tendo em conta o recurso hierárquico instaurado].
Atente-se:
Vem a Recorrente invocar que o facto de o Tribunal ao não ter decidido o pedido de apensação formulado no processo n.° 36/18.5BEMDL e não ter reponderado a suspensão da instância, comete uma nulidade.
Ora, não assiste qualquer razão à Recorrente desde logo porque não ocorre qualquer causa para suspensão da instância ou apensação de processos, porquanto as alegações relativas a outras matérias, a outros procedimentos [e processos judiciais] nada acrescentam ou importam às questões suscitadas nos presentes autos, tanto mais que os respectivos requisitos de admissão e parâmetros de avaliação e seriação de cada concurso [alvo de diferentes processos judiciais] não são os mesmos.
De facto, o que ora está em causa é o acto de exclusão da candidatura da Autora para a posição de Leitora Convidada a 100% [nos procedimentos com as ref.ªs BRCDC/UTAD/4/2019, BRCDC/UTAD/7/2019 e BRCDC/UTAD/8/2019] e não outro ou outros quaisquer.
Considerou o Tribunal, na linha do defendido pela Ré, que os presentes autos já tinham todos os elementos e factos aptos à prolação de uma justa decisão, independentemente de outros procedimentos e processos judiciais que possam estar a correr, porquanto, reitere-se, são autónomos entre si, com requisitos de admissão e de seriação diferentes.
Com efeito, não se visualiza nos presentes autos motivo justificado nem dependência de outra causa já proposta para suspensão da presente instância ou apensação de processos, ademais quando é do interesse de todos a diminuição da litigiosidade existente, bem como a sua actuação com um suficiente grau de certeza e segurança, o que apenas com decisões definitivas - neste e nos outros processos - se pode alcançar.
Desatende-se esta argumentação da parte.
Acresce que nunca poderia ser acolhida a tese de que o Juiz de determinado processo não poderá decidir sobre uma exceção nesse mesmo processo porque existe um pedido de apensação noutro processo; é que tal equivaleria a abrir a porta ao adiamento das decisões e ao protelar dos processos, quando o que se pretende é acautelar a celeridade processual.
Efectivamente, bastaria requerer a apensação a determinado processo para este ficar “preso” a esse pedido, o que, manifestamente, não é admissível, não faz qualquer sentido, legal e factual, e contraria, entre outros, os princípios da celeridade e decisão.
Assim, bem andou o Tribunal a quo neste segmento.
Entende também a Recorrente que o prazo da decisão do recurso hierárquico seria de 90 dias, e não de 60 ou 30, justificando tal com o facto de considerar ser aplicável o artigo 11.°/2 da Lei 72/2020, de 16 de novembro.
Todavia, carece de suporte.
É que, olvida a Recorrente que, em quaisquer das versões do CPA, o prazo para decisão de recurso hierárquico é de 30 dias, não havendo qualquer outro prazo em apreço ou aplicável ao caso sub judice.
Note-se, no procedimento em apreço não houve lugar à realização de nova instrução ou de diligências complementares, sendo que só assim é que o prazo geral de 30 dias poderia ser elevado [a 60 ou 90 dias, consoante se entenda qual a versão do CPA aplicável - cfr. seu artigo 198.°/2].
Ora, tanto não houve que tal não consta (i) da matéria de facto assente, (ii) de qualquer documento ou sequer (iii) do PA.
Temos, assim, que a Recorrente não logrou provar os pressupostos necessários àquilo que vem defender, nomeadamente que:
· neste processo houve lugar à realização de nova instrução ou de diligências complementares;
· por força de tal, o prazo para decisão de recurso hierárquico teria sido elevado para 90 dias.
Destarte e considerando a matéria de facto provada:
· os actos impugnados foram notificados à Autora em 05/agosto/2019 [cfr. facto assente 7 e primeira página da PI, onde se identificam aqueles actos e datas];
· em 05/set/2019 a Autora apresentou recurso hierárquico;
· (entre 05/agosto/2019 e 05/set/2019 contabiliza-se 31 dias);
· 05/set/2019 + 30 dias úteis [prazo de decisão do recurso hierárquico, cfr. artigo 198.° do CPA] = 17/out/2019;
· a Autora propôs a presente acção em 06/fev/2020;
· entre 17/out/2019 e 06/fev/2020 passaram 112 dias... ao que ainda teria que acrescer os 31 dias entre conhecimento do acto impugnado e a interposição do recurso hierárquico.
É inegável que a Autora propôs a acção manifestamente fora do prazo, designadamente no prazo de 143 dias quando o devia ter feito em 90 dias, de acordo com o artigo 58.° do CPTA [ou seja, até 03/nov/2019].
É certo que a mesma tenta defender-se com o disposto no artigo 194.°/2 do CPA e demais prazos relativos à tramitação do recurso hierárquico.
Porém, também aqui não lhe assiste razão.
Conforme supra exposto, mesmo que as regras e contagem dos prazos alegados pela Recorrente estivessem certos, a verdade é que, ainda assim, aquela propôs a acção intempestivamente.
É que, seguindo de perto a sua tese:
· 05/agosto/2019: notificação do ato impugnado;
· 05/set/2019: apresentação de recurso hierárquico [note-se que entre estas datas já decorrem 31 dias];
· 05/set/2019 + 3 dias úteis [conclusão 19.ª] + 15 dias úteis [conclusão 21.ª] + 30 dias [conclusão 23.ª] = 11/nov/2019 [conclusão 27.ª];
· De 11/nov/2019 + 59 dias [pois entre o acto impugnado e o recurso hierárquico decorreram 31... acrescendo os ditos 59 dias perfaz no total os 90 dias (prazo de impugnação)] = 09/jan/2020;
· Sucede que a acção foi instaurada em 06//fev/2020, ou seja, cerca de um mês após o prazo limite de 90 dias plasmado no artigo 58.° do CPTA.
Tal equivale a dizer que, mesmo seguindo a linha condutora da Recorrente [sobre os prazos máximos da tramitação de um recurso hierárquico], a mesma sucumbe, pelo que, se impõe a manutenção do decido pelo Tribunal a quo.
Mas a Recorrente sustenta também que a suspensão operada pelo recurso hierárquico só caducaria com a notificação da decisão final do mesmo [conclusão 35.ª].
Mais uma vez carece de suporte.
Decorre do artigo 59.°/4 do CPTA que:
Início dos prazos de impugnação
4. A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.
Neste sentido, igualmente o artigo 190.°/3 do CPA estipula:
Efeitos sobre os prazos
3. A utilização de meios de impugnação administrativa facultativos contra atos administrativos suspende o prazo de propositura de ações nos tribunais administrativos, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal.
“Nestes termos, a suspensão do prazo apenas inutiliza o período que decorra entre o momento da utilização do meio de impugnação administrativa e o da notificação da decisão que sobre ela tenha sido proferida ou o termo do prazo para que essa decisão fosse proferida, sem que tenha sido emitida qualquer decisão. O que significa que se o prazo legal da decisão da impugnação administrativa se esgotar sem que tenha sido proferida decisão, é aquele facto que determina o início do prazo de impugnação contenciosa contra o ato primário, sendo irrelevante a ulterior notificação de um eventual ato de indeferimento” - Mário Aroso e Carlos Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª ed., 2018, p. 413. Ou seja, também aqui falece a orientação da Recorrente.
Por fim importa salientar que, contrariamente ao aventado, o Tribunal recorrido se pronunciou sobre a questão da nulidade invocada na p.i..
De facto, decorre da sentença que: “(...) todos os vícios invocados pela Autora se reconduzem ao desvalor da anulabilidade (...), pelo que, para efeitos de aferição da tempestividade da presente acção, há que tomar em linha de conta o prazo de três meses (...).
E assim é.
O “conteúdo essencial de um direito fundamental” previsto no artigo 133º, nº 2, alínea d), do CPA reporta-se ao núcleo duro de um direito, liberdade e garantia ou análogo, à ofensa chocante e grave de um princípio estruturante do Estado de Direito ou de outro direito fundamental suficientemente densificado na lei ordinária.
A violação do “conteúdo essencial de um direito fundamental” só gera a nulidade do ato administrativo e, consequentemente, a possibilidade da sua impugnação a todo o tempo, quando, em consequência do ato administrativo em causa, seja afetado o mínimo sem o qual esse direito não pode subsistir enquanto tal.
Ademais, a Recorrente vem com tal alegação, sem sequer indicar em concreto qual o alegado direito fundamental que estaria a ser ofendido, o que, desde logo destronaria a sua pretensão.
Em suma,
A invalidade dos atos administrativos decompõe-se em duas modalidades essenciais: a nulidade e a anulabilidade.
A nulidade constitui a forma mais grave de invalidade. Um ato ferido de nulidade é ineficaz, não produzindo qualquer efeito ab initio, e insanável, quer pelo decurso do tempo, quer por ratificação, reforma ou conversão. É suscetível de impugnação a todo o tempo e perante qualquer tribunal e pode ser conhecida a todo o tempo por qualquer órgão administrativo e o seu reconhecimento tem natureza meramente declarativa.
A anulabilidade constitui uma forma de invalidade menos grave. Como tal, os atos meramente anuláveis são eficazes e produzem todos os seus efeitos até ao momento em que ocorra a sua anulação ou suspensão.
A regra no Direito Administrativo português é a de que todo o ato administrativo inválido é anulável; só excecionalmente é que o ato inválido é nulo.
Isto por razões de certeza e de segurança da ordem jurídica. Não se poderia admitir que, dado o regime da nulidade - e, designadamente, a possibilidade de ela ser declarada a todo o tempo - pairasse indefinidamente a dúvida sobre se os atos da Administração Pública são legais ou ilegais. É preciso que ao fim de algum tempo, razoavelmente curto, cessem as dúvidas e os atos da Administração possam claramente ser definidos como válidos ou como inválidos (Freitas do Amaral, em Curso de Direito Administrativo, vol. II, Coimbra, 2001, pág. 409).
Como bem decidiu a sentença, resumidamente, a Autora, na petição inicial, alega que os actos impugnado padecem de vício de violação de lei por violação do princípio da imparcialidade e por erro quanto aos pressupostos de facto e de direito.
Com efeito, todos os vícios invocados pela a Autora se reconduzem ao desvalor da anulabilidade (cfr. artigo 163.º, n.º 1, do CPA), pelo que, para efeitos de aferição da tempestividade da presente acção, há que tomar em linha de conta o prazo de três meses, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA ex vi n.º 2 do artigo 69.º do CPTA.

Como é sabido, com a estipulação de prazos para a reação a atos administrativos, pretende o Legislador a estabilidade nas relações jurídico-administrativas, as quais não podem estar dependentes do mero alvedrio, liberalidade ou escolha de timing do interessado e/ou da Administração, sob pena de se eternizar a indefinição acerca da situação jurídica das partes. Sendo, portanto, forçoso, em nome da segurança jurídica, impor um limite à reação a atos administrativos, de modo a conciliar de forma equilibrada estes princípios com o da tutela jurisdicional efetiva.
A intempestividade da prática do acto processual é uma excepção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo e importa a absolvição do Réu da instância, nos termos da al. h), do nº 1 e nº 2 do artigo 89º (actual artigo 89º, nºs 1, 2 e 4, al. k)) do CPTA, conjugado com os artigos 278º, nº 1, al. e), 576º, nº 2 e 577º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, mostrando-se por esse facto prejudicado o conhecimento do fundo da causa.
Na verdade, a caducidade do direito de acção é consagrada a benefício do interesse público da segurança jurídica que reclama que a situação das partes fique definida de uma vez para sempre com o transcurso do respectivo prazo - (v. Manuel Andrade “Teoria Geral da Relação Jurídica”, II, 3ª reimpressão, pág. 464).
Improcedem as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 09/5/2025

Fernanda Brandão
Rogério Martins
Isabel Jovita