Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00289/20.9BEMDL-S1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/15/2024
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL; DESPACHO; APOIO JUDICIÁRIO/NOMEAÇÃO DE PATRONO; PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DO PATRONO NOMEADO;
PRAZO DE RECURSO; IMPOSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO DE UM PRAZO QUE JÁ NÃO SE ENCONTRAVA EM CURSO À DATA EM QUE O AUTOR, POR VIA DO MANDATÁRIO SUBSTITUTO, REQUEREU A PRORROGAÇÃO DO PRAZO PARA INTERPOR RECURSO;
INDEFERIMENTO DO REQUERIDO;
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
Nos presentes autos em que é Autor «AA» e Réu o Fundo de Garantia Salarial, ambos neles melhor identificados foi proferido o seguinte Despacho:
Requerimento a fls. 121278:
Para a apreciação do requerimento em epígrafe e da matéria com ele conexa, considerem-se as seguintes ocorrências:
1) Em 13-09-2022, deu-se a expedição electrónica da notificação ao Autor da sentença proferida nos autos [cf. fls. ...90 do SITAF].
2) Em 25-10-2022, a CAJJ - Delegação de ... da Ordem dos Advogados enviou para este Tribunal um e-mail com o ofício 1048/20..., do qual consta essencialmente o seguinte: “Com referência ao processo supra identificado na sequência do pedido de substituição, apresentado pelo beneficiário, informa-se V. Exa. que por despacho exarado, de 20 de Outubro de 2022, do Exmo. Sr. Dr. «BB», Vogal do Conselho Regional ... da Ordem dos Advogados, o mesmo foi diferido com nova nomeação” [cf. fls. ...35 do SITAF].
3) Em 25-10-2022, a Ordem dos Advogados enviou para este Tribunal um e-mail com o ofício ...02, do qual consta essencialmente o seguinte:
..., 25 de Outubro de 2022
Assunto: Apoio Judiciário
- N/Ref-: N.P. nº ...22
- V/Ref-: Proc. nº 289/20.9BEMDL -
- Refª S.S.: Centro Distrital ... - Proc. nº ...16 –
- Requerente: «AA»

Exmo(a) Senhor(a),
Na sequência do deferimento do pedido de Apoio Judiciário referente ao Processo da Segurança Social supra-referido, comunicamos a V. Exª que foi nomeado(a) para o patrocínio o(a) Senhor(a) Advogado(a):
Dr(a) «CC»
C.P. nº ...
..., ... - Sl 1
... ...
Contacto:
em substituição do(a) Senhor(a) Advogado(a):
Dr(a) «DD»
Informa-se que, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 5 do artigo 24º e artigos 30º e 31º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, o(a) patrono nomeado(a) foi notificado(a), na presente data, da nomeação efectuada” [cf. fls. ...72].
O beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido. Se a substituição de patrono tiver sido requerida na pendência de um processo, a Ordem dos Advogados deve comunicar ao tribunal a nomeação do novo patrono (cf. artigo 32º, nºs 1 e 3, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho – doravante designada por “LADT”).
Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo (cf. artigo 24º, nº 4, da LADT). Tal prazo, quando efectivamente interrompido, inicia-se, conforme os casos: a) a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação; b) a partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono [cf. artigo 24º, nº 5, da LADT – sem prejuízo do Acórdão do Tribunal Constitucional, nº 515/2020, de 13 de Outubro, que declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma da alínea a) do nº 5 do artigo 24º da LADT, com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do nº 4 do mesmo artigo se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário desconheça essa nomeação, por dela ainda não ter sido notificado].
O artigo 24º, nº 4, da LADT, faz depender a interrupção do prazo da verificação de um conjunto de pressupostos: o pedido de apoio judiciário formulado tem de incluir o pedido de nomeação de patrono; a junção aos autos pelo requerente do documento comprovativo da apresentação desse pedido; e a comprovação enquanto o prazo estiver a correr. Não obstante, a falta de junção do comprovativo do pedido formulado, por parte do requerente, pode considerar-se suprida quando, no prazo para a prática do acto, já consta do processo a informação – prestada pela Segurança Social ou pela Ordem dos Advogados – de que esse pedido foi formulado e deferido, na modalidade de nomeação de patrono e com base nesta informação pode interromper-se o prazo em curso. Está garantida a normal tramitação processual, com respeito pelos prazos, em obediência à segurança jurídica e permite-se a tutela da defesa do requerente, com a interrupção do prazo (cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 07-06-2021, proc. nº 1546/20.0T8MAI-B.P1).
Saliente-se, ainda, que a necessidade de juntar ao processo o comprovativo, como exigência de interrupção do prazo, não corresponde à imposição de nenhum ónus desproporcionado, lesivo do seu direito constitucional de acesso ao direito e à justiça: trata-se de fazer chegar ao tribunal o comprovativo que fica em poder do requerente, dentro do prazo de que o interessado foi previamente informado (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14-09-2022, proc. nº 300/21.6SBGRD-A.C1, bem como a jurisprudência, nomeadamente constitucional, aí citada).
No caso concreto, em 13-09-2022, deu-se a expedição electrónica da notificação ao Autor da sentença proferida nos autos [cf. item 1) supra], o que significa que o trânsito em julgado relevante para aferir da situação em crise ocorreu em 17-10-2022 (cf. artigo 140º, nº 1, do CPTA, conjugado com os artigos 138º, nºs 1 a 3, 139º, nºs 1 a 4, 248º, 616º e 628º do CPC).
Ora, na ausência de qualquer comunicação anterior por banda do Autor, restam, com potencial virtude interruptiva, as comunicações constantes dos e-mails enviados a este Tribunal em 25-10-2022 [cf. itens 2) e 3) supra]. Potencial, todavia, não confirmado, na medida em que a junção dessas comunicações ocorreu já depois de transcorrido o prazo de recurso.
Em suma, não se verificam os pressupostos consagrados no artigo 24º, nº 4, da LADT, pois que não vem evidenciada a junção aos autos (pelo Autor ou pelo ISS ou OA) do documento comprovativo da apresentação do pedido de substituição do patrono nomeado em momento em que o prazo de recurso estivesse ainda em curso.
Assim sendo, como não pode ser prorrogado um prazo que já não se encontrava em curso à data em que o Autor, por via do Ilustre Mandatário substituto, requereu a prorrogação do prazo para interpor recurso, indefere-se o requerido.




Deste vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
1ª O presente recurso jurisdicional interposto da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, vertida no Douto Despacho proferido, Referência: ...46.
2ª Como resulta dos autos, ao autor, aqui recorrente foi-lhe concedido, é beneficiário de Apoio Judiciário.
3ª Como também resulta dos autos, resultado da controvérsia jurídica entre o autor e réu, em 13-09-2022, foi proferida Sentença, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela.
4ª O autor, aqui recorrente em 25 de Setembro de 2022 23:35, solicitou ao Senhor Presidente do Conselho Distrital do ... da Ordem dos Advogados, por email (...@...), a substituição do patrono, no processo 289/20.9BEMDL. Cfr. Doc. n° ... que se anexa
5ª A Ordem dos Advogados, Conselho Regional ..., Centro de Apoio Jurídico e Judiciário em 25 de Outubro de 2022, notificou o autor da substituição do patrono.
6ª O autor, contactou o patrono nomeado em substituição.
7ª O novo patrono, como desconhecia o objeto do processo, em 04-11-2022, Referência: ...78, via SITAF, apresentou requerimento, a solicitar o acesso ao Processo no SITAF, requereu também a concessão de prazo de pelo menos 30 dias, par análise, estudo do processo, para apresentar eventual recurso, enviando em anexo o comprovativo da nomeação pela Ordem dos Advogados.
8ª Em 15-11-2022, Referência: ...46, o meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela Proferiu Despacho, agora aqui em crise.
9ª No Despacho proferido o Meritíssimo Juiz, indeferiu o requerido pelo autor, considerando em suma que não pode ser prorrogado um prazo que já não estava em curso, aquando da nomeação do novo patrono em 25 de Outubro de 2022.
10ª O Apoio Judiciário tem como principal finalidade, assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, designadamente por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos, nos termos do disposto no art. 1° da LADT.
11ª Nos termos do disposto no art. 2° da LADT, o acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado.
12ª O requerimento, enviado pelo autor, à Ordem dos Advogados por email (...@...), em 25 de Setembro de 2022 23:35, a solicitar a substituição do patrono, foi apresentado tempestivamente, dentro do prazo, nos termos do disposto no art. 32° da LADT.
13ª O autor, aqui recorrente desconhece qual o motivo pela qual a Ordem dos Advogados, só em 25 de Outubro de 2022, notifica o autor da nova nomeação de patrono para substituir o anterior.
14ª Com o devido respeito e salvo melhor opinião, o autor não pode ser prejudicado, por motivo alheio à sua vontade.
15ª O Direito de acesso aos Tribunais e ao Recurso, é um Direito Constitucionalmente consagrado.
16ª Acresce que, somos também de opinião que se verifica também justo impedimento nos termos do disposto no artigo 140° do CPC, o que para os devidos e legais efeitos se requer;
17ª O justo impedimento é resultado da nomeação tardia da Ordem dos Advogados, em completo prejuízo do Beneficiário de Apoio judiciário, ou seja, o beneficiário não pode ser impedido de praticar atos, que a lei lhe confere por circunstâncias alheias à sua vontade.
18ª Está também em causa interesses públicos, designadamente da segurança e da certeza jurídica.
19ª Nesse sentido, deve ser concedido a prorrogação de prazo, de pelo menos 30 dias, para análise, estudo do processo, e para apresentar eventual recurso.

Nestes termos e nos demais de direito, que serão supridos, ao presente recurso deve ser concedido integral provimento, com a consequente revogação do Despacho recorrido, e

Assim se fazendo a já costumada Justiça

Não foram juntas contra-alegações.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo o tribunal superior conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º 2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por conhecer a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
As questões decidendas consistem:
a) em apurar se o pedido de substituição do patrono nomeado interrompe o prazo para apresentação de recurso,
b) se se verifica o justo impedimento.
Vejamos:
Como o prevê o artº 32º nº 2 da LADT o beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido.
Deferido o pedido de substituição do patrono, resulta do disposto no nº 2 deste preceito, que se aplicam “com as devidas adaptações”, os termos dos artigos 34.º e seguintes da LADT.
Pretende o Recorrente que o pedido de substituição do patrono que lhe tinha sido nomeado interrompa o prazo para interposição de recurso, prazo esse que se reinicia com a notificação da decisão que deferiu este pedido, in casu em 25-10-2022, por remissão do aludido preceito para o artº 34º nº 2 da LADT, o qual dispõe que o “pedido de escusa, formulado nos termos do número anterior e apresentado na pendência do processo, interrompe o prazo que estiver em curso, com a junção dos respectivos autos de documento comprovativo do referido pedido, aplicando-se o disposto no n.º 5 do artigo 24.º.”
Como bem observa a Senhora PGA não é, no entanto, esta a interpretação que deve ser dada ao artº 32º nº 2 do citado Diploma. O aludido normativo manda atender ao disposto nos artigos 34º e segs. com as devidas adaptações, deferido que for o pedido de substituição de patrono. Porém, a apresentação deste pedido não interrompe novamente o prazo em curso.
Com efeito, o prazo em curso reinicia-se com a notificação ao patrono da sua nomeação, desde que o requerente do apoio conheça a nomeação por dela ter sido notificado (Ac. do TC. nº 515/2020 de 13/10), cabendo ao patrono nomeado e enquanto não for substituído praticar o acto em causa, uma vez que até à sua substituição mantém todos os deveres inerentes à nomeação, podendo ser responsabilizado, a nível disciplinar e em sede de responsabilidade civil, pelo seu não cumprimento e pelos eventuais danos que resultem dessa omissão.
Assim, conforme refere o Ac. da Relação de Coimbra, datado de 03/11/2020, proferido no proc. nº 1097/19.5T8PBL-A.C1 (no mesmo sentido vide o Ac. do TRP de 08/09/2020, proferido no proc. nº 9254/19.8T8PRT-B.P1) “só com a nomeação de novo patrono cessa o patrocínio oficioso antes conferido a anterior, inexistindo qualquer interrupção de prazo processual em curso pela apresentação do requerimento de substituição (ao contrário do que se prevê no art. 24.º, n.º 4 e n.º 5 da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, para a nomeação inicial de patrono, e no art. 34.º, n.º 2 do mesmo diploma, para a escusa, face à diferente ponderação de interesses ínsitos nestas e naquela outra hipótese).”
Com efeito, o patrocínio judiciário, ao contrário do contrato de mandato judicial, não se baseia na relação de confiança mas antes, conforme refere o Ac. do TRG de 24/10/2019, no proc. 14/03.9TBCRZ-A.G1, “em direitos e deveres institucionalmente reconhecidos e impostos (a categorias pré-definidas, de requerente de apoio judiciário e de profissional forense).” Pelo que com a “nomeação de patrono oficioso, em processo judicial pendente, a parte requerente fica desde logo assistida; e a apresentação posterior de pedido seu de substituição do dito patrono não tem virtualidade para, ipso facto, fazer cessar - ou meramente suspender - o patrocínio oficioso que lhe fora deferido (cabendo inclusivamente a decisão dessa sua pretensão a entidade terceira).”.
Por outro lado, não se vê que esteja restringido o direito dos requerentes de apoio judiciário, pois que satisfeito pela efectiva nomeação de patrono. Conforme se refere no citado Ac. da Relação de Coimbra de 03/11/2020 “Está arredada a possibilidade de qualquer interpretação extensiva por forma a aplicar a interrupção de prazo processual em curso, pela apresentação do requerimento de substituição, à hipótese de substituição do patrono oficioso;”, por serem diferentes as situações e os interesses a salvaguardar e está “igualmente arredada a possibilidade de integração de eventual lacuna da lei (por falta de qualquer referência a essa concreta interrupção) com base em norma a criar, análoga à dos arts. 24.º, n.º 4 e n.º 5 e 34.º, n.º 2. da Lei nº 34/2004 de 29 de julho”, pois que nenhuma lacuna existe, estando a opção do legislador contida dentro dos poderes conformadores que lhe são constitucionalmente reconhecidos.
E o que dizer do justo impedimento?
O art. 146º, nº 1 do CPC, na redacção vigente, passou a considerar justo impedimento “o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”.
Este novo conceito - introduzido pela Reforma de 1995 visou, segundo Lebre de Freitas, uma “flexibilização de modo a permitir abarcar situações em que a omissão ou o retardamento da parte se haja devido a motivos justificados ou desculpáveis que não envolvam culpa ou negligência séria”. Daí que, “à sua luz, basta para que estejamos perante o justo impedimento, que o facto obstacularizador da prática do acto não seja imputável à parte ou ao mandatário, por ter tido culpa na sua produção. Tal não obsta à possibilidade de a parte ou o mandatário ter tido participação na ocorrência, desde que, nos termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade”.
“Passa assim o núcleo do conceito de justo impedimento da normal imprevisibilidade do acontecimento para a sua não imputabilidade à parte ou ao mandatário... cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa”. (vide A. cit., Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, págs. 257 e 258).
Deixou, portanto, a lei de fazer qualquer exigência a respeito da normal imprevisibilidade do evento, estranho à vontade da parte, para se centrar apenas na não imputabilidade à parte nem aos seus representantes ou mandatários pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto.
No que concerne à culpa, tal como na responsabilidade contratual, a mesma não tem de ser provada, cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa, isto é, a ocorrência de caso fortuito ou de força maior impeditivo. A este propósito, Lopes do Rego refere que decisivo para a verificação do justo impedimento é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário no excedimento ou ultrapassagem do prazo peremptório, sem prejuízo do especial dever de diligência e de organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das suas causas. (Autor cit. em Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, pág. 125).
Mas, conforme sublinha Lebre de Freitas, “no n.º 2 mantém-se, salvo o estabelecido no novo n.º 3, o ónus de requerer a prática extemporânea do acto mediante alegação e prova do justo impedimento, fora ou dentro do prazo, mas logo que cesse a causa impeditiva, sendo certo que não se estabeleceu um prazo razoável para a dedução do justo impedimento, pelo que a expressão "logo que ele cessou" (empregue na parte final da norma) há de ser entendida em termos de razoabilidade". Ou seja, decorre do nº 2 do citado preceito legal a obrigação de requerer a prática extemporânea do acto, alegando e provando o justo impedimento, logo que termine a causa impeditiva - cfr. Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 260.
A lei optou por não estabelecer um prazo razoável para a dedução do justo impedimento, pelo que a expressão "logo que ele cessou" (empregue na parte final da norma) há de ser entendida em termos de razoabilidade.
Ora, não foi isso que sucedeu no caso dos autos, salientando-se que o alegado justo impedimento só foi invocado nas alegações de recurso, e não antes, designadamente aquando do requerimento de 04-11-2022.
Com efeito, como é sabido, os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12.

Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc. 01460/13.

Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado nos seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se.

A função do recurso, repete-se, é a reapreciação da decisão recorrida e não proceder a um novo julgamento da causa pelo que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que a ela não foram submetidos.
Como é jurisprudência uniforme, os recursos, nos termos do artigo 627º do CPC (ex vi artº 140º/3 do CPTA), são meios de impugnações judiciais e não meios de julgamento de questões novas. Ou seja, é função do recurso no nosso sistema jurídico, a reapreciação da decisão recorrida e não proceder a um novo julgamento da causa pelo que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que não hajam sido formulados.
Como decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/03/2009, proferido no âmbito do processo nº 09...:
“I-É regra geral do regime dos recursos que estes não podem ter como objecto a decisão de questões novas, que não tenham sido especificamente tratadas na decisão de que se recorre, mas apenas a reapreciação, em outro grau, de questões decididas pela instância inferior. A reapreciação constitui um julgamento parcelar sobre a validade dos fundamentos da decisão recorrida, como remédio contra erros de julgamento, e não um julgamento sobre matéria nova que não tenha sido objecto da decisão de que se recorre.
II-O objecto e o conteúdo material da decisão recorrida constituem, por isso, o círculo que define também, como limite maior, o objecto de recurso e, consequentemente, os limites e o âmbito da intervenção e do julgamento (os poderes de cognição) do tribunal de recurso.
III-No recurso não podem, pois, ser suscitadas questões novas que não tenham sido submetidas e constituído objecto específico da decisão do tribunal a quo; pela mesma razão, também o tribunal ad quem não pode assumir competência para se pronunciar ex novo sobre matéria que não tenha sido objecto da decisão recorrida.”
Dito de outro modo, os recursos são instrumentais ao reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores e não servem para proferir decisões sobre matéria nova, isto é, que não tenha sido submetida à apreciação do tribunal de que se recorre.

O objectivo do recurso jurisdicional é a modificação da decisão impugnada, pelo que, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente suscitada, não pode o Recorrente vir agora invocá-la perante este tribunal ad quem, porque o objecto do recurso são, reitera-se, os vícios da decisão recorrida.

Como ensina Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2018, Almedina, pág. 119: “… os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Seguindo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos seguido um modelo de reponderação que visa o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame que permita a repetição da instância no tribunal de recurso. Compreendem-se perfeitamente as razões que levaram a que o sistema tenha sido assim desenhado. A diversidade de graus de jurisdição determina que, em regra, os Tribunais Superiores apenas devem ser confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios.”.
Ora, para além deste aspecto formal, a verdade é que não existe, no caso concreto, um justo impedimento para a prática extemporânea do acto, desde logo por todas as considerações formuladas em a).
Em suma e como sentenciado, não se verificam os pressupostos consagrados no artigo 24º, nº 4, da LADT, pois que não vem evidenciada a junção aos autos (pelo Autor ou pelo ISS ou OA) do documento comprovativo da apresentação do pedido de substituição do patrono nomeado em momento em que o prazo de recurso estivesse ainda em curso.
Assim sendo, como não pode ser prorrogado um prazo que já não se encontrava em curso à data em que o Autor, por via do Ilustre Mandatário substituto, requereu a prorrogação do prazo para interpor recurso, indefere-se o requerido.
Improcedem as Conclusões das alegações.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo de eventual benefício de apoio judiciário.
Notifique e DN.

Porto, 15/3/2024

Fernanda Brandão
Isabel Jovita
Rogério Martins