Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00403/07.0BECBR |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 01/12/2023 |
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Tribunal: | TAF de Coimbra |
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Relator: | Paulo Moura |
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Descritores: | PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DA APRECIAÇÃO JUDICIAL DO PEDIDO DE REVISÃO DA MATÉRIA COLETÁVEL REALIZADO AO ABRIGO DO ART.º 78.º DA LGT |
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Sumário: | I – Intentada uma Ação Administrativa Especial, com objeto impugnatório condizente com esta forma de ação, não é possível a sua convolação em Impugnação Judicial. II – A Ação Administrativa Especial interposta na sequência da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão da matéria coletável (realizado ao abrigo do artigo 78.º da LGT), não pode ser conhecida, por estar pendente uma Impugnação Judicial deduzida contas as mesmas liquidações visadas pelo pedido de revisão do ato tributário, III - Em relação ao procedimento respeitante ao pedido de revisão do ato tributário, vale o mesmo princípio da prevalência da apreciação judicial previsto para a impugnação graciosa ou o subsequente recurso hierárquico, conforme o disposto nos artigos 76.º, n.º 2 e 111.º, n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário. IV – Mesmo que assim não fosse, a Ação Administrativa Especial também não podia ser convolada, por estar pendente uma Impugnação Judicial deduzida contra as liquidações visadas no pedido de revisão do ato tributário, sob pena de litispendência |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: «A, Lda.», interpõe recurso do Despacho Saneador Sentença proferido na Ação Administrativa Especial intentada contra o Diretor-Geral dos Impostos, Despacho Saneador esse que julgou procedente a exceção dilatória de erro na forma de processo, em relação aos pedidos impugnatórios deduzidos contra as liquidações; e julgou verificada a exceção perentória de caducidade do direito de ação, em relação ao único pedido com fundamento de Ação Administrativa Especial. Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: a) Entendeu-se na sentença recorrida que o meio próprio a usar pela recorrente seria a impugnação judicial para depois concluir que teria ocorrido caducidade do direito de acção e para chegar a tal entendimento, em resenha útil, diz-se na mesma que: I) O meio que devia ser usado para questionar a legalidade dos actos de liquidação de IRC seria a impugnação judicial e não a acção administrativa especial; II) Pelo que só o ponto 8 do despacho saneador seria passível de ser apreciado por via da acção administrativa especial; III) Mas mesmo este não poderia ser apreciado por intempestividade da acção, dado que a Recorrente, havia apresentado um novo pedido de revisão da matéria tributável, em 08/09/2007, direccionado ao Director-Geral dos Impostos e o mesmo o que verdadeiramente seria era um recurso hierárquico face ao indeferimento do seu pedido de revisão da matéria tributável, em 08/08/2002. b) A acção foi intentada mais do que tempestivamente, c) A Recorrente, em 2007, não apresentou qualquer recurso hierárquico direccionado ao Director- Geral dos Impostos e relativo ao indeferimento do seu pedido de revisão da matéria tributável pois que aquela fez foi apresentar um pedido de revisão do acto tributário nos termos do artigo 78º da Lei Geral Tributária. d) O que se encontra bem identificado no cabeçalho desse seu articulado apresentado junto da hoje designada AT assim como são nele referidas as razões de facto e de Direito para a sua formulação e também para a sua admissibilidade. e) A AT não veio a decidir tal pedido de revisão do acto tributário no prazo de 6 meses pelo que se deu o respectivo indeferimento tácito – artigo 57º, nº 1 da LGT, pelo que a partir da formação do indeferimento tácito a Recorrente dispunha de 90 dias para impugnar judicialmente, caso se entendesse que este seria o meio adequado, ou de 3 meses para deduzir acção administrativa especial, caso se entendesse que seria este o meio processual correcto. f) Tendo dúvidas sobre o meio processual correcto a Recorrente deduziu a presente acção administrativa especial e fê-lo para aí, e no máximo, 45 dias após se ter formado o indeferimento tácito para que, assim e entendendo-se que o meio adequado seria a impugnação judicial, a acção jamais poder soçobrar com base em intempestividade. g) Uma vez que é pacifico que o que poderia impedir a convolação seria o facto de os argumentos vertidos na peça não se adequarem àquele meio processual, o que não era o caso, ou então quando a acção a convolar foi apresentada já se ter esgotado o prazo para deduzir impugnação judicial. h) Entende, em consequência, a Recorrente que a decisão recorrida, ao interpretar um pedido de revisão do acto tributário formulado nos termos do artigo 78º da LGT como sendo um recurso hierárquico em relação a um novo pedido de revisão da matéria tributável, incorreu em erróneas interpretação da matéria de facto, assim como violou o artigo 78º da LGT e 102º do CPPT, devendo ser revogada e substituída por uma outra que ordene a prossecução dos autos para apreciação de meritis ainda que sob a convolada forma de impugnação judicial. Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida mais se ordenando a baixa dos autos para que, sob a forma de impugnação judicial, os mesmos sigam para apreciação de mérito se a tal nada mais obstar, tudo o mais com as consequências legais. O Diretor-Geral da Administração Tributária e Aduaneira (ex-Diretor-Geral dos Impostos), apresentou contra-alegações, nas quais concluiu da seguinte forma: A - Em resultado duma acção inspectiva incidente sobre os anos de 1999 e de 2000, a matéria colectável do IRC e a subsequente liquidação de IVA foram corrigidos, tendo as respectivas correcções sido devidamente notificadas à aqui A. B - A aqui Recorrente Jurisdicional reagiu solicitando o consequente pedido de revisão da matéria colectável, mas acerca das liquidações, quando deveriam incidir sobre os valores apurados em sede de determinação da matéria tributável. Não obstante, esse pedido foi indeferido por extemporaneidade. C - Assim, a aqui Recorrente Jurisdicional confundiu operações tendentes à determinação da matéria colectável das quais foi devidamente notificada mas não reagiu (ou, melhor, reagiu das formas deficientes acima explanadas), com as notas de liquidação subsequentes. D - Para além disso, aquando da decisão incidente sobre a reclamação graciosa, a aqui Recorrente Jurisdicional foi notificada para, querendo, pronunciar-se acerca do apuramento aí efectuado, mas nada disse ou fez. Subsequentemente, foi notificada de novo para, querendo, recorrer hierarquicamente ou deduzir impugnação judicial e todavia, não reagiu. E - Por conseguinte, só era possível chegar a duas conclusões: o meio processual utilizado pela A. não era idóneo para atacar os pretensos vícios assacados por ela e, mesmo que assim se não entendesse, caía por terra e de forma notória, a fundamentação por aquela explanada. I - Por esta forma, está correcta a Sentença quando afirma que a aqui Recorrente Jurisdicional sempre quis atacar a legalidade das liquidações oficiosas de IRC e respectivos juros compensatórios, pretendendo na realidade, obter a anulação dos tributos liquidados, caso em que o meio processual próprio para o efeito é a impugnação judicial. G - Sendo impróprio o meio processual utilizado, o que acarreta como consequência erro na forma do processo, este poderia ser convolado na forma do processo adequada (impugnação judicial), salvo se fosse manifesta a sua improcedência ou intempestividade. Mas, conforme a douta Sentença recorrida demonstrou, convolação é impossível de operar-se. H - Assim sendo, falecem as pretensões da aqui Recorrente Jurisdicional, pelo que os fundamentos da douta Sentença recorrida deverão permanecer incólumes. Em face do exposto, deverá: - Manter-se integralmente a Sentença recorrida, com todas as legais consequências. O Ministério Público não emitiu parecer por se tratar de uma Ação Administrativa Especial. As partes foram ouvidas sobre a eventual impossibilidade de convolação da Ação Administrativa Especial em Impugnação Judicial, em virtude de a Autora já ter interposto em tribunal uma Impugnação Judicial, que se encontra pendente, contra as liquidações em causa neste processo. As partes nada disseram. Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais). ** Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir. As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber qual o objeto da ação administrativa especial e se sobre esse objeto é tempestiva; assim como se a presente ação pode ser convolada em impugnação judicial. ** Matéria de Facto Considerando tratar-se do recurso de um Despacho Saneador Sentença em que não foi dada como assente matéria de facto, para melhor perceção do recurso, efetua-se uma súmula das circunstâncias de facto relevantes, que são as seguintes: A) No dia 04/06/2002, a Autora apresentou um pedido de Revisão da Matéria Coletável, ao abrigo do artigo 91.º da Lei Geral Tributária, relativamente à fixação dos valores tributáveis em sede de IRC, no valor de € 919.734,46, para o ano de 1999 e no valor de € 129.444,79, para o ano de 2000; e para o IVA dos anos de 1999 e 2000, nas quantias de € 27.540,47 e € 13.770,23, respetivamente. (Vide fls. 165 e ss. do PA) B) No dia 04/06/2002, o legal representante da Autora, apresentou outro requerimento no qual pede que, o pedido de Revisão da Matéria Coletável, seja considerado entregue dentro do prazo, invocando que se encontrava impossibilitado de prestar qualquer serviço à firma, por motivo de doença. (Vide fls. 176 do PA) C) Mediante despacho do Diretor de Finanças, proferido em 08/08/2002, o pedido de Revisão da Matéria Coletável, foi indeferido por extemporâneo; decisão que foi notificada em 18/08/2002. (vide fls. 165 e ss., 183 e 184 do PA) D) No dia 05/09/2002, a Autora dirigiu um requerimento ao Ministro das Finanças, no qual refere que vem «recorrer do indeferimento do pedido para ser aceite a reclamação apresentada nos termos e para os efeitos do art.º 91.º da referida Lei Geral», alegando a impossibilidade da prática de atos de gestão da empresa pela outra sócia, pedindo a revogação do despacho e deferindo o pedido apresentado, com reconhecimento oficioso do justo impedimento. (Vide fls. 185 e ss. do PA) E) No dia 15/01/2003, a Autora foi notificada do despacho de indeferimento do pedido de reapreciação apresentado na Direção de Finanças em 05/09/2002, por se ter entendido que não eram trazidos elementos novos que permitissem alterar o sentido da decisão. (Vide fls. 188 a 192 do PA) F) No dia 8 de setembro de 2006, a Autora apresentou um pedido de Revisão do Ato Tributário, ao abrigo do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, com o objetivo de revisão das liquidações de IRC n.os ...29, ...37 e ...30, referentes aos anos de 1999 e 2000, no valor total de € 434.437,13, terminando com o seguinte pedido: «Em consequência de tudo o quanto vem alegado deverá a presente acção ser declarada procedente e, em consequência serem anuladas a liquidação de imposto e de juros compensatórios, tudo o mais com as consequências legais». (Vide pág. 103 do SITAF; idem a fls. 94 e ss. do proc. físico e fls. 195 e ss. do PA) G) Mediante despacho manuscrito proferido pelo Diretor de Finanças, em 18/01/2007, os referidos pedidos de Revisão do Ato Tributário, foram indeferidos; decisão de que não consta do processo administrativo tenha sido notificada à Autora (Vide fls. 106 e ss. do PA) H) No dia 17 de maio de 2007, a Autora interpôs contra o Diretor-Geral dos Impostos, a presente Ação Administrativa Especial, com os objetivos e pedido mencionados na Petição Inicial, que se transcrevem: (Vide pág. 1 do SITAF) A - OBJECTO DA PRESENTE ACÇÃO: 1. Constitui objecto da presente acção o indeferimento tácito que se verificou em relação ao pedido de revisão do acto tributário formulado pela aqui A. nos termos do artigo 78º da LGT e concernente às liquidações adicionais de IRC nºs ...29, ...37 e ...30, referentes aos anos de 1999 e 2000, no valor total de € 434.437,13. 2. Constitui também objecto da presente acção as liquidações adicionais de IRC nºs ...43 e ...45, referentes aos anos de 1999 e 2000, no valor total de €417.844,14. 3. Cumpre explicar, desde já, o porquê de todas aquelas liquidações serem objecto da presente acção; 4. As referidas em 1. são as originárias que foram notificadas à A. 5. No entanto devido ao reduzido provimento da reclamação graciosa apresentada pela A. veio a DGCI a proceder à notificação àquela das liquidações referidas em 2, mas isto já posteriormente à entrada do pedido de revisão do acto tributário no Serviço de Finanças. 6. Mas isto, também, sem que a A. fosse notificada de forma expressa da revogação dos anteriores actos administrativos praticados, ou seja, da revogação das liquidações referidas em 1. 7. Perante tal, e por mera cautela não pode a A. deixar de reagir contra todos aqueles actos tributários. 8. Acresce que o que segue resguarda a A. de qualquer vicissitude. 9. Constitui ainda objecto da presente acção a decisão da reclamação graciosa tirada no processo nº ...........03.0. 10. «O indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra acto tributário de liquidação pode constituir objecto de impugnação judicial. E, uma vez que consubstancia a manutenção de tal acto, integra também o objecto desta.» B - LEGITIMIDADE DA PRESENTE ACÇÃO NA SEQUÊNCIA DA LEGITIMIDADE DO PEDIDO DE REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO: 11. O uso do presente meio processual na sequência do pedido de revisão do acto tributário afigura-se legítimo, e nele se podendo discutir a integralidade dos vícios que a A. vai imputar aos actos tributários, uma vez que não faria sentido o legislador atribuir um prazo de 4 anos para a possível revisão dos actos tributários e depois dela excluísse as situações em que teria de haver reclamação prévia necessária. 12. Seria o "Dar com uma mão e tirar com a outra" o que o ordenamento jurídico no seu conjunto não pode permitir. 13. E em relação a uma situação paralela à presente já se decidiu na jurisprudência, assim; 14. «IV - O indeferimento, expresso ou tácito, do pedido de revisão, mesmo nos casos em não é formulado dentro do prazo da reclamação administrativa mas dentro dos limites temporais em que a Administração tributária pode rever o acto com fundamento em erro imputável aos serviços, pode ser impugnado contenciosamente pelo contribuinte [art. 95.º, n.ºs 1 e 2, alínea d), da L.G.T.]. V - A formulação de pedido de revisão oficiosa do acto tributário pode ter lugar relativamente a actos de retenção na fonte, independentemente de o contribuinte ter deduzido reclamação graciosa nos termos do art. 152º do CPT (ou 132º do CPPT).» C – MATÉRIA DE FACTO (…) D – MATÉRIA DE DIRIETO (…) E - PEDIDO: Em consequência de tudo o quanto vem alegado deverá a presente acção ser declarada procedente e, em consequência serem anuladas a liquidação de imposto e de juros compensatórios, tudo o mais com as consequências legais. I) O Réu contestou e juntou o processo administrativo, tendo o Autor sido notificado da contestação e da junção do processo administrativo, mediante ofício datado de 08/04/2008, apresentando Réplica, na qual se defendeu das exceções. (Vide fls. 70 e 71 a 83 do proc. físico; idem págs. 70, 72, 76 e 78 do SITAF) J) No dia 24 de janeiro de 2007, a Autora intentou uma Impugnação Judicial, que tomou o n.º 75/07...., com os objetivos e pedido mencionados na Petição Inicial, que se transcrevem: (vide pág. 378 do SITAF) A - OBJECTO DA PRESENTE IMPUGNAÇÃO: 1. Constitui objecto da presente impugnação as liquidações adicionais de IRC nºs ...43 e ...45, referentes aos anos de 1999 e 2000, no valor total de €417.844,14. 2. Constitui também objecto da presente impugnação as liquidações adicionais de IRC nºs ...29, ...37 e ...30, referentes aos anos de 1999 e 2000, no valor total de € 434.437,13. 3. Cumpre explicar, desde já, o porquê de todas aquelas liquidações serem objecto da presente impugnação; 4. As referidas em 2. são as originárias que foram notificadas à impugnante. 5. No entanto devido ao reduzido provimento da reclamação graciosa apresentada pela impugnante veio a DGCI a proceder à notificação àquela das liquidações referidas em 1. 6. Mas isto sem que a impugnante fosse notificada de forma expressa da revogação dos anteriores actos administrativos praticados, ou seja, da revogação das liquidações referidas em 2. 7. Perante tal, e por mera cautela não pode a impugnante deixar de impugnar no prazo de 15 dias após a decisão da reclamação graciosa que é o prazo constante do CPPT, refere a impugnante como objecto todas aquelas liquidações, 8. Sendo, no entanto, certo que o seu objecto primário serão as liquidações referidas em 1.. 9. Acresce que o que segue resguarda a impugnante de qualquer vicissitude. 10. Constitui ainda objecto da presente impugnação a decisão da reclamação graciosa tirada no processo nº ...........03.0. 11. «O indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra acto tributário de liquidação pode constituir objecto de impugnação judicial. E, uma vez que consubstancia a manutenção de tal acto, integra também o objecto desta.» B - MATÉRIA DE FACTO (…) C – MATÉRIA DE DIRIETO (…) D - PEDIDO: Em consequência de tudo o quanto vem alegado deverá a presente impugnação ser declarada procedente e, em consequência serem anuladas a liquidação de imposto e de juros compensatórios, bem como revogada a decisão da reclamação graciosa que assim não entendeu, tudo o mais com as consequências legais. K) A Impugnação referida na alínea anterior, teve sentença proferida no dia 17 de dezembro de 2012, que a julgou improcedente; tendo a Impugnante deduzido recurso que se encontra pendente. (vide págs. 431 e 478 do SITAF) ** Apreciação jurídica do recurso. No seguimento do que acima ficou descrito, as questões a apreciar neste recurso são apenas duas, a saber: 1.ª) se em função do objeto desta ação administrativa especial, a mesma é tempestiva; 2.ª) se a presente ação pode ser convolada em impugnação judicial. Segundo o referido no Despacho Saneador-Sentença e conforme é jurisprudência consolidada, a Ação Administrativa Especial não pode ser intentada contra os atos de liquidação, ou seja, com o objetivo de ver anuladas as liquidações. A Ação Administrativa Especial apenas pode ser deduzida contra atos em matéria tributária que não correspondam à liquidação de um tributo. Veja-se sobre o assunto o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13/01/2021 (entre outros), proferido no processo n.º 0129/18.9BEAVR (disponível em www.dgsi.pt), no qual se decidiu o seguinte: “Como este Tribunal tem decidido, o erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido, sem prejuízo de na sua interpretação, para indagação da real pretensão do autor, se poder usar a causa de pedir invocada – entre outros, acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06/11/2019, proferido no processo 01300/16.3BELRS 01397/16. A impugnação judicial é o meio processual adequado para discutir a legalidade do ato de liquidação – artigo 99.º do CPPT - independentemente de ter sido ou não precedida de meio gracioso e, no caso de assim ter acontecido, independentemente do teor da decisão que sobre ele recaiu, ou seja, de ser uma decisão formal ou de mérito – acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18/11/2020, proferido no processo 0608/13.4BEALM 0245/18. E visa a anulação total ou parcial do ato tributário (a liquidação). -Destaques nossos. Ao invés, a ação administrativa, meio contencioso comum à jurisdição administrativa e tributária, será o meio processual a usar quando a pretensão do interessado não implique a apreciação da legalidade do ato de liquidação (…)” No mesmo sentido decidiu o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02/02/2022, tirado no processo n.º 0848/14.9BEAVR, cujo sumário é o seguinte: O meio processual tributário de impugnação judicial é de acionar em todas as situações onde se visem atos relativos a questões tributárias que impliquem, contendam com a apreciação (de qualquer ilegalidade) do ato de liquidação, ainda que, no mesmo processo se tenham de versar e dirimir questões relacionadas, em exclusivo, com um procedimento de cariz administrativo, quando este tenha tido, previamente, lugar; por contraposição, o meio processual da ação administrativa só pode utilizado, quando as questões tributárias levantadas (no procedimento administrativo e no tribunal) não impliquem apreciar-se da legalidade do ato de liquidação. No que concerne ao objeto desta Ação Administrativa Especial, compete dizer que, conforme referido logo no ponto 1. da petição inicial, assim como nos seus pontos 11. a 14., esse objeto reporta-se a sindicar o indeferimento tácito que se verificou em relação ao pedido de revisão do ato tributário formulado nos termos do artigo 78.º da Lei Geral Tributária – vide alínea H) da matéria de facto supra. Vem agora a Autora em sede de recurso referir-se ao pedido de revisão da matéria coletável, formulado ao abrigo do artigo 91.º da LGT, com certeza, induzida pelo que ficou exarado no Despacho Saneador-Sentença, que decidiu ser extemporânea a Ação Administrativa Especial deduzida contra o ato de indeferimento do pedido de revisão da matéria tributável, praticado em 08/08/2002 – vide alínea C) da matéria de facto. Ora, a Autora efetivamente apresentou um recurso hierárquico, mas fê-lo em 05/09/2002 e não em 08/09/2006, uma vez que nesta última data a Autora requer o pedido de revisão do ato tributário, ao abrigo do artigo 78.º da LGT, e não a renovação do pedido de revisão da matéria coletável, previsto no artigo 91.º da LGT – vide alíneas D) e F), da matéria de facto supra. Portanto, se analisarmos a Petição Inicial como pretendendo sindicar o ato de indeferimento do pedido de revisão da matéria coletável, a decisão recorrida mostra-se acertada. Isto porque, tendo havido um indeferimento expresso do pedido de revisão da matéria coletável, notificado em 18/08/2002 [vide alínea C) da matéria de facto], ao caso seria aplicável o regime anterior ao atual Código de Processo nos Tribunais Administrativos (que só entrou em vigor em 01/01/2004), ou seja, era aplicável a LPTA – Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de julho), que nos termos do seu artigo 28.º, n.º 1, alínea a), determinava que o prazo de impugnação de atos administrativos era de dois meses. Portanto, dois meses contados desde 18/08/2002 (ou seja, desde a data da notificação do indeferimento – vide n.º 1 do artigo 29.º da LPTA), perfizeram-se em 18/10/2002. Assim, em 17 de maio de 2007 (data da apresentação da petição inicial desta ação), verifica-se que a ação se mostra extemporânea, para sindicar o ato expresso de indeferimento do pedido de revisão da matéria tributável. O mesmo raciocínio valeria para o caso de ser aplicável o atual Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), uma vez que o hiato de tempo entre o indeferimento e a propositura da ação é de superior a quatro anos e o prazo de propositura da Ação Administrativa Especial é de três meses, nos termos do artigo 58.º, n.º 2, alínea b) do CPTA. Isto mesmo que se leve em consideração a suspensão do prazo, em virtude da interposição de recurso hierárquico, conforme previsto no n.º 4 do art.º 59.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativo. No entanto, conforme já acima referido, na Petição Inicial, o Autor indicou como objeto da Ação Administrativa Especial, o indeferimento tácito do pedido de revisão do ato tributário, formulado ao abrigo do artigo 78.º da LGT. Ora, no seguimento do que acima ficou dado por assente, verifica-se que, não obstante ter havido um ato expresso de indeferimento do pedido de revisão do ato tributário, o mesmo nunca foi notificado ao Autor – vide alínea G) da matéria de facto. O Autor havia efetuado esse pedido no dia 08/09/2006 – vide alínea F) da matéria de facto. A presente ação foi intentada no dia 17/05/2007 – vide alínea H) da matéria de facto. No que concerne ao pedido de revisão do ato tributário estamos diante de uma inércia da Administração Tributária, pelo que nestes casos a ação caduca no prazo de um ano, contado do termo legal estabelecido para a emissão do ato pretendido e que foi omitido, conforme o disposto no n.º 1 do arrigo 69.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Vide sobre o assunto, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 05/05/2011, proferido no processo n.º 06669/10 (disponível em www.dgsi.pt), cujo sumário é o seguinte: I- Em situações de inércia da Administração, o direito de acção caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do acto ilegalmente omitido (artº. 69º nº1 do CPTA). Nos termos do n.º 1 do artigo 57.º da Lei Geral Tributária, o procedimento tributário deve estar concluído no prazo de seis meses (na redação aplicável à data dos factos, portanto anterior à alteração efetuada pelo artigo 149.º da Lei n.º 64.º-B, de 30 de dezembro, que encurtou aquele prazo de seis meses, para quatro meses), pelo que o procedimento devia ter sido concluído até ao dia 8 de março de 2007, data a partir da qual se abre a via judicial para as situações de inércia da Administração. O prazo para intentar Ação Administrativa Especial era de três meses, nos termos do artigo 58.º, n.º 2, alínea b) do CPTA - Código de Processo nos Tribunais Administrativos (na redação anterior à alteração realizada pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro), sendo que tal prazo se suspendia no decurso das férias judiciais, conforme previsto na redação do então n.º 3 deste preceito. Por sua vez, o prazo para deduzir Impugnação Judicial era de 90 dias, contados do pressuposto da formação do indeferimento tácito do pedido de revisão do ato tributário – vide alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT - Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Tendo a presente ação sido interposta em 17 de maio de 2007, será tempestiva, quer sob a forma de Ação Administrativa Especial, quer sob a forma de Impugnação Judicial, pois não foram ultrapassados os respetivos prazos de interposição de cada um daqueles processos. Foi referido no Despacho Saneador-Sentença que o Autor só apresenta um fundamento passível de ser apreciando enquanto Ação Administrativa Especial e que para a Impugnação Judicial, o processo é intempestivo. O Recorrente afirma que a forma processual de Impugnação Judicial é tempestiva e que por isso a ação deve ser convolada. Analisemos, em primeiro lugar, a eventual possibilidade desta convolação. No seguimento do que ficou exarado na alínea H) da matéria de facto e conforme mencionado na Petição Inicial, nos pontos 1, 11, 12, 13 e 14, a Autora invoca como objeto desta Ação Administrativa Especial, o pedido de revisão do ato tributário que efetuou junto da Administração Fiscal. Assim, a Autora optou pela forma processual de Ação Administrativa Especial, pelo que deve ser sob esta forma que a causa deve ser analisada. Ainda que a causa de pedir e pedido sejam rudimentares, em relação à forma adotada pela impetrante, tem entendido a jurisprudência que se deve adotar critérios de flexibilidade na interpretação dos articulados, de modo a se percecionar a intenção desejada, ainda que com recurso à figura do pedido implícito, de modo a se poder alcançar a tutela judicial efetiva (vide, entre muitos, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: de 5 de Fevereiro de 2014, proferido no processo n.º 1803/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Setembro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32220.pdf), págs. 490 a 495, de 28 de maio de 2014, proferido no processo n.º 1086/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 20 de novembro de 2014, págs. 2061 a 2067, de 4 de março de 2015, proferido no processo n.º 1271/13, disponíveis em www.dgsi.pt.). Conforme referido no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 3 de novembro de 2022, proferido no processo n.º 1477/08.1BEBRG: «(…) de acordo com o entendimento que tem vindo a ser adotado pelo Supremo Tribunal Administrativo, na interpretação do pedido não deve o juiz ficar-se pela redação que lhe foi dada; há que ir um pouco mais longe, não olvidando que nesta tarefa hermenêutica não podem ignorar-se as concretas causas de pedir invocadas, na medida em que permitam descortinar a verdadeira pretensão de tutela jurídica, ainda que com recurso à figura do pedido implícito (dando conta desta posição e subscrevendo-a, JORGE LOPES DE SOUSA, CPPT anotado e comentado, II volume, últimos três parágrafos da anotação 10 d) ao art. 98.º, pág. 92.). Na verdade, a nossa lei processual procura desde sempre evitar, sempre que possível, que a parte perca o pleito por motivos puramente formais – que a forma prevaleça sobre o fundo (cfr. MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 387, a propósito da flexibilidade que deve temperar o princípio da legalidade das formas processuais.) – e essa preocupação com o princípio da tutela jurisdicional efetiva dos direitos e interesses das partes tem vindo, cada vez mais, a encontrar expressão na lei adjetiva, que procura afastar o rigor formalista na interpretação das peças processuais (cfr. art. 7.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que dispõe: “[p]ara efetivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas”).» (Fim de citação do Acórdão do TCAN). Neste entendimento e, uma vez que a Autora expressamente refere na Petição Inicial que a ação tem por objeto o indeferimento tácito que se verificou em relação ao pedido de revisão do ato tributário – vide alínea H) da matéria de facto -, não é possível convolar esta Ação Administrativa Especial em Impugnação Judicial. Isto, para além de não ter havido desistência da ação na parte relativa ao objeto referente ao pedido de revisão do ato tributário. Portanto, não havendo erro na forma do processo, não é possível proceder à sua convolação. Resulta, ainda, que estando a ação tempestiva sob a forma de Ação Administrativa Especial, não pode ser convolada em Impugnação Judicial. Em face do exposto, competiria, então, apreciar os fundamentos da Ação Administrativa Especial, sendo que, no seguimento do que acima ficou exposto, tem de se entender que a Autora pretende sindicar o ato de indeferimento do pedido de revisão do ato tributário. Consequentemente, a sua pretensão (visto tratar-se de uma Ação Administrativa Especial) visa que a Administração Tributária aprecie os fundamentos do seu pedido de revisão, ou seja, que aprecie a legalidade das liquidações de IRC dos anos de 1999 e 2000. Sucede que a Administração Tributária já não vai poder apreciar a legalidade das liquidações em apreço, na medida em que, conforme acima dado por assente na alínea J) e F) da matéria de facto, a Autora tem pendente uma Impugnação Judicial (processo n.º 75/07....) intentada contras as mesmas exatas liquidações de IRC dos anos de 1999 e 2000. Significa isto que a apreciação do pedido de revisão do ato tributário que viesse a ser efetuado pela Administração Tributária, colidiria com a apreciação que está a ser realizada no processo de Impugnação Judicial acima identificado. Nem pode, pois, o Tribunal determinar que a Administração Tributária conheça o mérito das liquidações, quando tal já não é possível, por haver uma Impugnação Judicial pendente sobre o mesmo assunto. Portanto, na presente Ação Administrativa Especial não se pode condenar a Administração Tributária a conhecer o mérito do pedido de revisão do ato tributário, uma vez que prevalece sempre a análise a efetuar na Impugnação Judicial pelo Tribunal. Assim, o legislador entendeu dar prevalência à Impugnação Judicial, em detrimento da impugnação graciosa, ou do subsequente recurso hierárquico, conforme se pode ver, por exemplo, do disposto nos artigos 76.º, n.º 2 e 111.º, n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Não obstante se estar diante de um procedimento relativo a um pedido de revisão do ato tributário, vale o mesmo princípio da prevalência da apreciação judicial, quando está em causa a mesma matéria tributária. Com este entendimento veja-se o Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Vol. II, 6.ª ed., 2001, Áreas Editora, págs. 241 e 242, refere: «5 – Apensação de reclamações graciosas e recursos hierárquicos. Nos n.ºs 3 a 5 deste artigo prevê-se a apensação ao processo de impugnação judicial das reclamações graciosas ou recursos hierárquicos relativos ao acto tributário impugnado, independentemente de terem sido apresentados antes ou depois da recepção da petição de impugnação e de terem ou não fundamento idêntico ao desta impugnação. Como resulta dos n.ºs 3 e 5 deste artigo, o processo de reclamação graciosa ou de recurso hierárquico é apenso no estado em que se encontrar, por isso, mesmo que já esteja findo. Assim, será o tribunal e não a administração tributária que fará a apreciação das questões suscitadas na reclamação graciosa ou no recurso hierárquico, no âmbito do processo de impugnação judicial. Há, pois, uma preferência absoluta do meio judicial de impugnação sobre os meios administrativos, impedindo-se que seja apreciada por via administrativa a legalidade de um acto tributário que seja objecto de impugnação judicial, excepto da forma e no prazo previstos neste mesmo processo, que é a possibilidade de revogação nos termos e prazo indicados no art. 111.º, n.º 1 e 112.º deste Código. Esta constatação permite concluir, por evidente analogia, que a apensação deverá também ocorrer quando estiver pendente um pedido de revisão do acto tributário, apresentado nos termos do art. 78.º da LGT, nos casos em que ele não se fundamente em factos supervenientes em relação ao acto impugnado. Na verdade, os pedidos de revisão, para além de poderem ter fundamento factos que não foram considerados na liquidação (situação em que a liquidação não enfermará de qualquer vício, pois foi elaborada com base nos factos que deveriam ser considerados), podem ter também por fundamento qualquer ilegalidade da liquidação, como se prevê expressamente no n.º 1 daquele art. 78.º da LGT. Nestes casos em que no pedido de revisão forem imputados vícios à liquidação que também é objeto do processo de impugnação judicial, valerão inteiramente as razões que justificam a apensação das reclamações graciosas e respectivos recurso hierárquicos, pelo que se justificará a aplicação analógica do regime previsto nestes n.ºs 3 a 5 do art. 111.º. Considerando que esta é uma matéria que não está na disponibilidade das partes, é lícito ao tribunal de recurso conhecer oficiosamente as consequências processuais do procedimento do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, ou seja, do pedido de revisão do ato tributário. Veja-se sobre o assunto o que escreve o Conselheiro Abrantes Geraldes refere em anotação ao artigo 635.º do CPC, no seu livro, Recursos em Processo Civil, (6.ª edição, 2020, Almedina), a págs. 137-139, quando refere: «4. Os poderes do tribunal ad quem em sede de recurso encontram ainda outras limitações: A interposição de recurso impede que, pelo decurso do prazo, se produzam os efeitos de caso julgado em relação à decisão ou decisões por ele abarcadas (art. 628.º). Porém, atento o disposto no n.º 5 do art. 635.º, o caso julgado que, porventura, por qualquer via, se tenha estabelecido em relação a alguma decisão ou segmento decisório não pode ser perturbado por uma atuação posterior, ainda que de um tribunal hierarquicamente superior. Em matéria de qualificação jurídica dos factos, ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, o tribunal ad quem não está limitado pela iniciativa das partes (art. 5.º, n.º 3). Ou seja, uma vez interposto o recurso, é lícito ao tribunal ad quem conhecer oficiosamente de determinadas questões relativamente ao segmento decisório sob reapreciação, sejam de natureza processual (v.g. incompetência absoluta, falta de personalidade), sejam de natureza substantiva (v.g. nulidade do contrato por vício formal ou simulação, caducidade em matéria de direitos indisponíveis), desde que estejam acessíveis os necessários elementos de facto e seja respeitado o contraditório, tendo em vista evitar decisões surpresa, nos termos do art. 3.º, n.º 3. No que concerne a aspetos estritamente jurídicos, e com a mesma cautela, o tribunal é livre de identificar as normas que melhor se ajustam ao caso concreto para qualificar as relações jurídicas ou para delas extrair os efeitos adequados (art. 5.º, n.º 3). Por isso, é totalmente inútil, ou melhor, juridicamente impossível, saber o que quer que seja que possa ocorrer no procedimento de revisão do ato tributário, na medida em que tal procedimento jamais pode ser analisado pela Administração Tributária. Mas mesmo que assim não fosse e, eventualmente, se cogitasse a convolação desta Ação Administrativa Especial em Impugnação Judicial, tal também não poderia acontecer, na medida em que a Autora já tem interposta, precisamente, uma impugnação judicial contra estas mesmas liquidações de IRC de 1999 e 2000, com os mesmos fundamentos e com pedido de anulação das mesmas. Aquela Impugnação Judicial foi interposta antes desta Ação Administrativa Especial, pelo que, versando sobre o mesmo objeto impugnatório, contendo o mesmo pedido e que a parte demandada se deve considerar que é a mesma, em função da sua qualidade jurídica, não é possível que haja dois processos contra aqueles mesmos objetos impugnatórios. Acerca dos pressupostos da litispendência, veja-se o Acórdão de 15 de junho de 2022, proferido por este Tribunal Central Administrativo Norte no processo n.º 265/21.4BEVIS (ainda inédito), cuja parte com interesse para o tema se transcreve de seguida: «A exceção de litispendência encontra-se prevista, desde logo, como sendo dilatória e de conhecimento oficioso, no art.º 89.º, n.ºs 1, 2 e 4, al. l), do CPTA. No entanto, o seu regime geral resulta do estabelecido no CPC (aplicável por remissão do art.º 1.º do CPTA), sendo certo que, também neste caso, vem prevista como exceção dilatória e igualmente de conhecimento oficioso, nos termos dos art.ºs 577.º, al. i) e 578.º. Segundo o art.º 580.º, n.º 1, do CPC, as exceções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência. O n.º 2 da mesma norma clarifica o regime, estabelecendo que tanto a exceção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior. O cerne do regime da litispendência resulta, no entanto, do instituído pelo art.º 581.º do CPC, o qual fixa os requisitos de que depende a verificação de litispendência, e que, pela sua importância, se transcreve: “Artigo 581.º Requisitos da litispendência e do caso julgado 1. Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. 2. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. 3. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico. 4. Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas ações constitutivas, e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.” Como a propósito referem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “[d]á-se a litispendência (…) quando se instaura um processo, estando pendente, no mesmo ou em tribunal diferente, outro processo entre os mesmos sujeitos, tendo o mesmo objecto, fundado na mesma causa de pedir. A litispendência, como excepção dilatória, pressupõe assim a repetição da acção em dois processos diferentes” – cfr. Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2004, pág. 301. Estamos, assim, perante o requisito da tríplice identidade, ou seja, para que exista litispendência é necessário que, cumulativamente, se verifique entre as ações em análise: identidade de sujeitos processuais; identidade de causa de pedir; e identidade dos pedidos formulados. Como se deixou assinalado, entre outros, no sumário do acórdão do STA de 15.10.2014, proferido no processo n.º 0906/14, disponível em www.dgsi.pt, “a litispendência só ocorrerá se, cumulativamente, nas acções em apreciação, intervierem as mesmas partes, sob a mesma qualidade jurídica, pretendendo obter, nessas acções, o mesmo efeito jurídico e esse efeito jurídico tiver por causa o mesmo facto jurídico”.» (Fim de citação). A tríplice identidade de sujeitos processuais, causa de pedir e dos pedidos formulados, está verificada, uma vez que a causa de pedir reporta-se aos mesmos objetos impugnatórios, ou seja, às liquidações; os pedidos são iguais (conforme se pode ver pelo que acima ficou transcrito); e os sujeitos processuais também são os mesmos na sua qualidade jurídica – vide artigos 53.º, 54.º e 55.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Assim, também por este motivo, não seria admissível a convolação desta Ação Administrativa Especial, em Impugnação Judicial. * Resulta de tudo o exposto, que o recurso deve improceder na totalidade. ** No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil. ** Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário: I – Intentada uma Ação Administrativa Especial, com objeto impugnatório condizente com esta forma de ação, não é possível a sua convolação em Impugnação Judicial. II – A Ação Administrativa Especial interposta na sequência da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão da matéria coletável (realizado ao abrigo do artigo 78.º da LGT), não pode ser conhecida, por estar pendente uma Impugnação Judicial deduzida contas as mesmas liquidações visadas pelo pedido de revisão do ato tributário, III - Em relação ao procedimento respeitante ao pedido de revisão do ato tributário, vale o mesmo princípio da prevalência da apreciação judicial previsto para a impugnação graciosa ou o subsequente recurso hierárquico, conforme o disposto nos artigos 76.º, n.º 2 e 111.º, n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário. IV – Mesmo que assim não fosse, a Ação Administrativa Especial também não podia ser convolada, por estar pendente uma Impugnação Judicial deduzida contra as liquidações visadas no pedido de revisão do ato tributário, sob pena de litispendência. * * Decisão Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, o despacho saneador-sentença recorrido. * * Custas a cargo da Recorrente. * * Porto, 12 de janeiro de 2023. Paulo Moura Vítor Salazar Unas Ana Patrocínio |