Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01123/19.8BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/12/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Paulo Moura
Descritores:FATURAS FALSAS;
IVA;
Sumário:I - A Autoridade Tributária não tem de demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, da mesma forma, não carece o Tribunal de dar como provado, ou melhor, como não provado, que as operações tituladas nas faturas não são verdadeiras, bastando confirmar o juízo de falsidade das faturas realizado pela AT e dizer que o contribuinte não logra provar a materialidade das operações tituladas nas faturas.

II - As partes estão obrigadas a alegar factos concretos, que correspondam a factos essenciais, que são aqueles cuja verificação depende a procedência ou improcedência da ação ou da defesa e não a afirmar generalidades, matéria vaga e conclusiva ou afirmações sobre o eventual modo genérico de funcionamento da atividade da Impugnante.

III – Os recursos servem para impugnação e para reexame de decisões judiciais, estando o tribunal de recurso impedido de apreciar questões novas
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

«A... Unipessoal, Lda.», interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA dos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, no valor total de 193.631,11 euros, por entender que a decisão enferma de nulidade e que existem pontos da matéria de facto incorretamente julgados.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo T.A.F. de Aveiro que julgou totalmente improcedente a impugnação apresentada pela ora recorrente tendo o recurso por motivação pontos da matéria de facto que se entende incorretamente julgados impondo-se uma modificação da decisão do Tribunal a quo abrangendo ainda o recurso a violação do artigo 74º da LGT e a nulidade da decisão.
2. Foram operadas pela AT liquidações em sede IVA relativamente aos anos de 2013, 2014, 2015, 2016 emergentes da aplicação de correções meramente aritméticas em virtude da não-aceitação da dedução de IVA constante das facturas emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." (que a AT entende serem falsas).
3. Afirma a Administração Tributária (AT) que a recorrente não tem direito a deduzir IVA em causa sustentando-se para tal no disposto no artigo 19 nº 3 do CIVA.
4. Pela ora recorrente foi apresentada reclamação graciosa visando dessa forma sindicar a legalidade dos atos que levaram à não-aceitação da dedução de IVA em vários períodos dos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 constante das faturas emitidas pelos contribuintes "BB", NIF ... e "B.... Unipessoal Lda."; NIF ... e que constam de fls 12 a 15 do relatório dando-se as mesmas aqui por reproduzidas e que originaram as liquidações supra referenciadas sendo que por ofício datado de 16/09/2019 foi a recorrente notificada que veio a ser indeferida a reclamação apresentada tendo subsequentemente sido apresentada impugnação.
5. Na sentença visada pelo presente recurso entendeu o Tribunal a quo em suma que: No caso dos autos, como resulta da matéria de facto provada, a administração tributária considerou que as faturas contabilizadas pela Recorrente, não correspondem a efetivas operações essencialmente com base nos factos que indica e que verificou tanto junto dos emitentes como junto dos utilizadores das faturas. Os referidos indícios são suficientes para suportar a conclusão de que as faturas são falsas.
6. Da matéria de facto dada por provada não resulta sequer que o Tribunal a quo tenha considerado que as facturas emitidas por "B... Unipessoal, Lda" e "BB" para a recorrente não têm subjacente qualquer operação económica sendo portanto falsas.
7. Perscrutando a matéria de facto provada não se dá como provado UM ÚNICO facto indiciador de faturação falsa apurado na esfera da recorrente sendo que os factos, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 25, 26, 27 dizem respeito a matéria apurada na esfera dos emitentes e de fornecedores daqueles não existindo um facto da matéria dada como provada em que seja assente que as facturas emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." para a recorrente são facturas falsas em que nenhuma operação económica ocorreu.
8. Dar-se como provado que a AT reputa os operadores "BB" e "B.... Unipessoal Lda." como emitentes de facturas falsas NÂO É O MESMO que dar-se como provado que as concretas operações económicas tituladas pelas facturas emitidas por estes para a recorrente eram falsas.
9. Não resultando da matéria de facto provada que as facturas emitidas em 2013, 2014, 2015 e 2016 por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." para a recorrente não titulam qualquer operação económica real não poderia o Tribunal a quo decidir como decidiu sendo os factos provados contrários à fundamentação e à decisão tomada.
10. A nulidade da decisão por infração ao disposto na al. c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC e 125 do CPPT assenta na contradição localizada no plano da expressão formal da decisão onde emerge um vício insanável do denominado “silogismo judiciário
11. Isto é estamos perante uma contradição quanto aos fundamentos estabelecidos e utilizados na mesma estando esta nulidade relacionada com o facto de se exigir que a decisão judicial constitua um silogismo lógico-jurídico, em que o seu inciso decisório deverá ser a consequência ou conclusão lógica da conjugação da norma legal [premissa maior] com os factos [premissa menor].
12. Ora não resultando dos factos provados que as facturas emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." são falsas não há uma correlação lógica entre a matéria assente e a posterior decisão sendo a sentença nula o que se argui (125 CPP e 615 CPC)
13. Quando a Administração Tributária desconsidera determinadas facturas afirmando serem falsas aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo pois á AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade e uma vez feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação.
14. A AT tem que evidenciar a existência de factos que traduzem uma probabilidade elevada de a operação referida na fatura ser simulada, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – artigo 75º da LGT.
15. Tendo em consideração o contexto jurídico-probatório acima mencionado e considerando os factos apurados em sede inspetiva é negativa a resposta à questão de saber se resulta dos factos considerados que a AT fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir que as facturas relativamente às quais o IVA liquidado foi desconsiderado não tiverem subjacentes quaisquer operações económicas realizadas entre os identificados emitentes e a Recorrente, ora Recorrente.
16. E porque assim é será irrelevante saber se a Recorrente logrou demonstrar em Tribunal que são reais as operações económicas subjacentes às facturas.
17. A recorrente conforme consta do RI encontra-se registada para o exercício da atividade de “Fabricação de Rolhas de Cortiça”, estando coletada no Serviço de Finanças ... – 4, com o CAE 16294 e em complemento àquela atividade, comercializa produtos de cortiça, designadamente fardos de cortiça, bocados de cortiça, entre outros sempre cumprindo com as suas obrigações fiscais e sociais enviando atempadamente as D.P. do IVA, nos termos da alínea c) do artigo 29º e artigo 41º do CIVA apresentando, para efeitos de apuramento de IRC, a Declaração Periódica de Rendimentos Modelo 22, nos termos do Artigo 120º do CIRC. Enviou a Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal, nos termos do artigo 121º do CIRC., mantendo em boa ordem, um processo de documentação fiscal, nos termos do artigo 130º do CIRC.
18. Nos termos da alínea g) do artigo 29º do CIVA o S.P. dispõe de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto tendo a sua contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal que permite o controlo do lucro tributável sendo que todos estes factos foram confirmados pela AT, como se infere da leitura na última parte da página 3 do Relatório de Inspeção Tributária.
19. Nos termos do artigo 75º, nº 1, da LGT quando a contabilidade ou escrita do sujeito passivo se mostre organizada segundo a lei comercial ou fiscal, presumem-se verdadeiras e de boa-fé as suas declarações.
20. Se a AT não demonstrar a falta de correspondência com a realidade do teor das declarações da contabilidade e da escrita, estas são consideradas verdadeiras (cf., Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4ª ed., 2012, pág. 664).
21. Para afastar tal presunção a AT tem de demonstrar a existência de indícios fundados, ou seja, os indícios devem ser objectivos, sólidos e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais, de forma a ver legitimada a sua atuação.
22. No Relatório Final são elencados factos (?) relativamente a cada um dos transmitentes que terão sido apurados no âmbito de inspeções e que sustentarão, na ótica da AT que as faturas supra elencadas não titulam qualquer operação real contudo desconhecia a recorrente à data da liquidação, reclamação graciosa e posterior impugnação o teor integral dos relatórios de inspeção elaborados em tal sede sendo que a recorrente não sabe, não sabia, nem teria forma de saber se os transmitentes cumpriam com as suas obrigações declarativas ou de pagamento por tal ser matéria protegida pelo sigilo fiscal como desconhecia igualmente quem eram os fornecedores do mesmo.
23. A recorrente comprou todos os bens que constam das faturas identificadas no Relatório a páginas 12 a 15 tendo pago o preço devido através de cheque e transferência bancária tendo tais bens sido usados na prossecução do seu objeto social.
24. O Tribunal a quo sustenta a sua decisão em factos que terão sido apurados em inspeções realizadas aos emitentes sedo que da leitura da sentença notório se revela que o suporte probatório fulcral para a formação da convicção do Tribunal a quo são relatórios dos serviços de inspeção, comunicados à recorrente após a liquidação e após a impugnação o que impossibilitou a alegação de factos que pudessem contraditar as conclusões ali retratadas que aliás a mesma não tem sequer hipótese se sindicar.
25. O que deve ser levado à sentença é aquilo que é indiciado objetivamente quanto às relações comerciais mantidas entre os transmitentes e a ora recorrente.
26. Não pode a recorrente sindicar realidades que estão a montante das operações económicas que manteve com os seus fornecedores.
27. Os relatórios da Inspeção Tributária, relativos aos emitentes das facturas consideradas como falsas e referidos na sentença nunca foram notificados à aqui recorrente previamente à liquidação, pelo que, assim sendo, se verifica a violação do Princípio do Contraditório consignado nos artigos 45º, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e ainda do artigo 8º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária.
28. No que respeita, ao valor probatório do Relatório de Inspeção, de facto o artigo 76 nº 1 da LGT refere que «as informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei», Por outro lado o artigo 115º nº 2 do CPPT dispõe que “as informações oficiais só têm força probatória quando devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos”, respeitando a aludida fundamentação a elementos objetivos e exteriores que comprovam as asserções produzidas pela inspeção tributária.
29. O valor probatório do relatório de inspecção está condicionado pela aplicação do princípio do contraditório, sob pena de directa violação do art.º 20.º, n.º 4, da CRP, que postula um processo judicial tributário equitativo e subordinado a critérios de legalidade o que requer plena igualdade de armas entre ambas as partes, como de resto é reconhecido pelo art.º 98.º da LGT.
30. Tendo em conta esse princípio e tendo esse relatório sido impugnado quando notificado á recorrente após a inquirição de testemunhas o mesmo não tem força probatória que o Tribunal pretende fazer extrair.
31. A falta de credibilidade revelada pela entidade fornecedora da recorrente em anteriores inspeções tributárias, com referência a outras operações comerciais, não constitui indício fundado de que também as operações comerciais em causa não existiram.
32. Da matéria de facto provada nada é referido quando às concretas operações económicas subjacentes às facturas tidas como falsas, situando-se os factos provados indicadores de falsidade exclusivamente na esfera do emitente o que não é suficiente para desconsiderar a dedução do IVA e a dedutibilidade dos custos com base nessas facturas/encargos.
33. Estribando-se o Tribunal a quo para formar a sua convicção em factos extraídos de relatórios feitos aos fornecedores cujo teor não foi dado totalmente a conhecer antes da liquidação colmatou deficiências probatórias e indiciárias do relatório subjacentes às liquidações impugnadas
34. Há um reconhecimento implícito do Tribunal na deficiência indiciária do relatório feito à recorrente o que determinou a junção aos autos dos relatórios relativos aos fornecedores uma vez quer os tímidos elementos enxertados no relatório relativo à recorrente estavam truncados havendo uma notória colmatação indiciária irregular do relatório inerente às liquidações.
35. No âmbito da inspeção realizada, os serviços de inspeção consideraram pois que todas as faturas emitidas pelos sujeitos passivos "BB" e "B.... Unipessoal Lda." o primeiro no ano de 2013 e o segundo nos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, à recorrente eram falsas e que não correspondiam a verdadeiras transações sendo que os indícios que alicerçam tal conclusão, na esfera do utilizador resultam essencialmente de dois vetores: a) A falta de capacidade das instalações da recorrente para armazenar a cortiça comprada (fls 39 e seguintes) b) Incongruências ou anomalias quanto às quantidades vendidas e compradas (pág 51 e ss do Relatório)
36. Nada disto é levado à matéria de facto provada pois que factos relativos à recorrente (utilizadora das facturas) e que indiciem a inexistência das concretas operações económicas subjacentes às liquidações são olvidados na matéria factual provada.
37. Analisando o relatório da inspeção fica-se com a nítida sensação que a inspeção está a ser realizada aos sujeitos passivos "BB" e "B.... Unipessoal Lda." e não à sociedade «A... Unipessoal, Lda.».
38. Há factos eleitos pela AT que apenas se relacionam com decisões estratégias da empresa, pior ou melhor sucedidas; comparam-se realidades diferentes, porque contextualizadas em pressupostos diversos, como o caso dos dois SP ali relatados, imputam-se efeitos de comportamentos de terceiros à recorrente, sem que haja um fio condutor que permita ajuizar que esta tinha conhecimento de factos que não estão diretamente no campo do seu controle ou conhecimento; os meios de pagamento das faturas são os cheques ou transferências, fazendo-se considerações sobre as vicissitudes que os acompanham sem trazer elo de ligação entre as vicissitudes apontadas e quem paga através deste meio de pagamento; irregularidades contabilísticas de terceiros para descredibilizar as operações descritas nas faturas.
39. Todas estas objeções que estão devidamente pormenorizadas no relatório são suficientes para afirmar que a AT não colheu indícios fortes de faturação falsa acrescendo que no âmbito da prova produzida a recorrente consegue demonstrar a existência e realidade das operações económicas, corroborando o infundado das suspeitas enunciadas no relatório. (cf declarações de parte do representante legal da recorrente, "AA", dia 3-11-2020 e declarações das testemunhas "OO", "VV", "UU" no dia 3-11-2020)
40. A falta de capacidade das instalações da recorrente para armazenamento de cortiça é um sofisma que ficou cabalmente aniquilado em sede de inquirição resultando até do depoimento das próprias testemunhas da AT que é do conhecimento geral que muita cortiça fica armazenada nas caldeiras onde a mesma se coze fazendo a AT no seu relatório uma interpretação errónea das declarações dos donos dessas caldeiras. (cf declarações "MA" inquirição do dia 3-11-2020 dia 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26)
41. Ao contrário do que era afirmado pela AT no seu relatório o representante da "C... Lda." não afirma que não armazenou cortiça da recorrente dizendo precisamente o contrário
42. Do anexo 17 (declaração de "CC" dono da "C... Lda.") consta:

43. A AT usa como indício de faturação falsa uma deturpação das palavras do representante legal da sociedade "C... Lda." ("C... Lda.") enxertando em relatório uma realidade oposta à que consta das declarações do mesmo!
44. Quanto à suposta falta de capacidade das instalações primitivas da recorrente para armazenar cortiça tal é pois um sofisma como ficou demonstrado pela inquirição das testemunhas "OO", dia 3-11-2020, 01:27:25 – 01:53:01, "VV", dia 3-11-2020 01:54:34 – 02:20:13 e das declarações de "AA" no dia 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26.
45. Se as primitivas instalações da recorrente, na Travª do ... em ..., não conseguiam armazenar cortiça proveniente de "BB" e "B.... Unipessoal Lda." também não conseguiriam armazenar cortiça proveniente do Grupo "X...". Se eram exíguas para uns fornecimentos eram exíguas para outros.
46. Porém tal cortiça tinha exatamente o mesmo destino que a cortiça adquirida à "B.... Unipessoal Lda." ou a "BB" (ou ia para as caldeiras ou ia diretamente para os clientes e alguma ficava na sede da recorrente para ser trabalhada. (cf "OO" motorista encarregue da fazer transportes para o Grupo "X..." – inquirição do dia 3-11-2020, 01:27:25 – 01:53:01)
47. A recorrente após Agosto 2014 mudou a sua atividade industrial para armazém sito em ... com maior capacidade de armazenagem, com mais condições (cf. declarações "MA" e "MM", inquirição do dia 3-11­2020, 02:34:35 – 03:...:26 e 03:29:19 – 03:41:30)
48. A suposta falta de capacidade para armazenar cortiça é um logro indiciário desde logo porque pelo menos após Agosto de 2014 que a recorrente deixou de exercer a sua aticidade na Travessa do ... em ... e passou para um pavilhão em ... (fls 45 do Relatório):
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
49. Antes dessa mudança (que até, de facto, ocorreu antes de 2014) a mesma ficava armazenada em caldeiras ou ia já diretamente para instalações dos clientes da mesma sendo a suposta falta de capacidade das instalações da recorrente para armazenar cortiça (quando ficou límpido que a mesma não era armazenada em ... nem a adquirida à "B.... Unipessoal Lda." e "BB" nem a adquirida à ao Grupo "X..." que a AT considerou como input verdadeiro) uma fabulação e não tem o condão de fazer emergir um indício sério de faturação falsa.
50. Quanto às supostas anomalias nas compras e vendas (págs 39 e ss do Relatório) sobre as quais a sentença recorrida nem um parágrafo dedica talvez porque as mesmas partem de premissas erradas e desconhecimento do sector convém realçar o seguinte.
51. Relativamente aos quadros transpostos para o relatório, nas páginas 10 e 11, por muito boa vontade que se queira ter na interpretação dos mesmos, não se conseguem tirar quaisquer ilações. Mesmo na explicação, que é dada, abaixo do último quadro, não se consegue compreender o alcance desta relação, porque de tantos rácios onde se enquadra o da empresa e onde se enquadra os valores declarados pelas restantes empresas que operam no mesmo setor de atividade.
52. Por outro lado, deduzimos que estes quadros representam estatísticas da AT, e a dimensão da amostra, contempla, Grandes Contribuintes, alguns certamente cotados em Bolsa, Médios Contribuintes, Pequenos contribuintes e Micro Contribuintes sendo que se assim é, não se vislumbra como se se podem fazer comparações com dados tão divergentes, ou seja é confundir “alhos” com “bugalhos”, como se diz na gíria popular além de que a recorrente também está nesta amostra.
53. Apesar de tudo a AT, depois de todas estas correções, vai colocar a recorrente no top máximo da Margem Bruta.
54. Analisando o conteúdo do relatório, na página 58, a AT esquematiza as divergências que detetou, no controlo quantitativo das entradas e saídas e que as sintetiza num quadro, que passamos a transcrever.
Descrição2013201420152016
Diferença apurada25.446,3433.713,7712.325,9622.634,90
55. Analisando o relatório, no que se refere a este controlo quantitativo, conseguimos entender e cruzar esta informação com a obtida em outros quadros resumos de outras páginas, pelo que apontamos o seguinte, em Kgs:
e) Ano de 2016 – Divergência de 22,634,90, cruza e concilia com a informação da página 59 do relatório.
f) Ano de 2015 – Divergência de 12.325,96, cruza e concilia com a informação da página 57.
g) Ano de 2014 – Divergência de 33.713,77, cruza e concilia com a informação da página 55.
h) Ano de 2013 – Divergência de 25.446,34, cruza e concilia com a informação da página 53 do relatório.
56. Já não conseguimos entender a informação contida no primeiro quadro da pág 61, onde é referido que compra mais cortiça do que precisava, em Kgs, porquanto não se consegue cruzar e conciliar com os quadros acima referidos.
57. Se se opta por controlo de entradas e saídas por ordem cronológica, as diferenças ocorridas pelos registos ocorridos em documentos individualizados, deverão ser iguais às diferenças quando registamos os totais dos documentos, e no relatório da AT, isso não acontece.
58. Por exemplo:
Ano de 2016 – Informação global, divergência de 51.919, quando na informação individualizada diz que há uma divergência de 22.634,90.
Ano de 2015 – Informação global, divergência de 18.893, quando na informação individualizada diz que há uma divergência 12.325,96.
Ano de 2014 – Informação global, divergência de 36.932, quando na informação individualizada diz que há uma divergência de 33.713,77.
Ano de 2013 – Informação global, divergência de 41.964, quando na informação individualizada diz que há uma divergência de 25.446,34.
59. Perante esta análise e estas contradições forçosamente temos de concluir que os cálculos que a AT realizou estão completamente errados e que afinal não devem existir as divergências apontadas.
60. A análise que a AT faz, parte de pressupostos errados, pois que não consegue quantificar de uma forma precisa os pesos dos diversos produtos adquiridos e vendidos.
61. Só é viável fazer uma análise com objetivos específicos, se os dados nos permitirem tirar conclusões objetivas e haver precisão nesses mesmos dados, caso contrário, toda a análise que se faça é inconclusiva.
62. Os fardos de cortiça produzidos em Portugal, tanto podem pesar 55 como 60, como 65, como 70 e até 75 Kgs. (cf declarações de "AA" 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26, "MA", 3-11-2020, 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26 e "MM", inquirição do dia 3-11-2020, 03:29:19 – 03:41:30) pelo que se não se tem a certeza do peso, e para tirar conclusões deve-se construir quadros com todas estas hipóteses e depois tirar as conclusões.
63. Quanto aos fardos espanhóis, não se podem tirar conclusões com base nos CMR, porque, em regra e da experiência comum, nenhum camião vai à balança para pesar fardos, porque o comerciante está a comprar o fardo, mediante o que vê e a qualidade que observa e nunca tem em conta o peso que possa ter.(cf depoimento de "MA", depoimento do dia, 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26)
64. O fardo espanhol tanto pode ter 75, como 80, como 85 ou até 90 Kgs. (cf declarações de "AA" 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26, "VV", 3¬11-2020, 01:54:34 – 02:20:13, "MA", 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26 e "MM", inquirição do dia 3-11-2020, 03:29:19
65. Relativamente às paletes, também nesta matéria a AT tira conclusões precipitadas porquanto uma palete tanto pode pesar 1.000 Kgs, como 700 kgs. (cf declarações de "AA" 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26, "VV", 3-11-2020, 01:54:34 – 02:20:13, "MA", 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26 e "MM", inquirição do dia 3-11-2020, 03:29:19 – 03:41:30)
66. Quanto às rolhas, também aqui, a AT na sua extrapolação, comete diversos erros.
a – Nas rolhas 45 x 24, se forem de boa qualidade, cada milheiro de rolhas poderá pesar 3,25 Kgs, mas se se forem de qualidade fraca, o seu peso poderá ir até 3,85 ou mais Kgs.
b – As rolhas 12 x 21, mil rolhas poderá pesar, entre 1,65 a 2,30 Kgs, conforme sejam de boa qualidade ou fraca qualidade.
67. Em termos de observação, sempre diremos que a AT, por diversas vezes e no âmbito das diversas inspeções, foi pesar rolhas de calibres diferentes e qualidades diferentes, pelo que não pode ignorar estes factos. (cf declarações de "AA" 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26, "VV", 3-11-2020, 01:54:34 – 02:20:13, "MA", 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26 e "MM", inquirição do dia 3-11-2020, 03:29:19 – 03:41:30)
68. Quanto às aparas a AT nada refere e tem a obrigação de saber, que quando é faturada a apara, esta é feita pelo seu peso líquido ou seja, em regra, os adquirentes das aparas fazem um desconto de humidade, que por vezes chega a atingir os 30%. (cf declarações de "AA" 3-11-2020, 00:03:20 – 01:26:26, "VV", 3-11-2020, 01:54:34 – 02:20:13, "MA", 3-11-2020, 02:34:35 – 03:...:26 e "MM", inquirição do dia 3-11-2020, 03:29:19 – 03:41:30)
69. A AT não teve em conta este pressuposto porque se tivesse em conta, certamente as suas conclusões seriam bem diferentes quanto às eventuais divergências detetadas.
70. O INE, através das estatísticas relativas à produção e obtidas com recurso ao preenchimento do Inquérito Mensal à Produção Industrial, refere, que se considera normal, na produção de rolhas, quando se obtém as seguintes relações:
• 25% para rolhas e 75% para aparas:
• 20% para rolhas e 80% para aparas.
pelo que mais uma vez, ao considerar-se uma só relação, é partir de um pressuposto errado, e com isso, tudo o mais ser inconclusivo.
71. Através de um quadro construído por nós e relativamente ao ano de 2016, que é aquele que maiores quantidades apresenta e maiores desvios, segundo a AT, podemos fazer a seguinte análise.
Pressupostos:
• Iremos ter em conta as quantidades propostas no primeiro quadro da página 61, para a cortiça, onde iremos dividir por cortiça solta, paletes, fardos portugueses (Fardos P) e fardos espanhóis (Fardos E);
• Iremos ter em conta o primeiro quadro da página 60, para a as rolhas produzidas, e;
• Iremos ter em conta a apara considerando que 75% da cortiça é apara.
• Não iremos ter em conta qualquer desperdício ou desconto de humidade.
CONSUMOS E PRODUÇÕES 2016
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Fardos E
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Produção1.354.94651.631Consumos1751.17500
Peso/Mil31Peso100017585
Pesos Totais4.064,8451.631Pesos Totais17.00051.17500
Totais55.695,8468.175
Divergências12.479,16
Analisando este quadro, verifica-se que a divergência é 12.479,16 Kgs e não os 22.634,90 Kgs.
72. Refazendo este mesmo quadro, mas tendo em conta os seguintes pressupostos.
a) Iremos ter em conta que no rabanear da cortiça, haja um desperdício de 2%, e que dá origem a raspa e pó;
b) Iremos ter em conta que na venda de apara, o adquirente faz um desconto médio de 10%.
E teremos o seguinte quadro:
DESCRIÇÃO45 x 24APARADESCRIÇÃOPaletesCortiçaFardos PFardos E
kgs UnidadeKgs Un.
Vendas1.819.69251.131Compras50163.464300...
E.Inicial628.923 Ex.Inicial55.0502010
Compras395.823 Vendas30....779300...
E.Final560.000500Exist.Final816.5602010
Produção1.354.94651.631Consumos1751.17500
Peso/Mil31Peso100017585
% Desconto 10%Desperdício2%2%2%2%
Pesos Totais4.064,8457.368Pesos Totais16.66050.15200
Totais 61.432,62 66.812
Divergências5.378,88
73. Por este quadro, reconstruído, tendo em conta os pressupostos acima, verificamos que a divergência é, agora, de 5.378,88 Kgs.
74. Mas, admitindo outro peso inferior para as paletes, peso dos fardos e peso das rolhas, as divergências de certeza já serão outras.
Pressupostos:
1. Peso das rolhas: 3,85 kgs por Mil, porque foram de fraca qualidade;
2. O desconto nas aparas, atingiu um desconto médio de 20%.
Teremos o seguinte quadro:
DESCRIÇÃO45 x 24APARADESCRIÇÃOPaletesCortiçaFardos PFardos E
kgs UnidadeKgs Un.
Vendas1.819.69251.131Compras50163.464300100
E.Inicial628.923 Ex.Inicial55.0502010
Compras395.823 Vendas30....779300...
E.Final560.000500Exist.Final816.5602010
Produção1.354.94651.631Consumos1751.17500
Peso/Mil3,851Peso100017585
% Desconto 20%Desperdício2%2%2%2%
Pesos Totais5.216,5464.539Pesos Totais16.66050.15200
Totais 69.755,29 66.812
Divergências-2.943,79
Analisando este quadro, e tendo em conta os pressupostos para a construção deste quadro, chega-se à conclusão, que houve um bom aproveitamos nos recursos e não houve qualquer desvio.
75. Todo o trabalho que a AT realizou enferma de vício de forma e todas as suas conclusões são totalmente enviesadas como se demonstrou.
76. Os indícios recolhidos na esfera do utilizar são puras fabulações
77. Resta-nos indícios na esfera do emitente que conforme supra se referenciou não podem ser sindicados pela recorrente mas mesmo que estes se considerem sólidos por si só não são suscetíveis de demonstrar o cumprimento do ónus da prova da verificação dos respetivos indícios ou pressupostos da tributação que sobre a Ai recai, nos termos do n.º 1 do art. 74.º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua atuação, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes (art. 75.º da LGT),
78. Quando o juízo subjacente à desconsideração das operações fictícias reside única e exclusivamente em inspeções efetuadas aos fornecedores não podemos dar por cumprido tal ónus.
79. A AT no seu relatório faz constar cenários mirabolantes e verdadeiras fabulações para poder sustentar um juízo previamente formulado.
80. As razões apontadas pela administração tributária baseiam-se em raciocínios exclusivamente subjetivos sem empirismo tendo por base premissas falsas, erros de contagem, erros de análise produtiva e desconhecimento absoluto da forma de operar dos players do sector corticeiro pelo que não podia o Tribunal ter deixado de concluir pela insuficiência probatória da ação inspetiva e pela incapacidade de, com os elementos emergentes do relatório, sustentar as liquidações impugnadas.
81. Os indícios recolhidos pela administração tributária não permitem suportar, objetivamente e à luz das regras da experiência comum, a conclusão a que chegou e na qual fez repousar a decisão de proceder a correções meramente aritméticas em sede de IRC e proceder à liquidação em litígio.
82. Não cumprindo a administração tributária o ónus que sobre si impendia, não cabe à Recorrente o ónus de demonstrar a veracidade das transações, isto é, que as faturas emitidas correspondiam a verdadeira transações efetuadas entre o emitente e o utilizador
83. E os eventuais indícios que fornece são ainda assim cabalmente explicitados/afastados pela recorrente.
84. Pelo que deverá ser aceite a dedução do IVA constante das facturas emitidas em 2013, 2014, 2015 e 2016 por "BB" e "B.... Unipessoal Lda.".
85. E consequentemente anuladas as liquidações relativas de IVA relativas a 2013, 2014, 2015 e 2016.
86. Tribunal a quo fez incorreta interpretação e aplicação do ónus probandi que incide sobre a administração fiscal, nos termos do artigo 74º da LGT.
87. Ainda que se entenda que os indícios apresentados pela AT são sólidos dando por cumprido o ónus que sobre a mesma recaía julga a recorrente que assistimos a um notório erro de julgamento desde logo porque a prova produzida não foi devidamente apreciada de acordo com as regras da experiência.
88. Com efeito livre apreciação da prova não corresponde a arbitrariedade pelo que a atribuição ou não de credibilidade a uma fonte de prova deverá ser censurada pelo Tribunal de recurso quando essa opção é inadmissível.
89. PONTOS DA MATÉRIA DE FACTO QUE A RECORRENTE ENTENDE INCORRECTAMENTE JULGADOS IMPONDO-SE A MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DO TRIBUNAL “A QUO”:
O tribunal “a quo” deveria ter levado aos factos provados um conjunto de factos que traduzem realidades, constantes do articulado de Impugnação, que, no entendimento da recorrente ficaram plenamente demonstradas, tendo com consideração a análise conjunta da prova produzida, conforme infra se demonstrará, sendo tais factos os seguinte:
Factos constantes dos artigos 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158 e 165.º do articulado de Impugnação, sendo que considerando a sua dimensão, nos escusamos a reproduzi-los neste articulado, bastando-se apenas a mera remissão para os mesmos.
Tais factos deveriam ter sido dados como PROVADOS, o que se pugna através do presente recurso.
90. AS PROVAS QUE IMPÕEM DECISÃO DIVERSA:
Documentos constantes do PA junto pela A.T.:
Anexo 16 do Relatório: Guias de Transporte e Remessa emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda."
Anexo 21 do relatório: quadros elaborados pela AT com todos os meios de pagamento por referência a cada uma das facturas emitidas e cópias dos cheques, transferências e guias juntos ao PA.
Prova Testemunhal e Declarações de Parte – depoimentos prestados em audiência de julgamento realizada dia 03.11.2020:
"AA", depoimento prestado a 3-11-2020, constando do sistema de gravação 00:03:20 – 01:26:26.
"OO", depoimento prestado a 3-11-2020, constando do sistema de gravação 01:27:25 – 01:53:01
"VV", depoimento prestado a 3-11-2020, constando do sistema de gravação a 01:54:34 – 02:20:13
"MA", depoimento prestado a 3-11-2020, constando gravado a 02:34:35 – 03:...:26
"MM", depoimento prestado a 3-11-2020, constando do sistema de gravação 03:29:19 – 03:41:30
91. Da análise do anexo 21 resulta que todos os pagamentos efetuados pela recorrente foram realizados de forma a ser possível apurar o destinatário dos mesmos nos exatos termos legais. (cheque ou transferência bancária)
92. A AT não detetou nenhuma desconexão temporal, nenhum meio suspeito estando demonstrado que os meios de pagamento não apresentam, na esfera da recorrente, qualquer anomalia ou procedimento esdrúxulo.
93. Todos os documentos juntos nos anexos do Relatório (guias, facturas, meios de pagamento, etc que a A.T. compilou e os fez anexar), demonstram não só que a recorrente tinha uma contabilidade organizada nos termos legais, como também demonstram a realização dos negócios que lhe estão subjacentes.
94. Obviamente que se na esfera do emitente o mesmo procede a levantamentos tal não poderá ser imputado à recorrente.
95. Aliás, não se assiste a nenhum retorno às contas da mesma de qualquer montante afirmando a AT que desconhece o destino que os emitentes deram ao dinheiro. Ora a recorrente dirá o mesmo. Transcrevendo o Relatório:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
96. As alegadas incongruências produtivas ou de compras e vendas apontadas pelas A.T. no seu relatório são (e foram) perfeitamente explicáveis e prendem-se com algumas realidades que a A.T. não considerou (porque não conhece o funcionamento do negócio, apenas o conhecendo do ponto de vista formal), por exemplo:
A A.T. no seu relatório não levou em consideração o facto de estarmos perante o negócio que tem por base um produto natural – a cortiça – e que o mesmo sofre constantemente, ao longo das várias fases do negócio, variações de peso;
A A.T. no seu relatório não levou em consideração o facto de muitos dos negócios terem sido feitos com base na compra à unidade (fardos por exemplo) e não com base no peso que os mesmos apresentam portanto terão de ser tidos em consideração pesos meramente estimativos e margens de variação.
A A.T. não levou em consideração no seu relatório o facto – e esta postura por parte da A.T. é inquietante – de a empresa fornecedora da recorrente, que a A.T. diz não ter capacidade de produção para o efeito, era, no período em causa, fornecedora da empresa "EC" tendo a AT considerado verdadeiras essas operações.
97. As realidades referidas foram plenamente explicadas pelas testemunhas, sendo absolutamente fundamental atentar aos seus depoimentos e conjugar os mesmos com os documentos juntos aos autos.
98. Das declarações do legal representante da recorrente "AA" prestadas em sede de audiência de 3-11-2020, constando do sistema de gravação do minuto 00:03:20 – 01:26:26 resulta que foram reais todas as operações económicas subjacentes às facturas em causa nos autos de impugnação. "AA" era o representante legal da recorrente, nos anos alvo da inspeção, e era a pessoa responsável pelas compras e vendas de mercadoria no seio da sociedade. Referiu que conheceu as instalações dos fornecedores descrevendo-as e que as mesmas davam perfeitamente para exercer uma atividade comercial sendo que era lá que fazia as cargas da mercadoria havendo sempre um colaborador dos fornecedores que estava presente para ajudar. O mesmo seria de ... Descreveu a maquinaria que viu e as funções que as mesmas desempenhavam. Afirmou que os transportes eram sempre por conta da recorrente identificando cabalmente o veículo que procedeu aos mesmos. Teceu considerações sobre o peso das rolhas e da cortiça explicitando que os mesmos variam em função da qualidade e das classes. Explicitou a diferença entre os fardos de origem nacional e os espanhóis sendo estes últimos muito mais pesados afirmando igualmente que nenhum camião vai à balança para pesar fardos porque a venda de fardos de cortiça é negociada à unidade e não tendo em conta o peso factos estes que aliás foram igualmente atestados pelos Inspetores Tributários ouvidos em sede de inquirição de testemunhas. Falou sobre as humidades existentes na cortiça e a necessidade de se efetuarem descontos em função da humidade presente. Explicou que no ato e rabanear a cortiça há muito desperdício que depois pode ser vendido como apara. Descreveu igualmente as instalações da recorrente que num primeiro momento se situavam na Travessa do ... em ... e eram mais rudimentares tendo depois passado a exercer a sua atividade em ... (Rua .../Rua ...) em armazém com todas as comodidades e vasto espaço. Explanou as condições que tinha da Trav. do ... em ... afirmando que no logradouro, à entrada, do lado direito, tinha uma rabaneadeira e uma broca. Junto a uma figueira havia tinha um armazém em chapa referindo igualmente a existência duma banca de passar, para tirar os cavacos. Quando ao armazenamento de cortiça referiu que armazenou muito pelas caldeiras e que muitas vezes o negócio era efetuado ainda com a cortiça em cima da carrinha. Quando eram transportes de muita envergadura ai ia para as caldeiras e ficava ai armazenada. Referiu ainda que fez muitas compras à "X.... Florestal", empresa do maior grupo mundial do sector, compras essas que isoladamente representavam aquisições de cortiça em quantidades muito superiores à que se discutem nos presentes autos e nunca foi pela AT discutida a capacidade de armazenamento dessa mesma cortiça. Refere que o escopo da recorrente era essencialmente comércio de cortiça e pouca transformação o que aliás origina que não sejam precisas grandes instalações. Referiu que "BB", seu fornecedor, continua ainda hoje a operar no sector da cortiça tendo agora uma fábrica em ... e que continua a oferecer mercadoria ao mesmo. Por fim afirmou que os pagamentos foram feitos sempre por cheque ou transferência bancaria sendo desta forma que paga a todos os seus fornecedores.
99. Do depoimento de "OO", audiência realizada em 3-11-2020, constando do sistema de gravação do minuto 01:27:25 ao minuto 01:53:01 resulta que esta testemunha era motorista e a sua empresa prestava serviços para a "X.... Florestal" sociedade fornecedora da recorrente. Os transportes eram realizados pela testemunha sendo que apesar de nas guias constar como destino ... nunca lá descarregou qualquer cortiça até porque o camião TIR nem conseguia passar na Trav. do .... Os transportes que fazia eram na ordem das 13, 14 ou 15 toneladas, razão pela qual descarregava nas caldeiras do ... ou na "R" e bem assim nas instalações da recorrente em .... Isto apesar de nas guias constar a sede Travª do ..., .... Persistindo a tortuosa indagação: se a recorrente não conseguia armazenar a cortiça que adquiria a "BB" ou " B....Unipessoal , Lda" onde armazenada 13, 14 ou 15 toneladas que comprava à "X.... Florestal"?
.... Do depoimento de "VV" em sede de audiência, dia 3-11 2021, constando do sistema de gravação do minuto 01:54:34 – 02:20:13 resulta que o mesmo é irmão do representante legal da recorrente tendo sido até funcionário da mesma. Descreveu as condições em que a recorrente começou por exercer a sua aticidade na Trav. do ..., casa onde cresceu. O seu irmão tinha lá instalada uma pequena unidade produtiva tendo um palheiro onde guardava a cortiça tinha broca e rabaneadeira. Refere que a cortiça adquirida era muitas vezes descarregada na Fábrica (nota: a fábrica de ... cuja existência foi atestada pela AT pelo menos após Agosto de 2014) na caldeira do ... ou do "R". Foi várias vezes às instalações de "BB" e "B.... Unipessoal Lda." carregar mercadoria. Refere que o mesmo exercia a sua atividade na Trav do .... Verificou a existência de uma área coberta e outra descoberta sendo ai que "BB" tinha a cortiça. Nunca entrou na zona de fabricação desconhecendo as máquinas que possuía. Afirmou que os fardos era manuseados a rolar e depois colocados em cima da carrinha.
101. Do depoimento "MA", prestado em sede de audiência no dia 3-11-2020, constando do sistema de gravação do minuto 02:34:35 – 03:...:26 resulta que o mesmo era o coordenador da equipa responsável pelo procedimento inspetivo. Quando se iniciou a inspeção a recorrente já exercia atividade em armazém sito em ... (pavilhão com alguma dimensão e bem localizado referiu a testemunha). Tiveram dificuldades em determinar quando se verificou a mudança de instalações da Trav. do ... em ... para .... Nas instalações de ... viu equipamento, empilhador, rolhas e cortiça. Visitaram as antigas instalações da recorrente na Trav do ... e quando lá foram estavam já desocupadas. Descreveu o funcionamento duma caldeira afirmando que a cortiça é lá depositada para posteriormente vir a ser lá cozida. O ganho da caldeira é na cozedura e essa cozedura tanto pode ser paga pelo vendedor como pelo comprador. Confirma que a cortiça pode ficar lá meses armazenada. Confirma a existência de descontos de humidade na compra a venda de cortiça confirmando igualmente a diferença de pesos entre os fardos portugueses e os espanhóis (sendo estes mais pesados) e bem assim o facto da compra de fardos não ser feita ao peso mas sim á unidade.
102. Do depoimento de "MM" prestado em audiência do dia 3-11-2020, constando do sistema de gravação do minuto 03:29:19 – 03:41:30 resulta que esta testemunha á igualmente inspetor tributário sendo responsável pela inspeção externa à sociedade "B...Unipessoal, Lda" Notemos que o relatório efetuado à recorrente dá a entender que a "BI..." era uma empresa não declarante com inputs exclusivamente falsos sem qualquer actividade. Contudo do depoimento desta testemunha ficamos a saber que a mesma forneia a empresa "EC" (um dos maiores players do sector) Confrontados os representantes legais da "EC" sobre a forma de atuar quando existiam negócios com A "B...., Unipessoal, Lda." os mesmos referiram que iam à Trav do ... proceder ao carregamento a mercadoria. Exatamente o meso que fazia a recorrente. Portanto existia atividade comercial da Trav do .... A "B...., Unipessoal, Lda." exercia de facto atividade ligada ao sector corticeiro tendo outros clientes para além da recorrente e teve outputs que foram considerados verdadeiros.
103. Dos depoimentos supra identificados, que consideramos credíveis e bastante elucidativos e esclarecedores no sentido em que explicaram as pseudo incongruências apontadas pelas A.T., podemos apenas concluir que as operações económicas constantes das facturas em causa nos autos realizaram-se, pelo que estas traduzem negócios verdadeiros.
104. Da conjugação dos depoimentos supra transcritos e dos documentos anexos ao relatório (cheques, transferência e guias de transporte/remessa Anexos 16 e 21 desde logo) resulta que recorrente tem adequada estrutura empresarial suscetível de exercer a atividade declarada possuindo para o efeito o pessoal e equipamento necessário para o exercício desta atividade, atividade que consistia na Indústria da cortiça
105. A sua contabilidade está organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, é executada com recurso a sistemas informáticos e adota o Sistema de Normalização Contabilística – SNC, aplicando as NCFR adequadas para esta empresa e todos os lançamentos estão apoiados em documentos justificativos, datados e suscetíveis de serem apresentados sempre que necessários cumprindo atempadamente com as suas obrigações declarativas, quer ao nível do IRC quer ao nível do IVA;
106. Mantém em boa ordem um processo de documentação fiscal, relativo a cada exercício e cumpriu com as suas obrigações sociais.
107. Todas as operações económicas tituladas pelas facturas em causa emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." Unipessoal (fls 12 a 15 do relatório) são reais.
108. Aqui chegados, e pelos argumentos demonstrados, entendemos que terá que existir alteração quanto aos factos dados como provados na sentença nos seguintes termos o que se impetra pelo presente: Os factos constantes dos artigos 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158 do articulado de ImpugnaçãoDEVERÃO SER DADOS COMO PROVADOS.
109. Assim a falta de credibilidade revelada pela entidade fornecedora da recorrente em anteriores inspeções tributárias, com referência a outras operações comerciais, não constitui indício fundado de que também as operações comerciais em causa não existiram.
110. Da matéria de facto provada nada é referido quando às concretas operações económicas subjacentes às facturas tidas como falsas, situando-se os factos provados indicadores de falsidade exclusivamente na esfera do emitente sendo que tal não é suficiente para desconsiderar o IVA deduzido suportado por tais facturas.
111. Pelo que a impugnação deveria ter sido ser julgada procedente.
NESTAS TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVERÁ A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE CONTEMPLE AS CONCLUSÕES SUPRA ELENCADAS
ASSIM SE DECIDINDO FAR-SE-Á JUSTIÇA

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

**
Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber: (1) se a sentença padece de nulidade por contradição entre a matéria provada e a motivação e entre a matéria provada e a decisão; (2) se ocorre erro de julgamento no que concerne à repartição do ónus da prova e à ausência de indícios sérios de simulação de veracidade das operações económicas subjacentes às faturas em apreço; (3) se existe matéria de facto incorretamente julgada; e (4) se ocorre violação do princípio do contraditório, por não notificação dos relatórios de inspeção relativos aos terceiros inspecionados.

**

Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
3. Fundamentação
3.1 Matéria de facto dada como provada.
Com base nos elementos de prova juntos aos autos considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão:
1. A sociedade impugnante tem por objeto social a atividade de fabricação de rolhas de cortiça – CAE 016294 – artigo 8 da pá. e pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
2. A sociedade encontra-se fiscalmente enquadrada no regime geral do IRC e no regime normal, de periodicidade trimestral, do IVA – pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
3. Em 2013 a atividade da referida empresa era exercida na Travessa do ..., nº ..., ..., correspondente ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...1 da freguesia ..., com 290 m2 e área bruta de construção de 140 m2 – pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF e decisão da reclamação graciosa a pág. 59 do documento de ordem 64 do SITAF; o sócio-gerente, em declarações de parte, diz não se lembrar onde eram as instalações nesse ano, mas admitiu que ali exerceu a atividade;
4. Essas instalações coincidiam com o domicílio (arrendado) da família do sócio gerente, "AA", que em anexo possuía um terreno com cerca de 150 m2 e um pequeno barracão com 17 m2 – depoimento de parte, fotos de fls. 73 a 76 do processo físico e do termo de ocorrência de 10/3/2017, no PA como documento de ordem 39 do SITAF e decisão da reclamação graciosa a pág. 59 do documento de ordem 64 do SITAF;
5. Além disso, no terreno anexo a essa casa também havia um “barraco”, que tinha sido construído pelo pai do sócio-gerente da Impugnante e que este destruiu quando entregou a casa ao senhorio – segunda testemunha, "VV", irmão do referido sócio-gerente, que disse ter vivido nessa casa com os pais e irmão até se casar em 1988 e que depois de casar também ali trabalhou para o seu irmão, que foi o último a viver ali;
6. Em 7/8/2014 a agora impugnante comunicou que a sua atividade era exercida na Rua ..., anteriormente designada “Rua ..., ...”, em ... – parte introdutória da pá. e pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
7. Em 18/8/2014 foi alterada a sede da impugnante para a Rua ..., ..., em ..., que corresponde ao domicílio fiscal do sócio-gerente, "AA" – pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
8. Em 10/10/2017 foi alterada a sede da impugnante para a Rua ..., em ... – pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
9. Em 11/7/2018 foi alterada a sede da impugnante para a Rua ..., em ... – pág. 3 do Relatório da inspeção de pág. 9 de documento na ordem 14 do SITAF;
10. Resulta da contabilidade da sociedade impugnante que no referido período de 2013 a 2016 os “custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas” (CMVMC) representam entre 88% e 98% do total dos gastos – pág.7 do Relatório da inspeção de pág. 13 de documento na ordem 14 do SITAF;
11. Comparando a margem de lucro bruto sobre as vendas com o equivalente rácio (R16-MBI) da unidade orgânica de ... e do país, no período em causa, verifica-se o seguinte:
PeríodoDeclarado SPRácios UO ...Rácios nacionais
MédiaMedianaMédiaMediana
20139,7332,9735,6932,6434,75
20147,1731,6533,7130,3633,19
201511,7729,5833,2429,9732,93
20161,2533,1335,4633,1235,44
– pág.10/11 do Relatório da inspeção de pág. 16/17 de documento na ordem 14 do SITAF;
12. No período sob análise a sociedade impugnante declarou ter pago rendimentos do trabalho (cat. A) aos seguintes trabalhadores:
PeríodoNº de trabalhadores
20131 (sócio-gerente)
20141 (sócio-gerente)
20151 (sócio-gerente)
2016.010 (gerente esteve doente)
2016.021 (filho)
2016.031 (filho)
2016.041 (filho)
2016.053 (gerente e filho e filha)
2016.062 (filho e filha)
2016.072 (filho e filha)
2016.082 (filho e filha)
2016.091 (filho)
2016.102 (filho e irmão)
2016.112 (filho e irmão)
2016.122 (filho e irmão)
– pág.5/6 do Relatório da inspeção de pág. 11/12 de documento na ordem 14 do SITAF;
13. O agregado familiar do sócio gerente da impugnante ("AA") e esposa ("MT") e a filha ("AT") declarou os seguintes rendimentos e são-lhe conhecidas as seguintes despesas:
PeríodoRendimento globalDespesas
201413.751,4219.652,55
201514.347,1411.674,27
20167.552,8012.762,25
201713.312,627.087,45
TOTAL48.963,9851.176,52
– pág. 6 do Relatório da inspeção de pág. 12 de documento na ordem 14 do SITAF;
14. No período em causa, a sociedade impugnante contabilizou e deduziu custos relativos a compras de cortiça e suportados em faturas emitidas em nome de "BB" e da sociedade "B.... Unipessoal Lda."., que a AT reputa como emitentes de faturas falsas, nos seguintes montantes anuais:
PeríodoBaseIVATotal
2013110.645,0025.448,35136.093,35
2014197.160,0045.346,80242.506,80
2015239.333,7055.046,75294.380,45
2016188.09043.260,70231.350,70
– pág. 12/15 do Relatório da inspeção de pág. 18/21 de documento na ordem 14 do SITAF;
15. Em ação de inspeção à atividade de "BB", residente na Travessa do ..., nº ..., ..., efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço nº ...31, que culminou com o Relatório final de 9/10/2017, homologado por despacho de 11/10/2017, que foi motivada por ele ter contabilizado custos com base em faturas emitidas por sujeitos passivos fortemente indiciados de serem emitentes de faturas falsas, este declarou que exercia a atividade na Travessa do ..., nº ..., nuns anexos que pertenciam à falecida avó;
– disse não se recordar do nome dos seus fornecedores nem do nome das pessoas nem dos locais onde ia carregar as mercadorias;
– questionado sobre a sociedade “"CT...Unipessoal , Lda."”, que representa mais de 1/4 das suas compras, apenas disse que “foi o contabilista "NN" que o levou a ... a uma casa em cimento entre ... e ..., não sabendo precisar o local”, afirmando a AT que nunca conheceu aí qualquer instalação usada por essa empresa, e quanto à sociedade "PP Unipessoal, Lda.”, que representa cerca de 2/3 das suas compras, disse ter-lhe pago cerca de € 70.000,00 em numerário mas que não se recorda do local nem dos responsáveis da empresa;
– questionado acerca de compras de cortiça no sul do país, afirmou que comprou uma vez, mas que não se lembrava do local;
– questionado sobre a forma de pagamento aos fornecedores afirmou que o fazia sempre em dinheiro;
– questionado acerca do meio de transporte respondeu isso era sempre feito pelo fornecedor, já que ele não possui veículos (a AT verificou que em seu nome só existe um motociclo),
– questionado sobre os clientes disse não se lembrar se vendeu a "RD" enquanto empresário em nome individual ou na qualidade de gerente da sociedade "B.... Unipessoal Lda.", contacto que localiza “muito perto de onde o declarante mora”, e que também vendia à sociedade “«A... Unipessoal, Lda.»”, que localiza “perto do ...” de ... e que que para isso costumava contactar o "AA";
– questionado sobre os meios de pagamento afirmou que esses clientes lhe pagavam por cheque ou transferência bancária e que os clientes vinham carregar as mercadorias em viaturas que julga serem deles e afirmou que trabalhava sozinho nessa atividade (só tinha ajuda para brocar);
– a AT verificou que "GN" tem dificuldades financeiras (e tem execuções fiscais em curso contra si), tendo o mesmo reconhecido que esteve inibido do uso de cheques e que teve vício do jogo, disse ter recebido dinheiro em 2013 por herança da mãe, mas não comprovou;
– após consulta aos extratos bancários a AT verificou que não existem sinais dos levantamentos em numerário para fazer os alegados pagamentos aos fornecedores (em regra, os movimentos têm valores inferiores a € 200,00) e que as entradas de dinheiro das vendas são logo seguidas de levantamento através de cheque avulso de valor semelhante;
– a AT verificou que, uma vez que todos os recibos têm a mesma data das correspondentes faturas, o referido sujeito passivo necessitaria de ter em caixa o valor de quase € 60.000,00, mas afirma ter dificuldade em obter € 115,00 mensais para cumprir o plano de pagamento prestacional do IRS de 2013 que se encontra em execução fiscal;
– afirmou que tinha capacidade de armazenar até ... fardos, mas a AT verificou que chegou a contabilizar 410 fardos ou cerca de 33.676,05 kg em stock; a AT verificou que "BB" iniciou a atividade em 17/4/2013 e cessou em 31/10/2013, período em que registou vendas no valor de € 136.462,53 e compras no valor de € 85.650,00;
– por fatura de 29/10/2013 (que a AT também reputa como falsa) passou as máquinas e todas as existências – no total de 222 fardos de cortiça, que reconhece não ter sido inventariada fisicamente, sendo certo que a sua contabilidade apenas revelava 192 fardos – para a sociedade "B...Unipessoal, Lda", que constituiu para o efeito em 8/10/2013 alegadamente porque tinha de pagar muito IRS da atividade individual, continuando a exercer a mesma atividade no mesmo local;
– nas várias visitas ao local, os funcionários da AT nunca ali visualizaram qualquer fardo de cortiça.;
– a AT verificou que dos elementos de "BB" resulta de vendeu um pouco mais de apara e refugo do que a quantidade comprada e que vendeu muito mais cortiça e milheiros de rolhas do que as quantidades compradas, verificando que as rolhas vendidas (1182 milheiros) correspondem a mais 102 fardos cortiça do que que estão contabilizados; o referido emitente disse que compra fardos de cortiça para escolher e vender (em fardos), mas não possui máquina de enfardar, e a sua contabilidade revela que comprou e vendeu cortiça apenas das qualidades 4ª ou 5ª e que comprou e vendeu rolhas apenas de cortiça de raça;
– confrontada a capacidade de carga dos veículos identificados nos documentos de transporte com o correspondente peso da carga faturada, a AT verificou que o peso da mercadoria ultrapassa largamente o peso admissível para a viatura em causa, tendo sido detetadas situações em que tal transporte com o veículo indicado seria fisicamente impossível devido ao peso e ao volume – Relatório de 9/10/2017 referente á inspeção efetuada à atividade de "BB" no ano 2013, de fls. 1217, ordem ..., a 1412, ordem 114, do SITAF;
16. A Travessa do ..., onde se localizava a morada da Impugnante, no nº ..., e dos emitentes das faturas em causa, "AA" e "B...Unipessoal, Lda", no nº ..., não dá acesso a grandes cargas por ser estreita e no percurso existir uma ponte muito fraca – declaração de parte prestado pelo sócio-gerente da impugnante e depoimentos da primeira testemunha, "OO", motorista do veículo pesado que transportava cortiça das instalações da “XC” para as instalações da impugnante, que disse conhecer aquele local mas que nunca lá foi com a sua viatura de 13/15 toneladas, pelos motivos acima referidos, confirmado pela terceira testemunha, "UU", morador da mesma rua;
17. A morada onde se localizam as referidas instalações do "BB" e da sua sociedade “"B.... Unipessoal Lda.".”, na Travessa do ..., nº ..., corresponde a uma casa antiga (mais de 90 anos), bem conservada, com área bruta de construção de 84 m2 e anexo, ocupando o terreno com área total de 106 m2, inscrita na matriz urbana sob o artigo ...31 da freguesia ... – fls. 87 do Relatório da inspeção à atividade do referido "BB", em suporte de papel apenso e fotografias de fls. 72 a 74 e 76 do processo físico;
18. Nas visitas efetuadas pelos inspetores da AT às referidas instalações do "BB" apenas foi mostrado o pequeno anexo existente na traseira dessa casa, cujo acesso se faz por estreita passagem ao longo da parede exterior e não lhes foi referida a existência de outras instalações – fotografias de fls. 72 a 74 e 76 do processo físico e depoimento da quarta e quinta testemunhas, "MA" e "MM", inspetores tributários, que disseram não ter visitado a casa ao lado e que não sabem de quem é e a que se destina;
19. O "BB" era o único trabalhador da área comercial e era ajudado por um trabalhador na área da produção – Relatórios juntos aos autos e Declarações de Parte;
20. Na área da produção o "BB" dispunha de uma broca e de uma rabaneadeira – Relatórios juntos aos autos e Declarações de Parte;
21. O "BB" não possuía qualquer meio de transporte – Relatórios juntos aos autos e Declarações de Parte;
22. Na ação inspetiva levada a cabo à atividade de "BB" a AT verificou que as compras que esta registou em 2013 estão documentadas por faturas emitidas e, nome de "RV, Lda", "CT...Unipessoal , Lda.", "DS" e "PP Unipessoal, Lda.” – pág. 5 do relatório de ordem 100 do SITAF;
23. Em ação de inspeção à atividade da sociedade "RV, Lda", com sede no concelho ..., distrito ..., a AT verificou que se trata de uma empresa “não declarante” (tem histórico de declarações em atraso), não registou compras nem vendas em 2012 e 2013 e o seu gerente disse desconhecer a existência das faturas emitidas com datas posteriores a 2011, altura em que a empresa cessou a atividade, negando que tenham sido emitidas por si ou com seu conhecimento, tendo a AT apurado que as faturas posteriores a essa data (que circulam todas no distrito de ...) são formalmente diferentes das anteriores e delas consta a referência a uma gráfica (do ... e ...), suposta produtora dos respetivos documentos base, que não tem existência real – pág. 6 a 9 do Relatório, de pág. 9 a 12 do documento de ordem ... do SITAF;
24. Em ação de inspeção á atividade da sociedade ."CT...., Unipessoal, Lda." a AT verificou que também ela está indiciada como utilizadora de faturas falsas e em situação de crédito permanente de IVA, apesar de atuar exclusivamente no mercado nacional, e com comportamento declarativo semelhante ao dos operadores meramente instrumentais; contabilizou faturas de compra emitidas por 7 entidades conhecidas pela AT como emitentes de faturas falsas, incluindo a anteriormente referida "RV, Lda", por não possuírem qualquer capacidade económica ou financeira para o efeito, por não possuírem conhecimento necessários para o exercício de qualquer atividade do ramo corticeiro; apresenta uma estrutura de custos desadequada, com inventários empolados em quantidades que não pode armazenar, como omissão e substituição de gastos com mão-de-obra e aquisições de rolhas por gastos com aquisição de cortiça; existem indícios de simulação de operações ativas, falta de capacidade instalada para manusear e trabalhar o volume de cortiça mencionada nos documentos de compra e que estas apenas se limitaram a 50 fardos de cortiça de baixa qualidade, não havendo aquisição de serviços de logística e transportes, cozedura de cortiça, estufa, acondicionamento ou manuseamento, e não possui máquina de enfardar e não se provou qualquer dos supostos transportes de cortiça; os movimentos bancários não chegam a representar 12% atividades da empresa e os depósitos na sua conta são imediatamente seguidos de levantamento de numerário em caixa ou multibanco (indicio de “retorno”), não havendo prova da ocorrência de nenhum pagamento efetivo das aquisições sobre as quais pendiam os indícios de simulação; a gerente recusou responder a qualquer questão relativa à atividade da empresa – pág. 9 a 12 do Relatório de pág. 12 a 15 do documento de ordem 100 do SITAF;
25. Em ação inspetiva à atividade da sociedade "PP Unipessoal, Lda.”, da zona de ..., a AT verificou que a sede da empresa se localiza numa moradia onde reside uma família sem qualquer ligação ao sujeito passivo, tendo o respetivo proprietário declarado que desconhece a sociedade "PP Unipessoal, Lda.” bem como o respetivo sócio, "PP" e que já apresentou queixa na GNR, que originou o inquérito nº ..5/14.9GBVNG no qual o referido "PP" declarou que nunca trabalhou nessa moradia, que desconhece onde a mesma se localiza e acrescentou informações no sentido de que a utilização dos documentos com essas referências poderá ser da responsabilidade de uma antigo sócio seu, "NN", de nacionalidade brasileira, cujo paradeiro desconhece, que indicou essa morada para ser a sede da empresa e o lesou em cerca de € 30.000,00; a AT verificou que o referido gerente, "PP", se apresentou à insolvência (proc.º ...9/13.2TBVFR) em 7/8/2013 e que a sociedade nunca exerceu atividade no distrito do .... Depois disso, a AT levou a cabo outra ação inspetiva, por ter sido indicado que a atividade poderia ter sido exercida numa moradia do distrito de ..., mas verificou que esta corresponde ao domicilio dos pais do referido "PP" e que estes informaram que aquele já ali não vive (nem trabalha) há muito tempo e que desconhecem a sua morada; o referido Fernando declarou que comprou cortiça no ..., mas não se localizou qualquer fatura dessa operação nem dos comprovativos da respetiva despesa, e dos extratos bancários não consta o recebimento dos valores das faturas que emitiu; na base de dados da AT apenas consta a compra de 880 kg de cortiça (além de alguns milheiros de rolhas); ouvido em auto de declarações de 3/4/2013 afirmou que nessa altura já tinha vendido tudo e que não tinha intenções de continuar a trabalhar no setor da cortiça; contabilista que consta do respetivo cadastro informou que a empresa nunca lhe entregou quaisquer documentos de suporte da escrita, pelo que foi forçado a abandonar essa função – pág. 12 a 14 do Relatório de pág. 15 a 17 do documento de ordem ... do SITAF;
26. Em ação inspetiva à sociedade "B.... Unipessoal Lda."., com sede na Travessa do ..., nº ..., ..., a AT verificou que o único sócio e gerente é o "BB" acima aludido e que a sociedade iniciou a atividade em 11/10/2013 – pág. 1412, de ordem 114, a 2172, ordem 162 do SITAF;
27. Nessa ação inspetiva a AT apurou que a sociedade é não declarante, mas em sede de IVA declara situação de crédito de imposto, e não exerce qualquer atividade industrial efetiva e que apenas faz intermediação em alguns negócios de compra e venda, exibe estrutura de custos anómala, tendo o sócio gerente declarado que a sociedade exerce a atividade nos anexos da casa do nº ... da Travessa do ... e que a mesma consistia, para além da produção de rolhas que subcontratava a alguém que não quis identificar, comprava cortiça em fardo que desenfardava, escolhia e vendia; que não se recorda do nome dos fornecedores nem das pessoas com quem contactava nem dos locais onde fazia as compras; acerca da sociedade "RV, Lda" disse que uma vez comprou cortiça mas não se lembra de mais nada; acerca da sociedade "CT...Unipessoal , Lda." disse que foi o contabilista, "NN", que a acerta altura também identifica como seu fornecedor, que o levou a uma casa de cimento situada entre ... e ..., mas não sabe precisar mais nada; acerca da sociedade RPT disse que não se recorda dos locais nem das pessoas; acerca dos pagamentos aos fornecedores disse que pagava sempre em numerário; acerca do transportes das suas compras disse que ficavam a cargo dos fornecedores porque ele não possui meios de transporte; entre os seus clientes identificou a sociedade agora impugnante e o "AA" como seu contacto; acerca dos pagamentos dos clientes informou que era sempre em cheque ou por transferência bancária e que o transportes das mercadorias ficava a cargo dos clientes; que as suas instalações tinham a capacidade máxima para 100 fardos e no essencial repetiu o que a AT já sabia da atividade em nome individual daquele sócio-gerente – pág. 1412, de ordem 114, até 1547, ordem 126, do SITAF;
.... Com base nas Ordens de Serviço nº ...57, ...62, ...45 e ...46, a AT levou a cabo uma ação inspetiva externa de âmbito parcial relativa ao IVA e IRC dos anos 2013, 2014, 2015 e 2016, à atividade da agora impugnante, que culminou com o Relatório final de 12/2/2019, homologado por despacho de 19/2/2019, no qual foram efetuadas correções “meramente aritméticas” é matéria coletável do IRC e às tributações autónomas de IRC, e IVA em falta, em cada um desses ano – Relatório, fls. 106 em 192, documento da ordem 11 e 13 do SITAF;
29. As correções à matéria tributável do IRC, no total de € 735.228,70, foram as seguintes (em síntese):
ITEM do Relat.Resumo da infraçãoPeríodoArtigos
infringidos
Montante
IIIExistência de simulação de custos2013Art.º 23º do CIRC110.645,00
IIIExistência de simulação de custos2014Art.º 23º do CIRC197.160,00
IIIExistência de simulação de custos2015Art.º 23º do CIRC239.333,70
IIIExistência de simulação de custos2016Art.º 23º do CIRC188.090,00
– pág. 1 do Relatório da inspeção de pág. 7 de documento na ordem 11 do SITAF e cópia em papel apenso ao processo físico;
30. Com base nessas correções e com o mesmo método, a T apurou IVA em falta, no total de € 169.102,60, como segue:
Ano 2013 .................................. € 25.448,35;
Ano 2014 .................................. € 45.346,80;
Ano 2015 .................................. € 55.046,75;
Ano 2016 .................................. € 43.260,70 – pág. 1 do Relatório da inspeção de pág. 7 de documento na ordem 11 do SITAF e cópia em papel apenso ao processo físico;
31. Além disso, a AT efetuou as seguintes correções técnicas ao IRC em falta:
ITEM
do Relat.
Resumo da infraçãoPeríodoArtigos
infringidos
Montante
IIITributação autónoma – saídas de fundos a coberto de pretensos pagamento de faturas indiciadas como falsas2013Art.º 88º do CIRC68.046,68
IIIIdem2014Art.º 88º do CIRC121.253,40
IIIIdem2015Art.º 88º do CIRC147,190,23
IIIIdem2016Art.º 88º do CIRC115.675,35
– pág. 1 do Relatório da inspeção de pág. 7 de documento na ordem 14 do SITAF;
32. Na ação inspetiva à atividade da agora impugnante apurou-se que esta utilizou efetivamente as faturas emitidas por "BB", em seu nome individual e em nome da sociedade comercial unipessoal "B.... Unipessoal Lda." que constituiu como único sócio e gerente – pág. 12 do Relatório aludido no ponto 28 supra;
33. Na sequência do relatório de inspeção, a AT efetuou liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, no montante global de 193.631,11, referente aos períodos de 2013 a 2016, que notificou à agora impugnante – parte introdutória e artigos 1 a 3 da p.i. e parte introdutória da contestação;
34. A agora impugnante apresentou reclamação graciosa contra as liquidações aludidas no ponto anterior – artigo 5 da p.i., não contestado;
35. Por oficio datado de 16/9/2019 a AT notificou a agora impugnante do teor da decisão de indeferimento da reclamação graciosa – artigo 6 da p.i., não contestado;
36. Em 6/12/2019 foi apresentada, via correio eletrónico (email) no Serviço de Finanças ..., a petição inicial da presente impugnação – fls. 2 e seguintes do processo físico.
Também se julga provado que:
37. Alguma cortiça da impugnante – designadamente a adquirida à a “XC” – foi transportada diretamente do fornecedor para a “Caldeira "R"”, onde ficava armazenada até ser ali cozida – primeira testemunha, "OO", motorista da empresa que efetuava os transportes de cortiça desde as instalações da “XC” para a impugnante e termo de declaração de pág. 2/3 do documento de ordem 53 do PA no SITAF, no qual o sócio-gerente da empresa "C... Lda." ou “Caldeira "R"” disse, em 20/3/2017, que embora isso já não suceda há alguns anos, já ter tido , em anos que não pode precisar, cortiça pertencente à sociedade agora impugnante para ali ser cozida;
*
3.2 Matéria de facto dada como não provada:
O tribunal julga não provados os seguintes factos com relevância para a boa decisão da questão:
1 – O "BB" e a sua empresa “"B.... Unipessoal Lda.".” exerceram atividade nas instalações localizadas na casa da avó da ex-mulher daquele, contigua à casa onde ele mora no nº ... da Travessa do ..., ... – declaração do sócio-gerente da impugnante no seu depoimento de parte; facto incompatível com os depoimentos das quarta e quinta testemunhas, valorados por este Tribunal como tendo muito maior isenção e imparcialidade, que afirmaram ter visitado várias vezes as instalações e que nunca lhes foi referida existência de outras para além do pequeno anexo situado na traseira da casa situada no nº ... da Travessa do ...; essa declaração da parte também é incoerente com a afirmação de que tais instalações davam acesso ao seu interior com a sua carrinha, quando resulta evidente, através da fotografia de fls. 84 do processo físico, que isso não é verdade; a segunda testemunha inquirida, "VV", irmão do sócio-gerente da impugnante, disse ter trabalhado para este na Travessa do ... e disse que, nessas funções, foi carregar a casa do "BB" e por isso sabe que tem um telheiro onde ele
trabalhava, descrição que é mais compatível com a casa do nº ... do que com a casa contigua a essa, composta por vários anexos e telheiros e por um pátio interior;
*
4 – Motivação de facto:
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – art.º 74º da LGT – também são corroborados pelos documentos juntos aos autos art.º 76º nº 1 da LGT e arts. 362º e ss do Código Civil (CC) – identificados em cada um dos factos descritos no probatório.
Para isso relevaram-se as declarações de parte, prestadas pelo sócio-gerente, "AA" e os depoimentos das testemunhas inquiridas, conforme se indica em cada ponto do probatório.
As testemunhas inquiridas são:
1ª – "OO", motorista da empresa “"TA..."”, disse que transportava cortiça da sociedade “"X..."” para as instalações da impugnante pelo menos desde 2013 até à atualidade;
2ª – "VV", irmão do sócio gerente da impugnante e trabalhador dessa empresa desde 2016 ou 2017, onde fazia cargas e todo o trabalho de produção.
3ª "UU", comerciante, morador na Travessa do ..., vizinho do "AA" e disse que da varanda do seu apartamento, situado no ... andar, vê a casa do "BB", que mora mesmo em frente, no nº ...;
4ª – ."AM", IT, chefe da equipa que efetuou a ação inspetiva em causa e que também participou em todas as ações exteriores com a inspetora "LT", tal como acompanhou a inspeção à empresa do "BB", a casa do qual, no nº ... da Travessa do ..., se deslocou pelo menos 4 vezes.
5ª – "MM", IT, fez a inspeção à empresa do "BB".
As declarações prestadas pelo sócio gerente da sociedade impugnante são, por sua natureza, motivadas pelo seu interesse pessoal em manter a tese manifestada na petição inicial. Portanto, são naturalmente parciais e interessadas, por isso, pouco relevantes para o apuramento da verdade.
Ainda assim, poderão ser valoradas, desde que coerentes com outros elementos de prova juntos aos autos ou referentes a factos pessoais que só possam ser provados por esse meio.
O tribunal não valora a afirmação de que os emitentes das faturas reputadas falsas tinham instalações adequadas ao exercício dessa atividade localizadas em casa da avó do "AA", ao lado da casa deste (que este ocupava pagando renda) no nº ... da Travessa do .... Essa afirmação é incompatível com os depoimentos dos inspetores tributários que inspecionaram a atividade daqueles, inquiridos nos presentes autos como quarta e quinta testemunhas, que afirmaram que sempre visitaram apenas o anexo localizado nas traseiras da casa do nº ... e que nunca lhes foi referida a existência de qualquer outro local onde fosse exercida a atividade, tudo indicando que a referência à casa da avó do "BB" é produto da mera necessidade de negar a evidência dos factos relatados pela AT.
Essa ideia reforça-se pelo facto de o sócio–gerente da impugnante afirmar que a referida casa da avó do "BB" ter um logradouro com uma grande área e que dava para lá entrar com a sua carrinha, quando através das fotografias anexas à ata de inquirição e pelo confronto com a terceira testemunha se conclui que não existe tal acesso (aliás, na fotografia de fls. 84 do processo físico vê-se que naquela altura estavam estacionadas, mesmo em frente a essa casa, duas viaturas em posição que mostra ser inviável o acesso com carros ao seu interior). Dos autos apenas resulta que havia acesso ao anexo situado na traseira da casa nº ..., sendo esse acesso feito por estreita passagem ao longo da parede exterior da casa e possível apenas para alguma viatura ligeira de pequenas dimensões, mas sem que existissem máquinas que permitissem a carga, descarga ou empilhamento por meios mecânicos.
Ou seja, dessas declarações ficou a convicção de que os emitentes das faturas em causa não tinham outras instalações (designadamente na Zona Industrial) para além das situadas na Travessa do ... nº ..., e que estas não se estendiam para além do pequeno anexo situado na traseira dessa casa (pelo que as movimentações de mercadorias não poderiam ser de quantidades elevadas, por limitações de espaço naquelas instalações e por limitações de acesso a essa rua).
Por isso de deu como não provado o facto 1 de 3.2 supra.
Além disso, essas declarações confirmaram o que consta do Relatório quanto à inexistência de pessoal na empresa dos emitentes das faturas em causa bem como de meios de transporte, tendo o declarante confirmado que o referido "BB" era ajudado apenas por um trabalhador (mas apenas nas tarefas de produção), que ele tinha uma broca e uma rabaneadeira e que não tinha meios de transporte próprios.
O depoimento da primeira testemunha, "OO", motorista de pesados ao serviço da empresa prestadora de serviços de transportes de mercadorias das instalações da “XC” para as da impugnante, foi valorado no sentido de que os veículos como aquele que usava, com capacidade para 13 a 15 toneladas de cortiça, não tinham acesso à Travessa do ... porque nesse percurso existe uma ponte muito fraca e estreita para esse efeito.
Embora tenha afirmado que fazia esses serviços uma ou duas vezes por semana desde 2013 até à atualidade e que descarrega nos locais indicados pelo sócio-gerente da impugnante, independentemente dos locais indicados nas guias de transporte, e que o fazia nas instalações localizadas em ... ou na “Caldeira "R"”, não se releva especialmente esses factos na medida em que nos presentes autos não está em causa a aquisição das mercadorias fornecidas pela Amorim Cork e porque a testemunha não soube explicar a aparente “coincidência” de a empresa para a qual trabalha ter 6 ou 7 veículos iguais àquele acima referido e ser somente ele a pessoa designada para fazer todos os transportes a que aludiu, com a frequência que indicou, ficando a ideia de que o seu depoimento poderá não ser totalmente verdeiro e imparcial e que poderá estar motivado pela intenção de fazer o favor de apoiar a tese do sócio-gerente da impugnante.
O depoimento da segunda testemunha, "VV", irmão do sócio-gerente da impugnante, valora-se no sentido de que também viveu na mesma casa situada no nº ... da Travessa do ..., até se casar em 1988, pelo que conhece esse local bem como a casa do emitente das faturas reputadas falsas, correspondente ao nº ... da mesma rua. Essa testemunha disse só conhecer o "BB", que foi viver para esse local depois de ele ter saído de casa dos pais no nº ..., porque veio a trabalhar em 2016/2017 para o seu irmão e, nessa função, foi carregar mercadorias ao anexo daquela casa, onde o "BB" trabalhava, ficando a convicção de que as instalações do nº ... eram pequenas e paupérrimas, constituídas por um “barraco” que o irmão destruiu quando abandonou o local, e as do nº ... eram ainda mais pequenas, situadas na traseira da casa onde foi “carregar”, e que essa movimentação era feita em braços porque o local não permitia a entrada das viaturas nem a utilização de máquinas de carga. Ou seja, era um local pouco apropriado para o exercício da atividade em causa nos autos.
O Tribunal não releva o depoimento da terceira testemunha, "UU", na parte relativa à atividade dos emitentes das faturas em causa nos autos ("BB" e "B.... Unipessoal Lda.") pelas seguintes razões:
– Não está relacionado com a atividade em causa (é empresário de um café situado noutro local) e apenas foi convidado a prestar depoimento por ser residente na mesma rua em que moram os intervenientes nos atos sob análise nos autos, de quem, sendo vizinho e dono do café, também será amigo ou com quem interessa ter boas relações por razões de comerciais e de vizinhança (ou seja, existem condições para que o depoimento não seja imparcial);
– A testemunha limitou-se a afirmar que mora no apartamento do ... andar, mesmo em frente à casa do "BB" (com o nº ...) e que quando vai à sua varanda consegue ver os anexos dessa casa e que viu o "AA" a descarregar cortiça e sacos e que é proibido o acesso àquela rua para grandes cargas porque nesse percurso existe uma ponte que é muito fraca;
– Esse depoimento mostra-se muito vagos, sem precisar pormenores, como se se limitasse a dar cumprimento a um favor solicitado pelo impugnante e vizinho e amigo (e cliente do café) da testemunha;
– Quanto ao facto relatado (que viu descarregar cortiça em caso do vizinho "BB") vislumbra-se uma contradição ou hesitação, pois afirma que viu descarregar (a viatura) e que esta estava vazia e saía carregada; ora, tal operação não é de “descarga”, mas de carga; e, pelos vistos, terá assistido a isso por mero acaso (por ter ido à varanda nessa altura) e só terá visto tal coisa uma única vez (ou será que por acaso só assistia a operações de carga que afinal eram de carga?);
– De qualquer maneira, o Tribunal ficou com a convicção de que se, eventualmente, a testemunha viu realmente alguma movimentação de cortiça naquele local, isso terá acontecido muito esporadicamente (pelos factos acima referidos) e em quantidades praticamente despiciendas, na medida que a própria testemunha afirma que não havia acesso a meios de transporte para grandes cargas e se percebe, pelas fotografias e pelos depoimentos dos inspetores tributários, que o referido anexo é muito pequeno, sem capacidade de armazenamento e o acesso à rua é muito estreito e impossibilita a utilização de máquinas de carga, pelo que o manuseamento para cargas e descargas teria ser feito à força de braços (relembre-se que segundo o impugnante cada fardo pode pesar de 70 a 85 kg e uma palete pode pesar de 700 a 1000 kg). Deste testemunho também não se consegue retirar suporte para a alegação de que o referido "BB" e a sua empresa "B.... Unipessoal Lda." utilizavam as instalações da casa ao lado, alegadamente pertencentes à avó daquele, a qual também não tem acesso direto para a rua.
O tribunal considera que os depoimentos da quarta e quinta testemunhas, inspetores tributários, foram prestados com coerência interna e externa e com serenidade e aparente confiança, sinceridade e imparcialidade, e estão suficientemente corroborados pelos documentos juntos aos autos.
A quarta testemunha, "MA", chefe da equipa de inspeção que fiscalizou a situação tributária dos emitentes das faturas e da impugnante afirmou que participou em quase todos os respetivos atos externos e que visitou pelo menos 4 vezes as instalações do "BB" e da sua sociedade, localizada na casa do nº ... da Travessa do ..., onde nunca viu alguém a trabalhar nem máquinas nem cortiça e apenas viu alguns sacos de rolhas, conforme fotografias de fls. 50 a 53 do Relatório anexo em suporte de papel, e que o Sr. "BB" lhes disse que aquele era o local da atividade da empresa e nunca lhes falou na casa do lado, pelo que não sabe a quem ela pertence.
Sem prejuízo do que ficou dito, o Tribunal considera que a testemunha formulou juízo errado quanto à possibilidade de haver cortiça da impugnante armazenado no estaleiro da “caldeira "R"”, facto em que manifestamente não acredita por entender que a cortiça só ali entra para ser cozida e não poder ficar meses no estaleiro.
No entanto, isso não permite concluir que alguma da cortiça descrita nas faturas reputadas falsas possa ter sido transportada de casa no "BB" ou da sede da sua empresa, situada no nº ... da Travessa do ..., ou das instalações de algum dos seus fornecedores, diretamente para a “Caldeira "R"” para ali ser cozida, na medida em que nada nos autos aponta nesse sentido e tal possibilidade nem sequer vem invocada.
A quinta testemunha, AA, disse que inspecionou a atividade de "BB" e que se deslocou 2 vezes às instalações e só lhe mostraram o anexo localizado na traseira da casa com o nº ... e não conhece a existência de outras instalações.
Do Relatório que fez consta que teve oportunidade de ver apenas uma palete com pedaços de cortiça de má qualidade e em mau estado.
Do conjunto da prova produzida resulta a convicção de que as instalações dos emitentes das faturas reputadas falsas se limitam ao anexo localizado na traseira da casa nº ... da Travessa do ..., em ....
De fls. 25 do Relatório da inspeção à atividade de "BB", após a descrição da casa junto dos anexos onde exerce a atividade, consta a seguinte frase: “"BB" exerce a atividade nuns anexos, que diz pertenecerem à sua avó e situam-se junto à casa de habitação”. Ora, do contexto da frase e dos depoimentos dos inspetores o Tribunal retira a conclusão de que o seu autor pretendia dizer que a atividade é exercida exclusivamente no anexo situado nas traseiras da casa nº ..., único que lhes foi mostrado, e que esse local coincide com os tais anexos que "BB" diz pertencerem à sua avó, uma vez que desconhecia quaisquer instalações situadas na casa contigua a essa (que segundo o sócio-gerente do impugnante pertenceria ao sogro daquele).
O que se conseguiu apurar foi apenas que o "BB" casou e foi viver, depois de 1988 (pelo que até então não era conhecido pela segunda testemunha, que vivia no nº ... dessa rua e dali saiu quando casou em 1988), para o nº ... da Travessa do ..., para uma casa arrendada por cerca de € 250, ao lado da casa do sogro, e que na traseira da sua casa havia um pequeno anexo onde exercia a sua atividade e a atividade da sociedade que veio a constituir, usando gratuitamente essas instalações pertencentes à sua avó (ou à avó da sua mulher?), enquanto o seu sogro exerceria na casa ao lado alguma atividade do ramo da cortiça (conforme depoimento da terceira testemunha, que disse tê-lo conhecido, que terá falecido em 22/7/2008, segundo informação constante a fls. 24 do Relatório anexo em suporte de papel).
Em suma: do conjunto da prova apurada resulta a convicção de que "BB" e a sua empresa não tinham as condições empresariais, materiais, humanas e financeiras, indispensáveis para a prática das operações faturadas à agora impugnante, como melhor se verá em seguida.

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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar, alega a Recorrente que a sentença padece de nulidade por contradição entre a matéria provada e a motivação e entre a matéria provada e a decisão.
Assim, alega a Recorrente que não resulta da matéria de facto provada que as faturas emitidas, para a Impugnante, no "BB" e «"B.... Unipessoal Lda."», não titulam qualquer operação económica real, pelo que não poderia o tribunal a quo decidir como decidiu, uma vez que os factos provados são contrários à fundamentação da decisão tomada.
Relativamente a esta alegação de recurso, já de pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte em Acórdão proferido em 5 de maio de 2022, no Processo n.º 1122/19.0BEAVR, que versou sobre a mesma exata matéria de facto e sobre sentença em tudo idêntica à aqui recorrida (até porque o julgador era o mesmo), mas em processo em que estava em causa o IRC dos mesmos exercícios de 2013, 2014, 2015 e 2016. Assim, tratando-se de igual situação e de processo em tudo idêntico a este, incluindo a motivação da sentença, bem como as alegações e conclusões de recurso, aderimos ao mesmo, por concordarmos com o seu teor, pelo que passamos a transcrever o segmento onde foi analisada esta alegação:
«1ª Questão
É nula, a sentença recorrida, nos termos dos artigos 615º nº 1 alª c) do CPC e 125º do CPPT, isto é, por haver contradição entre a fundamentação e a decisão, já que não resulta da matéria de facto provada que as facturas emitidas em 2013, 2014, 2015 e 2016 por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." para a recorrente não titulam qualquer operação económica real, mas a decisão de improcedência da Impugnação pressupõe a prova disso?
Antes de tudo há que deixar dito que, uma vez que o artigo 125º nº 1 do CPPT prevê expressa e literalmente, como mesma causa de nulidade da sentença, a contradição entre os fundamentos e a decisão, não tem sentido invocar a um tempo também a norma do CPC com o mesmo fim. A ocorrer a nulidade invocada, a norma que a comina é apenas o nº 1 do artigo 125º do CPPT.
A alegação, porém, não procede. Vejamos porquê.
Em primeiro lugar, cumpre ter presente que não é pressuposto indefectível da desconsideração dos custos titulados em factura o documento equivalente a prova cabal da falsidade da mesma.
Conforme a conjugação dos artigos 74º nº 1 e 75º nºs 1 e 2 aª a) da LGT, a Contabilidade devidamente organizada e mantida confere ao contribuinte a presunção da sua correspondência com a realidade. E em princípio é da AT o ónus de provar os factos integrantes da matéria tributável. Mas se a AT invocar e provar factos de que decorram fundados indícios de que a contabilidade não espelha, antes oculta, factos relevantes para a determinação e quantificação da matéria tributável, então passa a ser do contribuinte o ónus de provar a veracidade qualitativa e quantitativa da sua matéria tributável.
Assim, não era necessário à AT alegar, nem à sentença dar por provada a falsidade das facturas, com a consequente “falsidade” da contabilidade, para decidir efectuar as correcções técnicas que efectuou à matéria tributável.
Bastava-lhe a prova de factos capazes de descredibilizarem, nos sobreditos termos, a contabilidade da impugnante.
De todo o modo, mesmo que fosse necessário provar a falsidade das facturas em causa, para ser licita e devida a desconsideração dos custos nelas mencionados, a falta da menção dessa prova apenas poderia dar azo a um erro de julgamento, designadamente um erro de direito, por se aplicar uma norma a um conjunto de factos a que ela não era aplicável.
Contradição entre os fundamentos e a decisão, apenas haveria se o Mº Juiz recorrido tivesse julgado que AT não se desempenhara do ónus de provar os factos geradores de indícios fundados de que as operações tituladas nessas facturas não haviam ocorrido e, ainda assim, tivesse inexplicavelmente decidido que a impugnação improcedia.
Não foi isso que se aconteceu nem é isso que a recorrente alega ter ocorrido.
Na verdade, a fundamentação de direito da sentença é redutível, precisamente ao juízo de que, atentos os factos apurados no RIT e provados em juízo suscitam-se fortes indícios da falsidade das facturas, pelo que cumpria à impugnante ter alegado e, depois, provado os factos concretos integrantes da correspondência das facturas com a realidade, o que esta não fez, pelo que foi lícita e devida, quer a desconsideração dosa custos nelas titulados, quer a tributação autónoma, como não documentados, desses custos, no que, tenha ou não razão o Mº juiz a quo, não há sombra de contradição.
Portanto improcede a alegação de nulidade da sentença.» (Fim de citação)

Poderemos acrescentar que, é suficiente que a Autoridade Tributária demonstre os factos-índice em que se baseia para afirmar que as operações tituladas pelas faturas não correspondem a verdadeiras e reais transações comerciais, para que passe a impender sobre o contribuinte o ónus da prova da efetiva realização dessas operações materiais. Assim, se o Tribunal confirmar a existência desses factos índice, não precisa de dar como não provado que as faturas não titulam verdadeiras operações económicas, bastando-lhe confirmar a existência desses factos índice e dizer que o contribuinte não faz prova da existência de verdadeiras operações económicas.
Portanto, como a Autoridade Tributária não tem de demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, da mesma forma, não carece o Tribunal de dar como provado, ou melhor, como não provado, que as operações tituladas nas faturas não são verdadeiras, bastando confirmar o juízo de falsidade das faturas realizado pela AT e dizer que o contribuinte não logra provar a materialidade das operações tituladas nas faturas. Veja-se, entre outros, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 17/02/2016, proferido no processo n.º 0591/15 ou o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 20/04/2017, tirado no processo n.º 00455/07.2BEPRT; assim como o Acórdão, também deste Tribunal Central Administrativo Norte de 05/03/2020, proferido no processo n.º 00177/17.6BEPNF; bem assim como o Acórdão, igualmente deste Tribunal Central Administrativo Norte de 17/03/2022, tirado no processo n.º 00376/9.6BEPRT (todos em ww.dgsi.pt).
Em face do exposto, improcede a alegada nulidade de sentença.
*
Em segundo lugar, alega a Recorrente que existe matéria de facto incorretamente julgada.
Para o efeito alega que o Tribunal devia ter dado como provado a matéria invocada nos pontos 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158 e 165.
Não obstante, a Recorrente nas suas alegações também se referir aos pontos 130, 132.º, 133.º, 155.º a 162.º e 165 da Petição Inicial, verifica-se que nas conclusões apenas se refere aos pontos 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158 e 165, conforme se pode ver pelas conclusões 89 e 108, pelo que é somente sobre estes pontos que o tribunal se pode pronunciar, na medida em que é sobre as conclusões que o recurso deve ser apreciado.
Conforme refere o Conselheiro Abrantes Geraldes, em anotação ao artigo 635.º do Código de Processo Civil, na sua obra, Recursos em Processo Civil, (6.ª edição, 2020, Almedina), na pág. 135: «Independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição, é-lhe ainda legítimo restringir o objeto do recurso nas alegações ou, mais concretamente, nas respetivas conclusões, indicando qual a decisão (a parte da decisão) visada pela impugnação. Em resultado do que consta no art. 639.º, n.º 1, as conclusões delimitam a área de intervenção do tribunal as quem, exercendo uma função semelhante à do pedido, na petição inicial, ou à das exceções, na contestação. Salvo quando se trate de matéria de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo e que não se encontrem cobertas pelo caso julgado, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem.».

Vejamos, então o que está alegado nos pontos 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158 e 165.º do articulado inicial desta Impugnação, efetuando-se a respetiva transcrição.
«150. A impugnante tem adequada estrutura empresarial suscetível de exercer a atividade declarada;
151. Possuindo para o efeito o pessoal necessário para o exercício desta atividade,
152. Possuía o equipamento necessário para o exercício da sua atividade;
153. A sua atividade consistia na Indústria da cortiça
154. A sua contabilidade está organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, é executada com recurso a sistemas informáticos e adota o Sistema de Normalização Contabilística- SNC, aplicando as NCFR adequadas para esta empresa;
155. Todos os lançamentos estão apoiados em documentos justificativos, datados e suscetíveis de serem apresentados sempre que necessários;
156. Cumpriu atempadamente com as suas obrigações declarativas, quer ao nível do IRC quer ao nível do IVA;
157. Mantém em boa ordem um processo de documentação fiscal, relativo a cada exercício;
158. Cumpriu com as suas obrigações sociais;».
Por sua vez, no ponto 165, refere o seguinte:
«165. Devendo ser aceite a dedução de IVA liquidado nas faturas em causa emitidas por "BB", NIF ... e "B.... Unipessoal Lda." Unipessoal, NIF ... e consequentemente anuladas as liquidações relativas a 2013, 2014, 2015 e 2016».

Analisadas as transcritas alegações, verifica-se que as mesmas não compreendem matéria de facto, no sentido de corresponderem a factos simples passíveis de poderem ser levados ao probatório.
O que a Recorrente invoca, não são factos simples, mas antes generalidades, matéria vaga e conclusiva ou afirmações sobre o eventual modo genérico de funcionamento da atividade da Impugnante. Bem assim, como pretende levar à matéria de facto a solução do litígio, segundo se pode ver pela redação do ponto 165, que não contém factos, mas antes a sua perspetiva sobre o desfecho da causa.
As partes estão obrigadas a alegar factos concretos, que correspondam a factos essenciais, que são aqueles cuja verificação depende a procedência ou improcedência da ação ou da defesa – vide artigo 5.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
Ora, se a Impugnante afirma que as operações tituladas nas faturas são reais, então os factos que tinha de alegar e provar eram aqueles factos concretos que suportavam a emissão das faturas. Ou seja, tinha de descrever os elementos respeitantes a cada situação titulada pelas faturas, explicando cabalmente a operação que estava descrita em cada fatura, de modo a provar a materialidade das operações. Essa, sim, é que poderia ser matéria de facto que o tribunal teria de apreciar, não o funcionamento genérico da atividade da Impugnante ou mesmo o alegado cumprimento geral das suas obrigações legais, pois tais situações em nada demonstram os negócios concretos da empresa, em relação às faturas aqui em apreço.
Isto porque, tendo a Autoridade Tributária considerado que havia fortes índicos de as faturas não corresponderem a verdadeiras operações económica, juízo esse secundado pelo Tribunal; competia ao contribuinte infirmar esse juízo e apresentar factos concretos da ocorrência das operações tituladas nas faturas em crise, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência.
Neste sentido veja-se o Acórdão do TCA Norte de 24/01/2008, proferido no processo n.º 01834/04 – Viseu, de onde se retira a seguinte passagem do sumário:
«No caso da liquidação adicional de IVA ter por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, à AT compete apenas fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, competindo então ao contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do art. 19.º do CIVA, não lhe bastando criar dúvida a esse respeito, pois o art. 121.º, n.º 1 do CPT, a que corresponde hoje igual número do art. ....º do CPPT, não logra aplicação, pois não é a AT quem está a invocar a existência de um facto tributário não declarado ou a atribuir a um facto tributário uma dimensão diferente da declarada (caso em que seria de decidir contra ela a dúvida), mas antes é o contribuinte quem invoca o seu direito à dedução do imposto que diz ter suportado a montante, motivo porque a dúvida aa esse propósito lhe é desfavorável, de acordo com a regra geral do art. 234.º do CC.»
Portanto, tendo a sentença considerado adequado o juízo efetuado pela AT de que as faturas indiciavam que as operações nelas tituladas não correspondiam a verdadeiras operações económicas, competia, em sede de recurso, rebater os fundamentos da sentença que confirmaram o juízo de falsidade das operações; o que não logra fazer.
Assim, encontrando-se a matéria de facto devida e exaustivamente motivada, designadamente no que respeita ao depoimento das testemunhas, competia à Recorrente, rebater tal motivação e não limitar-se a reafirmar o que alegou na Petição Inicial. Nem a indicação ou transcrição dos depoimentos é suficiente, na medida em que se não for sindicada a concreta motivação, a mera transcrição de depoimentos não é bastante para contrariar a motivação da sentença.
Acerca da necessidade de o recorrente ter de sindicar a motivação do tribunal recorrido, cita-se o Conselheiro António Abrantes Geraldes, que no seu livro, “Recursos em Processo Civil” (6.ª ed. julho de 2020, Almedina), a págs. 184 e 185 em anotação ao artigo 639.º do Código de Processo Civil, escreve o seguinte:
«As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 635.º, n.º 3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões do recurso devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende do tribunal superior, em contraposição com o que foi decidido pelo tribunal a quo. Incluindo, na parte final, o resultado procurado, as conclusões devem respeitar, na sua essência, cada alínea do n.º 2, integrando-se as respostas a tais premissas essenciais no encadeamento lógico da decisão pretendida. Se para atingir o resultado declarado o tribunal a quo assentou em determinada motivação, dando respostas às diversas questões, as conclusões devem elencar os passos fundamentais que, na perspetiva do recorrente, deveriam ter sido dados para atingir um resultado diverso.».
Aliás, relativamente a esta alegação de recurso, já de pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte em Acórdão proferido em 5 de maio de 2022, no Processo n.º 1122/19.0BEAVR, que versou sobre a mesma exata matéria de facto, mas em processo em que estava em causa o IRC dos mesmos exercícios de 2013, 2014, 2015 e 2016. Assim, tratando-se de igual situação e de processo em tudo idêntico a este, incluindo a motivação da sentença, bem como as alegações e conclusões de recurso, aderimos ao mesmo, por concordarmos com o seu teor, pelo que passamos a transcrever o segmento onde foi analisada esta alegação:
«2ª Questão
Errou, o Mº Juiz a quo, quanto ao julgamento em matéria de facto, por não “ter levado aos factos provados os factos constantes dos artigos 130º, 132º, 133º, e 155º a 162º da Petição Inicial, atentos a prova testemunhal, as declarações de parte e os anexos 16 e 21 do RIT?
Os “factos” indevidamente não levados à discriminação dos factos provados seriam os seguintes:
130º
«“Os serviços de inspecção, no seu relatório, referem que: "No âmbito do presente procedimento inspectivo e da análise à contabilidade da sociedade Unipessoal «A... Unipessoal, Lda.», foi verificado que todos os pagamentos efectuados a "BB" e "B.... Unipessoal Lda." foram através de transferência bancária ou cheque, conforme cópia que se anexa”
131º
Mais referem, e passamos a citar:
132º
“Conforme já vimos, na análise bancária efectuada às contas de "BB" e "B.... Unipessoal Lda.", as transferências bancárias / Cheques, são seguidos de levantamentos em numerário e no caso de alguns cheques por vezes são levantados ao balcão, desconhecendo-se assim o destino final do dinheiro”.
133º
E, acrescenta mais: “Junta-se ao presente relatório o anexo 21 onde consta uma listagem contendo as facturas que "BB" e "B.... Unipessoal Lda." emitiram a favor do «A... Unipessoal, Lda.» e respectivo meio de pagamento. Após análise destes elementos e do extracto da conta Bancos, verificou-se que, estes cheques e transferências bancárias, serviram para saldar as facturas de "BB" e "B.... Unipessoal Lda.". Junto se anexa ('anexo 14) extracto bancário comprovativo destes pagamentos, bem como cópia dos documentos comprovativos da transferência bancária e dos cheques bancários."»
155º a 162º:
«“155. A impugnante tem adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada;
156. Possuindo para o efeito o pessoal necessário para o exercício desta actividade,
157. Possuía o equipamento necessário para o exercício da sua actividade;
158. A sua actividade consistia na Indústria da cortiça
159. A sua contabilidade está organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, é executada com recurso a sistemas informáticos e adopta o Sistema de Normalização Contabilística- SNC, aplicando as NCFR adequadas para esta empresa;
160. Todos os lançamentos estão apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessários;
161. Cumpriu atempadamente com as suas obrigações declarativas, quer ao nível do IRC quer ao nível do IVA;
162. Mantém em boa ordem um processo de documentação fiscal, relativo a cada exercício;”»
Por fim, o artigo 165º:
«Todas as operações económicas tituladas pelas facturas em causa emitidas por "BB" e "B.... Unipessoal Lda." Unipessoal (fls 12 a 15 do relatório) são reais»
Há que questionar, antes de mais, se efectivamente a Mª Juiz a qua deveria ou não ter-se pronunciado expressamente sobre a prova ou não prova destes – assim chamados –factos, pois só então poderá ter ocorrido a indevida omissão, que a recorrente classifica como erro de julgamento. Só depois, no caso afirmativo, se poderá colocar a pergunta sobre se estes “factos” deviam ter sido julgados provados ou não provados.
Dispõe, o artigo 123º nº 2 do CPPT, que na sentença tributária o juiz “discriminará a matéria provada da não provada, fundamentando as decisões”.

Decorre do artigo 5º do CPC, aplicável ex vi 2º do CPPT, quais facto são esses, os atendíveis e carentes de prova:
“Ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal
1 - Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas.
2 - Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
Factos a discriminar como provados ou não provados, portanto, apenas podem ser os factos alegados pelas partes, os instrumentais e também os complementares dos primeiros, desde que sujeitos a oportuno contraditório.
Não se diga que basta a menção dos factos provados se estes são suficientes para a solução preconizada pelo tribunal e, quando muito, os não provados cuja não prova releva para a mesma solução.
Na verdade, se o direito ao contraditório é um direito processual que se filia num direito liberdade e garantia constitucional (o direito a uma tutela jurisdicional efectiva: artigo 20º nº 1 da Constituição) é dever do juiz pronunciar-se sobre a prova ou não prova de todos os factos alegados e relevantes, ainda que só para a solução do litígio preconizada por uma parte, de modo a que esta possa exercer o contraditório e o recurso também quanto à solução jurídica por si preconizada.
O vindo a expor carece de uma advertência sobre o que não é silêncio da sentença em matéria de facto: assim, quando da prova de um facto, devidamente fundamentada, resulta logicamente a não prova de outro, também ele alegado, o que sucede, verdadeiramente, é haver pronúncia, tácita, mas clara, e até fundamentada, pela não prova deste, não sendo, assim, indispensável, para cumprir com a artigo 123º citado, uma expressa referência à sua não prova.
Desçamos ao caso concreto.
Os alegados factos que alegadamente deviam ter sido levados ao probatório consistem em artigos da PI, pelo que, a tratar-se de alegações de matéria de facto, deviam em princípio ser discriminadas como provadas ou não provadas. Vejamos, porém, se se trata de factos e se foram efectivamente omissos:
Das proposições acima transcritas, que a recorrente alega que deveriam ter sido objecto de discriminação como provadas, as primeira três têm por objecto imediato excertos do teor do Relatório da Inspecção tributária.
Que o RIT tem este ou aquele teor, é um facto susceptível de prova.
Porém, não se pode dizer que tal facto seja omisso na enunciação dos factos provados, pois todo a emissão do relatório da Inspecção, com o respectivo teor, está dada como provada no artigo 28º da enunciação dos factos julgados provados.
Como assim, improcede a alegação de omissão de selecção como facto provado, do facto objecto de menção nos artigos 130º a 133º da Petição Inicial.
Passemos aos artigos 155 a 162º e 165º:
Os artigos 155º a 157º e 159º a 162º não enunciam factos, mas conclusões, quando muito proposições genéricas sobre factos aludidos de modo indeterminado e insusceptíveis de um juízo de prova, portanto.
Efectivamente, cumpre alertar para uma distinção: uma coisa são proposições gerais ou indefinidas sobre factos, outra são afirmações de factos concretos, individuais ou, se plurais, quantificados, situados no tempo e no espaço. Só estas são susceptíveis de prova porque só elas têm por objecto acontecimentos históricos ou realidades permanentes do mundo das coisas, que ocorreram ou ocorrem no mundo real e, portanto, podem ser objectivamente conhecidos. Aquelas outras, ainda que mediatamente tenham por objecto indefinidas realidades, acontecidas no espaço e no tempo, relevam sempre de uma conclusão cujos objectos de facto ficam por concretizar, pelo que não podem ser simplesmente conhecidos, logo, não podem ser objecto de prova. Nem mesmo a “validade” dessas conclusões é sindicável se não se conhecer os factos individuais sobre que os respectivos juízos são feitos.
Assim, quando o legislador dispõe que o juiz discrimine, na sentença, os factos provados e não provados, refere-se apenas à segunda espécie daquelas proposições: proposições sobre factos concretos, susceptíveis de prova.
Visto que não se trata de factos concretos, não tinham que nem podiam ser “levados” aos factos provados.
Como assim, não se pode dizer que que devessem ser discriminadas como provadas ou não provadas as proposições, acima transcritas, dos artigos 155 a 157 e 159 a 162 da Petição.
O artigo 165º também consiste numa proposição de carácter genérico, cuja veracidade depende da veracidade, um a um da pluralidade de factos concretos mencionados nas facturas.
Tal como se refere na sentença recorrida, ficamos sem saber – porque não foram alegados – que eventos concretos, circunstanciados, estariam subjacentes às facturas cuja autenticidade a Recorrente sustenta genérica e indefinidamente. Esses, sim, seriam factos a discriminar como provados ou não provados, se alegados.
Já artigo 58º, esse, corresponde ou está contido no artigo 1º dos factos dados como provados.
Em suma, não se impunha, antes estava legalmente vedado ao Mº Juiz descriminar, fosse como provadas fosse como não provadas, as proposições genéricas e ou conclusivas veiculadas pelos artigos 130º, 132º, 133º, 155º a 162º e 165º, todos da Petição. Quanto à preposição contida no artigo 158º, essa, sim, um facto concreto, está contida no facto provado 1º, pelo que tão pouco está em falta a sua selecção como facto provado e relevante.
Se não era devida a especificação das sobreditas proposições na matéria de facto provada e não provada, então está prejudicada a procedência da alegação de erro na apreciação da prova quanto a tais “factos” por não terem sido julgados como provados.
Improcede, pois, em toda a linha, a alegação do assim chamado erro de julgamento em matéria de facto.» (Fim de citação)

Em face do exposto, improcede a alegação da Recorrente, ora em análise.
*
Em terceiro lugar, invoca a Recorrente que ocorre erro de julgamento no que concerne à repartição do ónus da prova e à ausência de indícios sérios de simulação de veracidade das operações económicas subjacentes às faturas em apreço.
Também quanto a esta alegação de recurso, já de pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte, no já mencionado Acórdão de 5 de maio de 2022, tirado no Processo n.º 1122/19.0BEAVR, que versou sobre a mesma exata matéria de facto, mas em processo em que estava em causa o IRC dos mesmos exercícios de 2013, 2014, 2015 e 2016. Assim, tratando-se de igual situação e de processo em tudo idêntico a este, incluindo a motivação da sentença, bem como as alegações e conclusões de recurso, aderimos ao mesmo, por concordarmos com o seu teor, pelo que passamos a transcrever o segmento onde foi analisada esta alegação:
«3ª questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de facto e no julgamento de direito, ao concluir que a AT recolhera indícios fundados de que as facturas emitidas por "BB" e por "B.... Unipessoal Lda.". não correspondiam a negócio reais, imputando, consequentemente à Impugnante o ónus de provar a realidade dos mesmos, em violação, dessa feita, dos artigos 74º nº nº 1 e 75º nº 1 da LGT?
Na fundamentação de direito da sentença vem criteriosamente exposto como a conjugação dos factos provados 3 a 31, uns atinentes aos emitentes, outros ao utilizador, revela uma intensa inverosimilhança – em alguns aspectos uma impossibilidade prática – da autenticidade das sobreditas facturas.
Os termos de tal exposição merecem a adesão deste Tribunal.
A prova dos factos de que relevam não é posta eficazmente em causa pela recorrente (cf. a discussão da questão anterior).
A Impugnante limita-se a criticar o juízo da AT sobre a falsidade das facturas, louvando-se na regra geral sobre o ónus da prova, contida no artigo 74º nº 1 da LGT, e na presunção de verdade da sua contabilidade, por bem organizada (artigo 75º nº 1 da LGT). Como dissemos a propósito da 2ª questão, ela não curou de alegar os factos históricos concretos, circunstanciados, porventura subjacentes às facturas desconsideradas, com que se haveria de se desincumbir do ónus que, atentos aquela demonstrada inverosimilhança e o disposto na alª a) do nº 2 do mesmo artigo 75º, sobre si incumbia: provar a veracidade do objecto de cada factura.
Como assim, bem andou o Mº Juiz a quo ao julgar que era da Recorrente o sobredito ónus e que a mesma não de desempenhou dele, pelo que o recurso tão pouco pode proceder por esta via.» (Fim de citação)

Acrescentaremos apenas que a Recorrente limita-se a mencionar que os indícios recolhidos são puras efabulações, dizendo depois que tem adequada estrutura empresarial, que possuía equipamento necessário para exercer a atividade, que cumpria a legislação comercial e fiscal, que os lançamentos são apoiados em documentos justificativos, que todas as operações económicas foram pagas.
Conforme já referido, a Recorrente carecia de sindicar concretamente a sentença e não de reafirmar o que disse em relação aos vícios alegados contra o ato impugnado. Ou seja, a Recorrente não contradiz a fundamentação exarada na sentença, pelo que não é suficiente voltar a reafirmar o que anteriormente alegou contra o ato impugnado.
Conforme também já referido, a Recorrente não logra apresentar factos concretos passíveis de convencerem de que as operações tituladas nas faturas corresponderam a verdadeiras transações económicas.
Acerca do que fica dito, cite-se o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 05/03/2020, proferido no processo n.º 00177/17.6BEPBF, cujo sumário é o seguinte:
I. Estando em causa indícios de faturação falsa, a AT não tem que provar a falsidade das faturas, bastando-lhe demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as faturas são «falsas» para cumprir o seu encargo probatório.
II. Feita esta prova indiciária, a lei faz cessar a presunção de veracidade creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à faturação em crise.

III. A prova a realizar pelo contribuinte tem que ser inequívoca, positiva, concludente e sem margem para qualquer dúvida da materialidade das operações faturadas. Tal prova deve, pois, ser concretizadora, em termos de tempo, espaço e valores envolvidos, no sentido da demonstração concreta de cada operação, esclarecendo a identidade do vendedor, a data da transação, os bens transacionados ou serviços prestados, o respetivo custo, etc.
IV. A exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, prevista nas alíneas a), b) e c) do nº1 do artigo 640.º, integra um ónus impugnatório primário, na medida em que tem por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto, sendo que a respetiva inobservância impede que o Tribunal de 2.ª instância aprecie o julgamento de facto realização em 1.ª instância

Desta forma, também nesta parte o recurso improcede.
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Por fim, alega a Recorrente que ocorreu violação do princípio do contraditório, na medida em que não lhe foram notificados os relatórios de inspeção dos sujeitos passivos inspecionados e considerados emitentes de faturação falsa, com isso violando-se o disposto no artigo 45.º, n.º 1 do Código de procedimento e de processo Tributário, bem como o artigo 8.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira.
Relativamente a este assunto temos que referir que se trata de questão nova no recurso, uma vez que sobre o assunto nada foi invocado na Petição Inicial.
Não obstante a Recorrente mencionar na Petição Inicial que desconhece o teor dos relatórios elaborados em relação aos sujeitos passivos considerados emitentes de faturas falsas, limita-se a dizer apenas isso, não invocando, nessa ocasião, nenhuma violação do direito de defesa ou do direito ao contraditório.
Assim, veja-se a vaga referência a tal situação no ponto 30 do articulado inicial. Aliás, a Impugnante remete para a Administração Tributária a responsabilidade de verificar os pressupostos da dedução do IVA, conforme se pode ver pelo que refere nos pontos 47 a 59 da Petição Inicial.
Conforme decorre do artigo 627.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, os recursos jurisdicionais são um meio processual específico de impugnação e de reexame de decisões judiciais e como tal, o tribunal de recurso está impedido de apreciar questões novas, com exceção daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou suscitadas pela própria decisão recorrida sob pena de se produzirem decisões em primeiro grau de jurisdição sobre matérias não conhecidas pelas decisões recorridas (neste sentido, veja-se Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, Volume II, 2007, pág. 786).
Na situação em apreço, não se está diante de questão de conhecimento oficioso, nem é matéria suscitada pela própria decisão recorrida, pelo carecia de ter sido invocada no articulado inicial.
Portanto, tratando-se de questão nova no recurso, não pode ser conhecida, conforme é entendimento firmado da jurisprudência. Vejam-se, entre outros, os seguintes Acórdãos: do Supremo Tribunal Administrativo, de 13.03.2013, proc. n.º 0836/12; de 28.11.2012, recurso 598/12, de 27.06.2012, recurso 218/12, de 25.01.2012, recurso 12/12, de 23.02.2012, recurso 1153/11, de 11.05.2011, recurso 4/11, de 1.07.2009, recurso 590/09, 04.12.2008, rec. 840/08, de 30.10.08, rec.112/07, de 2.06.2004, recurso 47978 (Pleno), de 2911.1995, recurso 19369 e do Supremo Tribunal de Justiça, recurso 259/06.0TBMAC.E1.S1, todos em www.dgsi.pt.).
Veja-se, também sobre o assunto, a anotação realizada pelo Conselheiro Abrantes Geraldes ao artigo 635.º do CPC, no seu livro, Recursos em Processo Civil, (6.ª edição, 2020, Almedina), a págs. 139-141, quando refere o seguinte:
«5. A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Seguindo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos seguido um modelo de reponderação, que visa o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso.

Assim da conjugação do n.º 1 do art.º 627.º, do n. º 2 do art.º 639.º e n.º 1 art.º 640.º, todos do Código de Processo Civil, resulta que o tribunal de recurso fica impedido de conhecer questões novas, ou seja, matéria que não tenha sido anteriormente alegada e apreciada; como é o caso da agora em apreço.
Em consequência, não se conhece este vício alegado inovadoramente neste recurso, conforme acima fundamentado.
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Face ao exposto, o recurso não merece provimento.
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No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
I - A Autoridade Tributária não tem de demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, da mesma forma, não carece o Tribunal de dar como provado, ou melhor, como não provado, que as operações tituladas nas faturas não são verdadeiras, bastando confirmar o juízo de falsidade das faturas realizado pela AT e dizer que o contribuinte não logra provar a materialidade das operações tituladas nas faturas.
II - As partes estão obrigadas a alegar factos concretos, que correspondam a factos essenciais, que são aqueles cuja verificação depende a procedência ou improcedência da ação ou da defesa e não a afirmar generalidades, matéria vaga e conclusiva ou afirmações sobre o eventual modo genérico de funcionamento da atividade da Impugnante.
III – Os recursos servem para impugnação e para reexame de decisões judiciais, estando o tribunal de recurso impedido de apreciar questões novas.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 12 de janeiro de 2023.

Paulo Moura
Vítor Salazar Unas
Ana Patrocínio)