Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01008/08.3BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/03/2022
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:MÉTODOS INDIRECTOS
RÁCIO DISTRITAL VERSUS NACIONAL
ERRO NA QUANTIFICAÇÃO.
Sumário:I. Ainda que caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar.
II. Quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” está devidamente fundamentado, se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados.
III. Estando provado nos autos que a utilização exclusiva daquele critério na determinação da matéria tributável conduziu em concreto a erro de quantificação, por assentar em rácios nacionais muito superiores ao rácio distrital, o que decorre dos factos apurados, deve o acto ser anulado.
Recorrente:CP..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Judicial - Liquidação de tributos - 1ª espécie - Recursos jurisdicionais [Del. 2186/2015]
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
1.1. CP..., Lda. (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual foi julgada totalmente improcedente a impugnação judicial contra a liquidação adicional de IVA, respeitante ao exercício de 2003, no valor global de € 94.119,14, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1ª – A decisão da matéria de facto da sentença recorrida deve ser modificada quanto aos pontos 6), 7), 8) e 9), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 712º, nº 1, alíneas a) e b) do CPC, com fundamento na impugnação da prova gravada e na interpretação da prova documental efectuada a quo, porquanto não reflectem a imagem fiel da prova, quer dos depoimentos das testemunhas que se encontram gravados, quer da prova documental junta aos autos relativa aos pontos em crise.
2ª – Na motivação da decisão da matéria de facto quanto ao facto 7), tal modificação justifica-se pelas seguintes razões:
a) Não ficou provada a impossibilidade de determinação da matéria tributária de IVA do anos de 2003 da Recorrente a partir da sua contabilidade, que estava formalmente organizada de acordo com o Plano Oficial de Contabilidade e os princípios contabilísticos, tendo a Recorrente entregue declarações de substituição para a correcção dos erros originados pela emissão informática das guias de remessa e os erros tipográficos;
b) A Recorrente justificou que os prejuízos reiterados tiveram origem nos seus elevados custos de estrutura, na forma concreta em que exerceu a sua actividade com apenas uma central de via seca e sem produzir os inertes e o cimento;
c) Não foram publicados os indicadores objectivos de origem técnico-científico para os anos de 2003, 2004 e 2005 para o sector no distrito de X...., o que não permite a aplicação dos rácios de lucros médios líquidos na determinação do volume de negócios da Recorrente naqueles anos para efeitos da liquidação do IVA.
d) A crise do sector da construção civil que se arrasta desde 2002, agravada pela entrada no mercado da empresa concorrente denominada I... Lda. com sede e instalações fabris situadas a menos de 500 metros da sede e instalações Fabris da Recorrente, que os IT deconheciam existir.
3ª – Na motivação da decisão da matéria de facto quanto aos factos 6), 8) e 9), tal modificação justifica-se pelas seguintes razões:
a) A Recorrente está localizada nos ZZ... e não exerce a sua actividade a nível nacional, pelo que, os rácios a aplicar na determinação das matérias tributárias impugnadas deveriam ter sempre em conta o exercício desta actividade localizada no distrito de X...., em vez do exercício de uma actividade a nível nacional que nunca exerceu;
b) A Recorrente apenas possui uma central de produção de betão pela via seca;
c) A Recorrente não tinha nos anos de 2003, 2004 e 2005 a certificação de qualidade;
d) A Recorrente possui 8 empresas concorrentes as actuarem e com instalações fabris no distrito de X...., causando forte concorrência;
e) Os custos de estrutura da recorrente eram nos anos de 2003, 2004 e 2005 muito pesados;
4ª – É ilegal a aplicação aos presentes autos de métodos indirectos de avaliação com fundamento na impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (alínea b) do art.º 87 da L.G.T., na numeração vigente no período temporal sobre que incidiu o procedimento inspectivo pois a Recorrente possuía a sua contabilidade organizada segundo os princípios contabilísticos e o Plano Oficial de Contabilidade (POC).
5ª A existência reiterada de prejuízos fiscais ao longo da actividade da Recorrente justifica-se pelas razões seguintes:
a) Desenvolve a sua actividade num sector extremamente competitivo, o que é público e notório, sendo que só no distrito de X.... existiam, pelo menos, desde finais da década de 1990 as seguintes empresas concorrentes produtoras de betão pronto concorrentes: B... SA (em X....); U... (em X....); BM...; I... (ZZ...); AA (E); AA (...); BR... (...); BR... (...)
b) Os pesados custos de estrutura;
c) A falta de certificação da qualidade dos produtos;
d) A reduzida dimensão do mercado;
e) A não produção de inertes e de cimento utilizado como matérias-primas;
6ª – O RF, bem como os depoimentos prestados pelos inspectores tributários em julgamento, revelam o desconhecimento da AT dos elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tinham relações económicas com o contribuinte a localização e dimensão da actividade exercida e os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade.
7ª – Só por si, este facto é determinante de erro grave e notório da determinação e quantificação da matéria tributável em sede de IVA do ano de 2002 impugnada, já que, como resulta do RF e das declarações produzidas em sede de julgamento pelos ITs, eles não tiveram em consideração este facto quando determinaram e quantificaram aquelas matérias tributáveis; o desconhecimento pelos IT destes factos, ou sejam, de entre outros, a dimensão do mercado, o número de empresas concorrentes no mercado, a dimensão da actividade exercida pela Recorrente, as condições concretas dos preços por ela praticados comparados com os preços praticados pelos concorrentes e sem fundamentos de facto e de direito objectivos para a utilização na determinação das matérias colectáveis impugnadas, dos valores a nível nacional do rácio R17 sem que tivessem informado a Recorrente das empresas, respectivas localizações e dimensão da actividade a partir das quais aquele rácio foi coligido, consubstanciam, a violação do exercício pela Recorrente do direito ao contraditório e fundamentam erro grave e notório de qualificação e quantificação das matérias colectáveis impugnadas.
8ª – Os ITs sem quaisquer fundamentos de facto e de direito concretos e objectivos não aceitaram as justificações da Recorrente para os reiterados prejuízos, violando o disposto nas alíneas d), e) e f) do nº 1 do artigo 90º da LGT.
9ª – Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, tal como constam das condições de adjudicação dos contratos de construção de edifícios ou outras construções para os organismos ou entidades públicas era, como é, obrigatório que os fornecedores do betão e dos outros materiais a utilizar nas empreitadas de construção civil públicas, tivessem e tenham a certificação da qualidade dos produtos de acordo com a norma ISSO9001; pelo menos, até meados do ano de 2006, a Recorrente sempre esteve impedida de concorrer para fornecer betão às obras em virtude de não possuir a certificação da qualidade dos seus produtos segundo a norma ISO9001.
10ª – Os seus clientes habituais eram os construtores civis, pois que, nas obras particulares de pequena dimensão, o betão era praticamente todo feito em obra pelos empreiteiros utilizando para o efeito as betoneiras; excepcionalmente, um ou outro empreiteiro é que utilizava o betão pronto apenas e só quando colocava a placa de piso ou de telhado do prédio, sendo todo o restante betão tanto para assentar os tijolos como para rebocar e arear as paredes feita em obra pelos empreiteiros; porém, a Recorrente não podia fornecer estas obras por lhe ser exigida a certificação da qualidade do betão que produzia de acordo com a norma ISO9001 do seu betão; daí a decisão in extremis da Recorrente em efectuar novo investimento na substituição da central de via seca por uma central de via húmida, na criação de um laboratório capaz de nele serem efectuados testes aos produtos mais precisos e rigorosos e num sistema de controlo de qualidade, totalmente financiado por capitais próprios do sócio BB.
11ª – Andou mal o Tribunal a quo ao decidir que a Recorrente podia fornecer as obras públicas (o que não é verdade) e que não havia crise no sector da construção civil nos anos de 2002 a 2005, sem especificar que a crise iniciou em 2002 relativamente às obras particulares e que as obras públicas lançadas em 2005 pelo Governo tinham por objectivo compensar a crise das obras particulares, que afectou particularmente a Recorrente por ser o segmento de mercado onde esta actuava.
12ª – Só a partir de meados do ano de 2006 é que a Recorrente passou a ter a sua produção certificada pela norma ISO9001 necessária para poder fornecer as grandes obras públicas, pelo que, a conclusão transcrita porque se refere à expansão das obras públicas, lançadas pelo Governo precisamente para compensar a crise que por aquela altura já se vivia nas obras particulares, que era o segmento de mercado em que a empresa actuava, como é do conhecimento público, não serve para o tribunal a quo justificar que a crise na construção civil no ramo das obras particulares não teve início nos finais do ano de 2002 e princípios do ano de 2003.
13ª – Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, no caso da Recorrente, a crise teve efectivamente início durante o ano de 2002 quando começou a crise nas obras particulares, pois que, até ao ano de 2006 não estava em condições de beneficiar com o lançamento das obras públicas, facto que, foi determinante apenas para a sua decisão de efectuar um novo reinvestimento em equipamento moderno e no controlo de qualidade com vista à certificação dos seus produtos para desse modo poder fornecer a obra pública; por isso, andou mal o Tribunal a quo ao não considerar provada a existência de erro grave e notório na determinação das matérias tributárias impugnadas, de ilegalidades e de contradição da necessária e essencial fundamentação de facto e de direito no recurso aos métodos indirectos de determinação da matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da Recorrente.
14ª – Do RF consta expressamente o investimento em novos equipamentos, pelo que, é óbvio que o foi porque a central de betão que a Recorrente utilizava nos anos de 2003, 2004 e 2005 estava velha e/ou tecnologicamente desactualizada, facto que foi confirmado pelas testemunhas em sede da audiência de julgamento, ao contrário do entendimento perfilhado pelo tribunal a quo; mesmo assim, perante tal evidência, andou muito mal o Tribunal a quo quando entendeu que, tal como consta do RF, que nos anos de 2003 2004 e de 2005 a Recorrente possuía uma central de via seca o que lhe conferia vantagens competitivas em relação aos concorrentes.
15ª – No RF os ITs não fundamentaram a contradição entre a sua afirmação de a tecnologia de via seca da central da Recorrente constituir uma enorme vantagem competitiva e o investimento que ela efectuou durante o ano de 2006 para substituição da central de via seca por uma central com a tecnologia de via húmida, o que inquinou a qualificação e quantificação da matéria tributária impugnada.
16ª – No RF os ITs não fundamentam porque é que sendo a tecnologia da via seca tão vantajosa, todas as restantes empresas concorrentes da Recorrente (ao todo 8), a operarem no distrito de X...., utilizavam a tecnologia da via húmida, sendo certo que dentre elas constam os maiores fabricantes portugueses de betão, casos dos grandes grupos económicos do sector da produção de cimento C..., SA, Bl..., SA e L..., SA, e revelam o desconhecimento das condições concretas e objectivas de produção da Recorrente.
17ª – Os elevados custos de estrutura da Recorrente, que apesar de possuir apenas uma central e um reduzido volume de negócios quando comparado com as empresas de grande dimensão suas concorrentes, casos da C..., SA, da Bl..., SA e do grupo L..., SA, a verdade é que tinha de suportar os custos de investimento e de funcionamento de um laboratório para o controlo da qualidade dos seus produtos, escritórios com os respectivos empregados, vendedores para visitarem os clientes no distrito e X.... e de G... e um gerente remunerado quando aqueles concorrentes com 40 centrais ou mais, possuíam como ainda possuem apenas um escritório e um vendedor em cada distrito e os laboratórios estão localizados de forma a poderem atender as necessidades do controlo de qualidade dos produtos de betão produzidos em várias centrais, que produzem as suas próprias matérias-primas.
18ª – Os custos variáveis de transporte decorrentes da localização geográfica periférica das suas instalações já que, como ficou provado, a Recorrente não acumulava a produção de betão com a dos inertes (areias e britas), nem com a dos cimentos, contrariamente às grandes empresas que dominam este sector de actividade de produção de betão pronto.
19ª – A Recorrente adquiria os inertes que necessitava no seu processo produtivo e assumia o encargo do transporte desde as pedreiras até às suas instalações fabris, enquanto que as restantes empresas concorrentes possuíam as suas pedreiras, dentro das suas próprias fábricas onde produziam as britas e as areias que utilizavam na produção do betão e cujo custo constitui cerca de 50% do custo das matérias-primas necessárias à produção do betão pronto.
20ª – A inexistência de grandes obras públicas no portfólio da Recorrente nos anos de 2003, 2004 e de 2005 deve ser entendida como inexistência nas contas de proveitos, ganhos ou rendimentos da Recorrente de facturação para as grandes obras públicas, para as quais não estava habilitada a fornecer por falta de certificação da qualidade dos seus produtos; por isso, andou mal o Tribunal a quo quando afirmou que “sucede, contudo, que as explicações oferecidas ou não lograram ser demonstradas, maxime do ponto de vista de se revelarem causais dos prejuízos declarados.”
21ª – O tribunal a quo também andou mal quando decidiu que o recurso aos métodos indirectos pela AT para determinar a matéria tributável de IVA do ano de 2003 da Recorrente impugnada constituía um ónus da Recorrente quando, na realidade, tal ónus é da AT; deste modo, não era sobre a Recorrente mas antes sobre a AT que impendia o ónus de provar e fundamentar de facto e de direito de que as referidas justificações dadas pela Recorrente aos Its, para os seus prejuízos reiterados não eram aceitáveis.
22ª – De acordo com os depoimentos produzidos em sede de audiência de julgamento do IT, CC, fica provado que:
a) A estrutura de custos da Recorrente é pesada;
b) Que apenas reconciliou as contas entre a Recorrente e a sociedade cliente J... Lda. e que batiam certas;
c) Apesar disso nunca teve conhecimento da existência de permutas entre a J... Lda. e a Recorrente;
d) Que a contabilidade da Recorrente estava organizada de acordo com o POC (Plano Oficial de Contabilidade);
e) Que não detectou quaisquer omissões de vendas ou de proveitos na contabilidade da Recorrente;
f) Não procurou saber se os dinheiros depositados nas contas de depósitos à ordem da Recorrente e creditados na conta de suprimentos do sócio BB tiveram origem em contas bancárias que ele era titular quer em Portugal quer no estrangeiro;
g) Admitiu logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais do sócio BB.
23ª – Andou mal o Tribunal a quo ao decidir que o recurso aos métodos indirectos para a determinação da matéria Tributária em sede de IVA do ano de 2003 da Recorrente se fundamenta também no disposto na alínea e) do nº 1 do artigo 87º da LGT, tanto mais que, conforme as declarações do IT, CC, produzidas em julgamento, a Recorrente tinha nos referidos anos a sua contabilidade formalmente organizada nos termos do POC e de acordo com os princípios contabilísticos e ainda de que nunca viu, em concreto, fuga às vendas da Recorrente – tal como decidiu o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte no processo nº 00379/04, proferido pela 2ª Secção de Contencioso Tributário, em 23/02/2006.
24ª – Verifica-se falta de objectividade no RF, no qual o Tribunal a quo fundou a decisão de indeferir a anulação da matéria colectável de IVA do ano de 2003 da Recorrente, tendo o IT, CC, admitido logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais do sócio BB, sem qualquer prova objectiva e concreta, que tivesse sido investigada nesse sentido.
24ª – O IT, CC, não analisou os extractos das contas bancárias pessoais do sócio maioritário da Recorrente, BB, nem procurou confirmar se as afirmações quer do gerente da Recorrente quer dos restantes funcionários segundo a qual ele era rico (facto que aliás era do domínio público local, pois, era possuidor de vários prédios em Portugal e no estrangeiro e veículos de luxo), era verdadeira ou não; bastaria consultar as notas de liquidação do IMI para se aperceber do património e da capacidade financeira daquele sócio da Recorrente; durante o tempo que durou a inspecção, aquele IT nunca procurou saber, utilizando todos os meios ao seu alcance, se de facto a “imagem que todos vendiam de que ele era muito rico” era ou não verdadeira por forma a, em tempo, no RF contraditar de forma fundamentada, as razões concretas e objectivas que indicassem que assim não era.
25ª – Como se alcança das declarações daquele IT constantes de fls. ...-... do RF, em 2003, 2004 e 2005 conseguiu reconciliar grande parte dos suprimentos e de empréstimos efectuados a partir das contas bancárias daquele sócio da Recorrente, porque os lançamentos estavam suportados não só pelo talão de depósito como também com fotocópias dos extractos bancários da diversas contas bancárias pessoais do referido sócio; em parte alguma a Lei exige que além do talão de depósito se juntem os extractos bancários das contas pessoais dos sócios para comprovar a origem do dinheiro e dos cheques, já que este procedimento determina a devassa da vida pessoal e familiar daquele sócio, tanto mais que como ficou provado tais mútuos são actos comerciais pelo que não exigem documentos escritos ou escrituras públicas para serem provados ao contrário do que exige o artigo 1143º do Código Civil que foi violado.
26ª – Durante a audiência de julgamento, a Recorrente juntou ao processo de impugnação um conjunto enorme de cópias dos extractos bancários que provam que a origem da quase totalidade dos depósitos efectuados nas contas bancárias da Recorrente e debitadas nas contas de suprimentos (conta 25511) e de empréstimos (268) do sócio BB, tiveram origem nas suas contas pessoais de depósitos bancários.
27ª – Foi o sócio BB quem, desde a constituição da Recorrente em 20 de Março de 1992, financiou o investimento e os prejuízos da recorrente emprestando-lhe por diversas vezes várias quantias em cheques e em dinheiro previamente levantado das contas de depósitos que aquele sócio possui em Portugal no Banco Y..., no Banco K.... e no Banco Z, e em Espanha no Banco D... que a Recorrente utilizou e afectou ao desenvolvimento normal da sua actividade comercial.
28ª – São considerados actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente regulados no Código Comercial e, além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar – artigo 2º do CC; o contrato de empréstimo mercantil encontra-se especialmente regulado no Título XI do Código Comercial, nos artigos 394º a 396º; a Recorrente é uma sociedade comercial, pelo que, são actos de comércio todos os contratos e obrigações que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar.
29ª – Nem dos documentos juntos aos autos, nem das declarações produzidas pelas testemunhas em sede de audiência de julgamento, nem dos próprios actos resulta que os empréstimos (mútuos) e suprimentos efectuados à Recorrente pelo sócio BB, não tenham sido para financiar o giro da empresa, ou seja, a sua actividade comercial; as testemunhas DD, EE e FF depuseram em julgamento que aqueles empréstimos se destinaram a provisionar as contas bancárias de depósitos à ordem da Recorrente para, desse modo, os bancos darem cobertura ao pagamento dos cheques que a recorrente emitiu sobre as suas contas de depósitos à ordem no Banco K..., no Banco Z e na Caixa ... dos ZZ..., destinados ao pagamento aos seus fornecedores de máquinas e equipamentos, de matérias-primas e demais fornecimentos e serviços necessários ao normal desenvolvimento da sua actividade comercial e ao pagamento de salários ao trabalhadores.
30ª – Os empréstimos efectuados pelo sócio BB destinaram-se exclusivamente ao pagamento de cheques emitidos em resultado do giro comercial da empresa; tais empréstimos são actos de comércio subjectivos em virtude de a Recorrente ser comerciante e ter utilizado o dinheiro emprestado para a prática de actos de comércio, ou seja, para o giro comercial da empresa, sendo certo que o contrário não resulta dos autos – artigo 99º do Código Comercial.
31ª – Assim, todos os empréstimos em dinheiro e cheques contabilizados pela Recorrente como suprimentos na conta 25511 e como empréstimos na conta 268, são empréstimos mercantis por força do disposto nos artigos 2º, 99º e 394º, todos do Código Comercial; pelo que, admitem, seja qual for o seu valor, todo o género de prova – artigo 396º do Código Comercial – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no Processo 062309 em 31 de Outubro de 1968, in www.dgsi.pt, que decidiu que, os suprimentos feitos pelos sócios para o giro comercial da sociedade, podendo ser classificados de empréstimos (mútuos) mercantis, ficam sujeitos à disciplina do artigo 396º do Código Comercial, que foi violado, sendo licito demonstrar-se a sua existência por qualquer meio de prova; tal como se alcança da prova, quer testemunhal produzida em julgamento quer documental que a Recorrente juntou aos autos relativamente aos empréstimos que o citado sócio lhe efectuou, nomeadamente, dos talões dos depósitos efectuados na conta de depósitos à ordem da Impugnante no Banco K..., filial de ZZ..., durante o ano de 2003 que totalizam a quantia de € 76.100,00, com cheques emitidos sobre a conta à ordem nº ...5001, que o sócio BB é titular naquela filial; e também dos depósitos efectuados em dinheiro na conta de depósitos à ordem da Impugnante no Banco K..., filial de ZZ..., durante os anos de 2003, 2004 e 2005 que totalizam a quantia de € 453.894,33, a qual também foi levantada, por diversas vezes, da conta de depósitos à ordem nº ...5001, de que o sócio BB é titular naquela filial; bem como, os depósitos efectuados nas contas de depósitos à ordem da impugnante nas filiais de ZZ... do Banco K... e da Caixa ..., durante os anos de 2003, 2004 e 2005 que totalizam a quantia de € 1.172,352,24, com cheques emitidos sobre a conta de depósitos à ordem nº ...001 de que é titular no Banco Z; os depósitos eram feitos em dinheiro pelo gerente da Recorrente porque possuía procurações daquele sócio para movimentar as suas contas de depósitos à ordem pessoais em bancos portugueses ou espanhóis, bem como as contas dos depósitos pertencentes à sociedade M..., SL que o sócio possui em Espanha; o mesmo acontecendo com a funcionária da Recorrente, EE, que também possuía procuração para movimentar as contas de depósitos à ordem pessoais de que o sócio era titular em bancos portugueses.
32ª – Em virtude do sócio, BB, residir em Espanha ausentando-se por diversas vezes para Angola, Namíbia e Brasil conferiu poderes a GG (gerente da Recorrente) e a EE (funcionária da Recorrente) para movimentarem as suas contas de depósitos à ordem, tanto em Portugal como em Espanha, quer pessoais, quer da sociedade M..., SL.
33ª – O gerente da Recorrente, GG, efectuou diversos empréstimos ao sócio BB em dinheiro e cheques que, a pedido deste, depositou directamente nas contas bancárias da Recorrente, e esta contabilizou aqueles depósitos a crédito das contas 25511 e 268, pois que, dando cumprimento ao princípio contabilístico da substância sob a forma, para os devidos e legais efeitos tais empréstimos (mútuos) apesar de os depósitos terem sido directamente efectuados pelo Sr. GG com os seus cheques e o seu dinheiro nas contas bancárias da Recorrente, a verdade é que ele tinha emprestado aquelas quantias ao sócio BB que, por sua vez, as emprestou à Recorrente; pelo que, quem assumiu a obrigação de reembolsar o gerente daquelas quantias em causa foi o sócio BB, e não a Recorrente.
34ª – Estão nessas condições os empréstimos a que se referem os 12 talões de depósitos de cheques e dinheiro totalizando a quantia de € 80.600,00 relativos a empréstimos momentâneos, efectuados por GG ao sócio BB e que, a pedido deste, aquele depositou nas contas de depósitos à ordem da Recorrente, empréstimos estes que já lhe foram restituídos; o mesmo aconteceu com dois ou três amigos do sócio BB, que também adquiriam muito esporadicamente betão à Recorrente, os quais chegaram a emprestar, àquele sócio, momentaneamente, dinheiro e cheques em condições análogas àquelas que o gerente também efectuou; empréstimos que, na maior parte dos casos o gerente da Recorrente pretendia prender o cliente pois que, tendo este emprestado o dinheiro ao sócio BB, acabava por vir comprar o betão à Recorrente, pois, desse modo acabava por receber o seu empréstimo.
35ª – A Recorrente contabilizou aqueles depósitos a crédito das contas 2511 e 268 do sócio BB; na verdade, aqueles empréstimos tinham sido feitos ao sócio BB que, por sua vez, as emprestou à Recorrente; quem assumiu a obrigação de reembolsar aquelas quantias emprestadas pelos referidos clientes da recorrente, foi o sócio BB e não a recorrente, que há muito foram reembolsados.
36ª – Mal andou o Tribunal a quo que de forma sistemática desvalorizou o depoimento em julgamento das testemunhas arroladas, DD e EE, e não levou em consideração toda a prova documental que sobre esta questão dos empréstimos e suprimentos a Recorrente carreou para os autos; sobre esta questão dos empréstimos e dos suprimentos, o Tribunal a quo tinha de fundamentar a sua decisão de desconsiderar a prova testemunhal enquadrando-a e fundamentando-a de forma concreta e objectiva com na prova documental constante dos autos sobre esta matéria, considerando provado que todas as afirmações feitas no RF de que os valores depositados nas contas de depósitos à ordem da Recorrente e lançados a crédito da conta 25511 – Suprimentos do sócio BB, não tiverem origens nas contas bancárias pessoais daquele sócio resulta apenas do facto do IT, CC, ter admitido logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais.
37ª – A lei não exige que o contribuinte junte ao talão de depósito quaisquer outros documentos e, muito menos, os extractos bancários das contas pessoais do sócio, o que se traduziria na devassa da sua vida pessoal e familiar; a origem do dinheiro e dos cheques depositados admite prova não só documental como também testemunhal, que a Recorrente apresentou nos autos; um talão de depósito relativo ao depósito nas contas bancárias da Recorrente, de quantias em dinheiro ou de cheques efectuado pelos sócios (ou a seu mando) de qualquer sociedade destinados a suprimentos, não carecem de qualquer outro documento para serem válidos e eficazes e titularem os suprimentos por esse meio efectuados em virtude de serem mútuos comerciais e por isso não lhes ser aplicável o disposto no artigo 1143º do Código Civil.
38ª – Se o IT, CC, tinha dúvidas se o dinheiro assim depositado nas contas da Recorrente não pertenciam àquele sócio, deveria ter pedido para consultar os extractos bancários das contas pessoais daquele sócio para, desse modo, poder confirmar a origem do dinheiro; tal auditoria poderia e deveria, em nosso entender, ser feita por amostragem e ter em conta as quantias materialmente relevantes.
39ª – O IT, CC, viu todos os documentos contabilizados pela Recorrente e declarou no seu depoimento em julgamento que a contabilidade da recorrente dos anos de 2003, 2004 e 2005 estava formalmente organizada; daí que, deveria ter feito fé na contabilidade; mas se não fizesse fé na contabilidade e o sócio em causa se recusasse a fornecer os extractos bancários das suas contas pessoais, então poderia e deveria pedir o levantamento do sigilo bancário, pois, é para esse efeito que a legislação foi criada.
40ª – Nem no RF nem em sede de audiência de julgamento os ITs provaram que alguma ou algumas das quantias creditadas na conta de suprimentos do sócio BB não tiveram origem em bens ou direitos pertencentes àquele sócio da Recorrente.
41ª – O IT, CC, em vez de actuar no sentido de reunir provas objectivas e concretas para fundamentar de facto e de direito as afirmações que fez no RF, de que as quantias contabilizadas na conta de suprimentos do sócio BB não tiveram origem nas suas contas bancárias pessoais, apenas juntou ao RF fotocópias dos talões de depósito, os quais por si só, não servem para fundamentar a afirmação contida no RF segundo a qual os cheques ou o dinheiro relativos a tais depósitos não tiveram origem em contas bancárias do sócio em causa.
42ª – Andou mal o Tribunal a quo ao não ter efectuado uma análise crítica dos documentos que a Recorrente juntou aos autos, que provam a origem da quase totalidade das quantias constantes dos referidos talões de depósito, tanto mais que, o IT, CC, declarou em sede de audiência de julgamento que “admiti logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais”.
43ª – Andou mal o Tribunal a quo que, sem a adequada e essencial fundamentação de facto e de direito, também desvalorizou os depoimentos relacionados com os valores lançados a crédito na conta de suprimentos do sócio BB, tanto mais que os documentos que juntou aos autos provam a origem da grande maioria daquelas quantias constantes dos talões de depósito, sendo o gerente GG mero portador das quantias e dos cheques em causa, facto que a lei não proíbe.
44ª – A Recorrente contabilizou depósitos a crédito das contas 25511 e 268, pois que, dando cumprimento ao princípio contabilístico da substância sob a forma, tais empréstimos apesar de efectuados directamente pelo gerente da Recorrente com os seus cheques e o seu dinheiro nas contas bancárias desta, o facto é que aquele emprestou tais quantias ao sócio BB que, por sua vez, as emprestou à Recorrente, pelo que, quem assumiu a obrigação de reembolsar o gerente daquelas quantias, foi o sócio BB, e não a Recorrente; aliás, as pessoas emprestavam ao sócio, que tinha capacidade económica, não emprestavam à Recorrente, que andava sempre à rasca e não tinha credibilidade junto de quem emprestava.
45ª – Estão nas condições referidas na conclusão anterior os empréstimos a que se referem os 12 talões de depósitos de cheques e dinheiro totalizando a quantia de € 80.600,00 relativos a empréstimos momentâneos, efectuados pelo Sr. GG ao sócio BB e que a pedido deste ele depositou nas contas de depósitos à ordem da Recorrente, empréstimos que já lhe foram restituídos, que se encontram a fls. ...-... ; o mesmo aconteceu com dois ou três amigos do sócio BB, que também adquiriram muito esporadicamente betão à Recorrente, que chegaram a emprestar, momentaneamente, àquele sócio dinheiro e cheques em condições análogas àquelas que o gerente efectuou; em julgamento, foi efectuada prova (desvalorizada pelo tribunal a quo) sobre as razões justificativas da existência de avultados depósitos em dinheiro na conta da impugnante e contabilizados a crédito da conta 25511 – empréstimos de sócios – BB.
46ª – Grande parte dos movimentos em dinheiro, principalmente de quantias avultadas eram concretizados directamente no banco, onde o gerente levantava o dinheiro do cheque da conta pessoal do sócio BB, e o depositava de imediato na conta bancária da Recorrente sem que o dinheiro tivesse sequer saído do caixa do banco, para que o dinheiro ficasse imediatamente disponível, bem como quantias previamente levantadas das contas bancárias que aquele sócio era titular em Espanha no Banco D... e no Banco N....
47ª – O depósito de cheques emitidos por um cliente e relevado contabilisticamente como servindo para abater parte da divida do cliente, sendo o remanescente contabilizado como um empréstimo do sócio, em que o beneficiário dos pagamentos da sociedade não era o sócio mas terceiros (GG, J... Lda., existindo também cheques emitidos ao portador) estão quase exclusivamente relacionados com as permutas de fracções dos prédios por fornecimentos de betão, como consta dos depoimentos das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, e dos contratos promessa de fracções prediais aos clientes da Recorrente; a Recorrente juntou aos autos cópias de diversos contratos promessa de compra e venda de prédios com as sociedades J... Lda., cujo pagamento foi efectuado parcialmente com fornecimentos de betão, também designados por permutas, e de diversos contratos de cessão da posição contratual ao sócio BB naqueles contratos promessa de compra e venda de prédios por permuta de betão; se os cheques em causa tivessem origem em omissões de vendas ou se o sócio da impugnante não fosse o seu legitimo titular, ou seja se a impugnante não pudesse justificar a origem de tais cheques, certamente que nem ela nem o sócio os iriam depositar nas contas da empresa e lançá-los a crédito da conta de suprimentos; a Recorrente, é livre de endossar a quem quizer os cheques que receber pois tais endossos não consubstanciam fugas fiscais como os Its insinuaram no RF.
48ª – O cheque de fls. ...-... emitido ao gerente, GG, destinou-se a restituir os empréstimos que lhe efectuou;
49ª – O IT, CC, alegou que a contabilidade da impugnante não reflecte a existência de apartamentos, lojas ou prédios que adquiriu através de contratos-promessa de compra e venda e correntemente identificados pelas permutas em causa; a contabilidade da impugnante não reflecte nem poderia reflectir a existência de apartamentos, lojas ou prédios recebidos nas permutas, porque só se podem contabilizar os referidos imóveis quando tiverem sido outorgadas as respectivas escrituras de compra e venda; antes da celebração das escrituras públicas de compra e venda das fracções dos prédios, os valores entregues pela Recorrente aos seus próprios clientes a título de sinal e princípio de pagamento relativamente à parte do preço das fracções dos prédios que eram objecto de permuta pelo fornecimento do betão eram contabilizados a crédito da conta do cliente (que também era fornecedor do prédio ou da fração do prédio), já que este pagava à Recorrente parte do fornecimento do betão com a venda de uma ou mais fracções do prédio.
50ª – Para justificar os pagamentos e recebimentos pela Recorrente e pelos seus clientes que com ela permutavam fracções dos prédios por fornecimentos de betão, são suficientes os documentos dos contratos promessa de compra e venda juntos aos autos pela Recorrente; de facto, o que a contabilidade reflecte são os movimentos financeiros correspondentes aos direitos e obrigações emergentes da outorga dos referidos contratos promessa de compra e venda de prédios em causa designados por permutas; e reflecte também os movimentos financeiros correspondentes aos direitos e obrigações emergentes da cessão pela impugnante ao referido sócio dos direitos resultantes da outorga dos referidos contratos promessa de compra e venda de prédios em causa designados por permutas.
51ª – O IT deveria ter averiguado, o que não fez, a verdadeira origem dos cheques destinados a suportar os movimentos financeiros associados às vendas de betão por permuta parcial de fracções prediais e a cessão dos direitos de compra ao sócio BB; a Recorrente logrou provar em julgamento, não só com os depoimentos das testemunhas (funcionários e clientes da Recorrente) que arrolou, mas também documentalmente através das cópias dos contratos promessa que juntou aos autos, e sobre os quais o Tribunal a quo não se pronunciou quando estava obrigado a pronunciar-se; em vez disso, exigiu a apresentação das escrituras públicas de compra e venda das fracções prediais permutadas as quais, como depuseram as testemunhas, EE, HH e II, pelo menos, não chegaram a ser celebradas já que, o objectivo das permutas, era e é o de criar sinergias entre os clientes e os fornecedores.
52ª – O sócio da Recorrente, BB, não queria para si todos os prédios permutados, por isso, dava instruções aos construtores para os vender, quer pertencessem à impugnante quer em seu nome próprio (relativamente aos contratos promessa de compra e venda cedidos); e, quando os construtores vendiam os prédios em causa, entregavam o dinheiro que recebiam quer à impugnante quer ao sócio desta no caso das cessões da posição contratual no contrato promessa de compra e venda; neste aspecto, o IT, CC, identificou correctamente no RF as operações financeiras das permutas, mas nunca aceitou que estes movimentos estivessem associados às permutas; o Tribunal a quo exigiu, no entender da Recorrente ilegalmente, a apresentação de escrituras públicas, porém, não se apresenta o que não existe; os contratos-promessa e as cessões de posições contratuais juntos aos autos constituem prova adequada daquelas operações económicas e financeiras relativas às vendas de betão aos clientes e a compra (sob a forma de contrato promessa) de prédios ou suas frações.
53ª – De facto, entre a Recorrente, alguns dos seus clientes e o sócio BB, foram estabelecidas relações comerciais triangulares destinadas a criar sinergias e a alavancar os negócios entre eles; alguns dos clientes da Recorrente são simultaneamente seus fornecedores de fracções dos prédios que constroem; por sua vez, a Recorrente cedeu a sua posição de compradora daqueles prédios ao sócio BB que pagou aos clientes da recorrente a parte do preço dos imóveis que não foi objecto de permuta pelos fornecimentos de betão; porém, o sócio BB dava instruções aos clientes da Recorrente (os construtores) para venderem a terceiros as referidas fracções dos prédios; por isso, quando os clientes da Recorrente (os construtores) vendiam a terceiros as fracções dos prédios prometidos permutar e cujo direito de compra esta cedia ao sócio BB, eles entregavam o dinheiro da venda das fracções quer ao referido sócio, quer à Recorrente, e davam sem efeito os contratos de permuta para desse modo poderem dar início a um novo ciclo noutro prédio que os clientes construíssem.
54ª – Todos os movimentos dos cheques e dos depósitos tiveram origem nas operações comerciais que se estabeleceram entre a Recorrente, alguns dos seus clientes e o sócio daquela, BB, e para os quais os talões de depósito, os cheques emitidos e recebidos identificados supra, bem como os contratos promessa de compra e venda, os contratos de cessão de posição contratual junto aos autos a fls. ...-... constituem prova bastante da existência de tais factos, nomeadamente:
a) Venda do betão pela Recorrente aos clientes com emissão das correspondentes facturas;
b) Venda da(s) fracção(ões) dos prédios pelos clientes à Recorrente, tituladas por contratos promessa de compra e venda.
c) Cessão da posição contratual de promitente compradora das fracções dos prédios ao sócio BB.
d) Respectivos pagamentos do sócio BB aos clientes da Recorrente e compensação de saldos e endossos de cheques, entre a Recorrente e os seus clientes também eles seus fornecedores.
Todas estas operações eram como são legais, pelo que, em nosso entender andou mal o Tribunal a quo quando entendeu que estas operações só poderiam ser provadas com a apresentação das escrituras publicas, não tendo em conta que não é ilegal e que por mútuo acordo os outorgantes de um contrato-promessa o invalidem, ou seja, em qualquer contrato promessa de compra e venda, o contrato prometido pode nunca se realizar sem que tal facto constitua uma ilegalidade.
55ª – A matéria colectável para efeitos de IVA é constituída pelas transmissões de bens e serviços, enquanto que a matéria colectável para efeitos de IRC é determinada, deduzindo-se aos proveitos, ganhos ou rendimentos os custos, gastos ou perdas.
56ª – Os movimentos financeiros, de entre outros os relativos aos endossos de cheques de clientes, de compensação entre clientes e fornecedores da emissão de recibos com a mesma data das facturas e a consequente contabilização aquando o seu recebimento, não contribuem para a formação da matéria colectável em sede de IRC ou de IVA nos anos de 2003, 2004 e 2005 da Recorrente, e este facto não é adequado para fundamentar o recurso aos métodos indirectos para a determinação do IVA e do IRC nos anos de 2003, 2004 e de 2005; por isso, andou mal o Tribunal a quo ao entender que este facto constituía fundamento para a AT recorrer aos métodos indirectos para a determinação das matérias tributárias da Recorrente, nos anos de 2003 2004 e 2005 em sede de IVA e de IRC.
57ª – Nos termos do disposto nos artigos 847º e 848º do Código Civil é legal a compensação dos saldos devedores com os saldos credores realizados entre as entidades que ao mesmo tempo eram credoras e devedoras da Recorrente; assim, como os movimentos financeiros não contribuem para a formação da matéria colectável em sede de IRC ou de IVA nos anos de 2003, 2004 e 2005 da Recorrente este facto não é adequado para fundamentar o recurso aos métodos indirectos para a determinação do IVA e do IRC nos anos de 2003, 2004 e de 2005.
58ª – De facto, quer no RF quer nas suas declarações em audiência de julgamento, os ITs não concretizaram de forma objectiva como é que o encontro de contas ou compensação de saldos entre clientes e fornecedores se traduzia em fugas ao IVA/IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005 da Recorrente impugnadas; este facto não permite à AT, à luz das regras de experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as concretas circunstâncias do exercício da actividade, fixar o critério de qualificação e de quantificação da matéria tributável através dos métodos indirectos; assim, entendemos que quanto a este facto se verifica a falta de fundamentação de direito, pelo que, andou mal o Tribunal a quo quando na sentença recorrida o considerou adequado para a AT fundamentar o recurso aos métodos indirectos em causa.
59ª – Não existe qualquer norma legal que determine que o recibo só possa ser emitido no momento do recebimento e o RF não indica as normas violadas pelo que sempre estaremos perante a falta de fundamentação de facto e de direito quanto a este argumento para justificar o recurso aos métodos indiretos; por outro lado, a emissão de um recibo simultaneamente com a emissão da factura não consubstancia qualquer fuga ou evasão ao IVA/IRC dos anos 2003, de 2004 e 2005 da Recorrente, já que os movimentos financeiros não estão sujeitos a IVA; tal emissão, ainda que simultânea, não contribui para a formação da matéria colectável em sede de IRC ou de IVA nos anos de 2003, 2004 e 2005 da Recorrente, este facto não é adequado para fundamentar o recurso aos métodos indirectos para a determinação do IVA e do IRC nos anos de 2003, 2004 e de 2005.
60ª – Se o sócio BB é credor da Recorrente e ao mesmo tempo devedor do cliente desta, J... Lda., então o sócio em causa pode pedir à Recorrente para, sobre as suas contas bancárias sacar um cheque em nome do referido J... Lda. e entregar-lho; desta forma, a Recorrente reembolsa o sócio dos suprimentos e empréstimos mas em vez de lhe entregar o cheque, entrega-o àquele seu cliente a quem o seu sócio devia dinheiro; o mesmo aconteceu com o cheque emitido pela Recorrente em nome do gerente, GG.
61ª – Todos estes movimentos financeiros estão intrinsecamente relacionados com as permutas em causa nos autos, as quais não contrariam qualquer lei e não consubstanciam qualquer fuga ou evasão aos IVA impugnados dos anos de 2003, 2004 e 2005 da Recorrente, já que, os movimentos financeiros não estão sujeitos a IVA – nº 1 do artigo 1º do CIVA e estão devidamente contabilizados para que todos os utilizados da escrita comercial da Recorrente.
62ª – O IT, CC, não investigou concreta e objectivamente de forma a apurar a verdadeira origem destes movimentos financeiros porque de acordo com as suas declarações transcritas supra prestadas em audiência de julgamento admitiu logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais; de facto, quer no RF quer nas suas declarações em audiência de julgamento, os ITs não concretizaram de forma objectiva como é que o encontro de contas, o endosso de cheques ou compensação de saldos entre clientes e fornecedores se traduzia em fugas ao IVA/IRC dos anos de 2004 e 2005 da Recorrente impugnadas; este facto não permite à AT, à luz das regras de experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as concretas circunstâncias do exercício da actividade, fixar o critério de quantificação da matéria tributável através dos métodos indirectos.
63ª – O Tribunal a quo decidiu mal ao entender que a submissão de declarações de substituição por parte do sujeito passivo tinha sido feito antes do início do procedimento inspectivo em causa nestes autos quando, de facto, a Recorrente submeteu aquelas declarações de substituição de IVA e de IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005 durante o procedimento inspectivo destinadas a corrigir os erros informáticos, também designados por bugs, na emissão por meios informáticos das guias de remessa e aos erros tipográficos na numeração das guias de remessa impressas pelas tipografias; de facto, a impugnante emitiu e contabilizou duas facturas para dois clientes diferentes, apesar de ter uma só guia de remessa devido aos saltos na numeração das guias de remessa emitidas pelo sistema informático da central de betão em funcionamento na data dos factos; tal facto é revelador que, nesse caso concreto, o erro residia na atribuição por via informática do mesmo número a duas guias de remessa distintas mas em que, não se verificou qualquer omissão de facturação, pois que, independentemente do erro de numeração que as guias de remessa apresentavam a Recorrente emitiu as correspondentes duas facturas; o erro informático não prejudicou a AT e, após um levantamento exaustivo de todas as anomalias e erros na emissão das guias de remessa, a Recorrente apresentou declarações de substituição a fim de corrigir erros informáticos e tipográficos.
64ª – A Recorrente sempre admitiu e reconheceu que o sistema informático que comandava a central de betão de via seca e emitia as guias de remessa era obsoleto (era parte integrante daquela central de betão que entrou em funcionamento durante os primeiros meses de 1992), e susceptível de erros e saltos de numeração não só devido à reduzida memória do equipamento informático como também devido ao software que apesar de avançar na numeração sequencial das guias de remessa, não concluía a emissão da guia de remessa se naquele momento faltasse a electricidade; se, por um lado, a existência de duas facturas emitidas com base numa guia de remessa com um mesmo número não prova de forma concreta e objectiva a ocultação de facturação e, por outro lado, prova que todas as guias eram facturadas também a falta nos livros de guias de remessa de algumas guias na sequência numérica devido a erros tipográficos de numeração não prova a existência de qualquer fuga omissão ou ocultação da facturação para efeitos de IVA/IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005; apesar disso, nos anos de 2003, 2004 e 2005, o sistema informático cumpria com as leis tributárias que só passaram a exigir o SAFT e a certificação do software a partir do ano de 2006.
65ª – Não basta ao IT alegar que nos livros de guias de remessa verificou a falta de algumas guias na sequência numérica, pois, é necessário identificar, de forma concreta e objectiva quais as guias de remessas em falta, se tal falta são ou não consequência de erro tipográfico, e se existem ou não facturas emitidas relacionadas com tais guias em falta, identificando para quem foram tais fornecimentos, confrontando o valor das facturas com os meios de pagamento e visitar os clientes em causa para saber onde foi aplicado o betão e quantificá-lo para desse modo confirmar se a falta de tais guias de remessa poderão (ou não como é o caso dos autos) estar relacionadas com a omissão, ainda que parcial dos fornecimentos, o que até é fácil de se apurar como, aliás, a Recorrente veio a fazer; só dessa forma os ITs poderiam de forma concreta e objectiva provar se, em relação a tais guias em falta nos livros, a Recorrente omitiu ainda que parcialmente vendas à contabilidade.
66ª – O sistema informático da impugnante tinha mais de 12 anos e nunca foi substituído por falta de meios financeiros para esse efeito e ainda porque não existia qualquer Lei que obrigasse a Recorrente a possuir software certificado como actualmente é exigido; tal como as testemunhas, EE e JJ, conforme transcrito supra, depuseram em audiência de julgamento, que devido à obsolescência do hardware e do software e às frequentes quebras e falhas de energia eléctrica, eram frequentes os problemas com o sistema informático da central de betão, adquirido logo a seguir à constituição da Recorrente no ano de 1992.
67ª – Tanto o gerente como o TOC, confrontados com os erros de numeração sequencial das guias de remessa informáticas, efectuaram um levantamento exaustivo a todas essas situações tendo por base as notas de encomenda e as ordens de produção e identificaram e regularizaram tais situações, emitindo e corrigindo a facturação acidentalmente em falta e repondo a verdade dos factos tributários; após a regularização dos erros de numeração das guias de remessa informáticas e dos erros tipográficos das guias de remessa impressas nas tipografias, à luz das regras de experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as concretas circunstâncias do exercício da actividade, a AT estava vinculada a fundamentar o recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributável de IVA do ano de 2003 da Recorrente, de forma concreta e objectiva, o que não fez.
68ª – Após várias solicitações processuais da Recorrente, a AT lá acabou por juntar aos autos os rácios relativos ao sector de actividade de produção de betão pronto no distrito de X...., coligidos pelos Serviços de Informática da Direcção Geral dos Impostos relativos aos anos de 1998 a 2005, pelos quais se verifica claramente que o rácio R4, que traduz a rentabilidade fiscal das empresas do sector de actividade de produção de betão pronto no distrito de X.... (onde se inclui a Recorrente e as empresas concorrentes com sede no distrito de X....), sempre apresentou valores negativos, pelo menos, desde 1998 até 2003.
69ª – Para poder aferir concreta e objectivamente se os prejuízos que a Recorrente apresentava se justificavam ou não, nos termos do disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT, o IT, CC, deveria calcular as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros, as taxas médias de rentabilidade de capital investido e o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias primas e outros custos directos, da Recorrente, e compara-las com os mesmos rácios das outras empresas do distrito de X.... concorrentes da Recorrente; o que não fez; pois, só desse modo de forma concreta e objectiva estaria em condições de concluir sobre a necessidade ou não da determinação das matérias tributárias impugnadas com o recurso aos métodos indirectos.
70ª – Em consequência da dimensão, localização e do exercício concreto da actividade daquelas grandes empresas serem completamente distintos dos da Recorrente, as normas constantes da alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT, não permitem a utilização de rácios, sejam eles os rácios do distrito ou do território nacional, sejam eles o 1º quartil, a mediana, ou o 3º quartil das empresa nacionais como a C..., SA, a Bl..., SA e o GRUPO L..., SA.
71ª – A AT não informou nem notificou a Recorrente, quer para efeitos do exercício do direito de audição prévia, quer para efeitos do exercício ao contraditório, quais as empresas que integram o cálculo dos valores a nível nacional do 3º quartil dos rácios R17 e R4, que utilizou erradamente e em clara violação do disposto no nº 1 do artigo 90º da LGT para fundamentar a necessidade de recorrer aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003, em clara violação do disposto no artigo 125º do CPPT.
72ª – Não sendo possível a aplicação do disposto no nº 2 do artigo 90º da LGT por inexistência de regulamentação tanto na data dos factos como ainda actualmente, para efeitos da AT fundamentar o recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003 da Recorrente, a AT tinha de dar cumprimento ao disposto nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT, sem o que não poderia fundamentar de facto e de direito, de forma concreta e objectiva, o recurso aos métodos indirectos na avaliação daquelas matéria tributárias como base numa análise comparativa dos rácios da recorrente com os valores que rácios R17 e R4 assumem a nível nacional para o 3º quartil; a Recorrente desconhece como foram determinados e quais as empresas que serviram de amostra para o cálculo daqueles rácios pelo que quanto a este fato esteve com ainda está impedida de exercer o seu direito ao contraditório dos valores que os rácios R17 e R4 assumem para o 3º quartil a nível nacional.
73ª – A fundamentação da necessidade do recurso aos métodos indirectos para a determinação da matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 com base na comparação dos seus rácios com os rácios de outras empresas, de maior dimensão, com outra (ou outras) localizações e desenvolvendo concretamente a sua actividade de forma diferente da recorrente viola frontalmente o disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT.
74ª – A notificação da impugnante pela AT para exercer o direito de audição prévia no procedimento da determinação da matéria tributária impugnada não continha elementos que lhe permitissem saber a forma como foram calculados aqueles valores do 3º quartil dos rácios R17 e R4 e quais as empresas do sector que foram consideradas pelos Serviços de Informática da Direcção Geral dos Impostos no cálculo daqueles rácios, para que a Impugnante se pudesse pronunciar sobre a localização a dimensão e a forma concreta da actividade das mesmas e bem assim, poder confirmar que os referidos rácios não enfermam de erros de cálculo.
75ª – Ou seja, para permitir que a Recorrente pudesse exercer de forma esclarecida, concreta e objectiva, o seu direito de audição prévia e o seu direito ao contraditório nas correspondentes fases deste procedimento jurídico-administrativo-tributário, não bastava que a AT notificasse a impugnante dos valores a nível nacional nos anos de 2003, 2004 e 2005 dos referidos rácios R17 e R4, sem indicar de forma concreta, as formulas matemáticas do cálculo daqueles rácios estatísticos e sem indicar em concreto quais as empresas que foram utilizadas para o referido cálculo do R17 e R4, respectivas localizações, dimensão e forma concreta do exercício das respectivas actividades; pois, só desse modo a Recorrente estaria em condições de contraditar sobre as questões da dimensão, localização e a forma concreta do exercício da actividade daquelas empresas consideradas no cálculo dos valores a nível nacional do 3º quartil dos rácios R17 e R4 que a AT utilizou em clara violação do disposto no nº 1 do artigo 90º da LGT, para fundamentar a necessidade do recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003 da Recorrente impugnada; pelo que, neste ponto, a sentença recorrida também violou o disposto no nº 5 do artigo 267º e no nº 3 do artigo 268º, ambos da CRP.
76ª – De facto, contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, em vez dos rácios nacionais do sector seriam os rácios das três ou quatro empresas concorrentes da Recorrente com sede e instalações fabris no distrito de X.... que deveriam servir como termo de comparação para a AT poder fundamentar de forma concreta e objectiva o recurso aos métodos indirectos para a determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003 da Recorrente, tendo em conta, a sua localização, a sua dimensão e a forma concreta do exercício da sua actividade.
77ª – Ao utilizar os valores que o 3º quartil dos rácios R17 e R4 assumem a nível nacional, não só para fundamentar o recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003 da Recorrente como também para determinar aquela matéria colectável impugnada, com fundado e manifesto e grosseiro erro, a AT violou o disposto nº 1 do artigo 90º da LGT e o nº 5 do artigo 267º da CRP; pelo que, andou também mal aqui o Tribunal a quo ao ter decidido como decidiu.
78ª – A alínea c) do nº 1 do artigo 87º da LGT estabelece que a avaliação indirecta só pode efectuar-se no caso de “a matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica referidos na presente lei.”, norma que foi violada pela sentença a quo..
79ª – O nº 1 do artigo 89º da LGT determina que “a aplicação de métodos indirectos com fundamentos na matéria tributável ser significativamente inferior à que resultaria da aplicação de indicadores objectivos de actividade de base técnico-científica só pode efectuar-se, para efeitos da alínea c) do artigo 87.º, em caso de o sujeito passivo não apresentar na declaração em que a liquidação se baseia razões justificativas desse afastamento, desde que tenham decorrido mais de três anos sobre o início da sua actividade”, norma que foi violada pela sentença a quo.
80ª – O nº 2 do artigo 89º da LGT dispõe que “os indicadores objectivos de base técnico-científica referidos no número anterior são definidos anualmente, nos termos da lei, pelo Ministro das Finanças, após audição das associações empresariais e profissionais, e podem consistir em margens de lucro ou rentabilidade que, tendo em conta a localização e dimensão da actividade, sejam manifestamente inferiores às normais do exercício da actividade e possam, por isso, constituir factores distorcivos da concorrência. “, norma que também foi violada pela sentença recorrida; estes indicadores objectivos de base técnico-científica que podem consistir em margens de lucro ou rentabilidade nunca foram definidos anualmente nos termos da Lei pelo Ministro das Finanças e por isso nunca foram publicados.
81ª – Andou mal o Tribunal a quo quando fundamentou na alínea c) do nº 1 do artigo 87º da L.G.T. o recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da Recorrente norma essa, impossível de ser aplicada pela inexistência dos indicadores objectivos de base técnico-científica que nunca foram publicados; a nosso ver, está afastada (por inexistência de publicação dos indicadores objectivos de base técnico-científica) a aplicação dos métodos indirectos na determinação da matéria tributária da Recorrente em sede de IVA no ano de 2003.
82ª – Andou mal o Tribunal a quo, já que da sentença não consta uma análise crítica entre o que consta do Relatório da Fiscalização e o depoimento dos inspectores tributários, no que respeita às condições concretas da actividade da Recorrente e das suas concorrentes, da existência no distrito de X.... de, pelo menos, 8 empresas concorrentes, dos equipamentos obsoletos da Recorrente, da sua produção ter por base uma central de via seca (que mais ninguém usava), o facto de não produzir inertes nem cimento, o facto de ir buscar os inertes a cerca de 200 quilómetros com veículos próprios, o facto de possuir uma central enquanto que as grandes concorrentes do sector terem mais de 50 centrais espalhados pelo país, a estrutura pesada de custos, ainda o facto de o IT CC ter admitido que o dinheiro depositado na conta 25511 não era das contas pessoais do sócio e que a contabilidade estava organizada segundo os princípios contabilísticos, desconhecer a existência das permutas, entre outros factos que em função da prova produzida o Tribunal a quo deveria ter feito apreciação crítica destas questões controversas.
83ª – Na apreciação da prova, o Tribunal a quo desvalorizou sistematicamente a prova produzida em sede de audiência de julgamento pelo depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrente, e em contrário do decidido nesta matéria pela 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que proferiu em 15-04-2009 no Processo: 01115/08, o Acórdão disponível em www.dgsi.pt cujo sumário determina que, “nos casos em que seja produzida prova susceptível de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal), a fundamentação da sentença não pode deixar de integrar uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros; e que a completa ausência de exame crítico das provas, quando ela é imprescindível para permitir às partes a impugnação da decisão com cabal conhecimento das razões que a motivaram e permitir ao tribunal de recurso apreciar a sua correcção ou incorrecção, implica nulidade da sentença, por falta de fundamentação.”
84ª – Em média, os preços praticados pela Recorrente eram cerca de 10% mais baixos que os praticados pelas outras empresas concorrentes e ainda oferecia o serviço de bombagem do betão, conforme depuseram as testemunhas da Recorrente, cujos depoimentos foram desvalorizados pelo tribunal a quo; a forte concorrência da I... e das grandes empresas, como a C..., SA, a Bl..., SA e L..., SA, obrigou a Recorrente a vender, também durante os anos de 2004 e 2005, os seus produtos com preços em média mais baixos 10% que os seus concorrentes, não só porque os seus produtos nãos tinham a qualidade certificada mas também devido à forte concorrência da I... Lda. situada a menos de 500 metros da Recorrente, situação que nem sequer é identificada no RF.
85ª – O que o Tribunal a quo deveria ter feito como exigem as diversas alíneas do nº 1 do artigo 90º da LGT, e do RF não consta, seria uma análise comparativa dos preços de venda praticados pelos concorrentes e pela Recorrente, falta esta em clara violação do disposto na citada norma.
86ª – Quer no RF quer na sentença recorrida, verifica-se a ausência completa de factos sobre as condições concretas em que a Recorrente exercia a sua actividade, e uma análise comparativa com as suas concorrentes directas ou seja, as empresas que naqueles anos de 2004 e 2005 operavam nas zonas dentre os ZZ... e X.... e entre os ZZ... e G..., pois, era este o seu mercado.
87ª – O Tribunal a quo desvalorizou os depoimentos das testemunhas da Recorrente, e não teve em conta as contradições entre o que o RF afirma e o depoimento do IT, CC, designadamente, e como se alcança do seu depoimento em audiência de julgamento, violou o disposto na alínea i) do nº 1 do artigo 90º da LGT que exige “uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.”
88ª – A acusação constante do RF segundo a qual, a Recorrente omitiu vendas à sua contabilidade não resultou da verificação de qualquer omissão à sua contabilidade de vendas em concreto, mas antes de uma análise indiciária tendo por base meros rácios.
89ª – Ficou provado, apesar de o tribunal a quo assim não ter entendido, que os equipamentos que a Recorrente utilizava tinham sido adquiridos durante o ano de 1992 e que nenhuma empresa concorrente utilizava a tecnologia da via seca, não permitia o controlo de qualidade dos produtos e gerava muitos produtos rejeitados por falta de qualidade, factos que o tribunal recorrido não levou em conta na sentença que proferiu; pelo contrário, no RF consta uma análise precisamente contrária, peregrina até, segundo a qual a tecnologia da via seca é mais eficaz e mais rentável, o que revelando um flagrante e total desconhecimento sobre a forma concreta não só como a Recorrente exercia a actividade mas também como ela era exercida pelos seus concorrentes.
90ª – O Tribunal a quo não teve em conta as enormes vantagens que, ao contrário da Recorrente, os seus concorrentes possuíam, pois, eram produtores das suas próprias matérias-primas, designadamente, dos inertes (britas e areias) e do cimento; na sentença recorrida o Tribunal a quo não fez, quando estava obrigado a fazer, uma análise crítica destes factos concretos e objectivos sobre a forma concreta como a actividade da Recorrente e dos seus directos concorrentes era exercida, da dimensão da sua actividade e da sua localização; aliás, se a tecnologia de via seca era tão boa, não existiam razões para a Recorrente a substituir em 2006 pela tecnologia da via húmida; e se era tão boa, não existiam razões para as grandes empresas do sector (C..., SA, Bl..., SA, GRUPO L..., SA, I... e todas as suas empresas concorrentes) utilizarem esta tecnologia de via húmida.
91ª – No RF, o IT CC detectou a existência de movimentos financeiros entre a Recorrente, o sócio BB e alguns clientes daquela, que atribuiu erradamente a ocultação de vendas, mas não os investigou, antes declarando desconhecer a existência das permutas concretizadas em fornecimentos de betão pela Recorrente a alguns dos seus clientes e pagos em parte com a entrega por estes clientes com fracções de prédios que a Recorrente cedia ao sócio BB.
92ª – O Tribunal a quo, não valorizou quando estava obrigada a valorizar todos os contratos de permutas entre a Recorrente e alguns dos seus clientes e da cessão da posição contratual de promitente compradora ao seu sócio BB, exigindo para o efeito que tais permutas só poderiam ser provadas com a apresentação das escritura públicas de compra e venda sem ter em consideração que os contratos prometidos não se concretizaram, e não fez uma análise crítica de cada um dos contratos promessa juntos aos autos, tendo-se ficado pela exigência das escrituras públicas como único meio de prova.
93ª – Em relação aos empréstimos efectuados pelo sócio BB à Recorrente, o Tribunal a quo também não efectuou uma análise crítica a cada um dos documentos juntos aos autos que provam a efectiva existência dos suprimentos efectuados por aquele sócio à Recorrente; na fundamentação da sentença, o Tribunal a quo, não teve em conta que a Recorrente estava a fazer uma prova negativa dos factos tributários de que era acusada consubstanciados na eventual omissão à sua contabilidade de vendas, a qual só pode ser feita de forma genérica sendo manifestamente impossível de ser realizada de forma concreta, pois, a Recorrente está impedida de provar segundo a segundo o que fez, tanto de dia como de noite, durante os anos de 2003, 2004 e 2005.
94ª – Tendo em conta o princípio da legalidade administrativa, tal qual é hoje entendido, incumbe à AT, em termos correspondentes aos que são afirmados pelo art.º 342º do Código Civil, o ónus de prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas desfavoráveis à Recorrente, como sejam a existência dos factos tributários e respectivas qualificação e quantificação; para presumir a matéria tributária da Recorrente em sede de IVA do ano de 2003, a AT tem de praticar um conjunto de operações lógicas do tipo indutivo e dedutivo que se baseiam em premissas que encerram juízos de valor que carecem de fundamentação objectiva e concreta, sob pena de as operações lógicas e algébricas destinadas à determinação das matérias tributárias conduzirem inexoravelmente a um valor errado, devido ao erro de premissas.
95ª – Verifica-se a existência de erro das premissas lógicas que conduziram à determinação dos valores da matéria Tributária em sede de IVA do ano de 2003, em consequência da violação do disposto no nº 1 do artigo 90º da LGT.
96ª – Andou mal o Tribunal a quo quando entendeu desvalorizar, sem a essencial fundamentação, os depoimentos de todas as testemunhas arroladas pela Recorrente e não fez uma análise critica ao que foi escrito no RF, tendo em conta os depoimentos dos ITs; também mal andou o Tribunal a quo quando, sem fazer uma análise crítica aos depoimentos das testemunhas arroladas pela Recorrente considerou provados os factos constantes nos itens 6), 7), 8) e 9) da decisão da matéria de facto, quando não os deveria ter julgado provados.
97ª – Tal como decidiu a 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA) no acórdão que proferiu em 15-04-2009 no processo 01115/08 disponível em www.dgsi.pt, “nos casos em que seja produzida prova susceptível de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal), a fundamentação da sentença não pode deixar de integrar uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros; a completa ausência de exame crítico das provas, quando ela é imprescindível para permitir às partes a impugnação da decisão com cabal conhecimento das razões que a motivaram e permitir ao tribunal de recurso apreciar a sua correcção ou incorrecção, implica nulidade da sentença, por falta de fundamentação.”
98ª – Andou mal o Tribunal a quo quando na sentença recorrida decidiu que se verificaram os pressupostos para o recurso aos métodos indirectos de determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003 da Recorrente constantes das alíneas, b), c) e e) do artigo 87º da LGT, já que, do que foi provado pelo depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrente e pela AT e pela prova documental, a contabilidade da Recorrente estava formalmente organizada de acordo com os princípios contabilísticos e a Recorrente corrigiu por sua própria iniciativa os erros informáticos e tipográficos na emissão das guias de remessa apresentado as competentes declarações de substituição.
99ª – Do RF e do depoimento dos ITs, não resulta provada a existência de outros situações que possam colocar em causa a contabilidade e as declarações da Recorrente já que a verificação de anomalias na contabilidade do sujeito passivo não é condição, só por si, para promover a aplicação de métodos indirectos, exigindo-se, para esse efeito, que tais anomalias inviabilizem o apuramento directo da matéria tributável, como se decidiu no acórdão da 2ª Secção – Contencioso Tributário, do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) proferido em 18-11-2010, no processo 00144/02.TFPRT.12, disponível em www.dgsi.pt, ou seja, que:
1. Em matéria de prova, o respeito pelo princípio do contraditório exige, entre o mais, que às partes seja reconhecida a possibilidade de se pronunciarem sobre as provas produzidas por si, pelo adversário ou pelo tribunal
2. Consumado o prazo de arguição de nulidade secundária alegadamente decorrente da falta de notificação de documentos juntos aos autos, sem que a mesma haja sido invocada, ocorre a respectiva sanação.
3. A fundamentação da decisão sobre a matéria de facto deve consistir na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu num sentido e não noutro.
4. Verifica-se a nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando o tribunal não resolve questões que estava obrigado a apreciar.
5. Estando em causa uma liquidação de IRC que tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação.
6. Feita essa prova, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável nos termos que decorrem dos artigos 17º, nº 1 e 23º do CIRC, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada;
7. A verificação de anomalias na contabilidade do sujeito passivo não é condição, só por si, para promover a aplicação de métodos indirectos, exigindo-se, para esse efeito, que tais anomalias inviabilizem o apuramento directo da matéria tributável.
8. Mostrando-se que certos montantes declarados como custos correspondem a operações simuladas, a determinação da matéria colectável deverá fazer-se através de forma directa, nomeadamente, por via da não-aceitação desses custos.”
100ª – Andou mal o Tribunal a quo quando na sentença recorrida entendeu estarem verificados os pressuposto previstos nas alíneas b), c) e e) do artigo 87º da LGT, para o recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da recorrente já que, a AT não provou a impossibilidade da determinação da matéria tributárias em causa a partir da contabilidade da Recorrente, que reconhecer estar organizada segundo os princípios contabilísticos, a Recorrente ter justificado a existência dos prejuízos e não terem sido publicados os indicadores objectivos de base técnico-científica.
101ª – Para se socorrer dos valores que os rácios R17 e R4 assumem a nível nacional, a FP alegou erradamente no Relatório da Fiscalização que no distrito só existiam 3 sujeitos passivos a produzirem betão, quando até é público e notório que no distrito de X...., para além da Recorrente, operavam no ano de 2003, as empresas concorrentes da Recorrente (B... SA, U... SA, BM... SA, C..., SA, Bl..., SA) que possuem dezenas de centrais de betão espalhadas pelo país e complementarmente são produtores de britas e de areias e/ou produtoras de cimento, ou são simultaneamente produtoras de britas, areia e cimentos, que constituem as matérias-primas principais do betão, o que lhes proporciona enormes vantagens competitivas que a Recorrente nunca teve.
102ª – Os valores que os rácios R4 e R17 assumem a nível nacional para o 3º quartil não podem ser aplicados à Recorrente com os fundamentos indicados quer no RF quer nos depoimentos prestados pelos ITs em julgamento; a Recorrente não exerce a sua actividade a nível nacional, não tem 40 ou mais centrais, não tem os custos de estrutura nem de exploração das grandes empresas que foram consideradas no cálculo daqueles rácios.
103ª – Nos termos do nº 1 do artigo 90º da LGT, caso o tribunal a quo entendesse que se verificavam os pressupostos para a determinação por meios indirectos da matéria tributária de IVA de 2003, deveriam ser então utilizadas as médias das 2 ou 3 empresas do distrito de X.... que não são de âmbito nacional, pois, só estas podem servir para efeitos comparativos.
104ª – A AT violou o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 90º da LGT, pois, não calculou as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros da Recorrente, o que até era muito simples de fazer, tendo em conta que a produção da impugnante assenta apenas num produto que é o betão pronto; também violou o disposto na alínea b) do artigo 90º da LGT, pois, não calculou as taxas médias de rentabilidade de capital investido da Recorrente.
105ª – A AT violou a alínea c) do artigo 90º da LGT pois, não calculou o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos da Recorrente; violou ainda a alínea d) do artigo 90º da LGT ao não considerar os elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte.
106ª A AT violou também o disposto na alínea e) do artigo 90º da LGT, pois, não teve em conta a localização e dimensão da actividade exercida, bem assim, o disposto na alínea f) do artigo 90º da LGT, pois, os custos não foram presumidos em função das condições concretas do exercício da sua actividade; violou também o disposto na alínea i) do artigo 90º da LGT pois não teve em conta a relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte; por consequência, a sentença recorrida violou também as citadas normas.
107ª – Resulta claramente do RF que os peritos desconheciam diversos factos que para a Recorrente funcionaram como desvantagens competitivas, nomeadamente, que:
f) À data dos factos, a impugnante era a única empresa no distrito que utilizava uma central de betão de via seca;
g) À data dos factos, a impugnante era a única empresa no distrito que não possuía a certificação da qualidade ISSO9001 dos seus produtos o que a impedia de vender para obras públicas.
h) Tanto na data dos factos como ainda hoje em dia, a impugnante tem em funcionamento a menos de 500 metros das suas instalações industriais, uma empresa de produção de betão pronto denominada I... Lda., cuja concorrência nunca foi tida em consideração pelos peritos da AT.
i) A reduzida dimensão da sua produção e os elevados custos fixos de estrutura (administrativos, comerciais e de distribuição).
j) O mercado do betão pronto é altamente competitivo fazendo com que a impugnante tenha de disputar o mercado com grandes empresas, bem estruturadas, que também produzem cimento, areias e gravilhas que juntamente com a água, constituem as únicas matérias primas utilizadas no processo produtivo do betão.
108ª – O nº 1 do artigo 90º da LGT, que foi violado a quo, estabelece que, em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indirectos poderá ter em conta os seguintes elementos:
a) As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros;
b) As taxas médias de rentabilidade de capital investido;
c) O coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias primas e outros custos directos;
d) Os elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte;
e) A localização e dimensão da actividade exercida;
f) Os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade;
g) A matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração tributária.
h) O valor de mercado dos bens ou serviços tributados.
i) Uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.
O que não foi respeitado, nem pelo Relatório Fiscal, nem pela sentença recorrida.
109ª – O nº 2 do artigo 90º da LGT constitui letra morta em virtude dos indicadores objectivos de actividade de base técnico-científica nunca terem sido publicados; pelo que, a utilização pela AT dos valores que o rácio R17 e R4 assumem a nível nacional na determinação da matéria tributária da impugnante em sede do IVA da impugnante nos anos de 2003, sem ter em conta a sua reduzida dimensão e a localização, viola a alínea e) do nº 1 do referido artigo 90º da LGT
110ª – A norma prevista no nº 1 do artigo 90º da LGT, não permite a utilização de rácios, sejam eles os rácios do distrito ou do território nacional, sejam eles o 1º quartil, a mediana, ou o 3º quartil; não é possível a aplicação do disposto no nº 2 do artigo 90º da LGT; a determinação da matéria tributária da impugnante em sede de IVA quanto ao ano de 2003 não permite fundamentar do ponto de vista legal, a aplicação dos rácios que o perito da AT aplicou na determinação da matéria tributária impugnada. ; e nenhuma outra norma contida no nº 1 do artigo 90º da LGT permite a utilização dos rácios de outras empresas, com a mesma dimensão, localização e forma concreta do exercício de actividade, na determinação por métodos indirectos das matérias tributárias da Recorrente.
111ª – As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros, as taxas médias de rentabilidade de capital investido e o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias primas e outros custos directos, referidos nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT, dizem respeito à própria impugnante e não a quaisquer outras empresas.
112ª – A utilização dos rácios de outras empresas, na determinação por métodos indirectos, da matéria tributária da impugnante em sede de IVA do ano de 2003, viola frontalmente as alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 90º da LGT.
113ª – A notificação da impugnante para exercer o direito de audição prévia no procedimento da determinação da matéria tributária impugnada, não continha elementos que lhe permitissem saber a forma como foram elaborados, bem como as empresas do sector que foram consideradas pelos Serviços de Informática da Direcção Geral dos Impostos no cálculo daqueles rácios para que a impugnante se pudesse pronunciar sobre a localização e a dimensão das mesmas e bem assim, poder confirmar que os referidos rácios não enfermam de erros de cálculo.
114ª – O que o IT, CC, escreveu na página 40 do RF, constitui a única fundamentação de facto que foi utilizada pela AT para justificar a aplicação dos rácios a nível nacional na determinação por métodos indirectos da matéria tributária impugnada, porém, em clara violação do disposto no artigo 90º da LGT, pois nem se referem à impugnante nem constituem os indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica.
115ª – Em parte alguma do Relatório de Fiscalização existem fundamentos objectivos, estribados em dados objectivos resultantes da análise dos rácios da recorrente com os rácios das empresas congéneres suas concorrentes, com a mesma localização e dimensão da actividade exercida que permitissem ao Perito fundamentar a aplicação do 3º quartil do rácio R17 a nível nacional na determinação do seu volume de negócios.
116ª – Na determinação do volume de negócios que serviu de base à liquidação do IVA de 2003, o IT aplicou o valor do 3º quartil do rácio R17, quando o disposto na alínea a) do artigo 90º da LGT só permite que sejam aplicadas as médias e aqueles que resultem dos rácios do próprio impugnante, em função da sua situação concreta de exploração, estando a AT obrigada a calcular “o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias primas e outros custos directos”; ou seja, no caso dos autos, comparar o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias primas e outros custos directos com os coeficientes técnicos das empresas do sector que também utilizassem uma central de via seca; pois, só a partir daqui a AT poderá determinar “as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros” e estabelecer “uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.”; porém, nenhum destes elementos constam do RF.
117ª – Mesmo que o artigo 90º da LGT permitisse a determinação do volume de negócios que serviu de base à liquidação do IVA de 2003 impugnada com recurso aos rácios, por força do disposto na alínea e) daquele artigo, o IT não poderia ter aplicado o valor do rácio R17 de nível nacional, pois, tal norma exige que seja tida em consideração a localização e a dimensão da actividade exercida, contrariando o disposto na alínea e) do artigo 90º da LGT; que a sentença a quo também violou.
118ª – Tal como foi deposto em julgamento pela testemunha HH, a Recorrente só possui uma única central de produção de betão e, por isso, tem a dimensão mais reduzida do sector de actividade no distrito de X...., e não possuía as vantagens competitivas que a grande maioria das suas congéneres tinham por serem simultaneamente produtoras de cimento, britas e areias que constituem as matérias-primas do betão, e a qualidade do betão que produzia não estava certificada; os custos de estrutura da Recorrente eram mais elevados que os das congéneres concorrentes e ainda operava com uma central de betão de via seca obsoleta e gasta, ao contrário daqueles que usavam centrais de via húmida.
119ª – A Recorrente é apenas comparável à sua vizinha I... LDA., porém, esta desenvolve também a actividade de serração e polimento de granitos, e os seus custos de estrutura são inferiores aos da Recorrente por estarem a ser diluídos por um maior volume de negócios; contrariamente ao entendimento da AT, a BR... não pode ser comparada à Recorrente, pois, aquela já possui duas centrais de betão e, pelo menos, uma pedreira onde produz os inertes e não possui nenhuma concorrente nas proximidades do mercado em que actua; mas como o seu volume de negócios é muito superior pelo facto de produzir os inertes e possuir duas centrais de betão, em virtude dos custos fixos administrativos e comerciais estarem diluídos por um maior volume de negócios, os seus custos de estrutura são inferiores aos custos de estrutura da Recorrente.
120ª – A utilização de uma central de via seca (de baixa produtividade e rentabilidade, produzindo betão de fraca qualidade e com elevada percentagem de betão rejeitada pelos clientes), os elevados custos de estrutura, dos combustíveis e das reparações justificavam, como justificam os prejuízos apresentados pela Recorrente no período em causa; tanto mais que, as máquinas e equipamentos utilizadas pela impugnante nos anos de 2003, 2004 e 2005, tinham sido adquiridas aquando do investimento inicial de 1992 (ou seja, há mais de 10 anos à data do procedimento inspectivo), estavam gastos e obsoletos, e geravam elevados custos de conservação e reparação em consequência das frequentes avarias.
121ª – O mesmo sucedeu com os camiões-betoneiras utilizados na distribuição dos produtos, com mais de 10 anos de trabalho, também eles desgastados e obsoletos, originando maior consumo de combustível e menos potência que os motores dos novos camiões (que a Recorrente teve de adquirir durante os anos de 2005 e 2006), bem como maiores custos de conservação e reparação, sendo certo que aos custos de estrutura acrescem custos de conservação e os custos com os combustíveis que são contabilizados na conta de Serviços e Fornecimentos de Terceiros.
122ª – A grande quantidade de betão rejeitado pelos clientes devido à dificuldade no controlo de qualidade dos produtos obtidos com a utilização da central de via seca contribuiu para que os consumos com as matérias-primas fossem superiores aos consumos das matérias-primas das empresas concorrentes as quais, sem excepção, há muito que utilizam centrais de via húmida, tal como se alcança do RF.
123ª – O IT utilizou o R17 para determinar o volume de negócios a partir das compras das matérias-primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pelo SP, sem ter em conta uma relação congruente com a situação concreta da Recorrente; a utilização daquele rácio R17 para determinar o volume de negócios a partir das compras das matérias-primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pelo SP, gera um volume de negócios da recorrente superior ao normal, em consequência dos custos anormais dos consumos das matérias primas mais os serviços e fornecimentos de terceiros da recorrente, principalmente pelas razões apontadas supra (máquinas e equipamentos com mais de 10 anos, gastos e tecnologicamente obsoletos, provocando elevados custos com reparações e conservação, maiores custos com combustível a par da interioridade da empresa obrigando-a a ter de percorrer mais quilómetros para efectuar as entregas aos seus clientes, maiores consumos de matérias primas devido ao maior consumo e betão rejeitado por falta de qualidade).
124ª – A aplicação do rácio R17 resulta que, quanto maiores são os custos que a Recorrente tem de suportar com reparações e conservação (sem contar com o tempos das paragens da produção em que as máquinas avariadas não produzem e os camiões betoneiras não fazem entregas), com os combustíveis e com os produtos rejeitados em consequência da falta de qualidade dos produtos obtidos na central de via seca, maior será o seu volume de negócios assim determinado; o que não deixa de ser uma contradição para efeitos do disposto no nº 2 do artigo 125º do CPA.
125ª – Na determinação por métodos indirectos da matéria tributável impugnada, a AT socorreu-se do rácio do sector de actividade, CAE 26630, margem bruta II = R17 ao nível do 3º quartil, para determinar o volume de negócios a partir das compras de matérias primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pela Recorrente; na utilização do valor que aquele R17 assume para o 3º quartil a nível do país no cálculo por métodos indirectos do seu volume de negócios, não foi tida em conta a dimensão nem a localização da impugnante em clara violação da alínea e) do artigo 90º da LGT; ao actuar desse modo, a qualificação e a quantificação das matérias tributáveis impugnadas foram inquinadas com manifesto e flagrante erro, em clara violação da lei.
126ª – O RF prova a existência não só de indícios mas também de erro manifesto na quantificação do volume de negócios da impugnante e consequentemente da matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da liquidação adicional impugnada, uma vez que é público e notório de que, em estatística, os valores que os rácios assumem para o 3º quartil são de valor superior aos valores que eles assumem para a média como aliás resulta da simples consulta dos valores que o rácio R17 assume para a média e para o 3º quartil dos rácios de nível nacional do ano de 2003 anexos ao RF, então, o Juiz a quo (ainda que apenas colocado na posição de destinatário normal – o bonus pater familiae), facilmente concluiria que, qualquer número positivo (lucro) multiplicado pelo valor do 3º quartil daquele rácio R17, produz concomitantemente um valor superior (ou seja volume um negócios e consequentemente uma matéria tributária superior) que aquele que resulta da multiplicação daquele mesmo número positivo (lucro) pelo valor da média daquele rácio R17; a alínea e) do nº 1 do artigo 90º da LGT manda ter em conta a localização da recorrente em ZZ... no distrito de X.... e, por isso, no cálculo do volume de negócios da recorrente, a administração tributária estava como está legalmente obrigada a utilizar na determinação do volume de negócios da recorrente e consequentemente da matéria tributária que serviu de base às liquidações adicionais impugnadas, os valores que o rácio R17 assume nos anos de 2004 e 2005 para o distrito de X.....
127ª – A AT nunca notificou a Recorrente dos rácios aplicáveis ao sector de actividade com o CAE 26630, distrito de X...., que só a impugnada possuía em seu poder e que, nunca os notificou à impugnante, assim como nunca a notificou da formação da decisão da liquidação adicional de IVA do ano de 2003, apesar de a isso estar obrigada pelo disposto nos artigos 267º, nº 1 e 268º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, que também foram violados.
128ª – Mesmo que a Recorrente não tivesse feito prova positiva do erro da quantificação da sua matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 e, consequentemente, da liquidação adicional impugnada, tal prova positiva sobre a existência de erro na quantificação da matéria tributável, resulta claramente do Relatório de Fiscalização, devido à utilização pela FP do valor do 3º quartil do rácio R17 que um bónus pater familiae sabe e também resulta da leitura dos rácios de nível nacional para o CAE-Ver.3 – 23630 – Fabricação de Betão Pronto a nível nacional no distrito de X.... CAE anexos ao Relatório, que é de valor superior à média daquele rácio pelo que da aplicação daquele 3º quartil resulta um valor superior do volume de negócios, consequentemente da matéria tributária e das liquidações adicionais de IVA de 2004 e 2005 impugnadas.
129ª – Consultando os rácios anexos ao Relatório, um bónus pater familiae verifica que o valor do 3º quartil a nível nacional do rácio R17 utilizado pelo Perito da FP no cálculo do volume de negócios e consequentemente da matéria tributária que serviu de base à Liquidação Adicional impugnada, é de 0,2568, enquanto que, como estipulam as alíneas a) e e) do nº 1 do artigo 90º da LGT, o valor da média do rácio R17 no distrito de X.... é de 13,06% ou seja 0,1306; por conseguinte, verifica-se a existência de erro na determinação da matéria tributária de IVA do ano de 2003, porque na sua determinação, errada e ilegalmente, a AT socorreu-se de rácios que não têm em conta a dimensão e a localização da impugnada nem tampouco são indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica.
130ª – Como decidiu o Acórdão do TCAN proferido em 30-06-2005 no Processo 00462/04 – Viseu, da 2ª Secção do Contencioso Tributário (Relator: Sr. Juiz Desembargador, Valente Torrão) cujo sumário se transcreve:
1. Cabe à Fazenda Pública fundamentar a utilização dos métodos indiciários para apuramento da matéria tributável, bem como indicar os critérios utilizados na quantificação da mesma, situação que ocorre nos autos, atentas as irregularidades encontradas na contabilidade da recorrente e que inviabilizam o apuramento daquela matéria por outros métodos, tendo a quantificação sido operada a partir de amostragem realizada com base na escrita.
2. Cabe ao contribuinte o ónus de provar o erro da quantificação, nomeadamente por a mesma não se adequar à sua situação, ou por os critérios utilizados na mesma não serem adequados para se apurar a matéria tributável no caso concreto.
Ou seja, os valores do 3º quartil são muito superiores aos valores das médias, pelo que, ao abrigo do disposto no nº 1 artigo 100º da LGT, deverá o acto impugnado ser anulado por resultar provada fundada dúvida sobre a existência e a quantificação por métodos indirectos da matéria tributária em sede de IRC do ano de 2003 impugnadas.
131ª A contabilidade da Recorrente, permitia a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável do IVA impugnado, pois como declarou em sede de audiência de julgamento o Inspetor Tributário CC, verificou que a contabilidade da Recorrente que lhe foi exibida estava organizada de acordo com o Plano Oficial de Contabilidade (POC) e os princípios Contabilísticos, que lhe foi exibida, que não encontrou provas de falsificação ou viciação, que os erros foram supridos no prazo legal, e não existem quaisquer provas no RF da existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente menor do que a declarada, ou seja, não se verificavam quaisquer das situações previstas na alínea b) do nº 1 do artigo 87º e do artigo 88º da Lei Geral Tributárias que foram violados.
132º – Se por um lado, a lei civil e comercial permite o endosso de cheques e a compensação de saldos entre o saldo devedor de um cliente com o saldo credor de um fornecedor da Recorrente e a lei fiscal não proibia à data dos fatos, nem proíbe actualmente, tais endossos e compensações a Recorrente não entende como é que o Tribunal a quo fundamentou a decisão recorrida em tais fatos constantes do RF, tanto mais que os IT não explicam naquele Relatório, nem explicaram nos seus depoimentos como é que, em concreto, tais operações de endosso de cheques e de compensação de saldos teriam ou poderiam ter afetado a matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da Recorrente.
133ª – Ao reconhecer que a Recorrente provou com base nos 216 documentos juntos a fls. ...-... , a existência de tais empréstimos, o Tribunal a quo estava obrigado a tomar em consideração na decisão recorrida o montante dos suprimentos que efectivamente a Recorrente conseguiu provar com base nos referidos 216 documentos.
134º – Para que o Tribunal a quo pudesse legitimamente desvalorizar, como desvalorizou, os depoimentos das testemunhas DD, TOC da Impugnante, e EE, escriturária desta, fundamentando que a valia dos depoimentos prestados ficou condicionada pelo interesse das mesmas na presente causa, tendo em conta que o escrutínio efectuado em procedimento inspectivo versa sobre a área financeira/contabilística, na qual ambas as testemunhas exercem funções ao serviço da Impugnante e têm responsabilidade pela sua elaboração, então mutatis mutandis também deveria ter desvalorizado os depoimentos dos IT sob idêntico fundamento.
135º – Em 2003, como ainda atualmente, o artigo 1143º do Código Civil dispunha que, os mútuos de valor inferior a € 2.000,00 não careciam de qualquer documento e em parte alguma do depoimento da testemunha EE foram referidas quantias de tais empréstimos, por isso andou mal o Tribunal a quo ao exigir documentos para provar os empréstimos efetuados por aquela testemunha ao sócio BB, desvalorizando o seu depoimento com fundamento nesse facto, quando em parte alguma dos autos se provou que assim não era ou que os valores emprestados foram superiores a € 2.000,00.
136ª – A lei processual vigente não impede que as pessoas que trabalham para a Recorrente nos serviços de contabilidade deponham sobre factos de que têm conhecimento direto ou relacionados diretamente com a parte que a indicou como testemunha; a lei apenas impede os gerentes e os administradores da parte de testemunharem.
137º – A Recorrente justificou aos IT que os seus prejuízos sistemáticos se deviam aos elevados custos de estrutura, à forte concorrência e aos elevados custos de distribuição e de transporte das matérias primas; o IT CC reconheceu em audiência de julgamento que ela tinha uma estrutura de custos “pesada”; a Recorrente provou que os custos de distribuição são muito elevados quando comparados com a grande parte dos seus concorrentes; a menos de 500 metros da Recorrente existe outro produtor de betão (o que é público e notório) e que no distrito de X.... existem 8 empresas concorrentes e não apenas 2, pelo que, a sentença recorrida andou mal ao entender que não existem justificações para os seus sucessivos prejuízos.
138ª – Resulta dos autos que nos anos de 2003, 2004 e 2005, e ainda actualmente, não é aplicável por falta de regulamentação o disposto na alínea) do nº 1 do artigo 90º da LGT para a determinação do volume de negócios da Impugnante, que a AT considerou ser a matéria tributária em sede de IVA na liquidação impugnada em resultado da aplicação de rácios das “margens médias de lucro líquido”.
139ª – Como decidiu a 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão que proferiu em 24-03-2004 no Processo 01814/03 em sumário: “I. A utilização de métodos indirectos na determinação da matéria colectável, através de “margens médias do lucro líquido”, a que se refere o art. 90º, n.º 1, al. a) da LGT, não concretiza a aplicação dos “indicadores de actividade inferiores aos normais”, prevista no art. 89º do mesmo compêndio legal. II. Este último normativo só será aplicável uma vez concretizada a via regulamentar necessária para o efeito, o que ainda não aconteceu. III. Assim, nos casos previstos em 1 (primeira parte), o direito de liquidar os tributos caduca no prazo de quatro anos, que não no de três, aplicável à sua segunda parte – art. 45º, n.ºs 1 e 2 da LGT.
140ª – Na determinação da matéria tributária da Impugnante, como se alcança do Relatório de Fiscalização que serviu de base à liquidação de IVA do ano de 2003 impugnado, no valor de € 80.884,49 e acrescida de juros compensatórios no valor de € 13.234,25, a AT aplicou os valores que os rácios R17 e R4 assumem para o 3º quartil a nível nacional para o sector de actividade com o CAE 26630, o que fez em contrariando ostensivamente o acórdão do STA citado na conclusão anterior a esta.
141ª – Os valores que tais rácios R17 e R4 assumem para o 3º quartil a nível nacional, não são os indicadores objetivos de actividade de base técnico-cientifica e resultam apenas do tratamento informático das declarações tributárias dos contribuintes (sem que a AT tivesse provado o rigor técnico e cientifico de tais rácios), efectuado pelos serviços da Recorrida a partir dos lucros líquidos declarados a nível nacional pelas empresas daquele sector de actividade da Impugnante, independentemente da sua dimensão, localização, tecnologia e outras vantagens competitivas como sejam a capacidade de gestão (lá diz o ditado a tenda a quem a entenda), pelo que, os valores que tais rácios assumem, representam de forma direta ou indireta “margens médias de lucro líquido.
142ª – O valor que o rácio R17 assume para o 3º quartil a nível nacional para o setor de atividade com o CAE 26630 representa, direta ou indiretamente, a margem média dos lucros líquidos declarados pelas empresas a nível nacional, grandes e pequenas do M... ao GV..., com uma ou mais centrais de betão, que também produzem ou não as matérias-primas (produção vertical), ou seja, que objetivamente não desenvolvem a sua atividade em condições concretas análogas às da Recorrente, pelo que, sem prescindir de tudo quanto já foi anteriormente levamos a estas conclusões, tal rácio não pode ser aplicado na determinação da matéria tributária do ano de 2003 da Recorrente, a partir da qual a AT efetuou a liquidação de IVA impugnada.
143ª – O valor em causa do rácio R17, aplicado pela AT na determinação do volume de negócios do ano de 2003 da Recorrente, que considerou ser a sua matéria tributária para a liquidação do IVA impugnado, não constitui indicador objectivo de actividade de base técnico-científica, e nunca foi publicado legalmente, pelo que, nunca foi objeto de contraditório quer pela Recorrente quer pelas associações empresarias representativas do setor de atividade que desenvolve.
144ª – Do RF notificado pela AT à Recorrente não consta a identificação das empresas, localização, dimensão, tecnologia, entre outras informações do sector de atividade com o CAE 26630, a partir das quais os Serviços da AT calcularam os valores do 3º quartil, do rácio a nível nacional da margem bruta II = R17 que a AT aplicou para determinar a matéria tributária em sede de IVA da Recorrente no ano de 2003.
145ª – A sentença recorrida não se pronunciou, quando estava obrigada a pronunciar-se sobre esta questão alegada pela Impugnante nos itens 198, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 224, 225, 226, 227, 228, 229, 230, 231, 232, 233, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 249, 250, 251, 252, 253, 254, 255, 256, 258, 259, 260, 261, 262, 263, 264, 265, 266, 267, 268, 269, 270, 279, 280, 281, 282 e 283 da petição inicial de impugnação, e não se pronunciou também sobre o facto de a AT ter aplicado um rácio (o rácio R17) na determinação da matéria tributária que serviu de base à liquidação do IVA impugnado, o qual não é um indicador objectivo da actividade da Recorrente de base técnico-científica, não permitindo a lei tal aplicação.
146ª – A AT nunca publicou aqueles rácios, nunca notificou os contribuintes (nem a Impugnante) e as associações empresariais e patronais representativas dos diversos setores de atividade dos valores daqueles rácios, com a indicação das empresas incluídas na amostra, sua localização, dimensão e condições concretas do exercício da atividade, bem assim as fórmulas matemáticas ou estatísticas como esses rácios são calculados para que se pudesse exercer o direito do contraditório dos valores que tais rácios assumem, bem assim do seu rigor científico e técnico.
147ª – Ao aplicar o rácio R17 para determinar a matéria tributária que serviu de base à liquidação do IVA impugnada, a AT violou a alínea a) do nº 1 do artigo 90º da Lei Geral Tributária (LGT) e o artigo 3º do Código de Processo Civil (CPC) e também violou as alíneas c), e), f), h) e i) do nº 1 do artigo 90º da LGT, pois. não teve em conta a dimensão, a tecnologia e a concorrência a que a Recorrente estava sujeita, o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos, os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade, o valor de mercado dos bens ou serviços tributados, nem tampouco estabeleceu uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte localizada no concelho dos ZZ..., distrito de X.... (integrada na região mais atrasada da Europa, facto reconhecido pela AT que, para ajudar as empresas ali localizadas a vencerem o desequilíbrio económico tem vindo a atribuir apoios fiscais no regime da interioridade.
148ª – A inspecção tributária poderia ter aplicado outro qualquer rácio, a nível distrital ou nacional do 1º quartil, do 3º quartil ou da média, mas os Inspetores Tributários não o fizeram porque nenhum dos outros rácios permitia obter um volume de negócios do ano de 2003 da Recorrente (que foi assumido corresponder à matéria coletável em sede de IVA) que no critério subjectivo fosse razoável; porém, os ITs não fundamentam objetivamente qual o critério utilizado para considerar que o volume de negócios do ano de 2003 da Recorrente assim determinado, que igualaram à sua matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 impugnada é, no seu entender, razoável.
149ª – A sentença a quo também não se pronuncia sobre esta questão da fundamentação objectiva da razoabilidade do valor do volume de negócios do ano de 2003 da Recorrente, determinado em resultado da aplicação do valor que o rácio R17 assume a nível nacional para o 3º quartil que a AT assumiu corresponder à sua matéria coletável em sede de IVA.
150ª – As afirmações constantes do Relatório de Fiscalização são incompletas, contraditórias e subjetivas, não concretizam de forma clara e objectiva os factos, nem concretizam objectivamente a forma como tais factos afectam o apuramento da matéria tributária em sede de IVA no ano de 2003 que serviu de base à liquidação de IVA impugnado, impedindo a Recorrente de exercer de forma concreta e objetiva o seu direito ao contraditório, e são manifestamente insuficientes face à legislação vigente, para fundamentarem neste caso o recurso aos métodos indiretos para a quantificação da matéria tributária que serviu à liquidação no ano de 2003 do IVA impugnado e, muito menos, para se fundamentar a aplicação do valor que o rácio R17 assume para o 3º quartil a nível nacional no ano de 2003 para o setor de atividade com o CAE 26630.
151ª – Do depoimento em julgamento prestado pelo Inspetor Tributário, CC, fica provado que a estrutura de custos da Recorrente é pesada; que apenas reconciliou as contas entre a Recorrente e a sociedade cliente J... Lda. e que as contas quais batiam certas; que apesar disso nunca teve conhecimento da existência de permutas entre a Recorrente e o seu cliente J... Lda.; que a contabilidade da Recorrente estava organizada de acordo com o Plano Oficial de Contabilidade e de acordo com os princípios contabilísticos; que não detectou quaisquer omissões de vendas ou de proveitos na contabilidade da Recorrente (o que constitui contradição com o que redigiu no RF); que não encontrou provas concretas e objetivas de fuga de operações económicas que contribuem para o apuramento à matéria tributária ao IVA do ano de 2003 da Recorrente; que a decisão de tributar pelos métodos indirectos teve por base os indicadores, sem especificar quais, sendo certo que os indicadores objectivos de base técnico-científica nunca foram publicados; que não procurou saber se os dinheiros depositados nas contas de depósitos à ordem da Recorrente e creditados na conta de suprimentos do sócio BB tiveram origem em contas bancárias que ele era titular quer em Portugal quer no estrangeiro; e que admitiu logo à partida que o dinheiro não era de contas pessoais do sócio BB.
152ª – A inspecção tributária partiu, desde o início como foi admitido em julgamento pelo IT CC, da premissa de que os valores creditados na conta de suprimentos do sócio BB não tinham origem em contas bancárias pessoais daquele sócio, mas em “pagamentos de clientes que depois parte cairiam na conta 25”, e não investigou a verdadeira origem daqueles valores em dinheiro e cheques endossados que a Recorrente contabilizou a crédito da conta do sócio BB, limitando-se a dizer a fls... do seu Relatório da Fiscalização que não estavam documentados.
153ª – O reconhecimento por depoimento em julgamento, por parte do Inspetor Tributário, CC, de que não encontrou nenhuma comissão de vendas da Recorrente durante a Inspecção, que durou 2 anos, à contabilidade e aos negócios desta, não é de molde a pôr em causa a sua contabilidade, sendo ilegítimo e ilegal o recurso à avaliação indirecta na determinação da matéria tributária.
154ª – Os mútuos destinados à pratica de atos comerciais (empréstimo comercial ou mercantil), como ato comercial que é, não carece de qualquer documento para se provar a sua existência, o qual admite qualquer tipo de prova; por isso, à prova dos suprimentos feitos pelo sócio BB não se aplica o regime do artigo 1143º do Código Civil, mas sim o regime dos artigos 394º e 396º do Código Comercial.
155ª – A AT não provou que os empréstimos de dinheiro efectuados pelo sócio BB à Recorrente foram utilizados por esta para a prática de atos civis, antes resultando dos autos da exaustiva prova documental e testemunhal, que os empréstimos de dinheiro efetuados à Recorrente pelo seu sócio BB se destinaram a pagar aos fornecedores, a comprar matérias-primas, a pagar os salários, entre diversos outros atos comerciais objetivos.
156ª – Não logrou, a nosso ver, contrariamente ao decidido a quo, a Administração Tributária demonstrar, de forma suficiente e cabal o primeiro dos pressupostos em que se funda a sua actuação, qual seja, o pressuposto previsto na alínea b) do art.º 87º da LGT, na numeração vigente à data a que os factos tributários se reportam, nomeadamente, quanto à aplicação no RF dos critérios que estão na base da quantificação que efectuou.
157ª – Os empréstimos de dinheiro efetuados pelo sócio BB à Recorrente e utilizados por esta na prática de atos comerciais objetivos, constituem em si mesmos atos comerciais objetivos, e não carecem de forma (escritura pública ou outra) para se provar a sua existência, bastando para o efeito as cópias dos cheques e dos talões de depósito, cuja existência material o próprio IT reconhece no RF.
158ª – Por isso andou mal o Tribunal a quo, quando na decisão recorrida decidiu, sem qualquer prova objetiva de que o dinheiro emprestado pelo sócio BB à Recorrente, contabilizados por esta na respetiva conta de suprimentos, não estava documentado, o que apenas sucedeu por não ter atendido à prova documental que a Impugnante juntou aos autos.
159ª – Apesar de o tribunal a quo reconhecer que os documentos juntos pela Recorrente aos autos justificam 216 dos registos contabilísticos efectuados na conta de suprimentos do sócio BB, porém, em parte alguma da decisão recorrida quantifica o montante correspondente aos tais 216 registos contabilísticos, os quais justificam a quase totalidade dos movimentos a crédito da conta de suprimentos do sócio em causa, sendo os restantes 400 registos a crédito da conta do referido sócio, de valores materialmente não relevantes.
160ª – No entender da Recorrente, o tribunal a quo fez uma incorreta análise critica da prova carreada para os autos pela AT, designadamente, no cotejo das afirmações constantes do RF e das declarações contraditórias feitas em sede de audiência de julgamento pelo Inspetor Tributário Dr. CC, responsável pelo trabalho de campo e pela redação do RF da fiscalização que foram utilizadas para fundamentar o recurso aos métodos indiretos para determinar a matéria tributária em sede de IVA do ano de 2003 da Recorrente, e para fundamentar a aplicação do valor que o rácio margem II = R17 (calculado pelos Serviços da Recorrida a partir das margens médias de lucros líquidos declaradas pelos contribuintes do setor de atividade com o CAE 26630) assume a nível nacional para o 3º quartil na determinação do volume de negócios médio no ano de 2003 da Recorrente que a AT assumiu ser a matéria tributária para servir de base à liquidação do IVA impugnado.
161ª – O tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova, pelo que, a decisão recorrida deve ser declarada nula, os fundamentos que utilizou são subjetivos, obscuros, incompletos e contraditórios violando o disposto, entre outros, nos artigos 2º alínea e) e 125º do CPPT e 668º nº 1 alínea b) do CPC, pelo que, ad quem deve ser substituída por outra.
162ª – O recurso merece provimento, em consequência do erro de pressupostos para o recurso aos métodos indirectos de determinação do IVA do ano de 2003 da Recorrente e ainda, se assim não for entendido pelo tribunal ad quem, pela existência de erro grave e notório na qualificação e quantificação das matérias tributárias que deu origem às liquidações impugnadas, o que implica a nulidade da sentença, por falta de fundamentação, a qual deve ser revogada e substituída ad quem.

163ª – A nosso ver, a sentença recorrida violou as seguintes normas jurídicas:
- Artigos 87º alíneas b), c) e e); 88º; 89º nº 1 e 2; 90º nº 1 alíneas a), b), c), d), e), f) e i) da LGT;
- Artigos, 2º, 99º, 394º e 396º do Código Comercial;
- Artigo 342º, 847º e 848º do Código Civil;
- Artigos 267º nº 1 e 5; 268º nº 3 da Constituição da República
- A alínea a) do nº 1 do artigo 90º da Lei Geral Tributária (LGT);
- O artigo 3º do Código de Processo Civil (CPC).
- O artigo 125º do CPPT
- O artigo 668º, nº 1, alíneas b) e d) do CPC

TERMOS EM QUE, DEVE O RECURSO MERECER PROVIMENTO, REVOGANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA EM CONFORMIDADE COM AS RESPECTIVAS CONCLUSÕES, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.»

1.2. A Fazenda Pública (Recorrida), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 696 SITAF no sentido da improcedência do recurso, pelo qual adere e reproduz a fundamentação do parecer do MP emitido no âmbito do processo n.º 4...2/....6BEBRG.
«A Magistrada do Ministério Publico junto deste Tribunal, vem ao abrigo do disposto no artº 289º do CPPT pronunciar-se sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, emitindo, para tanto o seguinte parecer.
Em sede do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese julgar improcedente a impugnação deduzida pela impugnante, em consequência, manter as liquidações adicionais de IVA DO ANO DE 2003 e que resultaram do recurso à avaliação indirecta, no seguimento do procedimento inspectivo de que foi alvo a impugnante.
Do procedimento inspectivo de que foi a recorrente alvo, resultaram liquidações adicionais de Iva do ano de 2004 e 2005 e 2006, conforme se conclui da matéria dada como provada na douta sentença.
E, relativamente à liquidação de IVA dos anos de 2004 e 2005 está pendente neste TCAN o recurso da douta sentença que declarou improcedente a impugnação apresentada pela ora recorrente. Vide processo nº 4...2/....6BEBRG, que está em recurso neste TCAN.
Os fundamentos deste recurso são os mesmos do recurso interposto naquele, pelo que, com o devido respeito se mantém o que aí foi dito pelo MP.
Junta cópia do parecer emitido no processo nº 4...2/....6BEBRG.

«Parecer do Ministério Público- artigo 286º do Código do Procedimento e de Processo Tributário
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar improcedente a impugnação deduzida e, em consequência, manter as liquidações adicionais de IVA impugnadas, respeitantes aos períodos compreendidos entre os meses de janeiro de 2004 e Dezembro de 2005 e que resultaram do recurso à avaliação indirecta, no seguimento do procedimento inspectivo de que foi alvo a impugnante
O recorrente discorda do decidido, sustentando em síntese, que:
a) o tribunal andou mal ao dar como provados os factos constantes dos itens 8 e 9 da sentença, pois que tal revela uma desvalorização, sem a essencial fundamentação, dos depoimentos prestados pelas testemunhas por si arroladas
b) e andou mal ao decidir que se verificaram os pressupostos para o recurso aos métodos indirectos para determinação da matéria tributarias de IVA/IRC dos anos de 2004 e 2005, uma vez que nos autos existem suportes probatórios suficientes, quer testemunhal quer documental, que a contabilidade da recorrente estava organizada de acordo com os princípios contabilísticos e a mesma, por sua iniciativa corrigiu os erros informáticos e tipográficos na emissão das guias apresentando as competentes declarações de substituição, além de que existe erro grave e notório na qualificação e quantificação das matérias tributarias que deu origem às liquidações impugnadas.
Quanto à matéria de facto dos pontos 8 e 9 da douta sentença que a recorrida quer ver eliminada.
Toda a matéria dada como assente, e mais concretamente a que consta dos pontos impugnados (8 e 9) resultou dos documentos juntos ao PA e juntos com os articulados ao processo.
Conforme se diz expressamente na douta sentença, em sede de motivação da matéria de facto assente, o depoimento das testemunhas oferecidas pela recorrente, bem como das testemunhas da Fazenda Publica, pelas razões aí explicitadas, não contribuíram para que decisão diferente fosse tomada nesta vertente factual
Ademais, não cumpriu o recorrente relativamente à impugnação da matéria de facto contida nos itens 8 e 9 da douta sentença, com base no depoimento das suas testemunhas, o ónus estabelecido no artigo 685-B do CPC, que dispõe
1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
3 - Na hipótese prevista no número anterior, incumbe ao recorrido, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, podendo, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
4 - Quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições previstas nos números anteriores.
5 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A.
No caso concreto o fundamento para atacar a matéria de facto dada como provada nos itens 8 e 9, baseia-se no depoimento das testemunhas que apresentou, cujos depoimentos foram gravados.
Ora não tendo a recorrente indicado na sua alegação conclusiva o inicio e o termo do registo áudio dos depoimentos das testemunhas, não respeitou o ónus que lhe impõe o artº 685-B do CPC, pelo que não pode o depoimento das suas testemunhas servir de fundamento à alteração da matéria de facto provada nos itens que impugnou.
Quanto a falta dos pressupostos para a o recurso aos métodos indirectos
A Administração Fiscal aplicou métodos indirectos na determinação da matéria colectável do ano de 2004 e 2005 que originou a liquidação impugnada.
Na base da correcção da matéria colectável esteve um conjunto de situações que constam da matéria dada como provada que patenteiam a insuficiência dos elementos da contabilidade da impugnante, no sentido de permitir a percepção directa do seu rendimento real e que estão sintetizadas nos itens 1 a 12 da douta sentença: vide fls 521 a 522
Como defendeu o Magistrado do MP da 1ª instância, cujo parecer se subscreve, foi feita prova abundante de que a Fazenda Publica logrou demonstrar, como lhe competia os pressupostos que legitimaram a sua actuação pois que reuniu todo um conjunto de elementos que conseguiu evidenciar, não só a insuficiência da organização contabilística como também a discrepância entre lançamentos contabilísticos e as operações que estão subjacentes a esses mesmos registos.
Nos termos do artº 87º, alínea b) da LGT ,a Administração Tributaria pode recorrer aos métodos indirectos na determinação da matéria tributável perante a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto, sendo, conforme resulta do artº 88º do mesmo diploma legal que tal impossibilidade pode resultar, para o que aqui interessa, da insuficiência ou inexistência dos elementos de contabilidade, bem como discrepância manifesta entre o valor declarado e o valor de marcado dos bens ou serviços, bem como a existência de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada
Quanto à quantificação da matéria tributaria
Neste particular acompanhamos também o parecer do MP da 1ª instância, no qual se defende que os critérios de que se socorreu a Fazenda Publica se mostram devidamente fundamentados e justificados no caso em apreço, tendo em vista as condicionantes externas e próprias do sujeito passivo, sendo que a existir duvida fundada na quantificação, nos termos e para os efeitos do artº 100º do CPPT, a mesma reverte contra o contribuinte, por ser ele a causar e a manter a incerteza sobre a concreta quantificação.
Em conclusão, deve a douta sentença ser mantida na íntegra, assim se fazendo Justiça.»
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 707º do Código de Processo Civil (CPC), redacção vigente à data da apresentação do requerimento do recurso 08.06.2012, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações - cf. artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 5, Código de Processo Civil (CPC), na versão vigente, dada pelo DL. n.º 44129, de 28/12 de 1961, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que são as seguintes:
Ø Saber se o tribunal andou mal ao dar como provados os factos constantes dos itens 8 e 9 da sentença, pois que tal revela uma desvalorização, sem a essencial fundamentação, dos depoimentos prestados pelas testemunhas por si arroladas;
Ø Saber se incorreu em erro de julgamento ao decidir que se (i) verificaram os pressupostos para o recurso aos métodos indirectos para determinação da matéria tributárias de IVA do ano de 2003, uma vez que nos autos existem suportes probatórios suficientes, quer testemunhal quer documental, de que a contabilidade da recorrente estava organizada de acordo com os princípios contabilísticos e a mesma, por sua iniciativa corrigiu os erros informáticos e tipográficos na emissão das guias, apresentando as competentes declarações de substituição e, ao decidir (ii) que não ocorreu erro grave e notório na qualificação e quantificação das matérias tributarias que deu origem às liquidações impugnadas.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«A) Factos Provados
1. A sociedade CP..., Lda., NIPC ..., com sede na Quinta de..., iniciou a sua actividade em 20.03.1992, encontrando-se colectada em IRC pelo exercício da actividade “fabricação de betão pronto”, estando abrangida, no ano 2003, no regime normal de IVA, de periodicidade mensal.
2. A aqui impugnante foi alvo de inspecção, de âmbito parcial, relativamente aos anos 2003 a 2006, levada a efeito a coberto do despacho DI.......60 de 11.04.2005 – cfr. fls. 36 a 40 do PA.
3. No decurso desta acção inspectiva, a Impugnante apresentou, para efeitos de IVA, declarações de substituição, relativas aos períodos de 2003, 2004 e 2005, das quais resultaram imposto a entregar a favor do Estado, nos valores de € 8.268,65, € 17.494,81 e € 29.979,09, relativamente a cada um dos exercícios, conforme se constata dos quadros de fls. 45 e 46 do P.A., que se dão por reproduzidos.
4. No âmbito desta acção inspectiva foi elaborado o relatório de fls. 38 a 48 do P.A., que se considera integralmente transcrito, e do qual consta:
“(…)
Da pesquisa efectuada à base de dados, constatou-se a existência de prejuízos fiscais, continuados, conforme o quadro que se segue:

ANO
VALORES em €
1996
- 86.199,11
1997
-174.851,27
1998
- 101.835,95
1999
- 168.968,27
2000
-278.137,20
2001
- 296.269,29
2002
-256.162,64
2003
- 367.493,54
2004
- 361.373,66
2005
- 379.640,24

Levando em linha de conta o supra exposto, e ainda uma informação remetida pela D.F. do ..., através do oficio de 11.969 de 2006.02.08, onde o SP figura numa listagem de clientes da firma LS, cujas vendas foram de C 96.934,2, 310.960,32, nos anos de 2003 e 2004 respectivamente, sendo que a firma LS não tem qualquer estrutura empresarial, tendo celebrado negócios simulados por substituição de pessoa, há que apurar, entre outros, obrigatoriamente, os factos que sustentaram as correcções técnicas derivadas de lançamentos contabilísticos efectuados, os quais originaram, erradamente, faltas de liquidação de IVA e de proveitos, IVA indevidamente deduzido (“caso LS”), etc.. Aliás, foram já recolhidos elementos que permitem concluir que há omissão de facturação nos exercícios de 2003 a 2005, porquanto o controle das contas 25511 e 2688 eram creditadas por depósitos de cheques e/ou numerário de pagamento de clientes sem que se vislumbrasse a correspondente facturação, sendo de destacar que o SP regularizou, na sua óptica, a situação omissiva em sede de IVA para os exercícios de 2003 a 2005.
Foi ainda aferido que na contabilidade do SP CP..., Lda., constam compras à firma LS no decorrer do ano de 2005.
Face ao exposto, solicita-se a extracção de uma ordem de serviço externa, de âmbito geral, abarcando os exercícios de 2003 a 2006...” (cfr. fls. 47 e 48).
5- No seguimento, a Impugnante foi objecto de acção inspectiva, agora de âmbito geral, a qual versou sobre o exercício de 2003, e que foi realizada pela Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de X...., a coberto da ordem de serviço n.º 0120070305, de 26.09.2007 – fls. 60 a 63 do P.A.
6- Em resultado deste procedimento inspectivo, resultaram correcções, em sede de IVA relativas ao ano de 2003, com recurso à determinação da matéria colectável com recurso à avaliação indirecta, no valor de 80.884,89 Euros – fls. 60 a 104 do P.A., que aqui se consideram, para todos os efeitos, como integralmente reproduzidas.
7- Os fundamentos para o recurso à avaliação indirecta da matéria colectável, constam do Relatório de Inspecção Tributária (RIT), que considera integralmente reproduzido, das quais se destaca:
“(…)
Dado o exposto é bem evidente que a contabilidade desta firma não reflecte com o mínimo rigor a situação patrimonial da empresa, mesmo tendo em conta as correcções efectuadas pelo sujeito passivo, ou seja as correcções técnicas ao volume de negócios, relatadas no capítulo VI. De facto, estas configuram-se insuficientes e não encontrando suportes e justificações para os valores então apresentados pela sociedade, admitimos que esta o tenha feito de forma não sustentada, como forma de tornear a situação anómala encontrada na contabilidade.
Por outro lado, os rácios apresentadas pelo sujeito passivo revelam um desvio significativo ao nível da mediana do sector de actividade (CAE 26630 _ fabricação de betão pronto), quer ao nível da rentabilidade fiscal quer da margem industrial (…). Ora, conforme já referimos, trata-se de uma firma que tem vindo a declarar em todos os exercícios prejuízos fiscais avultados que não se coadunam com a sustentabilidade da empresa nem com o exercício continuado da actividade, aliado ao facto de existir um deficiente controlo interno da firma no que se refere aos registos auxiliares e respectivos documental suporte, como já foi exposto em pontos anteriores. Nestes termos, atento que a impossibilidade de comprovação directa e exacta dos elementos indispensáveis para a correcta determinação da matéria tributável em sede de CIRC e CIVA é evidente (alínea b) do art. 87º da LGT) e, por outro lado, o sujeito passivo apresenta, sem razão justificada, resultados tributáveis traduzidos como “prejuízos fiscais” durante três anos consecutivos (alínea e) do art. 87º da LGT) estão reunidos os pressupostos para que a avaliação indirecta seja efectuada já que é bem patente a insuficiência de elementos de contabilidade. Assim, nos termos do art. 54º do CIRC e art, 84º do CIVA, a liquidação do imposto com base em presunções ou métodos indirectos efectuar-se-á nos casos e condições previstos nos artigos 87º e 89º da Lei Geral Tributária – LGT, seguindo os termos do artigo 90º da referida lei e do art. 54º do CIRC e 84º do CIVA, com as adaptações necessárias.” – cfr. fls. 96 e 97 do PA que consideram integralmente reproduzidas.
8- Os “critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos” constam do RIT, que se tem por integralmente reproduzido, aí constando, entre o mais:
“Do anteriormente exposto resulta, face ao determinado no art. 90º da LGT que, dada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indirectos poderá ter em conta as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros, as taxas médias de rentabilidade de capital investido, o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos, os elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte, a localização e dimensão da actividade exercida, os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade, a matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração tributária, o valor de mercado dos bens ou serviços tributados, uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte e, se a matéria tributável se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores objectivos de actividade de base técnico-científica, a sua determinação efectua-se de acordo com esses indicadores. Conforme se disse, é notória a omissão de facturação de vendas e concomitantes registos pelo que vamos proceder ao cálculo do volume de negócios por métodos indirectos, socorrendo-nos do rácio do sector de actividade, CAE 26630, margem bruta II = R17 ao nível do 3º quartil, para determinar o volume de negócios a partir das compras de matérias primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pelo SP. (…).” cfr. fls. 97 a 102 do PA que consideram integralmente reproduzidas.
9- Com base nas correcções propostas no RIT, o Director de Finanças de X...., com recurso à avaliação indirecta, fixou, para efeitos de IVA, e relativamente ao ano de 2003, imposto em falta no valor de 80.884,89 Euros (fls. 59 e 60 do P.A.).
10- Em 15.04.2008, deu entrada na D.F de X...., pedido de revisão da matéria tributável, ao abrigo do disposto no artigo 91º da L.G.T., nos termos constantes de fls. 460 e ss. do P.A., e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11- Não tendo sido alcançado acordo entre o perito da administração tributária e o perito do contribuinte, por decisão de 18.03.2008, com o teor de fls. 483 a 486 e que aqui se dão por reproduzidas, foi indeferido o pedido de revisão.
12- No seguimento, foi emitida liquidação adicional de IVA, no valor global de € 94.119,14 (incluindo juros compensatórios), relativa ao ano de 2003.
*
B) Factos não provados
Não se provaram os demais factos alegados pelas partes com interesse para a boa decisão da causa.
*
C) Motivação de Facto
Para a consideração dos factos provados, o Tribunal alicerçou a sua convicção na posição assumida pelas partes nos respectivos articulados e no teor dos documentos juntos aos autos pela Autora e no processo administrativo, mencionados a propósito de cada facto.
A factualidade dada como não provada deveu-se ao facto de sobre a mesma não ter sido produzida prova bastante capaz de convencer o tribunal da sua veracidade.
Recorde-se que nos presentes autos foi admitido o aproveitamento da prova produzida nos processos 4...2/....6BEBRG e 3...2/.....2 BEBRG, ambos da UO3 deste Tribunal.
Como resulta de fls. 152, no 4...2/....6BEBRG, prescindiu-se da inquirição de testemunhas, determinando-se o aproveitamento da prova produzida no proc. nº 3...2/.....2 BEBRG.
Assim, no proc. nº 3...2/.....2 BEBRG, prestaram depoimento as testemunhas KK, LL, II, MM, BB, DD, EE, CC e NN.
Na medida em que concordamos inteiramente com a análise critica da prova testemunhal levada a cabo no processo nº 3...2/.....2 BEBRG, nada tendo a acrescentar (eventualmente a ressalvar apenas e só porque certas considerações não são aplicáveis ao objecto destes autos), limitar-nos-emos aqui a transcrevê-la porquanto coisa distinta seria inútil e redundante.
Assim,
“O depoimento da testemunha KK, técnico de laboratório, e trabalhador da Impugnante desde 2006, não foi valorado pelo Tribunal para efeito da matéria de facto dada como provada, não contribuindo também para a demonstração dos factos cuja prova a Impugnante se propôs fazer.
Tal ficou a dever-se à circunstância de o testemunho se não ter revelado suficientemente credível, tendo em conta o vínculo laboral existente entre a testemunha e a Impugnante, sendo certo que na presente causa se discutem factos referentes a período temporal no qual a testemunha não trabalhava ainda na empresa.
Cumpre assinalar que tal circunstancialismo não coibiu a testemunha de fazer afirmações quanto aos períodos em causa, sem que tenha resultado qual a razão de ciência para o afirmado, fazendo também afirmações quanto a matérias que não estão no domínio da sua área de trabalho (designadamente quanto à prática, até 2005, de preços abaixo da restante concorrência), revelando assim empenho e comprometimento com a versão apresentada pela Impugnante, o que levou o Tribunal a não valorar o depoimento prestado.
Da mesma forma, e quanto aos preços praticados pela Impugnante, ao investimento efectuado e às oscilações no volume de negócios em razão dos investimentos alegadamente realizados, importa salientar, que o depoimento revelou genérico sem que fossem concretizados, de forma circunstanciada, os factos em causa.
Quanto ao depoimento prestado pela testemunha LL, funcionário da Impugnante, o mesmo não permitiu ao Tribunal formar convicção positiva quanto à matéria a que foi perguntado (...), revelaram-se (...) vagas as afirmações quanto aos melhores preços praticados pela Impugnante em face da concorrência, limitando-se a testemunha a referir que pensava que seriam mais baixos, apesar de não ser ele quem fixava os preços.
As testemunhas II e MM, no essencial e de mais relevante, prestaram depoimento sobre matérias relativamente às quais se exigia prova documental, dado estarem em causa alegados negócios de permutas tendo por objecto direitos sobre bens imóveis, pelo que os depoimentos não foram tidos em conta para efeitos de demonstração de tudo quanto vinha alegado relativamente a esse núcleo factual.
Referiram ainda que os preços praticados pela Impugnante seriam melhores que os praticados pela concorrência, mas também aqui em termos genéricos, sem a concreta densificação dos preços praticados pelos vários operadores à época no mercado.
O depoimento da testemunha MM incidiu sobre os preços praticados pela Impugnante, versando também sobre empréstimos ao gerente da Impugnante.
Não obstante, o depoimento prestado revelou-se também pouco preciso, posto o relato ter sido efectuado de forma vaga sem que a testemunha tenha conseguido precisar as datas e os montantes dos empréstimos que relatou terem acontecido.
Em face disto, não contribuiu para a demonstração dos factos a que a testemunha depôs.
No que tange ao depoimento da testemunha BB, filho do sócio maioritário da Impugnante, a sua valia fica condicionada quer pela circunstância de ter sido funcionário da Impugnante apenas a partir de Julho de 2005 (...), quer ainda pela relação filial que o liga ao sócio majoritário da Impugnante.
Também este depoimento se caracterizou pela generalidade de relato, e não logrou convencer o Tribunal quanto às razões para existirem levantamentos em dinheiro em Espanha. Acresce que, também ficou por demonstrar a razão de ciência que permitisse à testemunha conhecer dos factos anteriores à sua entrada na empresa como funcionário, nomeadamente no que diz respeito à actividade corrente da sociedade, sua estrutura de custos, fornecedores e clientes.
Razões que, devidamente ponderadas, levaram a que o Tribunal não valorasse o depoimento que foi prestado.
O depoimento das testemunhas DD, Técnico Oficial de Contas da Impugnante, e EE, escriturária da Contribuinte, a valia dos depoimentos prestados ficou condicionada pelo interesse das mesmas na presente causa, tendo em conta que o escrutínio efectuado em procedimento inspectivo versa sobre a área financeira/ contabilística, na qual ambas as testemunhas exercem funções ao serviço da Impugnante e têm responsabilidade pela sua elaboração.
Acresce que os depoimentos se bastaram, na sua essencialidade, com alusões de índole genérica sem uma concreta consubstanciação espacio-temporal dos factos, revelando-se o mesmo relato, por vezes, pouco credível.
A título meramente exemplificativo, atente-se ao depoimento da testemunha EE quando, e não obstante ser assalariada na Impugnante, referiu ter emprestado dinheiro ao sócio da empresa inspeccionada, relato que não vai ao encontro das regras da experiência, posto não constituir prática normal funcionários emprestarem valores aos sócios ou gerentes das sociedade para a qual trabalham, sem que exista qualquer tipo de documentação, tudo o que põe em evidência a fragilidade do testemunho prestado. (...)
No que tange ao depoimento prestado pelas testemunhas CC e NN, ambos inspectores tributários a exercer funções na D.F. de X...., não obstante a forma isenta e credível com que prestaram as suas declarações, as mesmas relataram, no essencial, o que já constava no Relatório emergente do procedimento inspectivo e que faz parte do Processo Administrativo, pelo que os seus depoimentos não contribuíram para a demonstração da matéria factual em causa nos presentes autos.”»
Aditamento oficioso à matéria de facto
Pela pertinência para a decisão da causa e atendendo ao disposto no artigo 662º, nº 1 do CPC, procede-se ao aditamento da seguinte matéria:
13- O valor médio do Rácio 17, no ano de 2003, no distrito de X.... foi de 0,1306– cf. Doc. n.º 9 constante da certidão de fls. 991 – 1270 (1013 e 1014) do SITAF;
14- O valor nacional do Rácio 17 ao nível do 3º Quartil foi fixado para o ano de 2003 em 0,2568 – cf. fls. 99 do Processo Administrativo [PA].

2.2. De direito
Constitui objeto do presente recurso a sentença proferida nos presentes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga datada de 23 de maio de 2012, na parte, que considerou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações de IVA do exercício de 2003 e respectivos juros compensatórios, fundamentadas na aplicação de métodos indirectos.
Sabido que as conclusões do recurso definem o seu objeto, as questões a apreciar, como supra se delimitou no ponto 1.4 do relatório, sintetizadas, reconduzem-se a saber se a sentença recorrida incorreu em (i) erro de julgamento da matéria de facto e (ii) erro de julgamento da matéria de direito, por erro nos pressupostos no que concerne à aplicação dos métodos indiretos na determinação da matéria tributável, bem como erro na quantificação da matéria tributável.
Pese embora a identificação das questões a conhecer pela ordem indicada, iremos inverter a habitual ordem de conhecimento dos vícios/questões suscitadas, iniciando a apreciação dos fundamentos do recurso pelo erro de julgamento no que se refere à errónea quantificação da matéria tributável, uma vez que a procedência de tal questão terá como consequência a procedência do recurso e implicará a inutilidade do conhecimento dos demais fundamentos do recurso, nomeadamente da verificação dos pressupostos de recurso aos métodos indiretos e erro de julgamento de facto que lhe está subjacente.
Contudo, antes de entrarmos na apreciação das questões a tratar, importa referir que no âmbito da acção de inspecção realizada pelos Serviços de Inspecção Tributária, para além das liquidações em sede de IVA que constituem o objecto dos presentes autos, assente na mesma fundamentação foram ainda efectuadas correcções com recurso aos métodos indirectos à matéria coletável da qual resultaram liquidações de IRC igualmente ao exercício de 2003.
Ora, no que respeita às mencionadas liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios, suportadas no mesmo procedimento e relatório final de inspecção, a Impugnante, ora Recorrente, apresentou a competente impugnação judicial, relativamente à qual, em sede de recurso, já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte, por acórdão de 15 de setembro de 2022, proferido no Processo nº 1012/08.1BEBRG, no qual a ora relatora interveio na qualidade de segunda juiz adjunta, concedendo provimento ao recurso interposto da sentença proferida naqueles autos, de teor absolutamente idêntico ao da sentença aqui recorrida [no que respeita à factualidade considerada provada e sua motivação, fundamentação, divergindo, apenas, no imposto em causa] atendendo a pretensão recursiva da Recorrente.
Ademais, as alegações e conclusões de recursos apresentadas naqueles autos (n.º 1012/08.1BEBRG) são similares às apresentadas nos presentes, ou seja, as questões enunciadas são rigorosamente as mesmas.
Atendendo ao exposto, a apreciação levada a efeito naquele processo apresenta-se como sendo inteiramente válida e transponível para os presentes autos, por se tratar de situações assentes no mesmo RIT e decisão de revisão da matéria colectável, pelo que, considerando o comando constante do nº 3 do artigo 8º do Código Civil – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito - acolhemos o decidido naquele acórdão, aderindo integralmente ao seu discurso fundamentador, aqui aplicável, com as necessárias adaptações, ou seja, onde ali, por exemplo, se refere liquidação de IRC, deve aqui entender-se como se reportando ao IVA.
Assim, deixou-se plasmado no referido Acórdão o seguinte:
«4.1.1 Do erro ou exagero manifesto na quantificação da matéria tributável.
Conclui-se das conclusões 185.ª a 200.ª do recurso interposto, que a Recorrente invoca a existência de um excesso na quantificação do imposto através do recurso aos métodos indiretos.
Para tanto, no essencial, alega o excesso na quantificação da matéria tributável derivado da aplicação do rácio nacional e não o rácio distrital (de X....) da respectiva atividade.
Relembremos o quadro legislativo aplicável:
Dispõe o artigo 90.º, nº 1 da Lei Geral Tributária (doravante LGT) relativamente aos critérios de determinação da matéria tributável por métodos indiretos:
“Em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indirectos poderá ter em conta os seguintes elementos:
a) As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros;
b) As taxas médias de rentabilidade do capital investido;
c) O coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos;
d) Os elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte;
e) A localização e dimensão da actividade exercida;
f) Os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade;
g) A matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração tributária;
h) O valor de mercado dos bens ou serviços tributados;
i) Uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e situação concreta do contribuinte.”
Importa também referir as previsões legais no que ao ónus da prova diz respeito. A regra geral está prevista no nº 1 do artigo 74.º da LGT, especificando que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Mas determina a lei uma regra especial quanto à matéria em apreço. O n.º 3 desta mesma norma explicita o seguinte:
“Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação”.
Na sentença recorrida, consta o seguinte discurso fundamentador quanto ao alegado pelo Recorrente:
Com efeito, a administração tributária para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos procedeu ao cálculo do volume de negócios por métodos indirectos, socorrendo-se do rácio do sector de actividade, CAE 26630, margem bruta II = R17 ao nível do 3º quartil, para determinar o volume de negócios a partir das compras de matérias primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pela Impugnante.”
Embora a Impugnante conteste a utilização deste critério o certo é que não provou factos concretos dos quais resulte que a aplicação do mesmo implicou uma errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável.”
Por sua vez, no Relatório de Inspeção Tributário (doravante RIT) foi feito aí constar que:
Conforme se disse, é notória a omissão de facturação de vendas e concomitantes registos pelo que vamos proceder ao cálculo do volume de negócios por métodos indirectos, socorrendo-nos do rácio do sector de actividade, CAE 26630, margem bruta II = R17 ao nível do 3.º quartil, para determinar o volume de negócios a partir das compras de matérias primas e de aquisições de serviços e fornecimentos de terceiros apurados pelo SP.
De referir que optámos pelo valor do 3° quartil nacional, uma vez que se nos afigura ser o mais ajustável às características da unidade económica não só porque, ao nível da unidade orgânica o universo é composto por 3 SP´s e possui parca Informação uma vez que se resume à "Média", e, por outro lado, derivado a este SP já se encontrar implantado no mercado desde 20 de Março de 1992, isto é com vasta experiência do ramo, ser o único no concelho a possuir uma estrutura produtiva unicamente destinada à produção de betão seco, com instalações próprias e frota para escoamento/ colocação do produto correspondente a um activo imobilizado corpóreo considerável de € 2.125.830,24 e imobilizações em curso de € 227.019,64 e, bem assim, despesas com recursos humanos de € 271.419,65. Ademais, a sua localização encontra-se inserida numa área geográfica de intervenção/escoamento estrategicamente posicionada num raio de 60 Km (ao tempo, já que a partir de Outubro de 2003, as comunicações foram soberbamente melhoradas com o lanço da A27, etc), abrangendo a maior parte dos concelhos do distrito de X...., área essa de concorrência partilhada pelas empresas congéneres conhecidas - "U..., S.A." e "B... S.A.", permitindo-se actuar inclusive no concelho de X.... e distrito limítrofe de G....”
Conforme referido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido a 7 de março de 2006, no processo 00993/06:
Estando verificados os pressupostos para recurso a tal método de tributação a administração tributária, dentro da sua margem de liberdade e sindicabilidade encontrou uma margem e apurou o imposto em falta, sendo que neste método de apuramento de imposto há sempre uma margem de discricionariedade e de indeterminação que lhe está subjacente que se prende com a natureza sancionatória que tal regime acarreta, sendo inclusive um incentivo para os sujeitos passivos cumpridores porquanto, o recurso a este mecanismo de tributação tem como meio de combate à fraude e à evasão fiscal, incentivando os contribuintes a procederem com maior rigor na verdade da determinação da matéria tributável e no cumprimento dos deveres de colaboração e nas regras do ordenamento fiscal em vigor.”
Porém, “margem de discricionariedade” é distinto de “arbitrariedade”. Tal como sumariado no Acórdão proferido a 17 de abril de 2015 no processo 00533/10.0BEPRT:
Discricionariedade não é nem pode ser sinónimo de arbitrariedade. A Discricionariedade só se distinguirá da arbitrariedade se tiver como pressuposto um enquadramento legal e se correspondentemente estiver suficientemente motivada e densificada.”
Assim sendo, poder-se-á considerar que o critério utilizado se encontra dentro da designada margem de discricionariedade? Parece-nos que não.
Nos termos do disposto no artigo 77.º, n.º 4 da LGT:
A decisão da tributação pelos métodos indirectos nos casos e com os fundamentos previstos na presente lei especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade de base científica ou fará a descrição dos bens cuja propriedade ou fruição a lei considerar manifestações de fortuna relevantes, ou indicará a sequência de prejuízos fiscais relevantes, e indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável.”
No presente caso, temos que a Administração Tributária utilizou rácios de nível nacional, não tendo em consideração a localização da Recorrente, a qual se situa em X.... (a qual deveria ter sido tomada em consideração nos termos do citado artigo 90.º, n.º 1, al. e) da LGT).
Ora, conforme resulta do facto provado aditado, o rácio do sector de atividade em que se insere a Recorrente, relativamente ao distrito de X.... é de 0,1306, bem inferior ao rácio nacional de 0,2568.
Acresce ainda que, dentro do rácio nacional, foi optado pelo valor do 3º quartil nacional – sem que para tal tenha sido utilizada uma fundamentação compreensível.
Ora, da aplicação do rácio nacional resulta um volume de negócios substancialmente superior (quase 100%) àquele que resultaria da aplicação do rácio distrital.
No entanto, partindo da justificação que a Recorrente é o único contribuinte do concelho (ZZ...) e que há apenas 3 sujeitos passivos no distrito, a Administração Tributária decidiu aplicar o rácio nacional. Sem para tal, ser encontrado qualquer fundamentação.
Vejamos em concreto:
Com a aplicação do rácio nacional:
3.º Quartil do rácio MBII/R17=0,2568 -» MBII = [VN - (CMVC + FST)] / VN]
0,2568 = [(VN - (955.292,15 + 415.730,57)] / VN} e>
0,2568 = (VN - 1.371,022,72) / VN -» 0,2568VN = VN - 1.371.022,72
0,2568VN - VN = - 1.371.022,72 -» VN - 0,2568VN = 1.371.022,72 -» 0,7432VN = 1.371.022,72
VN = 1.371.022,72 / 0,7432 -» VN_______________________1.844.756,08
VN declarado na 1ª DR Anual________________________1.375.527,10
Correcção ao VN efectuado pelo SP____________________43.519. 97
Correcção devida por Métodos Indirectos (M.I.) _________425.709,97
*
Com a aplicação do rácio distrital:
Média do rácio MBII/R17=0,1306 a MBII – [(VN - (CMVC + FST)] / VN]
0,1306 = [VN - (955.292,15 + 415.730,57)] / VN
0,1306 = (VN - 1.371,022,72) / VN -» 0,1306VN = VN - 1.371.022,720
0,1306VN - VN = - 1.371.022,72 -» VN - 0,1306VN = 1.371.022,72 -» 0,8694VN = 1.371.022,72
VN = 1.371.022,72 / 0,8694 -» VN______________________1.576.975,75
VN declarado na 1ª DR Anual_______________________1.375.527,10
Correcção ao VN efectuado pelo SP___________________43.519 .97
Correcção devida por Métodos Indirectos (M.I.)________57.929,64

Ora, do exposto resulta existir uma diferença para mais da aplicação do rácio nacional no montante de € 267.780,33. Uma diferença considerável, (de mais de 100%) traduzível/qualificável como um claro excesso – atendendo que nenhuma justificação/fundamentação existe para tal.
Assim sendo, julgamos, pois, que o método adoptado pela Administração Tributária para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos mostra-se arbitrário e, em abstracto, ostensivamente inadequado, mostrando-se que conduz a resultados claramente excessivos – sem que para tal tenha sido apresentada qualquer justificação.
Assim sendo, na medida da suficiência do já exposto, mostra-se prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas no presente recurso.» (fim de citação)
Transpondo a fundamentação acabada de transcrever, a qual acolhemos integralmente e sem reservas, para o caso concreto, por lhe ser plenamente aplicável, somos, igualmente, a concluir que o rácio nacional aplicado à Recorrente no ano em questão [2003] é largamente superior ao rácio da região de X...., tal como resulta dos pontos aditados ao probatório, sem que a AT tenha explicitado de forma fundamentada o motivo pelo qual não aplicou o rácio previsto para o distrito de X...., entrando em manifesta violação do disposto nos artigos 84º, nº 1 e 3 e 90º, nº 1, al. e), ambos da LGT.
Destarte o método adotado pela Administração Tributária para a determinação da matéria tributável por métodos indiretos mostra-se arbitrário e, em abstrato, claramente inadequando, conduzindo a resultados excessivos sem que tenha para o efeito havido justificação plausível. Razão pela qual, a sentença recorrida, que, assim, não decidiu, incorreu em erro de julgamento.
Pelo exposto, o recurso merece provimento, devendo a sentença recorrida ser revogada, anulando-se os atos impugnados e a impugnação ser julgada totalmente procedente, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
2.3. Conclusões
I. Ainda que caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar.
II. Quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” está devidamente fundamentado, se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados.
III. Estando provado nos autos que a utilização exclusiva daquele critério na determinação da matéria tributável conduziu em concreto a erro de quantificação, por assentar em rácios nacionais muito superiores ao rácio distrital, o que decorre dos factos apurados, deve o acto ser anulado.

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar totalmente procedente a Impugnação Judicial e, em consequência, anular as liquidações impugnadas.
Custas pela Recorrida, em ambas as instâncias, que não incluem taxa de justiça na presente instância, dado que não contra-alegou.

Porto, 3 de novembro de 2022
Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos
Margarida Reis