Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00222/22.3BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:09/27/2024
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:LUÍS MIGUEIS GARCIA
Descritores:ACORDO DE COOPERAÇÃO;
IPSS;
CENTRO DE DIA;
Sumário:
I) – Não resultando os apontados erros de julgamento, o recurso não obtém provimento.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

Santa Casa da Misericórdia de (...) (Rua ..., ... ...), em acção administrativa intentada contra Instituto da Segurança Social, I.P – Centro Distrital de Coimbra (Rua ..., ..., ..., ... ...), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, que a julgou «parcialmente procedente e, em consequência, anula-se parcialmente o ato impugnado, na parte em que ordenou a restituição, pela A., das comparticipações financeiras que lhe foram pagas pelo R. em 2013 e até 16/01/2014, no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias, com as legais consequências.».

A autora/recorrente, conclui:

1) O tribunal de 1.ª instância dispensou a produção das declarações de parte requeridas e da prova testemunhal arrolada pela autora, fazendo-o, com o devido respeito, que é muito, através de uma formulação tabelar/conclusiva e que, por isso, não pode considerar-se para efeitos de fundamentação, sendo, portanto, nulo e de nenhum efeito;
2) Mesmo que assim se não entenda, impunha-se ao tribunal recorrido ordenar os meios probatórios que dispensou, uma vez que, tal como a ação foi configurada pela autora e tomando por referência a contestação do Réu, subsistem factos [nomeadamente os identificados no corpo das alegações] que podem estar carecidos de prova e podem ser relevantes para a boa decisão da causa e justa composição do litígio, em função das várias soluções plausíveis para a demanda;
3) Assim, por mera cautela de patrocínio, impõe-se arguir o erro de julgamento do despacho “sub judice”, por errada aplicação dos comandos legais aplicáveis, o que determinará a respetiva revogação.
4) O tribunal “a quo” dispensou a realização da audiência prévia, cuja realização é obrigatória para pelo menos facultar às partes a discussão de facto e de direito nas situações em que o julgador pretende proferir saneador-sentença, como será o vertente caso;
5) Este despacho consubstancia uma decisão surpresa que pode influir (e influirá) na boa decisão da causa e justa composição do litígio e por isso, verifica-se uma nulidade, que expressamente se invoca, que determinará a respetiva revogação e baixa do processo à 1.ª instância por forma a determinar a sua marcação, por força da violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º-A do CPTA;
6) O prazo de prescrição para a ré pedir a restituição dos valores pagos à autora e que constituem o objeto dos presentes autos é o que resulta do DL n.º 155/92, de 28/07, ou seja o prazo de 5 anos a contar dos pagamentos e, por isso, está prescrito o direito de a SS exigir a os pagamentos que efetuou à autora até 25/10/2016;
7) A ré não arguiu o instituto jurídico da interrupção da prescrição, muito menos o fez de forma expressa e individualizada e especificamente dirigida à arguição da prescrição por parte da autora, e, assim, o tribunal “a quo” estava impedido de lançar mão oficiosamente do referido instituto jurídico, sobre o qual, aliás, nem sequer deu à autora a oportunidade processual de se poder pronunciar antes da decisão surpresa neste particular;
8) O tribunal “a quo” considerou interrompida a prescrição em 16/01/2019 (e, por isso, prescrito o direito de a SS exigir os pagamentos que efetuou à autora até 16/01/2014), não obstante não ter considerado provado (por desde logo não ter sido alegado por quem tinha esse ónus – a ré) a data em que a demandante recebeu o ofício identificado no ponto 7 dos factos considerados provados; a este ofício, a autora respondeu efetivamente em 09/02/2019 – cfr. ponto 8 dos factos considerados provados –, pelo que, quanto muito, no que não se concede, a prescrição só se poderá considerar interrompida em 09/02/2019 (e, por isso, prescrito o direito de a SS exigir os pagamentos que efetuou à autora até 09/02/2014);
9) Como se disse, a ré não arguiu a interrupção da prescrição e por força do artigo 297.º do CC, o regime legal decorrente do DL 133/88, de 20/04, na redação introduzida pelo DL n.º 79/2019, de 14/06, é inaplicável ao caso “sub judice” porque à data em que o mesmo entrou em vigor (15/06/2019) faltava menos tempo para se completar o prazo de prescrição pelo regime decorrente do DL n.º 155/92, de 28/07, dado que, em 15/06/2019:
a. já se tinha completado o referido prazo relativamente aos pagamentos efetuados até 15/06/2014 (e, por isso, prescrito o direito de a SS exigir os pagamentos que efetuou à autora até 15/06/2014)
b. já se tinha iniciado o prazo de prescrição de 5 anos sobre todos os pagamentos relativamente aos quais ainda não estava completado o prazo de prescrição (uma vez que os pagamentos objeto do presente processo situam-se entre 2013 e 2018);
c. E, pelo novo regime, caso se considere que os pagamentos indevidos estavam pendentes, no que não se concede, ainda nem se tinha iniciado o prazo de prescrição, visto que, de facto, o novo regime, embora mantendo o prazo de 5 anos de prescrição, alterou o seu termo inicial e, por isso, de facto, aumentou expressivamente o prazo de prescrição;
10) Interpretação diversa do artigo 1.º do DL n.º 133/88, de 20/04, na redação dada pelo DL n.º 79/2019, de 14/06, aplicando-se este regime a prazos de prescrição que já estavam em curso e relativamente aos quais faltava menos tempo para se completar pelo regime do DL n.º 155/92, de 28/07, não deixará de ser inconstitucional, por violação além do mais do princípio da confiança e da segurança jurídicas e da boa fé. Inconstitucionalidade que expressamente se invoca para todos os legais e devidos efeitos;
11) A decisão “sub judice” postergou quer o princípio do dispositivo, quer os princípios do ónus da prova (artigos 342. e ss.), quer os instituto da prescrição (artigos 300.º e ss. do CC), quer o instituto da interrupção da prescrição (artigos 323.º e ss. do CC, quer o artigo 40.º do DL 155/92, de 28/07, quer o artigo 297.º do CC, quer o DL 133/88, de 20/04, na redação introduzida pelo DL n.º 79/2019, de 14/06;
12) Está de facto em causa o direito de audiência dos interessados, que concretiza o direito à participação procedimental consagrado nomeadamente no n.º 5 do artigo 267.º da CRP, quando dispõe: “5. O processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.” (nossos grifos)
13) Neste âmbito e já num plano infra constitucional, deve atender-se nomeadamente ao artigo 12.º e aos artigos 121.º e ss., todos do CPA, e, em particular neste caso concreto, ao que dispõe o n.º 2 do artigo 122.º do CPA, mais concretamente: “2 – A notificação fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito, indicando também as horas e o local onde o processo pode ser consultado .” (nossos grifos);
14) Feita esta nota introdutória, suscitaram-se a este propósito três questões essenciais. A saber: i) a notificação para o exercício daquele direito não continha a indicação das horas e do local onde o processo administrativo podia ser consultado; ii) a falta de indicação de todos os elementos de facto e de direito relevantes para a decisão proferir; iii) o indeferimento de todas as diligências probatórias requeridas na pronúncia;
15) RELATIVAMENTE À PRIMEIRA DAQUELAS TRÊS QUESTÕES, o tribunal “a quo” reconheceu que a notificação para o exercício do direito de participação da interessada não continha a indicação das horas e do local onde o processo administrativo podia ser consultado, mas acabou por “justificar” tal omissão com o facto de, “grosso modo e brevitatis causa” a ré ter alegadamente prorrogado o prazo para a apresentação de pronúncia;
16) Cremos que o tribunal “a quo” não tem razão. O tribunal de 1.ª instância reconhece que o prazo para a autora se pronunciar expirava a 10/11/2021, mas a partir deste momento e sempre com o devido respeito, que é muito, confunde a data do despacho de prorrogação do prazo (9/11/2021) com a data da expedição deste ao mandatário subscritor (em 12/11/2021) e não aplica corretamente o conceito de “prorrogação” de prazo;
17) Efetivamente, em face do requerimento que a autora atravessou nos autos em fase administrativa (cfr. ponto 11 da matéria de facto considerada provada), parece-nos óbvio que a autora foi impedida de consultar o processo administrativo antes de expirado o prazo (inicial) para o exercício do seu direito. E note-se que a esta assertiva não se opõe a circunstância de o despacho que prorrogou o prazo se encontrar datado de 9/11/2021 (cfr. ponto 12 da matéria de facto considerada provada), uma vez que a ré apenas o expediu em 12/11/2021 (cfr. ponto 14 da matéria de facto considerada provada), ou seja, a expedição (que nem sequer se confunde com a data de notificação) só foi efetuada depois de esgotado o prazo para a autora apresentar a sua pronúncia, o que fez, por cautela, em 10/11/2021 (cfr. ponto 13 da matéria de facto considerada provada);
18) Não se olvida a tramitação administrativa subsequente, nomeadamente a constante dos pontos 14 e 15 dos factos considerados provados, mas a verdade é que o prazo inicial estava esgotado e cumprido sem que a autora tivesse tido a possibilidade de consultar o processo administrativo, por culpa da ré, que não cumpriu o seu dever e não cuidou de notificar o despacho de 09/11/2021 em tempo útil;
19) Aos particulares, salvo o devido respeito, é absolutamente indiferente a data dos despachos, uma vez que, por princípio, só deles tomam conhecimento após a sua notificação e/ou a presunção da sua notificação. Quer com isto dizer-se que quando a autora, através do mandatário subscritor, foi notificada(o) do despacho datado de 09/11/2021, o que jamais ocorreu antes de 12/11/2021 (data da expedição) já o prazo estava completado e cumprido, sem ter a possibilidade de consultar o processo administrativo, frise-se;
20) Na verdade, a ré, perante as visíveis e reconhecidas insuficiências quer da notificação identificada no ponto 10 dos factos considerados provados, quer na data de expedição/notificação do despacho de 09/11/2021 (cfr. pontos 12 e 14 dos factos considerados provados), ao invés de “prorrogar” o prazo, que já estava completado e cumprido e por isso já não era suscetível de prorrogação, e indeferir as diligências requeridas em sede de pronúncia (cfr. ponto 15 dos factos considerados provados), podia e devia ter anulado todo o processamento subsequente à notificação identificada no ponto 10 dos factos considerados provados, inclusive, concedendo um novo prazo para a autora poder exercer o seu direito em toda a sua plenitude, podendo designadamente consultar o processo antes de exercer o seu direito;
21) Pelo contrário, a ré insistiu no erro (da prorrogação do prazo) e, mais grave, tomou uma posição absolutamente contraditória ao indeferir as diligências requeridas. Que dizer? Justificar e desculpabilizar a atuação da ré quando está em causa um princípio que se quer estruturante?
22) Posto isto, mal andou o tribunal “a quo” ao considerar sanado o vício em causa que, julgando-o procedente, devia ter conduzido a anulação do ato administrativo impugnado;
23) RELATIVAMENTE À SEGUNDA DAQUELAS TRÊS QUESTÕES, o tribunal “a quo” reconheceu “a circunstância de não ter sido indicado, de modo expresso e individualizado, qual o normativo concretamente violado pela A. no âmbito do equipamento de Secarias” (retirado da pág. 34 – nossos grifos) mas acabou por concluir que “estava em plenas condições de exercer o seu direito de resposta/defesa à análise efetuada ao equipamento da Sede e ao equipamento de Secarias.“ (retirado da pág. 35 – nossos grifos);
24) Parece inequívoco que, pelo menos relativamente ao equipamento localizado em Secarias, a ré não indicou qualquer fundamento de direito para a decisão que projetava e se mais não houvesse, e há, tal seria suficiente para o tribunal “a quo” ter concluído que não foi cumprido, na íntegra, o artigo 122.º, n.º 2 do CPA;
25) Como é que a autora podia exercer em toda a plenitude o seu direito se: i) não pôde consultar o processo administrativo antes de expirado o prazo (inicial) para o efeito; e ii) não foi indicado qualquer fundamento de direito para sustentar a projetada restituição, pelo menos referente ao equipamento de Secarias;
26) E nem se diga que se foi indicado um fundamento de direito para a projetada restituição referente ao CD Sede, tal valeria, igualmente, para o outro equipamento (CD Secarias), uma vez que, salvo o devido respeito, o conteúdo de ambos os acordos de cooperação são distintos (cfr. os pontos 1 e 2 dos factos considerados provados e os documentos n.ºs 11 e documento junto com a petição inicial de fls. 170 do processo eletrónico) e, por isso, os direitos e as obrigações das partes são igualmente diferenciados;
27) Posto isto, mal andou o tribunal “a quo” ao considerar sanado o vício em causa que, julgando-o procedente, devia ter conduzido a anulação do ato administrativo impugnado;
28) RELATIVAMENTE À TERCEIRA DAQUELAS TRÊS QUESTÕES, o tribunal “a quo” não jugou procedente o vício arguido porque considerou “(...) a violação do direito de audiência prévia, na vertente do direito do interessado de requerer a realização de diligências que, por serem convenientes, só ocorrerá se for omitida a realização de diligências que, por serem convenientes para averiguar factos cujo conhecimento seja necessário para a justa e rápida decisão do procedimento, deveriam ter sido realizadas. Daí que, se, fundamentadamente, a Administração não realizar as diligências de prova requeridas pelo administrado, por entender, justificadamente, que as mesmas não são indispensáveis à descoberta da verdade material, não incorre em qualquer ilegalidade, mormente por violação do direito de audiência prévia.“ (retirado das págs. 36 e 37 – nossos grifos);
29) A autora não pode concordar com a referida tese. Não pode concordar porque na verdade se a lei concede ao particular o direito de participar na decisão, através da sua audição prévia, é porque lhe reconhece o direito de a poder influenciar, através de prova documental e/ou testemunhal;
30) Não basta à administração fundamentar o indeferimento. É estritamente necessário que o fundamente e que o fundamente com acerto, o que não se vislumbra;
31) Se fosse como o tribunal “a quo” pugna, no que não se concede, isto é, se fosse no sentido de que “dependerá da posição que a entidade com competência para a decisão tiver sobre os pontos da matéria de facto que essas diligências podem esclarecer e: se já tiver formado a sua convicção sobre a sua ocorrência, no sentido positivo ou negativo, a decisão adequada será o indeferimento da sua realização, (...)” (retirado da pág. 38 – nossos grifos), então, na prática, não se justificará a prática de qualquer diligência probatória requerida pelo particular, uma vez que, se a convicção/decisão já está formada/tomada pela administração, o particular já não a pode influenciar e, assim, reduz-se a zero aquele direito procedimental, o que é manifestamente defeso;
32) Posto isto, as diligências requeridas não eram dilatórias e, insiste-se, foram efetuadas sem que a autora tivesse tido a possibilidade de consultar o processo, por culpa da ré, e, por isso, a demandante desconhecer qual a prova documental carreada para o procedimento administrativo;
33) A autora, ao contrário do referido, não tinha/não tem em sua posse os documentos em forma de certidão, e, não podem subsistir quaisquer dúvidas que os referidos documentos eram relevantes para a boa decisão do procedimento e continuam a ser relevantes para a boa decisão da causa e justa composição do litígio;
34) Uma vez que era e é essencial determinar o concreto teor dos acordos de cooperação (para confirmar que a autora os não violou), o teor do Regulamento Interno (para comprovar a correção da atuação da autora), as datas de pagamento dos valores (para a correta decisão da prescrição), bem como os relatórios das visitas de acompanhamento dos CD Sede e Secarias (para lobrigar as anteriores pronúncias do réu sobre o funcionamento destas duas respostas sociais);
35) E no que tange à prova testemunhal, mister se tornar reiterar que a mesma é, com o devido respeito, admissível no procedimento administrativo, não tendo o ISS, IP cuidado sequer em saber qual a matéria alegada na audiência de interessa que a autora visava comprovar com o recurso aos referidos meios complementares;
36) A autora, com as testemunhas arroladas, pretendia comprovar a matéria alegada nomeadamente nos artigos 28.º, 38.º, 39.º, 40.º, 44.º, 45.º, 51.º, 57.º e 58.º da audiência de interessada, uma vez que não deixava de ser essencial apurar se a ... tinha ou não ao dispor dos utentes todos os serviços próprios dos Centros de Dia e apurar a razão de porventura não prestar algum serviço a algum utente, isto é, apurar se tal devia ou não ao facto de o(s) utente(s) não pretender(em) beneficiar do(s) mesmo(s), e apurar qual o procedimento administrativo da ... para, nessas situações, REDUZIR o valor da comparticipação do(s) utente(s);
37) Pelo que, com o devido respeito, mal andou o réu ao indeferir as referidas diligências e mal andou o tribunal ao julgar improcedente a referida arguição, postergando de forma indelével a finalidade da audiência de interessados [poder influenciar a decisão final do procedimento], bem como o disposto nos artigos 58.º a 60.º do CPA, o que expressa e renovadamente se argui para todos os legais e devidos efeitos;
38) Relativamente aos vícios próprios do ato administrativo impugnado, a sentença “sub judice” encontra-se subdivida em 7 (sete) questões essenciais. A saber: i) violação do dever de decisão e de fundamentação (entre as págs. 40 e 42); ii) a errada aplicação do princípio “tempus regit actum” (pág. 43); iii) a omissão de indicação concreta do fundamento de direito para a decidida restituição (págs. 43 a 45); iv) a omissão de fundamentação de facto relativamente ao equipamento Sede (págs. 45 a 49); v) Erro de facto e de direito quanto à dicotomia Centro de Dia e Centro de Convívio relativamente ao equipamento Sede (págs. 49 a 55); vi) Equipamento Secarias – reprodução de fundamentos (págs. 55 a 56); e vii) o acompanhamento anterior da SS relativamente aos equipamentos e respetivas consequências (págs. 56 e 57);
39) RELATIVAMENTE À PRIMEIRA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que “na informação n.º 10/22, de 25/02/2022, que subjaz ao ato impugnado, foram devidamente apreciadas as questões novas suscitadas pela A. em audiência prévia, conforme consta (...). E a circunstância de não ter sido feita uma referência específica à questão da inexistência de limitação geográfica, a respeito da residência dos utentes, como requisito para a sua inclusão no acordo de cooperação não traduz qualquer omissão de pronúncia geradora de ilegalidade da decisão final, considerando a apreciação e a ponderação global da posição manifestada pela A. na sua resposta que, sem dúvida, foram efetuadas.” e acrescenta ”(...) é perfeitamente possível alcançar os motivos e fundamentos, de facto e de direito, que levaram a R. a decidir como decidiu, (...)”, afastando, assim, a violação do dever de decisão e de fundamentação;
40) É assim inquestionável, também para o tribunal “a quo”, que a ré não se pronunciou e não decidiu todos os fundamentos invocados em sede de audiência prévia ,nomeadamente a circunstância de nem os acordos de cooperação em causa, nem qualquer outra norma estabelecer qualquer limitação geográfica à residência dos utentes do(s) CD;
41) De facto, quer a administração, quer o tribunal “a quo” olvidaram o concreto teor dos acordos de cooperação em dissídio nos vertentes autos e esta, salvo o devido respeito por opinião divergente, tem de se considerar uma questão essencial/basilar;
42) Mas, afinal, a autora violou alguma norma/alguma cláusula do acordo de cooperação? Mas afinal a autora estava impedida de prestar serviços a utentes noutra localização, noutro CD? Mas afinal a autora estava obrigada a prestar serviços que os utentes não desejavam?
43) Estas foram questões colocadas em sede de audiência prévia e que a administração não respondeu, não se pronunciou, não decidiu, violando, assim, os mais basilares deveres que sobre si impendem, tendo optado por refugiar-se em meras conclusões, juízos de valor e questões de direito;
44) Não se olvide que o n.º 2 do artigo 153.º do Código de Procedimento Administrativo estabelece: “Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.” (nossos grifos)
45) Assim, salvo o devido respeito, a autora continua a pugnar que o ato administrativo devia ser anulado, pelos fundamentos invocados, que se renovam;
46) RELATIVAMENTE À SEGUNDA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que “O R. limitou-se, e bem, a citar a legislação aplicável à situação em apreço na versão que se encontrava em vigor no momento da prática do ato (decisão final de 02/03/2022) e, portanto, no momento da constatação da prática das irregularidades apontadas à instituição, ao abrigo do princípio “tempus regit actum”, que (...).” (retirado da página 43 – nossos grifos)
47) Pois a autora continua a pugnar no sentido de que é sobre a administração que incumbe o dever de operar a subsunção jurídica dos factos ao direito e se estão em causa pretensas violações cometidas entre 2013 e 2018, é à luz dos comandos vigentes em cada um desses momentos que a questão deve ser analisada e decidida;
48) Mas a legislação vigente à data dos pretensos factos é igual à que ora foi chamada à liça?
49) Esse ónus cabe à administração e não ao particular, tanto mais que a legislação invocada é do ano de 2015 (Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, republicada em 2019) e, por isso, a mesma nem sequer estava publicada e em vigor em grande parte do período em causa nos presentes autos (2013 a 2018), ou seja, não estava em vigor entre 2013 e meados de 2015, o que, só por si, devia ser (mais) do que suficiente para anular o ato impugnado, pelo menos no que respeita ao período entre 2013 e a entrada em vigor daquela Portaria, que ocorreu no segundo semestre de 2015 e sem prejuízo das suas alterações posteriores e republicação em 2019;
50) Posto isto e sempre com o devido respeito, mal andou o tribunal “a quo” ao perfilhar a aplicação do princípio “tempus regit actum”, quando a portaria invocada e alegadamente violada não estava sequer publicada e em vigor à data de grande parte do período temporal em dissídio nos autos;
51) Pergunta-se: mas a autora pode ter violado alguma norma de alguma Portaria que não estava publicada e em vigor à data dos factos que se localizam entre 2013 e a entrada em vigor da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07? Cremos honestamente que não, a não ser que “seja como a pescada, isto é antes de o ser já o era”!!!
52) RELATIVAMENTE À TERCEIRA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que “(...) a discrepância que foi detetada pelo R entre a frequência de utentes comunicada para efeitos de recebimento das comparticipações financeiras e a frequência real de utentes no equipamento Sede traduz, ao invés do que alega a A., a violação do dever da instituição comunicar ou declarar aos serviços da segurança social a frequência da resposta social abrangida pelo acordo de cooperação, na medida em que tal dever de comunicação/declaração pressupõe, naturalmente, uma correspondência, efetiva, verdadeira e exata, entre aquilo que é declarado e aquilo que ocorre na realidade - (...).” (retirado da página 45 – nossos grifos e negrito);
53) Em face da referida fundamentação, que se restringe apenas ao CD Sede, a primeira questão que se coloca é a seguinte: e relativamente ao CD de Secarias?!?!? É que, relativamente a este, o fundamento da administração não é exatamente o mesmo, pois é inquestionável que os 9 utentes comunicados frequentaram e beneficiaram efetivamente do CD, em Secarias, independentemente dos serviços prestados, por opção dos próprios utentes;
54) Na verdade, a autora não aceita a assertiva plasmada na sentença “(...) de que a A. sempre comunicou as frequências reais das respostas sociais em dissídio (Sede e Secarias), o que é manifestamente insuficiente para, por si só, infirmar ou contrariar, fundamentadamente, as conclusões a que o R. chegou, na sequência da ação de fiscalização realizada, quanto ao desfasamento encontrado entre o número de utentes (19) que a A. declarou que frequentavam o Centro de Dia situado na Sede, mas que, afinal, frequentavam o Centro de Dia de Secarias.” (nossos grifos)
55) Uma vez mais, o tribunal de 1.ª instância restringiu-se ao CD Sede e não se referiu ao CD Secarias. Mas não aceita porque, por um lado, dispensou a produção de prova por declarações de parte e a prova testemunhal [“rectius”, considerou que tinha todos os elementos para decidir sem realizar julgamento], por outro, considerando insuficiente a alegação, não convidou a autora a aperfeiçoar o respetivo articulado (omissão que então influi na boa decisão da causa e justa composição do litígio e que, por isso, se argui para todos os legais e devidos efeitos) e, ainda por outro, não pode deixar de se registar que a ação de fiscalização remontou apenas aos dias 8, 10 e 15 de outubro 2018 (cfr. ponto 4 dos factos considerados provados) e que, não obstante esta realidade temporal, a ré extraiu conclusões entre 2013 e 2018;
56) Salvo o devido respeito, incumbia à ré alegar e provar os fundamentos de facto e de direito da respetiva decisão. Tal ónus não é do particular. Tudo sem prejuízo de se voltar a reiterar que as normas invocadas para sustentar a pseudo violação por parte da autora nem sequer estavam publicadas e em vigor em grande parte do período temporal em dissídio nestes autos, mais concretamente entre 2013 e a publicação e a entrada em vigor da Portaria n.º 196- A-2015, de 1/7;
57) Com o devido respeito, muito mal andou a administração e o tribunal “a quo”;
58) RELATIVAMENTE À QUARTA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que “(...) as concretas moradas dos utentes (19) que frequentariam, na realidade, o equipamento de Secarias, mas cuja frequência foi declarada como sendo no equipamento da Sede, constam expressamente do Quadro II do relatório final da ação de fiscalização de que a A. foi alvo (e que esteve na génese do ato aqui sindicado) – processo de averiguação (...). Razão pela qual a sua não indicação (repetição) na informação que subjaz à decisão final de restituição não redunda em qualquer ilegalidade, pois que tal informação sempre foi devidamente prestada à instituição.
O mesmo se diga da identificação dos concretos serviços que eram prestados no equipamento de Secarias. Com efeito, para além do que já constava do relatório final da ação de fiscalização, da informação n.º 10/22 também constam que os serviços prestados pela Santa Casa da Misericórdia de (...), em Secarias, aos seus utentes se traduziam (...). Não vemos, pois, em que medida não foram identificados os serviços prestados no Centro de Dia de Secarias, nem a A. explica a relevância de uma qualquer individualização ou concretização adicional desses serviços.” (retirado das páginas 45 e 46 – nossos grifos)
59) É assim inquestionável que, de facto, o ato impugnado não continha as moradas dos 19 utentes do CD Sede e que o tribunal “a quo” ultrapassou essa questão por remissão para um relatório de fiscalização, de 2018, que o ato impugnado não absorveu;
60) Foi a administração quem acentuou a morada dos utentes, foi a administração quem usou esse argumento dito factual para sustentar a sua decisão e dúvidas não podem existir que a autora tinha o direito de conhecer as moradas em causa, através do ato impugnado e não através de qualquer outro relatório de fiscalização que aquele não fez seu, que não avocou e que não deu por reproduzido;
61) Já quanto à não identificação/concretização das atividades recreativas, esta menção é conclusiva e desprovida de qualquer referência factual concreta, que se subsume na reprodução de um conceito regulamentar;
62) Mas o que é que a administração entende por “atividades recreativas”? Será que as atividades que efetivamente foram desempenhadas (que não são identificadas), nos CD Sede e Secarias, podem ser enquadradas em atividades recreativas ou podem subsumir-se noutro conceito?
63) Incumbia à administração concretizar factualmente o que entendia por atividades recreativas, o que não fez, e, desta sorte coarctou os direitos mais básicos do particular, o que é manifestamente defeso;
64) Mais adiante e a propósito da alegação de que inexiste qualquer violação do acordo de cooperação, nem qualquer norma aplicável porquanto inexiste limitação geográfica relacionada com a residência dos utentes para os mesmos poderem ser incluídos no acordo de cooperação, considerou o tribunal “a quo”: “Este argumento, porém, não procede, desde logo porque a irregularidade detetada pelo R. não teve a ver com o incumprimento de qualquer eventual critério geográfico relativo à proveniência dos utentes de ambas as respostas sociais.” (retirado da página 46 – nossos grifos);
65) Relativamente a este aspeto, insiste-se, foi a administração quem criou o elo entre a residência dos utentes e a (im)possibilidade de os mesmos poderem ser admitidos em determinado CD, isto é, foi a SS quem pugnou no sentido de que um utente com residência em ... não podia frequentar o CD Secarias, em acordo de cooperação. A autora sempre pugnou pelo contrário;
66) E mais à frente, a sentença “sub judice” acrescenta: “Claro está que os utentes poderiam qualquer que fosse a sua residência, beneficiar dos serviços prestados em qualquer dos Centros de Dia da A., fosse na Sede, fosse em Secarias.” (retirado da página 47 – nossos grifos e nosso negrito);
67) Muito bem a sentença neste particular, ao contrário da administração!!!
68) Se assim é, e é, extraiam-se as devidas consequências, considerando todo o quadro legal aplicável, nomeadamente o n.º 3 do artigo do artigo 43.º da Portaria n.º 196- A/2015, de 1/7, bem como e, em particular, o artigo 4.º-A do Estatuto das IPSS (DL n.º 119/83, de 25/02, na redação introduzida DL n.º 172-A/2014, de 14/11), cujo conteúdo é o seguinte: “1 - As instituições podem estabelecer entre si formas de cooperação que visem, designadamente, a utilização comum de serviços ou equipamentos e o desenvolvimento de ações de solidariedade social, de responsabilidade igualmente comum ou em regime de complementaridade. 2 – A cooperação entre as instituições concretiza-se por iniciativa destas ou por intermédio das organizações de uniões, de federações ou confederações.” (nossos grifos)
69) Se a lei e a portaria admitem a articulação entre instituições para utilização comum de serviços ou equipamentos, é medianamente óbvio que, por maioria de razão, essa articulação e utilização comum de equipamentos pode legalmente verificar-se no seio da mesma instituição que, no caso, tem dois Centros de Dia, um localizado na Sede e outro localizado em Secarias.
70) Ou seja, ao contrário do que o tribunal pugna, aquela articulação/utilização comum NÃO SERVIU para “contornar, afastar ou ultrapassar as regras acordadas com o R. no âmbito dos referidos acordos de cooperação, perfeitamente autónomos e diferenciados.” (retirado da página 48 – nossos grifos), serviu outrossim para dar cumprimento à “utilização comum de serviços ou equipamentos” – cfr. artigo 4.º-A do EIPSS –, ciente de que, como o tribunal de 1.ª instância pugnou, inexiste qualquer limitação aos utentes em função da respetiva residência;
71) Não é legalmente aceitável que a sentença plasme que “Tal equivaleria a subverter os acordos celebrados.” (retirado da página 48 – nossos grifos), pois, insiste-se, é a lei que permite a articulação e a utilização comum das respostas sociais e, salvo o devido respeito que estes assuntos nos têm de merecer, quer os Tribunais, quer a Administração estão sujeitos à lei!!!
72) E o expoente da INJUSTIÇA e da ilegalidade eleva-se ao seu expoente máximo quando o próprio tribunal “a quo” reconhece(...), a circunstância de aqueles 19 utentes terem beneficiado, na prática, dos serviços de Centro de Dia, quer os mesmos tivessem sido prestados no equipamento Sede, quer os mesmos tivessem sido prestados no equipamento de secarias. O R. nunca colocou em causa, no procedimento que culminou no ato impugnado, a materialidade dos serviços prestados aos utentes, mas unicamente ao facto de a A. ter recebido comparticipações no âmbito de um acordo de cooperação que, ao invés de dizerem respeito a utentes do Centro de Dia abrangido por esse acordo de cooperação (Sede), diziam antes respeito a utentes que se verificou que frequentavam outro Centro de Dia, objeto de distinto acordo de cooperação (e em relação ao qual a A. já havia preenchido o limite máximo de utentes cujas prestações de serviços poderiam ser comparticipadas pelo R.).” (retirado da página 48 – nossos grifos e sublinhado)
73) Ou seja, o tribunal reconhece que os serviços foram prestados, reconhece que os utentes não estavam limitados no acesso em função da respetiva residência, conhece o teor do artigo 4.º-A do EIPSS (articulação e utilização comum das respostas sociais) e, ainda assim, não anula o ato impugnado na totalidade. Não pode ser!!! É injusto!!! É ilegal!!!
74) Não se acompanha o tribunal “a quo” quando concluiu, mal, que a administração não pretende enriquecer à custa do empobrecimento da autora, na medida dos custos que suportou com a prestação dos serviços efetivamente prestados e assim reconhecidos pelo tribunal nos termos sobreditos;
75) RELATIVAMENTE À QUINTA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que ”E não tem a A. razão, no caso concreto, porque, considerando a caraterização dos Centros de Dia, acima melhor descrita, os utentes que beneficiam, no seus equipamentos Sede e Secarias, não da totalidade (ou maior parte) dos serviços aí disponibilizados, mas apenas da participação em atividades recreativas e culturais e a da toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa, mais reduzida, de € 26,00 – (...) –, ainda que em resultado da sua opção de não beneficiarem de qualquer outro serviço ali disponibilizado e prestado, não se podem equiparar aos restantes utentes que beneficiam, nos mesmos equipamentos, dos restantes serviços aí prestados (todos ou quase todos), (...).
De facto, atentas as diferenças assinalas (quanto aos serviços prestados, às refeições tomadas e ao montante, fixo ou variável, da comparticipação familiar paga pelo utente, perfilhamos do entendimento do R no sentido de que os serviços prestados pela A. aos seus utentes e que se traduzem, sem mais, no fornecimento de um lanche durante atividades de convívio, conjugada com o tipo de mensalidade paga pelos mesmos, são enquadráveis na resposta social de Centro de Convívio e não de Centro de Dia, pois que esta última está mais vocacionada, como decorre do que ficou exposto, para a assistência dos idosos nas suas necessidades mais básicas – o que, como se viu, não ocorre com os 10 utentes aqui em causa. (...).” (retirado da página 52 – nossos grifos)
76) Nem a administração, nem o tribunal “a quo” têm razão, uma vez que, por um lado, quer a SS, quer a 1.ª instância continuam a referir-se indistintamente a atividades recreativas e de convívio sem que as tenham minimamente concretizado e, por isso, insiste-se, a autora está(va) impedida de se exercer os seus direitos relativamente a conclusões, matéria de direito e/u juízos de valor;
77) Mas as atividades foram bem enquadradas/designadas como recreativas ou de convívio? Não se sabe porque as mesmas não foram concretizadas pela administração, realidade esta acentuada pelo tribunal;
78) E o que dizer de ser administrada pelo menos uma refeição no CD? É que este serviço é típico do Centro de Dia e não do Centro de Convívio, mas, neste caso, nem a administração, nem o tribunal valorizaram corretamente este “desvio” aos serviços de um Centro de Convívio, preferindo optar no sentido da existência de um Centro de Convívio, não obstante os CD disporem de todos os serviços previstos para um CD;
79) Se algum serviço não foi prestado a algum utente, ele não foi prestado por opção do próprio utente, uma vez que a autora não os pode impor, pelo contrário, deve adequar os serviços prestados à vontade do utente, moldando o pagamento aos serviços efetivamente prestados, tanto mais, que, no caso, trata-se de REDUZIR o pagamento, em função da (in)capacidade financeira dos utentes;
80) A Ré está a penalizar a autora por fazer solidariedade social, o que não é nem justo, nem legal, e o tribunal, agora, perfilhou a mesma tese, não obstante jamais terem concretizado qualquer atividade recreativa, qualquer atividade de convívio;
81) Os CD existem e existiam, os serviços estavam disponíveis e podiam ser prestados e se algum o não foi, tal ficou a dever-se única e exclusivamente à vontade dos utentes, que são soberanos neste particular, e, neste cenário e atendendo aos casos em concreto, a ... reduziu o valor da comparticipação em função dos serviços escolhidos e à capacidade de cada utente;
82) É ilegal o ato que ordena a restituição de qualquer quantia referente ao CD Sede, seja porque nada impedia que os serviços fossem prestados no CD Secarias, bem pelo contrário atendendo nomeadamente ao artigo 4.º do EIPSS, nem administração (e o tribunal) descreveram concretamente as ditas atividades recreativas ou de convívio e, por isso, jamais de poderá desqualificar os CD em proveito de um Centro de Convívio, sem olvidar que cabe aos utentes escolher os serviços que pretendem ver prestados pela ... (princípios da autodeterminação e capacitação dos utentes);
83) RELATIVAMENTE À SEXTA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que ”atendendo à similitude/identidade de argumentos ora aduzidos com os argumentos que já foram apreciados a propósito do equipamento da Sede, remetemos, sem necessidade de ulteriores considerações, para o que acima deixámos exposto, (...).” (retirado das páginas 55 e 56 – nossos grifos);
84) Está em causa, relativamente ao CD Secarias, apenas a descaraterização dos serviços prestados em Centro de Convívio, o que, como vimos, não pode proceder pelo facto de a administração (e o tribunal) não ter concretizado o que são atividades recreativas e/ou de convívio, sendo certo que os serviços estavam todos disponíveis e que se os mesmos não foram prestados, foi por que os utentes optaram e, por isso, a sua comparticipação foi ajustada, em baixa, aos serviços que optaram e atendendo à sua capacidade económica. Por mera cautela de patrocínio, dá-se por integralmente reproduzido e integrado, “mutatis mutandis”, o supra alegado;
85) RELATIVAMENTE À SÉTIMA DAQUELAS SETE QUESTÕES, o tribunal “a quo” considerou que ”Razão pela qual as visitas de acompanhamento e apoio técnico não se nos afiguram suficientes para permitir a criação, na A., de uma convicção, legítima e justificada, de estar a cumprir todos os normativos aplicáveis, como tal merecedora de tutela e proteção jurídica, através da impossibilidade de imputação a posteriori de quaisquer incumprimentos e/ou desconformidades. (...).” (retirado das páginas 56 e 57 – nossos grifos)
86) Na verdade, o tribunal “a quo” não cuidou de analisar o conteúdo das fichas de acompanhamento que foram juntas através do requerimento identificado no ponto 16 dos factos considerados provados, pois se o tivesse feito, teria concluído com facilidade que os argumentos expendidos pela administração para ordenar a restituição dos valores que foram pagos à autora entre 2013 e 2018 foram efetivamente analisados naqueles relatórios da própria Segurança Social;
87) E se a própria autora acompanhou e fiscalizou ao longo dos anos o funcionamento daqueles CD Sede e Secarias e se apesar de identificar as mesmas questões, não cuidou de reputar de ilegal o funcionamento, é óbvio que ao contrário do pugnado, foi criada uma convicção na autora, legítima e justificada de estar a cumprir na íntegra todas as normas, expetativa essa destruída, somente agora, pela própria SS, que atua em violação do princípio expectativa e da confiança e da boa fé que, julgado procedente, deve conduzir à anulação do ato impugnado na íntegra.

Contra-alegou o Instituto, concluindo:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]















*
A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta não emitiu parecer (art.º 146º, nº 1, do CPTA).
*
Cumpre decidir, dispensando vistos.
*
Factos, que o tribunal “a quo” fixou como provados:
1) Em 09/11/1982 a A. e o R. celebraram um “Acordo de Cooperação”, objeto de posteriores adendas, pelo qual o R. se obrigou a comparticipar nos encargos financeiros da instituição relativos, entre outras valências, à resposta social de Centro de Dia, instalado e a funcionar no seu edifício sede (Equipamento Sede), sendo o número total de utentes abrangidos pelo referido acordo de 50 (cfr. doc. n.º 11 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
2) Em 01/08/2009 a A. e o R. celebraram um “Acordo de Cooperação”, pelo qual o R. se obrigou a comparticipar nos encargos financeiros da instituição relativos à resposta social de Centro de Dia, instalado e a funcionar no edifício da Junta de Freguesia ... (Equipamento Secarias), sendo o número total de utentes abrangidos pelo referido acordo de 9 (cfr. doc. junto com a petição inicial de fls. 170 do processo eletrónico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
3) Em 04/10/2018 foi iniciada, pelo Departamento de Fiscalização do R., uma ação de fiscalização à A., com auditoria financeira e avaliação às respostas sociais promovidas ao abrigo de acordos de cooperação, a qual correu termos sob o processo de averiguação (PROAVE) n.º ...62 (cfr. docs. de fls. 2 a 7 do ficheiro “PA Fiscalização-1.ª parte”).
4) No âmbito da referida ação de fiscalização, a equipa inspetiva efetuou visitas à A. nos dias 8, 10 e 15 de outubro de 2018, incluindo às instalações dos Centros de Dia a funcionar na respetiva sede e na localidade de Secarias (cfr. relatório de fiscalização de fls. 30 a 119 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte”).
5) Em 17/12/2018 a equipa inspetiva responsável pela ação de fiscalização elaborou o respetivo relatório final, do qual consta, além do mais, o seguinte:
B_ Acordos de Cooperação, Frequência e Comparticipações
1. Acordos de cooperação e frequência
1.1 As respostas sociais promovidas pela instituição, nomeadamente a estrutura residencial para pessoas idosas (ERPI), o centro de dia (CD) instalado no edifício sede e o instalado na localidade de Secarias, o serviço de apoio domiciliário (SAD) e o centro de atividades de tempos livres (CATL) funcionam ao abrigo de acordos de cooperação celebrados com o Centro Distrital de Coimbra, nos termos da informação que consta no quadro infra:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)
2.4 Relativamente à resposta social centro de dia as informações recolhidas no decurso da ação de fiscalização permitiram concluir o seguinte:
2.4.1 A instituição promove a resposta social centro de dia em dois equipamentos diferenciados, um instalado na sede da instituição, sita em ..., e um outro na Freguesia ... a qual dista 3,5 km.
Para o efeito foram celebrados acordos de cooperação distintos, o referente ao centro de dia instalado na sede determina uma capacidade de 50, abrangendo o mesmo número de utentes, e o do centro de dia instalado na Freguesia ... determina uma capacidade de 41, abrangendo 9 utentes.
2.4.2 O número de NISS registados pela instituição em SISS-AS-COOP para efeitos de comparticipação financeira pelo Centro Distrital de Coimbra pela frequência do equipamento de centro de dia instalado na sede (...) em 04-10-2018, frequência no mês 09/2018, e em 05-11-2018, frequência no mês 10/2018, são em número de 37.
2.4.3 A frequência do centro de dia instalado na sede da instituição, atestada pela listagem de faturação de mensalidades de utentes (CD equipamento sede) referente ao mês 09/2018 (última faturação disponível à data) e pelos mapas de registos mensais de refeições confecionadas e servidas aos utentes da instituição nos meses 09/2018 e 10/2018, concluiu-se em número de 17. (…)
2.4.4 Acerca dos restantes 20 NISS apurou-se o seguinte:
2.4.4.1 Existência de 1 NISS associado a uma utente (NISS ...93 «AA») cuja mensalidade é faturada pela frequência do centro de dia de Secarias mas da consulta ao SISS-IDQ a residência é ....
Contactado telefonicamente um familiar da utente, que se identificou como filho, informou que desde que a mãe passou a residir com o próprio em ... passou a frequentar o centro de dia instalado na sede da instituição, não sabendo precisar desde quando.
2.4.4.2 Existência de 1 NISS associado a uma utente (NISS ...88 «BB») que frequenta o equipamento de centro de dia instalado na localidade de Secarias isenta de mensalidade nos termos da informação prestada por um familiar via contacto telefónico.
2.4.4.3 Existência de 18 NISS associados a utentes do equipamento de centro de dia instalado na localidade de Secarias nos termos da listagem de faturação de mensalidades de utentes do CD de Secarias do mês 09/2018 e da confirmação da respetiva residência em SISS-IDQ e CNP – Sistema de Pensões. (…)
2.4.4.3.1 Dos 18 NISS, 10 estão associados a pessoas que apenas se deslocam ao centro de dia de Secarias para usufruírem da refeição correspondente ao lanche nos termos dos esclarecimentos verbais prestados pela técnica responsável pelo funcionamento dos equipamentos de centro de dia face aos valores faturados a cada um, contratualizados com os mesmos, posteriormente reconhecidos pela mesma numa lista remetida via mensagem de correio eletrónico.
Inicialmente o valor da mensalidade a pagar pela refeição de lanche era de 21,00€, estando atualmente fixado em 26,00€ (…).
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
2.4.5 Relativamente ao equipamento de centro de dia instalado na localidade de Secarias a técnica responsável pelo funcionamento informou que a frequência era de 9 utentes.
2.4.6 À data da visita às instalações que decorreu precisamente na hora do lanche, confirmou-se a presença de 22 pessoas idosas.
2.4.7 O número de NISS registados pela instituição na plataforma da Segurança Social para efeitos de comparticipação financeira pelo Centro Distrital de Coimbra em 04-10- 2018, frequência no mês 09/2018, e em 05-11-2018, frequência no mês 10/2018, são em número de 9.
Sobre os 9 NISS os elementos recolhidos permitiram concluir que apenas 6 são utentes da resposta social centro de dia. Os restantes 3 NISS estão associados a pessoas que tal como explicitado no ponto anterior (2.4.4.4) também se deslocam ao centro de dia apenas para usufruírem da refeição do lanche (…).
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…) 2.4.9 Face ao apurado e considerando:
- Que a natureza da resposta social centro de dia visa a satisfação das necessidades de uma coletividade traduzida na prestação de um apoio social que se reflete na possibilidade dos utentes usufruírem de um conjunto de serviços prestados de forma contínua nas instalações do equipamento social;
- Que as necessidades das 13 pessoas inscritas no equipamento de centro de dia de Secarias têm-se traduzido desde a respetiva data de admissão no usufruto da refeição correspondente ao lanche;
Entende-se que os mesmos não integram a população alvo da resposta social centro de dia tendo vindo a ser indevidamente incluídos para efeitos de comparticipação financeira pelo Centro Distrital de Coimbra.
2.4.10 Nessa conformidade, partindo da análise da frequência declarada nos meses 09/2018 e 10/2018, conclui-se pelo pagamento de comparticipações consideradas indevidas relativamente aos treze NISS indicados pela instituição para efeitos de comparticipação pelo Centro Distrital de Coimbra, identificados nos quadros II e III, que se apura, por ano e por utente, no valor total de 82.746,32€, nos seguintes termos:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
2.4.11 Quanto aos utentes do CD de Secarias que têm vindo a ser sinalizados em SISSAS-COOP CD_equipamento sede (...) identificados em número de 9 (Quadro II) conclui-se igualmente pelo pagamento de comparticipações indevidas.
Considerando que aquando o levantamento das reais necessidades da população residente em Secarias e arredores para efeitos de celebração de acordo de cooperação, o Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra entendeu que a comparticipação financeira pela frequência do equipamento de CD_Secarias deveria abranger apenas 9 utentes, pese embora tenha sido determinada uma capacidade das instalações para 41 utentes, não sendo suposto um número mais alargado de utentes a serem comparticipados pela frequência do citado equipamento, a instituição tem vindo a incluir os excedentes na relação mensal referente ao equipamento de centro de dia instalado na sede de forma a poder receber a comparticipação financeira pelo máximo número de utentes, nos termos do identificado no quadro II.
2.4.12 O valor apurado respeita apenas ao ano de 2018, período compreendido entre o mês 01/2018 e o mês em que se realizou a ação de fiscalização à instituição (10/2018), no montante de 10.183,50, conforme quadro seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
2.4.13 Face ao exposto, coloca-se à consideração do Centro Distrital de Coimbra, caso assim o entenda, implementar um plano de reposição de verbas pelos valores apurados, ou outro que entenda vir a apurar em função da análise que promova. (…)
5.4 Centro de Dia
Os princípios e regras quanto à fixação e pagamento das comparticipações familiares pela frequência na resposta social Centro de Dia estão previstos no artigo 64.º n.º 4 e 5 do regulamento interno (45% do RPC – almoço e lanche e 60% do RPC – almoço, lanche e jantar), assegurando o cumprimento do estabelecido pela Portaria n.º 196-A de 1 de julho de 2015.
Dos processos individuais consultados e segundo a Técnica de Serviço Social responsável pela resposta social, Dra. «CC», aferiu-se que a instituição não cumpre nem o regulamento interno nem a Portaria n.º 196-A de 1 de julho de 2015, uma vez que aplica um preçário fixo aos utentes que apenas usufruem de lanche na instituição no valor de 26,00€”
(cfr. relatório de fiscalização de fls. 30 a 119 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte”)
6) Em 28/12/2018 a Diretora do Núcleo de Fiscalização de Equipamentos Sociais da Unidade de Fiscalização do Centro do R. proferiu despacho de conclusão da ação de fiscalização realizada junto da A., mais determinando, entre o mais, que dela fosse dado “conhecimento integral aos serviços do Centro Distrital de Coimbra, nos âmbitos social e financeiro, através da aplicação SISS-SAF, sublinhando-se: - apuramento de comparticipações financeiras indevidamente processadas ao abrigo dos acordos de cooperação para centro de dia, no montante global de 92.929,82€ (conforme fundamentado e discriminado por utente, ano e equipamento a páginas 16 a 21, ponto 2.4), a fundamentar proposta de implementação de plano de reposição de verbas (…); - avaliação e eventual revisão dos acordos de cooperação de ERPI, centro de dia e serviço de apoio domiciliário, face ao descrito em matéria de instalações, capacidade, frequência real, composição dos serviços prestados e quadro de pessoal” (cfr. doc. de fls. 27 e 28 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte”).
7) Através do ofício n.º 00004781, de 16/01/2019, a A. foi notificada do relatório final da ação de fiscalização que antecede e, bem assim, para se pronunciar, querendo, acerca das respetivas conclusões e para apresentar um plano sobre os termos e condições em que se propunha regularizar as situações detetadas (cfr. doc. de fls. 120 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte”).
8) Em 04/02/2019 a A. apresentou a sua pronúncia relativamente às conclusões do relatório final da ação de fiscalização (cfr. doc. de fls. 121 a 144 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte”).
9) Por despacho de 19/10/2021, assente na informação n.º 46/2021 do Núcleo de Apoio Jurídico (NAJ), foi determinada a remessa do processo ao Núcleo de Respostas Sociais (NRS) para efeitos de notificação da A., em sede de audiência de interessados, para se pronunciar sobre a intenção de lhe ser ordenada a restituição da quantia de € 92.929,82, por si auferida a título de comparticipações financeiras (cfr. doc. de fls. 9 a 17 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
10) Através do ofício n.º 00061177, de 25/10/2021, recebido em 26/10/2021, com o assunto “Audiência de Interessados – restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo ISS, I.P. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias”, foi a A. notificada do seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. docs. de fls. 18 a 23 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
11) Em 02/11/2021, a A. apresentou requerimento onde solicitou a consulta dos autos e, bem assim, a prorrogação do prazo em curso para resposta à notificação que antecede, por mais dez dias úteis, requerimento renovado em 09/11/2021 (cfr. docs. n.os 2 e 3 da petição inicial).
12) Por despacho de 09/11/2021, foi deferido o pedido de consulta dos autos e de prorrogação do prazo de audiência prévia (cfr. doc. de fls. 27 e 28 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
13) Em 10/11/2021, último dia do prazo inicial para exercício do contraditório, a A. apresentou a sua pronúncia relativamente à intenção de ser ordenada a restituição das comparticipações financeiras que lhe foram pagas, tendo requerido a junção ou disponibilização de documentos pelo R. e tendo arrolado testemunhas (cfr. doc. n.º 4 da petição inicial).
14) Através do ofício n.º 00065868, de 12/11/2021, enviado, na mesma data, ao mandatário da A. por mensagem de correio eletrónico, foi a mesma notificada de que o processo administrativo se encontrava disponível para consulta nas instalações da sede do Centro Distrital de Coimbra do R., no horário de expediente, mais tendo sido informada de que o pedido de prorrogação do prazo para resposta em audiência de interessados foi deferido, dispondo do prazo de 20 dias úteis, contados da receção da notificação para audiência prévia, para exercer o direito ao contraditório (cfr. doc. de fls. 30 e 31 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte” e doc. n.º 5 da petição inicial).
15) Através de novo ofício com o n.º 00067016, de 16/11/2021, enviado, na mesma data, ao mandatário da A. por mensagem de correio eletrónico, o R. informou-o, “na sequência da resposta à audiência de interessados remetida, à cautela, por V. Exa. a estes serviços em 10/11/2021, por não ter rececionado em tempo a nossa notificação que indicava o dia, hora e local para consulta do processo administrativo e que deferia a prorrogação de prazo para pronúncia”, do seguinte:
a) O processo administrativo se encontra disponível para consulta nas instalações da sede do Centro Distrital de Coimbra do Instituto de Segurança Social, I.P., (…) no horário de expediente (…);
b) Que se prorroga o prazo para apresentação da resposta à audiência escrita de interessados, pelo que a constituinte de V. Exa. dispõe de um total de 30 (trinta) dias úteis, contados da data da receção da notificação para audiência de interessados, para exercício do direito ao contraditório;
c) Relativamente aos requerimentos de V. Exa., nos quais peticiona a emissão de certidão do acordo de cooperação e posteriores alterações, certidão do regulamento interno do Complexo Social da Santa Casa da Misericórdia de (...), bem como certidão da listagem e datas de pagamentos de comparticipações financeiras efetuados à Santa Casa da Misericórdia de (...) e certidão de relatórios de outras visitas de acompanhamento, indefere-se o requerido por configurarem uma diligência dilatória, porquanto os documentos cuja certidão se requer são documentos que se encontram na posse da instituição;
d) No que diz respeito ao requerimento para audição de três testemunhas, em fase de audiência de interessados e a título de diligência complementar, cumpre esclarecer que o juízo sobre a utilidade de tais diligências complementares para a correta decisão do procedimento cabe ao órgão instrutor/decisor.
Considerando que o apuramento das comparticipações financeiras indevidamente recebidas assenta i) na discrepância entre a frequência de utentes declarada pela instituição para efeitos de recebimento de comparticipações financeiras e a frequência real de utentes verificada in loco na visita inspetiva e corroborada por prova documental consultada in loco no momento da visita inspetiva e, bem assim, ii) na interpretação jurídica sobre se os serviços prestados pela instituição a certos utentes são enquadráveis na resposta social Centro de Dia, indefere-se o requerido, na medida em que o depoimento das testemunhas em nada contribuirá para a apreciação do objeto do processo administrativo.
A prova adequada a refutar os factos constantes da decisão perspetivada deve ser, também, prova documental”
(cfr. doc. de fls. 53 a 55 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
16) Através de requerimentos de 25/11/2021 e de 29/11/2021, a A. procedeu à junção da “Ficha da Visita de Ação de Acompanhamento de 13/09/2018, referente ao CD Sede” e da “Ficha da Visita de Ação de Acompanhamento de 13/09/2018, referente ao CD Secarias”, mais tendo requerido a junção, pelo R., de certidão das fichas das visitas de ação de acompanhamento de 20/05/2015, referentes a ambos os equipamentos, por tal não constar dos seus arquivos, bem como a disponibilização do processo administrativo em formato digital (cfr. docs. n.os 7 e 8 da petição inicial e docs. de fls. 61 a 113 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
17) Através de mensagem de correio eletrónico de 30/11/2021, o R. informou o mandatário da A. do seguinte, em resposta aos pedidos que antecedem:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. doc. de fls. 115 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
18) A certidão das fichas das visitas de ação de acompanhamento de 20/05/2015, referidas na notificação que antecede, não foi levantada pelo mandatário da A. (cfr. doc. de fls. 116 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
19) Em 25/02/2022 foi elaborada a informação n.º 10/2022, com o assunto “Decisão final – restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo ISS, I.P. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias”, da qual consta, além do mais, o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. doc. de fls. 117 a 132 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”)
20) Em 02/03/2022, a Diretora do Centro Distrital de Coimbra do R. proferiu o seguinte despacho, exarado sob a informação que antecede: “Concordo. Para prosseguimento” (cfr. doc. de fls. 117 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
21) Através do ofício n.º 0016883, de 09/03/2022, recebido em 10/03/2022, foi a A. notificada da decisão final referida no ponto anterior e da informação n.º 10/2022, mais tendo sido informada de que “poderá (…) proceder ao pagamento integral dos valores em dívida ou requerer o pagamento em prestações” (cfr. docs. de fls. 135 e 136 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 2.ª Parte”).
Mais se provou que:
22) Em reunião da Mesa de 20/11/2009, foi aprovada a proposta da Direção-Geral de permitir aos utentes do equipamento de Secarias a opção de frequentarem o Centro de Dia apenas num período (manhã ou tarde), beneficiando da refeição de lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa, à data definida em € 20,00, com o seguinte fundamento: “A necessidade de possibilitar esta modalidade objetiva o alcance de um processo gradual de integração no equipamento, impelindo os cidadãos mais hesitantes a experienciar os serviços prestados e garantindo a frequência de todos os utentes do anterior, e já extinto, Centro de Convívio” (cfr. doc. n.º 13 da petição inicial).
23) O valor das comparticipações familiares dos utentes «DD», «EE», «FF», «GG», «HH», «II», «JJ», «KK», «LL», «MM», «NN», «OO» e «PP», que beneficiavam apenas da toma de um lanche no Centro de Dia de Secarias, foi reduzido por decisão da A., atendendo, entre o mais, à sua situação económica, inicialmente para € 21,00 e atualmente para € 26,00 (cfr. relatório de fiscalização de fls. 30 a 119 do ficheiro “PA – Centro Distrital – 1.ª Parte” e docs. n.os 13 a 22 da petição inicial).
24) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 06/06/2022 (cfr. doc. de fls. 1 do suporte eletrónico do processo).
*
A apelação.
Configura nulidade “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva” (art.º 195º, nº 1, do CPC).
Ao anteceder o “saneador-sentença” propriamente dito, em despacho proferido em 30/03/2023 deixou-se consignado “O processo reúne já todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito da causa no despacho saneador [art.º 88.º, n.º 1, alínea b), do CPTA], revelando-se desnecessária, pelo que se dispensa, a prova testemunhal/por declarações de parte requerida. Uma vez que a audiência prévia teria apenas a finalidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 87.º-A do CPTA, decide-se dispensar a sua realização, nos termos do art.º 87.º-B, n.º 2, do mesmo diploma legal.”.
E mais não seria necessário.
A dispensa não mais careceria de fundamentação que a própria enunciação de passo reportada à faculdade legal.
«A dispensa de audiência prévia não constitui uma violação do princípio do contraditório, omissão de acto processual e, consequentemente, ainda, nulidade da sentença por «decisão-surpresa».» - Ac. do TCAS, de 07-06-2023, proc. n.º 171/17.7BELRS.
O CPTA, ou qualquer contraditório, não dita uma prévia notificação quanto à possibilidade de dispensa de audiência prévia (cfr. Acs. deste TCAN, de 02-07-2021, proc. n.º 263/19.8BEPNF, de 17-12-2021, proc. n.º 525/19.4BEPNF, de 20-12-2022, proc. n.º 641/21.2BEPNF).
“A normação vertida na al. b) do n.º 1 do art.º 87.º A e n.º 2 do art.º 87.º B, ambos do C.P.T.A., na versão operada pela Lei nº. 118/2019, de 17.09., permite, sem mais, a dispensa da audiência prévia pelo juiz, sem necessitar da notificação prévia das partes com vista a uma eventual audiência prévia potestativa, como o possibilitaria o n.º 4 do art.º 87.º B do C.P.T.A.” - Ac. deste TCAN, de 20-12-2022, proc. n.º 00641/21.2BEPNF.
«Mostrando-se prevista no art. 87.º-B n.º 2 do CPTA a dispensa de audiência prévia quando esta apenas se destine a facultar às partes a discussão de facto e de direito, por o Tribunal pretender conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa, a sua não realização não configura nulidade processual» – Ac. do TCAS, de 06-06-2024.
Certo é que “Pode ser dispensada a audiência prévia quando existam todos os elementos pertinentes para uma decisão de mérito, conhecendo-se imediatamente do pedido - n.º 2 do art.º 87.º A do CPTA” (Ac. deste TCAN, de 08-10-2021, proc. n.º 176/21.3BEVIS).
«I-Com a nova redação conferida ao n.º2 do artigo 87.º-B do CPTA, pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, passou a prever-se a possibilidade de o juiz do processo dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas a facultar às partes a discussão de facto, nas situações em que tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa.» (Ac. deste TCAN, de 02-07-2021, proc. n.º 263/19.8BEPNF).
O conhecimento de mérito foi alcançado sem instrução.
Se, efectivamente, um dos direitos fundamentais processuais consiste no direito à prova, que emerge como corolário do direito de acção e defesa previsto no nº 1 do art. 20º da CRP, tal direito não vincula à admissibilidade de todo e qualquer meio de prova e em todas e quaisquer circunstâncias; o direito à prova não é um direito absoluto e incondicionado.
Conhecendo-se logo por direito, aprestando-se a matéria apurada suficiente, sem necessidade de elucidar quanto a outra matéria factual que pudesse encontrar-se controvertida, justifica-se que assim se tivesse conduzido a acção, segundo bom princípio de utilidade.
E bem assim aconteceu, como ao adiante fica confirmado.
Assim.
Desde já conhecendo da censura que a recorrente desfere à solução alcançada no “saneador-sentença”, que teve pronúncia quanto à prescrição.
Nomeadamente, vendo da possibilidade de uma interrupção da prescrição, no ver da recorrente vedada.
Mas sem razão; não se trata de matéria na disponibilidade da parte; e convocado que foi o instituto pela parte Autora (cfr. art.º 97º e ss. da p. i.), não se poderá negar ao tribunal que, perante a alegação de se ter completado a prescrição, não considere no seu juízo interrupção que se lhe depare, precisamente para dar resposta ao que se lhe colocou.
Por outro lado, a recorrente censura também por o tribunal ter alcançado que em “em 15/06/2019, encontrava-se prescrito o direito à restituição das comparticipações financeiras recebidas pela A. entre janeiro de 2013 e 16/01/2014”.
Sabemos, efectivamente, que foi através do ofício n.º 00004781, de 16/01/2019, a A. foi notificada do relatório final da ação de fiscalização; a recorrente evidencia não estar apurada “a data em que a demandante recebeu o ofício identificado no ponto 7 dos factos considerados provados; a este ofício, a autora respondeu efetivamente em 09/02/2019 – cfr. ponto 8 dos factos considerados provados –, pelo que, quanto muito, no que não se concede, a prescrição só se poderá considerar interrompida em 09/02/2019 (e, por isso, prescrito o direito de a SS exigir os pagamentos que efetuou à autora até 09/02/2014).
Acontece que relativamente às quantias recebidas pela A. entre janeiro de 2013 e 16/01/2014 não carecia de se conhecer de qualquer interpelação para se reconhecer atingida a prescrição; segundo o Decreto-Lei n.º 155/92, de 28/07, “a obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas prescreve decorridos cinco anos após o seu recebimento” (art.º 40º, n.º 1).
Essa interpelação passou a ter relevância, mas já a/para posterior tempo.
Foi assim que em relação a outros montantes o tribunal “a quo” teve em consideração (e à luz do art.º 12º, n.º 1, do CC) o Decreto-Lei n.º 133/88, de 20/04, alterado pelo Decreto-Lei n.º 79/2019, de 14/06 (com entrada em vigor desde 15/06/2019 – art.º 11º), prevendo “o direito à restituição do valor das prestações indevidamente pagas prescreve no prazo de cinco anos a contar da data da interpelação para restituir” (n.º 1) e que, “para além das causas gerais de interrupção ou suspensão da prescrição, o prazo previsto no número anterior suspende-se ainda quando tenha sido autorizado o pagamento parcelado dos montantes a restituir, e enquanto se mantiver o seu cumprimento” (n.º 2), mas mais também prevendo uma norma transitória, de acordo com a qual “as alterações e aditamentos ao Decreto-Lei n.º 133/88, de 20 de abril, efetuadas pelos artigos 2.º e 6.º do presente decreto-lei, são aplicáveis aos pagamentos indevidos pendentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei”.
Donde, como o tribunal viu, e bem, legitimando sua aplicação aos “pagamentos indevidos pendentes, em relação aos quais ainda não tivesse transcorrido, na sua totalidade, o prazo de prescrição ao abrigo da lei anterior. E, aplicando-se o referido Decreto-Lei, ao direito à restituição do valor das prestações indevidamente pagas passou a aplicar-se, a partir de 15/06/2019 em diante, o prazo de prescrição de cinco anos a contar da data da interpelação para restituir (e já não a contar do recebimento dessas prestações).”.
Relativamente a esses outros montantes, num ponto de razão da recorrente, o momento interruptivo identifica-se com a interpelação, não simplesmente com a data do ofício (do ofício n.º 00004781, de 16/01/2019).
O tribunal assinalou aí um momento interruptivo, mas também não deixou de melhor apontar esclarecimento para “em 16/01/2019, por força da notificação à A. das conclusões do relatório final da ação de fiscalização”.
Mas a questão verte como meramente académica, sem repercussão que modifique.
Pelo menos aparentemente, no limite dos elementos que se nos deparam; sabendo que em causa estão pagamentos de periodicidade mensal certa, reportados a unidade de pretérito mês, e fazendo presumir o tempo de notificação do ofício, que a recorrente também não abala, e o que é da normalidade entre a comunicação da instituição e o tempo de processamento.
De qualquer modo, sempre o estatuído há-de ser lido e entendido na boa compreensão do que da própria fundamentação emana esclarecido: que em rigor o tempo que marca é o tempo de “notificação à A.”.
Portanto - e entendendo assim, na completude do esclarecimento -, de encontro e com defeso da posição da recorrente, bem que assim suceda, não se justifica revogar (o) juízo conforme.
Mais assinalou, com razão, segundo a nova lei, outra “interpelação da A. para restituir, marcando o início da contagem do prazo de prescrição do direito à reposição das comparticipações pagas desde 16/01/2014 até 2018, ocorreu, in casu, em 26/10/2021, quando a instituição foi notificada, através do ofício n.º 00061177, para exercer o seu direito de audiência prévia relativamente à intenção de lhe ser exigida a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo R. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias, notificação pela qual, aliás, a A. foi convidada a “proceder ao pagamento integral dos valores em dívida ou requerer o pagamento em prestações, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 133/88, de 20 de abril, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 79/2019, de 14 de junho” (cfr. ponto 10 dos factos provados).
Deste modo, tendo-se iniciado em 26/10/2021 o prazo de prescrição do direito à restituição dos valores pagos à A., a título de comparticipações financeiras, no período entre 16/01/2014 e 2018, impõe-se concluir que tal prazo ainda não decorreu, não se encontrando, pois, o referido direito prescrito (e sem contar com interrupções entretanto ocorridas). À mesma conclusão chegaríamos, aliás, caso se entendesse que a primeira interpelação da A. para restituir havia ocorrido com a notificação do relatório final da ação de fiscalização, em 16/01/2019 (e sem contar, uma vez mais, com suspensões e/ou interrupções entretanto verificadas, mormente as relativas à pandemia Covid-19).”.
A recorrente entende a sucessão de regimes “inconstitucional, por violação além do mais do princípio da confiança e da segurança jurídicas e da boa fé”; na base da inconstitucionalidade está que “o novo regime, embora mantendo o prazo de 5 anos de prescrição, alterou o seu termo inicial e, por isso, de facto, aumentou expressivamente o prazo de prescrição”.
Mas no caso tratam-se de obrigações periódicas em que no decurso do prazo/quanto ao decurso do prazo não há qualquer investimento de confiança que a Autora possa esgrimir a seu favor, bem assim sem apontamento de razão de segurança jurídica que possa subtrair à liberdade legiferante, quando, além de não atingir o que de pretérito já tivesse consolidação segundo a lei antiga, o início de termo segundo a lei nova corresponde ao que seria causa de interrupção segundo a lei antiga, com nova retoma de contagem de igual prazo.
Posto isto.
No que toca à audiência prévia relativa ao exercício do direito de participação da interessada, várias censuras são desferidas.
Num primeiro ponto, apontando relativamente ao ofício n.º 00061177, de 25/10/2021, para a Autora se pronunciar sobre o projeto de decisão de ordenar a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo R. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia (Sede e Secarias), que tal notificação não continha a indicação das horas e do local onde o processo administrativo podia ser consultado.
Na decisão recorrida entendeu-se o seguinte:
«(…)
Dispõe o art.º 122.º, n.º 2, do CPA que a notificação para o exercício do direito de audiência prévia “fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito, indicando também as horas e o local onde o processo pode ser consultado” (sublinhado nosso).
Ora, compulsada a notificação recebida pela A., através do ofício n.º 00061177, de 25/10/2021, para se pronunciar sobre o projeto de decisão de ordenar a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo R. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia (Sede e Secarias), não há dúvidas de que tal notificação não continha a indicação das horas e do local onde o processo administrativo podia ser consultado (cfr. ponto 10 dos factos provados).
No entanto, e como bem refere o R., tal irregularidade da notificação veio a ser sanada, na sequência dos requerimentos da A., apresentados no decurso do prazo (inicial) para audiência prévia, a solicitar a consulta dos autos e a prorrogação do prazo para defesa, nos seguintes termos (cfr. pontos 11 a 15 dos factos provados):
em 02/11/2021, a A. apresentou requerimento a solicitar a consulta dos autos e, bem assim, a prorrogação do prazo em curso para resposta em sede de audiência prévia, por mais 10 dias úteis, requerimento renovado em 09/11/2021;
em 09/11/2021 (penúltimo dia do prazo para audiência prévia), foi proferido despacho a deferir os pedidos de consulta dos autos e de prorrogação do prazo, mas que não foi de imediato notificado à A.;
na ausência de notificação atempada do despacho que antecede, a A. apresentou, à cautela, em 10/11/2021, no último dia do prazo inicial para exercício do contraditório, a sua pronúncia relativamente à intenção de ser ordenada a restituição das comparticipações financeiras que lhe foram pagas;
só através do ofício n.º 00065868, de 12/11/2021, enviado, na mesma data, ao seu mandatário por mensagem de correio eletrónico, é que a A. veio a ser notificada de que o processo administrativo se encontrava disponível para consulta nas instalações da sede do Centro Distrital de Coimbra do R., no horário de expediente, mais tendo sido informada de que o pedido de prorrogação do prazo para resposta em audiência de interessados foi deferido, dispondo do prazo de 20 dias úteis, contados da receção da notificação para audiência prévia, para exercer o direito ao contraditório
– ou seja, em 12/11/2021, a A. ficou a saber não só o local e as horas em que podia consultar o processo administrativo, como também que podia apresentar (nova) resposta até ao dia 24/11/2021, dado o deferimento do seu pedido de prorrogação do prazo para o efeito;
através de novo ofício com o n.º 00067016, de 16/11/2021, enviado, na mesma data, ao mandatário da A. por mensagem de correio eletrónico, o R. – tendo constatado que a instituição havia apresentado resposta em 10/11/2021 – voltou a informar que o processo administrativo se encontrava disponível para consulta “nas instalações da sede do Centro Distrital de Coimbra do Instituto de Segurança Social, I.P., (…) no horário de expediente (…)”, bem como que se prorrogava novamente o prazo para apresentação da resposta em audiência escrita de interessados, passando a A. a dispor “de um total de 30 (trinta) dias úteis, contados da data da receção da notificação para audiência de interessados, para exercício do direito ao contraditório” – ou seja, em 16/11/2021, a A. ficou a saber, uma vez mais, não só o local e as horas em que podia consultar o processo administrativo, como também que podia apresentar (nova) resposta até ao dia 10/12/2021, dada a concessão (oficiosa) de uma prorrogação adicional do prazo para o efeito.
Da factualidade acima descrita retira-se, portanto, que, pese embora a notificação para o exercício da audiência dos interessados não ter mencionado, como devia, o local e as horas em que o processo administrativo podia ser consultado pela A., essa indicação veio a ser efetuada mais tarde, em 12/11/2021, mas ainda em tempo útil, considerando que o prazo para apresentação de resposta em sede de audiência prévia foi prorrogado, no total, por mais 20 dias úteis face ao prazo inicial, terminando em 10/12/2021. O que significa que, ao contrário do que alega a A., foi-lhe dada efetiva possibilidade de consultar os autos durante o período de que dispunha para exercer o seu contraditório, assim se tendo alcançado plenamente a finalidade subjacente à exigência prevista no art.º 122.º, n.º 2, segunda parte, do CPA. E a tal conclusão não obsta, note-se, a circunstância de a A. já ter apresentado, à cautela, no último dia do prazo inicial (antes de ter sido notificada das duas prorrogações concedidas), a sua defesa escrita, na medida em que nada a impedia de ter apresentado nova resposta, até ao dia 10/12/2021, após a consulta dos autos. Se não o fez, sibi imputet.
Não procede, aliás, o argumento de que não é legalmente admissível prorrogar um prazo que já estava completado e cumprido por parte da A. – isto porque o despacho que deferiu o pedido de prorrogação do prazo foi proferido em 09/11/2021, isto é, no penúltimo dia do prazo que ainda corria para audiência prévia. E o facto de o R. ter indeferido, com a notificação de 16/11/2021, todas as diligências probatórias requeridas na resposta apresentada pela A. em 10/11/2022 não significa – ainda que se reconheça que essa pronúncia do R. possa ter sido algo “prematura” – que o prazo para audiência prévia não foi, afinal, prorrogado, porque o foi, para todos os efeitos.
(…)».
A recorrente opõe a circunstância de o despacho que prorrogou prazo se encontrar datado de 09/11/2021, mas, porém, apenas expedido em 12/11/2021; portanto, e não sendo notificada antes, ocorrendo prorrogação com prazo já esgotado; donde, a seu ver, sem poder falar-se numa “prorrogação”, razão que estende ao posterior ofício de 16/11/2021.
Mas confunde; bem que com eficácia a operar com a notificação, a “prorrogação” foi dada ainda em decurso de prazo; e que o não fosse, e não coubesse em rigor aludir a uma “prorrogação”, nem por isso se afastaria que lhe era comunicado o poder exercer a faculdade; e mesmo que com o ofício de 16/11/2021 tivesse ficado a saber do indeferimento de diligências.
De todo o modo, do concreto exercício da sua pronúncia em audiência prévia, ou a posteriori, não resulta qualquer nexo de necessidade à consulta, pelo que, a assinalar desvio, mais não se depararia mais que irregularidade, sem influência anulatória.
Num segundo ponto, a recorrente brande com a falta de indicação de todos os elementos de facto e de direito relevantes para a decisão proferir, censurando que o tribunal tenha reconhecido “a circunstância de não ter sido indicado, de modo expresso e individualizado, qual o normativo concretamente violado pela A. no âmbito do equipamento de Secarias”, mas tenha concluído que a Autora/recorrente “estava em plenas condições de exercer o seu direito de resposta/defesa à análise efetuada ao equipamento da Sede e ao equipamento de Secarias.”.
A recorrente argumenta em favor de que não cabe tirar tal conclusão.
Mas não tem razão.
A notificação para exercício do direito de audiência exige que seja fornecida aos interessados informação suficiente para ficarem a conhecer todos os aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito, a fim de poderem pronunciar-se sobre elas, sendo a questão de saber se a informação fornecida foi suficiente, no caso concreto, uma questão essencialmente de facto (cfr. Ac. do STA, Pleno, de 12-11-2003, proc. n.º 041291).
Como se ajuizou na decisão recorrida “ o art.º 122.º, n.º 2, do CPA prevê que a notificação para o exercício do direito de audiência prévia “fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito (…)” (sublinhado nosso).
Daqui decorre a exigência de que os interessados, através da notificação para o exercício do direito de audiência prévia, sejam devidamente informados sobre o sentido provável da decisão final a emitir no culminar do procedimento (sobre a mera “intenção” da Administração, ainda não corporizada numa decisão definitiva), para o que se revela necessário que lhes seja fornecido o projeto de decisão e os demais elementos pertinentes, pois que só assim estarão os interessados em condições de conhecerem todos os aspetos que poderão vir a servir de base àquela decisão, em matéria de facto e de direito, e de sobre eles se pronunciarem no exercício do seu direito.
Ora, no caso dos autos, compulsada a notificação constante do ofício de 25/10/2021, é manifesto que a A. foi devidamente informada sobre o sentido provável da projetada decisão de lhe ser ordenada a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia (Sede e Secarias), sendo também manifesto, salvo o devido respeito, que lhe foram fornecidos todos os elementos e todas as informações de que necessitava para um exercício pleno e esclarecido do seu direito de audiência prévia.
Da leitura daquela notificação retiram-se, com clareza, os fundamentos de facto e de direito subjacentes ao projeto de decisão, sendo que a circunstância de não ter sido indicado, de modo expresso e individualizado, qual o normativo concretamente violado pela A. no âmbito do equipamento de Secarias não impede, de todo, a compreensão cabal de todos os aspetos que levaram o R. a concluir no sentido evidenciado na notificação, pelo que a A. estava em plenas condições de exercer o seu direito de resposta/defesa em relação à análise efetuada ao equipamento da Sede e ao equipamento de Secarias.”.
É também o que agora se entende.
Não olvidando que na boa compreensão das coisas vale também o contexto pretérito de aquisição de conhecimento, em que a Autora foi notificada do relatório final da ação de fiscalização, e se pronunciou; não ficando postergado aquando do momento da audiência prévia o que já antes se confrontava bem esclarecido e a que esclarecidamente também deu resposta.
Num terceiro ponto, a recorrente censura o indeferimento das diligências probatórias requeridas no seu exercício de audiência prévia.
O tribunal “a quo” entendeu que “se, fundamentadamente, a Administração não realizar as diligências de prova requeridas pelo administrado, por entender, justificadamente, que as mesmas não são indispensáveis à descoberta da verdade material, não incorre em qualquer ilegalidade, mormente por violação do direito de audiência prévia.”
Volvendo ao caso dos autos, extrai-se da factualidade provada que, na pronúncia que apresentou em sede de audiência prévia, a A. requereu a junção ou disponibilização de documentos pelo R. e arrolou testemunhas. Acontece que tais diligências probatórias foram indeferidas, com os seguintes fundamentos (cfr. pontos 13 e 15 dos factos provados):
Relativamente aos requerimentos de V. Exa., nos quais peticiona a emissão de certidão do acordo de cooperação e posteriores alterações, certidão do regulamento interno do Complexo Social da Santa Casa da Misericórdia de (...), bem como certidão da listagem e datas de pagamentos de comparticipações financeiras efetuados à Santa Casa da Misericórdia de (...) e certidão de relatórios de outras visitas de acompanhamento, indefere-se o requerido por configurarem uma diligência dilatória, porquanto os documentos cuja certidão se requer são documentos que se encontram na posse da instituição”;
No que diz respeito ao requerimento para audição de três testemunhas, em fase de audiência de interessados e a título de diligência complementar, cumpre esclarecer que o juízo sobre a utilidade de tais diligências complementares para a correta decisão do procedimento cabe ao órgão instrutor/decisor. Considerando que o apuramento das comparticipações financeiras indevidamente recebidas assenta i) na discrepância entre a frequência de utentes declarada pela instituição para efeitos de recebimento de comparticipações financeiras e a frequência real de utentes verificada in loco na visita inspetiva e corroborada por prova documental consultada in loco no momento da visita inspetiva e, bem assim, ii) na interpretação jurídica sobre se os serviços prestados pela instituição a certos utentes são enquadráveis na resposta social Centro de Dia, indefere-se o requerido, na medida em que o depoimento das testemunhas em nada contribuirá para a apreciação do objeto do processo administrativo. A prova adequada a refutar os factos constantes da decisão perspetivada deve ser, também, prova documental”.
Ora, atenta a fundamentação avançada pelo R. para indeferir a prova documental e testemunhal requerida pela A., esse juízo mostra-se, a nosso ver, em face das concretas circunstâncias do caso concreto, correto e legal, não configurando qualquer violação do direito de audiência prévia, nem do disposto nos art.os 58.º a 60.º do CPA.
Com efeito, as diligências de prova, incluindo as que são requeridas pelo interessado, servem para averiguar os factos que relevem para a decisão do procedimento. Por isso, o juízo sobre a (in)conveniência da realização das diligências complementares dependerá da posição que a entidade com competência para a decisão tiver sobre os pontos da matéria de facto que essas diligências podem esclarecer: se já tiver formado a sua convicção sobre a sua ocorrência, no sentido positivo ou negativo, a decisão adequada será o indeferimento da sua realização, pois não devem praticar-se, nos procedimentos administrativos, atos que, na perspetiva da entidade que dirige o procedimento, se lhe afigurem como inúteis e com efeito meramente dilatório. Só ocorrerá, pois, um vício procedimental por não realização de diligências se se demonstrar que a Administração, não tendo formado a sua convicção em sentido positivo ou negativo sobre a ocorrência de determinados factos que podem relevar para a decisão, não realizou diligências que poderia realizar para os apurar (cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21/05/2008, proc. n.º 084/08, publicado em www.dgsi.pt).
Assim, quanto ao indeferimento da prova documental, tendo a A. requerido a junção, pelo R., dos acordos de cooperação, do seu próprio Regulamento Interno, das datas de pagamento dos valores objeto da projetada restituição e, ainda, dos relatórios das visitas de acompanhamento aos Centros de Dia da Sede e Secarias, tem razão o R. quando refere que tais documentos se encontrariam – ou deveriam encontrar – na posse da instituição, por se tratar de documentos em cuja elaboração a própria A. participou (os acordos de cooperação, os quais, note-se, foram juntos à petição inicial da presente ação) ou que foram unicamente por si elaborados (o seu Regulamento Interno, também anexado à petição inicial destes autos), ou, ainda, por se tratar de documentos relativos a informações/elementos que seriam, ou tinham de ser, do conhecimento da A., por deles ter sido beneficiária (datas dos pagamentos das comparticipações). Quanto aos apontados relatórios das visitas de acompanhamento, o que se extrai do probatório é que a A., através de requerimentos de 25/11/2021 e de 29/11/2021, acabou por proceder, ela própria, à junção da “Ficha da Visita de Ação de Acompanhamento de 13/09/2018, referente ao CD Sede” e da “Ficha da Visita de Ação de Acompanhamento de 13/09/2018, referente ao CD Secarias”, sendo que, quanto às fichas das visitas de ação de acompanhamento de 20/05/2015, referentes a ambos os equipamentos, o R. disponibilizou a respetiva certidão, tendo, para o efeito, informado o mandatário da A., através de mensagem de correio eletrónico de 30/11/2021, de que tais cópias certificadas se encontravam disponíveis para levantamento nas suas instalações, pese embora a A. não ter correspondido a esse convite (cfr. pontos 16 a 18 dos factos provados). Por fim, sempre se diga que, quanto às datas de pagamento de cada um dos valores mensais a restituir, para efeitos de apreciação de uma eventual prescrição, a sua junção ao procedimento não se mostrava relevante ou útil, uma vez que, na notificação para audiência prévia, ficou claro que os pagamentos mensais alegadamente indevidos se reportavam aos anos de 2013 a 2018, o que bastava, naquela fase, para o conhecimento daquela questão prescricional.
Por seu turno, no que respeita ao indeferimento da prova testemunhal, compulsada a exposição apresentada pela A., a matéria factual aí invocada e sobre a qual as testemunhas iriam depor não era relevante, a nosso ver, para a discussão dos fundamentos subjacentes ao projeto de decisão de restituição das comparticipações financeiras alegadamente pagas de modo indevido, mormente, e como referido na decisão do R., a discrepância entre a frequência de utentes declarada pela A. para efeitos de recebimento de comparticipações financeiras e a frequência real de utentes verificada in loco, corroborada por prova documental consultada no momento da visita inspetiva, e a questão sobre se os serviços efetivamente prestados pela A. a certos utentes (convívio e lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa) eram enquadráveis na resposta social Centro de Dia ou na resposta social Centro de Convívio (não se pondo em causa que a A. tinha ao dispor dos ditos utentes todos os serviços próprios dos Centros de Dia e que a não prestação de algum ou alguns desses serviços se ficou a dever a opção do próprio utente, mediante redução da sua mensalidade).
Como referido, aliás, na jurisprudência (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 03/06/2016, proc. n.º 00248/11.2BEMDL, publicado em www.dgsi.pt), “do exposto tem de se concluir que para concretizar a audiência prévia não se tornava necessário proceder à audição das testemunhas invocadas, uma vez que essa prova não era idónea a afastar a prova ou não prova dos factos invocados pela entidade demandada ora recorrente. Assim sendo, mesmo que essa audição fosse obrigatória, a sua execução, como vimos, seria inútil. É, aliás, nesta linha que se situa o conhecido brocardo jurídico «utile per inutile non vitiatur». Neste caso deve dar-se prevalência ao princípio do aproveitamento do ato administrativo em detrimento da violação de um preceito de ordem formal” (sublinhado nosso).
Ante todo o exposto, impõe-se concluir que, ao indeferir as diligências probatórias requeridas pela A., o R. não violou o direito de audiência prévia, nem o disposto nos art.os 58.º a 60.º do CPA, pelo que improcedem os vícios invocados.”.
Sobre o juízo relativo à utilidade da realização das diligências complementares para a «correcta decisão do procedimento», Mário Esteves de Oliveira e Outros, in Código do Procedimento Administrativo, Comentado, 2.ª Edição, pág. 467, referem que o mesmo «é do órgão instrutor…e abrange tanto as que se devem à iniciativa, como aquelas que tenham sido solicitadas na resposta (ou defesa) dos interessados ao abrigo do n.º3 do art. 101.º- não havendo, portanto, um direito destes à realização autónoma das mesmas ou de impugnação autónoma da decisão que denegou a sua realização».
Nesta linha, “é naturalmente, ao órgão administrativo decisor que cabe o juízo sobre a utilidade ou conveniência das diligências complementares requeridas pelo interessado, ou seja, sobre a relevância para o procedimento, na perspectiva, obviamente, de que a complementaridade se reporta às necessidades da instrução” (Ac. do STA, de 06-12-2007, proc. n.º 0650/06).
Tem-se entendido que a Administração não está adstrita a realizar todas as diligências de prova que os interessados requeiram na fase da audiência prévia, mas, conforme se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 01-03-2001, tirado no processo n.º 045897 «II-Não as poderá omitir sem se pronunciar sobre o pedido que o interessado formule nesse sentido, justificando sumariamente o indeferimento - sob pena de inaceitável degradação da faculdade conferida pelo art. 101.º, n.º3, do CPA».
Numa certa visão, “I - A realização de diligências complementares, mesmo as que tenham sido solicitadas, cabe na regra da livre apreciação das provas por parte da Administração não constituindo um direito do interessado. II - No exercício da qual goza a mesma de ampla margem de apreciação apenas sindicável em caso de erro grosseiro ou de utilização de critério claramente inadequado. (Ac. do STA, de 02-03-2006, 0984/05).
A perspectiva mais recente tem “temperado”, vendo do lugar e importância do direito à prova no âmbito de uma efectiva participação dos interessados.
Na decisão recorrida, sem constrangimentos, apreciou-se se o indeferimento o foi, como a recorrente reclama que tenha de o ser, “com acerto”.
A nosso ver não há que censurar o decidido, perante o que, como a decisão recorrida faz, se poderia ajuizar da utilidade da prova à averiguação do tecido fáctico em confronto, ponderando a então adquirida “frequência real de utentes verificada in loco, corroborada por prova documental”, e “não se pondo em causa que a A. tinha ao dispor dos ditos utentes todos os serviços próprios dos Centros de Dia e que a não prestação de algum ou alguns desses serviços se ficou a dever a opção do próprio utente, mediante redução da sua mensalidade”.
De qualquer forma, sem qualquer consequência invalidante da decisão final proferida no procedimento, se por apelo à teoria do aproveitamento dos atos administrativos se concluir, com toda a segurança, que a realização da diligência instrutória requerida não teria qualquer aptidão para abalar os fundamentos em que assenta a decisão final (cfr. Ac. deste TCAN, de 08-05-2015, proc. n.º 634/09.8BEVIS).
E para aí aponta o caso.
Assim, vendo agora de outras censuras, no que a decisão recorrida tratou sob “Dos “vícios próprios do ato impugnado:”, de que a recorrente erige impugnação sob:
i) violação do dever de decisão e de fundamentação (entre as págs. 40 e 42);
ii) a errada aplicação do princípio “tempus regit actum” (pág. 43);
iii) a omissão de indicação concreta do fundamento de direito para a decidida restituição (págs. 43 a 45);
iv) a omissão de fundamentação de facto relativamente ao equipamento Sede (págs. 45 a 49);
v) Erro de facto e de direito quanto à dicotomia Centro de Dia e Centro de Convívio relativamente ao equipamento Sede (págs. 49 a 55);
vi) Equipamento Secarias – reprodução de fundamentos (págs. 55 a 56); e
vii) o acompanhamento anterior da SS relativamente aos equipamentos e respetivas consequências (págs. 56 e 57);
O discurso fundamentador foi o seguinte:
«Alega a A., em primeiro lugar, que a responsável pela elaboração da informação que está na base da decisão final aqui impugnada não sistematizou correta e totalmente as questões suscitadas pela instituição, em sede de audiência de interessados, pecando por omissão. Exemplifica com a falta de apreciação da questão de nem os acordos de cooperação subscritos entre as partes, nem qualquer outra norma aplicável estabelecerem qualquer limitação geográfica relacionada com a residência dos utentes para os mesmos poderem ser incluídos no acordo de cooperação, bem como com a falta de concretização, nos “Factos Apurados”, de factos concretos e relevantes para a decisão proferida, nomeadamente a morada real dos utentes que alegadamente tinham residência em Secarias e beneficiavam de serviços no Centro de Dia de Secarias (e não no Centro de Dia Sede - ...) e os concretos serviços de que beneficiavam em Secarias (e não em ...). Conclui que a decisão final, por um lado, não decidiu todos os vícios assacados ao projeto de decisão e, por outro lado, está estribada em meras conclusões, juízos de valor e conceitos jurídicos, desprovida de factos concretos e relevantes para a decisão do procedimento administrativo, ao arrepio do que postula o n.º 2 do art.º 153.º do CPA (dever de fundamentação) (art.os 43.º a 52.º da PI).
Mas sem razão.
Cumpre ter presente, de uma banda, que só existe preterição de audiência prévia “sempre que resulte processualmente adquirido que a Administração não ponderou os argumentos nucleares apresentados pelo Recorrente em sede de audiência prévia” (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 02/10/2020, proc. n.º 00822/13.2BEAVR, publicado em www.dgsi.pt – sublinhado nosso). Por outras palavras, não tem a Administração de apreciar e rebater, de modo exaustivo, todos e cada um dos argumentos aduzidos pelo interessado no exercício do seu direito de audiência, desde que sejam efetivamente apreciadas as questões basilares aí invocadas a respeito da atuação administrativa (e que congregam ou agrupam todos e cada um dos diversos argumentos apresentados pelo interessado).
É certo que o cumprimento do dever de audiência prévia que se impõe aos órgãos decisores da Administração não poderá traduzir-se “num mero formalismo balofo, que se cumpre sem consequências”, antes devendo traduzir-se “na audição efetiva do interessado, de modo que as questões novas por ele suscitadas, e pertinentes para a decisão administrativa definitiva, sejam efetivamente ponderadas pelo órgão decisor” (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 09/06/2011, proc. n.º 02815/08.2BEPRT, publicado em www.dgsi.pt). No entanto, não menos certo é que a autoridade administrativa, para fundamentar a decisão final, não está obrigada, como se disse, a rebater todas as razões e argumentos aduzidos pelo interessado em sede de audiência prévia contra o projeto de decisão, estando apenas vinculada a ponderar ou a ter em consideração tais contributos (cfr. o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 13/04/2000, proc. n.º 041540, cujo sumário se encontra publicado em www.dgsi.pt).
Ora, no caso dos autos, é para nós inequívoco que, na informação n.º 10/22, de 25/02/2022, que subjaz ao ato impugnado, foram devidamente apreciadas as questões novas suscitadas pela A. em audiência prévia, conforme consta do ponto II da referida informação, em especial o erro nos pressupostos – aqui se destacando o argumento de que não vinham identificadas as concretas moradas dos utentes, nem os concretos serviços que lhes eram prestados no equipamento de Secarias –, a aplicação do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 119/83, de 25/02, e do ponto 6 da norma VII do Guião Técnico da DGAS, incluindo as diferenças entre as respostas sociais de Centro de Dia e de Centro de Convívio, e, ainda, a exceção da prescrição do direito à restituição das comparticipações financeiras em causa (cfr. ponto 19 dos factos provados). E a circunstância de não ter sido feita uma referência específica à questão da inexistência de limitação geográfica, a respeito da residência dos utentes, como requisito para a sua inclusão no acordo de cooperação não traduz qualquer omissão de pronúncia geradora de ilegalidade da decisão final, considerando a apreciação e a ponderação global da posição manifestada pela A. na sua resposta que, sem dúvida, foram efetuadas.
De igual modo, não se pode afirmar, salvo o devido respeito, que a decisão final e a informação que lhe subjaz assentam em meras conclusões, juízos de valor e conceitos jurídicos, estando desprovidas de factos concretos e relevantes para a decisão do procedimento administrativo, incorrendo, por isso, em violação do dever de fundamentação previsto no n.º 2 do art.º 153.º do CPA.
Dispõe o aludido art.º 153.º do CPA que “a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato” (n.º 1), equivalendo à falta de fundamentação “a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato” (n.º 2). A fundamentação deve, por isso, ser clara, suficiente e congruente.
Ora, compulsada a informação n.º 10/22, é perfeitamente possível alcançar os motivos e fundamentos, de facto e de direito, que levaram o R. a decidir como decidiu, motivação que a A. bem compreendeu, o que se infere a partir das alegações por si tecidas a propósito do vício de violação de lei por erro nos pressupostos que assaca à referida decisão, pelo que esta se encontra devidamente fundamentada, de um ponto de vista formal, cumprindo as exigências previstas na lei.
Diferente questão é, claro está, a discordância da A. relativamente a tais motivos ou pressupostos subjacentes à decisão de ordenar a restituição das comparticipações financeiras que o R. entendeu (bem ou mal) terem sido indevidamente pagas à instituição, o que se prende já com a fundamentação substancial ou material do ato impugnado (isto é, com um eventual erro nos pressupostos, de facto e/ou de direito), mas não com uma eventual falta ou insuficiência de fundamentação formal, que, como vimos, não se verifica.
Em segundo lugar, não colhe a alegação da A. de que, entendendo o R. que foi violado o disposto na alínea i) do art.º 12.º e no art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, na redação atual, a putativa violação de qualquer comando legal não pode ser efetuada à luz da redação atual, mas na redação vigente no momento da(s) pretensa(s) violação(ões) (art.os 53.º e 54.º da PI). O R. limitou-se, e bem, a citar a legislação aplicável à situação em apreço na versão que se encontrava em vigor no momento da prática do ato (decisão final de 02/03/2022) e, portanto, no momento da constatação da prática das irregularidades apontadas à instituição, ao abrigo do princípio “tempus regit actum”, que “manda aferir a legalidade do ato administrativo pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação” (cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 03/04/2003, proc. n.º 02046/02, aplicável em www.dgsi.pt). Sendo certo que a A. também não retira qualquer conclusão, efeito ou consequência da aplicação da redação atual dos preceitos invocados, em vez da aplicação da redação alegadamente em vigor no momento da prática das irregularidades.
Alega a A., em terceiro lugar, que, para além de o R. não concretizar qual o concreto normativo do art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, que julga ter sido violado, não se vislumbra qualquer concreta imputação factual que possa subsumir-se na violação do dever de comunicar as frequências das referidas respostas sociais, tanto para mais quando a A. sempre comunicou as frequências reais das respostas sociais em dissídio, pelo que nada justifica a decisão de restituição das comparticipações financeiras pagas no âmbito dos acordos de cooperação celebrados (art.os 55.º a 58.º da PI).
Este argumento, todavia, não pode proceder.
Não é controvertido que a decisão de ordenar à A. a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo R. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias assentou no entendimento de que a instituição violou o disposto na alínea i) do art.º 12.º e no art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, que define os critérios, regras e formas em que assenta o modelo específico da cooperação estabelecida entre o ISS e as instituições particulares de solidariedade social ou legalmente equiparadas, para o desenvolvimento de respostas sociais, em conformidade com o subsistema de ação social.
Ora, de acordo com o art.º 12.º, alínea i), da citada Portaria (republicada pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15/07), “no âmbito da celebração de um acordo de cooperação a instituição obrigase a: (…) i) comunicar aos serviços da segurança social a frequência da resposta social”. E o seu art.º 17.º estipula que “o pagamento da comparticipação financeira da segurança social é efetuado mensalmente tendo em conta a resposta social em causa” (n.º 1), devendo, para este efeito, a instituição “comunicar ao ISS, I.P., a frequência verificada no mês anterior, através da Segurança Social Direta” (n.º 2).
Da decisão final aqui impugnada retira-se que a conclusão no sentido da violação de tais normativos assentou nos seguintes três aspetos fundamentais:
no facto de a A. ter declarado aos serviços da segurança social que 19 utentes frequentavam o Centro de Dia situado na Sede, em ..., quando, na verdade, os mesmos residiam na localidade de Secarias e usufruíam dos serviços prestados pela A. no Centro de Dia situado em Secarias, pelo que houve uma discrepância entre a frequência de utentes comunicada ao R. para efeitos de recebimento das comparticipações financeiras e a frequência real de utentes no equipamento Sede;
no facto de 10 dos referidos 19 utentes usufruírem, no equipamento de Secarias, de serviços que não podiam integrar a resposta social de Centro de Dia, mas antes a resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), por participarem em atividades recreativas e culturais com a toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa de € 26,00;
no facto de a A. ter declarado aos serviços da segurança social que 9 utentes frequentavam o Centro de Dia situado em Secarias, quando, na verdade, 3 desses 9 utentes usufruíam, uma vez mais, de serviços que não podiam integrar a resposta social de Centro de Dia, mas antes a resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), por participarem em atividades recreativas e culturais com a toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa de € 26,00.
Como facilmente se compreende dos factos acima descritos, a discrepância que foi detetada pelo R. entre a frequência de utentes comunicada para efeitos de recebimento das comparticipações financeiras e a frequência real de utentes no equipamento Sede traduz, ao invés do que alega a A., a violação do dever da instituição de comunicar ou declarar aos serviços da segurança social a frequência da resposta social abrangida pelo acordo de cooperação, na medida em que tal dever de comunicação/declaração pressupõe, naturalmente, uma correspondência, efetiva, verdadeira e exata, entre aquilo que é declarado e aquilo que ocorre na realidade – correspondência essa que não terá existido in casu. Acresce que não basta a alegação, genérica e conclusiva, de que a A. sempre comunicou as frequências reais das respostas sociais em dissídio (Sede e Secarias), o que é manifestamente insuficiente para, por si só, infirmar ou contrariar, fundamentadamente, as conclusões a que o R. chegou, na sequência da ação de fiscalização realizada, quanto ao desfasamento encontrado entre o número de utentes (19) que a A. declarou que frequentavam o Centro de Dia situado na Sede, mas que, afinal, frequentavam o Centro de Dia de Secarias.
Quanto à circunstância de não ter sido indicado qual o concreto número do art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015 que terá sido violado, nenhuma ilegalidade decorre dessa invocada não concretização, na medida em que, considerando os elementos factuais acima enunciados, resulta evidente que a restituição das comparticipações financeiras assenta no facto de as mesmas não terem sido pagas, afinal, tendo em conta a efetiva e real frequência da resposta social em causa (Centros de Dia da Sede e de Secarias), ao arrepio, portanto, do que se prevê no n.º 1 do referido preceito regulamentar.
Defende a A., em quarto lugar, que, relativamente ao equipamento Sede, na decisão continuam a não ser identificadas as concretas moradas dos referidos utentes e, por outro, continuam a não ser identificados os concretos serviços que eram prestados no equipamento de Secarias (art.os 59.º e 60.º da PI). Mas tal argumento não convence.
Por um lado, as concretas moradas dos utentes (19) que frequentariam, na realidade, o equipamento de Secarias, mas cuja frequência foi declarada como sendo no equipamento da Sede, constam expressamente do Quadro II do relatório final da ação de fiscalização de que a A. foi alvo (e que esteve na génese do ato aqui sindicado) – processo de averiguação (PROAVE) n.º ...62 –, relatório do qual foi notificada e acerca do qual exerceu, aliás, o respetivo contraditório (cfr. ponto 5 dos factos provados). Razão pela qual a sua não indicação (repetição) na informação que subjaz à decisão final de restituição não redunda em qualquer ilegalidade, pois que tal informação sempre foi devidamente prestada à instituição.
O mesmo se diga da identificação dos concretos serviços que eram prestados no equipamento de Secarias. Com efeito, para além do que já constava do relatório final da ação de fiscalização, da informação n.º 10/22 também constam que os serviços prestados pela Santa Casa da Misericórdia de (...), em Secarias, aos seus utentes se traduziam “no fornecimento de um lanche e atividades de convívio” e que “prestar um serviço de lanche e atividades recreativas a pessoas, mediante o pagamento de uma quantia mensal fixa de €26,00 (…) é prestar uma resposta social (de Centro de Convívio) num mercado concorrencial”. Não vemos, pois, em que medida não foram identificados os serviços prestados no Centro de Dia de Secarias, nem a A. explica a relevância de uma qualquer individualização ou concretização adicional desses serviços.
Refere a A., em seguida, que, mesmo que tais situações (utentes declarados como frequentando o equipamento Sede quando tinham residência em Secarias e frequentavam o equipamento de Secarias) se tivessem verificado, tal não traduziria qualquer violação do acordo de cooperação, nem de qualquer outra norma aplicável, porquanto nem o acordo de cooperação subscrito entre as partes, nem as normas aplicáveis estabelecem qualquer limitação geográfica relacionada com a residência dos utentes para os mesmos poderem ser incluídos no acordo de cooperação, sendo o único requisito para incluir determinado utente no acordo de cooperação referente a um qualquer Centro de Dia a sua idade (superior a 65 anos) (art.os 61.º a 64.º da PI).
Este argumento, porém, não procede, desde logo porque a irregularidade detetada pelo R. não teve a ver com o incumprimento de qualquer eventual critério geográfico relativo à proveniência dos utentes de ambas as respostas sociais.
Como se disse supra, o problema residiu, em suma, no que respeita ao Centro de Dia da Sede, numa discrepância entre a frequência de utentes comunicada ao R. para efeitos de recebimento das comparticipações financeiras referentes a esse equipamento e a frequência real de utentes nesse mesmo equipamento, pois que, apesar de a A. ter declarado que 19 (do número total de) utentes frequentariam o Centro de Dia situado na Sede, constatou-se que os mesmos, na verdade, residiam na localidade de Secarias e usufruíam dos serviços prestados pela A. no Centro de Dia situado em Secarias. Claro está que os referidos utentes poderiam, qualquer que fosse a sua residência, beneficiar dos serviços prestados em qualquer dos Centros de Dia da A., fosse na Sede, fosse em Secarias. A questão é que a A. declarou que um determinado número de utentes frequentava o Centro de Dia da Sede – assim recebendo as comparticipações financeiras relativas a esses utentes, ao abrigo do acordo de cooperação celebrado para esse específico equipamento – quando, na realidade, esses mesmos utentes frequentavam o Centro de Dia de Secarias (para o qual a A. já havia esgotado as comparticipações financeiras concedidas para os utentes abrangidos pelo respetivo acordo de cooperação). A referência à morada dos utentes que se encontravam nessa situação (registados e declarados na Sede, mas frequentando Secarias) acabou por ser apenas um elemento adicional tendente a comprovar a discrepância detetada.
Entende, por outro lado, a A. que a possibilidade de os 19 utentes incluídos no acordo da Sede poderem beneficiar da prestação de serviços no equipamento localizado em Secarias é expressamente admitida pelo art.º 4.º-A do Estatuto das IPSS, conjugado com o n.º 3 do art.º 43.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, pelo que, se a lei e a portaria admitem a articulação entre instituições para utilização comum de serviços ou equipamentos, é óbvio que, por maioria de razão, essa articulação e utilização comum de equipamentos pode legalmente verificar-se no seio da mesma instituição que, no caso, tem dois Centros de Dia, um localizado na Sede e outro localizado em Secarias (art.os 65.º a 69.º da PI).
Esta alegação, todavia, passa ao lado, uma vez mais, da questão central aqui em litígio.
Tendo sido celebrados, entre A. e R., dois acordos de cooperação distintos – o acordo de 09/11/1982, pelo qual o R. se obrigou a comparticipar nos encargos financeiros da instituição relativos, entre outras valências, à resposta social de Centro de Dia, instalado e a funcionar no seu edifício sede (Equipamento Sede), sendo o número total de utentes abrangidos pelo referido acordo de 50, e o acordo de 01/08/2009, pelo qual o R. se obrigou a comparticipar nos encargos financeiros da instituição relativos à resposta social de Centro de Dia, instalado e a funcionar no edifício da Junta de Freguesia ... (Equipamento Secarias), sendo o número total de utentes abrangidos pelo referido acordo de 9 (cfr. pontos 1 e 2 dos factos provados) –, a invocada possibilidade de articulação e utilização comum de equipamentos no seio da mesma instituição – in casu, dos dois Centros de Dia – não pode servir, salvo o devido respeito, para contornar, afastar ou ultrapassar as regras acordadas com o R. no âmbito dos referidos acordos de cooperação, perfeitamente autónomos e diferenciados. Em concreto, se o R. se comprometeu a comparticipar financeiramente, nos termos de um específico acordo de cooperação, os serviços prestados pela A. a 9 utentes do Centro de Dia de Secarias (e não outro), não pode a A. obter esse apoio financeiro para mais utentes (além dos já referidos 9) do mesmo Centro de Dia de Secarias através do recebimento de comparticipações financeiras previstas para utentes de um outro Centro de Dia (Sede), objeto de um distinto acordo de cooperação, registando e declarando esses utentes (além dos já referidos 9) no contexto desse outro Centro de Dia (Sede) e alegando uma “articulação e utilização comum de equipamentos” para justificar a frequência do Centro de Dia de Secarias por parte desses utentes adicionais. Tal equivaleria a subverter os acordos celebrados.
E a tal conclusão não obsta, a nosso ver, a circunstância de aqueles 19 utentes terem beneficiado, na prática, dos serviços de Centro de Dia, quer os mesmos tivessem sido prestados no equipamento Sede, quer os mesmos tivessem sido prestados no equipamento de Secarias. O R. nunca pôs em causa, no procedimento que culminou no ato impugnado, a materialidade dos serviços prestados aos utentes, mas unicamente o facto de a A. ter recebido comparticipações no âmbito de um acordo de cooperação que, ao invés de dizerem respeito a utentes do Centro de Dia abrangido por esse acordo de cooperação (Sede), diziam antes respeito a utentes que se verificou que frequentavam outro Centro de Dia, objeto de distinto acordo de cooperação (e em relação ao qual a A. já havia preenchido o limite máximo de utentes cujas prestações de serviços poderiam ser comparticipadas pelo R.).
Não tem, por isso, razão a A. quando alega que o R. pretende enriquecer ilicitamente à sua custa, dado que é inquestionável que os serviços foram prestados, os utentes foram beneficiários dos mesmos e o R. pretende obter a restituição dos valores contratualizados para o efeito, visando o empobrecimento da A. na medida dos custos que suportou com a prestação dos serviços (art.os 70.º a 72.º da PI).
Defende a A., em quinto lugar, ainda no que se refere ao Centro de Dia da Sede, que os serviços aí disponibilizados e efetivamente prestados não se confundem com os serviços de um Centro de Convívio e, por isso, não pode proceder o segundo argumento invocado pelo R. para exigir a restituição das comparticipações financeiras. Alega que são as próprias normas técnicas que regulamentam as condições de localização, instalação e funcionamento dos Centros de Dia de Idosos, elaboradas pelo R., mais concretamente o ponto 6 da norma VII, que permitem que algum ou alguns utentes optem por não usufruir de algum ou alguns dos serviços existentes, pelo que tal situação não desvirtuaria a existência de um Centro de Dia. Reitera que tem ao dispor todos os serviços próprios de um Centro de Dia, como sejam o serviço de refeições, convívio/ocupação, cuidados de higiene pessoal e conforto, cuidados de saúde, cuidados de imagem, tratamento de roupas, apoio psicossocial, atividades de animação e socialização, preparação e controle da medicação, transporte, acompanhamento ao exterior (estruturas de saúde) e teleassistência, sendo a gestão dos serviços desenvolvida com respeito pelos princípios da autodeterminação e capacitação dos utentes, de acordo com as suas reais necessidades e pretensões (art.os 73.º a 83.º da PI).
Não lhe assiste, contudo, razão.
Como vimos, um dos fundamentos da decisão de restituição das comparticipações financeiras auferidas pela A. assentou no facto de 10 dos 19 utentes (declarados no Centro de Dia da Sede, mas que frequentavam o Centro de Dia de Secarias) usufruírem, no equipamento de Secarias, de serviços que não podiam integrar a resposta social de Centro de Dia, mas antes a resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), por participarem em atividades recreativas e culturais com a toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa de € 26,00. Utentes esses (10) expressamente identificados no Quadro 1 da informação n.º 10/2022.
Não é controvertido que, nos termos do Guião Técnico do Centro de Dia, elaborado pela Direção Geral da Ação Social (DGAS) e aprovado por Despacho do SEIS, de 29/11/1996, “o Centro de Dia é uma resposta social, desenvolvida em equipamento, que consiste na prestação de um conjunto de serviços que contribuem para a manutenção dos idosos no seu meio sócio-familiar” (norma II), sendo objetivos do Centro de Dia a “prestação de serviços que satisfaçam necessidades básicas”, a “prestação de apoio psicossocial” e o “fomento das relações interpessoais ao nível dos idosos e destes com outros grupos etários, a fim de evitar o isolamento” (norma III). Ademais, “o Centro de Dia assegura entre outros os seguintes serviços: a) refeições; b) convívio/ocupação; c) cuidados de higiene; d) tratamento de roupas; e) férias organizadas” (n.º 2 da norma V), sendo que “o utilizador pode escolher, de entre os serviços existentes, aqueles de que necessita, de acordo com as condições expressas no regulamento interno” (n.º 6 da norma VII).
Por sua vez, segundo o Regulamento Interno do Complexo Social da A. (junto como doc. n.º 12 da petição inicial), “o Centro de Dia (CD) é uma resposta social, destinada a pessoas idosas de ambos os sexos, que proporciona, em horário diurno, um conjunto diversificado de serviços e atividades de desenvolvimento pessoal tendentes ao bem-estar do utente e ao seu equilíbrio emocional e físico, e de apoio à respetiva família” (art.º 56.º, n.º 1). O Centro de Dia “assegura a prestação de um conjunto de serviços destinados à melhoria da qualidade de vida dos utentes, designadamente: a) refeições (Almoço e lanche ou almoço, lanche e jantar); b) cuidados de higiene pessoal e conforto; c) cuidados de saúde; d) cuidados de imagem; e) tratamento de roupas de uso pessoal; f) apoio psicossocial; g) preparação e controle da medicação; h) poderá, ainda, assegurar transporte do domicílio para o CD e do CD para o domicílio (…); i) transporte do CD para o Centro de Saúde, para tratamentos e consultas de saúde familiar”. Promove, ainda, o Centro de Dia, atividades de animação sociocultural, lúdico-recreativas e ocupacionais, celebração de datas festivas, organização de passeios e outras iniciativas (art.º 59.º, n.os 1 e 2).
Em matéria de determinação da comparticipação mensal do utente do Centro de Dia, a mesma “é calculada de acordo com a legislação em vigor” e é “determinada pela aplicação de uma percentagem sobre o rendimento ‘per capita’ do agregado familiar, de acordo com a seguinte tabela de comparticipações: (…)”. Ademais, “a exclusão, por parte do utente, familiar responsável ou representante legal, de alguns dos serviços constantes da tabela de comparticipações, não implica a redução do valor da comparticipação mensal”, sem prejuízo de, “nos casos em que se verifiquem situações sociais caracterizadas por uma grave carência económica”, poder “a instituição reduzir a comparticipação do utente, definida caso a caso, e mediante informação técnica” (art.º 70.º, n.os 1, 2, 3 e 7). O art.º 77.º do Regulamento procede, ainda, a uma caracterização de cada uma das atividades e serviços desenvolvidos nos Centros de Dia (cuidados de higiene e conforto pessoal, cuidados de imagem, serviço de refeições, tratamento de roupas, cuidados de saúde, atividades lúdicas e ocupacionais, apoio psicossocial, transporte dos utentes e preparação e controlo da medicação).
Já o Centro de Convívio consiste numa resposta ou equipamento social onde se organizam atividades recreativas e culturais que envolvem as pessoas idosas da comunidade, sendo seus objetivos prevenir a solidão e o isolamento, incentivar a participação e incluir as pessoas idosas na vida social local, promover as relações pessoais e intergeracionais, evitar ou adiar ao máximo o recurso a estruturas residenciais para pessoas idosas, contribuindo para a manutenção dos utentes em meio natural de vida (cfr. “Guia Prático Apoios Sociais – Pessoas Idosas”, elaborado pelo R. e disponível em https://www.seg-social.pt/documents/10152/27202/ N35_apoios_sociais_idosos/638b6f1a-61f6-4302-bec3-5b28923276cb). Volvendo ao caso dos autos, não tem razão a A. quando alega que, pelo facto de o utilizador poder escolher, de entre os serviços existentes, aqueles de que necessita no Centro de Dia, mesmo que algum utente optasse por não usufruir de algum ou alguns dos serviços existentes, tal situação não desvirtuaria a existência de um Centro de Dia, sendo certo que a A. tem ao dispor, nos equipamentos em causa, todos os serviços próprios de um Centro de Dia, os quais não se confundem com os serviços de um Centro de Convívio.
E não tem a A. razão, no caso concreto, porque, considerando a caracterização dos Centros de Dia, acima melhor descrita, os utentes que beneficiam, nos seus equipamentos Sede e Secarias, não da totalidade (ou maior parte) dos serviços aí disponibilizados, mas apenas da participação em atividades recreativas e culturais e da toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa, mais reduzida, de € 26,00 – factualidade que, na verdade, a A. não põe em causa –, ainda que em resultado da sua opção de não beneficiarem de qualquer outro serviço ali disponibilizado e prestado, não se podem equiparar aos restantes utentes que beneficiam, nos mesmos equipamentos, dos restantes serviços e atividades aí prestados (todos ou quase todos), mediante o pagamento de uma mensalidade variável para cada utente, calculada através da aplicação de uma percentagem sobre o rendimento per capita do agregado familiar, de acordo com a tabela de comparticipações prevista no Regulamento Interno da instituição para esta resposta social – o qual prevê, aliás, que “a exclusão, por parte do utente, familiar responsável ou representante legal, de alguns dos serviços constantes da tabela de comparticipações [almoço, lanche e/ou jantar], não implica a redução do valor da comparticipação mensal” – e em cumprimento do Guião Técnico do Centro de Dia, elaborado pela DGAS. Note-se, pois, que esta “modalidade” de serviços prestados no Equipamento de Secarias (participação nas atividades lúdicas apenas com toma de um lanche) nem sequer se encontra prevista, em rigor, no Regulamento Interno do Complexo Social da A.
De facto, atentas as diferenças assinaladas (quanto aos serviços prestados, às refeições tomadas e ao montante, fixo ou varável, da comparticipação familiar paga pelo utente), partilhamos do entendimento do R. no sentido de que os serviços prestados pela A. aos seus utentes e que se traduzem, sem mais, no fornecimento de um lanche durante atividades de convívio, conjugada com o tipo de mensalidade paga pelos mesmos, são enquadráveis na resposta social de Centro de Convívio e não de Centro de Dia, pois que esta última está mais vocacionada, como decorre do que ficou exposto, para a assistência aos idosos nas suas necessidades mais básicas – o que, como se viu, não ocorre com os 10 utentes aqui em causa.
Aliás, da factualidade provada resulta que a A. pretendeu estabelecer estas diferentes “modalidades” de respostas sociais disponibilizadas no Equipamento de Secarias. Com efeito, em reunião da Mesa de 20/11/2009, foi aprovada a proposta da Direção-Geral de permitir aos utentes daquele equipamento a opção de frequentarem o Centro de Dia apenas num período (manhã ou tarde), beneficiando da refeição de lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa, à data definida em € 20,00, com o seguinte fundamento: “A necessidade de possibilitar esta modalidade objetiva o alcance de um processo gradual de integração no equipamento, impelindo os cidadãos mais hesitantes a experienciar os serviços prestados e garantindo a frequência de todos os utentes do anterior, e já extinto, Centro de Convívio” (cfr. ponto 22 dos factos provados – sublinhado nosso).
Por conseguinte, mesmo que estes utentes tenham optado, de livre vontade, por não usufruir de todos os serviços próprios de um Centro de Dia (mormente, porque as suas necessidades básicas diárias se encontrariam asseguradas), mas apenas participar em atividades de convívio, com toma de um lanche, nos equipamentos da A., e não obstante aí serem disponibilizados, em teoria, a todos os utentes que o desejem, todos os serviços próprios de um Centro de Dia, o certo é que tal situação desvirtua a qualificação desses concretos utentes como utentes da resposta social de Centro de Dia. Razão pela qual, abrangendo os acordos de cooperação, tão-só e apenas, a comparticipação nos encargos financeiros da instituição relativos aos utentes que beneficiam e usufruem da resposta social de Centro de Dia, não podia a A. ter recebido comparticipações financeiras para utentes que, afinal, apesar de frequentarem aquele equipamento, não usufruíam, porém, dos serviços enquadráveis nessa resposta social (a não ser que, claro está, tais utentes estivessem abrangidos por um acordo de cooperação celebrado com o R. para essa modalidade de resposta social de Centro de Convívio, o que não é o caso).
Defende, ainda, a A., a respeito da mensalidade fixa de € 26,00, que a comparticipação familiar é, por definição, o “montante variável, pago pelos utentes e ou pelas famílias pela utilização de uma resposta social, em função dos serviços utilizados e dos rendimentos disponíveis do agregado familiar”, sendo que, segundo o n.º 7 do art.º 70.º do Regulamento Interno do Complexo Social da A., sempre que se verifiquem situações sociais caraterizadas por uma grave carência económica, poderá a instituição reduzir a comparticipação do utente, definida caso a caso, e mediante informação técnica. Conclui, por isso, que o R. está a “penalizar” a A. por esta reduzir a comparticipação do utente (art.os 84.º a 89.º da PI).
Não vemos, todavia, de que forma este argumento pode afastar a conclusão a que supra se chegou a respeito da natureza da resposta social praticada para aqueles 10 utentes.
Segundo os n.os 1 e 2 do art.º 19.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, “os utentes e famílias comparticipam nas despesas de funcionamento do serviço ou equipamento social objeto do acordo de cooperação, mediante o pagamento de um valor estabelecido em função do serviço prestado e dos rendimentos do agregado familiar”, sendo que, “para cálculo do valor da comparticipação familiar, a instituição deve observar os critérios estabelecidos no regulamento anexo à presente portaria e que dela faz parte integrante”. E do anexo à Portaria consta, no seu ponto 2, que se considera comparticipação familiar “o valor pago pela utilização dos serviços e equipamentos sociais, determinado em função da percentagem definida para cada resposta social, a aplicar sobre o rendimento per capita do agregado familiar”. Ademais, o ponto 11.3.1 do anexo estipula a percentagem máxima de 60% a aplicar sobre o rendimento per capita para apuramento da comparticipação familiar devida pela utilização do Centro de Dia, prevendo-se, ainda, no ponto 11.3.3, que, “para as respostas sociais centro de convívio (…) a comparticipação familiar é variável de acordo com a avaliação casuística, em função das características do território, das atividades e dos serviços prestados aos utentes”.
Não se ignora também que, nos termos do art.º 70.º, n.os 1, 2 e 7, do Regulamento Interno do Complexo Social da A., a comparticipação mensal do utente do Centro de Dia é “determinada pela aplicação de uma percentagem sobre o rendimento ‘per capita’ do agregado familiar, de acordo com a seguinte tabela de comparticipações: (…)” (45% no caso de almoço e lanche e 60% no caso de almoço, lanche e jantar). Acresce que, “nos casos em que se verifiquem situações sociais caracterizadas por uma grave carência económica, pode a instituição reduzir a comparticipação do utente, definida caso a caso, e mediante informação técnica”.
Ou seja, a regra para o cálculo da comparticipação familiar de cada utente do Centro de Dia é a aplicação de uma percentagem sobre o rendimento do respetivo agregado familiar (o que resultará, naturalmente, num montante diferente para cada utente). Todavia, esta comparticipação do utente pode ser objeto de redução, que é efetuada casuisticamente, considerando a efetiva situação de carência ou dificuldades económicas do agregado familiar, a sopesar e ponderar em informação técnica. Ora, mesmo que a mensalidade cobrada aos referidos 10 utentes – € 26,00 – tenha resultado da decisão de reduzir o montante das comparticipações desses utentes devido à situação de grave carência económica em que se encontrariam (cfr. ponto 23 dos factos provados), o certo é que tal não afasta a constatação de que os serviços prestados pela A. a esses seus utentes e que se traduzem, sem mais, no fornecimento de um lanche durante atividades de convívio, são enquadráveis na resposta social de Centro de Convívio (pela qual também é devido o pagamento de uma comparticipação) e não de Centro de Dia, atentas as características e a natureza de cada uma destas modalidades de resposta social, supra descritas.
Não se nos afigura, por isso, que o R. tenha atuado com a intenção de “penalizar” a A. por esta ter reduzido a comparticipação dos utentes.
Note-se, por último, a respeito do equipamento Sede, que, independentemente da validade ou invalidade do fundamento relacionado com a falta de enquadramento na resposta social de Centro de Dia dos serviços ali prestados a 10 utentes, sempre subsistiria o primeiro fundamento invocado para a reposição exigida pelo R., mormente a discrepância entre a frequência declarada de utentes e a frequência real de utentes (irregularidade detetada para 19 utentes, entre os quais se incluíam aqueles outros 10 utentes).
Em sexto lugar, relativamente ao equipamento de Secarias, a A. reproduz todos os fundamentos factuais e jurídicos invocados nos art.os 73.º a 89.º da petição, reiterando que nem o R., nem a instituição podem obrigar os utentes a beneficiar de todos os serviços do Centro de Dia, que, no caso da A., sempre estiveram disponíveis e continuam a estar, dada a necessidade de assegurar o respeito dos princípios da autodeterminação e capacitação dos utentes, procurando as instituições que prestam os serviços ajustar-se às reais necessidades e pretensões daqueles que procuram as suas respostas sociais (art.os 90.º a 96.º da PI).
Como vimos supra, a decisão de exigir a restituição das comparticipações financeiras pagas à A. assentou, no que ao equipamento de Secarias concerne, no facto de a A. ter declarado aos serviços da segurança social que 9 utentes frequentavam o Centro de Dia situado em Secarias, quando, na verdade, 3 desses 9 utentes usufruíam, uma vez mais, de serviços que não podiam integrar a resposta social de Centro de Dia, mas antes a resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), por participarem apenas em atividades recreativas e culturais com a toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa de € 26,00. Atendendo à similitude/identidade dos argumentos ora aduzidos com os argumentos que já foram apreciados a propósito do equipamento da Sede, remetemos, sem necessidade de ulteriores considerações, para o que acima deixámos exposto, resultando a improcedência da alegação da A. nesta matéria.
Alega a A., em sétimo lugar, que, ao longo dos anos, entre os quais os que estão aqui em dissídio, as respostas sociais de Centro de Dia Sede e Secarias foram objeto de visitas técnicas de acompanhamento por parte de técnicas do R., em cujos relatórios técnicos não foram apontadas quaisquer deficiências no funcionamento dos Centros de Dia, circunstância que criou uma convicção na A. de estar a cumprir todos os normativos aplicáveis, incluindo os que agora se diz terem sido postergados, pelo que a decisão impugnada é um ato contrário à boa fé e uma decisão injusta (art.os 114.º a 116.º da PI).
Cremos, contudo, que não é assim.
Isto porque a circunstância de não terem sido apontadas irregularidades nas visitas de acompanhamento e apoio técnico regularmente efetuadas à instituição por equipas do Centro Distrital de Coimbra do R. (cfr. art.º 33.º-A da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, aditado pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15/07) não podia obstar à deteção de irregularidades no âmbito da ação de fiscalização que foi levada a cabo pelo Departamento de Fiscalização do R., com auditoria financeira e avaliação às respostas sociais promovidas pela A. ao abrigo dos acordos de cooperação – processo de averiguação (PROAVE) n.º ...62 (cfr. art.º 39.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07). Por outras palavras, os resultados das visitas de acompanhamento e apoio técnico, ainda que não tenham detetado desconformidades, não podiam precludir ou obstaculizar a verificação posterior de eventuais irregularidades, reportadas aos mesmos períodos em que tais visitas tiveram lugar, detetadas no âmbito de ações de fiscalização desses equipamentos e serviços, sobretudo quando a análise destas ações de fiscalização é, por natureza, mais direcionada para a verificação do cumprimento dos acordos celebrados e dos normativos legais e regulamentares aplicáveis.
Razão pela qual as visitas de acompanhamento e apoio técnico não se nos afiguram suficientes para permitir a criação, na A., de uma convicção, legítima e justificada, de estar a cumprir todos os normativos aplicáveis, como tal merecedora de tutela e proteção jurídica, através da impossibilidade de imputação a posteriori de quaisquer incumprimentos e/ou desconformidades. Por conseguinte, a decisão impugnada, ao imputar à instituição um conjunto de irregularidades que não haviam sido detetadas naquelas visitas, não se revela, por si só, contrária à boa fé nem injusta, já que não defrauda nenhuma expectativa ou convicção legítima da A. na inexistência de irregularidades.».
Apreciando.
Num primeiro ponto, que a recorrente intitula como “violação do dever de decisão e de fundamentação”.
Coloca como “inquestionável, também para o tribunal “a quo”, que a ré não se pronunciou e não decidiu todos os fundamentos invocados em sede de audiência prévia, nomeadamente a circunstância de nem os acordos de cooperação em causa, nem qualquer outra norma estabelecer qualquer limitação geográfica à residência dos utentes do(s) CD; (…) Mas, afinal, a autora violou alguma norma/alguma cláusula do acordo de cooperação? Mas afinal a autora estava impedida de prestar serviços a utentes noutra localização, noutro CD? Mas afinal a autora estava obrigada a prestar serviços que os utentes não desejavam? (…) Estas foram questões colocadas em sede de audiência prévia e que a administração não respondeu, não se pronunciou, não decidiu, violando, assim, os mais basilares deveres que sobre si impendem, tendo optado por refugiar-se em meras conclusões, juízos de valor e questões de direito (…)”.
Não tem razão.
Claramente resulta na informação n.º 10/22, de 25/02/2022, em que expressamente ancora o acto impugnado, que tipo de serviços abrangiam os acordos de cooperação e qual o universo de utentes passível de ser abrangido, ao abrigo dos distintos acordos, tudo iluminado pelo que já antes até mais pormenorizadamente já tinha sido levado a relatório final da ação de fiscalização, com conhecimento e confronto por banda da Autora, conhecedora do que no que na economia do caso importava, distinguindo quais os utentes do equipamento sede de ... e de Secarias e que tipo de respostas [relacionando-os pelo nome e geografia e resposta (como se diz, sem volver a haver necessidade de transcrição exaustiva pormenorizada de todo o processo administrativo; com conhecimento próprio da Autora que factura os serviços e tem os processos individuais)], perfeitamente adequado à aceitação ou rebate, inclusive no que de direito se reclama ponderar acerca da “limitação geográfica”, em que, para além do que de fonte legal foi convocado, não foram esquecidos os concretos acordos de cooperação, nos seus contratualizados termos de número de utentes, e respostas, por equipamento, e em que, mesmo e mais que de princípio até se reconheça de intenção abrangência de multiplicar universo de diferentes comunidades (com sentido ao estabelecimento de diferentes acordos de cooperação), mas todavia até sem uma expressa cláusula de “limitação geográfica”, verdadeiramente o que se depara de desencontro, não é essa falta questão de uma tal limitação, antes é a não fidelidade de relação da facturação de utentes/por equipamento e respostas dadas.
Num segundo ponto, a recorrente aponta para uma “errada aplicação do princípio “tempus regit actum””.
Tem, a nosso ver, a sua dose de razão na colocação da questão.
Mas sem ter repercussão de favor.
Como se viu, o fulcro de razão do acto impugnado centra-se na fidelidade de relação da facturação de utentes/por equipamento e respostas de apoio dadas.
A solução jurídica na economia do caso, aferindo em desvio ao acordado e fonte legal, é a mesma, seja por via da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, seja à luz do antecedente Despacho Normativo, de 20/05 (e Despacho Normativo n.º 31/2000, de 31/07).
Num terceiro ponto, que a recorrente identifica como “a omissão de indicação concreta do fundamento de direito para a decidida restituição”.
O tribunal “a quo” identificou que “a decisão de ordenar à A. a restituição das comparticipações financeiras indevidamente pagas pelo R. no âmbito dos acordos de cooperação celebrados para as respostas sociais de Centro de Dia – Equipamento Sede e Equipamento Secarias assentou no entendimento de que a instituição violou o disposto na alínea i) do art.º 12.º e no art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07” e, após desenvolver, entendeu que “não ter sido indicado qual o concreto número do art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015 que terá sido violado, nenhuma ilegalidade decorre dessa invocada não concretização, na medida em que, considerando os elementos factuais acima enunciados, resulta evidente que a restituição das comparticipações financeiras assenta no facto de as mesmas não terem sido pagas, afinal, tendo em conta a efetiva e real frequência da resposta social em causa (Centros de Dia da Sede e de Secarias), ao arrepio, portanto, do que se prevê no n.º 1 do referido preceito regulamentar.”, sendo que esta última ponderação relativamente ao “concreto número do art.º 17.º da Portaria n.º 196-A/2015 que terá sido violado”, apesar de se sugerir de alvo, na sistematização apresentada, é despido de crítica impugnatória.
Como muito claramente se vê no que mais acima ficou transcrito, no desenvolvimento não restringiu que apenas se deparava a matéria relativa aos utentes e equipamento sede, condensando fundamentos em “três aspetos fundamentais”, também aí relativamente ao equipamento de Secarias, bem que tenha centrado atenção no específico aspecto de desfasamento de frequência real de utentes para com a frequência declarada, centrando-se por aí pela alegação da Autora em juízo quanto a tal aspecto, mas também sem ficar eclipsado o que mais foi o juízo do julgamento, ao propósito dos diferenciados apoios, não se compreendendo qual a necessidade agora brandida pela Autora de ser convidada a aperfeiçoar articulado, e para que alegação e prova, nomeadamente em contrário do que foram conclusões do relatório de fiscalização relativamente a 2013 até 2018, onde nele, com alicerce probatório de quem tinha o ónus, foram considerados os montantes de apoio, também para tal período, explicitamente relacionando e tendo em conta as datas de admissão de cada identificado utente.
Num quarto ponto, a recorrente aponta para “a omissão de fundamentação de facto relativamente ao equipamento Sede”.
Avança com argumentos que o tribunal “a quo” dissecou e bem apreciou, com discurso fundamentador sólido, longe do clamor de justiça e legalidade que reivindica.
A recorrente não vê o que é facilmente alcançável na referência a atividades recreativas - a respeito de também colocar diferença entre distintas modalidades de apoio -, e “passa ao lado, uma vez mais, da questão central aqui em litígio”, não advindo razão do que argumenta em relação às moradas dos utentes e limitação geográfica, limitação que coloca em termos que, como vimos, não são os da equação motivadora do acto impugnado - e a que não perturba(ria) a possibilidade de utilização comum de serviços ou equipamentos… desde que sem discrepâncias de facturação entre o declarado e o real -, advindo prestável a identificação feita e adquirida no procedimento - mesmo sem explícita referência no acto impugnado (a que nos termos legais se exige uma “sucinta exposição”) - para aferir dessa bondade.
Num quinto ponto, a recorrente arvora “Erro de facto e de direito quanto à dicotomia Centro de Dia e Centro de Convívio relativamente ao equipamento Sede”.
Mas não emana erro.
A decisão recorrida caracterizou o que é equipamento e respostas de um Centro de Dia e de um Centro de Convívio, importando a distinção porque um dos fundamentos da decisão de restituição das comparticipações financeiras auferidas pela A. assentou no facto de 10 dos 19 utentes (declarados no Centro de Dia da Sede, mas que frequentavam o Centro de Dia de Secarias) usufruírem, no equipamento de Secarias, de serviços antes apenas típicos de uma resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), assim ficando desconforme a frequência real de resposta com o que foi comunicado para apoio dado.
Entendeu como acertado o fundamento, sem controvérsia quanto ao que fossem atividades recreativas e de convívio, por respeito a “factualidade que, na verdade, a A. não põe em causa”.
A realidade quanto a essas actividades desenvolvidas, onde acompanha um juízo de facto, é - como foi - facilmente perceptível, não advindo qualquer êxito impugnatório.
Não tem motivo que a recorrente lance de censura que “quer a SS, quer a 1.ª instância continuam a referir-se indistintamente a atividades recreativas e de convívio sem que as tenham minimamente concretizado”, em queixume do que nunca foi óbice.
O tribunal “a quo” não errou quando entendeu por bom o entendimento tido pela Administração ao ver que os serviços “que se traduzem, sem mais, no fornecimento de um lanche durante atividades de convívio, são enquadráveis na resposta social de Centro de Convívio (pela qual também é devido o pagamento de uma comparticipação) e não de Centro de Dia”, mesmo que no Centro de Dia possa apenas “ser administrada pelo menos uma refeição”, mas sempre, como definido e auto-vinculado, “Almoço e lanche ou almoço, lanche e jantar”, não apenas limitado ao lanche, e mesmo que por eventual opção dos utentes em não beneficiarem de qualquer outro serviço.
E, como também viu, a circunstância de até existir uma redução no montante das comparticipações desses utentes, não onublia nem arreda a desconforme entre a frequência real de resposta para com o que foi comunicado para apoio.
Além de, como também assinalou, subsistir “a discrepância entre a frequência declarada de utentes e a frequência real de utentes (irregularidade detetada para 19 utentes, entre os quais se incluíam aqueles outros 10 utentes)”.
Nada sem ofensa à “autodeterminação e capacitação dos utentes”.
Num sexto ponto, a recorrente censura o que reporta sob “Equipamento Secarias – reprodução de fundamentos”.
A recorrente sintetiza que “Está em causa, relativamente ao CD Secarias, apenas a descaraterização dos serviços prestados em Centro de Convívio, o que, como vimos, não pode proceder pelo facto de a administração (e o tribunal) não ter concretizado o que são atividades recreativas e/ou de convívio, sendo certo que os serviços estavam todos disponíveis e que se os mesmos não foram prestados, foi por que os utentes optaram e, por isso, a sua comparticipação foi ajustada, em baixa, aos serviços que optaram e atendendo à sua capacidade económica. Por mera cautela de patrocínio, dá-se por integralmente reproduzido e integrado, “mutatis mutandis”, o supra alegado”.
O tribunal “a quo” identificou que “a decisão de exigir a restituição das comparticipações financeiras pagas à A. assentou, no que ao equipamento de Secarias concerne, no facto de a A. ter declarado aos serviços da segurança social que 9 utentes frequentavam o Centro de Dia situado em Secarias, quando, na verdade, 3 desses 9 utentes usufruíam, uma vez mais, de serviços que não podiam integrar a resposta social de Centro de Dia, mas antes a resposta social de Centro de Convívio (não abrangida pelo acordo de cooperação), por participarem apenas em atividades recreativas e culturais com a toma de um lanche, mediante o pagamento de uma mensalidade fixa de € 26,00.”.
Perante a “similitude/identidade dos argumentos ora aduzidos com os argumentos que já foram apreciados a propósito do equipamento da Sede”, fez recair mesmo juízo.
Já se viu, a linha argumentativa da recorrente não procede.
Pelo que igualmente se conclui pela não razão.
Num sétimo ponto, a recorrente recorda “o acompanhamento anterior da SS relativamente aos equipamentos e respetivas consequências”.
Observa que “o tribunal “a quo” não cuidou de analisar o conteúdo das fichas de acompanhamento que foram juntas através do requerimento identificado no ponto 16 dos factos considerados provados, pois se o tivesse feito, teria concluído com facilidade que os argumentos expendidos pela administração para ordenar a restituição dos valores que foram pagos à autora entre 2013 e 2018 foram efetivamente analisados naqueles relatórios da própria Segurança Social; (…) E se a própria autora acompanhou e fiscalizou ao longo dos anos o funcionamento daqueles CD Sede e Secarias e se apesar de identificar as mesmas questões, não cuidou de reputar de ilegal o funcionamento, é óbvio que ao contrário do pugnado, foi criada uma convicção na autora, legítima e justificada de estar a cumprir na íntegra todas as normas, expetativa essa destruída, somente agora, pela própria SS, que atua em violação do princípio expectativa e da confiança e da boa fé que, julgado procedente, deve conduzir à anulação do ato impugnado na íntegra.”.
Mas na decisão recorrida, sem agora maior necessidade de análise, mostra-se bem que não podem ter-se como violados os brandidos princípios: “a circunstância de não terem sido apontadas irregularidades nas visitas de acompanhamento e apoio técnico regularmente efetuadas à instituição por equipas do Centro Distrital de Coimbra do R. (cfr. art.º 33.º-A da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07, aditado pela Portaria n.º 218-D/2019, de 15/07) não podia obstar à deteção de irregularidades no âmbito da ação de fiscalização que foi levada a cabo pelo Departamento de Fiscalização do R., com auditoria financeira e avaliação às respostas sociais promovidas pela A. ao abrigo dos acordos de cooperação – processo de averiguação (PROAVE) n.º ...62 (cfr. art.º 39.º da Portaria n.º 196-A/2015, de 01/07). Por outras palavras, os resultados das visitas de acompanhamento e apoio técnico, ainda que não tenham detetado desconformidades, não podiam precludir ou obstaculizar a verificação posterior de eventuais irregularidades, reportadas aos mesmos períodos em que tais visitas tiveram lugar, detetadas no âmbito de ações de fiscalização desses equipamentos e serviços, sobretudo quando a análise destas ações de fiscalização é, por natureza, mais direcionada para a verificação do cumprimento dos acordos celebrados e dos normativos legais e regulamentares aplicáveis.
Razão pela qual as visitas de acompanhamento e apoio técnico não se nos afiguram suficientes para permitir a criação, na A., de uma convicção, legítima e justificada, de estar a cumprir todos os normativos aplicáveis, como tal merecedora de tutela e proteção jurídica, através da impossibilidade de imputação a posteriori de quaisquer incumprimentos e/ou desconformidades. Por conseguinte, a decisão impugnada, ao imputar à instituição um conjunto de irregularidades que não haviam sido detetadas naquelas visitas, não se revela, por si só, contrária à boa fé nem injusta, já que não defrauda nenhuma expectativa ou convicção legítima da A. na inexistência de irregularidades.”.
*
Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas: pela recorrente.

Porto, 27 de Setembro de 2024.


Luís Migueis Garcia
Catarina Vasconcelos
Conceição Silvestre