Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo | |
| Contencioso: | Administrativo |
| Data: | 06/29/2010 |
| Processo: | 06469/10 |
| Nº Processo/TAF: | 00545/10.4BELSB |
| Sub-Secção: | 2º. Juízo |
| Magistrado: | Clara Rodrigues |
| Descritores: | INTIMAÇÃO PARA DEFESA DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS. NULIDADE SENTENÇA. |
| Data do Acordão: | 08/05/2010 |
| Texto Integral: | Venerando Juiz Desembargador Relator A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos artºs 146º nº1 e 147º do CPTA, vem, ao abrigo do art. 145º nº 5 do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos: I – O presente recurso vem interposto, pela então Requerente da Providência, da sentença proferida a fls. 187 e segs., pelo TAC de Lisboa, que julgou improcedente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, em consequência, absolvendo o R. da instância. Nas conclusões das suas alegações de recurso, a recorrente, além de impugnar a matéria de facto dada como provada, imputa à sentença em recurso a nulidade do art. 668º nº 1 als. d) e c) do CPC e erro de julgamento quer quanto à matéria de facto quer quanto a de direito, com violação do art. 65º nº 1 da CRP, art. 52º nº 1 do DL nº 794/76 de 05/11, 92º nº 5 do DL nº 555/99 de 16/12, art. 6º nº 3 do DL nº 157/2006 de 08/08 e 762º nº 1 do CC. O Município, ora recorrido contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do julgado. II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com base na prova documental, os factos constantes das alíneas A) a L), do ponto II, de fls. 191 a 200, que aqui se dão por integralmente reproduzidos. III – Quanto à alegada nulidade da sentença por omissão e excesso de pronúncia a que se reporta o art. 668º nº 1 als. d) do CPC. Invoca a recorrente que a sentença é nula por omissão de pronúncia por não se ter pronunciado, nem expressamente ter decidido que não podia conhecer, da “aptidão ou falta dela” dos imóveis sitos na Rua Maria Pia nº 104º, 2º dtº e na Rua Convento da Encarnação nº 26 – 3º andar, ambos em Lisboa, para efeitos de realojamento da recorrente, por não reunirem as condições materiais para albergar, enquanto habitação, a recorrente e seu filho dadas as especiais características fisiológicas deste (com mais de 110 kg). E, na verdade, afigura - se - nos assistir razão à recorrente. Com efeito, a ora recorrente com a presente intimação o que pretende é ser realojada pelo Município numa habitação que possua condições materiais para a albergar a si e ao seu filho, tendo como causa de pedir as condições fisiológicas deste, que pesa mais de 110 kg e as habitações sitas na rua Maria Pia e na rua Convento da Encarnação, serem demasiado exíguas, tendo em consideração o peso do seu filho. Ora, o Mmº Juiz a quo, na sentença proferida, considerando o facto que deu como provado na al. L) da matéria factual assente, nomeadamente que o fogo sito na Rua Maria Pia estava em regular estado de conservação, entendeu que o mesmo assegurará aquele mínimo essencial de dignidade em termos de residência. Todavia, tal entendimento parte de um pressuposto genérico e abstracto, sem atentar nas condições específicas daquele fogo e as condições fisiológicas do filho da recorrente, questão sobre a qual não se pronunciou, nem nada deu como provado. Por outro lado, sendo certo que como se refere na sentença recorrida «O direito à prestação material fogo para realojamento é, por natureza, um direito “sob reserva do possível” e do disponível, no determinado momento em que é realizado o realojamento.», também é certo que nada foi dado como provado quanto à existência ou inexistência de outros fogos disponíveis, o que nem sequer foi referido pelo Município Demandado, pelo que o facto dado como provado na alínea K) do probatório não pode só por si levar a qualquer presunção sobre a indisponibilidade de outros fogos, para além do da Rua Maria Pia, o que embora não resulte claramente expresso da sentença recorrida, resulta implícito do teor da mesma. Daí que se nos afigure existir, efectivamente por um lado omissão de pronúncia e, por outro, excesso de pronúncia, o que implica a nulidade da sentença recorrida nos termos da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC. IV – Já quanto à nulidade da al. c) do nº 1 do art. 668º do CPC, contradição entre os fundamentos e a decisão afigura - se - nos que a mesma não se verifica. Com efeito, esta nulidade tem lugar quando os fundamentos, quer de facto quer de direito, invocados pelo juiz devam, logicamente, conduzir ao resultado oposto ao que é expresso na sentença. Não se verifica por conseguinte tal nulidade, quando os fundamentos invocados pelo juiz, em seu entender, conduzem a um determinado resultado lógico e consequente que pode eventualmente redundar em erro de julgamento, o que não significa desconformidade entre os fundamentos e a sua parte dispositiva, passível de determinar a invocada nulidade. Ora, atenta a matéria de facto dada como provada (sendo embora insuficiente/deficiente, como se verá em seguida) e os fundamentos de direito invocados na douta sentença não se vê que uns e outros devam, logicamente, conduzir ao resultado oposto ao que é expresso na sentença. V - O que acontece, a nosso ver, é a existência de erro na apreciação de parte da prova produzida e insuficiência ou deficiência de prova, por falta de produção desta, sendo que tal insuficiência, como resulta do atrás referido, conduziu à omissão de pronúncia e excesso desta. Na verdade, tal como a recorrente o impugna, o facto dado como provado na al. L) da matéria factual assente, não resulta provado tal como foi formulado, já que embora não conste nestes autos as fls. informatizadas que serviram de fundamento ao mesmo (que a recorrente diz serem a preto e branco), o certo é que de acordo com a planta e fotos a cor, juntas a fls. 171 e segs., não se pode dar como provada a existência no fogo em questão de duas casas de banho, já que embora no cabeçalho da foto de fls. 171 conste “APRECIAÇÃO: Estado de conservação regular, com duas casa de banho.(…)”, das fotos juntas não resulta a existência de duas casas de banho, mas tão - só de uma e, da referida planta de fls. 170 que não possui legenda, igualmente tal não resulte, sendo que tais documentos são particulares, não fazendo prova plena (cfr. artºs 371º, nº1 e 376º, nºs 1 e 2 do CC) e relativamente à 2ª casa de banho a recorrente sempre afirmou tratar - se apenas de uma “retrete”. Não obstante, quer tratando - se de uma ou duas casas de banho, o que importa aos autos, para aferir da procedência dos pedidos como tal formulados, é conhecer as dimensões destas e face a estas e às restantes dimensões daquela habitação, bem como da sita na Rua da Encarnação, nomeadamente no que respeita a largura de corredor, portas e de escadas, em confronto com as características do filho da recorrente, saber se aquela habitação oferece ou não condições de dignidade de habitação para este. Assim, que os factos que a recorrente pretende ver aditados, mas que a nosso ver não o poderão ser, por controvertidos e não resultarem ainda provados nos autos, os quais são essenciais para a decisão, devam resultar de prova testemunhal a produzir (ou mesmo de inspecção aos locais que pode ser determinada oficiosamente) tanto mais que a A., ora recorrente, e o Município ora recorrido, a arrolaram, respectivamente na p.i. e na contestação, o mesmo se dizendo no que respeita à disponibilidade de outros fogos ou não pelo Município recorrido. Produção de prova essa sobre a qual o Mmº Juiz a quo nem sequer se pronunciou e que, pese embora estarmos perante um processo de natureza urgente, é admissível e pertinente ao apuramento dos factos com relevância para a decisão a proferir, o que deveria ter sido acautelado pelo tribunal a quo, de acordo com o disposto no art. 110º nº 2 do CPTA. Assim sendo, as conclusões das alegações de recurso mostram-se procedentes, sendo a sentença recorria nula também por deficiência da matéria de facto supra referida, tendo ocorrido manifesta omissão de produção de prova, com violação do disposto no artº 110º nº 2 do CPTA, por parte do tribunal a quo, o que determina igualmente a anulação da sentença recorrida nos termos do disposto no artº 712º, nº4 do CPC. VI – Pelo que, em face de todo o exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, declarando - se nula a sentença recorrida, devendo os autos baixarem ao tribunal recorrido a fim de proceder às requeridas diligências de prova e outras que possam ser pertinentes, com vista ao apuramento dos factos, em sequência, formulando nova decisão desprovida das restante nulidades de omissão e excesso de pronúncia de que enferma. |