Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1668/08.5BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 01/14/2020 |
Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
Descritores: | REVERSÃO; FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO; GERÊNCIA DE FACTO. |
Sumário: | I. O despacho de reversão está fundamentado quando inserido num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível, atentos os elementos dele constantes.
II. O exercício efetivo de funções de gestão é um dos pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária dos gestores. III. Cabe à AT o ónus da prova de demonstrar tal exercício efetivo de funções. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acórdão
I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 25.07.2018, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a oposição apresentada por A.......... (doravante Recorrida ou Oponente), ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 3158200601017.... e apensos, que o Serviço de Finanças (SF) de Loures 3 lhe moveu, por reversão de dívidas de IRC do exercício de 2005, de IVA dos períodos 2005/12T e 2006/03T e IRS (retenções na fonte) dos anos de 2004 e 2006, da devedora originária C...... – S......, Lda. O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a oposição à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, na parte em que o douto Tribunal considerou que a Oponente é parte ilegítima para a execução, em consequência do despacho de reversão padecer de falta de fundamentação. II. Não se conforma a Fazenda Pública com a douta decisão recorrida, porquanto considera que da prova produzida se não podem extrair as conclusões que lhe serviram de base, determinando que se julgasse pela ilegitimidade da oponente consubstanciada na ausência da indicação da alínea a ou b, relativa ao artigo 24.º da LGT. III. Da análise da certidão de registo comercial constata-se que a ora Oponente figura como gerente da sociedade “C........ - S........, Lda.”, desde a constituição em 2001 até 20-04-2006, data em que renunciou à gerência. A sociedade obrigava-se pela assinatura dos dois gerentes. IV. De acordo com o despacho proferido em 02/04/2008 pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures 3 e conforme ficou assente na fundamentação de facto, constante na alínea E), parece-nos ser, desde logo, sanada a preterição incutida na douta decisão do Tribunal a quo. V. A saber: "(...) Através da análise do presente processo, constata-se a inexistência de bens pertencentes à originária devedora C........ LDA, NPC 5055049..., (...) que garantam o pagamento da dívida exequenda e acrescido, verificando-se, assim, a inexistência do património da executada para solver a dívida, pelo que nos termos do artigo 23.º n.2 da LGT e artigo 153º. n.º 2 do C.P.P.T., devem ser chamados à execução os responsáveis subsidiários. As informações oficiais prestadas e documentadas referem que: 1.º- A constituição da Sociedade foi matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Loures, sob o n.º 17541/20010... em 2001.06.11 2.º- A executada iniciou o exercício da sua actividade em 2001.06.11; 3. º- A executada não possui quaisquer bens, móveis ou imóveis, ou valores penhoráveis, pelo que não tem meios para proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido; 4.º- Verifica-se, desde logo, nos termos do art. 153.º, n. 2 alínea a) do CPPT, a inexistência do património da originária devedora para a satisfação da dívida. 5.º- No CONTRATO DE SOCIEDADE, Comercial, conforme a matrícula da Cons. Registo Comercial de Loures, ap 26/20010…, refere que designa como gerentes: 1.º A.......... (...) e 2° J…….. (...), sendo a gerência da competência dos dois sócios ou não sócios, já designados, sendo a forma de obrigar a sociedade com a intervenção dos dois sócios. 6.º - Na data a que se reportam as dívidas e se refere o presente processo e apensos- Período 2005/2006, comprova-se que os citados gerentes se mantiveram em funções. 7.º- Assim, de acordo com o disposto nos artigos 23.º e 24. da LGT e 153. e 160.º do CPPT, podemos identificar como subsidiários responsáveis os Gerentes, A..........e J........, relativamente à referida firma, pela divida exequenda no período decorrente entre 2001.06.11 e 2006.04… que está na base da instauração do processo de execução fiscal n.º 3158200601017.... e apensos e que preenche o período da Administração e da dívida. A discriminar: IRC 2005, IVA (4.º trimestre de 2005 e 1.º trimestre de 2006 - declarações entregues sem meio de pagamento), IRS -retenções na fonte não entregues 2004 a 4/2006, no total de 22.782,91 €. Em conclusão, atendendo ao decurso do seu mandato, à data do facto gerador do imposto, como ao tempo da liquidação e/ou cobrança da dívida, foram identificados como gerentes os acima identificados, responsáveis subsidiários pelo pagamento da dívida tributária supra indicada ( ...) até 2006.04.20 (...) Face ao que foi referido, é de concluir, de acordo com a proposta de decisão e os elementos constantes do processo, que: d) A gerência de facto e de direito é de A.......... e de J........, para o período decorrente entre 2001.06.11 a 2006.04.20 (...) e) Como se pode comprovar pela Consulta ao Sistema Informático da D.G.C.I.- Declarações Cadastrais e Rendimentos, bem como ao Património, onde se constata pela inexistência de bens pertencentes à originária Devedora; f) De tal período de gerência são subsidiariamente responsáveis, por força do disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT E 153.º E 160.º DO C.P.P.T., pelas dívidas de: IRC 2005, IVA (4.º trimestre de 2005 e 1.º trimestre de 2006 - declarações entregues sem meio de pagamento), IRS -retenções na fonte não entregues 2004 a 4/2006, no total de 22.782,91 €. -A........ e J........ (...) Assim, Constatada a inexistência de bens da originária devedora, tendo com fundamento legal no disposto do artigo 153.º n.º 2 alínea a) do CPPT, ORDENO A REVERSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL, contra os subsidiários responsáveis: A.......... e J........, pelas dívidas supra indicadas no valor total de 22.782,91 € (...), e que está na base da instauração do Processo de Execução Fiscal n.º 3158200601017.... e aps, relativas aos seu períodos de gerência, excluídas as coimas fixadas em processos de contra-ordenação. Citações necessárias, considerando os efeitos e cominações constantes do artigo 160.º do C.P.P.T., que se explicitarão, e tendo em atenção o disposto no artigo 191.º n.º3 do mesmo código. (...)" [cfr. despacho a fls. 60-61 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido]; VI. Sendo certo que todos os elementos apontam no sentido em que a Oponente está a ser revertida no âmbito da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT. VII. Na douta petição afere no quesito 26.º “…nos termos do disposto no artigo 24.º n.º 1 alínea b), infine, da LGT”. VIII. Neste sentido e tendo em conta outros elementos probatórios junto aos autos afere-se que as dívidas tributárias objecto da presente lide se referem a impostos dos anos de 2004, 2005, e até 04/2006 pelo que, os argumentos aduzidos e relativos à cessão de quotas e renúncia à gerência, tendo em conta que se reportam a factos posteriores às dívidas em causa, são manifestamente despiciendos. IX. Por outro lado, na petição inicial (cfr. pontos de 1 a 4, 7, 16 e 23) é aceite o exercício da gerência por parte da oponente. Da sua leitura retira-se que foi efetivamente gerente da sociedade, tendo o seu mandato durado até 20-04-2006, data em que renunciou à gerência, tendo durante esse período subscrito documentos e assinado cheques, e efectuado pagamento a trabalhadores da sociedade. X. Todos estes actos em que a Oponente participou como representante da sociedade em documentos que vinculam a própria sociedade, perante terceiros, é por si só distintivo da gerência de direito, ou seja, é demonstrativo do exercício da gerência de facto. XI. Logo não se compreende que o Tribunal ”a quo” conclua que no despacho de reversão ao não incluir a alínea relativa à responsabilidade subsidiária, só por si seja suficiente para soçobrar todo o processado. XII. Até porque estando devidamente enumerados todos os elementos que circunscreveram o procedimento de reversão, seria um processo interpretação simples, chegar à conclusão que só poderia, de acordo com a interpretação de cada alínea, estar aqui considerada a alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT. XIII. Conclusão a que a Oponente chegou (quesito 26.º PI) conhecendo perfeitamente o itinerário cognoscitivo dos presentes autos. XIV. É entendimento jurisprudencial que apesar da omissão do normativo legal, como neste caso, não é invalidante do acto, conforme se extrai (entre outros: dos Acs. do S.T.A. de 28-02-02 Rec. n.º 48071, de 28-10-99, Rec. n.º 44051, de 08-06-98, Rec. n.º 42212, de 07-05-98, Rec. n.º 32694, e do Pleno de 27-11-96, Rec. n.º 30218) do douto acórdão proferido no processo n.º 05007/11 do Tribunal Central Administrativo do Sul de 22/11/2011. XV. Pelo que de acordo com tudo o que foi dito, não se vislumbra qualquer ilegalidade no despacho de reversão proferido contra ela. XVI. Destarte, no entender da Fazenda Pública, e sem embargo de melhor opinião, constata-se que a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito, porque não procedeu ao correto enquadramento da matéria de facto no disposto no artigo 24.º, n.º 1, b) da LGT, considerando existir falta de fundamentação do despacho de reversão, quando na realidade apenas existe uma omissão no preceito legal que é completamente inteligível e perceptível”. A Recorrida não apresentou contra-alegações. Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência. É a seguinte a questão a decidir: a) Há erro de julgamento em virtude de o despacho de reversão não padecer de falta de fundamentação? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “A) Encontra-se registada na 1.ª Conservatória do Registo Comercial de Loures a designação da Oponente e de J........ como gerentes da sociedade "C....... - S........, Lda.", NIPC 5055049..., de 11/06/2001 a 20/04/2006, sociedade que, à data, se obrigava com a intervenção de dois gerentes [cfr. certidão a fls. 52-55 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida]; B) O Serviço de Finanças de Loures 3 instaurou contra a sociedade "C....... - S........, Lda.", NIPC 5055049..., o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3158200601017...., ao qual foram apensados os processos n.º 3158200601018…, 3158200601042…, 3158200601045…, 3158200601048…, 3158200601050…, 3158200601055…, 3158200601063…, 3158200601079…, 3158200601080…, 3158200601087…, 3158200601089…, 3158200701001…, 3158200701007… e 3158200701010…, para cobrança coerciva de dívidas de IRC do exercício de 2005, de IRS dos exercícios de 2004 e 2006 e de IVA dos exercícios de 2005 (4.º trimestre) e 2006 (1.º trimestre), totalizando a quantia exequenda EUR 22.782,91 [cfr. lista descritiva a fls. 59 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida]; C) Por escritura celebrada em 20/04/2006, a Oponente cedeu a sua quota a J........ e renunciou à gerência da sociedade [cfr. escritura a fls. 17-20 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida]; D) Em 26/03/2008, a Oponente exerceu, através do instrumento de fls. 57 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, o direito de audição prévia sobre a preparação do referido processo para efeito de reversão contra ela da execução fiscal; E) Em 02/04/2008, o Chefe do Serviço de Finanças de Loures 3 proferiu despacho de reversão da execução fiscal contra a Oponente, do qual consta, nomeadamente, o seguinte: "(...) Através da análise do presente processo, constata-se a inexistência de bens pertencentes à originária devedora C........ LDA, NPC 5055049..., (...) que garantam o pagamento da dívida exequenda e acrescido, verificando-se, assim, a inexistência do património da executada para solver a dívida, pelo que nos termos do artigo 23.º n.2 da LGT e artigo 153º. n.º 2 do C.P.P.T., devem ser chamados à execução os responsáveis subsidiários. As informações oficiais prestadas e documentadas referem que: 1.º- A constituição da Sociedade foi matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Loures, sob o n.º 17541/20010... em 2001.06.11 2.º- A executada iniciou o exercício da sua actividade em 2001.06.11; 3. º- A executada não possui quaisquer bens, móveis ou imóveis, ou valores penhoráveis, pelo que não tem meios para proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido; 4.º- Verifica-se, desde logo, nos termos do art. 153.º, n. 2 alínea a) do CPPT, a inexistência do património da originária devedora para a satisfação da dívida. 5.º- No CONTRATO DE SOCIEDADE, Comercial, conforme a matrícula da Cons. Registo Comercial de Loures, ap 26/20010…, refere que designa como gerentes: 1.º A.......... (...) e 2° J........ (...), sendo a gerência da competência dos dois sócios ou não sócios, já designados, sendo a forma de obrigar a sociedade com a intervenção dos dois sócios. 6.º - Na data a que se reportam as dívidas e se refere o presente processo e apensos- Período 2005/2006, comprova-se que os citados gerentes se mantiveram em funções. 7.º- Assim, de acordo com o disposto nos artigos 23.º e 24. da LGT e 153. e 160.º do CPPT, podemos identificar como subsidiários responsáveis os Gerentes, A..........e J........, relativamente à referida firma, pela divida exequenda no período decorrente entre 2001.06.11 e 2006.04.20 que está na base da instauração do processo de execução fiscal n.º 3158200601017.... e apensos e que preenche o período da Administração e da dívida. A discriminar: IRC 2005, IVA (4.º trimestre de 2005 e 1.º trimestre de 2006 - declarações entregues sem meio de pagamento), IRS -retenções na fonte não entregues 2004 a 4/2006, no total de 22.782,91 €. Em conclusão, atendendo ao decurso do seu mandato, à data do facto gerador do imposto, como ao tempo da liquidação e/ou cobrança da dívida, foram identificados como gerentes os acima identificados, responsáveis subsidiários pelo pagamento da dívida tributária supra indicada ( ...) até 2006.04.20 (...) Face ao que foi referido, é de concluir, de acordo com a proposta de decisão e os elementos constantes do processo, que: a) A gerência de facto e de direito é de A.......... e de J........, para o período decorrente entre 2001.06.11 a 2006.04.20 (...) b) Como se pode comprovar pela Consulta ao Sistema Informático da D.G.C.I.- Declarações Cadastrais e Rendimentos, bem como ao Património, onde se constata pela inexistência de bens pertencentes à originária Devedora; c) De tal período de gerência são subsidiariamente responsáveis, por força do disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT E 153.º E 160.º DO C.P.P.T., pelas dívidas de: IRC 2005, IVA (4.º trimestre de 2005 e 1.º trimestre de 2006 - declarações entregues sem meio de pagamento), IRS -retenções na fonte não entregues 2004 a 4/2006, no total de 22.782,91 €. -A.......... e J........ (...) Assim, Constatada a inexistência de bens da originária devedora, tendo com fundamento legal no disposto do artigo 153.º n.º 2 alínea a) do CPPT, ORDENO A REVERSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL, contra os subsidiários responsáveis: A.......... e J........, pelas dívidas supra indicadas no valor total de 22.782,91 € (...), e que está na base da instauração do Processo de Execução Fiscal n.º 3158200601017.... e aps, relativas aos seu períodos de gerência, excluídas as coimas fixadas em processos de contra-ordenação. Citações necessárias, considerando os efeitos e cominações constantes do artigo 160.º do C.P.P.T., que se explicitarão, e tendo em atenção o disposto no artigo 191.º n.º3 do mesmo código. (...)" [cfr. despacho a fls. 60-61 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido]; F) Por ofício datado de 02/04/2008, remetido por via postal registada com aviso de receção, o Serviço de Finanças de Loures 3 levou ao conhecimento da Oponente, que recebeu, que esta era executada por reversão no PEF n.' 3158200601017.... e apensos, constando como "FUNDAMENTOS DA REVERSÃO " o seguinte: "A agora executada era realmente gerente de direito e de facto nas datas das dívidas, embora renunciasse posteriormente (em 2006.04.20) à gerência. Nada alega em sede de audição prévia que apoie o pedido de não reversão contra si. Não existindo bens penhoráveis da firma, é portanto à gerência que cabe a responsabilidade subsidiária. Segue despacho e fundamentação mais elaborados em anexo a este." [cfr. despacho a fls. 58 dos autos, que aqui se dá por integramente reproduzido]; G) Por ofício datado de 02/04/2008, remetido por via postal registada com aviso de receção, o Serviço de Finanças de Loures 3 levou ao conhecimento da Oponente, que recebeu, que esta era executada por reversão no PEF n.º 3158200601017.... e apensos, constando como "FUNDAMENTOS DA REVERSÃO " o seguinte: "Em anexo fotocópia despacho de decisão de reversão que inclui a fundamentação " [cfr. ofício a fls. 62 e registo postal e aviso de receção a fls. 63, ambas dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos]; Mais se provou que: H) Desde o ano letivo de 1997/1998 até 31/07/2003, a Oponente frequentou o curso superior de Gestão no Instituto Superior de Gestão (cfr. documentos a fls. 21-24 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos]; I) No ano letivo de 2003/2004, a Oponente concluiu o curso de pós-graduação em Fiscalidade no Instituto Superior de Gestão [cfr. certificado a fls. 26 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido]; J) Desde 02/01/2004 até, pelo menos, 05/05/2008, a Oponente exerceu funções na sociedade "F…….. – C……., S.A." ao abrigo de contrato de trabalho sem termo [cfr. declaração a fls. 25 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida].”. II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida: “Não há factos com relevância para a decisão da causa que importe dar como não provados”. II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: “A decisão da matéria de facto foi tomada com base no teor dos documentos constantes dos autos, não impugnados, conforme especificado em cada um dos pontos do probatório”. II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se em aditar a seguinte matéria de facto provada: K) Desde data não concretamente apurada, a oponente tinha uma relação de namoro com J....... . L) J....... dedicava-se à atividade de segurança. M) A oponente aceitou ser sócia da sociedade referida em A) em virtude da relação afetiva que tinha, à época, com J....... . N) A oponente, entre 1997 e 2003, dedicou-se exclusivamente aos estudos. O) A oponente, a partir de inícios de 2004, dedicou-se profissionalmente em exclusivo às funções que exercia junto da sociedade F....... - C......., SA (doravante F....... ) referidas em J). A convicção do Tribunal, quanto aos factos K) a O), fundou-se na prova testemunhal produzida. Concretizando, quanto aos factos K) a M), a convicção do Tribunal fundou-se no depoimento das testemunhas I....... e M......, ambos amigos da oponente desde a faculdade (sensivelmente desde 1997/1998), que se revelaram coerentes e convincentes, demonstrando conhecimento direto dos factos, tendo ambos conhecimento da relação de namoro que existia entre a oponente e J......., bem como de ter sido tal o fator determinante para a Recorrida aceitar, do ponto de vista formal, participar na constituição da sociedade referida em A), e ambos sabendo qual a atividade profissional deste J....... (aliás, a testemunha M......., a este respeito, referiu mesmo tê-lo encontrado em determinada altura no exercício de tais funções de segurança). No que respeita ao facto N), a convicção do Tribunal fundou-se no depoimento das mencionadas testemunhas, com a razão de ciência já referida, tendo afirmado que nunca a oponente trabalhou junto da devedora originária, tendo saído da faculdade diretamente para a F...... . No tocante ao facto O), a convicção do Tribunal fundou-se no depoimento quer das testemunhas I....... e M......, quer da testemunha M……, esta colega de trabalho da oponente desde 2004, que conheciam o tipo de funções que desempenhava naquela sociedade e que referiram ser apenas essa a sua atividade, até por questões de tempo e disponibilidade. III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.A. Do erro de julgamento Considera a Recorrente que incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, uma vez que, em seu entender, do teor do despacho de reversão resulta sanada a preterição de falta de indicação da norma legal em que o mesmo se encontra fundado. Vejamos. In casu, a dívida revertida respeita a impostos relativos aos anos/exercícios de 2004, 2005 e 2006. O dever de fundamentação do despacho de reversão insere-se no princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da CRP, nos termos do qual “os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”[1]. Ao nível dos atos tributários, encontra-se especificamente previsto no art.º 77.º da Lei Geral Tributária (LGT), cujos n.ºs 1 e 2 determinam que: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”. “A fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão…”[2], para que o respetivo destinatário consiga perceber o iter cognoscitivo e para que, por outro lado, seja possível o controlo, quer administrativo, quer jurisdicional, do ato em causa. Deve ser, pois, clara, expressa, congruente e suficiente, de maneira a esclarecer inteiramente o seu destinatário, cumprindo, dessa forma, o desiderato constitucionalmente consagrado. Sobre o alcance do dever de fundamentação do despacho de reversão, é de chamar à colação o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 16.10.2013 (Processo: 0458/13), onde se refere: “…[E]nquanto acto administrativo tributário, o despacho de reversão deva incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» - cfr. nº 4 do art. 23º da LGT. (…) Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT). Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT). Não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido…”. Para aferir do cumprimento do dever de fundamentação do despacho de reversão por parte do órgão de execução fiscal (OEF), cumpre atentar na disciplina aplicável in casu no que ao regime jurídico da reversão respeita. Assim, desde logo, há que considerar o disposto no art.º 23.º da LGT, de cujo n.º 1 decorre que é através da reversão que se efetiva a responsabilidade tributária subsidiária. Resulta deste mesmo art.º 23.º que a reversão depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor originário (n.º 2), sendo a este propósito de ter em consideração o disposto no n.º 2 do art.º 153.º do CPPT. Nos termos do n.º 4 do mesmo art.º 23.º da LGT, a reversão é precedida de audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação. Somos ainda remetidos para o art.º 24.º, n.º 1, da LGT, nos termos do qual: “1. Os administradores (…) e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação; b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”. À semelhança do que já decorria do art.º 13.º do CPT, o art.º 24.º, n.º 1, da LGT determina que a simples gestão de facto é suficiente para acionar a responsabilidade em causa, não sendo, por outro lado, suficiente a mera gerência ou administração de direito. O art.º 24.º da LGT demarca duas situações, nas duas alíneas do seu n.º1. A primeira, correspondente à sua al. a), refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções quer no momento de ocorrência do facto tributário, quer após este momento, mas antes do término do prazo de pagamento da dívida tributária, sendo esta responsabilidade pelo depauperamento do património social, de molde a torná-lo insuficiente para responder pelas dívidas em causa. A culpa exigida aos gerentes ou administradores, nesta situação, é uma culpa efetiva — culpa por o património da sociedade se ter tornado insuficiente. Não há qualquer presunção de culpa, o que nos remete para o disposto no art.º 74.º, n.º 1, da LGT, pelo que cabe à administração tributária (AT) alegar e provar a culpa dos gerentes ou administradores. A segunda, constante da al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções no período no qual ocorre o fim do prazo de pagamento ou entrega do montante correspondente à dívida tributária. No art.º 24.º, n.º 1, al. b), da LGT, presume-se que a falta de pagamento da obrigação tributária é imputável ao gestor. Assim, atentando na al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, o momento relevante a considerar é o do termo do prazo para pagamento voluntário. A presunção constante da referida al. b) do art.º 24.º, n.º 1, da LGT, deriva da consagração do dever de boa prática tributária, constante do art.º 32.º da LGT, que prevê “... um especial dever de diligência no cumprimento dos deveres tributários [das pessoas colectivas] (...) — dever de diligência que se presume violado caso tais deveres tributários não sejam cumpridos”[3]. Esta presunção de culpa é ilidível, cabendo ao gestor revertido o ónus de a ilidir. Feito este enquadramento legal, resulta que, do ponto de vista do cumprimento de dever de fundamentação formal do despacho de reversão, é exigido ao OEF que: a) Indique as normas legais que determinam a imputação da responsabilidade; b) Mencione o preenchimento dos pressupostos da reversão, a saber: b.1) Inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária (n.º 2 do art.º 23.º da LGT e n.º 2 do art.º 153.º do CPPT); b.2) O exercício efetivo do cargo nos períodos relevantes, dependendo do enquadramento da situação na alínea a) ou na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT; c) Mencione a sua extensão temporal. Vejamos então. In casu, como já referimos, o Tribunal a quo considerou padecer o despacho de reversão em causa de falta de fundamentação, em virtude de, do mesmo, não constar a expressa menção à alínea do n.º 1 do art.º 24.º da LGT ao abrigo da qual se entendia serem de reverter as dívidas quanto à Recorrida. Atento o enquadramento a que fizemos referência, a fundamentação do despacho de reversão abrange a fundamentação de direito. Quanto a esta, é jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo que, “para que a mesma se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível”[4]. Continua o mencionado aresto: “…só em casos muito particulares (…) se pode concluir que um acto se encontra fundamentado de direito apesar de nenhuma referência legal directa existir no texto do acto. E tal só acontece quando, como se explica naquele acórdão de 27/05/2003, se mostrem verificadas duas condições: // «- A primeira é a de que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto; // - A segunda é a de que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra. // A segunda condição não funciona sem a primeira, pois esta integra-a. Se não se sabe qual o quadro jurídico efectivamente tido em conta pelo acto, jamais pode ser realizada; e, por isso, é irrelevante que o destinatário possa saber, e até saiba qual, o quadro jurídico que deveria ter sido considerado.»”. Atentando nesta jurisprudência, a que se adere, cumpre verificar se, do teor do despacho de reversão, é possível aferir em qual das alíneas do n.º 1 do art.º 24.º da LGT se fundou o OEF, apesar da ausência da expressa menção a tal alínea. A resposta à questão que colocamos, no sentido de saber se resulta do despacho a alínea do n.º 1 do art.º 24.º da LGT em que o OEF se fundou é afirmativa. Com efeito, resulta do mencionado despacho que o OEF considerou que os potenciais revertidos, entre os quais a Recorrida, tinham exercido de facto funções de gerência entre 11.06.2001 e 20.04.2006 e que os mesmos se mantinham em funções na data a que reportam as dívidas. No mencionado despacho é, a este propósito, indicada a data da constituição da devedora originária, o facto de a Recorrida e J........ terem sido designados como gerentes no contrato de sociedade e o facto de, na perspetiva do OEF, esses mesmos gerentes manterem-se em funções na data a que se reportam as dívidas, sendo expressamente indicado o período em causa. Ali se refere, em jeito de conclusão: “atendendo ao decurso do seu mandato, à data do facto gerador do imposto, como ao tempo da liquidação e/ou cobrança da dívida, foram identificados como gerentes os acima identificados, responsáveis subsidiários pelo pagamento da dívida tributária supra indicada (...) até 2006.04.20”. Portanto, desde contexto, resulta que o OEF configurou a situação em causa como enquadrável na al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT. Sendo percetível esta configuração da leitura do despacho de reversão, o facto de não estar ali expressamente referida a mencionada alínea não fere o despacho em causa de falta de fundamentação. Como tal, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento nesta parte, motivo pelo qual assiste razão à Recorrente, o que conduz à revogação da sentença recorrida. Atento o explanado e considerando que o Tribunal a quo não conheceu as restantes questões invocadas pela oponente na sua petição inicial, e uma vez que se dispõe de todos os elementos necessários, passa-se ao seu conhecimento em substituição (art.º 665.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT). Assim, é a seguinte a questão a decidir em substituição, nos termos do disposto no art.º 665.º do CPC: a) A oponente nunca foi gerente de facto da devedora originária? III.B. Do não exercício da gestão de facto Alega a oponente que nunca exerceu efetivas funções de gestão junto da devedora originária, tendo apenas aceitado sê-lo de direito a pedido do seu então namorado (J.......) e tendo apenas pontualmente assinado alguns documentos a pedido também do mencionado J........ In casu, como referimos supra, o despacho de reversão proferido foi-o ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, ou seja, considerando os potenciais responsáveis à data do término do prazo para pagamento voluntário. Como se referiu anteriormente, o regime da responsabilidade tributária tem subjacente o exercício efetivo de funções por parte do gestor. Trata-se do ponto de partida de aplicação do regime, sendo que, depois de demonstrada a gestão de facto [cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário, de 28.02.2007 (Processo: 01132/06)], aplicar-seá, num segundo momento, a al. a) ou a al. b), do n.º 1 do art.º 24.º da LGT. Cabe à AT, desde logo e em primeira linha, o ónus da alegação e prova da efetiva gerência ou administração por parte dos revertidos. Essa prova da gestão de facto tem de ser evidenciada por referência a atos praticados pelos potenciais revertidos, suscetíveis de demonstrar tal efetividade do exercício de funções, entendendo-se como tal a prática de atos com caráter de continuidade, efetividade, durabilidade, regularidade, com poder de decisão e com independência das funções exercidas. Durante vários anos, prevaleceu o entendimento de que, demonstrada que fosse a gestão de direito, a AT beneficiaria de uma presunção de gestão de facto, cabendo, segundo este entendimento, ao revertido demonstrar não ter exercido efetivamente as referidas funções. Na sequência do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 28.02.2007 (Processo: 01132/06), operou-se uma alteração jurisprudencial, no sentido de que “… [a] presunção judicial não tem existência prévia, é um juízo casuístico que o julgador retira da prova produzida num concreto processo quando a aprecia e valora. (...) Ninguém beneficia de uma presunção judicial, porque ela não está, à partida, estabelecida, resultando só do raciocínio do juiz, feito em cada caso que lhe é submetido. (...) Do que se trata é de censurar a aplicação que fez de um regime legal, afirmando a existência de uma presunção judicial e retirando, maquinalmente, de um facto conhecido, outro, desconhecido, como se houvesse uma presunção legal, que não há; e afirmando a inversão do ónus da prova, quando tal inversão não ocorre, no caso, na falta de presunção legal”. Como tal, continua o referido Acórdão do Pleno: “Quando, em casos como os tratados pelos arestos aqui em apreciação, a Fazenda Pública pretende efectivar a responsabilidade subsidiária do gerente, exigindo o cumprimento coercivo da obrigação na execução fiscal inicialmente instaurada contra a originária devedora, deve, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, provar os factos que legitimam tal exigência. (…) [N]ada a dispensa de provar os demais factos, designadamente, que o revertido geriu a sociedade principal devedora. Deste modo, provada que seja a gerência de direito, continua a caber-lhe provar que à designação correspondeu o efectivo exercício da função, posto que a lei se não basta, para responsabilizar o gerente, com a mera designação, desacompanhada de qualquer concretização” (sublinhado nosso). Face a este entendimento, unânime na jurisprudência atual, a que se adere, decorre, como referido, que cabe, em primeira linha, à AT alegar e demonstrar que o revertido exerceu, nos termos consignados no n.º 1 do art.º 24.º da LGT, efetivas funções de gerência, entendidas como funções de gestão e representação da sociedade. (cfr., para as sociedades por quotas, os art.ºs 192.º e 252.º do Código das Sociedades Comerciais). Posto este enquadramento, cumpre apreciar o caso em concreto. Ora, no caso dos autos, desde logo se refira que do despacho de reversão não consta qualquer indicação sobre quaisquer elementos factuais relativos ao exercício das funções de gestora de facto por parte da oponente. Com efeito, como resulta de tal despacho, o mesmo limita-se a presumir esta gestão de facto a partir da gestão de direito. Não se pode extrair a gestão de facto da nomeação de gerente, pois que, como já referimos, a mesma não comporta uma presunção de gerência de facto nem tal pode ser extraído, por si só, das regras da experiência, que ditam a existência de inúmeras situações de nomeações de gerentes de cariz meramente formal – bastará atentar na inúmera jurisprudência sobre a matéria para se concluir nesse sentido. Assim, desde logo se refira que a AT, ao contrário do que era seu ónus, não alegou nem demonstrou sequer o exercício efetivo de funções de gerente por parte do oponente, em sede de despacho de reversão[5]. Por outro lado, e ao contrário do referido pela Recorrente, também não resulta que a Recorrida assuma a gestão de facto na sua petição inicial. Aliás, da análise desse articulado decorre precisamente o contrário, resultando alegado que a Recorrida nunca exerceu quaisquer funções de gestão da devedora originária nem tomou quaisquer decisões sobre a mesma, limitando-se a subscrever esporadicamente documentos que J....... lhe apresentava e a pedido deste, sendo que a FP a este respeito nada provou de concreto. Não se extrai, do mesmo modo, tal conclusão da mera circunstância de a devedora originária se obrigar, formalmente, com a assinatura de dois gerentes, quando nem sequer foi alegada qualquer factualidade no sentido de a Recorrida assinar documentos da sociedade de forma reiterada e evidenciadora do exercício de funções efetivas de gestão. A mera consagração, do ponto de vista formal, dessa forma de obrigação, desprovida de demonstração efetiva da prática de atos de gestão, nada prova em termos de exercício efetivo da gestão de facto. Em suma, cabendo à AT o ónus da prova do efetivo exercício de funções de gestão por parte da Recorrida e não tendo esta logrado proceder a tal prova, a oposição tem de proceder. Ademais, da prova produzida resultou que a Oponente sempre se dedicou, em exclusivo aos estudos e, posteriormente, à sua atividade profissional junto da F....... , o que permite extrair a conclusão de que não intervinha na gestão da devedora originária. Como tal, não se encontra preenchido o pressuposto previsto no n.º 1 do art.º 24.º da LGT, motivo pelo qual se verifica ilegitimidade da oponente. IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida; b) Em substituição, julgar procedente a oposição e, em consequência, julgar os PEF 3158200601017.... e apensos, extintos quanto à oponente; c) Custas pela Recorrente em ambas as instâncias; d) Registe e notifique. Lisboa, 14 de janeiro de 2020 (Tânia Meireles da Cunha) (Mário Rebelo) (Patrícia Manuel Pires) ---------------------------------------------------------------------------------- [1] Cfr. v.g. os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 12.07.2017 (Processo: 1305/14.9BELRA), de 25.05.2017 (Processo: 192/10.0BEALM), de 06.04.2017 (Processo: 456/13.1BELLE) e de 19.03.2015 (Processo: 06729/13). [2] Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, p. 676. [3] Isabel Marques da Silva, «A Responsabilidade Tributária dos Corpos Sociais», Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, p. 132. [4] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14/2/2013 (Processo: 0642/12). V., igualmente, os Acórdãos do mesmo Supremo Tribunal, de 17.04.2013 (Processo: 01191/12), de 12.02.2015 (Processo: 01860/13), de 08.04.2015 (Processo: 0345/14), de 25.03.2015 (Processo: 087/14), de 17.06.2015 (Processo: 0487/15). [5] Cfr. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 11.07.2019 (Processo: 1666/08.9BELRS), cuja questão apresenta grandes similitudes com a dos presentes autos. |