Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1318/12.5BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 01/14/2020 |
Relator: | ANA PINHOL |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL; CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO; DEFENSOR OFICIOSO; SUBSTITUIÇÃO; INTERRUPÇÃO DE PRAZO. |
Sumário: | I. A junção aos autos de documento comprovativo da entrega do pedido de escusa interrompe o prazo que estiver em curso (artigo 34.º, n.º 2 da Lei nº 34/2004, de 29/7), o qual só se reinicia com a notificação ao novo patrono nomeado da sua designação ou com a notificação do indeferimento do pedido (cfr. artigos 34.º, n.º 2, e 24.º, n.º 5, desse diploma). |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO
I.RELATÓRIO F.......... (a seguir Oponente ou Recorrente) recorre para o Tribunal Central Administrativo Sul da sentença por que a Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, com fundamento em caducidade do direito de acção, julgou improcedente a oposição por ela deduzida à execução fiscal n.º ..........82, instaurada no Serviço de Finanças de Odivelas contra a sociedade «L.........., LDA.», para cobrança coerciva da quantia de € 117.245,53, proveniente de dívidas de IVA e IRC dos anos de 2004, 2005 e 2006, e coima aplicada por falta de entrega de declaração periódica de IVA do 3.º trimestre de 2008, que reverteu contra ela por ter sido considerada responsável subsidiária por essas dívidas. A Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor: «I.tendo sido contestada a veracidade do alegado pela AT, requerida nos autos de oposição acima identificados, no que respeita à notificação à requerente do respectivo patrono oficioso, caberia à AT o ónus de demonstrar que tal notificação, de facto, ocorreu. ** Não foram apresentadas contra-alegações. ** ** II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não sendo lícito a este Tribunal “ad quem” conhecer de matérias nelas não incluídas (cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nº 1 e 608.º nº 2 do CPC, aplicável “ex vi” do artigo 2.º, alínea e) do CPPT), ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado. Neste quadro, a questão colocada à apreciação deste Tribunal é a de saber se a sentença fez correcto julgamento de facto e de direito, ao considerar caducado o direito de acção. ** A. DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos: «A)Por ofício de 26.04.2011 a ora Oponente foi notificada para afeitos de audição prévia com vista à reversão no âmbito do PEF ..........82, instaurado no Serviço de Finanças de Odivelas para cobrança coerciva da quantia de € 117.245,53, relativa a dívidas de IVA e IRC dos anos de 2004, 2005 e 2006, e coima por falta de entrega de declaração periódica de IVA do 3.º trimestre de 2008, de que é devedora originária a sociedade “L.........., LDA.” – cf. fls. 22/23 do PEF apenso. B)Em 18.05.2011 a ora oponente requereu apoio judiciários nas modalidades de dispensa de taxas de justiça e demais encargos com o processo e nomeação de patrono – cf. fls. 29/30 do PEF apenso e fls. 167 do suporte físico dos autos. C)Em 20.05.2011 foi apresentado do PEF identificado em A) pela aqui Oponente requerimento com vista à suspensão do prazo para efeitos e audição prévia, atento o pedido de apoio judiciário apresentado em 18.05.2011 – cf. fls. 28 do PEF apenso. D)A proteção jurídica referida em B) foi deferida por despacho de 01.06.2011 – cf. fls. 17 do suporte físico dos autos. E)Na sequência do despacho que a antecede, na mesma data, a Ordem dos Advogados procedeu à nomeação do Senhor Advogado, Dr. L.........., como patrono da ora oponente, tendo a referida nomeação sido comunicada à mesma por ofício de 01.06.2011 – cf. fls. 147 do suporte físico dos autos. F)Em 28.10.2011 a ora Oponente foi citada, na sequência de reversão, para o PEF identificado em A), sendo o valor da dívida exequenda de € 116.992,33 – cf. fls. 61 do PEF apenso. G)Em 22.11.2011 a ora Oponente requereu à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado em 01.06.2011, Dr. L.........., por outro, que indicou – cf. fls. 148 do suporte físico dos autos. H)Em 15.02.2012 a ora Oponente insistiu junto da Ordem dos Advogados no sentido da substituição do patrono nomeado em 01.06.2011, Dr. L.........., por outro, que indicou – cf. fls. 147 do suporte físico dos autos. I)Em 28.02.2012, o patrono nomeado, Dr. L.........., foi substituído, sendo nomeada, a Senhora advogada, Dra. C.......... – cf. fls. 147 e verso de fls. 162 do suporte físico dos autos. J)Na mesma data que antecede, 28.02.2012, quer a Oponente quer a ilustre patrona nomeada em substituição do Senhor Advogado Dr. L.........., foram notificadas da referida substituição – cf. verso de fls. 162 e fls. 163 do suporte físico dos autos. K)Em 30.03.2012 a petição inicial a que respeita a presente oposição foi enviada ao órgão de execução fiscal por correio registado – cf. fls. 18 do suporte físico dos autos. Factos não provados: 1)Que o pedido de substituição de patrono a que se referem as als. G) e H) dos factos provados tenha sido comunicada no PEF identificado em A). Fundamentação da matéria de facto: Os factos que antecedem foram considerados provados com base nos documentos referenciados em cada uma das respetivas alíneas. Quanto ao facto julgado não provado resulta de sobre o mesmo não ter sido produzida qualquer prova, mais resultando da alegação da oponente no requerimento de resposta à contestação que tal comunicação não foi efetuada.». ** Como se sabe, os erros de escrita ou de cálculo, ou qualquer inexactidão contida numa sentença, devido a omissão ou lapso manifesto, podem ser corrigidas pelo juiz a requerimento do interessado ou mesmo oficiosamente (cfr.artigo 614º do C.P.C). No caso concreto, por se tratar de um mero lapso de escrita, pode e deve ser corrigido logo que detectado, pelo que, onde se lê: J)Na mesma data que antecede, 28.02.2012, quer a Oponente quer a ilustre patrona nomeada em substituição do Senhor Advogado Dr. L.........., foram notificadas da referida substituição – cf. verso de fls. 162 e fls. 163 do suporte físico dos autos. Deve passar a ler-se: J)Na mesma data que antecede, 28.02.2012, quer a Oponente quer a ilustre patrona nomeada em substituição do Senhor Advogado Dr. L.......... foram notificadas da referida substituição – cf. verso de fls. 162 e fls. 163 do suporte físico dos autos. ** III. DO DIREITO A Recorrente discorda da sentença que julgou caducado o direito de deduzir oposição à execução fiscal por a mesma padecer de erro de julgamento de facto e de direito. A questão de saber se ocorreu ou não erro de julgamento de facto assume-se como prévia a tudo o mais, pois sem a fixação definitiva dos factos provados e não provados não é possível extrair as pertinentes consequências à luz do direito. Justificando-se, assim, por imperativo de ordem lógica que comecemos precisamente por aí. Neste particular, alega a Recorrente que a matéria de facto inscrita na alínea E), na parte em que dá como assente que a nomeação do Dr. L .......... foi «comunicada à mesma por ofício de 01.06.2011» deve ser retirada na factualidade assente, face à ausência de prova que a sustente. Considerando que a impugnação da matéria de facto foi efectuada pela Recorrente em obediência ao preceituado no n.º 1 do artigo 640.º do CPC, mostram-se reunidos os requisitos formais de admissibilidade do recurso nesta parte, interposto com vista à alteração da decisão de facto por este Tribunal Central Administrativo. Vejamos, então. O que está aqui em causa é determinar se do teor do documento junto a fls. 147 do processo físico se pode extrair a matéria de facto inscrita na última parte da alínea E) do probatório. Tal como a Recorrente, entendemos que daquele documento unicamente se retira que o Conselho Regional da Ordem dos Advogados no oficio remetido ao Tribunal de 1ª Instância informou que a nomeação do Dr. L.......... « à Senhora beneficiária, F.........., para efeitos de Instaurar Acção, no âmbito do Processo de Nomeação n.º ........../2011(…) foi notificada à Senhora beneficiária através do nosso Oficio n.º .......... –A, datado de 01/06/2011, enviado via CTT- Correio simples.». Assim, na procedência deste concreto fundamento de recurso a alínea E) da matéria de facto provada fica a ter a seguinte redacção: «E)Na sequência do despacho que antecede, na mesma data, a Ordem dos Advogados procedeu à nomeação do Senhor Advogado, Dr. L.........., como patrono da ora oponente.». Adita-se ao probatório a seguinte factualidade: L) O Conselho Regional da Ordem dos Advogados no oficio remetido ao Tribunal de 1ª Instância informou que a nomeação do Dr. L.......... « à Senhora beneficiária, F.........., para efeitos de Instaurar Acção, no âmbito do Processo de Nomeação n.º ........../2011(…) foi notificada à Senhora beneficiária através do nosso Oficio n.º .......... –A, datado de 01/06/2011, enviado via CTT- Correio simples.». (doc. fls. 147 do processo físico). Estabilizada a matéria de facto, avancemos para as demais questões que nos vêm colocadas. A sentença recorrida julgou procedente a excepção de extemporaneidade da oposição, com a consequente absolvição da Fazenda Pública do pedido, por sustentar que o prazo em curso não se interrompeu, porquanto a Recorrente não comunicou ao processo de execução o pedido de substituição de patrono a que se referem as alíneas G) e H) do probatório. A Lei nº 34/2004, de 29/7, com a alteração dada pela Lei 47/2007, de 28 de Agosto, procedeu à alteração do regime de acesso ao direito e aos tribunais, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios. Sobre a notificação da decisão proferida quanto ao pedido de protecção jurídica rege o artigo 26.º, n.º 1, da Lei de Apoio Judiciário, estabelecendo que «[a] decisão final sobre o pedido de protecção jurídica é notificada ao requerente, e se o pedido envolver a designação de patrono, também à Ordem dos Advogados». Em anotação a este normativo o Conselheiro SALVADOR DA COSTA observa que «[a] primeira daquelas notificações é, naturalmente, inerente ao direito à informação do requerente sobre o decidido em relação ao que requereu, a fim de poder exercer os direitos e vinculações emergentes. A razão de ser da notificação da decisão final em causa à Ordem dos Advogados (…), tem a ver com o facto de aquela entidade dever decidir sobre a respectiva nomeação» (O Apoio Judiciário, 9.ª edição actualizada e ampliada, Almedina 2013, pág. 165). Quanto à notificação da nomeação de patrono a este e ao Requerente, dispõe o artigo 31.º da Lei do Apoio Judiciário, que: «1. A nomeação de patrono é notificada pela Ordem dos Advogados ao requerente e ao patrono nomeado e, nos casos previstos no n.º 4 do artigo 26.º, para além de ser feita com a expressa advertência do início do prazo judicial, é igualmente comunicada ao tribunal. 2. A notificação da decisão de nomeação do patrono é feita com a menção expressa, quanto ao requerente, do nome e escritório do patrono bem como do dever de lhe dar colaboração, sob pena de o apoio judiciário lhe ser retirado». (negrito da nossa autoria) No caso vertente, tendo a Ordem dos Advogados na sequência do formulado pedido de nomeação de patrono remetido carta simples para informar da nomeação de advogado, não obstante a Recorrente tenha alegado que a não recebeu, há que reconhecer que, pelo menos, desde 22.11.2011, que tinha conhecimento da nomeação do patrono nomeado, pois que foi nesta precisa data que requereu a respetiva substituição. O artigo 32º, nº 1, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, permite ao beneficiário do apoio judiciário, a possibilidade de, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido. No caso concreto, estamos perante uma situação que exige a interpretação do artigo 32.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, com a alteração que lhe foi dada pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, que tem a seguinte redacção: «1. O beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido. 2. Deferido o pedido de substituição, aplicam-se, com as devidas adaptações, os termos dos artigos 34.º e seguintes. 3. Se a substituição do patrono tiver ser requerida na pendência de um processo, a Ordem dos Advogados deve comunicar ao tribunal a nomeação do novo patrono” Nos termos do artigo 34.º, n.º2 da citada Lei : «O pedido de escusa, formulado nos termos do número anterior e apresentado na pendência do processo, interrompe o prazo que estiver em curso, com a junção dos respectivos autos de documento comprovativo do referido pedido, aplicando-se o disposto no n.º 5 do artigo 24.º». Neste quadro, temos como seguro que a junção aos autos de documento comprovativo da entrega do pedido de escusa interrompe o prazo que estiver em curso (artigo 34.º, n.º 2 da Lei nº 34/2004, de 29/7), o qual só se reinicia com a notificação ao novo patrono nomeado da sua designação ou com a notificação do indeferimento do pedido (cfr. artigos 34.º, n.º 2, e 24.º, n.º 5, desse diploma). É verdade que o pedido de substituição não foi comunicado ao processo de execução fiscal. Porém, o tribunal tomou conhecimento de que em 22.11.2011, a Recorrente requereu a substituição do patrono nomeado. E, por isso, deverá entender-se que, com a junção do deferimento da substituição, ocorreu também a junção de documento comprovativo do pedido de substituição, susceptível de, nos termos do artigo 34º, nº 2 e 3 da Lei nº 34/2004, aplicável com as devidas adaptações, por força do artigo 32.º, nº 2 da mesma lei, fazer interromper o prazo iniciado em 29.10.2011 se interrompeu em 22.11.2011 e voltou a correr a partir de 29.02.2012 (Neste sentido vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 07.02.2017, proferido no processo n.º 726/15.7T8CBR-A.C1, disponível em texto integral em www.dgsi.pt). O que significa que, quando a petição inicial foi apresentada em 30.03.2012, o prazo de 30 dias (cfr. artigo 203.º, n.º1, al. a) do CPPT) ainda se encontrava em curso. Por isso, há que revogar a sentença recorrida que em contrário decidiu. Aqui chegados, haverá, ainda, que indagar se, de acordo com o artigo 665.º, aplicável nos termos do artigo 2º, alínea e) do CPPT, se no presente processo se poderá exercer a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, quanto ao mérito da oposição, ainda que a sentença recorrida a não haja apreciado, por ter considerado procedente a excepção de caducidade do direito de acção. Contudo, não é possível a este Tribunal apreciar o fundo da causa, pois que, para além da total omissão, pelo tribunal “a quo”, da fixação da matéria de facto pertinente à pronúncia de mérito, foi dispensada a produção da prova testemunhal requerida. Termos em que não é possível conhecer do objecto da oposição à execução, em substituição do Tribunal de 1ª Instância resultando a necessidade de os autos serem instruídos, nomeadamente através da produção de prova testemunhal e demais diligências que se afigurem úteis na decorrência daquela. IV.CONCLUSÕES I. A junção aos autos de documento comprovativo da entrega do pedido de escusa interrompe o prazo que estiver em curso (artigo 34.º, n.º 2 da Lei nº 34/2004, de 29/7), o qual só se reinicia com a notificação ao novo patrono nomeado da sua designação ou com a notificação do indeferimento do pedido (cfr. artigos 34.º, n.º 2, e 24.º, n.º 5, desse diploma). V.DECISÃO Termos em que, face ao exposto, os juízes da 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo, acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar o regresso dos autos à 1.ª Instância, a fim de aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar. Custas a cargo da Recorrida. Lisboa, 14 de janeiro de 2020 [Ana Pinhol] [Isabel Fernandes] [Catarina Almeida e Sousa] |