Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1097/09.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/26/2025
Relator:CRISTINA COELHO DA SILVA
Descritores:SISA – AJUSTE REVENDA – ÓNUS PROVA – VALOR TRIBUTÁVEL – AUDIÊNCIA PRÉVIA.
Sumário:I – Por força do preceituado no § 2.º do artigo 2.º do CIMSISD os ajustes de revenda estão sujeitos a imposto de Sisa. Desta mesma disposição resulta que ocorreram duas transmissões relevantes para efeitos deste imposto, a saber: uma primeira do promitente-comprador originário para o cedente e uma segunda do promitente-vendedor para o cessionário que ocorre no momento da celebração do contrato definitivo.

II – Nestas situações presume-se que existiu uma tradição jurídica do bem para o promitente-comprador que cede a sua posição contratual a um terceiro.

III – Tratando-se de normas de incidência tributária, a presunção constante do mencionado preceito é uma presunção juris tantum, por força do disposto no artigo 73º da LGT.

IV- Em consequência, impende sobre o sujeito passivo, prominente comprador e cedente, o ónus da prova de que não existiu entre si e o terceiro com quem a escritura de compra é realizada um ajuste de revenda, por força do disposto no artigo 74º da LGT e 342º do Código Civil.

V – Em face do disposto no artigo 19ª, § 2° do CIMSISSD que, fora dos casos previstos no § 1°, o imposto de Sisa incide sobre o preço convencionado pelos contratantes ou o valor patrimonial tributário fixado, se for maior. Assim sendo, o valor a considerar para efeitos de cálculo do imposto devido não revela o valor do sinal que foi restituído ao cedente, mas o valor de alienação do bem que consta do contrato prometido.

VI – Tal circunstância não viola o Princípio da Capacidade Contributiva, desde logo, porque em sede de impostos sobre o património essa capacidade é revelada pelo valor do bem adquirido.

VII – Não ocorre a violação da audiência prévia quando ao sujeito passivo são comunicados os elementos fundamentais que estão na origem da liquidação oficiosa.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:*
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul



I – RELATÓRIO

P …………………., melhor identificado nos autos, deduziu impugnação judicial contra o ato de liquidação de Imposto Municipal de Sisa, notificado pelo ofício de 04.03.2009, no valor de € 20.146,45 e respetivos juros compensatórios, perfazendo a quantia global de € 27.301,47.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença de 13 de dezembro de 2018, julgou a impugnação improcedente.



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Inconformado com a decisão, o Impugnante, ora Recorrente, interpôs recurso da mesma, tendo formulado na sua alegação as seguintes conclusões:

A. O Recorrente foi notificado pelo Ofício nº 000940 de 04/03/2009 relativo à liquidação do Imposto Municipal de SISA do ato de Liquidação do Imposto de SISA consubstanciado no Ofício 7777 de 30/01/2009 da DFLX - Divisão de Processos Criminais e Fiscais, entr. 1170 de 002/02/09, no qual foi liquidado o Imposto Municipal de SISA de 20.146,45 Eur, e 7.155,02 Eur de juros compensatórios;

B. Não concordando com a liquidação o recorrente impugnou com os seguintes fundamentos: (i) a errónea, como tal, ilegal, qualificação do facto tributário; (ii) a errónea quantificação da matéria coletável; e (iii) a preterição de uma formalidade essencial, consubstanciada, na denegação do direito de audição previa e participação na formação dos atos tributários; constantes das alíneas o) e d) do artigo 99.° do CPPT.

C. Sobre a errónea qualificação do facto tributário, a norma de incidência que fundamenta o ato impugnado - § 2.° do art. 2.° do CIMSISSD - não é aplicável ao caso concreto.

D. A ratio legis que subjaz a este preceito normativo é o de evitar a fraude no pagamento do Imposto de SISA, mediante um alargamento da sua incidência, o qual permite que se tribute atos negociais que, embora, em termos civilísticos não constituam uma transmissão de bens imóveis, têm, no entanto, esse efeito económico.

E. A verdadeira intenção do promitente-comprador teria que ser a de realizar um investimento imobiliário, o qual seria financeiramente benéfico: como o contrato de promessa de compra e venda não acarreta a transmissão de um imóvel, estaria fora do âmbito de incidência da SISA.

F. De facto, para estar perante um ajuste de revenda visado pelo no § 2 do art. 2.° do CIMSISSD, são necessários os seguintes elementos: a) a intenção do promitente- comprador de não ficar com o imóvel; B) a possibilidade de transmissão da posição contratual de promitente-comprador a terceiro, sem dependência de oposição ou autorização do promitente-vendedor.

G. A realidade económica, a realidade jurídica e toda a materialidade subjacentes a este caso não possibilitam a respetiva subsunção na norma de incidência, na medida em que o Recorrente adquiriu o direito à compra do imóvel em causa tendo exclusivamente em vista a habitação própria e permanente da fração autónoma que viesse a ser construída, para si e para o seu agregado familiar, tendo vindo a desistir da referida aquisição por considerar que a construção que estava a ser levada a cabo não correspondia aos padrões de qualidade que queria, e que o comportamento dos promotores do empreendimento não eram consentâneos com os seus princípios.

H. Tudo isto foi atestado pelas testemunhas inquiridas: C ……………. e J …………………….., a primeira amiga de longa data do Recorrente, e a segunda sua esposa, ambas tendo declarado perante o Tribunal e sem qualquer dúvida ou hesitação que a perspetiva de o Recorrente comprar uma fração autónoma no empreendimento em causa se baseava apenas no desejo pessoal de se estabelecer com a sua família numa casa melhor a construir naquela zona, onde já residia e de que gostava muito, tendo referido o facto de estar inserido num condomínio fechado como um fator determinante para a melhoria da situação habitacional.

I. Mais foi referido por ambas as testemunhas que a construção do empreendimento se deu de forma muito rápida, tendo a testemunha J …………………. especificado que acompanhou com o Recorrente quase diariamente o crescimento da obra, através de visitas muito regulares, dada a proximidade da casa em que habitavam e da obra, e que nessas visitas puderam verificar que, para além do crescimento muito rápido, os métodos de construção utilizados não eram os melhores, de acordo com os comentários feitos pelo Recorrente nessas visitas, que espelhavam a respetiva opinião técnica sobre a obra, avalizada pelo facto de ser um profissional do ramo.

J. Para além da falta de rigor técnico, foi também referido por ambas as testemunhas, embora sem concretizações, que existiu algum desconforto entre o Recorrente e os promotores do empreendimento, mas cujas razões de facto não conseguiram apontar uma vez que nunca assistiram às conversas entre eles.

K. Ambas as testemunhas disseram que todos os escritos contratuais que enformaram as operações em causa foram redigidos pelos promotores imobiliários, de acordo com um método próprio utilizado para angariação e venda, sem que o Recorrente (nem qualquer outra pessoa que com eles contratasse) pudesse alterar os respetivos termos, do que decorre que a falta de previsão do consentimento do promitente-vendedor para uma eventual futura cessão da posição contratual não é imputável ao Recorrente, nomeadamente por este ter posto a hipótese de realizar um ajuste de revenda.

L. Mais: ambas as testemunhas disseram que o Recorrente não conhecia o cessionário da posição contratual e que foram os promotores do empreendimento que o angariaram e diligenciaram no sentido da formalização do negócio, quando o Recorrente lhes manifestou a sua intenção de desistir da aquisição da futura fração autónoma.

M. Também testemunharam terem ideia de que o Recorrente apenas se limitou a reaver o montante do sinal pago aquando da cessão da posição contratual, não tendo obtido qualquer vantagem económica com essa cessão, não se podendo vislumbrar no mesmo qualquer ato de especulação imobiliária, o que resulta igualmente provado documentalmente dos autos.

N. Assim, o ato de liquidação está viciado de um erro nos pressupostos de direito por ter sido feita errada interpretação ou aplicação da norma legal que determina a incidência do imposto, ilegalidade arguível como fundamento de impugnação ao abrigo do disposto no art. 99.° al. a) do CPPT, e que determina a anulabilidade do ato impugnado.

O. Quanto à errada quantificação do facto tributário, há a constatar existir uma flagrante violação do princípio da igualdade fiscal manifestada no conceito de capacidade contributiva presente nos artigos 13.° e 103.° da Constituição da República Portuguesa, e ainda no art. 4.° n.° 1 da LGT.

P. A administração tributária considerou como matéria tributável € 201.464,47, ou seja, o valor do contrato definitivo previsto, sendo que o Recorrente pagou apenas a quantia de 20,146.45 Eur, a título de sinal e princípio de pagamento do preço, e esse foi precisamente o valor que recebeu pela cessão da sua posição contratual.

Q. Nos termos do artigo 19°, § 2°, do CIMSISSD, o valor da SISA a pagar pela operação em causa seria apurado com base no valor do contrato ou no valor patrimonial do imóvel, consoante o que for maior, sendo que o valor do contrato de cedência é de 20,146.45 Eur e o valor patrimonial do imóvel é de 66.799,01 Eur.

R. A tributação teria que incidir sobre matéria tributável que correspondesse à capacidade contributiva demonstrada pelo ora Recorrente, pelo que surge como manifestamente chocante e violador do princípio da capacidade contributiva que, num caso em que o promitente-comprador entregou um montante de 20,146.45 Eur a título de sinal, correspondendo ao mesmo valor que recebeu pela cessão da posição contratual, venha a ser tributado pelo valor de um contrato que não celebrou - o contrato definitivo de compra e venda do imóvel - ou até mesmo pelo valor patrimonial de um imóvel de que nunca foi proprietário ou chegou a dispor.

S. A capacidade contributiva demonstrada foi, portanto, a quantia que o Recorrente pagou ao abrigo do contrato de promessa, a título de sinal, pelo que deve ser esta a quantia correspondente à matéria coletável para efeitos de liquidação da SISA eventualmente devida.

T. Se assim não se considerasse, sempre teria que se concluir que a matéria coletável a considerar seria a correspondente ao valor patrimonial do imóvel, uma vez que o valor do contrato em causa é inferior, sob pena de violação do disposto no artigo 19°, § 2°, do CIMSISSD.

U. Assim, a recorrente reitera a impugnação do ato de liquidação com fundamento na sua ilegalidade, ao abrigo do disposto no art. 99.° al. o) do CPPT, na parte em que prevê como fundamento da impugnação a "(...) Erróneo (...) quantificação de valores patrimoniais (...)", o que determina a respetiva anulabilidade.

V. Quanto à preterição de formalidade essencial, no caso concreto, existiu uma manifesta violação do direito de audição prévia que assistia ao Recorrente, nos termos do disposto no art.° 60.°, n.°4, da LGT, bem como no art.° 268.°, n.° 1 e n.° 3, da Constituição da República Portuguesa, com violação conexa do disposto no art.°125 do Código de Procedimento Administrativo e no art.° 36.° n.° 2 do CPPT.

W. De facto, a notificação que o instava para o exercício desse direito não tinha fundamentação adequada para o propósito que visava: não havia menção ao montante de imposto a pagar, à matéria coletável, à taxa de imposto que sobre esta iria incidir valor da liquidação, nem à demonstração do cálculo do imposto a pagar.

X. A situação descrita é agravada pelo facto do Recorrente ter reclamado desta falta de fundamentação, a qual lhe impossibilitava o exercício do seu direito de audição prévia e ter solicitado que lhe fossem fornecidos elementos adicionais que lhe permitissem exercer tal direito, sem que tal pretensão tivesse sido atendida, em manifesta violação do disposto no art.° 37.° n.°1 do CPPT.

Y. Ou seja, o ato impugnado encerra em si a decisão de convolação do projeto de decisão que não foi submetido a prévia apreciação do Recorrente em decisão definitiva, apesar do interesse demonstrado pelo Recorrente em realizar tal pronúncia.

Z. A preterição do direito de audição prévia no caso concreto consubstancia uma ilegalidade que é fundamento da impugnação ao abrigo do disposto no art. 99.° al. d), e que determina a anulabilidade do ato impugnado, ao contrário do decidido em sede de Sentença ora recorrida.
Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao Recurso interposto pelo ora Recorrente, por provado, e, em consequência, ser revogada a douta Sentença recorrida, com as legais consequências, fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA!..

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A Recorrida, Fazenda Pública, devidamente notificada, não apresentou contra-alegações.

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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colheram-se os vistos dos Juízes Desembargadores adjuntos.

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DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, em consonância com o disposto no art. 635º do CPC e art. 282º do CPPT, são as conclusões apresentadas pelo recorrente nas suas alegações de recurso, a partir da respetiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer, ficando, deste modo, delimitado o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem.

No caso que aqui nos ocupa, as questões a decidir consistem em saber se a sentença recorrida enferma de:
- erro de julgamento de facto e de direito, por não ter relevado a prova que fez nos autos da razão pela qual cedeu a sua posição contratual e por ter julgado que a cessão da posição contratual efetuada pelo recorrente, relativamente ao contrato-promessa de compra e venda de imóvel em que intervinha como promitente-comprador, representa um ajuste de revenda, que implica uma tradição, e, por isso, está sujeita ao pagamento da sisa, nos termos do § 2º do artigo 2º do CIMSSD.
- erro de julgamento de Direito ao ter considerado que o ato não se encontrava ferido dos vícios de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, designadamente quanto ao valor de incidência do imposto.
- erro de julgamento de Direito por não ter considerado violado o Princípio da Igualdade, na sua vertente da capacidade contributiva e
- erro de julgamento de Direito ao ter considerado que não violado o direito de audiência prévia.


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II – FUNDAMENTAÇÃO
- De facto
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
“A) Em 29 de Abril de 1999, foi celebrado entre «P................. - Investimentos …………. Lda.», na qualidade de promitente-vendedora, e o ora impugnante, na qualidade de promitente-comprador, “Contrato Promessa de Compra e Venda”, do qual se extraem, com relevo, as seguintes cláusulas:
“SEGUNDA
(Promessa de Compra e Venda)
1. Pelo presente contrato promessa a PRIMEIRA OUTORGANTE promete vender ao SEGUNDO OUTORGANTE, e este comprar, livre de ónus, hipotecas ou quaisquer encargos, a fracção autónoma sita no Rés-do-chão à cota 12.00, designada por Rés do-Chão T2-C, que inclui uma arrecadação com o n° 1 sita no Piso -2 à cota 5.60, bem como um lugar de estacionamento automóvel duplo com o número 1 sito no Piso -2 à cota 5.60, do prédio a edificar no Lote A4, tudo melhor descrito e identificado nas plantas juntas ao presente contrato, com as áreas e configuração aí constantes e que após rubricadas por ambos os outorgantes, ficam fazendo parte integrante deste para todos os efeitos legais.
2. As características do edifício a construir e os acabamentos da referida fracção autónoma respeitam respectivamente o projecto de arquitectura aprovado e as características patentes, na data da assinatura do contrato, na sala de exposições relativa ao empreendimento imobiliário onde a referida fracção se inclui, e ao mapa de acabamentos anexo ao presente contrato.
TERCEIRA
(Preço e Condições de Pagamento)
O preço global da fracção prometida vender é de Esc.: 40.390.000$00 (quarenta milhões trezentos e noventa mil escudos) e será pago da seguinte forma:
a) Esc.: 4.039.000$00 (quatro milhões e trinta e nove mil escudos), nesta data a título de sinal e princípio de pagamento, pelo qual a PROMITENTE VENDEDORA dá ao PROMITENTE COMPRADOR a respectiva quitação;
(...)
SÉTIMA
(Cessão de Posição Contratual)
A posição contratual e os direitos previstos no presente contrato podem ser cedidos ou transferidos pelo PROMITENTE COMPRADOR até 30 (trinta) dias antes da data da celebração da escritura de compra e venda e processar-se-á do seguinte modo:
a) O PROMITENTE COMPRADOR deverá comunicar por escrito à PROMITENTE VENDEDORA a sua intenção de ceder a posição contratual no presente contrato, bem como a indicação da entidade que lhe sucederá no mesmo;
b) No prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da data da recepção da comunicação referida no número anterior, a PROMITENTE VENDEDORA elaborará o correspondente Contrato de Cessão de Posição contratual a favor da entidade que viera ser indicada, o qual será assinado por todas as partes envolvidas, no qual esta última assumirá expressamente a obrigação de cumprir com todas as cláusulas e condições que tiverem sido contratualmente acordadas, entre a PROMITENTE VENDEDORA e o PROMITENTE COMPRADOR.” (cfr. doc., a fls. 71 a 79 dos autos);

B) Em 22 de Junho de 1999, foi celebrado entre o ora impugnante, primeiro outorgante, e P …………………., segundo outorgante, e «P................. - Investimentos Imobiliários Lda», terceira outorgante, “contrato de cessão de posição contratual”, do qual, constam, com interesse para a causa, as seguintes cláusulas:
“1ª
Em 28 de Abril de 1999 foi celebrado entre os PRIMEIROS OUTORGANTES e a TERCEIRA OUTORGANTE o Contrato Promessa de Compra e Venda da fracção autónoma do Lote A4, que vier a corresponder ao apartamento do tipo T2, provisoriamente identificado por R/C T2-C sito no Piso R/C, que inclui uma arrecadação com o n° 1 sita no Piso -2 à cota 5.60, bem como um lugar de estacionamento automóvel duplo com o número 1 sito no Piso -2 à cota 5.60, todos localizados no empreendimento denominado “I ………………. - Condomínio” sito à Rua …………….., em Lisboa, freguesia de …………………., composto por terreno para construção designado por Lote A4, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sobre o n° …………….

Nesta data, os PRIMEIROS OUTORGANTES cedem, livre de quaisquer ónus ou encargos, ao SEGUNDO OUTORGANTE, a sua posição de Promitentes Compradores do apartamento acima citado no Contrato Promessa de Compra e Venda referido na Cláusula ia deste contrato pelo valor total de Esc.: 40.390.000$00 (quarenta milhões trezentos e noventa mil escudos), a serem pagos da seguinte forma:
a) Nesta data o SEGUNDO OUTORGANTE entrega aos PRIMEIROS OUTORGANTES a quantia de Esc.: 4.039.000$00 (quatro milhões e trinta e nove mil escudos), a título de pagamento da cedência da posição contratual, quantia em relação à qual os PRIMEIROS OUTORGANTES dão a respectiva quitação após a boa e efectiva cobrança;
b) A quantia restante de Esc.: 36.351.000$00 (trinta e seis milhões trezentos e cinquenta e um mil escudos), será paga pelo SEGUNDO OUTORGANTE à TERCEIRA OUTORGANTE, de acordo com o Contrato Promessa de Compra e Venda celebrado entre os PRIMEIROS OUTORGANTES e a TERCEIRA OUTORGANTE.

O SEGUNDO OUTORGANTE, ao tomar a posição dos PRIMEIROS OUTORGANTES aceitam na íntegra todo o clausulado do Contrato Promessa de Compra e Venda anexo ao presente contrato e que, após rubricado pelas partes, dele fica fazendo parte integrante, para todos os efeitos legais.

A TERCEIRA OUTORGANTE aceita a cessão da posição contratual dos PRIMEIROS OUTORGANTES para o SEGUNDO OUTORGANTE” (cfr. doc., a fls. 84 a 88 dos autos);

C) Em 20 de Junho de 2001, foi outorgada no 5° Cartório Notarial de Lisboa escritura de “Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca”, celebrada entre «P................. - Investimentos …………. Lda», primeiro outorgante, P …………………, segundo outorgante, e «Banco …….. SA», terceiro outorgante, da qual se extrai, designadamente, o seguinte teor:
Pela primeira outorgante foi dito: que pela presente escritura e pelo preço de CATORZE MILHÕES DE ESCUDO (...) vende a fracção autónoma designada pela letra “C”, que corresponde ao rés-do-chão letra C, destinada a habitação, do prédio urbano sito na Rua ………………, lote A quatro, freguesia de ………….., concelho de ………. (...)” (cfr. doc., a fls. 14 a 20 do PAT apenso aos autos);

D) Pelo ofício n° 000566, de 5 de Fevereiro de 2009, do Serviço de Finanças de Lisboa 7, com o assunto “Cedência de posição contratual - liquidação do Imposto Municipal de Sisa”, foi o impugnante notificado para exercer o direito de audição prévia, constando do identificado ofício o seguinte teor:
“Fica notificado nos termos do art. 60º da Lei Geral Tributária para, no prazo de oito dias contados de acordo com o art. 39º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (3° dia posterior ao do registo ou 1° dia útil seguinte quando esse dia não seja útil), exercer por escrito o direito de audição prévia com referência à cedência de posição contratual que efectuou do R/C C - Lote A4 do prédio sito na Rua ............. Dias, n° 120, em Lisboa, actualmente inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Santa Maria de Belém sob o artigo 2696 - "C", do qual celebrou contrato promessa de compra e venda com a P................. - INVESTIMENTOS …………. LDA, NIPC. …………….., em 1999/04/29 pelo preço de € 201.464.47.
Verifica-se, porém, que a Escritura de Compra e Venda da referida fracção foi celebrada em 2001/06/20, no 5° Cartório Notarial de Lisboa, entre a P................. E P …………….., NIF. …………., o que configura um ajuste de revenda, conforme previsão do § 2° do artigo 2° do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto de Sucessões e Doações, pelo que o imposto deveria ter sido pago nos 30 dias subsequentes aquela escritura, em obediência ao disposto no n° 4 do art. 115° do já citado código.” (cfr. doc., a fls. 89 dos autos);

E) Por requerimento de 19 de Fevereiro de 2009, o impugnante respondeu ao ofício parcialmente transcrito na alínea antecedente, nos seguintes termos:
“Acusamos a recepção do V/oficio n° 0566 de 2009.02.05 para efeitos de audição prévia.
Sucede, porém, que o V/ofício não continha qualquer projecto de decisão, nem tão pouco a respectiva fundamentação, caso os mesmos existam.
Ou seja, V. Exas., na notificação sob oposição, não deram cumprimento à imposição legal contida no n° 5 do art. 60° da LGT.
Assim sendo, é objectivamente impossível ao exponente poder pronunciar-se sobre uma eventual decisão (incluindo a respectiva fundamentação) que o mesmo desconhece, não lhe foi notificada em violação do referido dispositivo legal e cuja efectiva existência não se pode deixar de questionar.
Neste contexto, impõe-se que seja dado cumprimento cabal ao supra referido normativo legal de modo a que seja assegurado o regular exercício, pelo exponente, dos direitos inalienáveis que lhe assistem em sede de audição prévia.
Acresce a todo o exposto, e porventura mais importante do que se referiu, que o presente procedimento deve ser arquivado liminarmente na medida em que o alegado direito à liquidação do imposto municipal de SISA, a existir, simplesmente já prescreveu/caducou, por força do decurso do prazo legal para o efeito.” (cfr. doc., a fls. 93 dos autos); 

F) Em 3 de Março de 2009, foi elaborada pelo Serviço de Finanças de Lisboa 7, informação com o seguinte teor, em transcrição parcial:
“Tendo em conta os fundamentos invocados em sede de audição prévia e com vista à decisão definitiva em sede de liquidação de SISA, cumpre-me informar:
7.De acordo com a norma de incidência objectiva estabelecida no art. 2° do CIMSISD, a sisa incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis.
8. Consideram-se, para esse feito, transmissões de bens nomeadamente, “as promessas de compra e venda ou de troca de bens imobiliários, logo que verificada a tradição para o promitente comprador ou para os promitentes permutantes, ou quando estes estejam usufruindo os bens” - cf. Art. 2°, § 1°, regra 2a do CIMSISD.
9.Estabelece o § 2° do art. 2° do CIMSISD que “Nas promessas de compra e venda entende-se também verificada a tradição se o promitente comprador ajustar a revenda com um terceiro e entre este e o primitivo promitente vendedor for depois outorgada a escritura de venda.”
10.De facto o art. 2°, § 2° do CIMSISD tem por finalidade alargar a incidência do imposto de sisa a situações de revenda ou agenciação de bens alheios feita pelo promitente comprador ao negociar a sua posição contratual, entendendo-se que se dá, nestas circunstâncias, uma tradição do imóvel, embora aquele não intervenha na escritura, uma vez que a sua intervenção é escamoteada. É também no momento de celebração da escritura que se verifica a transmissão contemplada neste artigo 2° (...).
11. Desta forma para que se verifique a tradição, para os efeitos descritos na citada disposição, não é necessário, ao contrário do que sucede no 2° ponto do § 1° do art. 2° do CIMSISD "a prática pelo promitente comprador de actos de posse em temos civilísticos, considerando ainda, por outro lado, que ocorre o ajuste de revenda quando o promitente comprador cede a sua posição contratual a terceiro e entre este e o promitente vendedor vem a realizar-se a escritura de compra e venda respectiva, o que aconteceu.
12. Através da notificação efectuada foram fornecidos todos os elementos essenciais para a compreensão dos factos invocados pela Administração Tributária, quer quanto aos elementos objectivos quer quanto aos elementos subjectivos que permitiram a subsunção dos factos ao enquadramento normativo estabelecido no § 2° do art. 2° do CIMSISD, pelo que nada mais existe a acrescentar à notificação.
(...)
14. A notificação contestada continha todos os pressupostos elencados no § 2° do art. 2° do CIMSISD, que permitiam ao contribuinte reproduzir o raciocínio que esteve subjacente ao projecto de decisão.
15. De acordo com a legislação invocada será necessário que se verifiquem dois pressupostos para que seja aplicável a norma de incidência constante no § 2° do art. 2° do CIMSISD; o ajuste, por parte do promitente comprador, de revenda do imóvel a terceiro e a posterior escritura de venda entre este terceiro e o primitivo promitente vendedor.
16. Ambos os pressupostos se encontram reunidos no caso controvertido, uma vez que:
i) foi celebrado um contrato promessa de compra e venda entre P................. - Investimentos ……………, Lda. e o ora contribuinte P …………………..,
ii) foi celebrado um contrato de cessão de posição contratual entre P …………….. e PEDRO ………………,
iii) e foi celebrada a escritura de compra e venda entre P................. - Investimentos ……., Lda e PEDRO ………………...
17. Face aos pressupostos que têm de se verificar cumulativamente para operar a presunção da transmissão abrangida na norma de incidência estabelecida no § 2 do art. 2°, verifica-se que somente na data da escritura de compra e venda celebrada entre P................. - Investimentos Imobiliários, Lda, e P …………………., é que se verifica o facto tributário, uma vez que só nessa data é que todos os requisitos se encontram reunidos.
18. Assim sendo, quer o prazo de caducidade, quer o prazo de prescrição terão de ser contados a partir desta datada ocorrência do facto tributário, ou seja, a partir de 20 de Junho de 2001.
19. Da conjugação do art. 45° da Lei Geral Tributária e do art. 92° do CIMSISD, no que se refere à caducidade e no art. 48° da LGT no que se refere à prescrição, o prazo máximo em ambas as situações é de 8 (oito) anos.
20. Por conseguinte, quer o prazo de caducidade, quer o prazo de prescrição apenas terminam em 20 de Junho de 2009, caso não ocorra qualquer outra causa suspensiva ou interruptiva entretanto,
21. Em conclusão sou de parecer que deverá o projecto de liquidação convolar-se em definitivo procedendo os serviços à liquidação do imposto municipal de sisa devido nos termos do 2° do art. 2° do CIMSISD, com a consequente liquidação de juros compensatórios, nos termos do art. 35° da Lei Geral Tributária.” (cfr. informação, a fls. 81 a 83 dos autos);

G) Na sequência da informação parcialmente transcrita na alínea antecedente, em 3 de Março de 2009, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 7 proferiu o seguinte despacho: “Concordo, pelo que convolo em definitivo o projecto de decisão, com os fundamentos constantes daquele, bem como da presente informação. Proceda-se à liquidação do respectivo imposto e juros.
Notifique-se.” (cfr. despacho, a fls. 80 dos autos);

H) O impugnante foi notificado do despacho referido na alínea antecedente pelo ofício n° 000937, de 3 de Março de 2009 (cfr. doc., a fls. 79 dos autos);

I) Em 3 de Março de 2009 foi emitida a nota demonstrativa da liquidação do Imposto Municipal de Sisa, e correspondentes juros compensatórios, perfazendo o valor global de €27.301,47, calculado da seguinte forma:
RESULTANTE DA AVALIAÇÃO 66.799,01 Eur.
VALOR DO CONTRATO (CEDÊNCIA) 201.464,47 Eur.
MATÉRIA COLECTÁVEL art. 19§2 CIMSIS/SD 201.464,47Eur.
SISA DEVIDA
201.464,47 Eur x 0,10
n° 2 art. 33° CIMSIS/SD - 20.146,45 Eur.
J.C (...) - 7.155,02” (cfr. nota demonstrativa da liquidação, a fls. 95 dos autos);

J) Pelo ofício n° 000940, de 4 de Março de 2009, foi o impugnante notificado da liquidação mencionada na alínea antecedente, com prazo para pagamento de 30 dias a contar da data de assinatura do aviso de recepção (cfr. doc., a fls. 94 dos autos).

K) O impugnante recebeu o ofício mencionado na alínea antecedente em 10 de Março de 2009 (facto não controvertido)..

***
A sentença recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:
” Com relevância para a decisão da causa nada mais se provou, designadamente, que:
1) O “contrato de cessão de posição contratual”, identificado em B) que antecede, tenha sido celebrado na sequência da perda de interesse do impugnante na compra da fracção, motivada pela qualidade dos métodos de construção que estavam a ser utilizados e pelo desconforto sentido pelo impugnante relativamente à forma como o empreendimento estava a ser gerido e à forma como era estabelecida a relação com os futuros proprietários.”.

***
A decisão da matéria de facto fundou-se no seguinte:
«A decisão da matéria de facto assentou na análise crítica dos documentos, não impugnados, constantes dos autos e do processo administrativo apenso, conforme referido a propósito de cada alínea dos factos provados supra.
Quanto à matéria de facto não provada, a prova testemunhal produzida não permitiu ao tribunal dar esses factos, objecto de alegação pelo impugnante, como provados, porquanto os depoimentos das testemunhas se mostraram vagos e imprecisos.
Com efeito, do depoimento da testemunha C ………………………. - amiga do impugnante há mais de 30 anos e que revelou ter conhecimento directo dos factos em causa nos autos, por ter adquirido uma loja no mesmo empreendimento - resultou apenas que tinha conhecimento da celebração do contrato de promessa e da cessão da posição contratual ocorrida posteriormente, no entanto, nada sabia quanto às razões que motivaram a cessão, limitando-se a fazer suposições quanto ao descontentamento do impugnante relativamente ao desenvolvimento da obra, mostrando hesitação quando questionada a este propósito.
Por seu lado, do depoimento da testemunha J ………………. - casada com o impugnante, referindo que já o era à data dos factos - resultou que pouca intervenção teve no negócio celebrado. Ademais, apesar de referir que a fracção em causa se destinava à habitação do impugnante e da sua família e que efectuou visitas à obra, juntamente com o seu marido, não conseguiu concretizar em que aspectos o desenvolvimento da construção não estava a corresponder às suas expectativas e do impugnante, limitando-se a afirmar, de forma vaga e conclusiva, que o marido terá observado que as técnicas e os materiais utilizados não eram os melhores e que a obra avançava com muita rapidez. Referiu, igualmente, não saber se o marido tinha algum problema de relacionamento com o vendedor e se alguma vez conversou com o dono da obra sobre eventuais problemas com a construção.
Em suma, nada conseguiu especificar quanto aos aspectos que terão provocado a insatisfação do impugnante em relação ao desenvolvimento da obra, razão pela qual o tribunal não poderá valorar o seu depoimento.”.
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III. Do Direito

Na presente sede recursiva, o Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação de Imposto Municipal de Sisa, referente ao ano de 1999.
Argui que o Tribunal a quo errou no julgamento que efetuou, quer no que respeita à matéria de facto fixada, quer quanto à aplicação do Direito aos mesmos, numa questão relacionada com a liquidação adicional de Imposto Municipal de SISA respeitante a um ajuste de revenda.
Comecemos por apreciar o erro de julgamento de facto que o apelante assaca à decisão aqui criticada.
Advoga o Recorrente que em face dos depoimentos prestados pelas duas testemunhas inquiridas teria ficado provado quer o motivo pelo qual a aquisição iria ocorrer, bem como o motivo da cessão da posição contratual. (conclusões I a M).
Sobre a questão do erro de julgamento de facto, ensina António dos Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, pág. 169, atento o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, que a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto caracteriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão.
Deste modo, o regime concernente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [vide, al. a) do nº 1 do art.º 640º do CPC];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].
Quando os factos a fixar tenham por base gravações realizadas nos autos, incumbe ao recorrente indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte.
Significa isto que não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe os ónus já mencionados.
Ora, no caso em apreço o Recorrente não cumpre os ónus que sobre si impendiam. Efetivamente, muito embora no corpo das alegações faça menção as passagens da gravação em que funda o seu recurso, a verdade é que não indica os concretos factos que pretende ver considerados como assentes. Na verdade, o apelante não convoca qualquer aditamento por complementação ou substituição, nem qualquer supressão do probatório, nada retirando da prova testemunhal produzida em termos de asserção fáctica que reputa relevante para a lide, pelo que se rejeita o presente Recurso, nesta parte.
Avançando.
Advoga o Recorrente que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de Direito, por um lado porque a cessão da posição contratual não justifica a tributação, e, por outro lado, porque nunca poderia o imposto incidir sobre a totalidade do contrato, mas apenas sobre a parte de que foi ressarcido, ou seja, o valor por si pago a título de sinal e princípio de pagamento.
O Tribunal a quo esteou a improcedência da impugnação sustentando que, em face da redação do artigo 2°, § 2° do CIMSISSD, nas promessas de compra e venda ocorre a tradição, para efeitos de incidência do imposto, se o promitente-comprador ajustar a revenda com um terceiro e entre este e o primitivo promitente-vendedor for outorgada a escritura de venda. Nestes casos, a lei ficciona a existência de tradição jurídica do imóvel para aquele que realizou o ajuste de revenda, considerando verificada a transmissão do bem, para efeitos de incidência da Sisa, independentemente de o promitente-comprador ter entrado na posse material ou física do mesmo.
E com total acerto.
Senão vejamos.
Começando por convocar o artigo 2.° do CIMSISSD, em sede de incidência real, verificamos que este sujeitas a imposto de Sisa as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade sobre bens imóveis e das figuras parcelares do mesmo.
Consignando, por seu turno, o § 1.º, 2.º, do citado normativo que:
Consideram-se, para este efeito, transmissões de propriedade imobiliária:
2.º As promessa de compra e venda ou de troca de bens imobiliários, logo que verificada a tradição para o promitente-comprador ou para os promitentes permutantes, ou quando aquele ou estes estejam usufruindo os bens; (…)
Já o § 2º do mesmo preceito, estabelecia que:
“§ 2.º Nas promessas de venda entende-se também verificada a tradição se o promitente-comprador ajustar a revenda com um terceiro e entre este e o primitivo promitente vendedor for depois outorgada a escritura de venda.”
O que resulta destes ditames é que muito embora a regra deste imposto seja tributar a transmissão onerosa de bens imóveis, na aceção civilística da transmissão do direito de propriedade ou de figuras parcelares do mesmo, situações existem em que o legislador optou por tributar operações jurídicas tal como se se tratassem de transmissões onerosas, recorrendo a uma ficção jurídica.
Ora, é exatamente isto que acorre no caso do § 2, em que sempre que ocorra uma operação jurídica que se configure como um ajuste revenda com um terceiro com o qual o promitente vendedor venha a celebrar a escritura de venda do imóvel, a lei presume ter existido uma tradição do imóvel para o cedente, com a consequente transmissão económica ou fiscal do imóvel.
Como ensina José Maria Fernandes Pires, Lições de Imposto sobre o Património e Selo, Almedina, 2011, pág. 317, “se o promitente adquirente cedesse, a sua posição contratual a um terceiro, o CIMSISSD sujeitava-o a imposto na previsão normativa constante do § 2.° do artigo 2.° do CIMSISSD. O sujeito passivo do imposto, neste caso era o cedente e a determinação do valor tributável seguia a regra geral do imposto. O terceiro que adquiriu a posição contratual não pagava qualquer imposto por esse facto, só ficando a ele sujeito na data da celebração da escritura pública de transmissão do imóvel. Era também nessa data que o cedente pagaria o imposto
No mesmo sentido F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, CIMSISSD, 4ª edição, 1997, pág. 60) escreveram o seguinte:
O legislador contentou-se com a tradição jurídica dos bens. A teleologia deste preceito é sujeitar a sisa a revenda ou agenciação de bens alheios feita pelo promitente comprador ao negociar ou ceder a sua posição contratual, entendendo-se que se dá, nestas circunstâncias, uma tradição fiscal do imóvel, embora aquele não intervenha na escritura, uma vez que a sua intervenção no acto é escamoteada.
É também no momento da celebração da escritura que se verifica a transmissão contemplada neste p. 2º. É evidente que havendo tradição efectiva não há que lançar mão deste dispositivo legal, sendo a sisa devida nos termos já ali referidos. O campo de aplicação deste preceito restringe-se, pois, à situação do promitente-comprador, que não entrou na posse do imóvel, ajusta a revenda com um terceiro, sendo a escritura celebrada entre este último e o promitente vendedor.”
Se é verdade que os contratos-promessa de compra e venda onde não exista a traditio do bem, não estão sujeitos a imposto, nas situações de promessas de compra e venda estatuídas no normativo que vimos analisando, entende-se verificada a tradição e, consequentemente, a sujeição a imposto, se o promitente comprador ajustar a revenda com um terceiro, vindo a escritura a ser outorgada apenas entre o promitente vendedor e este terceiro, estabelecendo-se, assim, uma traditio ficta.
Como tem vindo a ser afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, designadamente no Aresto deste Tribunal Central Administrativo Sul, de 29/05/204, tirado no processo nº 303/09.9BELRS, importa “ter presente que para esse efeito não tem de constar no probatório asserção fática expressa e com esse conteúdo, e isto porque, a demonstração se basta com a prova dos factos que, segundo as regras da experiência, geram uma convicção séria da existência do negócio referido naquele § 2º do artigo 2.º do CIMSISD.”
Note-se que a ratio legis desta tributação em sede de CIMSISSD radicava no facto de os contratos-promessa de compra e venda de imóveis terem deixado de ser, “progressivamente, com o desenvolvimento da actividade económica, meros negócios preparatórios de contratos de compra e venda, passando a ser utilizados como instrumentos de realização de investimentos e de especulação imobiliária, que têm por base uma transmissão puramente económica dos bens, proporcionadora de rendimentos.” (Vide neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.04.2010, recurso 924/09, e de 06.06.2012, recurso 903/11).”
Cabe ainda salientar que a prova da verificação destes pressupostos impende sobre a AT, em obediência ao disposto no artigo 74º da LGT e 342º da Código Civil, uma vez que são factos constitutivos do direito a que esta se arroga. Acresce ainda realçar que a presunção que consta daquele § 2º configura uma presunção juris tantum, desde logo pela impossibilidade da existência de presunções juris et de júri em matéria de incidência tributária (artigo 73º da LGT).
Exatamente no sentido que aqui pugnamos, podemos encontrar o Aresto do STA, proferido em Plenário da Secção de Contencioso Tributário, no processo nº 0895/11, de 02 de Maio de 2012, de cujo sumário se realça o seguinte:
IV-O § 2.º do artigo 2.º do CIMSISD estabelece é que, nos casos em que ocorra um ajuste de revenda nas promessas de compra de bens imobiliários, se tem de presumir legalmente que existiu uma prévia tradição jurídica do bem para aquele que realizou o ajuste, sendo a partir daí que a lei ficciona a ocorrência da transmissão (económica) do imóvel sujeita a imposto.
V – Para afastar essa presunção legal de tradição (presunção juris tantum por força do artigo 73.º da LGT), o sujeito passivo terá de provar que, não obstante a celebração da escritura do promitente vendedor com terceiro, não existiu entre si e este qualquer ajuste de revenda, sendo indiferente, para a referida ilisão, a prova da falta de posse material e efectiva do bem, pois o preceito não abrange estas situações de tradição efectiva, que caem, antes, no âmbito de incidência do § 1.º, n.º 2 do artigo 2.º do CIMSISD.
Por outro lado, e no que respeita aos pressupostos em que deve assentar este § 2º do artigo 2º do CIMSISD, sumariou o STA, no seu Aresto de 02/03/2016, proferido no processo nº 0520/14, o seguinte:
I - A norma contida no § 2º do artigo 2º CIMSISD prevê a ocorrência de duas transmissões autónomas de propriedade imobiliária sujeitas a tributação por força de contrato de promessa de venda e subsequente ajuste de revenda com terceiro: (i) a transmissão económica do bem que ocorre da esfera jurídica do promitente-vendedor para a esfera jurídica do promitente-comprador originário, sendo este o sujeito passivo do respectivo imposto de sisa; (ii) a transmissão civil do bem que ocorre com o contrato definitivo de compra e venda que vem a ser outorgado entre o promitente-vendedor e o referido terceiro, sendo este o sujeito passivo do respectivo imposto de sisa.
Exposto deste modo o Direito, bem como a posição jurisprudencial dos nossos Tribunais Superiores, cabe baixar ao caso dos autos e verificar se ficaram provados os pressupostos fácticos da aplicação do mencionado preceito.
Atentemos no recorte probatório dos autos, salientando que o mesmo não foi eficazmente impugnado pelo Recorrente, por forma a aferirmos se o Tribunal a quo, decidiu acertadamente sobre a legalidade do ato de liquidação por se encontrarem verificados os pressupostos que legitimam a liquidação de SISA.
Resulta do probatório que o apelante celebrou, em 29 de Abril de 1999, um contrato-promessa de compra de venda com a sociedade P................. – Investimentos Imobiliários Lda., nos termos do qual prometeu comprar o imóvel ali identificado pelo preço de Esc.: 40.390.000$00 (€ 201.464,47). Mais se apura naquele probatório que o apelante poderia ceder ou transferir a sua posição contratual a terceiro.
Decorre também daquele probatório que o Recorrente pagou um sinal e princípio de pagamento no montante de Esc.: 4.039.000$00 (€ 20.146,45).
Flui ainda do probatório fixado que, em 22 de Junho de 1999, foi celebrado entre o aqui apelante, Pedro ………………. e a sociedade P................. – Investimentos Imobiliários Lda. um contrato de cessão da posição contratual onde o apelante cedeu a posição que detinha no contrato-promessa celebrado com a sociedade a Pedro ………………… tendo como objecto o mesmo imóvel identificado no ponto 1 do probatório.
Mais tarde, em 20 de Junho de 2001, foi outorgada a escritura de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca, relativa ao contrato prometido acima mencionado, entre P................. – Investimentos Imobiliários Lda., como primeiro outorgante, …………………, como segundo outorgante.
Realça-se que foi dado como não provado que o contrato de cessão de posição contratual tenha sido celebrado na sequência da perda de interesse do impugnante na compra da fração, motivada pela qualidade dos métodos de construção que estavam a ser utilizados e pelo desconforto sentido pelo impugnante relativamente à forma como o empreendimento estava a ser gerido e à forma como era estabelecida a relação com os futuros proprietários.
O conjunto dos factos elencados levaram a que a AT considerasse estar na presença dum ajuste de revenda subsumível ao § 2° do artigo 2° do CIMSISD.
Este entendimento foi sancionado pelo Tribunal a quo, que amparou a sua decisão do seguinte modo:
Resulta do exposto que, de acordo com a citada norma do CIMSISSD, está sujeito a imposto o contrato-promessa de compra e venda de imóvel, sempre que ocorra um ajuste de revenda entre o promitente-comprador e um terceiro, com o qual o promitente-vendedor venha a celebrar a escritura de compra e venda do imóvel, isto é, o contrato prometido. Nestes casos, a lei ficciona a existência de tradição jurídica do imóvel para aquele que realizou o ajuste, considerando verificada a transmissão do bem, para efeitos de incidência da sisa, independentemente de o promitente-comprador ter entrado na posse material do imóvel.
Nestes termos, presumindo a lei a tradição do imóvel para o promitente-comprador se este ajustar a revenda com um terceiro e entre este e o promitente- vendedor vier a ser outorgada a escritura de compra e venda, temos que, verificada a cessão da posição contratual por parte do primitivo promitente-comprador para um terceiro, com quem virá a ser celebrado o contrato prometido, considera-se ter havido ajuste de revenda e, como tal, presume-se a prévia tradição do imóvel e, consequentemente, a sua transmissão, para efeitos de liquidação de Sisa.
(…)
Temos, assim, que o impugnante celebrou um contrato de cessão da sua posição contratual de promitente-comprador no contrato-promessa de compra e venda da fracção autónoma que viria a ser designada pela letra “C”, correspondente ao rés-do-chão letra C, do prédio urbano sito na Rua ……………., Lote A4, freguesia de ………………, concelho de …………, que havia celebrado com a sociedade «P................. - Investimentos ………. Lda», tendo o contrato prometido vindo a ser celebrado com o cessionário.
Deste modo, considera-se ter havido um ajuste de revenda entre o impugnante e o adquirente final da fracção em questão e, em consequência, presume-se a tradição jurídica do bem e, bem assim, a sua transmissão, para efeitos de incidência de Imposto de Sisa.
E, assim sendo, aplicando as considerações expendidas supra ao caso em exame, é ao impugnante que cabe o ónus de ilidir a referida presunção, trazendo aos autos elementos que permitam demonstrar que não realizou qualquer ajuste de revenda, explicitando as razões que levaram à cessão da posição contratual, afastando, assim, a presunção de tradição jurídica e de transmissão do imóvel.
Ao impugnante cabia, portanto, demonstrar que o contrato prometido já não se podia realizar, nomeadamente, por impossibilidade económica do promitente- comprador ou por perda de interesse na sua celebração.
Ora, o impugnante, não obstante alegar que ocorreu essa perda de interesse, não logrou provar os motivos que determinaram a desistência da celebração do contrato de compra e venda, pelo que não logrou provar que não existiu ajuste de revenda, não se mostrando afastada a presunção estabelecida no artigo 2°, § 2° do CIMSISSD (cfr. alínea 1) dos factos considerados não provados supra).
Nesta conformidade, não assiste razão ao impugnante quanto à alegada errónea qualificação do facto tributário, não padecendo o acto de ilegalidade, por esta via.”
Não vemos motivos para nos afastarmos do aqui decidido.
Os pressupostos de facto em que assenta a presunção estabelecida no preceito que temos vindo a analisar são dois, a saber: o ajuste, por parte do promitente- comprador, de revenda do imóvel com um terceiro e a posterior escritura de venda entre este terceiro e o primitivo promitente-vendedor.
A demonstração dos mesmos basta-se com a prova dos factos que, segundo as regras da experiência, geram uma convicção séria da existência do negócio referido naquele § 2º do art. 2º do CIMSISSD.
Tendo ficado demonstrado que foi cedida a posição contratual que o promitente-comprador detinha no contrato-promessa a um terceiro e que a escritura definitiva veio a ser outorgada entre o primitivo promitente-vendedor e um terceiro, é razoável aceitar e presumir que houve um ajuste da revenda do prédio entre o promitente comprador e o terceiro que, afinal, veio a outorgar na escritura como comprador.
Não obstante esta presunção seja uma presunção ilidível por prova em contrário (artigo 351º do Código Civil), essa prova impende sobre o promitente comprador.
Muito embora se acompanhe entendimento perfilhado no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul, refletido no Aresto de 29/05/2024, tirado no processo nº 303/09.9BELRS, de que “Para efeitos de densificação e materialização da ilisão da presunção há que ponderar, e valorar, casuisticamente, quais as razões que levaram à cessão da posição contratual, o intuito negocial, e o efetivo aumento do poder aquisitivo, computando-se, designadamente, a prova de finalidade especulativa.” a verdade é que, in casu, nenhuma prova foi feita sobre as razões que sustentaram a cessão da posição contratual.
Na verdade, como já tivemos oportunidade de realçar acima, a circunstância de terem resultado como não provados os elementos justificativos para a cessão da posição contratual, sendo que os invocados seriam a perda de interesse no negócio motivada por alegadas razões da qualidade construtiva do mesmo, leva a que se conclua pela não ilisão da presunção legalmente exigida por parte do aqui Recorrente.
Sendo certo que era sobre o apelante que impendia o ónus da prova dos motivos que poderiam ter determinado a cessão da sua posição contratual de promitente comprador a um terceiro, designadamente a sua alegada perda de interesse devidamente circunstanciada, não tendo tal prova sido efetuada, somos forçados a concluir que o Recorrente não conseguiu ilidir a presunção que consta do § 2° do artigo 2º do CIMSISSD, pelo que nenhuma censura merece a decisão recorrida que se deve manter na ordem jurídica.
Avançando.
Advoga ainda uma errónea quantificação da matéria coletável uma vez que a Administração Tributária considerou como matéria tributável o montante de € 201.464,47 (valor do contrato-cedência), e o ora Recorrente, então promitente-comprador, pagou apenas a quantia de € 20.146,45, a título de sinal e princípio de pagamento do preço.
Defende, também, que ao assim não se entender a liquidação seria violadora do princípio da Igualdade, na vertente da capacidade contributiva.
Mais sustenta que, ainda que assim não se considerasse, sempre teríamos da considerar que ocorreu erro na quantificação uma vez que o valor sobre o qual deveria incidir o imposto aqui em dissido, teria de corresponder ao VPT, pelo que o ato se encontra ferido de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto. Ancora esta sua alegação no disposto no artigo 19°, § 2°, do CIMSISSD, onde se estabelece que sendo superior o VPT o imposto deveria ter sido calculado sobre o mesmo e não sobre o valor do contrato porque inferior.
O Tribunal a quo julgou improcedentes todas as questões aqui suscitadas por entender que a base de incidência corresponde ao valor do contrato-promessa de compra e venda em que o promitente comprador cede a sua posição contratual e não o valor do sinal e princípio de pagamento do mesmo constante, bem como que tal conclusão não viola o aludido princípio.
Ora, adiantamos desde já, que nenhuma censura merece o ali decidido.
Comecemos pela questão de saber qual deverá ser a base de incidência do imposto.
Preceituava o artigo 19ª, § 2° do CIMSISSD que, fora dos casos previstos no § 1°, o imposto de Sisa incide sobre o preço convencionado pelos contratantes ou o valor patrimonial tributário fixado, se for maior.
Sobre a questão concreta de saber qual o valor a considerar para efeitos de incidência de SISA nas situações de ajuste de revenda, doutrinou-se no Aresto do STA de 2 de Março de 2016, proferido no Processo n° 520/14, e seguinte: “o valor a considerar para efeitos de liquidação do imposto de sisa é o mesmo para o promitente-comprador originário e para aquele que posteriormente outorga, como comprador, no contrato definitivo de compra e venda, pois ambos são aquirentes do imóvel e, nessa medida, sujeitos passivos do imposto relativamente à transmissão que para si ocorre. Com efeito, a norma contida no § 2° do artigo 2° CIMSISD prevê a ocorrência de duas transmissões autónomas de propriedade imobiliária sujeitas a tributação: (i) a transmissão civil do imóvel para o terceiro cessionário, operada pelo contrato definitivo de compra e venda, e que tem como sujeito passivo este adquirente; (ii) a transmissão económica do promitente-vendedor para o originário promitente-comprador.
Pelo que o imposto de sisa, enquanto imposto sobre a transmissão onerosa do imóvel objecto do contrato promessa de compra e venda, incide sobre o preço desse imóvel, e esse preço não pode ser senão outro que o preço convencionado para a sua transmissão (seja a transmissão civil, seja a transmissão económica), por referência ao negócio celebrado por cada um dos adquirentes: (...) o originário promitente-comprador por referência à aquisição económica que realizou também com a proprietária do imóvel e que lhe permitiu realizar o negócio de ajuste de revenda do imóvel com um terceiro.”
Vertendo os ensinamentos aqui plasmados para o caso dos autos, verificamos que tendo no contrato-promessa sido convencionado como valor de alienação € 201.464,47 [cfr. alínea A) dos factos provados supra], será este que constituirá a matéria coletável para efeitos do Imposto de Sisa devido pela transmissão do imóvel, no âmbito do ajuste de revenda e não o valor do sinal ou princípio de pagamento. Na verdade, o valor do imposto não incidirá sobre o contrato de cessão da posição contratual, mas sobre o valor do contrato-promessa de compra e venda, uma vez que foi com este que ocorreu a presunção de aquisição para efeitos do disposto no § 2° do artigo 2° CIMSISD.
Acresce ainda que o imposto que aqui nos ocupa não possui a natureza dum imposto sobre o rendimento pelo que não possui relevância a criação ou não de rendimentos adicionais para o alienante, designadamente mais-valias. Efetivamente, com este imposto visa tributa-se o património exteriorizado pela propriedade ou uso e fruição de bens patrimoniais pelo que o mesmo incide sobre o valor dos bens transmitidos e não duma qualquer mais-valia decorrente da alienação.
Em igual sentido decidiu o Tribunal a quo, pelo que também nesta parte, o presente salvatério terá de improceder.
Prosseguindo.
Defende o apelante que esta interpretação e que é a que está subjacente à liquidação aqui discutida viola o Princípio da Igualdade, na sua vertente da capacidade contributiva.
O Tribunal a quo julgou não verificado este vício.
Apreciemos.
O princípio da capacidade contributiva mais não é do que uma emanação do princípio da igualdade em sede fiscal, expresso no artigo 13º, nº 2 da CRP, e dele decorre que a lei fiscal deverá tratar de forma igual e uniforme os factos que exprimem ou revelam a mesma capacidade contributiva, bem como que aqueles factos sejam reveladores de uma igual capacidade contributiva. Podemos assim afirmar que este princípio opera como condição ou pressuposto da tributação e, bem assim, como critério ou parâmetro da tributação. Significa isto que ele impede, por um lado, que a tributação opere sobre uma riqueza que não existe, como determina a exacção do património dos contribuintes se faça de acordo com a sua capacidade de gastar, como é doutrinado no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 84/2003, no processo nº 531/99.
No caso dos impostos sobre o património essa capacidade de gastar encontra-se expressa na aquisição, ainda que ficcionada, de adquirir um determinado bem imóvel. É o incremento patrimonial exteriorizado na aquisição de património imobiliário que demonstra a capacidade contributiva do sujeito passivo do imposto.
Ora, no caso concreto o apelante demonstrou possuir essa capacidade quando celebrou o contrato-promessa de compra e venda que, mais tarde, veio a ser objeto de uma cessão da sua posição contratual. Na verdade, ficou provado que um determinado bem imóvel entrou na esfera jurídica patrimonial do apelante e essa circunstância demonstra a aludida capacidade contributiva.
Como vimos acima, a lei fiscal, nestas situações de cessão de posições contratuais presume a existência duma aquisição económica/jurídica do bem e será esta que está na génese da tributação, pelo que com ela fica demonstrada a capacidade contributiva do sujeito passivo, donde somos forçados a concluir não ocorrer a alegada violação do mencionado princípio.
Ao ter assim decidido o Tribunal a quo, também nesta parte nenhuma censura merece o decidido, embora com a presente fundamentação.
Apreciemos agora a questão de saber se o ato objeto de impugnação enferma de erro na quantificação por ter considerado como base tributável o valor do contrato e não o VPT, de acordo com o disposto no artigo 19°, § 2°, do CIMSISSD. Como vimos a arguição do apelante sustenta-se na circunstância de o VPT ser superior ao valor do contrato.
O Tribunal a quo, com total razão adiante-se, considerou que tal erro não ocorria atenta a matéria de facto assente.
Vejamos, então.
Começando por trazer novamente à colação o aludido § 2º do artigo 19º daquele compêndio legal verificamos que o mesmo determinava que “Nos outros casos, o valor dos bens será o preço convencionado pelos contratantes ou o valor patrimonial, se for maior.” o que significa que não estando em causa as transações mencionadas no § 1º, ou seja, aquisições ao Estado ou às autarquias locais, bem como o dos adquiridos mediante arrematação judicial ou administrativa, ou bens expropriados por utilidade pública, o valor a considerar para efeitos de incidência do imposto o valor convencionado pelas partes para a alienação ou o VPT.
Vertendo para o caso dos autos, resultou provado que o VPT foi fixado em € 66.799,01, já o valor constante do contrato-promessa de compra e venda e do contrato de cessão da posição contratual foi de € 201.464,47 (que correspondia a Esc. 40.390.000$00).
Por outro lado, emergiu daquele mesmo probatório que o valor sobre o qual incidiu o imposto aqui controvertido foi, exatamente, o valor que era indicado no contrato de cessão da posição contratual, em virtude de ser superior ao VPT.
Como é bom de ver, sendo o VPT fixado inferior ao valor que resulta do contrato celebrado pelas partes, o imposto teria de incidir sobre este último, motivo pelo qual o ato não padece de qualquer erro de quantificação que lhe é assacado pelo apelante, como havia sido afirmado na decisão recorrida.
Prosseguindo.
Argui, finalmente, o apelante que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de Direito por ter julgado improcedente a impugnação com base na invocada preterição da formalidade de audiência prévia.
Sustenta a sua afirmação advogando que a notificação que o instava para o exercício desse direito não tinha fundamentação adequada para o propósito que visava, bem como não fazia qualquer menção do montante de imposto a pagar, da matéria coletável, da taxa de imposto que sobre esta iria incidir valor da liquidação, nem à demonstração do cálculo do imposto a pagar. Adensa a sua arguição afirmando que tal situação foi agravada com o facto de ter requerido que lhe fosse emitida uma certidão com os fundamentos daquela decisão e a mesma nunca ter sido emitida.
A decisão recorrida ancorou a sua decisão de improcedência do vício invocado nos seguintes argumentos:
Vejamos.
A audição prévia do sujeito passivo, enquanto corolário do princípio da participação, apresenta-se como uma das garantias dos contribuintes no procedimento tributário (e, de resto, no procedimento administrativo em geral), com consagração constitucional expressa (cfr. artigo 267º, nº 5 da CRP), e visa, fundamentalmente, garantir a descoberta da verdade material.
O princípio da participação vem concretizado nos artigos 60º da LGT e 45º do CPPT, elencando-se, naquele preceito da LGT, os casos em que deve ter lugar a audição prévia do contribuinte, designadamente, antes da liquidação (cfr. artigo 60º, nº 1, alínea a) da LGT).
Nos termos do artigo 60º, nº 5 do referido diploma, a Administração Tributária deverá notificar o contribuinte para o exercício do direito de audição, comunicando-lhe o projecto da decisão e a sua fundamentação.
Devendo ter lugar a audiência prévia, a falta de notificação para o seu exercício constitui preterição de uma formalidade essencial, que gera a anulabilidade do acto em causa no procedimento em que tal preterição se verificou.
O dever de fundamentação das decisões da Administração, plasmado no artigo 268º, nº 3 da CRP, vem, ainda, concretizado no artigo 77º da LGT, que estende o dever de fundamentação a todas as decisões, ainda que favoráveis ao sujeito passivo. Aí se determina que a decisão é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, exigindo-se que a Administração Tributária demonstre o iter cognoscitivo da decisão, assim permitindo ao destinatário normal a compreensão da motivação do acto ou do projecto de decisão.
No presente caso, foi o impugnante notificado para se pronunciar em sede de audição prévia através do ofício nº 000566, de 5 de Fevereiro de 2009 (cfr. alínea D) dos factos provados supra).
Da análise do identificado ofício conclui-se que a notificação para o exercício do direito de audição vem acompanhada da fundamentação do projecto de decisão a proferir – a liquidação do imposto de Sisa. E da fundamentação resulta que tal liquidação ocorre por força dos contratos celebrados pelo impugnante, que configuram um ajuste de revenda, identificando-se, ainda, a norma legal aplicável.
Assim, da notificação em apreço resultam todos os elementos necessários à compreensão do sentido da decisão a proferir pela Administração Tributária, pelo que não assiste razão ao impugnante quanto à invocada falta de fundamentação.
Na verdade, o impugnante pretende enquadrar a situação por si descrita no disposto no artigo 37º, nº 1 do CPPT, mas, tal norma tem por âmbito de aplicação os casos em que a notificação de um acto tributário se revela insuficiente, por omissão de elementos que devem constar das notificações, nos termos do artigo 36º, nº 2 do referido diploma.
De resto, isso mesmo resulta da letra do preceito, ao referir “se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida (…), pode o interessado (…) requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos (…)” (sublinhado nosso) - cfr. artigo 37º, nº 1 do CPPT.
É certo que a fundamentação é um desses elementos que obrigatoriamente devem constar da notificação. O que acontece é que, no presente caso, tal omissão não se verificou, pois a notificação para audição prévia foi acompanhada da respectiva fundamentação.
Ou seja, o regime do referido artigo 37º do CPPT está previsto para o suprimento das deficiências das notificações e não dos actos notificados e, nessa medida, se o acto notificado não tem fundamentação ou, neste caso, como considera o impugnante, a fundamentação é insuficiente, não se estará perante qualquer deficiência na notificação, pois esta deu ao destinatário conhecimento do teor do acto tal como ele foi praticado, sem prejuízo da possibilidade de imputar ao acto vício de forma, por falta de fundamentação (cfr., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, volume I, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, p. 351).
Resulta de todo o exposto que, in casu, não se verificou a preterição do direito de audição prévia, uma vez que o impugnante foi oportunamente notificado para esse efeito, tendo essa notificação sido acompanhada dos fundamentos em que se baseou a intenção da Administração Tributária de proceder à liquidação do imposto, tendo tido o impugnante a faculdade de sobre eles se pronunciar.”
Apreciando.
Este princípio de audiência prévia, como bem menciona da decisão aqui criticada, decorre dum comando constitucional ínsito no artigo 267º da CRP e que encontra reflexo, a nível infraconstitucional, nos artigos 100º e seguintes do CPA vigente à data dos factos (atual artigo 121º e segs. do novo CPA). Dele resulta que os órgãos administrativos antes de tomarem uma decisão relativamente a um cidadão, que lhe seja desfavorável, devem ouvi-lo, antes da tomada de decisão final.
Em sede de Direito tributário e do procedimento tributário, este princípio veio a ser acolhido quer no artigo 60º da LGT, quer no artigo 45.º do CPPT.
Há data dos factos, preceituava o mencionado artigo 60º da LGT o seguinte:
1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2 - É dispensada a audição:
a) No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;
b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.
3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado.
4 - O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.
5 - Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.
6 - O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição, não pode ser inferior a 8 nem superior a 15 dias.
7 - Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão.”
Decorre do exposto que a AT, antes de tomar uma decisão sobre qualquer pedido do sujeito passivo, de proceder a uma liquidação de imposto, do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições apresentados pelos contribuintes e, bem assim, antes da conclusão do relatório da inspeção tributária ou da decisão de aplicação de métodos indiretos, tem de lhe conceder a possibilidade de se pronunciar sobre a sua intenção, salvo quando o contribuinte já teve oportunidade de o fazer numa fase anterior, bem como quando a liquidação tenha como base na declaração do contribuinte ou, ainda, quando a decisão lhe seja favorável.
Significa isto que sempre que a AT se encontre numa fase de preparação duma decisão que afete negativamente o contribuinte, por exemplo no âmbito do respetivo procedimento, deve comunicar-lhe a sua intenção, dando conhecimento do projeto da mesma, indicando os fundamentos em que ancora a sua pretensão, bem como indicando quais foram os elementos que nortearam o apuramento do imposto. Para além disto, deve ainda indicar o prazo em que tal direito pode ser exercido, bem como fornecer a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita (neste sentido podemos ver, entre muitos, os acórdãos do STA, proferidos nos processos nº 21244, de 25/01/2000 e 684/03, de 2/07/2003; bem como Acórdão deste TCASul tirado no processo nºs 1510/06, de 17/09/2013).
A inobservância desta formalidade, quando a mesma reveste carácter obrigatório, constitui um vício procedimental que acarreta, em regra, a anulação do ato que vier a ser proferido.
Salienta-se ainda que, esta formalidade pode degradar-se em formalidade não essencial ou em mera irregularidade, se, num juízo de prognose póstuma, for possível afirmar que o ato sempre teria aquela concreta configuração.
Atualmente, este princípio do aproveitamento do ato administrativo encontra consagração legal no artigo 163.º, nº5 do CPA, que reza o seguinte:
5 - Não se produz o efeito anulatório quando:
a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;
b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;
c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.”
Mas mesmo antes da consagração legal do aludido princípio, vinha sendo entendimento dos nossos Tribunais Superiores que os vícios de forma poderiam não conduzir à invalidade dos atos. Exemplo disto é o doutrinado no Acórdão do STA, proferido pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário, no âmbito do processo nº 0441/13, de 22 de Janeiro de 2014:
a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do acto a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las. Consequentemente, e tendo em conta que a audiência prévia dos interessados não é um mero rito procedimental, a formalidade em causa (essencial) só se podia degradar em não essencial (não invalidante da decisão) se essa audiência não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e se se impusesse, por isso, o aproveitamento do acto –utile per inutile non viciatur.”
Em idêntico sentido, foi afirmado no Aresto daquele mesmo Supremo Tribunal, no âmbito do processo nº 01391/14, de 25 de Junho de 2015, o seguinte:
A doutrina e a jurisprudência têm vindo a acolher o princípio do aproveitamento do acto – princípio que não tem suporte directo em disposição legal alguma, mas que assenta no entendimento de que não se justifica a anulação de um acto administrativo que foi praticado no exercício de poderes vinculados e está de acordo com os pressupostos fixados na lei –, nos termos do qual se admite que a falta de audiência dos interessados, quando obrigatória, possa não conduzir à anulação do acto final do procedimento (in casu a liquidação adicional de IS), anulação que é a sua consequência, de acordo com o previsto no n.º 1 do art. 163.º do Código do Procedimento Administrativo («São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção».). Essa omissão nem sempre conduzirá à anulação, «designadamente não a justificando nos casos em que se apure no processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem deixou de pronunciar-se sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final, ou acabou por ter oportunidade de pronunciar-se, em procedimento de segundo grau (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiência no procedimento de primeiro grau» (DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 15 ao art. 60.º, págs. 515 e segs.).
«Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do acto a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las.

Consequentemente, e tendo em conta que a audiência prévia dos interessados não é um mero rito procedimental, a formalidade em causa (essencial) só se podia degradar em não essencial (não invalidante da decisão) se essa audiência não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e se se impusesse, por isso, o aproveitamento do acto – utile per inutile non viciatur. O que exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso» (Cfr. o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 441/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 7 de Outubro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32410.pdf), págs. 13 a 20, também disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/212bcafe7f4d180f80257c6f004ea9c0?OpenDocument.).Como também ficou dito no acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 1071/06 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 14 de Fevereiro de 2008
(
https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2007/32210.pdf), págs. 386 a 392, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3d268a41bfe236798025728f0050532e?OpenDocument.), «[à] luz de tal princípio [do aproveitamento do acto], deverá entender-se que não se justifica a anulação, apesar da preterição do direito de audição, nos casos em que se apure no processo contencioso que, se a audiência tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem de se pronunciar sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final sobre as quais não tivesse já tido oportunidade de se pronunciar. Mas, apenas nessas situações em que não se possam suscitar quaisquer dúvidas sobre a irrelevância do exercício do direito de audiência sobre o conteúdo decisório do acto pode ser efectuada aplicação daquele princípio”.
Exposto brevemente o Direito e a posição dominante da jurisprudência, cumpre baixar ao nosso caso para aferir da existência da preterição desta formalidade.
Flui do recorte probatório fixado, não impugnado, nesta parte, pelo apelante, que em 5 de Fevereiro de 2009, o Serviço de Finanças de Lisboa 7, remeteu ao aqui apelante um ofício, com o assunto “Cedência de posição contratual – liquidação do Imposto Municipal de Sisa”, no qual se informava que era intenção da AT proceder à liquidação oficiosa de SISA por referência a uma cedência de posição contratual em que este havia figurado como cedente.
Do ofício aludido constava: “Fica notificado nos termos do art. 60º da Lei Geral Tributária para, no prazo de oito dias contados de acordo com o art. 39º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (3º dia posterior ao do registo ou 1º dia útil seguinte quando esse dia não seja útil), exercer por escrito o direito de audição prévia com referência à cedência de posição contratual que efectuou do R/C C - Lote A4 do prédio sito na Rua …………………, nº 120, em Lisboa, actualmente inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Santa ………… sob o artigo ……… - "C", do qual celebrou contrato promessa de compra e venda com a P................. – INVESTIMENTOS …………. LDA, NIPC. …………, em 1999/04/29 pelo preço de € 201.464.47. Verifica-se, porém, que a Escritura de Compra e Venda da referida fracção foi celebrada em 2001/06/20, no 5º Cartório Notarial de Lisboa, entre a P................. E PEDRO ……………………, NIF. ……………, o que configura um ajuste de revenda, conforme previsão do § 2º do artigo 2º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto de Sucessões e Doações, pelo que o imposto deveria ter sido pago nos 30 dias subsequentes aquela escritura, em obediência ao disposto no nº 4 do art. 115º do já citado código.”
O Recorrente não coloca propriamente em causa a existência desta notificação para se pronunciar antes da decisão, mas afirma que tal ofício não possui qualquer fundamentação, designadamente no que concerne à matéria coletável à qual se aplicaria o imposto, não continha o valor do mesmo, nem as taxas a aplicar.
A questão não se prende com a falta de fundamentação do ato, mas sim, se bem compreendemos as alegações do apelante, com o facto de não constarem os motivos que haviam originado aquela intenção de liquidação oficiosa, o valor sobre o qual o imposto incidiria, a taxa aplicável e o valor final do imposto a pagar.
Mas sem razão.
Senão vejamos.
Como dimana do aludido ponto D) do probatório o ofício não apenas esclarece qual a operação que sustentaria essa liquidação oficiosa, esclarecendo que a mesma se reportava à fração autónoma a que correspondia o R/C C - Lote A4 do prédio sito na Rua ....................., nº 120, em Lisboa, atualmente inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …………………… sob o artigo …..- "C. Mais identificava a existência dum contrato-promessa celebrado pelo Recorrente com a sociedade P................. – INVESTIMENTOS ………….. LDA, NIPC. ……………, a respetiva data e o preço acordado, como mencionava que tendo sido outorgada uma escritura de compra e venda da mencionada fração em data posterior - 2001/06/20 -, que havia tido como contratantes a aludida sociedade e Pedro …………….. pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 2º, § 2º do CIMSISD, consideravam ter existido um ajuste de revenda, pelo que o imposto deveria ter sido pago nos 30 dias subsequentes aquela escritura, em obediência ao disposto no nº 4 do art. 115º do já citado código.
Ou seja, do mencionado ofício constava não apenas o facto tributário que, na opinião da AT, se encontrava sujeito a tributação, fazendo-se menção expressa aos dispositivos legais ao abrigo dos quais ancoravam a sua pretensão, como indicavam o valor do negócio sobre o qual era devido imposto.
É verdade que deste ofício não constavam nem a taxa, nem o valor do imposto apurado, no entanto, tais elementos para além de constarem da lei, resultam da mera realização de operações aritméticas nada pudendo ser aduzido quanto a elas pelo contribuinte que fosse capaz de alterar o conteúdo do ato de liquidação concreto.
Significa isto que, mesmo que se considerasse que do projeto de decisão a notificar ao Recorrente deveriam constar as taxas concretas aplicáveis, bem como o valor efetivo do imposto a pagar, o que não se concede, sempre seria de considerar que tais faltas não acarretariam a preterição da formalidade essencial pois, ao abrigo do princípio do aproveitamento do ato, num juízo de prognose póstuma, sempre se poderia afirmar no que a estes elementos concretos respeita, que outro não poderia ser o conteúdo do ato impugnado pelo que a preterição da formalidade aqui em apreço se degradaria numa formalidade não essencial que não conduziria à anulação do ato.
Assim sendo, tendo o Tribunal a quo julgado não verificada a preterição desta formalidade, nenhuma censura merece o decidido, embora com a presente fundamentação.

*
CUSTAS
No que diz respeito à responsabilidade pelas custas do presente Recurso, atendendo ao seu total decaimento, as custas são da responsabilidade do Recorrente. [cfr. art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT].

***




III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul julgar negar provimento ao presente recurso, confirmando-se a sentença recorrida.


Custas pelo Recorrente.


Lisboa, 26 de Junho de 2025

Cristina Coelho da Silva (Relatora)

Patrícia Manuel Pires

Teresa Costa Alemão