Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1082/09.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/18/2025
Relator:ISABEL SILVA
Descritores:AMORTIZAÇÃO DE TRESPASSE
DEPERECIMENTO TOTAL
TEMPESTIVIDADE DO PEDIDO DE AMORTIZAÇÃO
Sumário:I. O Trespasse, apenas excecionalmente - em caso de deperecimento efetivo devidamente comprovado, reconhecido pela DGSI-, poderia ser amortizável enquanto elemento do ativo imobilizado incorpóreo, nos termos do artigo 17º nº 3 do DR 2/90 de 12.01.

II. O reconhecimento referido em I) teria de ser dirigido à DGSI, tempestivamente, nos prazos referidos no artigo 10º nº 3 do citado DR 2/90 de 12.01.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
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Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

Vem a FAZENDA PÚBLICA, ( ora recorrente), apelar para este Tribunal Central Administrativo, da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a ação administrativa especial, deduzida pela recorrida Z........, LDA S.A, visando a anulação do despacho proferido pela AT, que indeferiu, por intempestividade, ao abrigo do artigo DR 2/90, o pedido de aceitação como custo fiscal no exercício de 2005, o montante de €349.159,00, respeitante ao deperecimento total do valor económico de um trespasse.

A Recorrente apresentou na sua alegação recursiva as seguintes conclusões: “

A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta Sentença, que anulou a decisão da Exma. Senhora Chefe de Divisão de Administração I da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas que indeferira, por intempestividade, o pedido de aceitação como custo fiscal no exercício de 2005 do montante de € 349.159,00, respeitante ao trespasse de um estabelecimento comercial que adquirira em 1991 e totalmente amortizado em exercícios anteriores.

B. Ao assim decidir a douta sentença recorrida fez uma deficiente apreciação dos factos trazidos aos autos, procedendo a uma incorrecta interpretação e aplicação dos arts.10° e 17° do DR n° 2/90, de12 de Janeiro.

C. No caso dos autos, em 23.02.2006, a ora Recorrida apresentou o pedido de reconhecimento do deperecimento do trespasse, para efeitos fiscais, nos termos do disposto na al a) do n°3 do art. 17° do DR 2/90, de 12 de Janeiro, de modo a possibilitar o abate do valor respectivo ao imobilizado e permitir que as amortizações praticadas sejam aceites como custo fiscalmente dedutível no exercício de 2005.

D. O pedido foi liminarmente indeferido por não ter sido observado o prazo constante no n°3, do art. 10° do DR n°2/90, de 12 de Janeiro, na redação dada pelo DR 16/94, de12 de Julho, vigente à data em que ocorreu a desvalorização excepcional.

E. Isto porque, tendo ocorrido a cedência da posição contratual de arrendamento integrante do trespasse em 30.04.2005, o pedido para o reconhecimento foi formulado apenas em 23.02.2006, ou seja, muito para lá do fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional.

F. Com todo respeito, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, o entendimento vertido na decisão de indeferimento consubstancia uma correcta interpretação da al a), do n°3, do art 10° do DR 2/90, bem como do seu art. 17°.

G. Como se sabe, o trespasse consiste na transferência de um estabelecimento comercial ou industrial e abrange normalmente todos os seus elementos que o compõem, integra o activo imobilizado enquanto activo incorpóreo.

H. Ora, o n°1 do DR n°2/90, de 12 de Janeiro, dispõe que podem ser objecto de reintegração e amortização os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento.

I. A douta sentença recorrida analisa bem ao considerar que, em regra, o trespasse não é amortizável por não estar sujeito a esse deperecimento, ou seja, por não ser um bem susceptível de perder gradualmente o seu valor, o que é de fácil assimilação se tivermos em conta que como os imóveis, com os trespasses, também em regra, se transmitem os móveis dele integrantes, têm tendência a valorizar com o decurso do tempo, ao contrário dos bens móveis. 

J. Efectivamente, a regra é, nos termos do art. 1° do DR 2/90, de 21 de Janeiro, a do trespasse não poder ser deperecido ou, preferencialmente, depreciável. Todavia, esta não é uma regra rígida.

L. Com efeito, pode ocorrer uma perda fruto da alienação de um trespasse, perda que há que filtrar à luz do art. 23° do CIRC, e nesse caso, a mesma é apurada de acordo com as regras enunciadas no art. 43° do CIRC que consagram o regime das mais e menos valias.

M. Podendo ainda acontecer que essa perda seja total, por exemplo se se tornar inviável a sua alienação, o que seria o caso como alega a Recorrida, e então o custo da mesma só poderá ser reconhecido quando seja igualmente reconhecido o deperecimento efectivo sob a forma de amortização.

N. Sendo que o n°3 do art. 17° do DR n° 2/90 preveja, a título excepcional, a depreciação do trespasse sempre que, a pedido dos sujeitos passivos, a depreciação efectiva seja devidamente comprovada e reconhecida pela AT.

O. Ora, não é o caso dos autos, ao contrário do que pretende a Recorrida e entendeu a sentença recorrida.

P. Foi ao abrigo do transcrito art 17° que a Recorrida apresentou o pedido em causa nos autos.

Q. Tal norma, contudo, não é aplicável ao pedido formulado pela Recorrida, contrariamente ao decidido pela douta sentença recorrida.

R. Atendendo ao teor dos artigos 10° e 17° do DR n°2/90, na redacção dada pelo DR 16/94, de 12 de Julho, ressalta das normas transcritas que têm campos de aplicação distintos e que apenas o n°3 do art. 10° indica um prazo aos sujeitos passivos para estes requererem as desvalorizações do activo imobilizado, mediante exposição devidamente fundamentada, até ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional.

S. Coloca-se, por conseguinte, a questão de saber se as imobilizações incorpóreas integram, a par das imobilizações corpóreas, os elementos do activo imobilizado.

T. A lei não define elementos do activo imobilizado, mas fá-lo a doutrina. Assim, por exemplo, segundo Rogério Fernandes, in Balanços, I, p.203, "A designação de imobilizações, na contabilidade, assenta no facto de os empates de capital nestes elementos patrimoniais (corpóreos e incorpóreos) se manterem indisponíveis para venda, por se encontrarem em utilização, de reserva ou a proporcionar rendimentos periódicos na empresa considerada”.

U. Sendo que o imobilizado incorpóreo engloba os valores imobilizados que não têm representação material e o imobilizado corpóreo compreende todos os elementos materiais que se encontram em condições de contribuir para a produção de bens ou serviços e que se destinam a permanecer na empresa de forma duradoura e no mesmo estado.

V. Por outras palavras, o activo imobilizado é formado pelo conjunto de bens e direitos necessários à manutenção das actividades dos sujeitos passivos e compreende quer os activos tangíveis que são mantidos para serem usados na produção ou na comercialização de mercadorias ou serviços, quer os activos intangíveis (como marcas, patentes, trespasses).

X. Nessa medida, o art. 10° do DR n° 2/90, sob a epígrafe “Desvalorizações excepcionais de elementos do activo imobilizado”, reporta-se às desvalorizações excepcionais, quer dos elementos corpóreos, quer dos elementos incorpóreos, nos quais se inclui o trespasse. 

Y. O conceito de excepcionalidade constante da norma visa relevar aquela circunstância que, a ocorrer, não torna possível a amortização ou o deperecimento segundo os métodos-regra previstos no art. 4° do DR 2/90 e, desse prisma, não há dúvida que a desvalorização em apreço consubstancia uma desvalorização excepcional porquanto é uma desvalorização não resultante desses métodos.

Z. Decorrentemente, aplicando-se o n° 3, do art. 10°, de natureza instrumental, às desvalorizações do activo imobilizado, será de aplicar, por maioria de razão, a todos esses activos, independentemente de serem elementos corpóreos ou elementos incorpóreos.

AA. Por outro lado, não se afigura de aplicar a segunda parte do n°3 do art. 10° que refere que,” salvo em casos comprovadamente justificados, e como tal reconhecidos por despacho do Ministro das Finanças, em que essa exposição poderá ser entregue até ao fim do primeiro mês seguinte ao do termo do período de tributação em que tiverem ocorrido as desvalorizações excecionais"

BB. Ora, há que ter interpretar articuladamente todo o art. 10° do DR n°2/90.

CC. Com efeito, o n°3 do art. 10° remete para o seu n°1, que especifica a origem das desvalorizações excepcionais: “ desvalorizações (...) provenientes de causas anormais (...) devidamente comprovadas"; Referindo o n°2, a título meramente exemplificativo, como causas anormais “as desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas".

DD. Sendo que as várias situações justificativas de tais desvalorizações contêm um denominador comum - a ocorrência de uma circunstância excepcional, para cuja formação não concorre a vontade dos sujeitos passivos. 

EE. É manifesto que não é o caso dos autos, porquanto, a Recorrida, ao ceder a sua posição contratual que motivou a alegada depreciação do trespasse, agiu voluntária e conscientemente e não em estado de necessidade para a concretização do negócio jurídico.

FF. Decorre assim que inexiste qualquer improbabilidade, acaso ou imprevisibilidade na cedência da posição contratual da Recorrida passível de se subsumir no n°1 do referido art. 10° e, nessa medida, não tem aplicação o prazo estipulado na segunda parte do n°3 do mesmo preceito legal.

GG. Neste sentido pronuncia-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11.02.2011, proferido no processo n° 0719/11, como se extrai da transcrição do Artigo 39° do corpo das presentes Alegações, e se evidenciou nos subsequentes Artigos 40°, 41°° e 42°.

HH. Por outro lado, não se pode deixar de salientar que tendo a Recorrida solicitado a relevação de um gasto, não carreou para os autos nenhum elemento susceptível de comprovar o valor contabilizado como trespasse só tendo procedido à sua quantificação.

II. Ora, não se podendo conhecer o deperecimento do activo, não se poderá, poderá reconhecer o custo no montante de € 349.159,00.

JJ. Nessa medida, ainda que o pedido da ora Recorrida tivesse sido apresentado dentro do prazo, esse custo também não poderia ser reconhecido à luz da al g), do n°1 do art. 23° do CIRC que dispõe que se consideram “gastos os que que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeito a a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente (...), alg) Depreciações e amortizações ”.

LL. Saliente-se que não está em causa nos autos uma amortização que pudesse ter enquadramento no n°3, do art.° 17.° do DR 2/90, já que aí se enquadram as amortizações que traduzissem perdas de valor, com carácter repetitivo, resultantes, designadamente, da utilização do ativo ou do decurso do tempo, mas não de causas anormais, como a do caso concreto, sendo, por essa razão, despicienda e inútil a indicação de qualquer prazo.

MM. No caso sub judice, não tem aplicação o art. 17° do DR n° 2/90.

NN. De referir, ainda, que, contrariamente ao considerado na douta sentença recorrida, o entendimento da Recorrente vertido na decisão impugnada não integrou qualquer lacuna da lei simplesmente porque inexiste tal lacuna, nem recorreria a nenhuma analogia, como acima se evidenciou.

OO. O que está previsto na lei é a existência de um único prazo, uma vez que a realidade que visa abranger é tão-somente a desvalorização ou o deperecimento excepcional dos bens do activo imobilizado, independentemente da natureza dos elementos que o integram.

PP. No caso dos autos, está em causa uma desvalorização excepcional do activo intangível, pelo que seria de aplicar o disposto no art. 10.° do DR n° 2/90, de 12 de Janeiro, com a redação dada pelo DR n° 16/94, de 12 de Julho.

QQ. Tratando-se de uma amortização extraordinária, cuja aceitação a obter por parte da AT deveria ser solicitada no prazo previsto no n.° 3 daquele artigo.

RR. Por todo o exposto, é de concluir que a Decisão proferida pela Senhora Chefe de Divisão de Administração I da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas não enferma de nenhuma ilegalidade, porquanto consubstancia uma correcta interpretação e aplicação do n°3, do art. 10° do DR n°2/90, de 21 de Janeiro, na redacção dada pelo DR n° 16/94, de12 de Julho, bem como do art. 17° do mesmo diploma legal, contrariamente ao julgado pela douta sentença recorrida. 

Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas Doutamente suprirão, deve ser revogada a dota sentença recorrida, e, em consequência, deve ser mantida a Decisão impugnada nos autos de acção administrativa especial, proferida pela Senhora Chefe de Divisão de Administração I da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, com todas as legas consequências.


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Notificada, a Recorrida apresentou contra-alegações, aí concluindo nos termos que segue:

A. A sentença proferida pelo Tribunal a quo julgou procedente a Acção Administrativa Especial apresentada pela RECORRIDA e anulou a decisão impugnada, por vício de violação de lei, (erros sobre os pressupostos de facto e de direito), pelo facto de o artigo 17º nº 3 do Decreto-Regulamentar nº2/90, de 12 de Janeiro não prever nenhum prazo para a apresentação do pedido de aceitação, como custo fiscal, no exercício de 2005, do montante de EUR. 349.159,00, referente a uma amortização/reintegração extraordinária de um elemento do activo imobilizado corpóreo (trespasse), não podia a RECORRENTE aplicar, sem mais, o artigo 10º nº 3 do indicado diploma, e assim indeferir liminarmente o referido pedido;

B. Com efeito, embora o indicado artigo 17.º nº 3 não preveja nenhum prazo, tal facto não permite que a RECORRENTE, sem mais, recorra ao prazo previsto noutra disposição legal ( o artigo 10), e assim integre, com recurso à analogia, uma eventual lacuna ou omissão de um prazo naquela disposição legal, o que lhe é vedado pelo artigo 11ºnº 4 da LGT, e confirmado pelo Tribunal a quo ao confirmar que: “(...). Assim, a Entidade Demandada não poderia indeferir liminarmente o requerimento em apreço pela aplicação do artigo 10º nº 3 do diploma em apreço, sem mais, por violação do princípio constitucional da legalidade tributária, uma vez que as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia. (…).”(cfr. pág. 17 da sentença recorrida, a fls. (...));

C. Pelo que, como o supracitado artigo 17º 3 não prevê qualquer prazo, nem era lícito à RECORRENTE aplicar o prazo previsto no aludido artigo 10º nº3, com recurso à analogia, nada mais resta concluir do que, quanto a este ponto, pela inexistência do erro de julgamento de facto e de direito assacado e apontado pela RECORRENTE à douta sentença colocada em crise com o presente Recurso, o que implicará a final, e, por conseguinte, a improcedência do Recurso e a manutenção na ordem jurídica da decisão recorrida nos precisos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quo;

D. Ainda que se entenda - o que só necessidade de raciocínio se admite e sem condescender - que a norma do indicado artigo 10.º n.º3 fosse aplicável, a segunda parte desta disposição legal prevê que, nos “(…) casos comprovadamente justificados (..o pedido deve ser apresentado até ao fim do primeiro mês seguinte ao do termo do período de tributação em que tiverem ocorrido as desvalorizações excecionais, pelo que, como o período de tributação da RECORRIDA não coincide com o ano civil - (vai de 01 de Fevereiro a 31 de Janeiro do ano seguinte -), o pedido podia ser apresentado até ao fim do mês de Fevereiro de 2006, como veio efectivamente a suceder, sendo tempestivo e destruindo o fundamento da intempestividade da RECORRENTE;

E. A RECORRENTE considera ainda, em termos muito sintéticos, que o pedido apresentado pela RECORRIDA deveria ter sido apresentado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10ºdo Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro e não do seu artigo 17º nº 3, como efectivamente veio a suceder;

F. Conforme correctamente confirmado pelo Tribunal a quo, o âmbito de aplicação e a previsão de cada uma das normas é radicalmente diferente;

G. Com efeito, o artigo 10º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, refere- se à possibilidade de aceitação, desde que autorizado pela AT, de amortizações ou reintegrações mais elevadas e, portanto, superiores às normais e que já estavam a ser praticadas, com fundamento na ocorrência de causas anormais, devidamente comprovadas, e resultantes de desastres, fenómenos naturais, inovações técnicas excecionalmente rápidas. Isto é, respeita a bens que já eram ou já estavam a ser previamente amortizados ou reintegrados;

H. Por seu turno, o artigo 17.º n.º 3 alínea a) do Decreto-Regulamentar n.º2/90, de 12 de Janeiro, é aplicável a bens não suscetíveis de amortização ou reintegração, precisamente como o trespasse objeçto do presente processo, por não perder valor pelo uso ou pela passagem do tempo, e apenas quando se verifique o seu deperecimento efectivo;

I. No caso em apreço, como a RECORRIDA se viu impossibilitada de proceder ao trespasse, (mas apenas à cessão da posição contratual do contrato a favor da Z........, Unipessoal, Lda.), foi nesse momento que se verificou o deperecimento efectivo do trespasse e devidamente comprovado;

J. Neste contexto, uma vez que o trespasse não era amortizável, por não ser um bem suscetível de perder gradualmente o seu valor, e por se ter verificado o seu deperecimento efetivo,constata-se que o pedido foi corretamente formulado e enquadrado pela RECORRIDA no artigo 17.º n.º3 do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, nada mais restando concluir do que, quanto a este ponto, pela inexistência do erro de julgamento de facto e de direito assacado e apontado pela RECORRENTE à douta sentença colocada em crise com o presente Recurso, o que implicará a final, e, por conseguinte, a improcedência do Recurso e a manutenção na ordem jurídica da decisão recorrida nos precisos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quer,

TERMOS EM QUE, COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXAS., DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, POR NÃO SE VERIFICAR O ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO E DE DIREITO QUE LHE É IMPUTADO PELA RECORRENTE, O QUE IMPLICARÁ, POR CONSEGUINTE, A CONFIRMAÇÃO E A MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA NOS PRECISOS TERMOS EM QUE FOI PROFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO, TUDO COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, ASSIM FAZENDO VOSSAS EXCELÊNCIAS, VENERANDOS JUÍZES DESEMBARGADORES, A COSTUMADA JUSTIÇA.“


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Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul (artigo 146º do CPTA, ex vi artigo 2º al. c) do CPPT), o qual emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento.

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II -QUESTÕES A DECIDIR:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT].
Nesta conformidade, cabe apreciar e decidir se, a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 10º nº 3 1ª parte e 17º nº 3 al. a) do Decreto Regulamentar 2/90 de 12 de janeiro, desde logo ao concluir que a pretensão da recorrida (reconhecimento do deperecimento do trespasse como custo) teria de ser apresentada dentro do prazo estabelecido no artigo 10º nº 3, primeira parte, do citado DR.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:”

1. A Impugnante requereu à Entidade Demandada a aceitação como custo fiscal, no exercício de 2005, do montante de amortizações praticadas, em exercícios anteriores, sobre o trespasse de um imóvel nos seguintes termos: (cfr.prova documental documento n°3 junto com a petição inicial)


“(texto integral no original; imagem)”

2. A Entidade Demandada notificou a Entidade Demandada do seguinte: ( cfr. prova documental documento n°6 junto com a petição inicial)

“(texto integral no original; imagem)”

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A decisão recorrida consignou ainda, quanto aos factos considerados não provados, o seguinte:

“Não se detecta a alegação de factos essenciais relevantes para a decisão da causa que devam ser considerados como não provados.”


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O Tribunal recorrido motivou, do modo seguinte, a factualidade apurada:

“Quanto aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na análise da prova documental constante dos autos e do PA apenso, conforme especificado em cada uma das alíneas supra Para convicção do Tribunal, na delimitação da matéria de facto supra provada, foi decisivo o conjunto da prova produzida, analisada individualmente e no seu conjunto.

Designadamente nos documentos não impugnados juntos aos autos, referidos nos “factos provados”, com remissão para as folhas do processo onde se encontram, bem como à posição das partes sobre a matéria alegada.”


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IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
Tal como avançamos, a este Tribunal cabe analisar e decidir se a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito na aplicação e interpretação dos artigos 10º nº 3 e 17º nº 3 do DR 2/90, ao decidir que o pedido formulado pela Autora junto da recorrida era intempestivo, por não decorrer do artigo 17º nº 3 daquele DR qualquer prazo para apresentação do pedido da Autora/recorrida para reconhecimento, como custo, do valor de 349.159,00 EUR, referente ao alegado deperecimento total do valor económico do trespasse (enquanto ativo imobilizado incorpóreo), efetuando-se o respetivo abate do mesmo (trespasse) no imobilizado.
O Tribunal recorrido, acompanhado o entendimento da recorrida, na PI, entendeu que aquele pedido de “abate” no imobilizado do valor do trespasse não era de aplicar o prazo estabelecido no artigo 10º nº 3, 1ªa parte, por isso andou mal ao decidir que o mesmo (requerimento) era intempestivo, visto não decorrer do artigo 17º nº 3 do DR 2/90, qualquer prazo.
Consultando a decisão recorrida, ajuizou o Tribunal a quo, após discorrer sobre a natureza dos custos aqui em causa, sobre as regras normais de amortização e de enunciar que o trespasse não era, por regra, abrangido pela amortização/reintegração, nos termos do disposto no artigo 17º nº 3 do DR 2/90, que, in casu, a entidade demandada não podia indeferir, por intempestividade, o requerimento da Autora, com base nos artigos 10º e 17º do DR 2/90, por inexistir qualquer prazo imposto pelo artigo 17º nº 3 do DR 2/90 a autorizar tal conclusão, não sendo de aplicar o prazo vertido no artigo 10º do citado DR.
Nas contra-alegações a recorrente secunda o entendimento do Tribunal a quo, acrescentando que, ainda assim, de acordo com a segunda parte do consagrado no nº 3 do artigo 10º do DR 2/90, sempre o requerimento por si apresentado estaria em tempo.
Apreciando.
Sobrevoando a decisão recorrida consta da mesma o seguinte:
“(…)
O trespasse em regra não é amortizável ( cfr. artigo 17º nº3 a) do diploma em apreço) por não estar sujeito a esse deperecimento, ou seja, por não ser um bem susceptível de perder gradualmente o seu valor.
Na verdade, os trespasses têm tendência a valorizar com o decurso do tempo ao contrário do que ocorre com os bens móveis utilizados na produção da sociedade comercial.
Todavia, tal pode não acontecer, por exemplo no caso de se tornar inviável a alienação do trespasse.
De modo, a precaver as mencionadas situações o legislador prevê que em casos devidamente comprovados possa ser aceite como custo fiscal o valor do deperecimento do trespasse (cfr. artigo 17º nº3 a) do diploma em apreço).
Será que tal pedido tem de ser efectuado até ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional, para além dos restantes casos devidamente comprovados, como considerou a Entidade Demandada ( cfr. facto provado nº2) ao indeferir liminarmente o pedido apresentado pela Impugnante?
A resposta decorrerá da interpretação do artigo 10º e do artigo 17º do diploma em apreço. (…)” para depois concluir, apelando às regras de interpretação normativa, que, através do elemento literal, que: “(…) no artigo 17º não se encontra expresso qualquer prazo para ser requerido à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos a autorização para amortização do valor referente ao trespasse, nos casos em que seja possível.”.
Prossegue, afirmando que: “É certo que trata-se de uma situação excepcional como se depreende do elemento literal do mencionado artigo. Mas, a excepcionalidade conforme supra exposto decorre da normalidade de que o trespasse valoriza com o decurso do tempo.
Ao invés, no artigo 10º do mencionado diploma, a excepcionalidade aí estipulada reside noutro factor ( cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 2 de Novembro de 2011 proferido nos autos nº0719/11).
(…)
Exemplificando o legislador no n.º 2 do artigo 10.º do DR 2/90 que o mencionado regime aplica-se, designadamente, às desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas.
Assim, a Entidade Demandada não poderia indeferir liminarmente o requerimento em apreço pela aplicação do artigo 10ºnº3 do diploma em apreço, sem mais, por violação do princípio constitucional da legalidade tributária, uma vez que as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia (cfr .Acórdão do.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012,proc.5320/12; Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7073/13; Acórdão do.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.7384/14).
Procedendo, assim o vício invocando, sem necessidade de se conhecer o vício alegado a título subsidiário”.
Não podemos acompanhar o assim decidido.
Esclarecemos, porque assim o entendemos.

Como se vê do probatório, que não está posto em causa, em 22. 02.2006, a Autora/recorrida solicitou à AT, ao abrigo do nº 3 do artigo 17º do DR. nº 2/90 o reconhecimento, como custo fiscal de 2005, do montante de 349.159,00EUR, resultante do deperecimento total e efetivo do valor económico do trespasse que, em 1991 pagara, no valor de 349.159, 00EUR, o qual perdera por completo o valor, devendo efetuar-se o abate do aludido trespasse no imobilizado (amortização/reintegração de imobilizado incorpóreo).

Não obstante o mérito da pretensão, aquele pedido de “abate” foi indeferido por intempestividade, tendo o Tribunal recorrido decidido anular aquela decisão de intempestividade (naturalmente, sem apreciar o mérito da pretensão), por essa razão, não cabe analisar os contornos do trespasse, se é ou não um verdadeiro trespasse, etc, o que não foi objeto de análise pelo Tribunal.

O que nos cabe analisar e decidir é se o tribunal andou bem, ou não, ao entender que o despacho da AT era ilegal ao rejeitar o mesmo por intempestividade por não se aplicar o prazo vertido na 1ª parte do artigo 10º nº 3 do DR 2/90, nos termos em que o ajuizou.

Prosseguindo.

A amortização de um ativo imobilizado, como sabemos, consiste em registar, de forma sistemática, a perda do valor daquele bem, repartindo o custo de uma imobilização pelos exercícios abrangidos pela sua vida útil ou duração económica.

O artigo 23º nº 1 al. g) e artigo 28º do CIRC consideram que as amortizações são custos, indispensáveis, os quais são dedutíveis de acordo com a regra geral das quotas constantes (artigo 28º nº 1, 29º nº 3 e 33º nº 1 al. c), do CIRC), embora a lei preveja que, em situações excecionais, aquele valor possa ser superior ao das quotas constantes, nomeadamente em situações de desvalorização excecional derivada de causas anormais, devendo, nessas situações ser obtida prévia autorização da DGSI (artigos 29º nº 3 a 5 al. b), 30º e 33º, do CIRC, e artigo 10º do DL 2/90 de 12.01), para comprovar essa realidade (vd. neste sentido o acórdão do TCAS prolatado no processo nº º 362/09.4BELRS em 15.07.2025).
Na verdade, só podem ser aceites como custos as amortizações que obedecerem aos limites previstos na lei, e fora desses limites apenas podem ser aceites as amortizações que configurem uma desvalorização excecional proveniente de uma causa anormal. Como tal, para levar a custos essa amortização, a Autora tinha impreterivelmente de ter solicitado à AT a consideração daquela amortização como custo fiscal do exercício pretendido (2005). Isto, porque, à luz do regime legal só há duas opções:
(i) a amortização situa-se dentro dos limites previstos nos artigos 28º a 32.º do Código do IRC e 4.º a 9.º do DR n.º 2/90;
(ii) ou, não se situando dentro desses limites, a AT autoriza que a mesma seja considerada como custo do exercício, nos termos permitidos pelo artigo 10.º, n.ºs 1 e 3 do DR n.º 2/90.

Efetivamente, estabelece o CIRC, na redação em causa à data dos factos, no artigo 23º nº 1 al. g) que, as reintegrações e amortizações consideram-se custos ou perdas desde que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Estatuindo, ao mesmo passo, o artigo 28º nº 1 do CIRC que: “são aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do ativo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas

Paralelamente, o artigo 29º do CIRC, no que tange ao método de cálculo das reintegrações e amortizações, estabelece que:

1 – O cálculo das reintegrações e amortizações do exercício deve fazer-se, em regra, pelo método das quotas constantes.

2 – Os sujeitos passivos do IRC podem, no entanto, optar, para o cálculo das reintegrações do exercício, pelo método das quotas degressivas relativamente aos elementos do ativo imobilizado corpóreo que:

a) Não tenham sido adquiridos em estado de uso;

b) Não sejam edifícios, viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, exceto quando afetas a empresas exploradoras de serviço público de transporte ou destinadas a ser alugadas no exercício da atividade normal da empresa sua proprietária, mobiliário e equipamentos sociais.

3 – Podem, ainda, ser utilizados métodos de reintegração e amortização diferentes dos indicados nos números anteriores quando a natureza do deperecimento ou a atividade económica da empresa o justifiquem, após reconhecimento prévio da Direcção-Geral dos Impostos.

4 – Em relação a cada elemento do ativo imobilizado deve ser usado o mesmo método de reintegração e amortização desde a sua entrada em funcionamento até à sua reintegração ou amortização total, transmissão ou inutilização.

5 – O disposto no número anterior não prejudica:

(…)

b) A consideração como custos de quotas de reintegração ou amortização superiores devido à superveniência de desvalorizações excecionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas, aceites pela Direcção-Geral dos Impostos.

(…)”

Por outro lado, decorre do artigo 33.º, n.º 1, al. c) do mesmo CIRC que não são aceites como custos as amortizações que excedam os limites legais.

Definindo o CIRC o quadro de referência quanto a este tipo de custos com amortizações e reintegrações, o próprio CIRC remeteu para o diploma regulamentar – DR nº 2/90 de 12.01-, o desenvolvimento técnico do respetivo regime, desde logo tendo em conta o estabelecido no artigo 29º do CIRC.

Para efeitos de reintegrações e amortizações, para efeitos do IRC, é imperioso consultar o Decreto Regulamentar (DR) n.º 2/90, de 12.01.

Assim, a regulamentação do regime das reintegrações e amortizações, vazada no DR 2/90, começa por enunciar as condições gerais da sua aceitação para efeitos fiscais (artigo 1.º) e pela concretização, em termos de valorimetria, da respetiva base de cálculo (artigo 2.º), trazendo uma noção de período de vida útil (artigo 3.º).

Dos métodos de cálculo das reintegrações e amortizações que é possível utilizar (artigo 4.º) destaca-se o método geral - método das quotas constantes (artigo 5.º), e aquele que pode resultar, em certos casos, de uma opção dos contribuintes - método das quotas degressivas (artigo 6.º). Quanto a este último, com vista a possibilitar a reintegração total do bem dentro do período de vida útil correspondente, indica-se o modo de cálculo das quotas de reintegração que podem ser praticadas nos últimos anos desse período.

As quotas de reintegração e amortização são, em regra, anuais e constantes.

O DR 2/90 acolheu o princípio da uniformidade dos métodos de reintegração e amortização, esclarecendo o artigo 8º o seu alcance, apesar de ser possível, nos casos de utilização intensiva dos elementos patrimoniais, se poder aceitar uma quota superior à máxima que puder ser praticada de acordo com o método que estiver a ser utilizado (artigo 9.º), regulando a faculdade de se poderem aceitar reintegrações ou amortizações mais elevadas devido à ocorrência de desvalorizações excecionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas (artigo 10.º).

Dos normativos transcritos decorre, tal como o dissemos já, que, considerando o artigo 23º nº 1 al. g) e artigo 28º do CIRC, que as amortizações são custos, indispensáveis, aqueles são dedutíveis ao lucro tributável de acordo com a regra geral das quotas constantes (artigo 28º e 29º nº 1 e 3 e 33º nº 1 al. c) do CIRC) e, em situações excecionais, aquele valor pode ser superior ao das quotas constantes, desde logo em situações de desvalorização excecional derivada de causas anormais, devendo, nessas situações ser obtida prévia autorização da DGSI (artigo 29º nº 5 al. b) e artigo 10º do DL 2/90 de 12.01), para constar essa realidade.

Por assim ser é que o artigo 33º, n.º 1, al. c) do CIRC consagra que, não são aceites como custos as amortizações que excedam os limites legais, na medida em que não é essa a regra geral (mas da amortização de acordo com as quotas constantes – artigo 29º CIRC).
Na situação trazida, pretendia a recorrida, com o requerimento apresentado à entidade demandada e que veio a ser indeferido por intempestividade (que o Tribunal recorrido anulou), obter autorização para deduzir o montante do trespasse por deperecimento total, tratando-se de um ativo não realizável.

À luz do DR 2/90, em que a Autora/recorrida, formulou o seu requerimento para autorização da inclusão, nos custos de 2005, do valor do trespasse (por perda total do seu valor económico em abril de 2005), evidencia-se que, o cálculo das amortizações do exercício económico deve fazer-se, por regra, pelo método das quotas constantes (cf. artigos 29.º, n.º 1 do Código do IRC e 4.º, n.º 1 do DR n.º 2/90), e só assim não será nas hipóteses elencadas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 29.º do Código do IRC e 4.º, n.ºs 2 e 3 do DR n.º 2/90.

Assim, o cálculo das amortizações de imobilizado incorpóreo aqui em causa deve, prima facie, efetuar-se pelo método das quotas constantes, uma vez que essa é a regra. Neste método, a quota de amortização é a mesma todos os anos.

Mas, o que em causa está é um trespasse que a Autora solicitou à AT que fosse aceite a sua amortização excecional, face ao alegado deperecimento total.

Como visto, a regra geral (quotas constantes) só pode ser quebrada no caso de se verificarem desvalorizações excecionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas, desde logo porque, uma determinada amortização só pode ser fiscalmente aceite como custo do exercício se não exceder os limites impostos legalmente, exceto se for considerada pela AT uma desvalorização excecional adveniente de uma causa anormal.

A enumeração das causas anormais constante no n.º 2 do artigo 10º do DR n.º 2/90 é meramente exemplificativa, como desde logo se percebe pela utilização do advérbio “designadamente”.

Tratando-se de uma enumeração exemplificativa e sendo a condição imposta pelo legislador a de que a desvalorização excecional seja proveniente de uma causa anormal, caberá à Administração Fiscal, perante cada caso concreto que lhe seja apresentado pelo contribuinte, nos termos do artigo 10.º, n.º 3 do DR n.º 2/90, avaliar se a desvalorização em questão é, ou não, proveniente de uma causa anormal.

In casu, está em causa um alegado trespasse sem valor económico, decorrendo do artigo 17º nº 3 al. a) do DR 2/90 que aquele tipo de imobilizado incorpóreo (Trespasse), por regra, não é amortizável, exceto em caso de deperecimento efetivo, devidamente comprovado e reconhecido pela DGSI.

Ora, este prévio reconhecimento da DGSI implica que seja feito um requerimento junto da mesma para poder analisar essa pretensão de modo a aferir se é de acudir à inclusão (excecional) nos custos de amortização/reintegração (in casu, do exercício económico de 2005), obedecendo, naturalmente, ao prazo consagrado no artigo 10º nº 3 do mesmo diploma regulamentar.

Por isso, não podemos acompanhar a decisão recorrida quando apregoa que não tinha aplicação o prazo estabelecido no artigo 10º nº 3 do DR 2/90, como se fosse permitido, a todo tempo, solicitar aquele acréscimo de custos/amortizações/reintegrações, quando, o artigo 17º nº 3 al. a) se deve compaginar com o vertido no artigo 10º nº 3 do mesmo DR donde decorre que:

1 - No caso de se verificarem em elementos do activo imobilizado desvalorizações excepcionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas, poderá ser aceite como custo ou perda do exercício em que aquelas ocorrem uma quota de reintegração ou amortização superior à que resulta da aplicação dos métodos referidos no artigo 4.°

2 - O regime estabelecido no número anterior aplica-se, designadamente, às desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas.

3- Para efeitos do disposto no n.° 1 deverá o contribuinte obter a aceitação da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos através de exposição devidamente fundamentada até ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional, salvo em casos comprovadamente justificados, e como tal reconhecidos por despacho do Ministro das Finanças, em que essa exposição poderá ser entregue até ao fim do primeiro mês seguinte ao do termo do período de tributação em que tiverem ocorrido as desvalorizações excepcionais.

Por tudo que deixamos exposto, assuma concluir que, ao ter apresentado o requerimento em fevereiro de 2006, estando em causa uma “perda”/deperecimento alegadamente verificado em abril de 2005 (Cf. ponto 08) do requerimento da Autora vertido nos factos provados), já se havia esgotado o prazo de um mês após a sua verificação (artigo 10º nº 3, 1ª parte), como se decidira, e bem, no despacho posto em crise na decisão recorrida.

A este respeito, veja-se o acórdão deste TCAS, prolatado no processo nº 1280/07.6BELSB em 11.02.2021, o qual, com as devidas adaptações, é de aplicar ao caso sujeito, onde se sumariou que:

“I. O n.º 3 do art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro, determinava que o contribuinte requeresse a aceitação como custo até ao fim do primeiro mês da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excecional”.

Na verdade, de acordo com o citado normativo a situação aqui em causa estava dependente do requerimento à DGSI no prazo estabelecido na primeira parte do nº 3 do artigo 10º do DR 2/90 (e não já na parte final em que o prazo é mais alargado e relaciona-se com situações comprovadamente justificados, e como tal reconhecidos por despacho do Ministro das Finanças, reconhecimento aqui inexistente nem alegado).

Por se assim, importa concluir que o recurso terá de proceder, ficando prejudicado o demais alegado, sendo certo que, muitas das questões colocadas no recurso não foram apreciadas pelo Tribunal e contendiam com o mérito da pretensão da Autora (como sublinha o DMMP), o que aqui não está em causa.

Posto isto, terá a decisão recorrida de ser revogada, mantendo-se o despacho recorrido na ordem jurídica.


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DAS CUSTAS

No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrida, por ser parte vencida.


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V- DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:

- Conceder provimento ao recurso;

- Revogar a decisão recorrida, mantendo-se válida a decisão de intempestividade proferida pela recorrente.

Custas a cargo da recorrida.


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Lisboa, 18 de setembro de 2025.

Isabel Silva
(Relatora)
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Sara Loureiro
(1ª adjunta)
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Rui A. S. Ferreira
(2º adjunto)
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