Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1264/15.0BELRA |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 11/28/2019 |
Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
Descritores: | FATURAS FALSAS; ÓNUS DA PROVA; IRC. |
Sumário: | I. O ato tributário está fundamentado quando estão evidenciadas as premissas subjacentes à conclusão extraída.
II. A autoridade do caso julgado obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão, impondo-se à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões. III. Se, para cada um dos alegados fornecedores, a AT reuniu indícios sérios de que as transações tituladas pelas faturas em causa não tiveram efetividade, revelando tais indícios que há uma probabilidade séria de não terem sido feitos os fornecimentos em causa, o ónus da prova da efetividade de tais transações é do sujeito passivo. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acórdão
I. RELATÓRIO B......, Lda (doravante Recorrente ou Impugnante) veio apresentar recurso da sentença proferida a 21.03.2018, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto as liquidações de imposto sobre o rendimento as pessoas coletivas (IRC) e as dos respetivos juros compensatórios, referentes aos exercícios de 2009, 2010 e 2011. O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A) O presente recurso vai interposto da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou parcialmente improcedente a impugnação relativamente às liquidações adicionais de IRC dos anos de 2009, 2010 e 2011. B) A douta sentença recorrida incorre em ERRO DE JULGAMENTO, de facto e de direito, porquanto: - Em face do teor do relatório de inspeção tributária (alínea C) da decisão de facto) e demais factos dados por provados, a Administração tributária não logrou fundamentar nem demonstrar os pressupostos de facto e de direito ou indícios sérios e objetivos que a legitimaram a corrigir a liquidação de IRC com fundamento de que a recorrente não comprovou a indispensabilidade dos custos para realizar as vendas que declarou em violação do disposto no artigo 23º do CIRC. - Incorre em contradição entre a fundamentação de facto e a decisão e em Erro na apreciação da prova produzida nos autos (testemunhal, documental), porquanto, mesmo que se considerasse que a Administração Tributária cumpriu o seu ónus da prova, em face dos elementos e prova documental, testemunhal (estes confirmaram a veracidade da atividade dos fornecedores e a existência de transações com a recorrente no ano em apreço) que foram produzidas nestes autos, deveria o Meritíssimo juiz a quo ter dado por provado que as faturas referenciadas no relatório de inspeção tributária correspondem a operações reais - Art.º 75 da LGT. C) As correções técnicas à matéria tributável dos anos em apreço, tiveram como fundamento “INDÍCIOS DE FATURAÇÃO SIMULADA”, concluindo a douta sentença recorrida (no entender da recorrente mal) para cada um dos fornecedores em crise que a AT logrou demonstrar os pressupostos da correção e a derrogação do princípio da verdade do declarado: - Quanto ao fornecedor M......, entendeu o meritíssimo juiz a quo que a AT evidenciou que as faturas terão sido emitidas por J......, e revertidos os pagamentos a favor deste, estando ele indiciado, em anos anteriores, de ter emitido faturas falsas. - Relativamente ao fornecedor C......, também se entendeu que a AT alegou e demonstrou os pressupostos das correções por este não evidenciar estrutura empresarial. - Relativamente ao fornecedor V......, entendeu-se que a AT alegou e demonstrou os pressupostos das correções porquanto esta fornecedora estava indiciada pela Direção de Finanças de Setúbal, de ser emitente de faturas falsas. D) A decisão recorrida contraria o teor do Relatório de inspeção tributária, e dos processos administrativos juntos aos autos, incluindo toda a documentação de suporte (faturas e documentos de suporte dessa faturas, nomeadamente as guias de transporte das mercadorias), que demonstram que as correções não estão fundamentadas, em termos substanciais e que está demonstrada a veracidade dessas transações. E) Do teor do RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA não existem indícios sólidos, consistentes, claros e suficientes que demonstrem com elevada probabilidade que as operações subjacentes às respectivas faturas não correspondem à realidade. - M....... Relativamente a este fornecedor, o que resulta da decisão da matéria de facto no que respeita a este fornecedor é a matéria contida nas alíneas S), T), U), V), W), X), Y), Z), AA) e, ainda a alínea C) (parte do teor do Relatório de inspeção Tributária, da qual se evidencia o seguinte: “No que respeita ao Sr. J...... será de referir que o mesmo está indiciado como emitente de faturas falsas, com referência a faturas emitidas em seu nome nos anos de 2006, 2007 e 2008… Nesses anos concluíram os Serviços de Inspeção que o Sr. J...... não possuía estrutura empresarial …”) F) A fundamentação da AT assenta no facto de as compras terem sido “negociadas” pelo Sr. J...... e não pela D. M......, fundamentando, ainda que em anos anteriores o aludido J….. ter sido indiciado como emitente de faturação falsa por não ter estrutura empresarial adequada e por não ter declarado fornecedores/aquisições. G) Mas a não põe em causa a veracidade dessas transações,, ou seja, não é controvertido que: - A Impugnante adquiriu os bens mencionados nas facturas constantes da sua contabilidade; - As facturas foram emitidas por M......; - A Impugnante pagou o respectivo valor através de cheques bancários emitidos em nome de M....... - Por outro lado, resultou, ainda, da prova produzida nos autos que M...... endossou os referidos cheques a J...... e que os transportes eram organizados por J....... H) Por outro lado resulta da douta sentença (e que acaba por contrariar a própria decisão) são estas conclusões que se vão transcrever: “Foi ponderado o depoimento de M...... que confirmou … que os SIT não efetuaram qualquer procedimento inspetivo à contabilidade de M......” “Por conseguinte, não obstante a demonstração da emissão de cheques que corresponderão às faturas em causa, ou seja, a evidenciação do circuito documental, não foi esclarecido pela impugnante o circuito económico do dinheiro como deveria ter sido, de modo a justificar o facto apontado pelos SIT de que os cheques, apesar dos valores elevadíssimos em causa… terem sido descontados/levantados ao balcão e, também, a circunstância de dois dos cheques terem sido levantados ao balcão por uma funcionária da própria impugnante” I) Daqui se deveria concluir-se que a AT não sustentou os “indícios” que se limitou a escrever no Relatório de inspeção tributária, uma vez que nem sequer efetuou uma inspeção tributária à escrita da fornecedora da recorrente. J) Por outro lado, não era exigível à recorrente explicar o circuito económico subjacente ao cheque e ao seu posterior levantamento em numerário, após desconto. K) Isso caberia à Administração Tributária investigar o circuito económico ou as relações comerciais, económicas e tributárias desses fornecedores com os seus clientes/ fornecedores, mas, como ficou evidenciado pela testemunha M......, inspetora tributária, NÃO HOUVE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA À M...... E À SUA ESCRITA, nos anos em evidência na decisão recorrida. L) Ficou igualmente provado que a M...... Alagoa e o seu irmão procederam à regularização voluntária da sua situação contributiva perante a AT, entregando as declarações de substituição de IVA em falta e efectuando o pedido de pagamento em prestações dos valores de IVA não entregues ao Estado (facto provado alínea S), sendo também a prova de veracidade das vendas efetuadas a B...... Lda. M) Por outro lado, M......, é evidente que não desconhece as transacções que efectuou à sociedade B......, Lda., até porque os cheques de B......, Lda. Foram emitidos à ordem de M...... e foram por ela movimentados no banco ou endossados ao seu irmão, sendo que as faturas e guias de transporte eram emitidos por esta (Cfr. alíneas U) e V)). N) Por fim, as irregularidades contabilísticas e fiscais praticadas pelos fornecedores da impugnante não eram do seu conhecimento, nem a responsabilidade das mesmas lhe pode ser atribuída ou por elas penalizada. O) Vê-se também a INCONSISTÊNCIA da Administração quando a fls 78 do relatório de inspecção que “foram reunidos uma série de fortes indícios, objectivos e credíveis, de que as facturas existentes na contabilidade da sociedade B......, Lda., em nome de M......, não titulam operações reais, consubstanciando, sim, a emissão de “facturas falsas/de favor”, quando os mesmos Serviços estão na origem de dois processos judiciais-criminais por “crime de abuso de confiança fiscal”, ex vi artigo 105.º do RGIT, movidos a J...... e M...... considerando que estes exerceram a atividade, mas não terem entregado ao Estado o IVA liquidado nas facturas emitidas a B......, Lda (Cfr. r alíneas X) a AA) da decisão de facto);
C...... P) Os registos contabilísticos das operações inerentes às aquisições de bens efectuadas a C......, nos exercícios de 2010 e 2011 e os documentos que lhe servem de suporte, nomeadamente, facturas, guias de transporte, talões de pesagem e cheques nominativos emitidos a favor de C......, demonstram e provam a veracidade das aquisições que lhe foram efetuadas e contrariam os indícios de que a AT se socorre para desconsiderar as compras; Q) A AT ignorou: os registos contabilísticos e os documentos que suportam na escrita da impugnante o direito à dedução do imposto; os pagamentos das facturas efectuados (nos termos do artigo 63-C da LGT) através de cheques nominativos emitidos em nome e a favor de C......; os levantamentos registados nos extractos bancários, e que evidenciou no RIT;
V...... R) Também no que respeita a esta fornecedora da recorrente, entendeu a douta sentença recorrida que a AT cumpriu o ónus que lhe incumbia, qual seja ao de demonstrar indícios objetivos de que as transações declaradas pela B......, num total de 14.250 €, não consubstancia uma transação real, todavia não está devidamente fundamentada. S) Trata de uma única transação de 25.00 kilos de pinhas mansas, a esta fornecedora. T) O Relatório de inspeção Tributária da recorrente, no que respeita a esta fornecedora é uma mera transcrição de outro relatório de inspeção tributária da Direção de Finanças de Setúbal, no qual se terá concluído que esta não possuía estrutura empresarial. Ficou por apurar qual a estrutura empresarial necessária para que a fornecedora “indiciada” fornecer à recorrente 25.000 kg de pinhas. U) E sobretudo, é mais grave, quando de dá por provado na alínea BB) da decisão de facto, a que a Factura nº0…… emitida por V......, foi paga através cheque nominativo nº 9…….., da Caixa……, emitido a favor de V......, emitido o correspondente Recibo nº 0….., assinado por V......, que comprova o pagamento, assim como do teor do Extrato bancário se comprova o fluxo financeiro subjacente. V) Em face ao exposto, a Administração Tributária não logrou cumprir o ónus de demonstrar “indícios sólidos, consistentes, claros e suficientes que demonstrem com elevada probabilidade que as operações subjacentes às respetivas faturas não correspondem à realidade”, e, por consequência deveria ter-se declarado ilegais as correções à matéria tributável, por violação de Lei e erro nos pressupostos de facto e de direito pelo que a mesma deverá de ser revogada. W) De todo o exposto resulta que a atuação da Administração Tributária, é ilegal e carece de fundamentação, como obriga o disposto no artigo 77.º n.º 1 da LGT e 125.º do CPA, pelo que a liquidação de IRC subjacente à impugnação e ao despacho de indeferimento do Recurso Hierárquico impugnado, deverá ser ANULADA. X) Em face do exposto deverá a douta sentença ser revogada e ser substituída por outra que dê por provada a veracidade das transações postas em causa pela Administração Tributária e, por consequência julgar procedente a impugnação relativa às liquidações adicionais IRC dos anos de 2009, 2010 e 2011. Y) Ao não dar por provado este facto a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto, requerendo a este Venerando tribunal a reapreciação da prova identificada supra a fim, depois de reapreciada e ponderada, dar-se por provado que as operações refletidas nas faturas postas em causa pela Administração Tributária são verdadeiras, revogando e substituindo a douta sentença recorrida onde se reflita tal prova”. A Fazenda Pública (doravante Recorrida ou FP) não contra-alegou. Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência. São as seguintes as questões a decidir, delimitadas pelas conclusões das alegações do recurso (cfr. art.º 639.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT): a) Há contradição entre a fundamentação de facto e a decisão? b) Há erro no julgamento de facto? c) Há erro de julgamento, na medida em que a administração tributária (AT) não logrou fundamentar nem demonstrar os pressupostos de facto e de direito ou indícios sérios e objetivos que a legitimassem a corrigir a liquidação de IRC com fundamento de que a recorrente não comprovou a indispensabilidade dos custos para realizar as vendas que declarou em violação do disposto no art.º 23.º do CIRC para nenhum dos fornecedores em crise? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “ A) A Impugnante, B......, Lda., tem como atividade principal o comércio por grosso de pinhas mansas e, residualmente, a extração e comercialização de pinhão e outros frutos secos. - (facto não controvertido). B) Com base na Ordem de Serviço n.º OI2……., os Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de Santarém realizaram ação de inspeção à Impugnante, de âmbito parcial, em sede de IRC e IVA, relativa aos exercícios de 2009, 2010 e 2011, que teve início a 11-01-2012 e termo a 29-11-2012. – (cfr. relatório de inspeção tributária, a fls. 336 e ss. do processo de reclamação graciosa apenso). C) Em 21-12-2012 os SIT da Direção de Finanças de Santarém elaboraram o relatório final do procedimento de inspeção (RIT) efetuado à Impugnante, no qual se apurou, designadamente, o seguinte: “(…) Factos que constituem fortes indícios de operações simuladas Após o relato das diligências efetuadas por estes Serviços de Inspeção com o objetivo de apurar qual a real atividade desenvolvida pela Sra. M......, no que respeita ao comércio de pinhas e pinhões, concretamente nas transações efetuadas para a sociedade B......, Lda., e com base nos elementos que estes Serviços de Inspeção conhecem e dispõem à data desta informação sobre os anos de 2009, 2010 e 2011, concluíram estes Serviços de Inspeção o seguinte: As faturas emitidas em nome da Srª. M...... não correspondem a transações por ela realizadas, mas sim, a operações comerciais supostamente efetuadas pelo seu irmão Sr. A......, com a intenção de defraudar a Administração Fiscal no seu propósito de cobrança de valores em dívida da responsabilidade deste último. Na realidade a Srª. M...... não desenvolveu qualquer atividade de comercialização de pinhas mansas como a própria declarou. O Sr. A......, seu irmão corroborou essas declarações, assumindo que as faturas emitidas em nome da Srª M...... foram emitidas por si próprio, e que os pagamentos correspondentes a essas faturas reverteram para ele próprio. Deste modo, as faturas da Srª M...... não consubstanciam operações comerciais por ela realizadas, ou seja, não correspondem a transações reais por si realizadas, podendo ser classificadas como de “faturas de favor”. Assim, pelos factos descritos nos pontos anteriores, foram reunidos uma série de fortes indícios, objetivos e credíveis, de que as faturas existentes na contabilidade da sociedade B......, Lda., em nome da Srª. M......, não titulam operações reais, consubstanciando, sim, a emissão de “faturas falsas/de favor”. II - 3.4.8 – Diligências efetuadas sobre J...... No que respeita a J...... será de referir que o mesmo está indiciado como emitente de faturas falsas, com referência faturas emitidas em seu nome, nos anos de 2006, 2007 e 2008, e relativas, igualmente, ao comércio de pinhas. Nestes anos concluíram estes Serviços de Inspeção que o Sr. J...... não possuía qualquer estrutura comercial que lhe permitisse faturar as quantidades de pinhas que constavam inscritas nas suas faturas, principalmente, por inexistência de fornecedores. Relativamente aos exercícios de 2009, 2010 e 2011, apurou-se pela análise à sua contabilidade a ausência de fornecedores de pinhas nos anos de 2009 e 2010, tendo registado em 2011 compras no valor de € 50.867,19 e € 261.196,64, respetivamente, a dois supostos fornecedores já anteriormente referidos: • D......, Ldª., NIPC: 5….., com sede na Rua de S….., nº …. – 1 A, ….., concelho de Leiria; e • N……, Ldª., NIPC: 5….., com sede na Rua Dr. O….., nº…., M…., concelho de Leiria. Estes factos colocam, igualmente, em causa que o Sr. J...... exerça a atividade de comércio de pinhas, e que as faturas que são emitidas em nome de sua irmã Srª. M......, consubstanciem transações de pinhas por si efetuadas. II - 3.4.9 – Diligências efetuadas sobre C...... A sociedade B......, Ldª. tem registado na sua contabilidade dos exercícios de 2010 e 2011, diversas faturas em nome de C......, na qualidade de fornecedor, com um numero de identificação fiscal italiano (IT 01……..). As supostas transações de pinhas descritas nas várias faturas foram consideradas como aquisições intracomunitárias de bens, tendo o sujeito passivo português procedido à respetiva liquidação e dedução de IVA, nos termos da legislação fiscal. Verificou-se, ainda, o registo na contabilidade da sociedade B......, Ldª., com referência ao exercício de 2011, de uma fatura de compra de pinhas do mesmo C......, com a indicação de um número de identificação fiscal português (NIF……….), com a seguinte morada: R……, nº …. – 1º Frente, M……. No que respeita à primeira situação referida, ou seja, faturas com a identificação de um número de identificação fiscal italiano, solicitaram estes Serviços de Inspeção, ao abrigo da cooperação administrativa prevista no artigo 5º do Regulamento (CE) nº 1798/2033, informação à Administração Fiscal Italiana, sobre este suposto sujeito passivo italiano. Em resposta a este pedido, deu entrada nestes Serviços o ofício nº CLO/……/2012, datado de 20/01/2012, informação da Administração Fiscal Italiana, que por tradução livre dos Serviços da DSIFAE (Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais), informavam do seguinte: “O VRN (nº de contribuinte para efeitos de IVA) em questão pertence a C......, embora em 2010-2011 (período em que as faturas foram emitidas) não fosse residente na Itália e não tivesse qualquer atividade empresarial. Atualmente, a empresa não pode ser encontrada no território italiano. Estes são o resultado de nossas investigações: (…) Ao abrigo do Despacho Externo DI2….. emitido para recolha de elementos referentes ao Sr. C......, e na impossibilidade de contato pessoal, procedeu-se à recolha de elementos junto do TOC, Sr. A......, tendo-se constatado na sua contabilidade apenas uma fatura de venda (Fatura n.º 1), datada de 14/02/2011, emitida para a sociedade B......, Lda, respeitante a venda de 33.760 KG de pinhas, no valor total de € 16.204,80, a que acresceu IVA à taxa de 21%. Como documento de compra de pinhas estava registada uma fatura manuscrita com o n.º 14, datada de 17/02/2012, do próprio C......, com o número de identificação italiano (IT 0……..), referente à compra de 33.760 Kg de pinhas, pelo valor de € 16.204,80, com isenção de IVA devido ao facto, presume-se, de se estar em presença de uma aquisição intracomunitária de bens (cfr. Anexo II – 22). Será de referir que esta fatura manuscrita, a que foi atribuído o n.º 14, tem o mesmo aspeto gráfico das faturas que constam da contabilidade da sociedade B......, Lda, dos exercícios de 2010 e 2011, emitidas por C...... com o número de identificação fiscal italiano. Ou seja, o Sr. C......, para poder justificar a suposta venda de pinhas para a sociedade B......, Lda., consubstanciada na fatura n.º 1, supra referida, registou como compra a aquisição intracomunitária efetuada a si próprio, desconhecendo-se a sua origem, pois a Administração Fiscal italiana, conforme informação já referida, desconhece qualquer atividade do Sr. C...... no seu território. (…) Assim, no que respeita a C......, e em face do exposto, conclui -se que, apesar da existência dos cheques indicados nos dois Quadros anteriores, é nosso parecer que existem indícios objetivos e credíveis que as transações indicadas nas faturas emitidas em nome de C......, quer com o número de identificação italiano, quer com o número de identificação português, não correspondem a transações reais, quer no que respeita às quantidades transacionadas, quer quanto à(s) entidade(s) interveniente(s) na qualidade de verdadeiro(s) fornecedor(es). (…) 1 – Faturas emitidas em nome de C...... com o número de identificação italiano. . a Administração Fiscal italiana informou estes serviços de Inspeção de que C...... não exerceu qualquer atividade comercial nos anos de 2010 e 2011 em território italiano, pelo que se desconhece a origem das pinhas que transacionou como transmissões intracomunitárias de bens; . em território português não se detetaram sujeito passivos que tenham declarado vendas de penhas a C......; . no exercício de 2010, as faturas emitidas em nome de C...... para a sociedade B......, lda, totalizaram 119.040 Kg de pinhas, enquanto as quantidades indicadas nas guias de transportes associadas a tais transações (transportes L......, Lda., apenas ascendem a 85.280 Kg; Ø guia de transporte n.º…..: 28.500 Kg; Ø guia de transporte n.º…..: 29.840 Kg; Ø guia de transporte n.º….: 26.940 Kg. . apesar do exposto na alínea anterior, a sociedade Transportes L......, Lda não apresentou justificação plausível para os serviços correspondentes a tais guias de transporte, tendo apresentado para os mesmos, uma fatura de serviços prestados à sociedade B......, Lda, que indica outros serviços de transporte prestados a esta última; . no exercício de 2011, as faturas emitidas em nome de C...... para a sociedade B......, Lda. totalizaram 759.517 Kg de pinhas, enquanto as quantidades indicadas nas guias de transporte associadas a tais transações (Guia do próprio C...... e guias da sociedade de transportes C….., Lda.) apenas ascendem a 502.110 Kg; . em face das declarações de um sócio-gerente da sociedade de transportes C......, Lda. que segundo as guias de transporte detetadas transportou 472.470 Kg de pinhas (do total de 502.100 KG indicados na alínea anterior), os contatos para o transporte e a indicação do locais de carga, foram efetuados com a sociedade r......, Lda., em cujas instalações foram preenchidas as guias de transporte, bem como a colocação do carimbo com o nome de C......, onde tal carimbo se encontrava. 2 – Faturas emitidas em nome de C...... com o número de identificação português (Cfr. Anexo II – 22) . As supostas compras que suportam as quantidades de pinhas que constam da fatura n.º…., datada de 14/02/2011, de C...... emitida para a sociedade B......, Lda (33.760 Kg) constam da fatura…., datada de 17/02/2012, do próprio C......, com o número de identificação italiano. Assim terá que se ter em conta o referido no ponto 1 anterior. . A guia de transporte que foi apresentada como justificativo do transporte das penhas que consta da fatura …. de C...... supra referida, é a guia 2….. da sociedade de transportes T….. – S……., Lda., NIPC 5….., que não foi apresentada a estes Serviços de Inspeção, apesar de notificação para o efeito. Também não foi possível confirmar que a sociedade Transpoente não possui na sua contabilidade qualquer serviço prestado e C....... Todos os factos descritos revelam indícios de que C...... poderá estar a ser utilizado apenas como emitente de faturas que não consubstanciam operações reais, quer em termos de quantidades, quer em termos de valores, quer ainda, quanto aos verdadeiros vendedores das pinhas. II - 3.4.10 – Informações enviadas pela Direção de Finanças de Setúbal Através do ofício nº 3….., de 22/11/2012, dos Serviços de Inspeção da Direção de Setúbal, foi comunicado que na sequência de uma ação inspetiva ao sujeito passivo V...... – NIF 2……, “ … apurou-se que as faturas que esta emitiu no decurso da sua atividade de compra e venda de Cortiça, Pinha e Lenha, não correspondem a operações efetivamente realizadas entre a própria e os seus clientes, conforme fundamentos expressos no relatório de inspeção fundamentos expressos no relatório de inspeção associado à Ordem de Serviço OI……. O montante da fatura emitida por Vera Roque ao seu cliente B......, Ldª., - NIPC 5…., durante o exercício de 2011, ascendeu a um total de 17.527,50 € com IVA incluído à taxa normal de 23%, conforme extrato de conta de cliente que se junta em anexo.” (…) Estes Serviços de Inspeção confirmaram que na contabilidade da sociedade B......, Ldª., foi registada a fatura nº….., de 04/03/2011, no valor de € 14.250,00, a que acresceu IVA no montante de € 3.277,50, através do registo interno nº….., referente à compra de 25.000 Kg de pinhas. No entanto, em face do exposto pelos Serviços de Inspeção da D.F. de Setúbal esta fatura não consubstancia operações reais, pelo que não poderá ser aceite como gasto para efeitos de IRC, nos termos do artigo 23º do Código destes imposto, sendo a dedução de IVA inerente á mesma considerada indevida, segundo o nº 3 do artigo 19º do CIVA (cfr. Anexo II – 28). (…) III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável. III.1 – Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas III.1.1 – Custos não aceites fiscalmente III.1.1.1 – Artigo 23.º, n.º 1 do Código do IRC III.1.1.1.1 – Operações com indícios de simulação. Em sede de IRC e em face do exposto nos pontos 3.4.7 a 3.4.10, do Capítulo II, os custos/gastos contabilizados inerentes às faturas de M......, C...... e V...... que se encontram relacionadas nos quadros seguintes, não podem ser aceites fiscalmente, nos termos do artigo 23.º do Código do IRC, o qual dispõe no seu n.º 1 que “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos…”. Deste modo, o custo titulado por faturas relativamente às quais há fortes indícios, objetivos e credíveis, de que as operações nelas descritas são simuladas, não poderão concorrer para a obtenção de proveitos. (…) III.1.1.1.2 – Outros custos/gastos não aceites fiscalmente. Na análise efetuada à conta de Compras do exercício de 2010, detetou-se que foram registados como aquisição de mercadorias dois adiantamentos efetuados pela sociedade B......, Lda. a C...... (…) Deste modo, verifica-se que a matéria coletável do exercício de 2010 deverá ser corrigida no valor de € 6.000,00, (…). Relativamente ao ano de 2011(…) conclui-se que foram registados gastos em excesso, no exercício de 2011, no valor global de € 33.914,94 (…). III.1.2 – Proveitos Omissos III.1.2.1 – Omissões em vendas de pinhas mansas em 2009. Com base na recolha efetuada à totalidade das faturas referentes à venda de pinhas emitidas pela sociedade B......, Lda., constatou-se que no exercício de 2009 não existem faturas para o sujeito passivo espanhol “P…. & H…., SL” (…) Assim, as vendas de pinhas omitidas em 2009 ascendem ao valor de € 83.397,27. Sendo a venda de pinhas a atividade do sujeito passivo, tasi vendas omissas são de considerar como proveitos da atividade desenvolvida pela sociedade B......, Lda. (…). III.1.2.2 – Omissões em vendas de pinhas mansas em 2011 Pela análise dos elementos da contabilidade de 2011, constatou-se que apesar da fatura n.º …. emitida pela sociedade B......, Lda., emitida ao cliente “C…. e F….. Srl” respeite a venda de pinhas no montante de € 105.830,00, foi registada como proveito na conta de venda 71.19 pelo valor de € 23.226,25 (…) Em face do exposto, será de acrescer ao lucro tributável de 2011 o valor de € 48.209,00 resultante da omissão de vendas. (…). III.1.2.3 – Omissão de vendas de Pinhão Descascado em 2011 Conforme se descreveu no ponto II – 3.4.1.3.2.2 – Análise Compras / Vendas de Pinhões Descascados, apurou-se a falta de venda de 497,50 quilos de pinhão descascado. (…) Ao não ter registado na respetiva conta de vendas o valor de € 12.637,50 respeitante à omissão na transmissão de pinhão descascado, o sujeito passivo infringiu o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 3 do art.º 17.º do CIRC (…) III.1.3 – Correções a favor do sujeito passivo (…) III.1.4 – Correções Globais Em face das correções expostas em sede de IRC descritas nos pontos III.1.1 a III.1.3, apresentam-se de seguida quer os valor das mesmas por tipo de correção, quer a proposta de Lucro Tributável Corrigido por estes serviços de inspeção, para os exercícios de 2009, 2010 e 2011: III.2.1 IVA deduzido indevidamente (…).”. – (cfr. doc. de fls. 335 a 472 do processo de reclamação graciosa apenso). D) Com data de 27-12-2012, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Santarém endereçaram à ora Impugnante o ofício n.º….., de notificação do relatório de inspeção identificado na alínea antecedente. - (cfr. fls. 328 do processo de reclamação graciosa apenso.) E) Em 06-06-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da ora Impugnante a demonstração da liquidação adicional de IRC n.º 2013…… relativa ao exercício de 2009, no montante de € 43.294,87. - (cfr. fls. 60 do processo de reclamação graciosa apenso). F) Na mesma data, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2013….., relativa ao exercício de 2009, no valor de € 4.023,92. - (cfr. doc. de fls. 61 do processo de reclamação graciosa apenso). G) Com data limite de pagamento de 12-08-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a demonstração de acerto de contas do IRC do ano de 2009, com o valor a pagar de € 43.294,87. – (cfr. doc. de fls. 62 do processo de reclamação graciosa apenso). H) Com data de 06-06-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da ora Impugnante a demonstração da liquidação adicional de IRC n.º 2013……. relativa ao exercício de 2010, no montante de € 86.971,12. - (cfr. fls. 63 do processo de reclamação graciosa apenso). I) Na mesma data, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2013……., relativa ao exercício de 2010, no valor de € 5.087,97. - (cfr. doc. de fls. 64 do processo de reclamação graciosa apenso). J) Com data limite de pagamento de 14-08-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a demonstração de acerto de contas do IRC do ano de 2010, com o valor a pagar de € 86.971,12. – (cfr. doc. de fls. 65 do processo de reclamação graciosa apenso). K) Em 24-06-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da ora Impugnante a demonstração da liquidação adicional de IRC n.º 2013…… relativa ao exercício de 2011, no montante de € 394.977,29. - (cfr. fls. 66 do processo de reclamação graciosa apenso). L) Na mesma data, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a demostração da liquidação adicional de juros compensatórios e moratórios relativa ao IRC do exercício de 2011, no valor de € 7.187,56 e € 490,30, respetivamente. - (cfr. doc. de fls. 67 do processo de reclamação graciosa apenso). M) Com data limite de pagamento de 26-08-2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a demonstração de acerto de contas do IRC do ano de 2011, com o valor a pagar de € 317.092,53. – (cfr. doc. de fls. 68 do processo de reclamação graciosa apenso). N) Em 07-11-2013, a Impugnante apresentou reclamação graciosa dirigida ao Diretor de Finanças de Santarém dos atos de liquidação de IRC e respetivos juros compensatórios dos exercícios de 2009, 2010 e 2011. - (cfr. fls. 3 e 4 do processo de reclamação graciosa apenso). O) Em 03-02-2014, o Diretor de Finanças de Santarém proferiu despacho de indeferimento total do pedido apresentado em sede de reclamação graciosa. – (cfr. fls. 537 do processo de reclamação graciosa apenso). P) Em 07-03-2014 a Impugnante apresentou recurso hierárquico dirigido ao Sr. Ministro das Finanças da decisão de indeferimento da reclamação graciosa referida na alínea anterior. – (cfr. fls. 1 do recurso hierárquico apenso). Q) Em 10-04-2015 a Subdiretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira proferiu despacho de indeferimento do recurso hierárquico referido na alínea antecedente. – (cfr. fls. 467 do recurso hierárquico apenso). R) Em 23-04-2015, a Direção de Finanças de Santarém remeteu à Impugnante o oficio n.º ….. de notificação da decisão referida na alínea que antecede, rececionado em 27-04-2015. - (cfr. docs. de fls. 499 e 500 dos autos). Encontra-se ainda provado com interesse que: S) No âmbito dos procedimentos tributários destinados a “consulta, recolha e cruzamento de elementos” realizados a J...... e M......, os sujeitos passivos procederam à regularização voluntária da sua situação tributária, apresentando declarações de substituição em sede de IVA, não tendo sido emitidas liquidações adicionais, para os exercícios de 2006 a 2008. – (cfr. fls. 131 a 145 dos autos). T) Os procedimentos tributários referidos na alínea anterior foram desencadeados pelo facto de os valores declarados por J...... e M...... não se coadunarem com os declarados pela Impugnante. - (cfr. docs. de fls. 131 a 145 dos autos). U) Nos anos de 2009 a 2011, as faturas e guias de transporte eram emitidas por M...... e os pagamentos foram sempre feitos por cheque bancário, tendo um cheque sido levantado ao balcão a pedido do Senhor J….. – (cfr. depoimento das testemunhas F...... e A......). V) M...... assinava os cheques e endossava-os ao seu irmão. - (cfr. relatório de inspeção constante do processo de reclamação graciosa apenso). W) Os transportes eram organizados por J......, através da empresa T....... ou com o carro Mitsubishi Canter, com a matrícula……... - (cfr. depoimento das testemunhas F...... e A......). X) Por sentenças proferidas em 03-12-2012 e 12-12-2013, nos processos n.º 1/10.0IDSTR e 34/10.7IDSTR, respetivamente, que correram termos no Tribunal Judicial de Abrantes, J...... foi condenado pelos crimes de abuso de confiança fiscal e abuso de confiança fiscal qualificado. - (cfr. a fls. 55 a 76 dos autos). Y) Em 13-06-2014, por sentença proferida no processo n.º 76/12.8IDSTR do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes, J….. de A...... foi condenado pela prática de crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, e condenado na quantia de € 466.458,55. - (cfr. fls. 84 a 95 dos autos). Z) Na sentença mencionada na alínea antecedente, M...... foi condenada como cúmplice de J...... no crime de abuso de confiança fiscal qualificado. - (cfr. fls. 84 a 95 dos autos). AA) No processo referido na alínea antecedente, ficou provado, com base nas declarações dos arguidos, que M...... e J...... decidiram conjuntamente que aquela desse início à atividade de compra e venda de pinhas no Serviço de Finanças de Abrantes. - (cfr. fls. 84 a 95 dos autos). BB) O valor correspondente à fatura n.º…., emitida em 04-03-2011, por V......, foi pago por cheque bancário descontado ao balcão e transformado em numerário. - (cfr. processo de reclamação graciosa em apenso). CC) A empresa P….. e H….., SL era um bom cliente da Impugnante, desde 2004. - (cfr. depoimento da testemunha A......). DD) Em 2009, a Impugnante cedeu verbalmente à P......e H....., SL um espaço para depositar mercadorias destinadas a clientes desta, ficando as mesmas no estaleiro pelo tempo necessário a preencher um camião de 26 toneladas. - (cfr. depoimento da testemunha A......). EE) As mercadorias mencionadas na alínea antecedente foram transportadas para Espanha por uma empresa de transportes contratada pela Impugnante a pedido da P......e H....., SL. - (cfr. depoimento da testemunha A......). FF) As pinhas, constantes da fatura n.º …. da Impugnante emitida a “I…., S.R.L.”, foram transportadas para Itália através do porto de Setúbal. - (cfr. processo de reclamação graciosa apenso)”. II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida: “Não se provou, nomeadamente, que: i) Nos anos de 2010 e 2011, a Impugnante tivesse adquirido a C...... as quantidades de pinhas constantes das faturas emitidas por este (uma vez que o depoimento das testemunhas inquiridas sobre esta matéria não foi conclusivo e que não foram juntos outros elementos de prova adicionais); ii) No ano de 2011, a Impugnante tivesse adquirido a V...... a quantidade de pinhas constante da fatura emitida por esta fornecedora (uma vez que o depoimento das testemunhas inquiridas a este respeito não foi conclusivo e que não foram juntos outros elementos de prova adicionais); iii) As transmissões de bens tituladas nas facturas nºs….., …., … e …. da Impugnante tenham saído do território nacional. - (cfr. docs. juntos com a p.i., do processo de reclamação graciosa, uma vez que que a declaração do adquirente, desacompanhada de outros elementos prova, não permite dar por assente que as mercadorias tenham sido transportadas para Itália)”. II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: “A convicção do Tribunal, no que respeita aos factos provados, efetuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e do processo administrativo a que se refere o artigo 111.º do CPPT, dos processos de reclamação graciosa e recurso hierárquico que se encontram em apenso e respetivos documentos anexos, bem como na prova testemunhal produzida, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório. Cumpre deixar presente que, relativamente à matéria de facto, o juiz deve basear a sua decisão, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da razão de ser das coisas [cfr. artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC)]. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei, designadamente quanto aos documentos autênticos, que nos termos do artigo 371.º do Código Civil, têm força probatória plena, ou quando os factos estejam plenamente provados por acordo ou confissão das partes, é que não domina na apreciação das provas produzidas este princípio da livre apreciação. Assim, no que respeita à prova testemunhal, e quanto às testemunhas arroladas pela Impugnante, foi ponderado e valorado o depoimento da testemunha F......., motorista, que demonstrou ter um conhecimento direto dos factos sobre os quais depôs, tendo o seu depoimento sido claro, objetivo e isento de contradições, merecendo, por isso, credibilidade. Foram ponderados os depoimentos de C....... e M......., inspetoras tributárias, arroladas pela Impugnante, dos quais não resultou a prova de qualquer facto com relevo para a decisão a proferir para além dos já provados por documento. Foram ponderados os depoimentos das testemunhas M.......e B….. que, no entanto, não se revelaram esclarecedores quanto aos factos sobre os quais recaíram, não sendo, por isso, tomados em consideração. Foi ponderado e valorado o depoimento da testemunha A……., empregada de escritório da Impugnante, que revelou-se claro e consistente, isento de contradições, tendo sido valorado pelo Tribunal. Foi ponderado o depoimento da testemunha A……. que, no essencial, revelou-se conclusivo, não se retirando do mesmo a prova de qualquer facto autónomo com relevo para a decisão a proferir. Os sobreditos depoimentos, na identificação concreta dos serviços faturados, foram demasiado genéricos, não sendo referidos quaisquer factos concretos quanto ao conteúdo das faturas e à prova de que houve transação de mercadorias entre as empresas que correspondesse a essas faturas e não relevando, assim, para a prova de qualquer factualidade, mormente dos factos dados como não assentes (artigos 341.º e 396.º do Código Civil). Quanto à testemunhas arrolada pela Fazenda Pública, foi ponderado o depoimento de M...... que confirmou, no essencial, os factos descritos no relatório de inspeção e confirmou que os SIT não efetuaram qualquer procedimento inspetivo à contabilidade de M....... Apesar dos factos poderem ser comprovados por prova testemunhal (artigo 393.º do Código Civil), os depoimentos devem revelar-se coerentes, assertivos e credíveis ao ponto de corroborarem os factos alegados pelas partes e que, no caso da Impugnante, se destinavam a contrariar indícios de faturação falsa, e a demonstrar que as relações materiais subjacentes, tituladas por tais documentos, correspondiam efetivamente a transações reais. O nível de exigibilidade da verosimilhança dos depoimentos das testemunhas nestes casos tem de ser mais exigente e detalhado porque têm de substituir a força probatória dum documento cuja validade foi colocada em causa pela AT no quadro de legalidade das suas competências. No caso em apreço, a assertividade dos depoimentos não foi suficiente para o Tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela Impugnante, designadamente os factos dados como não provados, como se referiu, sendo certo que aqui não está em causa a venda pela Impugnante de pinhas e pinhões identificada, mas sim que esta tenha sido efetuada por aqueles fornecedores em concreto nos exatos termos expressos nas faturas emitidas e questionadas pela AT. Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por não se mostrarem controvertidos, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou por não terem relevância para a decisão da causa”. II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, acorda-se em alterar a redação de parte da factualidade mencionada em II.A., em virtude de resultarem dos autos elementos documentais que exigem tal alteração(1). Nesse seguimento, é a seguinte a redação dos factos que se identificam, por referência à sua enumeração por letras efetuada em 1.ª instância: Facto S) mencionado em II.A.: S) No âmbito dos procedimentos tributários destinados a “consulta, recolha e cruzamento de elementos” realizados a J...... e M......, os sujeitos passivos procederam à regularização voluntária da sua situação tributária, apresentando declarações de substituição em sede de IVA, não tendo sido emitidas liquidações adicionais, para os exercícios de 2006 a 2008 e dois primeiros trimestres de 2009 (cfr. fls. 131 a 145 dos autos). III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.A. Da contradição entre os fundamentos e a decisão Alega a Recorrente que a decisão incorre em contradição entre a fundamentação de facto e a decisão, considerando que o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que as operações foram reais e que considerou que os SIT não fizeram inspeção a M...... ao mesmo tempo em que aceita as conclusões extraídas no relatório de inspeção tributária (RIT) sobre esta emitente de faturas. Vejamos. Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, constitui nulidade da sentença a oposição dos fundamentos com a decisão [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC]. Esta nulidade consubstancia-se na contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença(2), ou seja, na circunstância de o iter constante da sentença, na sua motivação, estar em contradição com a decisão a final proferida(3). Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 05.11.2014 (Processo: 0308/14), “… esta nulidade ocorre quando a construção da sentença é viciosa, quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto. Isto é, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma oposta à que logicamente deveria ter extraído: a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”. Ora, atentando no alegado, verifica-se que, apesar de a Recorrente ter configurado o alegado como contradição entre os fundamentos e a decisão, na verdade o que está subjacente é um alegado erro de julgamento – quer da matéria de facto, quer no sentido de não ter desconsiderado os elementos referidos pela AT relativamente a M....... Como tal, não se verifica qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, sendo que o alegado será apreciado infra, enquanto erro de julgamento. III.B. Do erro de julgamento de facto Entende a Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento de facto, devendo ter dado como provada a veracidade das transações postas em causa pela administração tributária (AT). Apreciando. Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão(4). Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC]; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC]. Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC: “2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe os ónus já mencionados(5). Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus não foram cumpridos. Com efeito, como resulta das alegações de recurso, a Recorrente limita-se a insurgir-se contra o facto de não ter sido dada como provada a veracidade das transações postas em causa pela AT, concluindo no sentido de dever ser reapreciada a prova efetuada. Ora, como decorre das alegações e conclusões, não são indicados os factos que se entende deveriam ter sido considerados provados nem, consequentemente, a prova, documental ou testemunhal, que deverá ser atendida. Assim, não tendo sido cumpridos minimamente os requisitos exigidos no art.º 640.º do CPC, nesta parte o recurso tem de ser rejeitado. III.C. Do erro de julgamento no que respeita à falta de fundamentação e à falta de demonstração dos pressupostos de facto e de direito Considera, por outro lado, a Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, ao considerar que a AT logrou fundamentar e demonstrar os pressupostos de facto e de direito ou indícios sérios e objetivos que a legitimaram a corrigir a liquidação de IRC, com fundamento de que a Recorrente não comprovou a indispensabilidade dos custos para realizar as vendas que declarou em violação do disposto no art.º 23º do CIRC. Vejamos. Nos termos do art.º 75.º da Lei Geral Tributária (LGT): “1 - Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. 2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando: a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo…”. Cabe, pois, à AT ilidir esta presunção de veracidade da contabilidade, carreando, maxime em sede de fundamentação do ato tributário, elementos suficientes para esse efeito. É pacífico o entendimento de que, em situações como a dos autos, para efeitos designadamente do art.º 74.º, n.º 1, da LGT, a AT não tem de provar, em sede de ação inspetiva, a efetiva simulação nos termos constantes do art.º 240.º do Código Civil. É assim bastante a demonstração da existência de indícios sérios e objetivos que impliquem uma probabilidade elevada de que as operações tituladas pelas faturas não foram operações reais(6). Assim, reunidos e demonstrados que estejam tais indícios, cessa a presunção de veracidade prevista no art.º 75.º da LGT, competindo ao sujeito passivo alegar e provar a efetividade das operações. Naturalmente que, na sua atuação, a AT deverá atentar às exigências ao nível do dever de fundamentação do ato tributário. O dever de fundamentação dos atos tributários insere-se no princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da CRP, nos termos do qual “os atos administrativos (…) carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”. Ao nível dos atos tributários, encontra-se especificamente previsto no art.º 77.º, da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”. “A fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão…”(7), para que o respetivo destinatário consiga perceber o iter cognoscitivo e para que, por outro lado, seja possível o controlo, quer administrativo, quer jurisdicional, do ato em causa. Deve ser, pois, clara, expressa, congruente e suficiente, de maneira a esclarecer inteiramente o seu destinatário, cumprindo, dessa forma, o desiderato constitucionalmente consagrado. Como tal, cumpre verificar se a AT cumpriu o seu ónus probatório, ou seja, aferir se foi pela mesma alegada e demonstrada (fundamentadamente) a existência de indícios que, de forma séria, abalam a presunção de veracidade dos documentos em causa, legitimando a desconsideração dos custos, por não se enquadrarem no âmbito do art.º 23.º do CIRC. Para melhor estruturação da análise, proceder-se-á a esta apreciação de forma separada, por emitente de fatura. III.C.1. Emitente de faturas M...... In casu, relativamente a esta emitente de faturas, em sede de RIT, a AT elencou uma série de indícios, que, em seu entender, permitiram pôr em causa a presunção de veracidade. Assim, e depois de explanar exaustivamente todas as diligências feitas junto de tal emitente das faturas (sendo irrelevante o facto de tal não ter sido em sede de ação inspetiva, porquanto a ação inspetiva à Recorrente legitima que, ao abrigo do dever de colaboração, se peçam informações a entidades que com ela se relacionem, maxime fornecedores – cfr. art.º 59.º, n.º 4, da LGT), resultam como indícios recolhidos os seguintes: A) M...... não desenvolveu qualquer atividade de comercialização de pinhas, conforme declarado pela própria, não tendo qualquer conhecimento sobre a mesma, tendo ainda afirmado que as faturas eram emitidas pelo seu irmão e que se limitava a endossar a este os cheques emitidos em seu nome; B) O seu irmão (J......) confirmou o declarado por M......, referindo que foi ele próprio a emitir as faturas e que os pagamentos correspondentes reverteram a seu favor; C) As faturas emitidas não correspondem a transações realizadas por M......, mas sim a operações comerciais supostamente realizadas pelo irmão; D) Foram registadas, em 2011, na contabilidade de M......, aquisições de pinhas (faturadas em 2010), respeitando a dois fornecedores (N....... e Delimentol), em relação aos quais a AT considera haver suspeitas de não realização das operações, tendo, no caso da D......., o RIT à mesma respeitante concluído pela existência de indícios de faturação falsa; E) Foram detetadas incongruências entre as quantidades registadas nas guias de transporte e as constantes das faturas e, bem assim, deficiências quanto aos seus elementos; F) Os cheques alegadamente relativos aos pagamentos das faturas foram, na sua maioria, levantados ao balcão, sendo apenas identificados dois cheques, em 2010, depositados, mas que foram emitidos ao portador; G) Dois dos cheques foram levantados por funcionária da própria Impugnante (A…..); H) J...... não possuía estrutura comercial apta à faturação das quantidades em causa, não tendo registado quaisquer fornecimentos em 2009 e 2010 (não sendo, pois, ao contrário do referido pela Recorrente, mencionados elementos apenas respeitantes a exercícios anteriores); I) Os fornecimentos registados por J...... em 2011 respeitam aos mesmos fornecedores já identificados anteriormente (N....... e D.......). Atento este elenco, considerou a AT estar perante um conjunto de indícios suficiente para pôr em causa a materialidade das prestações tituladas pelas faturas em análise. Com efeito, foram reunidos os indícios elencados, que são relativos a diversos aspetos atinentes a M......, ao seu irmão e à sua relação com a Recorrente e que têm de ser considerados e valorados enquanto um todo. Tais indícios vão desde a inexistência de uma estrutura (quer da emitente quer do seu irmão) à evidenciação de um circuito de pagamentos opaco, com diversos levantamentos ao balcão, tendo sido mesmo identificadas situações de levantamento ao balcão por parte de funcionária da Recorrente. Abrangem ainda diversas incongruências ao nível das guias de transporte. Portanto, face ao que expusemos, desde logo do ponto de vista da fundamentação formal, não padece o RIT em causa de falta de fundamentação, estando cabalmente explanado o itinerário cognoscitivo percorrido, em cumprimento do disposto no art.º 77.º da LGT. Cumpre, agora, aferir, atento o elenco referido supra, se a AT logrou reunir indícios de que as operações, tituladas pelas faturas elencadas no RIT e que estiveram na base das correções técnicas em causa, não correspondiam a operações reais. Reitere-se que nestas situações, em termos de ónus da prova a cargo da AT, é pacífico que esta não tem de provar a simulação, mas tem apenas de recolher indícios de que as operações a que se referem as faturas não ocorreram efetivamente. Nestes casos, como já referido, cessa a presunção de veracidade da contabilidade, passando o ónus da prova para o sujeito passivo, cabendo a este demonstrar a efetividade das operações, individualmente consideradas. A este propósito, o Tribunal a quo considerou terem sido recolhidos pela AT tais indícios, socorrendo-se da fundamentação da decisão de 1.ª instância proferida nos autos n.º 446/08.6BESNT, respeitante às mesmas partes e aos mesmos exercícios, sendo ali impugnadas as liquidações de imposto sobre o valor acrescentado (IVA). Desde já se adiante que se acompanha esta posição. Com efeito, da análise do conjunto dos indícios recolhidos, verifica-se que a AT elencou elementos que revelam de forma séria quer a evidência de não ter sido M...... a fornecer quaisquer bens titulados pelas faturas (o que a própria assume, tendo o irmão corroborado tais afirmações), quer mesmo a forte probabilidade de as operações em causa não serem operações reais, nem de M...... nem do irmão, considerando quer os fornecimentos feitos a M...... e ao irmão, quer os circuitos de pagamentos, opacos, com diversos pagamentos ao balcão (com a consequente insusceptibilidade de demonstrar a efetividade de pagamentos), quer os próprios circuitos documentais relativos às guias de transporte, cujas incongruências acentuam a mencionada probabilidade. Todos estes indícios, com as particularidades já mencionadas, são indícios de que as operações tituladas não corresponderam a operações reais, porquanto não só as mesmas respeitavam a alegados fornecimentos que não poderiam ocorrer sem a existência de uma estrutura apta aos mesmos, como os circuitos financeiros revelam as fragilidades já descritas. Acolhe-se, a este respeito, o que já foi decidido por este TCAS, em Acórdão proferido a 06.04.2017, no âmbito dos autos n.º 09899/16 (404/15.4BELRA), relativos ao IVA dos anos de 2009, 2010 e 2011, que tiveram como fundamento justamente o mesmo RIT, entendendo-se que sobre esta questão há que apelar à autoridade do caso julgado. Com efeito, nos termos do art.º 619.º, n.º 1, do CPC: “1 - Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º”. Respeita a norma contida nesta disposição legal ao caso julgado material, que ocorre quando a decisão transitada recai sobre o mérito da causa(8). Assim, a definição dada à relação material controvertida tem força dentro e fora do processo(9). As exigências de segurança jurídica têm sido apontadas como fundamento primordial do caso julgado material(10), sendo um garante da tendencial imutabilidade das decisões transitadas em julgado, fundamental até em termos de manutenção da paz social. O caso julgado material pode refletir uma dupla função, negativa ou positiva(11). Assim, a função negativa do caso julgado material está inerente à exceção de caso julgado, consubstanciando-se no impedimento de a mesma causa ser apreciada pelo Tribunal numa nova ação. Já a função positiva respeita à chamada autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão(12). Ou seja, a autoridade do caso julgado impõe à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões(13). Considerando que, no que respeita à aferição da reunião, por parte da AT, de indícios suficientes no sentido de as faturas em causa não titularem operações reais, a situação ora em análise e a apreciada nos autos n.º 09899/16 é exatamente a mesma (uma vez que em ambas se aprecia o mesmo RIT e os indícios recolhidos são os mesmos) e considerando que o referido Acórdão transitou em julgado, formou-se caso julgado material, com os necessários reflexos nos presentes autos, atenta a autoridade do caso julgado. Ali se escreveu: “Para concluir pela existência de indícios sérios de que as facturas não correspondem a operações reais, a AT apoiou-se, em síntese e no essencial, no seguinte: a própria emitente, M......, declarou que não desenvolveu qualquer actividade de comercialização de pinhas mansas, o que foi corroborado pelo irmão daquela, Sr. A....... De acordo com ambos os declarantes, as operações comerciais subjacentes à emissão das facturas foram efectuadas pelo Sr. A......, o qual terá emitido as facturas em causa, tendo os pagamentos revertido para o dito irmão da M....... Mais avançou a AT (ponto II. 3.4.7 do relatório inspectivo) no sentido de que: - o alegado fornecedor N......., que consta da contabilidade da M......, nunca entregou declaração de rendimentos mod. 22, nem declaração anual de informação contabilística e fiscal; a última declaração de IVA entregue é de 2007; nunca entregou a declaração mod. 10/ anexo J; que na morada correspondente à sede encontra-se uma casa destinada exclusivamente à habitação, em regime de arrendamento; que tal empresa e o seu gerente são aí desconhecidos; o TOC da N....... afirmou não assumir a realização da contabilidade daquela empresa desde 2007; não foi possível, apesar das tentativas, contactar o gerente da N......., pelo facto das comunicações postais serem devolvidas com a indicação de não terem sido reclamadas (todos estes dados foram obtidos com base em inspecção à sociedade N.......); - o alegado fornecedor D......., que consta da contabilidade da M......, não está registado no sistema informático da AT pelo exercício de qualquer actividade; não apresentou declarações de IVA, IRC, IES; não se detectaram quaisquer entidades que tenham declarado vendas ou prestações de serviços à D.......; não são conhecidos funcionários nesta empresa; não dispõe a mesma de instalações conhecidas, mercadorias ou equipamentos (todos estes dados foram obtidos com base em inspecção à sociedade D.......); - da contabilidade da M......, no ano de 2010, constam aquisições de 539.550 quilos de pinhas aos ditos fornecedores; - no ano de 2009, 2010 e 20111 foram descontados/ levantados ao balcão cheques nos montantes de € 97.722,36, € 594.462,23 e € 1.423.308,14, respectivamente; - dois dos cheques levantados ao balcão foram-no por uma funcionária da própria impugnante; - foram apuradas divergências significativas entre as pinhas facturadas e as que constam das guias de transporte. Ora, sem necessidade de considerações muito desenvolvidas, em face da evidência resultante dos elementos recolhidos pelos serviços de inspecção e aos quais deixámos expressa referência, entendemos poder concluir que, in casu, a AT recolheu, efectivamente, indícios sérios e seguros de que as facturas emitidas pela M...... à B......, nos anos de 2009 a 2011, não titulam reais vendas de pinhas que aquela tenha efectuado a esta. Com efeito, é a própria M...... a afirmar (no que é corroborada pelo irmão, o qual, nas suas palavras, era o efectivo vendedor dos bens e beneficiário dos pagamentos) que jamais comercializou pinhas, nem emitiu as facturas em causa, nem tão pouco recebeu o valor correspondente às facturas. Por conseguinte, uma primeira conclusão é inelutável. Em nenhum dos anos em causa – 2009 a 2011 – a M...... vendeu pinhas à B....... Mas mais. Seguindo a hipótese de as vendas de pinhas, apesar de facturadas pela M......, terem sido efectivamente vendidas pelo seu irmão (no que alegadamente pareceria resultar de um acordo entre ambos), a AT foi mais longe e, com recurso à fiscalização cruzada, concluiu sobre a impossibilidade de os supostos fornecedores constantes da contabilidade da M......, terem vendido os bens que a mesma registava em aquisições. Para além disso, foram evidenciados factos objectivos – quer relativamente à forma de pagamento/descontos dos cheques, quer em relação à divergência entre as quantidades facturadas e transportadas – que, no entendimento deste Tribunal, são de molde a concluir fundadamente por um quadro de enorme probabilidade de as transacções alegadamente ocorridas entre as partes não corresponderem (materialmente) à realidade pressuposta nas facturas a que respeita o IVA desconsiderado. Por conseguinte, todos estes “factos-índice”, numa análise concatenada e ponderados à luz da experiência, são suficientes para permitir à AT, como sucedeu, desconsiderar o IVA que tem as apontadas facturas como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessas facturas são simuladas. Repete-se, os elementos recolhidos em sede inspectiva vão, inequivocamente, num sentido claro: o de que a M...... não exercia qualquer actividade comercial relacionada com o comércio de pinhas, inexistindo tão pouco evidência de factos que permitam concluir que as vendas, ainda que não realizadas de facto pela M......, se pudessem ter realizado através de outrém (conclusão que se retira da trabalho investigatório quanto aos alegados fornecedores da M......). Assim sendo, como se entende que é, há que concluir que a AT demonstrou os pressupostos da sua actuação, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia. Por conseguinte, isto é, tendo a Administração cumprido o ónus que sobre si impendia, competia ao Impugnante ter apresentado prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que as pinhas lhe foram vendidas, ou seja, que aquelas facturas têm subjacentes operações económicas reais”. Assim, ao contrário do sustentado pela Recorrente, a AT logrou reunir um conjunto de indícios suficientemente fortes para abalar a presunção de veracidade da contabilidade da Recorrente, o que, nos termos já explanados supra, implica que caiba a esta o ónus da prova da efetividade das operações tituladas pelas faturas em causa. Ora, tal prova não ocorreu. Com efeito, ao contrário do sustentado pela Recorrente, do RIT não resulta que a AT não tenha posto em causa a veracidade das alegadas transações entre si e J....... Atentando no teor do RIT, é ali referido que “[a]s faturas emitidas em nome da Srª. M...... não correspondem a transações por ela realizadas, mas sim, a operações comerciais supostamente efetuadas pelo seu irmão Sr. A......, com a intenção de defraudar a Administração Fiscal no seu propósito de cobrança de valores em dívida da responsabilidade deste último” (negrito nosso). Ora, o advérbio “supostamente” evidencia que a AT não aceita a veracidade de tais transações. Ademais, do próprio RIT consta um conjunto de indícios consistentes, relativamente ao próprio J......, já elencados supra, que também quanto a este põem solidamente em causa a versão de que as transações teriam sido por ele efetuadas. A este propósito escreveu-se no Acórdão deste TCAS proferido nos autos n.º 09899/16, já referido: “[S]e bem interpretamos o relatório de inspecção, jamais a AT aí assume que a venda de pinhas a que se referem as facturas emitidas pela M......, apesar de não ter sido efectuada por ela, o foi pelo seu irmão. Na verdade, a alusão às “operações comerciais supostamente efectuadas pelo seu irmão” é, na economia do relatório de inspecção (considerado na sua globalidade), uma referência conclusiva ao que, ao longo da acção inspectiva, foi afirmado por aqueles dois sujeitos. Que a AT assim não aceitou mostra-o claramente o relatório de inspecção, em concreto a afirmação aí contida (II – 3.4.8), segundo a qual “…estes factos colocam, igualmente, em causa que o Sr. J...... exerça a actividade de comércio de pinhas, e que as facturas que são emitidas em nome de sua irmã Sra. M......, consubstanciem transacções de pinhas por si efectuadas”. Portanto, temos para nós que, em sede inspectiva, a AT não aceita que, apesar de as vendas de pinhas não terem sido efectuadas pela M......, o foram pelo seu irmão. De resto, e percebendo-se até a ligação que se pretendia estabelecer a montante, ou seja, entre a emitente das facturas e os seus alegados fornecedores, a N....... e a D......., a AT avança com indícios de que os mesmos não poderiam fornecer as quantias de pinhas que se mostravam registadas na contabilidade. E esta afirmação é válida tanto para as supostas aquisições feitas pela M......, como para eventuais aquisições que o seu irmão tivesse feito (este aspecto é expressamente retomado no ponto II. 3.4.8 do relatório de fiscalização). Portanto, e retomando o que já atrás vínhamos dizendo, era à Impugnante que competia demonstrar que, apesar de todos estes indícios, eram reais - ou seja, correspondiam a operações materiais - as vendas das pinhas facturadas nos documentos que incluem o IVA corrigido. E, do nosso ponto de vista, esta demonstração não foi feita, não sendo a prova produzida concludente. Vejamos. Quanto ao pagamento das facturas, entendeu o tribunal a quo que não é controvertido que a Impugnante tenha pago o respectivo valor através de cheques bancários emitidos em nome da M....... E, na verdade, como se reconhece, os cheques correspondentes às facturas foram emitidos. Contudo, a análise dos autos leva-nos a ponderar que, na realidade, uma coisa é o circuito documental que se mostra evidenciado (facturas, cheques, endossos), o qual pode, até, mostrar-se formalmente correcto, outra bem diferente é o circuito económico do dinheiro. E, neste concreto ponto, há que realçar que a AT fez notar expressamente o facto de os cheques, apesar dos valores elevadíssimos em causa (de € 97.722,36, € 594.462,23 e € 1.423.308,14), terem sido descontados/ levantados ao balcão e, também, a circunstância de dois dos cheques terem sido levantados ao balcão por uma funcionária da própria impugnante, o que não deixa sem mácula todo este circuito”. E concretamente em relação aos transportes: “É verdade que o Tribunal a quo afirma que os transportes das pinhas eram organizados por J......, o que, aliás, resulta do ponto [W)] (…) dos factos provados, nos termos do qual “Os transportes eram organizados por J......, através da empresa T….. ou com o carro Mitsubishi Canter, com a matrícula…..”. Contudo, este circunstancialismo é demasiado genérico para servir de base de sustentação à materialidade das operações subjacentes às facturas a que respeita o IVA liquidado, sendo certo que se mantém por esclarecer as apontadas divergências significativas entre as pinhas facturadas e as que constam das guias de transporte. Portanto, a prova produzida, em concreto aquela que competia à Impugnante, não chega para cumprir o ónus que a este respeito lhe era legalmente imposto, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e de que se verificam os pressupostos de que depende o seu direito à dedução do imposto. Contrariamente, a AT provou a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que é susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte”. Face ao exposto, verifica-se que carece de pertinência o invocado pela Recorrente quanto ao seu ónus de demonstrar o circuito económico dos cheques. Com efeito, cabe à Recorrente a demonstração da veracidade das operações, o que poderá ser efetivado sob diversos prismas, não sendo, naturalmente, despiciendo o circuito económico dos alegados meios de pagamento. Ora, in casu, a verdade é que a AT, em sede de RIT, aferiu uma série de caraterísticas atinentes à movimentação dos alegados meios de pagamento que indiciam uma opacidade desse mesmo circuito. Caberia, pois, à Recorrente afastar e demonstrar a efetividade dos pagamentos, como forma de demonstração da efetividade das operações. É a este respeito irrelevante o facto de não ter havido ação inspetiva à emitente das faturas, pois, como já referimos supra, a AT pode realizar diligências, ao abrigo do dever de cooperação, junto, designadamente, de clientes ou fornecedores do inspecionado e obter elementos nesse contexto, o que aconteceu, nunca tendo tais elementos sido aliás postos em causa. O facto de M...... ter, entretanto, apresentado declarações de IVA não altera a conclusão extraída. Apelando novamente à fundamentação constante do Acórdão deste TCAS proferido nos autos n.º 09899/16, ali se refere a este propósito: “Em primeiro lugar, dos elementos juntos aos autos (…), não se retira que a regularização voluntária da situação contributiva, concretamente quanto IVA, e com respeito à M...... e ao J….., inclua todo o período de imposto que está em causa nestes autos de impugnação. Concretizando, nos presentes autos estão em causa liquidações adicionais de IVA de 2009, 2010 e 2011; as regularizações efectuadas respeitam aos anos de 2006, 2007, 2008 e incluem uma parte de 2009. Como tal, parte do ano de 2009 e os anos de 2010 e 2011 estão fora das regularizações em causa (ou documentadas, melhor dizendo). Mas mais. Analisados os documentos juntos – repete-se, respeitantes à M...... e ao J...... - não se percebe em que medida tal regularização (ao menos em parte, isto é, quanto ao ano de 2009) pode corroborar aquela que é a alegação que se pretendia demonstrar, ou seja, que as facturas foram emitidas pela M...... mas as vendas foram feitas efectivamente pelo J….., pois que, como se constata, à maior liquidação de IVA de um, deveria corresponder o correlativo decréscimo de outro, o que não se verifica. Por conseguinte, entendemos que este circunstancialismo, mesmo para o IVA de 2009, pouco nos adianta para os fins aqui visados, sendo inútil relativamente aos restantes períodos de imposto”. Carece ainda de pertinência o invocado em torno de a Recorrente não conhecer nem ser responsável pelas irregularidades contabilísticas dos seus fornecedores. Como já explanado, a AT reuniu indícios sólidos de que as operações tituladas pelas faturas não corresponderam a operações reais (mesmo sob a perspetiva de serem operações alegadamente realizadas por J......). Esses indícios vão muito além das irregularidades contabilísticas, como já se deixou expresso, cabendo, como referido, à Recorrente a prova da efetividade das operações, o que não sucedeu. Da mesma forma não afasta tal entendimento o facto de terem sido movidos processos crime a J...... e M....... Com efeito, dos mesmos resulta que foram emitidas faturas e que não foi entregue o IVA nas mesmas liquidado, não havendo qualquer análise da efetividade das operações subjacentes às faturas emitidas, nem tão-pouco uma análise casuísta cliente a cliente. Tendo havido emissão de faturas, o que não é controvertido, tem de ser entregue ao Estado o IVA nas mesmas constantes. Questão diferente é aferir da efetividade das operações subjacentes, o que não é ali abordado. Como tal, tais decisões não têm o alcance que é assacado pela Recorrente. Assim, face ao exposto, considera-se que a AT reuniu, de forma fundamentada, indícios sérios de que as transações tituladas pelas faturas em causa não tiveram efetividade, revelando tais indícios que há uma probabilidade sustentada de não terem sido feitos os fornecimentos em causa pelos seus emitentes. Tendo a AT logrado reunir indícios sérios de que as operações tituladas pelas faturas em causa não correspondiam à realidade, caberia à Recorrente o ónus da prova da efetividade de todas as alegadas operações inerentes às faturas emitidas, o que não ocorreu, porquanto a Recorrente se centrou nos elementos documentais já considerados, cujas incongruências não permitem concluir por tal efetividade, como já se explanou a propósito da análise dos indícios recolhidos. Como tal, nesta parte, não assiste razão à Recorrente. III.C.2. Emitente de faturas C...... No que respeita a este emitente de faturas, a AT elencou, em sede de RIT, uma série de indícios que, sob a sua perspetiva, poriam em causa a presunção de veracidade inerente às faturas emitidas em 2010 e 2011, a saber: A) C...... emitiu faturas quer utilizando número de identificação fiscal (NIF) italiano, quer, no exercício de 2011, utilizando NIF português; B) Ao abrigo da cooperação administrativa, a informação obtida da AT italiana foi no sentido de: 1. Em 2010 e 2011 C...... não residia em Itália nem ali tinha qualquer atividade empresarial; 2. Não realizou, nos últimos 5-6 anos, nenhuma atividade na morada tida como sede da empresa, onde existe uma outra empresa; 3. O seu contabilista apenas teve contactos com ele para efeitos de apresentação da declaração de rendimentos de 2005; 4. O seu pai afirmou que o filho estava fora de Itália há longo tempo; 5. O seu último patrão confirmou que trabalhou com C...... em 2007, final de 2008 e início de 2009; 6. C...... deslocou-se muitas vezes a Portugal em nome de empresa italiana, a fim de obter o direito à colheita de terras cultivadas com pinheiros mansos; 7. C...... não tem qualquer propriedade em Itália onde possa ser localizado; 8. Os últimos registos, quer em termos de segurança social, quer em termos de impostos, remontam a 2006; 9. Desde 2008 não constam quaisquer registos das bases de dados da AT italiana; 10. As faturas em causa estão redigidas em italiano muito incorreto e com alguns códigos de isenção de IVA que não se enquadram na legislação italiana; 11. Os modelos de faturas que a AT italiana recolheu, emitidos por C......, são muito distintos dos emitidos para a empresa portuguesa; 12. A última vez que utilizou o seu NIF foi em 2007, dado que em 2008 e 2009 trabalhou por conta de outrem; C) Quanto à fatura emitida com NIF português, respeitante a 2011, a AT apurou o seguinte: 1. C...... deu início de atividade perante a AT a 20.01.2011; 2. O domicílio fiscal corresponde a apartamento, não tendo sido localizado C......; 3. Foi identificado um outro imóvel arrendado a C......; 4. As notificações enviadas, para ambas as moradas, não obtiveram resposta; 5. Junto do seu contabilista, apenas se identificou como venda a fatura emitida à Recorrente; 6. Como documento de compra de pinhas, estava registada uma fatura manuscrita, com o n.º…., datada de 17.02.2012, do próprio C......, com o NIF italiano; D) As guias relativas a 2010 apresentadas como documentos de transporte de parte das pinhas que constam das faturas emitidas por C...... respeitam a serviços prestados à Recorrente, de acordo com elementos obtidos junto da transportadora, e apresentam dados incongruentes com as faturas; E) Quanto aos transportes em 2011, de acordo com a informação obtida junto do transportador, as guias apresentadas foram preenchidas pela Recorrente, que apôs o carimbo do expedidor C......, e todas as indicações relativas a transporte foram dadas pela Recorrente, afirmando ainda que foi C...... quem pagou alguns dos transportes. A AT apurou na contabilidade do transportador que apenas uma fatura de 100,00 Eur. se encontrava paga, estando por pagar outra de 10.778,40 Eur.; no tocante à guia relativa à fatura emitida com NIF português, a mesma, tendo sido identificada, não foi apresentada; F) Em 2010, a maioria dos cheques foi descontada ao balcão, sendo que, em 2011, não se consegue aferir a que respeitam parte deles; G) Não se detetaram quaisquer fornecedores de pinhas a C....... Face ao que expusemos, desde logo do ponto de vista da fundamentação formal, não padece o RIT em causa de falta de fundamentação, estando cabalmente explanado o itinerário cognoscitivo percorrido, em cumprimento do disposto no art.º 77.º da LGT. Cumpre, pois, aferir se a AT logrou reunir indícios de que as operações, tituladas pelas faturas elencadas no RIT e que estiveram na base das correções técnicas atinentes a este emitente, não correspondiam a operações reais, considerando os termos em que tal é admissível e exigível a que já nos referimos supra. Também a este respeito, é de apelar à autoridade do caso julgado, nos termos já abordados anteriormente, desta feita em virtude da sentença proferida em primeira instância nos mencionados autos n.º 404/15.4BELRA, que nesta parte julgou improcedente a pretensão da ora Recorrente, decisão que nessa parte não foi objeto de recurso. Tal como aí se entendeu, considera-se que a AT reuniu indícios suficientemente fortes para abalar a presunção de veracidade inerente às faturas emitidas. Com efeito, e não obstante quanto aos pagamentos, sobretudo em 2011, haver indicação de depósitos de cheques, a verdade é que tal circunstância, per se, não afasta os demais indícios elencados, que permitem fundadamente concluir que nenhuma atividade foi exercida por C...... em Itália e que permitem abalar de forma segura a efetividade dos alegados fornecimentos de pinhas, atentando, desde logo, no facto de não haver fornecimentos de pinhas registados ou de haver fornecimentos do próprio, com o NIF italiano, em momento ulterior ao da emissão da fatura e de haver incongruências nas guias de transporte e até na identidade de quem estava a atuar. Assim, não se acompanha o entendimento da Recorrente, considerando que foram reunidos indícios suficientes pela AT. Como tal, nos termos já enunciados, caberia à Recorrente o ónus da prova da efetividade das operações, o que não logrou fazer – como resulta do facto não provado i). Aliás, também aqui a Recorrente se centrou nos elementos documentais já considerados pela AT, em virtude de considerar serem os mesmos suficientes, quando, nos termos que já referimos, as suas incongruências e fragilidades não permitem a conclusão de que os mesmos demonstram a efetividade das operações em causa. Como tal, carece também de razão, nesta parte, a Recorrente. III.C.3. Emitente de faturas V...... No tocante a esta emitente de faturas, a AT, socorrendo-se de informação cruzada, obtida junto da direção de finanças de Setúbal, elencou, em sede de RIT, uma série de indícios que, sob a sua perspetiva, poriam em causa a presunção de veracidade inerente às faturas emitidas em 2010 e 2011. Desde já se refira, globalmente, que é admissível a utilização de informação cruzada por parte da AT(14), sendo por isso possível lançar mão de elementos recolhidos pelos serviços de inspeção relativos a terceiros. Por outro lado, no caso dos autos, o RIT identifica o emissor do procedimento de inspeção que visa a emitente da fatura, bem como os elementos aí obtidos, que transcreve, pelo que está cabalmente identificada a informação cruzada utilizada, assegurando a transparência do procedimento. Assim, foram apurados os seguintes indícios: A) V...... não evidencia estrutura do negócio de compra e venda de cortiça, pinhas e linha, não tendo quaisquer instalações, equipamentos ou funcionários; B) Os valores de compras de pinhas respeitam a um único fornecedor, que não apresenta na sua contabilidade quaisquer documentos de aquisição que justifiquem os montantes faturados a V......; C) As transmissões iniciaram-se antes das aquisições, remontando as primeiras a sete meses antes; D) As contas bancárias evidenciam entradas de valor inferior a 50% do total dos recebimentos; E) As contas bancárias evidenciam a saída no próprio dia ou dos dias subsequentes de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais se referem na sua quase totalidade a levantamentos em numerários; F) A emissão das faturas evidencia irregularidades, designadamente em termos de emissão sequencial e a desconformidade entre originais na posse de clientes e cópias na posse do sujeito passivo. Face a estes elementos recolhidos, concluiu a AT estar na presença de indícios suficientemente ponderosos para poder concluir estar-se perante uma situação de faturação falsa. Desde já se refira que não se acompanha o entendimento da Recorrente, no sentido de se estar perante uma situação de falta de fundamentação. Com efeito, resulta evidenciado o itinerário cognoscitivo percorrido pela AT e que conduziu a que concluísse pela existência de fundados indícios de se estar perante faturação falsa, estando cabalmente fundamentado, motivo pelo qual, nesta parte, não assiste razão à Recorrente. Por outro lado, e quanto ao erro de julgamento alegado pela Recorrente, no sentido de a AT não ter logrado cumprir com o ónus de demonstrar a reunião de indícios sólidos, também não se acompanha tal entendimento, o que se encontra em consonância com o decidido nos autos n.º 404/15.4BELRA a este propósito, apelando-se, pois, novamente à autoridade do caso julgado. Com efeito, quanto a esta emitente, como referido, os indícios recolhidos evidenciam fragilidades estruturais (inexistência de instalações, equipamentos ou funcionários), incoerências ao nível dos fornecimentos e outras irregularidades formais, que não se compadecem com uma estrutura sólida de fornecimentos, situação comum em casos de faturação falsa. Por outro lado, o facto provado BB) não permite extrair a conclusão extraída pela Recorrente, na medida em que ali ficou provado que foi emitido cheque de valor correspondente ao da fatura emitida por V......, descontado ao balcão e transformado em numerário. Ora, além de não estar provado o efetivo pagamento a V….., porquanto o circuito subsequente do dinheiro não se encontra demonstrado, o facto de ter havido desconto ao balcão acentua ainda a perceção de a operação não ter sido real, considerando que, atentas as regras de experiência, se trata de procedimento usual nesse tipo de casos. Assim, tendo a AT reunidos indícios sólidos passíveis de pôr em causa a presunção de veracidade em causa, caberia à Recorrente o ónus da prova da efetividade da operação, o que não logrou fazer – como resulta, aliás, do facto não provado ii). Face ao exposto, também nesta parte carece de razão a Recorrente. Como tal, improcede, in totum, a pretensão da Recorrente. Nos termos do art.º 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. In casu, face à circunstância de já ter sido apreciada situação idêntica, no âmbito dos autos n.º 404/15.4BELRA, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP. IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida; b) Custas pela Recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda os 275.000,00 Eur.; c) Registe e notifique. Lisboa, 28 de novembro de 2019 (Tânia Meireles da Cunha) (Cristina Flora) (Patrícia Manuel Pires) ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ (1)Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 286. (2).Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, 6.ª Edição, Vol. II, Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 361 e 362; José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum à luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 333. (3).V., exemplificativamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.04.2013 (Processo: 0969/12) e de 15.09.2010 (Processo: 01149/09) e os Acórdãos deste TCAS, de 05.06.2019 (Processo: 1747/08.9BELRS) e de 18.06.2013 (Processo: 06121/12). (5).V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada. (6).Vejam-se, exemplificativamente, os Acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 01.02.2016 (Processo: 0591/15), de 16.03.2016 (Processos: 0400/15, 0587/15), de 19.10.2016 (Processo: 0511/15), de 16.11.2016 (Processo: 0600/15) e de 27.02.2019 (Processo: 01424/05.2BEVIS 0292/18). (8).Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Vol. V, p. 156. (12).Cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.11.2018 (Processo: 4263/16.1T8VCT.G1.S1) e de 27.02.2018 (Processo: 2472/05.8 TBSTR.E1). (14).Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05.02.2015 (Processo: 08097/14), de 22.02.2018 (Processo: 08959/15) e de 07.06.2018 [Processo: 813/11.8BELRA (09855/16)], bem como do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11.07.2017 (Processo: 00396/09.9BEPNF). |