Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:603/05.7BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:04/03/2025
Relator:ISABEL SILVA
Descritores:TAXAS DE CONSTRUÇÃO
LICENÇA DE CONSTRUÇÃO
Sumário:I - A distinção entre taxa e imposto assenta no caráter unilateral do imposto e no carácter bilateral ou sinalagmático da taxa, aqui correspondendo à prestação do particular, uma contraprestação específica, consubstanciada numa atividade do Estado ou de outros entes públicos especialmente dirigida ao respetivo obrigado, que se concretizará na prestação de um serviço público, no acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à atividade dos particulares (art. 4º nº 2 da LGT).

II- A taxa de construção de obras, versada no artigo 30º nº 6 do Regulamento Municipal de Taxas e Licenças do B........................, é devida pela remoção de um obstáculo à atividade construtiva da recorrente;

III- A taxa referida em II) é distinta das taxas relativas às infraestruturas urbanísticas.

IV- A liquidação das taxas referidas em II), inserem-se na atividade vinculada da administração e, nesse contexto, traduzem-se numa operação meramente aritmética, sustentada em fórmulas que contêm o esquema de cálculo a adotar para se encontrar o seu quantum, que tem por base os elementos constantes do processo de licenciamento, sem comportar qualquer definição do direito do particular, o que (já) ocorre com o ato de licenciamento que lhe serve de pressuposto.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

S…………. - SOCIEDADE ……………., S.A, veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em 11.05.2018, na qual foi julgada improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra os atos de liquidação e cobrança das «taxas de construção» que o Município do B........................, impugnado e ora recorrido, praticou no âmbito dos procedimentos de licenciamento camarários nºs CT……../00 e CT/………../00, nos montantes, respetivamente de €43.898,25 e de €44.031,99.

*

O Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, com as seguintes conclusões:

“A - DA INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE DO RMLCTL

1ª. Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, as normas do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................ (RMLCTL) são inconstitucionais e inaplicáveis in casu (v. art. 204° da CRP e art. 1°/2 do ETAF), pois:

a) Inexiste e não é sequer teoricamente configurável qualquer contrapartida específica, já realizada ou a realizar pelo Município do B........................ (v. arts. 2º, 9º, 18°, 103º e 266º da CRP);

b) Os elementos essenciais dos tributos em causa - taxa, incidência objectiva e subjectiva - nunca poderiam ser objecto de simples regulamento municipal (v. arts. 103º/2 e 3, 112º/5 e 165º/1/i) da CRP):

c) As normas do referido regulamento municipal criaram impostos ou contribuições especiais, que são da exclusiva competência da Assembleia da República (v. arts. 112° e 165º/1/i) da CRP) - cfr. texto n°s. 2 a 4;

B - DA INAPLICABILIDADE DO RMLCTL


2ª. A liquidação e cobrança dos tributos em causa fundamentou-se no RMLCTL, publicado no Diário da República, Apêndice n.° 6-B, II Série, n.° 13, de 2001.01.16, tendo entrado em vigor, em 2001.02.01 (v. art. 18°), com a atualização dos valores da tabela de taxas e licenças, de 2004.02.01 (v. fls. 50 a 71 dos autos) - cfr. texto n°s. 5 a 9;


3ª. O RMLCTL é inaplicável in casu, pois a ora recorrente apresentou os pedidos de licenciamento das edificações em causa, em 2000.11.06 (v. Alíneas A) a D) dos FP), e o referido regulamento municipal apenas entrou em vigor cerca de três meses depois, em 2001.02.01 (v. art. 18° do RMLCTL) - cfr. texto n°s. 5 a 9;


4ª. A aplicação das referidas normas regulamentares determinaria a imposição retroactiva do pagamento de tributos não previstos na lei e que a ora recorrente não podia antecipadamente prever, em clara violação dos princípios da protecção da confiança, da segurança, da justiça e da boa fé (v. arts. 2º, 9º, 18º, 103° e 266° da CRP; cfr. arts. 4º e 8º da LGT e arts. 3º, 5º e 6º do CPA), causando-lhe prejuízos absolutamente desproporcionados e injustificados - cfr. texto n°s. 5 a 9;


C - DA NULIDADE DOS TRIBUTOS SUB JUDICE

5ª. Os actos sub judice são nulos, pois basearam-se em normativos manifestamente inconstitucionais, inaplicáveis e ilegais - RMLCTL conforme se demonstrou, carecendo em absoluto de base legal, integrando o exercício de poderes tributários e a liquidação de tributos não previstos na lei (v. art. 2º/4 da Lei 42/98 e art. 88°/1 /a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março; cfr. Ac. STA, de 1999.03.02, AD 454/1243)- cfr. texto n°s. 10 a 17;

6ª. Os actos sub judice são inválidos por falta de elementos essenciais (v. art. 133º/1 do CPA), pois traduzem-se na exigência de obrigações tributárias sem causa legal e em clara violação do princípio reforçado da legalidade tributária, do princípio da proibição da retroactividade dos impostos (v. art. 103° da CRP e art. 133º/2/d) do CPA) e do direito fundamental de propriedade privada (v. art. 62° da CRP) - cfr. texto n°s. 10 a 17;

7ª. Os actos sub judice são ainda inválidos por falta de atribuições (v. art. 133º/2/b) do CPA: cfr. arts. 103° e 168º/1/i) da CRP; cfr. art. 95º/2/a) da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro), e por ofenderem o conteúdo essencial dos direitos fundamentais consagrados nos arts. 62°, 103° e 105° da CRP (v. art. 103º/2 da CRP e art. 133º/2/d) do CPA) e ainda por serem consequentes de actos nulos e ineficazes (v. arts. 133º/2 e 134° do CPA)- cfr. texto n°s. 10 a 17;

D - DA INEXIGIBILIDADE DOS TRIBUTOS SUB JUDICE

8ª. Como resulta expressamente do preâmbulo e do art. 30º/6 do RMLCTL, as taxas têm de reflectir não só a localização das construções, mas também o respectivo uso e pressão que as mesmas alegadamente criarão nas infra-estruturas gerais existentes ou a realizar, o que claramente não se verificou in casu - cfr. texto n°s. 18 a 25;

9ª. Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, no caso sub judice não se verificam os pressupostos de que dependia a exigibilidade das quantias em causa, pelo que não se constituiu qualquer facto tributário (v. art. 103° da CRP; cfr. arts. 4º e 8º da LGT), como resulta do seguinte:

a) Não se provou a existência de qualquer efectiva e específica utilidade prestada à ora recorrente pelo Município, em consequência da alegada pressão que as construções criariam nas infra-estruturas gerais existentes ou a realizar por aquela entidade pública (v. Alíneas Y), Z) e AA) dos FP);

b) O Município do B........................ não realizou, não se obrigou a realizar, nem suportou quaisquer despesas com obras de infra-estruturas gerais, designadamente, a abertura, alargamento, regularização de via pública e/ou grandes vias de comunicação (v. Alíneas Y), Z) e AA) dos FP);

c) Nos orçamentos e planos de actividade do Município do B........................ nunca esteve prevista a realização de obras de urbanização ou a instalação e reforço das existentes no local, em consequência dos licenciamentos das construções em causa (v. Alíneas Y), Z) e AA) dos FP) - cfr. texto n°s. 18 a 25;

10ª. Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, não estamos perante meras taxas "devida(s) pela realização de obras de construção", pois no momento em que foram praticados os actos tributários impugnados, já haviam sido realizadas todas as obras de urbanização, no âmbito da operação de loteamento, tendo o promotor - e não o Município do B........................ - suportado os custos respectivos e pago as correspondentes taxas urbanísticas -cfr. texto n°s. 18 a 25;

E - DA PRETERIÇÃO DE AUDIÇÃO PRÉVIA DA ORA RECORRENTE

11ª. Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, os actos sub judice violaram frontalmente o disposto nos arts. 2°, 18°, 266°, 267°/5 e 268/1 da CRP, no art. 60° da LGT e no art. 45° do CPPT, bem como nos arts. 1º, 2º, 8º e 100°/1 do CPA. pois:

a) No procedimento que culminou com a emissão dos actos de liquidação e cobrança imputáveis a órgãos e serviços do Município do B........................, não foram minimamente assegurados os direitos de audiência e defesa da ora recorrente, em frontal violação do disposto nos arts. 267º/5 e 268° da CRP. 60° da LGT e 45º/1 do CPPT:

b) Nunca se poderia considerar sanado o referido vício, pelo simples facto de a recorrente ter participado no procedimento de licenciamento, não havendo lugar a "qualquer actividade instrutória distinta da que tem lugar no procedimento de licenciamento”, pois:

i) As pronúncias emitidas no âmbito do procedimento de licenciamento incidiram sobre aspectos instrutórios e urbanísticos específicos da operação urbanística em causa, sem qualquer relação com o liquidação e cobrança dos tributos em causa:

ii) O procedimento de liquidação dos tributos em causa e o procedimento de reclamação graciosa, são autónomos e independentes do procedimento de licenciamento da operação urbanística em causa;

iii) No procedimento de liquidação têm que ser analisados os critérios, factores de cálculo e elementos de facto (áreas de projecto, áreas licenciadas, afectações e outros), concretamente considerados pelo Município do B........................ na liquidação dos tributos em causa, para “o contribuinte poder controlar os termos em que foi feito o cálculo da matéria colectável" (v. Ac. STA de 2002.11.13, Proc. 977/02, in www.dgsi.pt):

c) No caso em análise não se verificou qualquer pressuposto que permitisse a dispensa de audiência prévia da ora recorrente e mesmo que existisse - o que não se aceita - sempre teria que ser invocado fundamentadamente (v. art. 103º/2 do CPA), não sendo minimamente aplicável o princípio do aproveitamento dos actos administrativos, sob pena de frontal violação do disposto nos arts. 2º, 18° e 266° da CRP, não podendo os Tribunais substituir-se à Administração no exercício de funções tributárias (v. arts. 202° e 266° da CRP), estando em causa "formalidade essencial a observar, a notificação do destinatário do acto tributário final, para exercer, querendo, o direito de audição, e (...) a preterição de tal poder/dever é insusceptível de se degradar em formalidade não essencial” (v. Ac. TCA Sul de 2008.11.11, Proc. 02020/07; Ac. STA de 2014.10.15, Proc. 1374/13, in www.dgsi.pt);

d) A participação da ora recorrente no procedimento de liquidação e cobrança dos tributos sub judice era susceptível de influenciar a decisão final, considerando as manifestas ilegalidades dos tributos impugnados (v. Ac. STA de 2015.11.04. Proc. 01082/13. www.dgsi.pt) – cfr. texto n.º 26;

F - DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO

12. Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, os actos sub judice violaram frontalmente o disposto no art. 268°/3 da CRP, nos arts. 124° e 125° do CPA e no art. 77° da LGT, pois:

a) Assentam em meros juízos conclusivos e não recondutíveis, por si só, a quaisquer factos concretos passíveis de ser valorados in casu (v. Ac. STA de 2015.09.09, Proc. 01173/74; Ac. STA de 2012.04.19, Proc. 036/12; Ac. STA de 2010.10.22, Proc. 00018/02; Ac. STA de 2004.07.01, Proc. 058/03, in www.dsgi.pt; cfr. Acs. STA de 2005.03.17, Proc. 0103/05: de 1991.04.11, Proc. 25.846-TP; de 1982.02.18, AD 247/920; de 1989.01.10, AD 339/1303; de 1988.10.25, AD 327/371);

b) Na fundamentação da liquidação dos tributos em análise era essencial que tivessem sido invocados, ainda que de forma sucinta, os factos integradores da previsão do art. 30°/6 do RMLCTL, nomeadamente a localização das construções, mas também o respectivo uso e pressão que as mesmas alegadamente criariam nas infra-estruturas gerais existentes ou a realizar pelo Município do B........................, o que claramente não se verificou in casu:

c) A simples referência ao ''art. 30° n.° 6" nunca seria susceptível de integrar uma fundamentação de direito suficiente e congruente, pois, como bem se decidiu no douto Acórdão do Venerando Supremo Tribunal Administrativo, de 1985.05.30, a fundamentação de direito tem que ser concreta, ou seja, que se recorte à aplicação específica dos comandos legais em causa ao caso individual a decidir (…), não satisfazendo referências vagas que não permitam ao interessado o conhecimento das razões justificativas do acto" (v. Ac. TCA Sul de 2012.06.19, Proc. 05096/09; Ac. TCA Norte de 2017.10.26, Proc. 00476/13; AD 295/816; cfr., no mesmo sentido, Ac. STA de 1985.02.05, AD 288/1405; de 1989.01.10, AD 339/1303; de 1988.10.25, AD 327/371; de 1982.12.09, AD 255/348; de 1981.12.10, AD 246/755) - cfr. texto n°. 27.


NESTES TERMOS,

Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.”

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O Recorrido apresentou contra-alegações, nos termos que se seguem:

1. As taxas exigidas à recorrente foram-no em razão de construção nova, taxas que são calculadas por aplicação de fórmulas matemáticas pré-estabelecidas, devendo ser liquidadas pelo promotor daquelas operações de construção nova como condição para o pedido a efectuar de emissão de alvará junto da entidade competente e, em consequência, o alvará de licença de construção, logo, as taxas sub judice não têm a natureza de taxa de participação em infra estrutura urbanística, previstas noutra sede no respectivo Regulamento Municipal (art.° 46°) ou sequer taxas relativas às obras de urbanização ou loteamento.
2. As taxas foram liquidadas e cobradas pela recorrida ao abrigo do art.° 30° n.° 6 (art.° 29° n.º 6 na redacção vigente), ou seja, tratam-se de taxas devidas pela realização de edificações novas.
3. Assim, as quantias devidas pelo licenciamento de duas operações de construções novas, tituladas pelos respectivos alvarás emitidos pela recorrida a favor a recorrente, são taxas e não impostos ou contribuições especiais e não sendo organicamente inconstitucionais as normas regulamentares, também não padecem de qualquer vício de nulidade, as liquidações emitidas com fundamento nas mesmas.
4. Num segundo plano, a recorrente sustenta a inaplicabilidade do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................, tendo por base duas ideias essenciais: o facto de, alegadamente, o Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................ ter entrado em vigor num momento muito posterior ao pedido de licenciamento da construção, em violação dos princípios da segurança, confiança e cognoscibilidade.
5. Face ao determinado no n.º 1 do artigo 117.° do referido Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de Dezembro, não podem restar quaisquer dúvidas de que a liquidação das taxas devidas pelo deferimento do pedido de licenciamento ou de autorização tem de ser feita de acordo com o regulamento municipal (e tabela de taxas que o mesmo haja fixado) em vigor à data do acto administrativo que deferiu tais pedidos e não de um qualquer outro regulamento anterior. Ou seja, para efeitos de liquidação daquelas taxas é irrelevante que o processo de licenciamento se tenha iniciado em data anterior à entrada em vigor daquele regulamento ou que, durante o procedimento, a administração tenha produzido outros actos (v.g., o acto de aprovação do projecto de arquitectura) ainda na vigência de anterior regulamento municipal. Só não seria assim, se o novo regulamento integrasse norma transitória a determinar a sua não aplicação aos processos em curso aquando da sua entrada em vigor.
6. Toda a argumentação desenvolvida pela recorrente em torno da nulidade dos actos de liquidação, é desprovida de fundamento, porque o regulamento não é inconstitucional, porque os tributos em causa são taxas e não impostos, porque o actos de liquidação não enfermam de qualquer vício invalidante e por consequência, o conteúdo essencial dos direitos fundamentais que se dizem violados, não estão, nem nunca estiveram em causa. Não se verificando as premissas de que parte, nenhuma das conclusões da recorrente merece acolhimento, conforme bem se assinalou na sentença recorrida.
7. Para sustentar a tese da inexigibilidade dos Tributos sub judice, a recorrente, alega que os tributos em causa têm a natureza de impostos e não de taxas, por lhe faltar a característica da signalagmaticidade.
8. Ora, para o caso releva o que dispunha a Lei das Finanças Locais (aprovada pela Lei n.° 42/98, de 6.08), aplicável ao caso vertente, que consagra no seu 16.° que constituem receitas dos Municípios “o produto da cobrança de taxas por licenças concedidas pelo município” [al. c)] e “o produto da cobrança de taxas, tarifas e preços resultantes da prestação de serviços pelo município” [al. d)]. Prescrevendo o seu artigo 19.°, que os Municípios podem cobrar taxas designadamente pela realização, manutenção e reforço de infra-estruturas urbanísticas [al. a]; e pela concessão de licenças de loteamento, de licenças de obras de urbanização, de execução de obras particulares, de ocupação da via pública por motivo de obras e de utilização de edifícios, bem como de obras para ocupação ou utilização do solo, subsolo e espaço aéreo do domínio público municipal [al. b)].
9. Não restam dúvidas que estamos perante taxas e não impostos, exigíveis pela realização de obras de construção, de acordo com o que se acha previsto no art.º 30° n.° 6 do Regulamento, conforme decidiu na douta sentença recorrida.
10. No caso, importa ter presente, conforme se deixou decidido, que o cálculo do montante das taxas de licença de construção, nos termos do Regulamento municipal, é efetuado através da aplicação de fórmulas que visam obter o quantum da taxa, em que os elementos de facto considerados neste cálculo são as suas características: o tipo de utilização da obra, a área de construção (A) e o custo do m2 da construção (C), tendo como referencial 100m2, pelo que os dados respeitam à dimensão, importância e valor da própria obra.
11. Donde, não é possível concluir, nomeadamente, pela inexigibilidade do tributo por desajustamento entre o montante a pagar a título de «taxa» de licença de construção, pela realização de edificações novas, e o valor que o particular retira dessa utilização.
12. É de qualificar como «taxa» o tributo pago como contrapartida pela emissão da licença de construção, destinada à realização de construção nova, o que significa que o artigo 30.° [artigo 29.°, de acordo com a tabela vigente em 2004], n.° 6 do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................ não enferma de qualquer inconstitucionalidade.
13. Assim, constituindo as quantias impugnadas, devidas pelo licenciamento de duas construções de obras novas, tituladas pelos competentes alvarás emitidos pela Câmara Municipal do B........................ a favor da sociedade Impugnante, uma «taxa», que não um imposto ou contribuição especial, e não sendo (organicamente) inconstitucionais as normas regulamentares que a fixaram, as liquidações impugnadas não padecem da ilegalidade/nulidade por falta de atribuições do Município do B........................, tal qual a mesma vem alegada pela recorrente.
14. Nos presentes autos estão em causa obras novas e a taxa é a contrapartida pela emissão da licença de construção, destinada à realização de construção nova que pelas suas características preenche os requisitos para aplicação dos respectivos dispositivos regulamentares (art.° 30.° n.° 6 do Regulamento).
15. A recorrente pretende extrair do facto de ter sido ela mesma a realizar as obras de urbanização que antecederam as obras de construção, o argumento de que por isso não teria de liquidar esta taxa, o que, como é evidente não pode proceder, uma vez que, in casu, é a própria construção que a justifica e constitui o seu fundamento, pela sua localização, mas também o respectivo uso e pressão que a mesma criará na sua envolvente (cft. Preâmbulo do RMLCTL).
16. Da emissão da licença de construção para uma construção nova com as características supra aludidas resultam claros e óbvios benefícios para a recorrente, que constituem o fundamento da taxa, de que avulta o sinalagma que a caracteriza.
17. A dedução nas taxas, do valor das obras de construção fora da propriedade pressupõe que haja interesse municipal e acordo do titular da licença, pelo que esta previsão, que visa conferir maior justiça e equidade na solução regulamentar encontrada, não tem aplicação no caso concreto.
18. Dada a dimensão e características de uma dada construção, a mesma cria uma pressão adicional sobre as infra estruturas adjacentes, independentemente de quem as tenha realizado ou pago as respectivas taxas pelas respectivas obras de urbanização (que pode ser quem constrói ou um terceiro).
19. Pela forma clara, escorreita e bem fundada, a sentença recorrida não merece também neste particular qualquer reparo, nem a alegação da recorrente a abala, pelo que damos aqui por integralmente reproduzido tudo quanto ali bem se deixou dito.
20. Sumariamente, dir-se-á, que o direito de audiência previsto no artigo 60.° da LGT é uma concretização do direito constitucional de participação dos cidadãos na formação das decisões administrativas que lhes digam respeito, garantido pelo artigo 267.°, n.° 5, da CRP.
21. Bem andou o Tribunal a quo quando decidiu que não se acha violado o direito de audição, no caso vertente, desde logo, porque as liquidações das duas taxas de licença de construção em presença não têm lugar em procedimento próprio, uma vez que são efetuadas no âmbito do procedimento de licenciamento e com base nos elementos constantes deste. Não existem procedimentos autónomos, mas apenas o procedimento de licenciamento
22. Por esta razão, não há lugar a qualquer atividade instrutória distinta da que tem lugar no procedimento de licenciamento, sendo certo que é justamente no âmbito deste mesmo procedimento de licenciamento que se deve realizar a audiência dos interessados (neste caso, por aplicação do artigo 100.° do CPA e do regime concretamente aplicável ex vi do RJUE).
23. Os actos de liquidação das taxas são acto estritamente vinculados, que surgem na decorrência de meras operações aritméticas, não contendo em si mesmas a definição jurídica do direito da interessada, pelo que não devem ser antecedidos de audiência prévia.
24. A fundamentação deve ser expressa, clara, suficiente e congruente, sendo equivalente à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.
25. Mais uma vez, neste particular, a douta sentença recorrida decidiu bem, alias, de forma clara, suficiente e congruente porquanto concluiu não estar verificado o vício de falta de fundamentação, com os argumentos que adiante enunciaremos- e integralmente aqui damos por reproduzidos.
26. Não estão em causa, “juízos conclusivos”. A localização das construções e as respectivas características e pressão que as memas causam nas infra estruturas resultam do procedimento de licenciamento do qual fluem os factos sobre os quais incidem as respectivas taxas devidas pela emissão das respectivas licenças de construção.
27. Não restam dúvidas algumas sobre quais as razões de lacto e de direito que fundamentam os tributos em causa, pelo que os actos também não padecem do invocado vício.”
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Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, nos termos do art. 288.º, n.º 1 do CPPT, o qual emitiu parecer no sentido de negar provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento.
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II -QUESTÕES A DECIDIR:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT].
Nesta conformidade, cabe a este Tribunal apreciar e decidir se a decisão recorrida padece de erro de julgamento no ajuizado quanto à:
(i) - (In)constitucionalidade orgânica dos tributos cobrados nos autos, por violação do artigo 165.º da CRP;
(ii) - Nulidade dos tributos por inexistência de factos tributários, por falta de elementos essenciais, falta de atribuições, por violação do princípio da retroatividade e por violação do direito fundamental de propriedade privada;
(iii) – Inexigibilidade do tributo, por falta de contrapartida do Município, relativamente às taxas liquidadas e cobradas;
(iv)- (In)aplicabilidade das normas do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças (RMLCTL) – Aviso nº459-B/2001, publicado no Diário da República, Apêndice n.º6-B, II série, n.º 13, de 6.01.2001- por preterição do princípios da proteção da confiança, da segurança, da justiça, da boa-fé e da proporcionalidade;
(v)- Violação do direito de audição;
(vi)- Violação do dever de fundamentação dos atos de liquidação em causa.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:”
A) - A 6 de novembro de 2000, a sociedade S................... - SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, S.A., ora Impugnante, requereu, junto da Câmara Municipal do B........................, o licenciamento para a realização das obras de construção de edifício de 8 pisos e cave, sito na Urbanização da Quinta …………, Lote 22, L……………. - cfr. fls. 1-25 do processo de licenciamento camarário n.º CT/256/00 apenso, em conjugação com os depoimentos das 1.ª e 3.ª testemunhas inquiridas;

B) - O pedido de licenciamento de construção apresentado pela ora Impugnante, identificado na alínea antecedente, deu origem ao processo camarário nº CT/…./00, que correu os seus termos na Câmara Municipal do B........................ - facto que se extrai do processo de licenciamento camarário n.º CT/256/00 apenso, em conjugação com os depoimentos das 1.8 e 3.8 testemunhas inquiridas;

C) - A 6 de novembro de 2000, a sociedade S................... - SOCIEDADE …………, S.A., ora Impugnante, requereu, junto da Câmara Municipal do B........................, o licenciamento para a realização das obras de construção de edifício de 8 pisos e cave, sito na Urbanização da ……………., Lote 23, L………….. - cfr. fls. 1-25 do processo de licenciamento camarário n.° CT/257/00 apenso, em conjugação com os depoimentos das 1.8 e 3.8 testemunhas inquiridas;

D) - O pedido de licenciamento de construção apresentado pela ora Impugnante, identificado na alínea antecedente, deu origem ao processo camarário n.º CT/257/00, que correu os seus termos na Câmara Municipal do B........................ - facto que se extrai do processo de licenciamento camarário n.º CT/257/00 apenso, em conjugação com os depoimentos das 1 .ª e 3.ª testemunhas inquiridas;

E) - A 1 de abril de 2004, a sociedade S................... - SOCIEDADE ……………S, S.A., ora Impugnante, apresentou, junto da Câmara Municipal do B........................, um pedido de reaprovação de projeto do prédio sito na Quinta …………., Lote 22, a que se refere o processo camarário n.º CT/………6/00 - cfr. fls. 658 do processo de licenciamento camarário n.º CT/256/00 apenso;


F) - A 1 de abril de 2004, a sociedade S................... - SOCIEDADE ……………….., S.A., ora Impugnante, apresentou, junto da Câmara Municipal do B........................, um pedido de reaprovação de projeto do prédio sito na Quinta ……….s, Lote 23, a que se refere o processo camarário n.º CT/……../100 - cfr. fls. 687 do processo de licenciamento camarário n.º CT/257/00 apenso;


G) - Com data de 20 de julho de 2004, o Departamento de Planeamento e Gestão Urbana (DPGU) da Câmara Municipal do B........................, elaborou "Informação", no âmbito do processo de licenciamento n.° CT/…/00, na qual propôs o deferimento do pedido de reaprovação dos projetos de arquitectura, de isolamento térmico (RCCTE), estabilidade, redes prediais de águas, saneamento, segurança contra risco de incêndios e acústico, e o deferimento da junção dos projetos de elevadores e instalação de infraestruturas de telecomunicações em edifícios - cfr. fls. 95 dos autos;


H) - A 20 de julho de 2004, a Chefe de Divisão do DPGU proferiu despacho com o seguinte teor, exarado na "Informação" identificada na alínea antecedente:

"Propõe-se o deferimento do licenciamento do processo pelo período aprovado na calendarização da obra, devendo o titular requerer o alvará de licença de construção, nos termos do art.º 76.º do D.L. n.º 555/99, de 16/ 12, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 177/01 de 04/06" - cfr. fls. 95 dos autos;


I) - Com data de 20 de julho de 2004, o DPGU, elaborou "Informação'', no âmbito do processo de licenciamento n.º CT/257/00, na qual propôs o deferimento do pedido de reaprovação dos projetos de arquitectura, de isolamento térmico (RCCTE), estabilidade, redes prediais de águas, saneamento, segurança contra risco de incêndios e acústico, e o deferimento da junção dos projetos de elevadores e instalação de infraestruturas de telecomunicações em edifícios - cfr. fls. 88 dos autos;

J) - A 20 de julho de 2004, a Chefe de Divisão do DPGU proferiu despacho com o seguinte teor, exarado na "Informação" identificada na alínea antecedente:

"Propõe-se o deferimento do licenciamento do processo pelo período aprovado na calendarização da obra, devendo o titular requerer o alvará de licença de construção, nos termos do art.º 76.º, do D.L. n.º 555/99, de 16/12, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 177/01 de 04/06" - cfr. fls. 88 dos autos;


K) - A 21 de julho o Vereador do DPGU proferiu despacho de concordância quanto à proposta de deferimento de licenciamento vertida na "Informação" identificada na alínea G) - cfr. fls. 95 dos autos;


L) - A 21 de julho o Vereador do DPGU proferiu despacho de concordância quanto à proposta de deferimento de licenciamento vertida na "Informação" identificada na alínea I) - cfr. fls. 88 dos autos;

M) - Com data de 26 de julho de 2004, o DPGU elaborou o inscrito designado por "CÁLCULO DE LICENÇAS PARA OBRAS", por referência ao processo camarário n.º CT/… /00, com o seguinte teor:

«Texto no original»

- cfr. fls. 87 dos autos;

N) - Com data de 26 de julho de 2004, o DPGU elaborou o inscrito designado por "CÁLCULO DE LICENÇAS PARA OBRAS", por referência ao processo camarário n.º CT/….100, com o seguinte teor:

«Texto no original»

- cfr. fls. 94 dos autos:

O) - A 28 de julho de 2004, o DPGU remeteu à sociedade S…………. - SOCIEDADE DE ………….., S.A., ora Impugnante, o ofício n.º 1300/DGU, com o n.º de saída 5001, assinado pelo Vereador do referido DPGU, com o seguinte teor:

“(…) ASSUNTO: CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIO DE 8 PISOS E CAVE SITO NA URBANIZAÇÃO DA ……………….., LOTE 23 - LAVRADIO CT/………/00

Levo ao V. conhecimento que, por meu despacho de 21 de Julho de 2004, informa-se o seguinte: O deferimento do pedido de reaprovação dos projectos de arquitectura, de isolamento térmico (RCCTE), estabilidade, redes prediais de águas, saneamento, segurança contra risco de incêndios e acústico, nos termos dos n.ºs 4 e 6 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo D.L. 177/01 de 4 de Junho, bem como o deferimento da junção dos projectos de elevadores e instalação de infraestruturas de telecomunicações em edifícios.

Mais se informa o deferimento do licenciamento do processo pelo período aprovado na calendarização da obra.

No prazo referido do artigo 76°do DL 555/99 de 16/12, com as alterações introduzidas pelo DL 177/01de 4/6, deverá dirigir-se ao Atendimento do Departamento, sito no Largo Alexandre Herculano, n° 85-1°, a fim de requerer o alvará de licença de construção nos termos do artigo acima referido e proceder ao pagamento das respectivas taxas.

Informa-se ainda que de acordo com o Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas, Licenças e Autorizações, salvo qualquer alteração ao mesmo entretanto entrada em vigor, o valor das licenças é o seguinte:

…/…

Licença de construção: € 44.031,99 (quarenta e quatro mil e trinta e um euros e noventa e nove cêntimos).

Licença de Ocupação de Via Pública: € 3.793,00 (três mil setecentos e noventa e três euros).

De acordo com o D.L. n° 46950 de 9/4/66 referente ao encargo de Mais Valia o valor a cobrar é de € 1.526,32 (mil, quinhentos e vinte e seis euros e trinta e dois cêntimos)”.

- cfr. fls. 82-83 dos autos;

P) - A 28 de Julho de 2004, o Departamento de Planeamento e Gestão Urbana da Câmara Municipal do B........................ remeteu à sociedade S................... - SOCIEDADE ……………., S.A., ora Impugnante, o ofício n.º 1301/DGU, com o n.º de saída 5000, com o seguinte teor:

“(…) ASSUNTO: CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIO DE 8 PISOS E CAVE SITO NA URBANIZAÇÃO ………………., LOTE 22 – L……………..CT/256/00

Levo ao V. conhecimento que, por meu despacho de 21 de Julho de 2004, informa-se o seguinte:

O deferimento do pedido de reaprovação dos projectos de arquitectura, de isolamento térmico (RCCTE), estabilidade, redes prediais de águas, saneamento, segurança contra risco de incêndios e acústico, nos termos dos n.ºs 4 e 6 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo D.L. 177/01 de 4 de Junho, bem como o deferimento da junção dos projectos de elevadores e instalação de infraestruturas de telecomunicações em edifícios.

Mais se informa o deferimento do licenciamento do processo pelo período aprovado na calendarização da obra.

No prazo referido do artigo 76°do DL 555/99 de 16/12, com as alterações introduzidas pelo DL 177/01de 4/6, deverá dirigir-se ao Atendimento do Departamento, sito no Largo Alexandre Herculano, n° 85-1°, a fim de requerer o alvará de licença de construção nos termos do artigo acima referido e proceder ao pagamento das respectivas taxas.

Informa-se ainda que de acordo com o Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas, Licenças e Autorizações, salvo qualquer alteração ao mesmo entretanto entrada em vigor, o valor das licenças é o seguinte:

…/…

Licença de construção: € 43.898,25 (Quarenta e três mil, oitocentos e noventa e oito euros e vinte e cinco cêntimos).

Licença de Ocupação de Via Pública: 3.379,09 (Três mil, trezentos e setenta e nove euros e nove cêntimos).

De acordo com o D.L. n° 46950 de 9/4/66 referente ao encargo de Mais-valia o valor a cobrar é de € 1.511,36 (Mil, quinhentos e onze euros e trinta e seis cêntimos) ”- cfr. fls. 698-699 do processo de licenciamento camarário n.º CT/256/00 apenso;

Q) - A 6 de outubro de 2004 a Impugnante procedeu ao pagamento do montante de € 43.898,25, por referência ao processo camarário n.º CT/256/00, de acordo com o teor da seguinte "GUIA DE RECEBIMENTO":

«Texto no original»

- cfr. fls. 700 do processo de licenciamento camarário n .º CT/256/00 apenso;

R) - A 6 de outubro de 2004, a Impugnante requereu a emissão de alvará de licença de construção para a execução da construção nova referente ao Lote n .º 22, a que corresponde o processo camarário n .º CT/……./00 - cfr. fls. 834-835 do processo de licenciamento camarário n.º CT/256/00 apenso;

S) - A 6 de outubro de 2004, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante de € 44.031,99, por referência ao processo camarário n.º CT/………/00, de acordo com a seguinte "GUIA DE RECEBIMENTO":

«Texto no original»

- cfr. doc. n.º 1 junto à p.i.;

T) - A 6 de outubro de 2004, a Impugnante requereu a emissão de alvará de licença de construção para a execução da construção nova referente ao Lote n.º 23, a que corresponde o processo camarário n.º CT/……./00 - cfr. fls. 850-851 do processo de licenciamento camarário n.º CT/257/00 apenso;

U) - A 13 de outubro de 2004, foi emitido o alvará n.º 152/04, para a realização de obras de construção de edifício com uma área licenciada de 4062.13m2, com 8 pisos acima da cota de soleira, 1 abaixo da cota de soleira, composto por 21 fogos destinados a habitação, r/c com 5 estabelecimentos comercias e cave com 19 estacionamentos, que incidem sobre o lote 22 - cfr. fls. 836 do processo de licenciamento camarário n.º CT/…../00 apenso;

V) - A 13 de outubro de 2004, foi emitido o alvará n.º 153/04, para a realização de obras de construção de edifício com uma área licenciada de 4086.63m2, com 8 pisos acima da cota de soleira, 1 abaixo da cota de soleira, composto por 21 fogos destinados a habitação, r/c com 5 estabelecimentos comercias e cave com 21 estacionamentos, que incidem sobre o lote 23 - cfr. fls. 852 do processo de licenciamento camarário n.º CT/………/00 apenso;

W) - A 3 de janeiro de 2005, a ora Impugnante apresentou RECLAMAÇÃO GRACIOSA «da liquidação e cobrança das "taxas de construção - coletivo'', no montante de € 43.898,25 e de € 44.031,99 exigidas pela Câmara Municipal do B........................ no âmbito dos processos camarários n.ºs 256/00-CT e 257/00-CT», na qual requereu a anulação dos atos de liquidação e o reconhecimento de que as aludidas liquidações se deveram a erro imputável aos serviços - cfr. fls. 2-5 do PAT, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

X) - Por ofício de 16 de fevereiro de 2005, do DPGU, dirigido à ora Impugnante, foi levado ao seu conhecimento o teor do parecer jurídico do DPGU, com o seguinte teor: "(...)

«Texto no original»

(…)” - cfr. fls. 22-24 dos autos;

Y) - O Município do B........................ não realizou, não se obrigou a realizar, nem suportou quaisquer despesas com obras de infraestruturas gerais, designadamente, a abertura, alargamento, regularização de via pública e/ou grandes vias de comunicação, em consequência dos licenciamentos das construções novas, a que se referem os processos camarários n .ºs CT/………../00 e CT/…../00 - cfr. facto invocado nos artigos 11.º, 13.º, 14.º, 18.º, 20.º e 21.º da p.i. e reconhecido pelo Município do B........................ nos artigos 1.º e 2.º do seu requerimento de fls. 77-78 junto aos autos; facto confirmado pelos depoimentos das testemunhas inquiridas, conforme fundamentação constante na motivação da matéria de facto, para a qual se remete;

Z) - Nos orçamentos e planos de actividade do Município do B........................ nunca esteve prevista a realização de obras de urbanização ou a instalação e reforço das existentes no local, em consequência dos licenciamentos das construções novas, a que se referem os processos camarários n.ºs CT/……../00 e CT/………/00 - cfr. facto invocado nos artigos 11.º, 13.º, 14.º, 18.º, 20.º e 21.º da p.i. e reconhecido pelo Município do B........................ nos artigos 1.º e 2.ºdo seu requerimento de fls. 77-78 junto aos autos;

AA) - O valor das obras de urbanização que foram realizadas na área onde as construções se situam é superior ao montante das taxas liquidadas e exigidas pelo Município do B........................ - a Impugnante não concretizou no artigo 23.º da p.i. o valor das obras de urbanização, como ainda as testemunhas inquiridas não lograram factualizar com rigor tal valor; em todo o caso, foi possível extrair dos seus depoimentos que foram realizadas obras de arranjos exteriores, arrumamentos e redes viárias, (ainda que não se saibam qual o valor exato de tais obras e quem as suportou, e se tal ocorreu na fase de loteamento dos terrenos e/ou na fase de licenciamento da construção das obras) e que esse valor seria superior ao montante referente às taxas de construção; circunstância que ponderada com as regras de experiência, permite julgar este facto como provado, ainda que com a ressalva da falta de prova dos valores das obras, não concretamente alegados;

BB) - A presente impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, em 14 de setembro de 2005 - cfr. aposição do carimbo a fls. 2 dos autos.”

A decisão recorrida consignou ainda, quanto aos factos considerados não provados, o seguinte:

1) - A 22 de maio de 1997, a Impugnante requereu na Câmara Municipal do B........................ a aprovação dos projetos e o licenciamento das construções que pretendia erigir nos lotes 22 e 23 - cfr. artigo 2.º da p.i .;

2) - As obras de urbanização e trabalhos respeitantes às infraestruturas existentes foram e estão a ser realizados e financiados pela Impugnante - cfr. artigo 12.º da p.i.;

3) - As obras de urbanização que a Impugnante executou beneficiam toda a população do Município do B........................ e todos os utentes da zona - cfr. artigo 19.º da p.i.; conforme o sentido atribuído na alínea O) das alegações finais;

4) - Os atos de liquidação das taxas de construção causaram prejuízos desproporcionados e injustificados à ora Impugnante - cfr. artigo 40.º da p.i ..”

O Tribunal recorrido motivou, do modo seguinte, a factualidade apurada:

“A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame e análise crítica dos documentos constantes dos autos, do processo de reclamação graciosa (composto por um volume) e dos processos de licenciamentos camarários n.ºs CT/256/00 e CT/257/00 apensos aos autos (compostos por onze volumes), e, bem assim, na prova testemunhal, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório.

A prova testemunhal relevou para a verificação dos factos constantes das alíneas A), B), C), D), Y) e AA) dos autos, sendo que as testemunhas inquiridas prestaram um depoimento espontâneo e sincero, apesar da relação profissional com a sociedade Impugnante, tendo demonstrado um conhecimento específico da situação.

Quanto ao facto não provado identificado sob o n.º 1, a 1.ª e a 3.ª testemunhas referiram, com segurança, que o pedido que foi efetuado no ano de 1997/1998 foi o de licenciamento dos loteamentos e que o licenciamento das obras de construção foi iniciado no ano de 2000, o que corrobora a informação que se extrai dos processos de licenciamentos n.ºs CT/256/00 e CT/257/00, levada à matéria de facto assente.

Já o facto não provado sob o n.º 2 assenta em juízos de direito e é conclusivo. A Impugnante não logrou factualizar na p.i. quais as «obras de urbanização» que, em concreto, foram por ela executadas. Embora do depoimento da 1 .ª e da 2.ª testemunha seja possível extrair que a Impugnante executou obras que serviam os lotes objeto de licenciamento, como arranjos exteriores e arruamentos, não ficou claro se as obras a configurar como «infraestruturas urbanísticas» efetuadas no local foram e estão a ser apenas executadas e financiadas pela Impugnante. As testemunhas fizeram referência à intervenção de uma outra empresa do grupo (que se julga denominar GIC), não tendo ficado claro o que foi suportado por cada uma delas (e/ou se o foi no âmbito dos processos de licenciamento e/ou de loteamento), referindo-se, ainda, a 1.ª testemunha à execução de obras por uma terceira empresa detentora de uma urbanização na zona.

Quanto ao facto não provado sob o nº 3, as testemunhas não fizeram referência concreta no sentido de que todas as obras de urbanização executadas beneficiam toda a população do Município do B........................ e todos os utentes da zona. Aliás, a 1.ª testemunha referiu, genericamente, que fizeram arruamentos e que alguns deles (não todos), não se sabe quais, foram realizados com outros fins, não só para servir a urbanização, como ainda a 3.ª testemunha referiu que a rede viária realizada serve toda a gente da Quinta dos Gatos e da Quinta dos Fidalgos (e não toda a população).

Por fim, o facto não provado indicado sob o n.º 4 é de configurar como um mero juízo conclusivo. Na verdade, nada de concreto foi alegado pela Impugnante quanto ao custo/benefício obtido pela mesma com o licenciamento da construção dos Lotes 22 e 23, sendo que dos depoimentos das testemunhas inquiridas não foi possível extrair factos concretos, simples e precisos, que permitissem suportar esta afirmação conclusiva da Impugnante.”.


*

IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
Tal como avançamos, a este Tribunal cabe analisar e decidir se a decisão recorrida padece dos erros de julgamento que lhe vão apontados.
Começa a recorrente por defender que, contrariamente ao ajuizado na decisão recorrida as normas do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................ (RMLCTL) são inconstitucionais e inaplicáveis à situação concreta por: - inexistir qualquer contrapartida do Município; porque os elementos das taxas em causa não podiam ser objeto de Regulamento, tendo aquele Regulamento criado impostos ou contribuições, o que é da competência da Assembleia da República (artigos 103.º e 165.º, n.º 1 al. i) da CRP), afirmado, nesta sequência que as taxas em causa são nulas e inexigíveis, inexistindo facto tributário.
Já recorrida defende que inexiste inconstitucionalidade material nem orgânica do Regulamento, não sendo por isso nulas.
Diz o Município do B........................ que no âmbito dos processos camarários n.ºs CT/………/00 e CT/../00 o que a recorrente solicitou foi a licença de construção de prédios urbanos e, nos termos dos artigos 16.º, alínea c) e 19.º, alínea b) da Lei das Finanças Locais, as autarquias têm o direito de cobrar taxas pelo licenciamento de construção de edifícios.
Vejamos.
Nos presentes autos, os atos de liquidação impugnados, considerados legais pelo Tribunal a quo, respeitam a «taxas de construção», nos montantes de € 43.898,2 e de € 44.031,99, liquidadas pela Câmara Municipal do B........................, pagas pela recorrente no âmbito dos processos de licenciamentos camarários com n.ºs CT/…./00 e CT/…./00.
Consultando os autos e o probatório, informam os mesmos que:
· Em 06.11.2000, a sociedade recorrente requereu, junto da Câmara Municipal do B……………. (CMB), o licenciamento para a construção de dois edifícios de 8 pisos e cave, sitos na Urbanização da Quinta ………….., Lotes 22 e 23, L…………….;
· Os pedidos de licenciamento de construção apresentados pela recorrente deram origem aos processos de licenciamento camarários n.ºs CT/……../00, e CT/……../00;
· Em 01.04.2004, a recorrente solicitou, junto da CMB, a reaprovação dos projetos de construção dos prédios sitos na Quinta …………., Lotes 22 e 23, a que se referem os processos de licenciamento camarários n.ºs CT/………./00 e CT/………../00;
· Em julho de 2004, a CMB ao aprovar o pedido de licenciamento, condicionando a licença de construção à obrigação de pagamento, pela Sociedade recorrente, da quantia de € 43.898,25, quanto ao lote 22, e da importância de € 44.031,99, quanto ao lote 23, a título de «taxa geral», a aplicar a todas as licenças de construção, acrescida de uma «taxa especial», a acumular com a dita «taxa geral», devida pela realização das obras de construção nova, tendo a mesma sido liquidada ao abrigo Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B.........................

Segundo a recorrente os tributos em causa consubstanciam prestações pecuniárias, coativas, unilaterais, e sem caráter de sanção, exigidas pelo Município do B........................, para proceder ao licenciamento de operações urbanísticas, em violação dos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP, e, ainda, dos artigos 4.º, n.º 3 e 8.º da LGT e artigo 2.º, n.º 4 da Lei n.º 42/98, de 6 de agosto.
Vejamos.
A distinção entre taxa e imposto não é nova, repousando no caráter unilateral do imposto e no carácter bilateral ou sinalagmático da taxa, aqui correspondendo à prestação do particular, uma contraprestação específica, consubstanciada numa atividade do Estado ou de outros entes públicos especialmente dirigida ao respetivo obrigado, que se concretizará na prestação de um serviço público, no acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à atividade dos particulares (artigo 4º nº 2 da LGT).
Na situação colocada, estão em causa taxas de construção, onde são emitidas licenças, a autorizar as mesmas, como contrapartida dos particulares (a aqui recorrente) para poder levar a cabo as edificações que pretende nos dois lotes de terrenos aqui em causa (lotes 22 e 23) e obtenção do(s) respetivo(s) alvará(s) de construção.
As taxas foram cobradas com fundamento legal no artigo 30º nº 6 do RMLCTL.
O RMLCTL no capítulo V, refere-se às taxas do setor urbanístico – taxas de construção e de urbanização.
Neste capítulo incluem-se as taxas de construção e de loteamento (artigo 29º).
Enunciando o artigo 30º do Regulamento, as taxas especiais a acumular com as taxas referidas no artigo 29º, quando devidas.
Assim, no artigo 30º nº 6 do citado Regulamento, que serviu de fundamento legal às taxas aqui em causa, decorria que essas taxas eram devidas relativamente a: “Obras de construção nova, ampliação, reconstrução ou modificação”, elencando os valores atinentes a: - Estacionamentos e garagens; Habitações e seus anexos; Piscinas e tanques de recreio e semelhantes; Comércio, escritórios, armazéns, indústrias ou quaisquer outras não inseridas nas alíneas anteriores.
Decorrendo ainda daquele normativo o seguinte:
“A (metros quadrados) — é a área de construção medida em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 31º
C (escudos por metro quadrado) — é o custo correspondente à área bruta de 100 m2, do metro quadrado de construção, de acordo com a portaria que fixa os valores para as casas de renda limitada, considerando-se C=0 em áreas abrangidas por alvará de loteamento emitido há menos de três anos ou áreas urbanas de génese ilegal definidas de acordo com a Lei n.o 91/95, de 2 de Setembro.
N — é o número de lugares de estacionamento em falta e que, de acordo com o disposto nos nº 1 do artigo 23º, nº 1 do artigo 26º, artigo 27º, artigo 28º e artigo 29º do Plano Director Municipal, deveriam ser criados com o licenciamento da construção, ampliação, reconstrução ou modificação de edifícios”.

De acordo com os nºs 11 e 13 daquele artigo 30º, sempre que houvesse interesse municipal em que o titular da licença efetuasse quaisquer obras de infraestruturas fora da sua propriedade e haja o acordo deste, o valor das mesmas será dedutível nas taxas a que se refere o presente Regulamento, sendo o valor a deduzir determinado por estimativa orçamental a efetuar pelos serviços municipais ou por aceitação municipal de proposta feita pelo particular.
Por outro lado, decorria do artigo 46º do mesmo diploma que, estavam sujeitos à taxa de participação em infraestruturas urbanísticas todos os terrenos sujeitos a operações de loteamento (nº1) e que a liquidação da taxa era efetuada no ato da emissão do alvará de licença de loteamento (nº 4).
Naquele normativo é feita uma distinção, para efeitos de quantificação das taxas, entre “operações de loteamento com obras de urbanização” (n.º 2.1.) e “operações de loteamento sem obras de urbanização” (n.º 2.2.).
No preâmbulo do Regulamento em causa, no ponto II- Taxas de construção e urbanismo – decorre que “A formulação do nº 6 do artigo 30º pretende que as taxas devidas pela construção reflictam não só a localização da construção, mas também o respectivo uso e pressão que a mesma criará na sua envolvente.
Desta formulação não resulta agravamento acrescido na totalidade das taxas a pagar pelo munícipe, uma vez que foi suprimido o artigo 27º do anterior Regulamento.
Ainda dentro deste artigo, prevê-se a possibilidade de dedução do valor das obras de infra-estruturas executadas pelo particular fora da sua propriedade. Considera-se, assim, haver uma maior equidade entre quem só paga a taxa de construção e quem teria ainda que executar infra-estruturas fora da sua propriedade (...)”
A liquidação dos tributos apoiou-se no artigo 30º nº 6 do RMLCTL, de onde decorria que a mesma incidia sobre as operações de construção, como acontece na situação em causa.
O citado Regulamento criou, no artigo 30.º [artigo 29.º, de acordo com a tabelas em 2004)], n.º 6, uma “taxa” que incide sobre as operações de construção nova, ampliação, reconstrução ou modificação, na qual considera a seguinte tipologia de obras: a) estacionamentos e garagens; b) habitações e seus anexos; c) piscina e tanques de recreio ou semelhante; e d) comércio, escritórios, armazéns, indústrias ou quaisquer outras não inseridas nas alíneas anteriores.
Como se vê do exposto, o Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................, nos artigos 30º nº 6 e 46º reporta-se a taxas diferentes.
O artigo 30º nº 6 refere-se às taxas de construção de obras novas, e o artigo 46.º reporta-se a um outro tipo de taxas, as “Taxas de participação em infraestruturas urbanísticas», estando aqui em causa apenas as primeiras.
A taxa de participação em infraestruturas urbanísticas é calculada através da aplicação de fórmulas matemáticas pré-estabelecidas, devendo ser liquidada pelo promotor daquelas operações de loteamento no ato de emissão do alvará de licença de loteamento, podendo ser paga em prestações mensais, sendo que, verificando-se a caducidade da licença, para a concessão de nova licença, não há lugar ao pagamento da taxa consignada neste normativo (n.º 6).
Portanto, as taxas referidas no artigo 46º são diferentes das taxas a que alude o artigo 36º nº 6 aqui em causa, apesar do equívoco da recorrente, para quem, se bem se percebe, trata as duas taxas como se respeitassem à mesma realidade.
O valor da taxa é calculado através da aplicação de fórmulas matemáticas pré-estabelecidas, devendo ser liquidada pelo promotor daquelas operações na sequência da aprovação dos projetos de arquitetura, sendo a sua cobrança efetuada antes do levantamento da respetiva licença de construção.
A taxa em causa, à semelhança de outros Regulamentos Municipais, constitui um importante meio de financiamento dos mesmos (cf. art. 16º do RGTAL e, à data, a Lei das Finanças Locais).
A Lei das Finanças Locais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de março, veio “legalizar” a cobrança destas taxas, dali decorrendo que os Municípios podem cobrar taxas, quer pela realização de infraestruturas urbanísticas, quer para licenças de construção de obras, as quais constituem receitas do município (artigos 3.º, n.º 1, al. d) i), e 8.º, al. a) e b)).
Também a nova Lei das Finanças Locais, à data, (Lei nº 42/98, de 6 de agosto) continuou a permitir aos Municípios a cobrança das mesmas taxas.
O Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de novembro (Regime Jurídico do Licenciamento das Operações de Loteamento e das Obras de Urbanização), na redação introduzida pela Lei 26/96, de 1 de Agosto (que alterou, por ratificação, o Decreto-Lei n.º 334/95, de 28 de Dezembro, o qual havia, por sua vez alterado o referido Decreto-Lei n.º 448/91), no artigo 3.º, al. b), definia “obras de urbanização” como “todas as obras de criação e remodelação de infra-estruturas que integram a operação de loteamento e as destinadas a servir os conjuntos e aldeamentos turísti­cos, nomeadamente arruamentos viários e pedonais e redes de abastecimentos de água, de esgotos, de electrici­dade, de gás e de telecomunicações, e ainda de espaços verdes e outros espaços de utilização colectiva”.
A respeito das operações de loteamento que, em princípio, precedem as obras de urbanização, dispunha o n.º 1, do art. 16.º, do Decreto-Lei n.º 448/91, na redação referida, que “o proprietário e os demais titulares de direitos reais sobre o prédio a lotear cedem gratuitamente à câmara municipal parcelas de terreno para espaços verdes públicos e de utilização colectiva, infra-estruturas, designadamente arruamentos viários e pedonais, e equipamentos públicos, que, de acordo com a operação do loteamento, devam integrar o domínio público”, acrescentando o n.º 4 do mesmo normativo que “se o prédio a lotear já estiver servido pelas infra-estruturas referidas na alínea b) do artigo 3.º ou não se justifi­car a localização de qualquer equipamento público no dito prédio, não há lugar a cedências para esses fins, ficando, no entanto, o proprietário obrigado a pagar à câmara municipal uma compensação em numerário ou espécie, nos termos definidos em regulamento aprovado pela assembleia municipal”.
Já no âmbito do “licenciamento das obras de urbanização”, o n.º 1, do art. 32.º, do mesmo diploma legal, prescrevia que a realização de infraestruturas urbanísticas e a concessão do licenciamento da operação de loteamento estão sujeitas ao pagamento das taxas, decorrendo do n.º 3 do mesmo normativo que “a câmara municipal, com o deferimento do pedido de licenciamento, procede à liquidação das taxas em conformidade com o regulamento aprovado pela assembleia municipal”.
Por outro lado, de acordo com o artigo 2.º do RJUE, obras de construção” correspondem às obras de criação de novas edificações [al. b)] enquanto que as “obras de urbanização” são as obras de criação e remodelação de infraestruturas destinadas a servir diretamente os espaços urbanos ou as edificações, designadamente arruamentos viários e pedonais, redes de esgotos e de abastecimento de água, eletricidade, gás e telecomunicações, e ainda espaços verdes e outros espaços de utilização coletiva [al. h)].
Por seu turno, as “operações urbanísticas” são as operações materiais de urbanização, de edificação ou de utilização do solo e das edificações nele implantadas para fins não exclusivamente agrícolas, pecuários, florestais, mineiros ou de abastecimento público de água [al. j)].
Dispunha o artigo 3º (Regulamentos Municipais), n.º 1 do RJUE, que, “No exercício do seu poder regulamentar próprio, os municípios aprovam regulamentos municipais de urbanização e ou de edificação, bem como regulamentos relativos ao lançamento e liquidação das taxas que, nos termos da lei, sejam devidas pela realização de operações urbanísticas”.
Ao mesmo passo, o artigo 74.º do RJUE estatuía que:
“1 - O licenciamento ou autorização das operações urbanísticas é titulado por alvará.
2 - A emissão do alvará é condição de eficácia da licença ou autorização, e depende do pagamento das taxas devidas pelo requerente”.
Já do artigo 76.º, decorria que: “O interessado deve, no prazo de um ano a contar da data da notificação do acto de licenciamento ou autorização, requerer a emissão do respectivo alvará, apresentando para o efeito os elementos previstos em portaria aprovada pelo Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território” (n.º 1), e que o alvará é emitido no prazo de 30 dias a contar da apresentação do requerimento previsto nos números anteriores, ou da receção dos elementos a que se refere o n.º 4 do artigo 11.º, desde que se mostrem pagas as taxas devidas (n.º 4).
Por outro lado, o artigo 116º (Taxa pela realização, manutenção e reforço de infra-estruturas urbanísticas) do RJUE, consagrava que, “a emissão dos alvarás de licença e autorização previstos no presente diploma está sujeita ao pagamento das taxas a que se refere a alínea b) do artigo 19.º da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto” (n.º 1) e ainda que,a emissão do alvará de licença ou autorização de loteamento e de obras de urbanização está sujeita ao pagamento da taxa referida na alínea a) do artigo 19.º da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto” (n.º 2); sendo que “a emissão do alvará de licença ou autorização de obras de construção ou ampliação em área não abrangida por operação de loteamento ou alvará de obras de urbanização está igualmente sujeita ao pagamento da taxa referida no número anterior” (n.º 3).
Recorde-se que, apesar da maior parte dos diplomas e normas acima enunciados terem sido entretanto revogados e substituídos por nova legislação, tendo surgido o RGTAL, aqui já referido, este diploma continua a qualificar como taxa municipal aquela que corresponde à realização, manutenção ou reforço das infraestruturas primárias e secundárias, bem como na concessão de licenças de construção (artigo 6.º, n.º 1. a) e b)).
As taxas de infraestruturas e de construção, como a trazida, são verdadeiras taxas e não impostos, com tem sido sucessivamente afirmado pela Jurisprudência do STA e TCA.
O Tribunal Constitucional já foi chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade deste tipo de taxas, previstas nos Regulamentos dos Municípios de Amarante, Póvoa de Varzim e Baião. Assim, no acórdão n.º 357/99 (pub. no D.R., II Série, de 2-3-2000) apreciou-se a constitucionalidade do Regulamento da Taxa Municipal de Urbanização de Amarante, tendo-se afirmado o seguinte:
“(…) Incidindo a taxa sobre obras de construção, reconstrução ou ampliação de edificações destinadas a habitação, indústria, comércio e profissões libe­rais
(em terrenos não loteados) ou sobre operações de loteamento nos termos do artigo
1º do DL nº. 400/84 e legislação complementar, relativamente aos lotes servidos por arruamentos públicos existentes (artigos 2º, corpo e 3º, corpo), desde logo se pode concluir que o 'objectivo' referido no artigo 1º não traduz uma mera afectação financeira das receitas provenientes da cobrança da taxa, mas a compensação das despesas efectuadas, ou a efectuar, pelo município, causadas, directa ou indirectamente, pelas obras sobre que a taxa incide. Determinando estas obras a necessidade, actual ou futura, de realização de infra-estruturas urbanísticas, tais como as enunciadas no corpo do artigo 1º, elas constituem, afinal, a contraprestação da autarquia, o serviço prestado pela autarquia conexionado com o pagamento da taxa.

(…) Não obsta ao carácter bilateral da taxa o critério consagrado no Regulamento para a fixação do montante da prestação exigida – em função da área bruta de construção a licenciar, representando 1% do custo da obra, corrigida tendo em conta o factor localização (construções em terrenos não loteados) e em função do comprimento da frente dos lotes objecto do 'encargo', represen­tando o custo unitário da realização das infra-estruturas e obras de urbanização por metro linear de arruamento, corrigida considerando os factores localização, ocupação e situação dos terrenos (operações de loteamento) – artigos 7º a 12º. Na verdade, afastada a exigência de uma absoluta correspondência económica entre as prestações do ente público e do utente (cit. Acórdãos nºs. 205/87 e 76/88), o critério adoptado, fundamentalmente pela ponderação da área de construção-índice quer da utilidade retirada pelo obrigado, quer do grau de exigência na realização, reforço, manutenção ou funcionamento, de obras de infra-estruturas urbanísticas – não deixa de ser ditado por uma preocupação de proximidade entre o custo e a utilidade da prestação do serviço e o montante da taxa. E também não contradiz a bilateralidade da taxa a eventualidade de a prestação do serviço não implicar vantagens ou benefícios para quem é obrigado ao pagamento (cfr. cit. Acórdão nº. 67/90), muito embora, seja considerável, no caso, a probabilidade dessas vantagens ou benefícios em qualquer das modalidades de obras de infra-estruturas urbanísticas ('realização, reparação, manuten­ção e funcionamento') em geral exigíveis, ou convenientes, quando se efectuam as construções ou operações de loteamento referidas nos artigos 2º e 3º do Regula­mento, o que do mesmo modo retira o carácter presuntivo, em abstracto, das maiores despesas ou encargos por parte da pessoa pública que é próprio das 'contribuições especiais por maiores despesas' (neste sentido, Aníbal Almeida, ob. cit. pág. 72).
Por outro lado, a circunstância de aquelas obras poderem gerar utilidade para a generalidade da população não contende com o facto de elas serem efectuadas no interesse do onerado (cfr. cit. Parecer da PGR nº. 59/86) que delas retira, ou pode retirar, uma utilidade própria (o serviço prestado é, nesta dimen­são, específico e divisível). Em suma, pois, não se vê que a 'taxa municipal de urbanização' em causa revista características diversas das que, na jurisprudência do Tribunal Constitucional (e cita-se aqui, em especial, o Acórdão nº. 354/98, de 12/5 in DR II Série de 15/7/98), têm fundamentado a qualificação de outros tributos como 'taxa'. E, sendo assim, não pode o 'Regulamento da Taxa Municipal de Urbanização', aprovado pela Assembleia Municipal de Amarante em 30/6/86 estar ferido de inconstitucionalidade orgânica por violação do artigo 168º nº. 1 alínea i) da CRP (…)”
Também no acórdão n.º 410/2000 (pub. em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 48.º vol., pág. 141), aprovado em Plenário, apreciou-se a constitucio­nalidade dos três primeiros artigos do Regulamento da Taxa Municipal de Urbaniza­ção da Póvoa do Varzim, tendo-se sustentado o seguinte:
“(…) Segundo consta da introdução ao Regulamento da Taxa Municipal de Urbanização do concelho da Póvoa do Varzim, a criação desse tributo tornou possível que a construção individual concorresse, também, para os custos da urbanização. De outro modo a Câmara, sem recursos que lhe permitissem custear as obras de urbanização, não as poderia levar a termo, nomeadamente tendo em conta uma 'intensa pressão de construção, sobretudo em zonas situadas fora dos principais aglomerados'. A melhoria da rede viária e dos transportes, do saneamento, dos equipamentos e arranjos dos espaços públicos exige 'que cada nova construção ou cada aumento de área construída em prédios existentes comparticipe de forma significativa nos encargos gerais de urbanização do concelho'.
(…)
A realização de infra-estruturas urbanísticas ocorre, por via de regra, na fase das operações de loteamento, nomeadamente quando os municípios assumem uma função de estímulo à iniciativa de urbanização e de construção (pro­porcionando a abertura de arruamentos, construindo infra-estruturas de abaste­cimento de água e de saneamento, por exemplo). O que se compreende: o lotea­mento urbano constitui um instrumento típico de transformação urbanística do solo, fazendo-se acompanhar, como tal, e normalmente, das operações materiais necessárias e implícitas à iniciativa. No entanto, o apontado nexo de conexão justificativo da taxa não tem de funcionar sincronicamente – designadamente quando, como é o concreto caso, se está perante uma operação de reconstrução ou ampliação de edifícios, e, como parece suceder no concelho em causa, a ajuizar pelo pequeno exórdio do Regulamento, quando a pressão da iniciativa privada da construção se depara com as dificuldades financeiras municipais para custear as respectivas obras de urbani­zação. Digamos que ainda qui funciona a lógica de interacção em que a taxa se insere (e a que o acórdão nº 1108/96 alude), bastando-se com a sinalagmaticidade construída juridicamente, já anteriormente mencionada.
Não se surpreende, assim, vício de inconstitucionalidade orgânica no Regulamento em apreço. (…)”
Versando diretamente sobre a constitucionalidade orgânica de taxas, aplicável à situação trazida, disse ainda o TC no acórdão prolatado no Processo n.º 958/07, o seguinte:
“Do regime constitucional das taxas municipais Importa agora passar ao enquadramento jurídico-constitucional das taxas em geral e, particularmente, das taxas municipais, sem perder de vista que estando nós a apreciar a invocação duma inconstitucionalidade formal (a violação do princípio da reserva de lei) a redacção do Regulamento sob fiscalização foi aprovada, quando a Constituição da República Portuguesa (C.R.P.) apresentava a redacção introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/92, de 25 de Novembro, pelo que as referências que se irão passar a fazer ao texto constitucional se reportam a essa versão. De acordo com a Lei Fundamental, a organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, as quais visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas – artigo 237.º, da C.R.P.. Efectivamente, não obstante ser unitário, o Estado não pode deixar de respeitar na sua orga­nização o princípio da autonomia das autarquias locais – artigo 6.º, n.º 1, da C.R.P.. Desde a redacção originária da Constituição, o urbanismo é um dos domínios onde se verifica uma concorrência de atribuições e competências entre a Admi­nistração estadual, regional e municipal (ALVES CORREIA, em “Manual de Direito do Urbanismo”, volume I, pág. 131, da 3.ª Edição, da Almedina). Para assegurar o desempenho das suas atribuições, as autarquias locais têm património e finanças próprias – artigo 240.º, n.º 1, da C.R.P.. A autonomia financeira das autarquias locais compreende o “direito de arrecadação e disposição de receitas próprias” (GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, em “Constituição da República Portuguesa Anotada”, 2º vol., pág. 889, da 3.ª Edição, da Coimbra Editora).
As receitas próprias das autarquias locais incluem obrigatoriamente – nos termos do disposto no n.º 3, do artigo 240.º, da C.R.P. - as provenientes da gestão do seu património e as cobradas pela utilização dos seus serviços. Mas, a lei pode – e deve – atribuir outras receitas às autarquias locais (GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, na ob. cit., p. 891). A Constituição não impede que as autarquias locais tenham impostos próprios, nomeadamente através da atribuição directa das receitas provenientes de certos impostos que se transformam em impostos locais. Aliás, os municípios partici­pam, por direito próprio e nos termos definidos pela lei, nas receitas provenientes dos impostos directos – artigo 254.º, da C.R.P.. Porém, é preciso ter presente que a Constituição proíbe que as autarquias locais possam criar ou sejam legalmente autorizadas a criar impostos. Na verdade, a criação de impostos e a definição dos seus elementos essenciais constitui reserva de lei, constitucionalmente atribuída à Assembleia da Repú­blica e, por isso mesmo, vedado ao poder normativo local – artigos 106.º, n.º 2, e 168.º, n.º 1, al. i), da C.R.P..
É a consagração do princípio dos ideais liberais “no taxation without representation”, correspondente à ideia de que, sendo o imposto um confisco da riqueza privada, a sua legitimidade tem de resultar duma aprovação dos representantes directos do povo, numa lógica de auto-tributação. Uma vez que a Recorrente entende que a esfera de competência reservada da Assembleia da República foi invadida pelo poder normativo da Assembleia Municipal de Lisboa, importa deter um pouco mais a atenção nalguns elementos essenciais do sistema fiscal português durante a vigência da Constituição de 1976, na redacção introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/92. Em sede de organização económica do Estado, o artigo 106.º, da C.R.P., apresentava a seguinte redacção:
(…)
A não sujeição das taxas ao princípio da legalidade estrita é compreensível perante a circunstância das mesmas terem por causa o pagamento duma prestação pública, não constituindo uma amputação, sem retribuição específica, do património privado, que exija uma aprovação parlamentar. A existência duma relação jurídica bilateral permitirá aos seus sujeitos obter outras formas de tutela dos seus direitos, não necessitando da garantia da exigência da autorização prévia do contribuinte, dada através dos seus representantes”.
Depois de avançar as razões pelas quais os Municípios podem criar taxas e não impostos, adensa aquele alto Tribunal as diferenças entre taxas, impostos e contribuições, para li se concluir que em causa estão taxas (tal como na situação sob nossa mira), ali consagrando que:
“2.5. Da distinção entre os diferentes tipos de tributo. Perante esta diferente sujeição ao princípio da legalidade é importante relembrar a distinção entre os conceitos dos diferentes tipos de tributo, tendo presente que a C.R.P. não indica qualquer critério distintivo, sendo necessário recorrer aos conceitos constantes da Lei Geral Tributária (artigo 4.º), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro.
“1 - Os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património.
2 - As taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.
3 - As contribuições especiais que assentam na obtenção pelo sujeito passivo de benefícios ou aumentos de valor dos seus bens em resultado de obras públicas ou da criação ou ampliação de serviços públicos ou no especial desgaste de bens públicos ocasionados pelo exercício de uma actividade são consideradas impostos.”

E no Regime das Taxas Locais, aprovado pela Lei n.º 53 – E/2006, de 29 de Dezembro, no artigo 3.º, definem-se as taxas das autarquias locais como “tributos que assentam na prestação concreta de um serviço público local, na utilização provada de bens do domínio público e privado das autarquias locais ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, quando tal seja atribuição das autarquias locais, nos termos da lei.”
(…) O imposto, enquanto prestação unilateral, não corresponde a nenhuma contraprestação específica atribuída ao contribuinte por parte do Estado; ele terá apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. Ao carácter unilateral da prestação de imposto contrapõe-se a natureza sinalagmática das taxas. A sinalagmaticidade que caracteriza as quantias pagas a título de taxa só existirá quando se verifique uma contrapartida resultante da relação concreta com um bem semipúblico, que, por seu turno, se pode definir como um bem público que, satisfaz, além de necessidades colectivas, necessidades individuais (vide TEIXEIRA RIBEIRO, em “Noção jurídica de taxa”, na “Revista de Legislação e de Jurisprudência”, ano 117.º, pág. 291).
A taxa “pressupõe, ou dá origem, a uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta (que pode ser ou não de benefício) entre o contribuinte e um bem ou serviço público”, sendo “grande a variabilidade do conteúdo jurídico do conceito, resultante da diversidade das situações que geram as obrigações de taxa e das múltiplas delimitações formais da respectiva noção financeira” (….)
No plano da unilateralidade, a figura da contribuição especial também é habitualmente equiparada ao imposto para efeito de sujeição ao respectivo regime constitucional – nomeadamente à reserva de lei fiscal –, mas distingue-se do imposto porque “tem como fundamentos, ou um benefício individualizado reflexamente resultante da actuação de um sujeito público, ou a necessidade de compensar o sujeito público pelo uso anormal dos bens ou serviços públicos por parte de certos sujeitos, os quais oneram mais gravemente as finanças do Estado ou deterioram bens públicos (…) É, pois, uma situação geral, individualizável e anormal, que justifica a imposição de uma prestação tributária. A situação individual é ocasional e indirecta – não é intencional e directamente conexa com os fins da actividade estadual que lhe dá origem”(…)”
Diante do exposto, facilmente se percebe que não pode ser atribuído caráter de imposto nem de contribuição às taxas cobradas nos processos de construção de edifícios nos lotes 22 e 23 identificados no probatório, o que autoriza a conclusão que inexiste inconstitucionalidade orgânica, podendo as mesmas ser criadas como foram pelo Município por via regulamentar (sem ser necessário provir de diploma da AR) e, ao mesmo passo, que as taxas não são nulas, sendo exigíveis.
Bem sabemos que, a fruição dos bens imobiliários depende da existência de estruturas urbanísticas de suporte, por isso, um edifício só satisfará de forma eficiente as necessidades dos seus utilizadores se existir uma rede de infraestruturas que lhe permita proporcio­nar todas as utilidades a que é destinado e que condicionará o seu valor (desde logo as redes de abastecimento de água, gás, eletricidade, telecomunicações, esgotos domésticos e pluviais, arruamentos, os passeios adjacentes, os parqueamentos na via pública, as paragens dos transportes públicos, sistemas de recolha de lixo e de ilumina­ção pública – elementos de suporte primário; a par de infra-estrruturas secundárias como, parques infantis, escolas, hospitais, cemitérios, mercados, parques de estacio­namento, pólos de cultura, desporto e lazer, serviços de segurança pública, etc). Sucede que, algumas destas estruturas, pela sua natureza, são passíveis de utilização não exclusiva e não concorrencial, pelo que não são, em muitos casos, produzidas naturalmente pelo funcionamento do mercado, tendo o Estado que assumir a sua realização, com vista à manutenção de padrões satisfatórios de qualidade de vida dos cidadãos. Por isso, os custos (desta) atividade prestativa pública para suprimento das insuficiências dos mecanismos de decisão privada, exigem um sistema de financiamento complexo, onde, perante a criação de utilidades divisíveis e indivisíveis, tendo por beneficiários sujeitos determinados e indeterminados, convivem taxas, impostos e contribuições especiais, quer locais, quer por transferência do Orçamento do Estado.
No que tange às taxas, considerando a sua natureza sinalagmática, as mesmas consubstanciam uma contrapartida específica pelos encargos resultantes do planeamento e ordenamento urbanístico determinado pela obra em causa, ou pela construção, reconstrução, ampliação ou alteração de infraestruturas urbanísticas primárias ou secundárias, realizadas, ou a realizar, por causa daquela determinada obra.
E, no preenchimento do conceito de contrapartida específica há que ter em consideração que o carácter sinalagmático das taxas não exige a existência de um benefício exclusivo para quem suporta o pagamento da taxa, mas a contraprestação específica não pode deixar de dirigir-se individualmente, ainda que parcialmente, ao respetivo obrigado, sem que a satisfação proporcionada pelo serviço público tenha que ser imediata, podendo ser futura -vide BENJAMIM RODRIGUES, em “Para uma Reforma do Sistema Financeiro e Fiscal do Urbanismo em Portugal”, in Ciclo de Colóquios “O Direito do Urbanismo do Século. XXI”, pág. 185, Almedina, 2001.
Para serem devidas taxas, nem sem­pre é necessária a efetiva utilização dos bens semipúblicos, bastando a mera possi­bilidade da respetiva utilização -vide TEI­XEIRA RIBEIRO, em “Noção jurídica de taxa”, na “Revista de Legislação e de Jurisprudência”, ano 117.º, pág. 293.
As quantias impugnadas pela recorrente, como se avançou, não respeitam diretamente a taxas pela participação, realização, manutenção ou reforço das infraestruturas, comummente designadas por «taxas de urbanização» ou «taxas de infraestruturas urbanísticas», reguladas pelo artigo 46º do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................, preceito relativo às taxas de infraestruturas urbanísticas que são aplicáveis a “todos os terrenos sujeitos a operações de loteamento”, sendo certo que os lotes 22 e 23 onde pretendia a recorrente edificar, foram já alvo de loteamento, estando agora em causa as taxas devidas pelo licenciamento das construções a implantar nesses dois lotes.
É o próprio legislador que no artigo 4 º da LGT assevera que são devidas taxas quando é levada a cabo uma atividade construtiva ao estabelecer que são devidas taxas pela remoção de um obstáculo jurídico, como é a emissão de licenciamentos e alvarás de construção, não podendo os particulares construir sem previa autorização das autoridades locais respeitando a legislação urbanística e ordenamento do território, sem que essa atividade licenciadora (com a consequente aplicação de taxas) não configure senão uma atuação legal dos municípios sem afrontar o direito dos particulares e sua propriedade privada, quando essa atividade construtiva está regulamentada e obedece ao direito do urbanismo e ordenamento do território.
As taxas em causa foram liquidadas pela CMB com base no então artigo 30º nº 6 do RMLCTMB, respeitantes à realização de edificações novas (edifícios sobre os lotes 22 e 23), para as quais é necessária licença, sendo que o tributo decorrente da remoção de um limite jurídico à atividade dos particulares, relativamente proibida – licença – é de qualificar como taxa – vd. acórdão do STA de 11.10.2000, processo nº 24610.
Recorde-se que, à luz do nº 2 do artigo 4º da LGT, as taxas assentam: (i) na prestação concreta de um serviço público; (ii) na utilização de um bem do domínio publico, ou (iii) na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares – daí, diremos nós, a necessidade de obtenção de licença para autorizar, in casu, a construção como contrapartida da remoção do obstáculo jurídico à mesma.
Por isso, tal como anota a decisão recorrida, toda a tese construída pela sociedade Impugnante em torno da realização pela mesma de infraestruturas urbanísticas que servem os lotes assenta, pois, num pressuposto que não tem aderência com a realidade fática apurada e em causa nestes autos, na medida que em causa está uma construção (compreendendo-se que com a mesma as infra estruturas existentes fiquem sujeitas a maior pressão urbana devido à maior população que as irá usar), daí a necessidade de pagamento da taxa a autorizar essa construção condicionada ao pagamento da taxa com vista à remoção do obstáculo que impedia a mesma, sendo condição para a emissão do alvará de construção.
Portanto, o sinalagma centra-se nesta remoção de obstáculo e não já, como nas taxas pelas infraestruturas, noutras contrapartidas como as aludidas pela recorrente, apesar de facilmente se perceber que o aumento de construção naquela zona (dois edifícios com oito pisos cada, cave, etc) terá necessariamente impacto devido a maior pressão sobre as infraestruturas envolventes já criadas (desde logo por aumentar a população que delas se servirá).
Mas, a quantia paga nestas situações, a título de taxa, é devida essencialmente pela remoção do obstáculo jurídico para possibilitar a prática de determinada atividade construtiva, que implica previamente uma atividade licenciadora que é sujeita a taxas, não se compreendendo, nem vai adensado pela recorrente, em que medida as taxas são atentatórias do princípio da proporcionalidade.
A respeito das taxas aqui em questão, Sérgio Vasques refere-se a esta figura que apelida de “muito especial” que são as “taxas de licença”, as quais constituem uma das três espécies de taxas que o legislador português identifica na Lei Geral Tributária. Catalogando os tributos em função do respetivo pressuposto, o artigo 4º nº 2 da LGT distingue entre as taxas que assentam na prestação concreta de um serviço público e aquelas que assentam na utilização de um bem do domínio público e as taxas relacionadas com as licenças, as quais assentam na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares – In “ O Princípio da Equivalência e a Conformação dos Tributos Comutativos”, Almedina, pág. 648/649.
Nas lições de Direito Fiscal de 1959-1960, Alexandre do Amaral representa estas taxas como a contraprestação da “especial actividade dos serviços públicos solicitada ou desencadeada pelo contribuinte”.
A classificação tripartida das taxas deve-se a Alberto Xavier, o qual, reconduzindo o caráter comutativo das taxas ao facto gerador sustentava que o pressuposto de facto da obrigação de taxa podia revestir três formas: “ a actividade administrativa da prestação de um serviço, a utilização do domínio público e a remoção de um limite jurídico imposto à livre actividade dos particulares”
É hoje pacifico que a remoção de obstáculos jurídicos ao comportamento dos particulares constitui uma utilidade que justifica o pagamento de uma taxa.
Esta classificação tripartida vertida na LGT, arrumada no artigo 4º, é clara ao fazer conviver, ao lado das taxas devidas pelo aproveitamento de bens e serviços, as taxas devidas enquanto contrapartida pela remoção de um entrave jurídico ao seu comportamento ou atividade, tal como sucede na situação que nos é trazida, ao fazer incidir taxa para autorizar a construção nova nos lotes 22 e 23.
De resto, tal como sublinha Sérgio Vasques, talvez em nenhum outro domínio isso seja mais verdadeiro do que ao nível da administração local, constituindo o recurso às taxas de licença um alimento importante de municípios e freguesias, sobretudo dos primeiros. Em conformidade com a Lei das Finanças Locais, o novo Regime Geral das taxas Locais define taxas locais no seu artigo 3º como tributos que assentam na prestação concreta de um serviço público local, na utilização privada de bens do domínio publico e privado das autarquias locais, ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares quando tal seja atribuição das autarquias locais nos termos da lei. Ao ilustrar a incidência objetiva das taxas de municípios e freguesias no artigo 6º o legislador elenca taxas devidas pela utilização de bens do domínio público – o aproveitamento do domínio público e das freguesias – como elenca as taxas devidas pela prestação de serviços públicos – a prática de atos administrativos, a gestão de equipamentos, os serviços de prevenção civil e de riscos, as atividades de promoção do desenvolvimento e competitividade local – encontrando-se, além destas, taxas devidas pela remoção de obstáculos jurídicos – as taxas incidentes sobre a concessão de licenças a que se referem as alíneas b) do nº 1 e a) do nº 3.
Ao estabelecer o classificador económico das receitas e despesas públicas a empregar na elaboração do Orçamento de Estado, o legislador precisa em nota explicativa do DL 26/2002 de 14.02, que no grupo de taxas, o grupo 04.00.00, se incluem os pagamentos em contrapartida da emissão de licenças e da prestação de serviços, nos termos da lei, não havendo qualquer relação de valor entre os aludidos pagamentos e o custo dos serviços prestados – vd. Sérgio Vasques, ob. Cit. pág. 651 e 652.
Diante de todo exposto, consoante se disse, além da exigibilidade das taxas em causa, não se pode concordar com a recorrente quando defende que inexiste facto tributário, fazendo assentar essa alegação na asserção de que as obras de urbanização e os trabalhos respeitantes às infraestruturas terem sido totalmente realizadas e financiadas por si, e que serviriam toda a população, e, ainda, de que o Município do B........................ não realizou, não financiou e não executou, por si ou por intermédio de terceiro, quaisquer infraestruturas urbanísticas em virtude do licenciamento das operações urbanísticas promovidas pela recorrente. E diz isto porque, como se anotou, confunde taxas de construção (e correspondente emissão de licença para permitir a remoção do obstáculo jurídico, permitindo a construção das edificações) com as taxas de infraestruturas que aqui não estão em causa.
Recorde-se que as quantias impugnadas foram liquidadas e cobradas pela CMB ao abrigo do artigo 30.º [artigo 29.º, na redação vigente ao tempo], n.º 6 do dito Regulamento, ou seja, trata-se de taxas devidas pela realização de edificações novas e não de taxas cobradas pela realização, manutenção ou reforço de infraestruturas.
Relembre-se que, em julho de 2004, ao aprovar o pedido de reaprovação dos projetos e o licenciamento apresentado pela recorrente, a CMB viria a condicionar a emissão da competente licença/alvará de construção à obrigação de pagamento da quantia de € 43.898,25, quanto à construção no Lote 22, e € 44.031,99, quanto à edificação no Lote 23, a título de «taxa geral» a aplicar a todas as licenças de construção, acrescida de uma «taxa especial», a acumular com a dita «taxa geral», devida pela realização das obras de construção nova.
Por esta razão, ou seja, para a obtenção da licença de construção destas edificações nos dois lotes, foi cobrada a «taxa de construção», a qual se mostra enquadra no artigo 19º, al. b) da Lei das Finanças Locais e, bem assim, no artigo 116.º, n.º 1 do RJUE - e não propriamente devida mercê da participação/realização de obras de urbanização/infraestruturas urbanísticas. E, como se disse, podia e tinha competência para o fazer.
A verdade é que, tal como refere a decisão, “nos ofícios de 28.07.2004, remetidos pelo DPGU da CMB à Sociedade Impugnante [cfr. alíneas O) e P) do probatório], tais quantias são liquidadas e cobradas a título de «licenças de construção», apenas aparecendo a menção à denominação de «taxa de construção - coletivo» nas respetivas guias de recebimento [cfr. alíneas Q) e R) do probatório]. O que significa que o caso dos autos se enquadra naquele tipo de situação em que a contrapartida do tributo, da «taxa», se consubstancia na remoção de um obstáculo jurídico ao exercício de determinadas atividades por parte dos particulares”.
As taxas respeitantes à realização de Infraestruturas Urbanísticas, são já as que visam criar, diretamente, uma contrapartida dos investimentos municipais com a construção e reforço das infraestruturas gerais e equipamento urbano, contrapartida que é devida ao município pelas utilidades prestadas aos particulares pelas infraestruturas urbanísticas primárias e secundárias cuja realização, remodelação ou reforço seja consequência de operações de construção, recons­trução ou ampliação, de edifícios ou de alterações na forma de utilização destes.
Diante da enumeração tripartida, constante do artigo 4º da LGT quanto às taxas atenta as categorias de prestação que lhe dão causa e servem de contrapartida à prestação exigível a título de taxa, o legislador não acolheu uma conceção restritiva, tendo antes considerado a remoção de um obstáculo jurídico como pressuposto autosuficiente da figura da taxa – vd. neste sentido o acórdão do TC de 05.05.2010, Processo nº 177/2010, publicado no DR n° 110, II Série.
Neste caso, diz, e bem a decisão recorrida, que: “(…) não está em causa apenas o interesse de integridade dos valores urbanísticos, que poderiam ser afetados por causa da atividade de construção/edificação nova. A emissão da licença [rectius], o levantamento do obstáculo jurídico, dá origem a uma relação com o sujeito passivo tributário distinta da que intercede com a generalidade dos administrados. É que neste quadro a entidade emitente da licença assume uma obrigação particular, de se conformar com a influência modeladora que resulta do uso e fruição da licença emitida, que é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estruturando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário. Findo o prazo para o qual tinha sido concedida a licença de construção, torna-se necessário, designadamente, proceder à reavaliação da situação, do ponto de vista da permanência das condições legais de licenciamento.
Já o promotor da obra ganha título para uma ativa e particular fruição, necessária à realização da utilidade individual que procurou - construção de duas edificações com 8 pisos, nos terrenos previamente objeto de loteamento - com o pedido de emissão de alvará.
Sendo certo que o nexo de conexão justificativo da taxa não tem de funcionar sincronicamente – designadamente quando, como é o concreto caso, se está perante operações de construções novas.
Diga-se, por fim, que como se esclarece no Acórdão do TC n.º 258/2008, proferido no processo n.º 958/07 [disponível em www.tribunalconstitucional.pt]: “Apesar da fixação de taxas ter como pressuposto uma relação material de sinalagmaticidade entre uma prestação pecuniária do sujeito passivo e uma contrapartida qualitativa de utilização de um bem ou serviço público, isso não significa que a esta equivalência jurídica tenha de corresponder uma equivalência económica. (…).
Além de, na maior parte dos casos, não existir um mercado que permita determinar o valor da prestação pública, de, muitas vezes, a fixação do montante das taxas visar finalidades extra-financeiras, e de, frequentemente, serem prestadas utilidades indivisíveis a uma pluralidade de beneficiários, considerando que as taxas têm uma função essencialmente redíticia, no que diz respeito à definição do seu montante vigora o princípio da liberdade de conformação pelo legislador ordinário. (…).
Esta liberdade de definição do montante das taxas terá, contudo, como limite superior o princípio constitucional estruturante da proibição do excesso, corolário do Estado de direito democrático (artº 2.º, da C.R.P.), o qual impedirá a fixação de valores manifestamente desproporcionados ao serviço prestado.” (destaque nosso).
No caso, o cálculo do montante das taxas de licença de construção, nos termos do analisado Regulamento municipal, é efetuado através da aplicação de fórmulas que visam obter o quantum da taxa, em que os elementos de facto considerados neste cálculo são as suas características: o tipo de utilização da obra, a área de construção (A) e o custo do m2 da construção (C), tendo como referencial 100m2, pelo que os dados respeitam à dimensão, importância e valor da própria obra.
É certo que esta metodologia, apesar de se mostrar sustentada, uma vez que as características das obras que devem ser ponderadas na fixação do valor da «taxa» para a licença de construção, em circunstâncias normais, podem ter implicações na reavaliação da permanência das condições legais de licenciamento e, bem assim, na pressão urbanística que as mesmas criarão na sua envolvente, na verdade, pode falhar na aplicação ao caso concreto.
Mas o Regulamento salvaguarda o caso das áreas abrangidas por alvará de loteamento emitido há menos de três anos (em que C=0), como ainda a possibilidade de dedução nas taxas do valor das obras de infraestruturas realizadas fora da sua propriedade.
Donde, não é possível concluir, nomeadamente, pelo manifesto desajustamento entre o montante a pagar a título de «taxa» de licença de construção, pela realização de edificações novas, e o valor que o particular retira dessa utilização, pela inconstitucionalidade da norma em apreciação por violação do princípio da proporcionalidade.
Nesta conformidade, tudo visto e ponderado, é de qualificar como «taxa» o tributo pago como contrapartida pela emissão da licença de construção, destinada à realização de construção nova.
O que significa que o artigo 30.º [artigo 29.º, de acordo com a tabela vigente em 2004], n.º 6 do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................ não enferma da inconstitucionalidade orgânica apontada na p.i. pela Impugnante, por violação do princípio de legalidade fiscal, na sua dimensão de reserva material da lei (artigo 103.º, da CRP) ou da reserva relativa de lei da Assembleia da República (artigo 165.º, n.º 1, alínea i) do mesmo diploma legal).
Assim, constituindo as quantias impugnadas, devidas pelo licenciamento de duas operações de construções de obras novas, tituladas pelos competentes alvarás emitidos pela Câmara Municipal do B........................ a favor da sociedade Impugnante, uma «taxa», que não um imposto ou contribuição especial, e não sendo (organicamente) inconstitucionais as normas regulamentares que a fixaram, as liquidações impugnadas não padecem da ilegalidade/nulidade por falta de atribuições do Município do B........................, tal qual a mesma vem apontada na petição inicial”.
E, assim é, na medida em que estamos perante verdadeiras taxas devidas pela construção nos lotes 22 e 23. Portanto, não estando em causa impostos, nem contribuições financeiras, não está a sua criação sujeita à regra da reserva de lei para a sua criação e para determinação dos elementos essenciais, podendo a sua previsão constar de regulamento municipal, aprovado pela assembleia municipal, nos termos das Lei das Finanças Locais e das Autarquias Locais então em vigor, conforme se avançou.
Assim, além de inexistirem a inconstitucionalidade orgânica anotada, inexiste também qualquer nulidade, inexigibilidade ou ilegalidade abstrata dos tributos.
- Diz ainda a recorrente que o Regulamento em causa não é aplicável à situação trazida, desde logo porque os pedidos de licenciamento são de 06.11.2000 e o Regulamento apenas entrou em vigor três meses após os mesmos, o que determina a imposição retroativa do pagamento de tributos, afrontando princípios da segurança e proteção da confiança, sendo desproporcionados e injustificados, causando-lhe prejuízos.
Antes de mais, e como se viu, o Regulamento é de aplicação à situação trazida.
É certo que os pedidos de licenciamento que deram origem aos processos camarários n.ºs CT/……../00 e CT/………./00, destinados, respetivamente, à execução de edificações novas nos Lotes 22 e 23, foram apresentados junto da Câmara Municipal do B........................ em 06.11.2000.
Porém, à luz do vertido no artigo 117º, n.º 1 do RJUE, a liquidação das taxas em causa tem de atentar às normas jurídicas que as regulavam na data da emissão do ato de licenciamento, o qual ocorreu em 21.07.2004, consoante decorre do ponto L) do probatório, aprovando o pedido de reaprovação do projeto apresentado pela recorrente, facto determinante para as liquidações das taxas e para a emissão dos correspondentes alvarás de licença de construção em 13.10.2004, consoante se extrai das alíneas U) e V) do probatório.
O Regulamento Municipal de Liquidação e Cobrança de Taxas e Licenças do Município do B........................, aprovado pela Assembleia Municipal em 05.01.2001, em vigor em 01.02.2001 (publicado no Diário da República, Apêndice n.º 6-B/2001, II Série, n.º 13, de 16.01.2001), é, pois, de aplicar ao caso em apreço, com a atualização da tabela vigente à data de 21.07.2004, tal como o disse a decisão recorrida.
De resto, decorria do artigo 16º (Disposição transitória) daquele Regulamento Municipal do B........................, que as taxas e licenças aplicam-se a todos procedimentos pendentes à data de entrada em vigor do mesmo, por isso, aplicável às taxas aqui em causa.
Improcede, nesta conformidade a alegada inaplicabilidade, retroatividade e bem assim os princípios da segurança, confiança e boa fé em que se arvora a recorrente, ao defender que o pagamento das taxas aqui em causa configuravam tributos não previstos na lei, com os quais não podia antecipadamente prever.

- Aduz ainda a recorrente que a decisão recorrida ajuizou mal as consequências decorrentes da falta de audição prévia, e que não se verificam os pressupostos para a sua dispensa, estando em causa, afirma, uma formalidade essencial com assento constitucional.
Apreciando.
O direito de audiência previsto no artigo 60.º da LGT e 45º do CPPT concretiza o direito constitucional de participação dos cidadãos na formação das decisões administrativas que lhes digam respeito, garantido pelo artigo 267.º, n.º 5, da CRP que, a não ser respeitado, determina, em princípio a anulação do ato.
A este respeito, o Tribunal a quo entendeu que aquele direito de participação não tinha lugar nas situações em causa, na medida em que as taxas relativas às construções são efetuadas no âmbito do procedimento de licenciamento e com base nos elementos constantes do mesmo, razão pela qual não há lugar a uma atividade instrutória distinta daquela que tem lugar no procedimento de licenciamento, sendo certo que é justamente no âmbito deste mesmo procedimento de licenciamento que se deve realizar a audiência dos interessados.
E, assim é.
Na verdade, a liquidação das taxas em apreço, inserem-se na atividade vinculada da administração e, nesse contexto, traduzem-se numa operação meramente aritmética, sustentada em fórmulas que contêm o esquema de cálculo a adotar para se encontrar o seu quantum, que tem por base os elementos constantes do procedimento de licenciamento
A liquidação dessa taxa mais não é do que uma operação aritmética subsequente ao deferimento de um pedido de licenciamento, pelo que, a taxa em causa não comporta qualquer definição do direito do particular que já ocorre com o ato de licenciamento que lhe serve de pressuposto – vd. acórdão do TCAS de 04.06.2020, processo 387/00.5BTLRS e acórdão do STA de 29.10.2014, processo 01242/13, (embora a respeito da taxas de infra-estruturas urbanísticas, mas igualmente aplicável com as devidas adaptações).
Ao decidir assim, bem andou a decisão recorrida, o que determina a improcedência do recurso nesta parte.
- Alega ainda a recorrente que as taxas padecem de falta de fundamentação e que mal andou o Tribunal ao concluir o contrário.
Entende que deveriam ter sido elencados os factos integradores da previsão do artigo 30º nº 6 do Regulamento Municipal em causa, nomeadamente da localização das construções, uso e pressão que as mesmas criariam nas infra- estruturas existentes ou a realizar.
Analisando.
É verdade que os atos tributários têm de estar fundamentados, desde logo à luz do artigo 77º da LGT e do artigo 268º da CRP, devendo essa fundamentação ser clara e congruente, por forma a que, o seu destinatário compreenda o iter percorrido pela Administração para praticar o ato, podendo assim, conformar-se ou não com o seu teor, sem que saiam afetadas as suas garantias de defesa.
Na situação posta em crise, podemos afirmar que as garantias de defesa da recorrente não foram afetadas na medida que dirige aos atos tributários uma defesa que se evidencia capaz e esclarecida, pese embora as suas razões de discórdia.
A recorrente dá conta que conhece a fundamentação legal das taxas - artigo 30º nº 6 do Regulamento Municipal-, apesar de confundir as taxas em causa com as taxas urbanísticas, apregoa que falta a justificação quanto à pressão que as mesmas criam nas infraestruturas gerais existentes ou a realizar. Porém, como repetidamente se disse, em causa não estão taxas de infraestruturas urbanísticas para que essa fundamentação lhe fosse oferecida.
Relativamente à localização das construções, não há dúvida que esses elementos são do conhecimento da própria recorrente, pois respeitam às taxas de construção nos edifícios que pretendia construir nos seus dois lotes, a que respeitam os procedimentos camarários identificados no probatório.
De resto, relativamente à quantificação das taxas nada é referido pela recorrente, sendo certo que neste tipo de tributos, a própria norma enuncia os elementos de calculo/preço, reduzindo-se a atividade do Município a uma operação meramente aritmética, como o dissemos, estando a mesma enunciada na operação de liquidação como se vê dos pontos M) e N) do probatório, sem que a recorrente evidenciasse qualquer incompreensão na sua quantificação.
Portanto, contendo o fundamento legal (artigo 30º nº 6 do Regulamento) e as operações de cálculo para as construções nos dois lotes da recorrente (os elementos de facto considerados no cálculo são as suas características: o tipo de utilização da obra, a área de construção (A) e o custo do m2 da construção (C), tendo como referencial 100m2, pelo que os dados respeitam à dimensão, importância e valor da própria obra), os tributos satisfazem a exigência legal de fundamentação.
Assim, concordamos com a decisão recorrida quando conclui que não ocorre falta de fundamentação, improcedendo, também aqui, o alegado pela recorrente.
Aqui chegados, assuma a conclusão que o recurso terá de improceder na sua integralidade, mantendo-se a decisão recorrida e bem assim os tributos impugnados.
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No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrente.


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V- DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.


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Lisboa, 03 de abril de 2025.

Isabel Silva
(Relatora)
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Margarida Reis
(1ª adjunta)
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Tiago Brandão de Pinho
(2º adjunto)
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