Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 1895/09.8BELRS |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 07/11/2024 |
| Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
| Descritores: | MÉTODOS INDIRETOS ÓNUS DA PROVA INSUFICIENTES IRREGULARIDADES CONTABILÍSTICAS SUPORTE DOCUMENTAL DO CUSTO |
| Sumário: | I - Decorre do artigo 104.º, nº2 da CRP, que deve evitar-se a existência de imposto sem rendimento efetivo, contudo a tributação pelo rendimento real constitui um princípio ou uma regra que permite, excecionalmente, desvios ou exceções. II - Compete à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação; III - A existência de irregularidades contabilísticas, só permite fundamentar a tributação presuntiva quando for impossível quantificar diretamente a matéria coletável, sendo que a morosidade, a excessiva onerosidade e a dificuldade não podem ser aventadas como justificação para a avaliação indireta. IV - A singela constatação, sem aferir, de forma devidamente sustentada e casuística, toda a realidade empresarial, mormente dinâmica, parcerias, acordos de repartição de custos e casuística ponderação de encontro de contas, não permite fundar a impossibilidade de apuramento direto da matéria tributável, quando, ademais, resulta do Relatório de Inspeção Tributária, que a Recorrida não se furtou a qualquer colaboração. V - À data da prática dos factos tributários, o documento justificativo de um lançamento contabilístico e, em particular um documento comprovativo de um custo, não tinha que ser constituído por uma fatura ou documento equivalente, não relevava, portanto, o conteúdo formal do documento, mas um certo conteúdo funcional. VI - O ónus probatório dos pressupostos da sua atuação têm de ser definidos em sede e momento próprio, não podendo o Tribunal substituir-se à parte (AT), e a posteriori, fundamentar uma realidade ou mesmo um deficit instrutório por si protagonizado. Tal juízo de entendimento implicaria uma subversão do ónus probatório, envidando-se uma pronúncia substitutiva, totalmente, ilegal. |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I – RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente ou DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente, por provada, a impugnação judicial deduzida por T… -Viagens e Turismo A…, Lda, (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), e correspondente Juros Compensatórios (JC), do exercício de 2004, no valor global de € 97.008,70. *** A Recorrente apresentou as suas alegações, formulando as conclusões, que infra se reproduzem: «A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial à margem identificada, deduzida por T… -VIAGENS E TURISMO A…, LDª, NIPC 5…, tendo como objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRC n.º2008 8310038247 e Juros Compensatórios referente ao ano de 2004, no valor de €97.008,70. B. Não pode a Fazenda Pública, com o devido respeito, que é muito, conformar-se com o assim decidido, por ser seu entendimento que, in casu, a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, de forma imediata, e a liquidação de IRC do ano 2004, de forma mediata, não padecem do enquadramento legal na parte lhes vem apontado pela sentença recorrida, designadamente, por ocorrer uma discrepância entre a matéria de facto provada, designadamente dos factos de índole administrativa, e a fundamentação da decisão. C. Previamente¸ realce-se que a Digna Procuradora do Ministério Público perfilha o mesmo entendimento da Administração Tributária, conforme decorre do seu parecer, onde começa por uma breve resenha legislativa, para concordar que a contabilidade da Impugnante não refletia todas as operações realizadas e dedução indevida de custos, pelo que, conclui ” (…) afigura-se-nos que a AT logrou demonstrar, cabalmente, que se mostram preenchidos os pressupostos que, neste caso, impuseram o recurso a métodos indiretos para determinação da matéria tributável. Por outro lado, afigura-se-nos que, a impugnante não logrou demonstrar a existência de excesso de quantificação.”. D. Em sede inspetiva, a Administração Tributaria efetuou todas as diligências tidas como necessárias e suficientes, esbarrando com a insuficiência de informação plausível no esclarecimento das dúvidas em torno da contabilidade Impugnante e que culminaram na necessidade do recurso a avaliação da matéria tributável por métodos indiretos, tal como decorre do RIT, dos factos provados, designadamente, da análise do direito audição, onde se explica cabalmente que os elementos trazidos pela Impugnante foram insuficientes para alterar a impossibilidade de avaliação direta, “O facto é que a contabilidade e os elementos auxiliares apresentados pela sociedade até ao momento, não demonstram onde estão a totalidade dos proveitos inerentes aos custos identificados, nem tao pouco, se esses custos foram debitados a quem auferiu os respetivos proveitos.”. E. A Fazenda Pública entende que o Tribunal a quo não tem razão quando assenta que é do pedido de revisão que se deve colher a fundamentação adotada pela Administração Tributária, porquanto a fundamentação a ter em consideração é toda aquela que foi operada pela Administração Tributária, devendo-se ter em consideração todas as vicissitudes, como por exemplo, o timing da Impugnante não apresentar determinadas informações/documentos em sede inspetiva, mesmo interpelado pelos serviços de inspeção, e só o fazer em sede do pedido de revisão ou em sede de impugnação, constitui uma clara denegação da intenção da descoberta da verdade material, independente de a lei formalmente o permitir, mas materialmente terá que ser devidamente acalentado pelo Tribunal a quo quando é claro que ab initio a Impugnante está em poder material para fornecer todas as explicações. F. Sendo o momento, por excelência, da cooperação do contribuinte na descoberta material sobre a sua capacidade contributiva na fase inspetiva, por ser esse momento que as partes estão factualmente a esmiuçar a verdade, e que existe a oportunidade de encetar novas diligências junto de terceiros, antes de se começar a consolidar a verdade material, e a defesa do direito fundamental de pagar impostos. G. Por outro lado, ao contrário do gizado pelo Tribunal a quo, a Administração Tributária não se limitou a indicar as irregularidades na contabilidade, antes especificou que as irregularidades não permitiam assimilar todas as operações realizadas, designadamente em sede de proveitos e a aceitação dos custos contabilizados. H. Considerando que da contabilidade e dos factos apurados pela Administração Tributária, decorre uma discrepância quanto à faturação dos bilhetes emitidos e os custos suportados, que a Impugnante não soube cabalmente explicar, concluindo-se que em determinados voos foram transportados mais passageiros do que os faturados, e que dos autos não se encontra documentalmente justificada esta discrepância, que consubstancia uma irregularidade que também fundamenta o recurso à avaliação indireta. I. A Fazenda Pública entende que o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao dar como sanada esta situação por consistir um arrepio e que explica-se pelos vínculos jurídicos estabelecidos entre a I…, e a P…, porque esses vínculos jurídicos e explicações associadas não dão resposta às irregularidades detetadas pela Administração Tributária, e nesse sentido, ao contrário do afirmado pelo Tribunal a quo, não completam a informação constante dos mapas e outros elementos. J. O Tribunal a quo afirma que os referidos vínculos jurídicos completam os mapas e a informação anteriormente apresentada, mas o Tribunal a quo não explica (fundamenta) de que forma, e como tal, como é que chega a essa conclusão. K. Nessa medida, temos uma tramitação administrativa de descoberta da verdade material em sede inspetiva a esmiuçar todas as informações, respondendo à participação da Impugnante e depois cooperando no pedido de revisão, em que fundamenta a sua tomada de posição por avaliação indireta, para depois, com o devido respeito, termos uma apreciação jurisdicional que não expõe plenamente os fundamentos da sua conclusão, assim como infra limita-se a juntar as várias informações, mas partindo sempre da premissa que a fundamentação do procedimento de revisão é insuficiente, dando como normais as irregularidades detetadas pela Administração Tributária, e desvalorizando as relações especiais entre as parte. L. Também não concordamos com o afirmado pelo Tribunal a quo de que a Administração Tributária tem de convencer a Impugnante, porquanto antes tem a obrigação de fundamentar de forma correta e que tem vindo a ser entendido na doutrina e jurisprudência que “a fundamentação tem duas funções: uma de natureza endógena, decorrente dos princípios da legalidade, da justiça e da imparcialidade que se impõe a toda a actuação da Administração e que exige que as decisões administrativas, nomeadamente os actos administrativos e tributários apareçam na ordem jurídica como conclusões de um processo lógico coerente e sensato e resultado de um exame sério e imparcial dos factos e das disposições legais a considerar em cada caso; outra de natureza exógena, externa ou garantística, que é a de permitir ao cidadão o conhecimento dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a autoridade administrativa a decidir da forma concreta que o fez e, assim, permitir-lhe optar conscientemente entre a aceitação da decisão administrativa, aceitando a sua legalidade, ou reagir contra ela por via administrativa ou contenciosa.” (vide Ac. do TCA, Proc. 03804/00 de 13/01/2004, acessível através da internet através dosite www.dgsi.pt). M. Pelo que compulsada toda a fundamentação administrativa na situação em apreço, designadamente nos pontos IV e V em sede inspetiva, em sede do laudo do perito da Fazenda Pública, em sede da decisão proferida no procedimento de revisão, em sede graciosa e por fim em sede de contestação, especificamente no art.11, a Fazenda Pública considera que existe uma fundamentação completa e correta e explica corretamente a verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indireta. N. Assim como, o Tribunal a quo não determina o alcance da utilização da expressão “de acordo com as regras da experiência comum” na situação sob apreço quanto à relação entre o quadro dos vínculos jurídicos, as relações especiais e as incongruências entre menores proveitos face aos custos contabilizados, e desconsiderados pela Administração Tributária. O. A Fazenda Pública reitera que a inexistência de faturas entre a I… não pode ser justificável no quadro dos vínculos jurídicos e das relações especiais, porquanto esses dois factos não podem derrogar as regras contabilístico-fiscais, e dessa forma, não basta a mera junção desses documentos, para que caia por terra as respetivas obrigações e saneamento das irregularidades contabilísticas que impediram avaliação direta. P. Acresce que, a argumentação gizada em torno do impulso inspetivo da Administração Tributária, nos termos do art.58.º e 63.º da LGT, carece de qualquer validade para a situação em apreço nos autos. Q. Por um lado, o art.63.º da LGT clarifica, em termos gerais, os poderes inspetivos da Administração Tributária, que mediante a sua estratégica e análise, poderá lançar mão deles, mas isso não significa que possa ser ajuizada, nos moldes como foi na douta sentença, sobre a sua utilização, porquanto essa disposição não impõe determinada diligência em determinada situação, e ainda porque a Administração Tributária exerceu os seus poderes inspetivos na medida que considerou necessário para fundamentar e não acusou nenhuma impossibilidade no exercício das suas funções. R. Por outro lado, a referência ao princípio do inquisitório na aplicação à situação em concreto, no sentido utilizado pelo Tribunal a quo, como se Administração Tributária se tivesse furtado ao seu dever inquisitório, também carece de razão, porquanto se a Administração Tributária não diligenciou junto da I…foi porque entendeu que não tinha que o fazer, sendo certo que era a Impugnante que tinha de prestar todas as informações. S. Se o Tribunal a quo entendia necessário haver mais informação relativamente à I…, com vista a descoberta material, então antes deveria ter o Tribunal a quo lançado mão do seu poder inquisitório, porque a decisão jurisdicional não podia ficar refém da informação do relatório de inspeção ou outro ato administrativo, como o procedimento de revisão, e por isso, quando assim existem indícios que ofuscam a verdade material, como entende o Tribunal a quo, este deve lançar mão das suas ferramentas, designadamente, do seu poder oficioso de encetar todas as diligências que considere pertinentes, ao abrigo do princípio do inquisitório. T. De ressalvar, que esta ímpeto inquisitório do tribunal, não se trata de substituir às partes e ao seu dever do ónus da prova, mas antes diligenciar, por todos meios, a descoberta material! U. Portanto, a Fazenda Pública defende que todo o quadro jurídico e factual que foi sendo construído no apuramento da verdade material em sede inspetiva e depois em sede de revisão tem sempre presente incongruências da contabilidade da Impugnante, como seja mais custos do que proveitos por ausência de faturação, que não pode ser meramente aceitável por a faturação ser de outras empresas com as quais a Impugnante tinha relações especiais e vínculos jurídicos. V. Nestes termos, atenta à decisão proferida e salvo o devido respeito, a Fazenda Pública não se pode conformar, nem tão pouco concordar com a douta sentença que ora se recorre proferida pelo Tribunal a quo, por julgar procedente a impugnação! Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., e em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, e substituída por Acórdão que julgue improcedente, por não provada, a impugnação judicial, e, em consequência, mantenha, vigentes no ordenamento jurídico tributário, por legais, a liquidação de IRC de 2004. Todavia, Decidindo, Vossas Excelências farão, como sempre, a costumada Justiça!” *** A Recorrida apresentou as suas contra-alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem: “I. A Recorrente fundamenta, em síntese, o seu Recurso nos termos seguintes: Considera que em sede inspetiva a Administração Tributária efetuou todas as diligências tidas como necessárias e suficientes, esbarrando com a insuficiência de informação plausível no esclarecimento das dúvidas em torno da contabilidade da impugnante; Entende que o Tribunal não tem razão quando assenta que é no pedido de revisão que se deve colher a fundamentação adotada pela administração Tributária; Entende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao dar como sanada a alegada discrepância quanto à faturação dos bilhetes emitidos e os custos suportados. II. Todavia, não lhe assiste razão, como se demonstra: III. As alegadas diligências da Administração Tributária tidas como necessárias e suficientes não esbarraram com a insuficiência de informação plausível no esclarecimento das dúvidas em torno da contabilidade da impugnante. IV. Com efeito, a ora Recorrida exerce a atividade de agência de viagens e de turismo, e, não tendo instalações fixas e recursos humanos na Suíça, fez uma parceria com a I…, para coordenação de esforços para a exploração da rota, sendo que nos termos do contrato, a contabilidade desta POOL é levada a cabo por um dos participantes, e uma vez aprovada é feita a repartição dos lucros ou perdas na percentagem de 50% a cada um dos participantes, como expressamente decorre do contrato que consta da PI da Impugnação Judicial. V. Ora, o funcionamento dos registos contabilísticos da POOL foram exaustivamente explicados à inspeção tributária, que ainda assim considerou que a contabilidade não foi elaborada de acordo com a normalização contabilística, em manifesta negação da forma como a Recorrida desenvolve a sua atividade. VI. Com efeito, sentencia a inspeção tributária que “onde estão registados os custos deveriam estar registados os proveitos”, para assim justificar que os bilhetes vendidos pela I… deveriam estar registados na contabilidade da Recorrida, cabendo ao sujeito passivo “através da contabilidade, o ónus da demonstração da indispensabilidade dos custos para a realização dos proveitos”. VII. Ora, a exploração conjunta de rotas é uma prática corrente na aviação comercial com os bilhetes a serem vendidos e registados na contabilidade de cada uma das diversas companhias que integram a POOL e, sendo esta a realidade dos factos, a inspeção tributária para ver simplificada a sua tarefa de controlo não pode proibir a exploração conjunta de rotas nem pode obrigar uma só das companhias a registar a totalidade da venda dos bilhetes. VIII. Mas, perante a complexidade das operações da Recorrida, a inspeção tributária em vez de tentar compreendê-las, limitou-se a enunciar princípios: “cabe ao sujeito passivo através da contabilidade, o ónus da demonstração da indispensabilidade dos custos para a realização dos proveitos”. IX. Ora, não há dúvidas que os custos estão evidenciados na contabilidade, e se não são indispensáveis para a realização dos proveitos, competiria à inspeção, na exata medida, desconsiderá-los, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC. X. Com efeito, depois de, em direito de audição, a Recorrida ter demonstrado cabalmente como foi feita a repartição de receitas e despesas, apresentando para o efeito 6 anexos, a inspeção não efetuou nenhuma análise dos documentos apresentados. XI. Ora, a Recorrida explicou que existe (e apresentou) um acordo de parceria, nos termos do qual cada uma das partes fatura os bilhetes que vende, correspondentes aos passageiros de um determinado voo, sendo, como é óbvio, apenas a soma dos bilhetes vendidos por cada uma das duas partes no acordo é comparável com os indicados pela companhia transportadora como passageiros transportados em determinado voo. XII. Explicou que nos termos do acordo, a parte que em primeira linha contrata os voos suporta os custos, podendo o correspondente montante naturalmente superar a sua faturação, e que no final do ano, é feita a repartição dos lucros ou perdas numa proporção de 50% para cada uma das partes, utilizando-se os mapas POT sendo certo que desses mapas emergem todos os elementos com relevância para se efetuar a mencionada repartição. XIII. Ora, ao invés de efetuar uma análise dos referidos mapas, a inspeção sentencia que um documento interno não pode substituir um documento de origem externa, como se houvesse um específico documento externo para refletir o resultado da ventilação destes proveitos e custos. XIV. É o próprio acordo que prevê a repartição dos lucros e perdas nos termos referidos, dando origem à elaboração dos correspondentes mapas, e que constituem o documento de suporte, não servindo as faturas nem as notas de débito para esse efeito. XV. Portanto, ao contrário do que refere a Recorrente, a inspeção tributária não quis perceber o modelo de negócio da Recorrida, limitou-se a formular uma suspeição, e não “esbarrou com a insuficiência de informação plausível no esclarecimento das dúvidas em torno da contabilidade”, antes pelo contrário, não se dignou analisar os esclarecimentos que foram feitos, não tendo emitido qualquer juízo fundamentado sobre o manancial de informação que lhe foi facultado. XVI. Também quanto ao pedido de revisão como fonte da fundamentação adotada pela administração Tributária, a considerar pelo Tribunal, não assiste razão à Recorrente. XVII. A Recorrente entende que a fundamentação a ter em consideração é toda aquela que foi operada pela Administração Tributária, devendo ter-se em consideração todas as vicissitudes, como por exemplo, “o timing da impugnante não apresentar determinadas informações/documentos em sede inspetiva”, pretendo, aparentemente, justificar a falta de diligências da inspeção com uma suposta falta de colaboração da Recorrida. XVIII. No Relatório a inspeção não emitiu qualquer juízo valorativo sobre os elementos que lhe foram facultados, mas, se tivesse feito a análise de tais elementos, como lhe competia, teria concluído (inequivocamente) que naturalmente, tratando-se de uma parceria, os proveitos correspondentes à venda dos bilhetes encontra-se reconhecida no parceiro que efetuou a sua venda, sem prejuízo do apuramento do resultado que a cada um cabe na exploração da rota. XIX. Portanto, enquanto a Recorrida cumpriu com o seu dever de colaboração e ónus de prova, a inspeção ficou numa atitude passiva, como se, nos termos do artigo 6.º do RCPITA não recaisse sobre ela o dever de descoberta da verdade material. XX. E, neste caso, a inspeção tributária não só não fez quaisquer diligências, como nem sequer se dignou analisar os elementos que lhe foram facultados no direito de audição. XXI. De qualquer modo, é jurisprudência consolidada que tendo a liquidação sido feita com base na decisão do procedimento de revisão é aí que deve ser colhida a fundamentação do ato, como decorre, por exemplo do Acórdão do TCAN de 20-01-2022, no Processo n.º 00243/08.9BEVIS: “I – Assentando a liquidação impugnada num ato emanado no procedimento de revisão, mais propriamente na decisão do respetivo Diretor de Finanças, é nesse ato final que se deve colher a fundamentação adotada pela Administração Tributária”. XXII. Também quanto ao alegado erro de julgamento do Tribunal a quo ao dar como sanada a alegada discrepância quanto à faturação dos bilhetes emitidos e os custos suportados, não assiste razão à Recorrente. XXIII. De facto, no âmbito do procedimento e no direito de audição, a Recorrida informou que os bilhetes não faturados pela T… foram faturados pela I…, que a repartição dos ganhos ou das perdas resultantes dos voos é feita através de um débito ou crédito mensal, suportado por um mapa auxiliar, com o valor a considerar como custo ou proveito, respeitante aos bilhetes de cada mês, e que o valor correspondente aos passageiros transportados por conta e em nome da T…foi totalmente faturado. XXIV. Ora, as regras do ónus da prova não significam que seja sobre a parte à qual ele é imposto que recai o dever de trazer ao processo os meios de prova dos factos relevantes para decisão, dispensando a parte contrária de tal tarefa, pois a Administração Tributária nunca está dispensada de, em cumprimento do princípio do inquisitório, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido, por força do artigo 58.º da LGT. XXV. De facto, o princípio do inquisitório situa-se a montante do ónus de prova, como resulta do Acórdão do STA, de 21-10-2009, no Processo n.º 0583/09, só operando as regras do ónus da prova quando, após o devido cumprimento daquele princípio, se chegar a uma situação de dúvida (non liquet) sobre os factos relevantes para a decisão do procedimento tributário, situação esta em que a matéria de facto é decidida contra a parte a quem é imposto tal ónus. XXVI. Portanto, não é possível concordar com a visão idílica que a Recorrente traça da inspeção tributária e a falta que imputa ao Tribunal a quo. XXVII. Com efeito, a inspeção tributária não fez o menor esforço para entender o modelo de negócio da Recorrida, a complexidade das operações efetuadas e dos consequentes registos contabilísticos. XXVIII. Constatou de início que a Recorrida não vendia a totalidade dos bilhetes dos voos que contratualizou, e a partir daqui, pensou ter encontrado um motivo para aplicação de métodos indiretos. XXIX. Foi demonstrado que a venda dos bilhetes era feita no âmbito de um acordo de parceria, pelas partes intervenientes e foram-lhe facultados no âmbito do procedimento e no direito de audição, em particular os mapas POT em que, com base nos custos e proveitos auferidos por cada uma das partes contratantes, é feita a determinação do resultado que cada uma compete, nos termos do acordo. XXX. Perante a evidência do acordo e da venda de bilhetes pela I…, o fundamento passou a ser a falta de faturas pelo débito dos custos, isto é, como não fez nenhuma análise para confirmar se através da metodologia utilizada se chegava a um resultado conforme ao acordo, vem invocar uma questão de forma para justificar a tributação por métodos indiretos. XXXI. Relativamente ao Tribunal a quo, a Recorrida também não pode concordar com a visão crítica da Recorrente. XXXII. O Tribunal fundamentou a sua conclusão, considerando que competia à inspeção “uma explicação adicional que ponha em causa o equilíbrio dos valores constantes dos mapas e dos outros elementos fornecidos pela Impugnante”. XXXIII. Isto é, competia à inspeção demonstrar, tendo em conta os elementos apresentados, que a Recorrida, em termos de parceria, suportou, percentualmente, mais custos do que a I…. XXXIV. O Tribunal reconheceu e bem que a fundamentação do procedimento foi insuficiente e desvalorizou a inexistência das faturas, tendo em consideração os vínculos jurídicos que decorrem do acordo de parceria, que estipulam a forma de repartição dos resultados. XXXV. O Tribunal considerou e bem que a constatação constante do procedimento de revisão de que “na contabilidade da Recorrida não estão evidenciados de forma inequívoca os proveitos, mas tão somente os custos suportados com os voos” e “os documentos de suporte não são os mais esclarecedores” não é reveladora de irregularidades graves que descredibilizem a contabilidade da Recorrida. XXXVI. O Tribunal não deu como normais as alegadas irregularidades detetadas pela inspeção tributária (apenas decidiu que não estavam verificados os pressupostos de aplicação de métodos indiretos) e também não desvalorizou as relações especiais, porque não foram invocadas pela inspeção para fundamentar qualquer correção. XXXVII. E, assim sendo, não foi o Tribunal a quo que não fundamentou as suas conclusões, foi a administração fiscal que ao longo do procedimento violou o seu dever de descoberta da verdade material. Atento o exposto, nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente Recurso improceder, pois só assim se fará a costumada JUSTIÇA!” *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento do recurso apresentado pela DRFP.. *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. *** II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, dão-se como provados os seguintes factos: “A. A Impugnante exercia, à data dos factos, a actividade de “Agência de Viagens e de Turismo” e o respectivo capital social era detido por A… e L… (cf. Relatório de Inspecção Tributária (RIT) a fls. 117 e segs. Do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); «Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original» Do anexo VII (“Extractos Contables Por Fecha Contable”) e do anexo VIII (Mapa de Apuramentos dos Custos Deduzidos Indevidamente), com o seguinte teor essencial:
E. Sobre o RIT, foram proferidos despacho e parecer com o seguinte teor essencial: «Imagem em texto no original» F. A Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável ao abrigo do disposto nos artigos 91.º e segs. da LGT, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 333 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido): (…) «Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original»
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G. Ao pedido de revisão referido na letra anterior, a Impugnante juntou 13 anexos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, designadamente do anexo II, com o seguinte teor essencial:
«Imagem em texto no original» Do anexo III, com o seguinte teor essencial: «Imagem em texto no original»
Do anexo IV, com o seguinte teor essencial: (…) «Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original»
Do anexo V, igualmente junto como anexo VII ao RIT, com o seguinte teor essencial:
«Imagem em texto no original»
Do anexo VIII, com o seguinte teor essencial: (…)
«Imagem em texto no original» Do anexo IX, com o seguinte teor essencial:
«Imagem em texto no original»
E do anexo XI, com o seguinte teor essencial:
«Imagem em texto no original» H. Foram lavradas as actas n.ºs 42/08 45/08 e 47/08, da qual consta que não foi possível o acordo entre os peritos da Administração Tributária e da Impugnante relativamente ao montante da matéria tributável a fixar, pelo que cada um elaborou o laudo com anexos respectivos, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 447 e segs. e 461 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original»
I. Em 13 de Outubro de 2008, o Director de Finanças de Lisboa proferiu decisão nos termos do artigo 92.°, n.º 6, da LGT, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 507 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original» J. Em 24 de Novembro de 2008, foi emitida a liquidação de IRC n.º 08102100055000001497303, referente ao exercício de 2004 (e respectiva liquidação de juros compensatórios), no valor total de € 97.008,70 (cf. doc. Junto a fl. 31 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); K. Em 5 de Maio de 2009, a Impugnante apresentou reclamação graciosa, a qual foi indeferida por despacho proferido em 16 de Setembro de 2009 pelo Chefe de Divisão, por sub-delegação do Director de Finanças Adjunto, sobre informação dos serviços com o seguinte teor essencial (cf. fls. 133 e segs. do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido): (…)
L. Em 7 de Outubro de 2009, foi apresentada em juízo a p. i. da presente impugnação (cf. carimbo dos CTT aposto a fl. 22, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); M. Entre a I… AG (doravante I…), com sede na Suíça e a Impugnante, foi celebrado acordo com o seguinte teor essencial (cf. doc. junto a fls. 159 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Imagem em texto no original»
«Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» N. Mensalmente, eram elaborados mapas de apuramento dos resultados da comercialização e exploração dos voos, com base no acordo referido na letra anterior, na informação transmitida pela I… quanto aos bilhetes vendidos e noutros documentos, como facturas e documentos de embarque, sendo que podia haver desistências e os dados eram inseridos no sistema (cf. doc. 6 a fl. 242, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, anexo IV a fls. 364 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, anexo I a fls. 461 e segs, do PAT apenso e depoimentos das testemunhas inquiridas); O. Entre a P… – Companhia Portuguesa de T…, S. A. (doravante P…), a Impugnante e a I…, foram celebrados os acordos de fretamento (“Charter Agreement”) juntos a fls. 167 e segs. e fls. 248 e segs., igualmente juntos como anexo IV ao RIT, com o seguinte teor essencial:
(…) P. Em 9 de Setembro de 2004, a I… enviou a A…/T…, Madrid telecópia e documentação com o seguinte teor essencial (cf. docs. juntos a fls. 231 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Imagem em texto no original»
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Q. A Impugnante efectuou o lançamento contabilístico das facturas que emitiu na sequência da venda em Portugal de 12 bilhetes para o voo Geneve/Porto de 7 de Agosto de 2004 (cf. docs. 2 a 9, juntos com a p. i. a fls. 31 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido, anexo IV ao pedido de revisão, referido na letra G supra e depoimentos das testemunhas inquiridas).” *** A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte: “Nada mais resultou provado com interesse para a decisão a proferir.” *** A motivação da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “Assenta a convicção do tribunal no exame dos docs. constantes dos autos e do PAT apenso, atenta a fé que merecem e o facto de não terem sido impugnados e bem assim, nos depoimentos das testemunhas inquiridas, designadamente das testemunhas G… e S…, dada a sua razão de ciência (cf. acta referida no ponto I supra), que prestaram os seus depoimentos com isenção, credibilidade e coerência com a prova documental produzida no PAT e nos autos e revelando conhecimento directo da organização contabilística da Impugnante e do modus operandi do seu negócio, tendo explicitado, de forma clara e objectiva, como era efectuada a repartição, com a I…, dos custos com o fretamento dos aviões e dos proveitos da comercialização e exploração dos voos e tendo descrito o procedimento de apuramento dos valores constantes dos mapas dos voos em causa, em especial os do mês de Agosto, tal como referido em cada letra do probatório.” *** III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação adicional de IRC, do exercício de 2004. Importa, desde logo, ter presente que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, porquanto ajuizou que não se encontravam reunidos os pressupostos para a determinação da matéria coletável de IRC, através do recurso aos métodos indiretos. A Recorrente alega, desde logo, que existe erro de julgamento, porquanto inversamente ao ajuizado pelo Tribunal a quo, a AT efetuou todas as diligências tidas como necessárias e suficientes, colidindo com a insuficiência de informação plausível no esclarecimento das dúvidas em torno da contabilidade e que determinaram a necessidade do recurso a avaliação da matéria tributável por métodos indiretos, tal como decorre do teor do Relatório de Inspeção Tributária, mormente, do item inerente à audição prévia, onde se explica cabalmente que os elementos carreados foram insuficientes para alterar a impossibilidade de avaliação direta. Advogando, outrossim, que não pode ser descurado o concreto período temporal em que a Impugnante, ora, Recorrida disponibilizou as informações, tendo, portanto, de ser valorado como que traduzindo uma clara denegação da intenção da descoberta da verdade material. Mais sustenta que, inversamente ao ajuizado na decisão recorrida, a AT não se limitou a indicar as irregularidades constantes na contabilidade, demonstrando que existe uma discrepância quanto à faturação dos bilhetes emitidos e os custos suportados, a qual não se encontra documentalmente justificada. Enfatiza, ainda, que não se podia sustentar uma concreta sanação face aos vínculos jurídicos estabelecidos entre a I…, e a P…, legitimando, por conseguinte, o recurso à avaliação indireta. Sufraga, adicionalmente, que o Tribunal a quo para além de não expor os fundamentos da sua conclusão, incorre em erro porquanto toda a fundamentação administrativa permite demonstrar a verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indireta, tendo realizado todas as diligências que reputou de relevo para o efeito, não podendo, in fine, socorrer-se de meros documentos internos. Conclui que, não obstante inexista qualquer violação do inquisitório, a verdade é que se o Tribunal a quo entendia que as diligências eram insuficientes poderia/deveria ter suprido as mesmas, mormente, mediante pedido de esclarecimentos junto da I…. Dissente a Recorrida, propugnando pela manutenção da decisão recorrida na medida em que a mesma estabeleceu um correto enquadramento normativo com a devida transposição para o recorte fático dos autos, porquanto valorou, e bem, as circunstâncias específicas em que a Recorrida desenvolve a sua atividade, mormente, as parcerias. Alega, para o efeito, que toda a orgânica e o concreto funcionamento dos registos contabilísticos da POOL foram exaustivamente explicados à AT, e ainda assim os mesmos não foram computados, tendo erradamente concluído que a contabilidade não foi elaborada de acordo com a normalização contabilística. Alterca, adicionalmente, que a AT ao invés de efetuar uma análise de toda a documentação que foi carreada, mormente, acordos de parceria e mapas, limita-se a apartar, sem mais, os documentos internos, não analisando, como era seu ónus, os esclarecimentos que foram feitos, não tendo emitido qualquer juízo fundamentado sobre o manancial de informação que lhe foi facultado. Corroborando, in fine, o aduzido pelo Tribunal a quo quanto ao âmbito e extensão do inquisitório, sublinhando que, neste caso, a Inspeção Tributária não só não fez quaisquer diligências, como nem sequer se dignou analisar os elementos que lhe foram facultados no direito de audição. Vejamos, então. O Tribunal a quo após elencar os pressupostos que legitimavam o recurso aos métodos indiretos dilucidou, como se transcreve: “No essencial, a Administração Tributária fundamenta a correcção efectuada na falta de proporção entre os custos e os proveitos e na inexistência de lançamentos contabilísticos de quaisquer notas de débito ou facturas para a I…, acabando por colocar em causa a base de cálculo, isto é, os custos e assumindo um montante diferente como lucro tributável (cf., ainda, anexo VIII ao RIT, referido na letra D do probatório). Vejamos, então, se a decisão recorrida merece a censura que lhe é endereçada. Para o efeito, há, desde logo, que atentar no respetivo regime normativo, e aquilatar em que situações é legítimo lançar mão dos métodos indiretos de fixação da matéria tributável, e estabelecer depois a competente transposição para o caso sub judice. Atentemos, então, no quadro normativo, tecendo os considerandos de direito que se reputam de relevo para o caso vertente. O recurso aos métodos indiretos só deve ser utilizado quando configure a única solução para se chegar à identificação do valor da matéria tributável efetiva. Assume, portanto, a natureza subsidiária e residual (cfr. artigo 85.º, n.º 1, da LGT). Uma “ultima ratio fisci”, para que a AT possa cumprir o poder/dever que lhe está cometido de diligenciar no sentido de que todos os contribuintes paguem os impostos devidos. “É, de facto, doutrinária e jurisprudencialmente líquido que a AT apenas estará legitimada a recorrer a presunções, na tarefa de encontrar a matéria tributável do contribuinte, -ainda que, por natureza e norma, meramente aproximativa da efectiva, quando este tenha rompido com o seu dever de colaboração para com aquela na medida em que, por um lado, a declarada, nos termos do princípio vigente neste domínio, não mereça credibilidade, por se indiciar fundadamente, que não tem aderência à realidade e, por outro, porque não haja metodologia alternativa que permita a sua fixação directa e exacta (correcções técnicas), sendo, ao caso e atento o imposto liquidado, relevante o preceituado nos art.ºs 82.º, 83.º e 84.º do CIVA e no art.º 81.º, do CIRS” (1-Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no recurso nº 2016/07, de 14 de novembro de 2007, disponível para consulta em www.dgsi.pt). Neste particular, importa, desde logo, ter presente o consignado no artigo 81.º da LGT, o qual preceitua que: “1 - A matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indireta nos casos e condições expressamente previstos na lei”. Preceituando, por seu turno, o normativo 83.º da LGT, sobre os fins da avaliação direta e bem assim indireta, no sentido que: “1 - A avaliação direta visa a determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação. 2 - A avaliação indireta visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha”. Daí que, a determinação da avaliação direta, tenha como ponto de partida as declarações dos contribuintes e/ou os dados apurados na sua contabilidade, os quais se presumem verdadeiros. Preceituando, neste âmbito, o artigo 75.º, nº1, da LGT, de que se presumem verdadeiras as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei. O princípio da verdade declarativa coloca, assim, na esfera de atuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, logo a AT está vinculada a liquidar os tributos com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, a posteriori, ao controlo dos factos declarados. Com efeito, só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todos as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita. Nessa medida, se por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no citado normativo 75.º, n.º 1 da LGT deixar de funcionar, a AT fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, preferencialmente com recurso aos métodos diretos ou, quando tal não seja, de todo, possível, a métodos indiretos. Note-se que, como decorre do citado normativo, concretamente, do seu nº2, a presunção de veracidade da contabilidade cessa quando revelar “[o]missões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”. Daí que, tenha existido a preocupação legal de se objetivarem as situações em que a matéria coletável pode ser fixada através de métodos indiretos, consagração legislativa taxativa, na medida em que não é qualquer omissão, erro ou inexatidão das declarações ou da contabilidade do sujeito passivo que permite o recurso a métodos indiretos de avaliação da matéria coletável, sendo exigido que tais irregularidades sejam de tal forma relevantes que tornem inviável a quantificação direta. O mesmo é dizer que, se não obstante a existência de irregularidades contabilísticas, for, ainda assim, possível quantificar diretamente a matéria coletável, deve-se lançar mão dos métodos diretos, desde que os mesmos permitam, com segurança, concluir no sentido da ocorrência do facto tributário e da sua quantificação concreta. No tocante à concreta enumeração, como visto, taxativa, há que chamar à colação o plasmado nos normativos 87.º e 88.º da LGT. Preceituando, para o efeito, o citado artigo 87.º, n.º 1, da LGT: “1 - A avaliação indireta só pode efetuar-se em caso de: a) Regime simplificado de tributação, nos casos e condições previstos na lei; b) Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável de qualquer imposto; c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objetivos da atividade de base técnico-científica referidos na presente lei. d) Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A; e) Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, salvo nos casos de início de actividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano, ou em três anos durante um período de cinco. f) Existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.” Esclarecendo, por seu turno, o artigo 88.º da LGT, no atinente à impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável que: “A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indiretos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável: a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais; b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação; c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexatidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal. d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”. Importando, ainda, ter presente que no domínio da errónea quantificação compete ao sujeito passivo provar -após demonstração por parte da AT que se mostram adequadamente fundamentados os pressupostos e critérios adotados para o recurso à avaliação indireta- que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade. Sendo certo que, não se pode perder de vista que a avaliação indireta representa, em bom rigor, uma aproximação da realidade tributária, donde a provável falibilidade, e inverosimilhança da quantificação é resultado da inevitabilidade em acionar o método indireto ou presuntivo, derradeira possibilidade de repor a legalidade e apurar uma determinante e insubstituível matéria tributável que, apenas por motivos, deficiências, imputáveis ao sujeito passivo, não pode estabelecer-se com recurso à via direta e normal, ou seja, mediante os seus elementos de contabilidade (2-Vide, designadamente, Acórdão do TCAN, proferido no processo n.º 00235/04.7BEPNF de 25.01.2007.). Como doutrinado, no Acórdão do STA, proferido no processo nº 0537/11, datado de 21 de setembro de 2011: “I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à AF o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.°, n.° 3 da LGT). II - Não logrando o contribuinte provar a existência de tal excesso, nem se afigurando evidente para o Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo, é de manter o “quantum” tributável fixado pela AF, desde que devidamente fundamentado.” Aqui chegados, e uma vez que, como já densificado anteriormente, compete à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação, importa, então, atentar no preenchimento do respetivo ónus probatório, aquilatando, para o efeito, se bem decidiu a sentença quando julgou que a AT não estava legitimada a proceder à determinação da matéria coletável por via presuntiva. Vejamos, então. De relevar, ab initio, que a Recorrente não procedeu à impugnação da matéria de facto, nada requerendo em termos de aditamento por complementação, substituição ou mesmo supressão do probatório, em nada podendo relevar a alegação genérica e não devidamente substanciada de que existe uma discrepância entre a matéria de facto provada, designadamente dos factos de índole administrativa, e a fundamentação da decisão. Mais importa relevar que, carece outrossim do relevo que lhe pretende imprimir a Recorrente o aludido em C), na medida em que o parecer do DMMP, não tem caráter vinculativo, podendo, naturalmente, o julgador não adotar o mesmo entendimento e sem que tal traduza qualquer ilegalidade. Feito este introito, atentemos, então, no erro de julgamento quanto aos aduzidos pressupostos. Neste concreto particular, cumpre evidenciar que não assiste razão quando sufraga que não foram ponderados todos os pressupostos que legitimaram a determinação da matéria coletável por recurso a métodos indiretos, na medida em que o Tribunal a quo elencou os mesmos apartando-os, não só face à existência de um juízo eminentemente genérico e conclusivo mas igualmente erróneo e desconforme com a realidade societária em contenda, adensando, outrossim, que a própria determinação das correções, e seu modus operandi, permite inferir que era possível a sua determinação pela via direta. No caso vertente, conforme resulta expressamente do Relatório de Inspeção Tributária-meio probatório no qual se deve indagar a fundamentação contemporânea do ato carecendo, portanto, de qualquer relevo o aduzido em M) por redundar em fundamentação a posteriori-, a fundamentação legal para o recurso à avaliação indireta assenta no disposto nos artigos 52.º do CIRC, 87.º, nº1, alínea b), e 88.º, alínea a), ambos da LGT. Entendeu, pois, a AT que se estava perante a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável do imposto, resultante da “Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais”. Evidenciou, para o efeito, o aludido Relatório como circunstâncias fáticas impeditivas de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis ao correto apuramento e quantum direto e exato, as que infra se descrevem: i. Mediante análise das vendas dos Bilhetes de Avião dos Voos Chárter com origem/destino - Geneve e Zurich através da verificação das faturas, extratos das contas de proveitos, Listagens de Embarque e faturas emitidas pelo fornecedor referente às taxas aeroportuárias, verificou-se que a sociedade suportou a totalidade dos custos relativos ao transporte de passageiros e respetivas taxas, quando não faturou a totalidade dos proveitos desses charters; ii. De acordo com informação obtida junto do fornecedor-P…, nomeadamente extratos de conta corrente, contratos celebrados para a realização dos voos e número de ocupantes dos aviões por voo, confirma-se a não faturação da totalidade dos passageiros transportados; iii. A título exemplificativo: a. Chárter de Ida e volta, datado de 07/08/2004, com origem/destino a Geneve (Porto/Geneve/Porto), permitiu verificar que: No percurso Porto /Geneve o número de lugares ocupados foram de 96 e o número de bilhetes faturados foram de 18; No percurso Gevene/Porto o número de lugares ocupados foram de 86 e o número de bilhetes faturados foram de 12. b. Chárter de ida e volta, datado de 14/08/2004, com origem/destino a Zunch (Porto/Zurich/Porto), permitiu constatar que: O número de lugares ocupados no voo Porto/Zurich foram de 97 e o número de bilhetes faturados foram de 24. No voo Zurich/Porto o número de lugares ocupados foram de 64 e o número de bilhetes faturados foram de 15. iv. As listagens de embarque apresentam como Agência/Vendedor, para além da própria T… (Clientes de Balcão) e dos seus clientes (outras agências), a I… e I…; v. De acordo com as informações prestadas pela TOC os bilhetes não faturados pela T… foram faturados pela I…(sociedade do grupo A… - Espanha), com sede na Suíça, uma vez que os charters foram organizadas por ambas as empresas e estas terão acordado entre elas a repartição em 50% dos ganhos ou das perdas dos voos, tendo feito a posteriori o respetivo encontro de contas, que se traduziu num débito ou crédito mensal, suportado por um mapa auxiliar, com o valor a considerar como custo ou proveito, respeitante aos bilhetes do mês. vi. Tal procedimento tinha de estar registado na contabilidade, mediante registo da Nota de Débito ou Fatura, não sendo idóneo, para o efeito, meros documentos internos. Carecia da existência de documento externo destinado a provar a operação afetando, necessariamente, o valor probatório da contabilidade. vii. A análise dos contratos celebrados com a companhia aérea (P…) permitiu apenas constatar que ambas as sociedades eram organizadoras de tais voos, relatando os contratos unicamente as condições específicas do transporte, não mencionando as entidades a quem seriam faturados. viii. A AT devido às insuficiências - não terem sido declarados os proveitos gerados pelos custos deduzidos - não tem a possibilidade de comprovar exatamente a matéria tributável. Conclui, assim, que por se ter verificado a dedução indevida de custos e a impossibilidade da sua comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria coletável, artigos 87.° e 88.° da LGT, a matéria coletável será apurada por avaliação indireta. Mas, a verdade é que existem, desde logo, erros na concreta interpretação, âmbito e abrangência da atividade desenvolvida, os quais foram, devidamente, apontados pela Recorrida, com junção de prova documental idónea e, devidamente, corporizada no probatório e que permite justificar as aduzidas irregularidades. Por outro lado, há que ter presente que o demais elenco supratranscrito, é absolutamente conclusivo, na medida em que se limita a descrever uma situação de facto, sem a atinente e necessária demonstração dos pressupostos que legitimam tal avaliação indireta. Atentemos, então, em cada uma das realidades de per se. Com efeito, a AT enuncia irregularidades na contabilidade, porquanto não faturou a totalidade dos passageiros transportados, tendo, no entanto, suportado a totalidade dos custos, mas a verdade é que não concretiza, minimamente, porque motivo tais irregularidades inviabilizam a realização de correções meramente aritméticas, sendo certo que do concreto cálculo e modus faciendi se infere, justamente, o oposto, ou seja, de que era viável -sendo caso disso- mediante análise dos respetivos elementos contabilísticos estabelecer um apuramento direto da matéria coletável. Note-se, outrossim, que não procede a alegação, porquanto contrária, como visto e devidamente densificado anteriormente, à metodologia da avaliação indireta, e inerente ratio legis no sentido de que “[a] alternativa ao método declarativo de apuramento da matéria tributável poderá consistir no recurso ao método de avaliação indirecta quando a declaração ou a correcção técnica se mostrem inadequadas para o apuramento do lucro tributável”. E isto porque só a impossibilidade, e não a falta de adequação ou dificuldade no tratamento de dados e elementos obtidos e carreados, pode legitimar o recurso à avaliação indireta. Mais importa ter presente que, a singela constatação -entenda-se sem inerente densificação, atinente à discrepância na faturação e concreta repartição dos custos- sem aferir, de forma devidamente sustentada e casuística, toda a realidade empresarial, mormente dinâmica, parcerias, acordos de repartição de custos e casuística ponderação de encontro de contas, não permite fundar a impossibilidade de apuramento direto da matéria tributável, até porque, conforme resulta do Relatório de Inspeção Tributária, a Recorrida não se furtou a qualquer colaboração. Por outro lado, os pressupostos elencados em i) e ii) supra, padecem de erro interpretativo, que tem, como visto, uma deficiente interpretação da realidade empresarial, a qual não obstante ter sido objeto de concreta explanação e junção de prova documental idónea, foi descurada, de forma absolutamente formal e conclusiva. Conforme resulta da factualidade provada, para além de existir uma justificação, devidamente suportada, para a desconformidade entre os lugares ocupados e os faturados, a verdade é que as aludidas premissas não se apresentam conforme com a realidade de facto patenteada nos autos, ou seja, de que a Recorrida suportou, no âmbito dos voos charters, mais custos que proveitos. Acresce que, desprezou a existência de encontro de contas devidamente, registado na contabilidade. Senão vejamos, mediante convocação do respetivo probatório. Mediante cotejo da realidade constante nas alíneas M), a Q), verifica-se que a AT não teve, efetivamente, em linha de conta todas as premissas que norteiam a atividade da Recorrida e que permitiam justificar as alegadas discrepâncias, particularmente, não foi, devidamente, valorado e ponderado que a exploração da atividade exercida pela Recorrida, é realizada em parceria com a I…, e o particular acordo estabelecido com o desiderato de exploração dos voos charter sindicados, no qual se encontra materializado o âmbito de atuação, as comissões, e a conta de exploração definitiva. Com efeito, resulta provado que entre a I… com sede na Suíça e a Impugnante, ora Recorrida, foi celebrado um acordo com o teor evidenciado em M), dele se extraindo, designadamente, o seguinte: Ø A partir de 1 janeiro de 2002, e por um período de tempo ilimitado, comprometem-se a coordenar as respetivas organizações na Suiça e Portugal, para comercializar, organizar e explorar voos charter entre Suiça e Portugal e vice versa, externando-se em termos de obrigações e responsabilidades básicas entre as partes que as mesmas serão repartidas da seguinte forma: o Quer a I…, quer a Recorrida têm direito a dispor de 50% dos lugares disponíveis nos aviões para ser comercializadas pelas suas próprias organizações em cada um dos países, não podendo ceder a terceiras empresas colaboradoras, isto é, agências em que não participem, uma comissão superior a 20%. o Cada participante auferirá uma comissão de 20% sobre as importâncias dos bilhetes transportados e vendidos pela sua própria organização. o Beneficiarão, igualmente, de uma comissão de 5% sobre os bilhetes transportados para compensar os custos de “Pool”, contabilidade e marketing, bem como os da realização do Booking, assistência em aeroportos. Ø No concreto domínio da contabilidade entre os voos da Suiça e Portugal e vice versa, é, igualmente, estipulado que mensalmente será elaborado um resumo consolidado de exploração do mês, sendo a contabilidade realizada com base nos passageiros transportados, com o respetivo resumo estatístico de todos os elementos componentes. E bem assim, a liquidação estabelecendo os saldos resultantes da exploração, sendo distribuídos tanto os benefícios como as perdas em função da percentagem de participação de cada uma das partes. Mais se consignando que no final de cada exercício ou período de exploração será feita a liquidação definitiva. Daí resultando que, uma vez examinada e aprovada a contabilidade da “Pool” correspondente à exploração relativa ao período em causa, os lucros ou perdas serão repartidos na percentagem de 50%. Dimanando, outrossim, provado que mensalmente eram elaborados mapas de apuramento dos resultados da comercialização e exploração dos voos, com base no acordo supra evidenciado, na informação transmitida pela I… quanto aos bilhetes vendidos e noutros documentos, como faturas e documentos de embarque, sendo que aquando da existência de desistências tais dados eram objeto de inserção no sistema. Sendo, igualmente, de relevar que entre a P…, a Impugnante, ora Recorrida e a I… foram celebrados acordos de fretamento “Charter Agreement”, com clara estipulação contratual dos custos, mormente, na cláusula 5ª, e dos termos de pagamento na respetiva cláusula 7ª. Ora, face às realidades supra expendidas ter-se-á de concluir que as premissas elencadas em i) e ii) comportam uma interpretação que não se apresenta em conformidade com a realidade societária, com os meandros empresariais, desvirtuando, adulterando, e inquinando, assim, o resultado atingido. Daí resulta, portanto, que a Recorrida demonstrou que a venda dos bilhetes era feita no âmbito de um acordo de parceria, pelas partes intervenientes, cujo suporte documental foi integralmente facultado, em particular os mapas POT (compostos por diversos agregados, mormente, receita líquida/bruta/despesas pagas, e devidamente, corporizado, designadamente, nas alíneas D) e F) da factualidade assente). Donde, a determinação do resultado é feita com base nos custos e proveitos auferidos por cada uma das partes contratantes, e de acordo com os acordos estabelecidos. Logo, não só não se aquilata a apontada irregularidade, como, no limite, a mesma não legitimaria, de todo, o recurso à avaliação indireta. Por seu turno, e quanto ao evidenciado em iii) supra, cumpre evidenciar que o exemplo que foi trazido à colação pela AT no seu Relatório de Inspeção Tributária, foi devidamente justificado, donde apartada qualquer irregularidade, conforme decorre da factualidade corporizada no probatório, mormente, em P) e Q). Sendo certo que, sempre se dirá que num universo anual e com movimentos mensais significativos, a convocação de tais realidades de facto sempre teriam uma reduzida expressividade, porquanto manifestamente redutora. Em nada podendo relevar, neste e para este efeito, o aduzido quanto ao concreto momento temporal da disponibilização da documentação, na medida em que a Impugnante pode proceder à concreta densificação do suporte documental ao longo de todo o procedimento, podendo, inclusive, carrear elementos em sede judicial. Logo, a disponibilização temporal não pode, de todo, ter o efeito que lhe pretende granjear a Recorrente, e muito menos uma conduta de “entorpecimento” da verdade material, quando, ademais, se infere que a Recorrida nunca se furtou a quaisquer esclarecimentos e a colaborar nas elucidações e explicações requeridas. Por seu turno, a premissa evidenciada em iv), mais não representa que um juízo conclusivo que em nada traduz e alicerça irregularidades contabilísticas e mais ainda que as mesmas possam obstaculizar à realização de meras correções aritméticas. No concernente às alíneas v) e vi), e face aos considerandos que já expendidos anteriormente, ter-se-á de relevar que as mesmas não só não traduzem a realidade fidedigna empresarial, deturpando, assim, as conclusões e os resultados apurados, como a simples menção e referência aos documentos internos não pode, de todo, ter o alcance que foi conferido pela Recorrente, quando, ademais, e como visto, tais realidades se encontram, devidamente lançadas e refletidas na contabilidade, conforme se extrai do Relatório de Inspeção Tributária, mormente, no Anexo VI. Note-se, ademais, que, à data da prática dos factos tributários, o documento justificativo de um lançamento contabilístico e, em particular um documento comprovativo de um custo, não tinha que ser constituído por uma fatura ou documento equivalente, bastando, assim, que a documentação carreada fosse apta e adequada a comprovar a realização da operação, realidade que sucede no caso vertente, conforme flui, inequivocamente, do probatório. O que significa, portanto, que à data, não relevava o conteúdo formal do documento, mas um certo conteúdo funcional, a sua adequação para cumprir uma certa função, donde, os documentos de suporte aos lançamentos contabilísticos têm, por conseguinte, de ser adequados e aptos a relacionar um certo fluxo financeiro com uma operação material com relevo económico (a jusante) e com a corresponde fonte produtora (a montante). [vide, designadamente, Acórdão STA, proferido no processo nº 0184/10, de 06.05.2020]. Não podendo, naturalmente, proceder a argumentação da AT no sentido de que a existência de documento externo destinado a provar uma operação afeta necessariamente o valor probatório da contabilidade, que essa falta não pode ser suprida com a apresentação de um documento interno, e mais ainda que tais predicados legitimam a determinação da matéria coletável, mediante recurso à avaliação indireta, como visto, de última ratio. Ainda neste conspecto, e no âmbito da análise dos predicados avançados para estear e fundar a avaliação indireta, refira-se que para além de não corresponder à realidade dos factos o expendido em vii), -a qual, ademais, tinha de ser concatenada com toda a demais prova produzida- a verdade é que, mesmo assumindo-se como insuficiente qualquer relevação constante num acordo ou suporte documental, poderia/deveria a AT ao abrigo do inquisitório encetar diligências instrutórias adicionais tendentes a esclarecer e a dissipar quaisquer dúvidas e substanciar realidades de facto que carecessem de dilucidação adicional. De salientar, neste concreto particular, que não procede o aludido pela Recorrente nas suas conclusões R) a T), atinentes ao inquisitório e à concreta supressão pelo Tribunal, mormente, envidando esclarecimentos junto da I…, na medida em que, como é bom de ver, o ónus probatório dos pressupostos da sua atuação têm de ser definidos em sede e momento próprio, não podendo o Tribunal substituir-se à parte (AT), e a posteriori, fundamentar uma realidade ou mesmo um deficit instrutório por si protagonizado. Com efeito, não só tal argumentação não tem qualquer fundamento legal, como a adotar-se tal juízo de entendimento subverter-se-ia o ónus probatório, e envidar-se-ia uma pronúncia substitutiva, totalmente, ilegal. In fine, e quanto à evidência constante em viii), para além da mesma enfermar, dos erros de facto já devidamente densificados anteriormente, mais não representa que um juízo conclusivo que em nada permite fundar o recurso à avaliação indireta, porquanto não justifica, de forma devidamente substanciada, porque motivo as alegadas insuficiências impossibilitam o recurso à matéria coletável pela via direta. Por outro lado, há que evidenciar que se a AT, no Relatório Inspetivo e respetivos anexos, identifica um conjunto, devidamente, escalpelizado de proveitos e despesas, segregando diversos itens de custos (conforme densificado, designadamente, nos Anexos identificados na alínea D), da factualidade assente) ou seja, se as situações se encontram de tal forma circunscritas e elencadas, aquiesce-se que de um confronto de elementos ao seu dispor quaisquer correções a encetar -e desde que, devidamente justificadas- nunca poderiam radicar na metodologia adotada pela AT, faltando, desde logo, o desiderato da impossibilidade e subsidiariedade a eles inerente. É certo que se avança que a contabilidade não é credível, por insuficiências de elementos contabilísticos, mas mediante uma asserção conclusiva, e sem que se patenteiem as razões atinentes ao efeito. Com efeito, e como é bom de ver, não pode limitar-se a dizer que os custos são comuns, ficando por concretizar de que forma se alcança esse juízo conclusivo, qual em concreto o âmbito de abrangência, e por que motivo tal inviabiliza o recurso à avalição direta. Destarte, permanece por concretizar a aludida insuficiência, ou seja, quais são esses elementos, de que forma, com que extensão, e acima de tudo porque motivo permitem retirar a conclusão de que há impossibilidade de apuramento da matéria tributável pela via direta. Sendo certo que, há que adensar, neste e para este efeito, que resulta algo contraditória tal asserção na medida que, se constata que tais omissões promanam, integralmente, do cruzamento de elementos de suporte à contabilidade entre outros. Note-se que não é passível de confusão conceptual, inerente justificação e legitimação a dificuldade na quantificação dos custos -que, em bom rigor, é a linha argumentativa que se retira do Relatório Inspetivo e a impossibilidade de concreta aferição e mensuração desses mesmos custos. De resto, e conforme resulta da letra da lei, a simples dificuldade ou mesmo morosidade no apuramento de determinados resultados não permite, sem mais, granjear o efeito útil pretendido pela Recorrente. Até porque, “[a] questão de os elementos estarem integrados na contabilidade da empresa em causa ou, neste caso, fora dela, não pode servir para afastar o recurso a correcções aritméticas (…)” (Vide, designadamente, Aresto do TCAN, prolatado no âmbito do processo nº 01281/08, datado de 25.01.2018). O que siginifica, portanto, que tais juízos tinham de ser perfeitamente enunciados, devidamente corporizados e externados o que, como visto, não sucedeu no caso vertente. Note-se, ademais, que a decisão recorrida, de forma criteriosa, evidenciou tal realidade, não tendo a mesma sido sindicada e apartada, limitando-se a Recorrente a reiterar a fundamentação constante no Relatório de Inspeção Tributária, donde, em rigor, sem ataque eficaz. É certo que a Recorrente também convoca que a decisão recorrida não estabecelece uma fundamentação do seu iter, mas não só tal realidade não é arguida enquanto nulidade, nem de resto, integra qualquer nulidade, como em nada se compadece com a realidade dela constante, bastando uma leitura atenta da decisão recorrida. E a verdade é que, é basilar e inultrapassável a justificação da impossibilidade de recurso à avaliação indireta. Neste âmbito, convoque-se o doutrinado, no Acórdão do TCAS, proferido no processo nº 1621/07, de 25 de outubro de 2018, do qual se extrata, designadamente, o seguinte. “ A avaliação indirecta reveste natureza substantiva, dado que através dela se pode determinar o essencial do facto tributário, isto é, a sua quantificação. Por outro lado, a mesma avaliação indirecta tem carácter subsidiário (cfr.artº.85, nº.1, da L.G.T.), visto que o respectivo regime só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa ou objectiva, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito. Isto significa que, mesmo quando o sujeito passivo viole os deveres de cooperação, a primeira forma a que se deve recorrer para fixar a matéria colectável é a avaliação directa (v.g.correcções técnicas), mais devendo ser efectuada a devida fundamentação relativamente à inviabilidade desta, antes de se recorrer à avaliação indirecta. Por outras palavras, a Administração Fiscal deve justificar, motivar e comprovar a relação de causa/efeito entre a acção/omissão do contribuinte e a impossibilidade de aplicar o método de avaliação directa (cfr.artº.77, nº.4, da L.G.T.). 22. O recurso ao método de avaliação indirecta só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G. Tributária).” (destaques e sublinhados nossos). Ainda neste âmbito e concreto particular, e a adensar todo o supra expendido há que relevar e reiterar que a própria forma de apuramento da matéria coletável, permite estribar e fundar a falta de legitimidade de recurso aos métodos indiretos, na medida em que o acervo de elementos contabilísticos que dispunha e a que recorreu facultavam esse apuramento. Com efeito, do Relatório de Inspeção Tributária resulta que o quantum se fundou num cruzamento de elementos documentais, que permitem corporizar, arimeticamente, tais correções, em nada podendo relevar, como já evidenciado anteriormente e ora se reitera, a morosidade e a dificuldade de concretização. Sendo, ainda, de avançar que é o próprio perito da AT no seu laudo, que reconhece que podem, efetivamente, existir realidades que não foram, devidamente, ponderadas- e, quando, alías, adoptou um procedimento díspar e sem que se percecione essa concreta disparidade quanto às faturas emitidas pela firma “A…”- e ainda assim, nada se adensou em sede de pedido de revisão da matéria coletável, quando, ademais, o contribuinte junta um manancial de informação e documentação, bastante expressivo, que foi completamente descurado, e quando, em rigor, convoca realidades de facto que se prendem justamente com a prova em contenda. Como expendido no Acórdão deste TCAS, prolatado no âmbito do processo nº 887/07, datado de 01 de junho de 2023, a propósito da densificação da legitimação da avaliação indireta à luz do suporte documental disponível: “[n]ão pode é inexistir a inerente concretização, densificação fática e depois, sem mais, fazendo tábua rasa de toda a realidade documental, concluir pela determinação presuntiva dos rendimentos. Sendo certo que, estando a Recorrida na posse de todas as faturas de compra, e de venda e dispondo, como visto, de uma ficha individual de produto, não se vislumbra de que forma esse deficit -não demonstrado, reitere-se- não poderia ser suprido, esclarecido ou mesmo afastado, legitimando, por conseguinte, qualquer correção técnica que não presuntiva. É certo que, tal poderia traduzir um trabalho de campo moroso e implicar, inclusive, um dispêndio adicional de tempo na fiscalização aos exercícios de 2002 e 2003, no entanto, como é consabido, a morosidade, a excessiva onerosidade e dificuldade não podem ser aventadas como justificação para a avaliação indireta.” Uma última nota para evidenciar que, carece de qualquer relevo a existência de, eventuais, relações especiais, por um lado, porque não integra a fundamentação contemporânea do ato, e por outro lado, porque a existência, per se, dessas mesmas relações não permite, sem mais, fundamentar o recurso à avaliação indireta, quando, de resto, e como é consabido nesse concreto âmbito e domínio as correções pautam-se por um procedimento específico. Ora, tendo presente as asserções fáticas que determinaram o recurso à avaliação indireta, supra expendidas, entende-se que nenhuma censura pode ser apontada à decisão recorrida quando ajuizou que não estavam reunidos os pressupostos para a tributação presuntiva, na medida em que as mesmas não se afiguram, efetivamente, impeditivas de comprovar e quantificar, de forma direta e exata, a matéria tributável do imposto. Com efeito, os aludidos indícios não são suficientes, não permitindo cessar a presunção da sua veracidade, donde, inviabilizar o apuramento pela via direta. Destarte, a sentença que decidiu no sentido da ilegalidade do ato de liquidação não padece dos erros de julgamento que lhe são assacados, devendo, por isso, manter-se na esfera jurídica. *** IV. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO e confirmar a decisão recorrida. Lisboa, 11 de julho de 2024 (Patrícia Manuel Pires) (Susana Barreto) (Isabel Silva) |